PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOCIÊNCIAS FORENSES Identificação das substânciasapostas em impressõesdigitais latentes Daniela Sant’Ana de Aquino1; Selma Aparecida Souza Kückelhaus2; 1 Biomédica. Aluna da Pós-Graduação em Biociências Forenses, pela Universidade Católica de Goiás/IFAR Orientadora: Bióloga. PhD. Ciências Médicas. UnB. Professora adjunta de Histologia e Embriologia - Área de Morfologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Endereço: Universidade de Brasília, Faculdade de Medicina, Área de Patologia - Laboratório de Imunologia celular. Campus Darcy Ribeiro/Asa norte Brasília-DF CEP: 70910-900. E-mail: [email protected] 2 RESUMO Em locais de crime é comum encontrar vestígios como impressões digitais latentes que resultam de substâncias secretadas pelas glândulas da pele, quando esta toca uma determinada superfície, além dessas susbtâncias, componentes exógenos como contaminantes, microrganismos e drogas de abuso podem ser encontradas em impressões latentes. O conhecimento dos componentes formadores de latentes podem ser úteis em perícia forense para determinar a idade das impressões e fornecer informações preciosas sobre a autoria de crimes. Considerando que o conhecimento e o comportamento das substâncias deixadas emlatentes podem contribuir para a elaboração de métodos mais eficientes e seguros de individualização humana, esse trabalho de revisão teve como objetivo identificar e descrever os compostos apostos em impressões digitais latentes para contribuir com a perícia forense. Palavras chave: Impressão digital latente; Glândulas sudoríparas; Glândulas sebáceas; Componentes exógenos. Identification of substances in latent fingerprints ABSTRACT At crime scenes is common to find latent fingerprints that result from substances secreted by glands of the skin when it touches a certain surface, beyond these substances, exogenous components as contaminants, microorganisms and drugs of abuse can be found in latent fingerprints. The knowledge of the components present in latent can be useful in forensics to determine the age of the latent and to provide valuable information about the author of crimes. Whereas that the knowledge and behavior of the substances present in latent can contribute to develop efficient forensic methods, this review work was aimed to identify and to describe the compounds in latent fingerprints to contribute for forensic. Keywords:Latent fingerprint; Sweat glands; Sebaceous glands; Exogenous compounds. 1 INTRODUÇÃO As impressões digitais podem ser consideradas como evidências físicas de um crime, isso ocorre porque, ao serem apostas em determinada superfície, são deixadasnessas impressões as substâncias produzidas pelas glândulas da pele,formando um fragmento de impressão papiloscópica latente (RAMOTOWSKI, 2001;POLIMENI;SARAVO, 2004;RICHMOND-AYLOR et al, 2007;GARG; KUMARI; KAUR, 2011). Assume-se que essas impressões são específicas para os diferentes indivíduos e permitem assim a individualização civil e criminal no âmbito das ciências forenses (DIAS, 2011). Os desenhos datiloscópicos presentes nas regiões de pele espessa, como palma das mãos e planta dos pés, são formados ao sexto mês de gestação por interação entre o ectoderma cutâneo e o mesoderma (MOORE; PERSAUD, 2008). A proliferação de células da camada basal para a epiderme é responsável pela formação das cristas epidérmicas primárias que invadem a derme e provoca a invasão da derme dentro da epiderme, formando assim as papilas dérmicas; a interação entre esses dois tecidos proporciona maior adesão na sua interface (KÜCKEN, 2007). Considerada o maior órgão do corpo humano, a pele é fundamental para as diferentes espécies, pois, além de proporcionar individualidade, protege o organismo contra agentes infecciosos, regula a temperatura corporal, permite a excreção de várias substâncias e abriga as terminações nervosas sensoriais (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011). As secreções são produzidas por glândulas presentes na pele, sudoríparas écrinas e sebáceas. Nas palmas das mãos e nas plantas dos pés são encontradas somente as glândulas écrinas, as quais secretam aproximadamente 99% da água presente no suor (RAMOTOWSKI, 2001; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011).Ressalta-se que as glândulas sebáceas não são encontradas nas superfícies palmar e plantar, e sim em regiões do corpo onde o folículo piloso está presente; a composição sebácea encontrada nas impressões digitais deve-se ao hábito natural de levar as mãos às demais regiões do corpo. Diferentes estudos mostram que uma grande variedade de compostos químicos orgânicos e inorgânicos pode ser encontrada em impressões latentes, incluindo contaminantes ambientais; além dessas substâncias glandulares, as impressões digitais podem conter células epiteliais (RAMOTOWSKY, 2001; PINHEIRO; RAIMANN, 2011). Uma vez apostos, os componentes químicos passam por uma série de transformações como a evaporação do componente aquoso, o processo de decomposição da impressão, devido à oxidação e à atividade de microrganismos, além de desgastes decorrentes do intemperismo. Essas transformações podem influenciar a eficácia de algumas técnicas de revelação baseadas na interação química com os componentes das impressões digitais (ARCHER et al, 2005) e pode permitir inferir o período de tempo da aposição à degradação de uma impressão latente. Fragmentos de impressões latentes são bastante comuns em locais de crime e representam uma valiosa informação para o estabelecimento da autoria delitiva. Esses fragmentos, uma vez revelados, são, na prática, utilizados exclusivamente para a individualização sendo descartadas outras possíveis análises que forneçam dados sobre o intervalo de tempo entre o toque e a revelação do respectivo fragmento de impressão digital ou palmar. A obtenção dessas informações baseia-se na análise química dos componentes apostos em impressões latentes, mas apesar da existência de estudos envolvendo as secreções presentes na pele, pouco se sabe sobre a composição dos resíduos de impressões latentes que são misturas complexas de substâncias secretadas pelas glândulas da pele (CROXTON et al, 2010). Considerando que o conhecimento da composição de substâncias deixadas pelas impressões e que o comportamento dessas substâncias em diferentes tipos de superfícies e em função do tempo pode contribuir para a elaboração de métodos mais eficientes e seguros de individualização humana,esse trabalho teve como objetivo identificar e descrever, pela revisão da literatura, os compostos apostos em impressões digitais latentes. 2 MÉTODOS Trata-se de uma revisão de literatura baseada em trabalhos científicos publicados sobre papiloscopia, em especial, estudos sobre a identificação e caracterização de substâncias presentes em impressões digitais latentes. O assunto foi pesquisado na base de dados cintíficos do Google Acadêmico, Periódico Capes (Universidade de Brasília), PubMEd, Scielo e Science Direct, utilizandoas seguintes expressões em português e inglês: impressões digitais latentes, compostos de impressões digitais, resíduos de impressões digitais latentes, microbiota da pele. Durante a pesquisa foram encontrados cerca de seis mil artigos para cada expressão. Para a delimitação da pesquisa bibliográfica utilizou-se como critério a inclusão de artigos científicos publicados nos últimos 10 anos e em cujo título estava explícito, temas sobre impressões digitais e secreção das glândulas da pele. Segundo esses critérios foram selecionados 27 artigos científicos e três livros, entre revisões e estudos inéditos. 3 DISCUSSÃO 3.1Substâncias oriundas de glândulas sudoríparas As glândulas sudoríparas são responsáveis pela produção de parte da secreção integrante de um fragmento de impressão papiloscópica. Seus produtos são água, compostos inorgânicos e orgânicos. Ver tabela 1 (RAMOTOWSKI, 2001; CHEMELLO, 2006). Dentre os componentes inorgânicos,o mais abundante é a água, este constitui aproximadamente 99% da secreção das glândulas sudoríparas écrinasapostas em impressões latentes(RAMOTOWSKI, 2001; JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011). A despeito do seu grande volume a água rapidamente evapora de impressões digitais. Outros componentes inorgânicos, como os sais minerais, cloretos, sódio, potássio, íons metálicos, sulfatos, fosfatos, amônia e cálcio também são encontrados em impressões latentes decorrentes da secreção das glândulas sudoríparas (RAMOTOWSKI, 2001; CHEMELLO, 2006). O componente orgânico das glândulas sudoríparas, presente em impressões latentes é representado por aminoácidos, ureia, ácido lático, açúcares, creatinina, colina e ácido úrico (CHEMELLO, 2006). Nos estudos de Croxtonet al (2010) foram encontrados diversos aminoácidos em impressões latentes, dentre eles aglicina, valina, leucina, serina, asparagina, prolina, ácido aspártico, ácido glutâmico, fenilalanina e cisteína foram identificados em todas as amostras estudadas. Aminoácidos como a lisina, ornitina e tirosina estavam presentes em 99% das impressões. A serina foi o aminoácido mais abundante seguido por glicina, ácido aspártico e alanina. As proteínas identificadas nos resíduos das impressões digitais foram catepsina-D, queratina 1 e 10 (DRAPEL et al, 2009). Esse estudo demonstrou que as proteínas resultantes da degradação de células epiteliais chegam a 130 mg nos resíduos liberados por glândulas sudoríparas écrinas e 384 mg em resíduos de ambas as glândulas, sudoríparas e sebáceas. A dermicidina que também foi encontrada entre os resíduos apostos em digitais, é um peptídeo secretado por glândulas écrinas da pele e melanócitos, neurônios e células epiteliais da mama e da placenta. Essa substância é um potencial antimicrobiano natural que é efetivo contra microrganismos encontradosna pele(DRAPEL et al, 2009; MOREIRA, 2012). 3.2 Substâncias oriundas de glândulas sebáceas O principal componente oleoso das impressões digitais são os lipídios produzidos pelas glândulas sebáceas, desses, 30% são compostos de ácidos graxos livres, 33% são glicerídeos, 22% ésteres de cera, 10% de esqualeno e 5% de hidrocarbonetos (KIMONE et al, 2010). Sabe-se que as glândulas sebáceas produzem em sua maior parte, ácidos graxos, colesterol, esqualeno, ésteres graxos e triglicerídeos hidrocarbonetos e álcoois (RAMOTOWSKI, 2001;CHEMELLO, 2006), mas também ácido tetradecanóico, ácido palmítico, ácido esteárico, ácido palmitoleico, ácido oleico e esqualeno (ARCHER et al, 2011); todos esses compostos podem ser encontrados em impressões latentes. O esqualeno que é um hidrocarboneto altamente insaturado, intermediário linear na biossíntese de colesterol, e suscetível à oxidação tem sido reportado como um produto da degradação do colesterol e sua presença em impressões latentes pode sugerir envelhecimento da latente. Altos níveis desse intermediário foram encontrados em amostras de digitais preparadas, onde os doadores passavam as mãos no rosto para transferência de produtos de glândulas sebáceas, que são enormemente encontradas na face;já as amostras controle (em que os doadores lavavam as mãos antes de doar as digitais) não havia presença do esqualeno porque este é derivado de glândulas sebáceas e as tais não estão presentes nas palmas das mãos (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2011; CROXTON et al, 2010). Os lipídios encontrados nos resíduos de impressões digitais variam de acordocom a idade e o sexo. Mudanças químicas podem ocorrer e as condições ambientais são importantes nesse processo (CROXTON et al, 2010). Segundo Williams, Brown e Bruker (2011) as mulheres depositam mais resíduos de glândulas sebáceas que os homens da mesma idade. Esse achado pode ser explicado pelo uso de cosméticos oleosos, como cremes hidratantes, que é hábito comum entre as mulheres (WEYERMANN; ROUX; CHAMPOD, 2011).Asano et al (2002) mostraram que alguns resíduos como o ácido palmítico, ácido palmitoleico e ácido oleico são encontrados em maiores concentrações nas impressões latentes de homens, na comparação com as impressões produzidas por mulheres, mas apesar de inconclusivo, esse estudo aponta para diferenças na composição de impressões latentes em relação ao gênero. Os estudos realizados por Kimone et al (2010) mostram diferenças na composição de impressões latentes em função da idade. Impressões digitais de adultos possuemo dobro da massa molecular de carbono quando comparada a impressões de crianças, isso pode ser explicado pela presença de ésteres de ácido graxo de maior peso molecular e de baixa volatilidade na secreção sebácea de indivíduos adultos (CHEMELLO,2006).Em contrapartida, as impressões latentes de crianças mostram maior proporção de ésteres de ácidos graxos de cadeia curta, que por serem voláteis tornam as latentes menos resistentes à degradação; isso explica porque as impressões digitais de crianças desaparecem mais facilmente que impressões de adultos(CHEMELLO, 2006; KIMONE et al, 2010). Resíduos lipídicos das impressões digitais podem interagir com substâncias de metal, por serem de carga positiva, os íons das substâncias metálicas, que são negativas, permitindo a visualização das digitais ao serem reveladas com esses componentes (SAMETBAND et al, 2007). 3.3Microorganismos presentes em impressões latentes A pele humana é um sítio de colonização por diferentes microorganismos como bactérias, fungos e vírus. Sabe-se que os componentes formadores de impressões latentes podem sofrer degradação decorrente de alterações físicas e/ou químicas causadas pela microbiota oriunda da pele, em função do seu tempo de produção (ARCHER et al, 2011). Segundo Ramotowski (2001) a maioria dos ácidos graxos livres presentes no suor é oriunda de lipólise mediada por enzimas ou mesmo por atividade bacteriana. Logo o conhecimento da microbiota presente em impressões latentes é importante para compreender as transformações sofridas por impressões latentes ao longo do tempo e mesmo para identificar o perfil dos componentes formadores de impressões latentes. Fierer et al (2010) afirmam que a microbiota humana pode variar de acordo a região geográfica, entre indivíduos e até mesmo em função de hábitos. Dentre os microorganismos presentes na pele humana as bactérias são as mais comuns. Comumente são encontradas bactérias residentes comoStaphylococcus coagulase, Staphylococcus aureus, Micrococcus, Corynebacterinae, Bacteroidales, Parabacteroides, Proprionibacterineae, Ruminococcaceae, Clostridiales, Anaerococcus, Peptoniphilus, Pityrosporum e bactérias transitórias como as Pseudomonas(FIERER et al, 2010; LOCKS et al, 2011). Tabela 1: Substâncias e microorganismos encontrados em impressões latentes. Origem Componentes glandulares, substâncias Referências exógenas e microorganismos Glândulas sudoríparas Inorgânicos Orgânicos Cloretos, Íons metálicos, amônia, sulfatos, fosfatos água, ferro. Proteínas Aminoácidos Uréia Ácido lático Carboidratos Creatinina Colina Ácido úrico Orgânicos Glândulas Outros CHEMELLO, 2006 ___ Ácidos graxos Glicerídeos Hidrocarbonetos Álcoois Colesterol Residentes Transitórios LOCKS et al, 2011; Staphylococcus coagulase Micrococcus Corinebactérias Bacteroidales Parabacteroides Proprionibacterineae Ruminococcaceae Clostridiales Anaerococcus Peptoniphilus Pseudomonas Staphylococcus aureus Fungos Vírus FIERER et al; 2010 Vitaminas do complexo B, riboflavina Drogas de abuso Entorpecentes Nicotina Pólvora Resíduos de explosivos CHEN et al, 2007; HAZARIKA et al, 2008; SHALHOUB et al, 2008;RONNIE NG et al, 2009; PINHEIRO; RAIMANN, 2011 ABDELHAMID et al, 2011 GIROD; RAMOTOWSKI; WEYERMANN, 2012 sebáceas Microbiota CHEMELLO, 2006 DNA Acredita-se que a microbiota confira um caráter individual ao ser humano. Isso pode ser constatado pelo baixo compartilhamento da microbiota entre duas pessoas e até mesmo entre gêmeos univitelinos; assume-se que cerca de 13% da microbiota presente na palma da mão é compartilhada entre dois indivíduos (LOCKS et al, 2011). Apesar do baixo percentual de compartilhamento o perfil da microbiota não deve ser suficiente para permitir a individualização no âmbito das ciências forense, mas a identificação de linhagens bacterianas com distribuição geográfica restrita pode fornecer pistas importantes sobre a origem de um determinado suspeito de crime, quando suas impressões digitais não forem encontradas nos bancos de dados policiais ou mesmo quando evidências como o DNA forem ausentes (TIMS et al, 2010). 3.4 Envelhecimento de impressões latentes x Degradação dos compostos secretados Estabelecer a idade de uma impressão digital é relevante para provar a presença do suspeito dentro do período em que ocorreu um determinado crime. Uma das formas de se estimar a idade de uma latente é pela curva de degradação dos compostos apostos nessa impressão que pode ser traduzida como o seu envelhecimento (WEYERMANN, ROUX, CHAMPOD; 2011). No entanto, a determinação da composição do resíduo da latente é complexa e demanda a padronização dos tipos de resíduos e da sua quantificação em função do seu tempo de aposição, do substrato de aposição e de variáveis ambientais (GIROD, RAMOTOWSKI, WEYERMANN; 2012); como dito, alterações físicas, químicas e biológicas afetam os resíduos deixados numa impressão latente. Diversas são as variáveis que cooperam para a produção e degradação dos resíduos de impressões latentes. De acordo com Girod,Ramotowski, Weyermann(2012) a composição dos resíduos das latentes depende das características intrínsecas do doador, da dieta, idade, e sexo, da forma como a impressão é produzidaquanto à pressão e o tempo de contato com a superfíce e a natureza da superfície de aposição quanto à porosidade e textura. Um exemplo de como a idade pode afetar a composição de uma latente vem dos estudos de Williams, Brown e Bruker (2011) que, por microespectroscopia infravermelha mostrou que é comum e estável a presença de cloreto de sódio e de ácido láctico nas impressões latentes de crianças em função do tempo, enquanto que os níveis de ésteres eram decrescentes. Dentre as variáveis ambientais relacionadas à degradação dos compostos formadores de impressões latentes a temperatura deve ser considerada, pois sabe-se que a exposição de uma latente a altas temperaturas, entre 400°C a 500°C, podem causar a condensação de aminoácidos como o ácido aspártico e a alanina formando 3,6-dimetilpiperazina-2, 5-diona e maleimida e 2,5-furandiona, respectivamente; nessas condições assume-se que a latente esteve sujeita a calor específico (RICHMOND-AYLOR et al, 2007). A superfície em que as impressões digitais são apostas também influenciar na concentração de certos compostos, como o cloreto, que pode variar com a porosidade da superfície, que como mostrado é três vezes maior em superfícies porosas como o papel filtro na comparação com folhas de alumínio (CROXTON et al, 2010). Ensaios realizados por Weyermann, Roux e Champod (2011) revelaram que, ao decorrer do tempo, o esqualeno era detectado em superfícies porosas depois de trinta dias. Já em superfícies não porosas o mesmo composto não era encontrado depois de uma semana tendo sido ligeiramente degradado. Outra variável a ser considerada é a luz. Sabe-se que na presença de luz o processo de degradação dos compostos de impressões latentes é acelerado e a presença do esqualeno pode ser avaliada, em ensaios controlados, para a determinação de uma curva que associa sua presença à degradação do colesterol, na presença ou não da luz. Ou seja, o esqualeno não é encontrado após nove dias de incubação na presença de luz porque este acelera a sua degradação(ARCHER et al, 2011). A degradação de esqualeno gera produtos de oxidação como o esqualeno mono hidroperóxido e epóxido de esqualeno que podem ser considerados como indicativos do envelhecimento de impressões latentes (CROXTON et al, 2010).Sabe-se que o esqualeno, colesterol e ácidos graxos sofrem degradações significativas em função do tempo, resultando na produção de novos compostos que em sua maioria são moléculas oxidadas de menor peso molecular (MONGet al, 1999; ARCHERet al, 2005; WEYERMANNet al, 2011). Um bom exemplo são os ácidos graxos de cadeia curta, encontrados em maior abundância em impressões envelhecidas; esses derivam de ácidos graxos de cadeia longa que são frequentes em impressões recentes (ARCHERet al, 2005). O esqualeno pode ser degradado por microorganismos, resultando em produtos como epóxidos, cetonas, álcoois e hidro peróxidos por reação com o oxigênio, mesmo em condições de baixa temperatura e luminosidade (RAMOTOWSKI, 2001). De acordo com Croxton et al (2010) compostos insaturados como o esqualeno, ácido oleico e ácido palmitoleico são predominantemente perdidos ao longo do tempo, enquanto que os compostos saturados permanecem inalterados. Existem outros fatores, ver tabela 2, que interferem na composição dos compostos deixados pelas impressões digitais e que podem influenciar a composição inicial desses resíduos (PEIXOTO; RAMOS, 2010; GIROD;RAMOTOWSKI; WEYERMANN,2012). 3.5 Outros componentes encontrados em impressões latentes Como dito as impressões latentes são compostas por substâncias endógenas, mas também pode apresentar outros compostos como o DNA e vitaminas até mesmo componentes exógenos, como cosméticos e drogas de abuso. A fonte de DNA para compor impressões latentes pode ser do mesmo indivíduo pela descamação de células das glândulas sebáceas ou pela contaminação com células de outros indivíduo. Estudos mostram que a quantidade de DNA presentes em impressões latentes é sufuciente para permitir a identificação precisa do indivíduo do qual a célula originou, por meio da técnica da PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) (SHALHOUB et al, 2008; PINHEIRO; RAIMANN, 2011). Tabela 2: Fatores que podem influenciar a variabilidade da composição inicial dos resíduos deixados pelas impressões digitais latentes. Fatores que interferem na composição dos resíduos deixados pelas digitais Dieta Características do doador Idade Referências GIROD;RAMOTOWSKI; WEYERMANN,2012 Sexo Hábitos Condições da produção das latentes Natureza da superfície Ângulo de contato PEIXOTO; RAMOS, 2010; Pressão de contato Duração do contato GIROD;RAMOTOWSKI; WEYERMANN,2012 Superfície porosa PEIXOTO; RAMOS, 2010 Superfície semi-porosa GIROD;RAMOTOWSKI; WEYERMANN,2012 Superfície não porosa Vitaminas do complexo B e riboflavina também foram encontradas nos resíduos deixados por impressões digitais identificadas pela cromatografia a laser assistida (GIROD; RAMOTOWSKI; WEYERMANN, 2012). As drogas de abuso podem ser facilmente identificadas em impressões latentes. Dentre as drogas encontradas agrupam-se os medicamentos como o diazepan, aspirina, opióides como a metadona que é um fármaco sintético prescrito na terapia a pacientes toxicodependentes de heroína e de outros opióides (HAZARIKA et al, 2008; RONNIE NG et al, 2009). Da mesma forma foram identificados em latentes metabólitos da metadona (2etilideno-1,5-dimetil-3,3-difenilpirrolidina), da cocaína (benzoilecgonina), o D9- tetrahidrocanabinol (THC) que é o principal psicoativo presente na maconha (HAZARIKA et al, 2008) e a cotinina que é um metabólito derivado da nicotina(CHEN et al, 2007). Outros compostos exógenos como resíduos de explosivos e pólvora podem ser identificados em impressões latentes pela técnica baseada em espectroscopia a laser induzida com captura óptica(RONNIE NG et al, 2009;ABDELHAMID et al,2011). 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS As impressões latentes constituem evidências físicas de um crime e o seu caráter específico permite a individualização civil e criminal no âmbito das ciências. A formação de uma impressão latente depende de uma variedade de compostos endógenos e exógenos. Como dito o perfil desses compostos depende de variáveis relacionadas à produção da impressão latente, como as características intrínsecas do doador, a pressão e o tempo de contato com a superfíce e a natureza da superfície de aposição. Uma vez produzida, a impressão latente sofre processos de degradação que são dependente de variáveis ambientais como a temperatura, umidade, luminosidade e etc. Até o momentona prática forense, as impressões latentes tem sido utilizadas exclusivamente para a individualização humana, no entanto, considerando a multiplicidade dos compostos encontrados em latentes, as variáveis relacionadas à produção e à degradação desses compostos inúmeras são as informações contidas nas latentes que podem contribuir na investigação civil e criminal. Apesar das potencialidades das impressões latentes no fornecimento de novas evidências no âmbito das Ciência Forenses, novos estudos são necessários para determinar o perfil dos componentes formadores de impressões latentes que considerem as variáveis envolvidas na produção das latentes bem como as variáveis ambientais envolvidas na degradação dos compostos. Considera-se que novos estudos são fundamentais para estabelecer curvas que permitam a comparação com impressões questionadas, mas também para permitir transpor dados amostrais para a população. REFERÊNCIAS 1. ABDELHAMID, M.; FORTES, F. J.; HARITHB, M. A.; LASERNA, J. J. Analysis of explosive residues in human fingerprints using optical catapulting–laser-induced breakdown spectroscopy. Journal of Analytical Atomic Spectrometry, v. 26, p. 1445 – 1450, 2011. Disponívelem: <www.rsc.org/jaas>. Acessadoem: jun. 2012. 2. ARCHER, Nia E., YANNIS Charles; ELLIOTT, Julia A.; JICKELLS, Sue. 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