1
PATRÍCIA DA SILVA FERREIRA
A INFLUÊNCIA DAS PRÁTICAS POPULARES NO
CUIDADO COM A MALÁRIA NO MUNICÍPIO DE
JURUENA-MT
CUIABÁ
2008
2
UNIVERSIDADE FEREDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
PATRÍCIA DA SILVA FERREIRA
A INFLUÊNCIA DAS PRÁTICAS POPULARES NO
CUIDADO COM A MALÁRIA NO MUNICÍPIO DE
JURUENA-MT
CUIABÁ
2008
3
PATRÍCIA DA SILVA FERREIRA
A INFLUÊNCIA DAS PRÁTICAS POPULARES NO
CUIDADO COM A MALÁRIA NO MUNICÍPIO DE
JURUENA-MT
Dissertação
apresentada
ao
Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem, da UFMT, como
requisito para a obtenção do título
de Mestre em Enfermagem –
Área de concentração: Processos
e
Práticas
em
Saúde
e
Enfermagem.
ORIENTADORA: Dra. ROSEMEIRY CAPRIATA DE SOUZA
AZEVEDO
CUIABÁ
2008
4
Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução
total ou parcial desta dissertação.
FICHA CATALOGRÁFICA
Catalogação na Publicação (CIP). Bibliotecária Valéria Oliveira dos Anjos - CRB1 1713
F383i
Ferreira, Patrícia da Silva.
A influência das práticas populares no cuidado com a malária no
município de Juruena-MT / Patrícia da Silva Ferreira. – Cuiabá, 2008.
112 f. ; il.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso para obtenção do
título de Mestre em Enfermagem.
“Orientadora: Profª. Dra. Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo”.
1. Saúde Pública. 2. Doenças Parasitárias. 3. Atenção à Saúde. 4.
Assistência à Saúde. 5. Malária. I. Título.
CDU 614.253:616.936
5
DEDICATÓRIA
A Deus presente em todos os momentos da minha vida, e por conduzir-me
com amor, coragem e sabedoria deixando meu trilhar mais suave nesta
jornada.
À Minha Mãe querida, pela dedicação, força e amor, mostrando que vale a
pena lutar pelos nossos ideais e que sempre existe uma solução para tudo
em nossas vidas.
Ao meu companheiro Alexsander, pelo seu respeito e amor constantes,
compartilhando os momentos difíceis desta etapa de nossas vidas.
6
AGRADECIMENTOS
- À Professora Drª Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo, pela
orientação, estímulo e disponibilidade nesse processo de crescimento
pessoal e profissional.
- Ao grupo de pesquisa pelas valiosas contribuições.
- À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso - FAPEMAT pelo
apoio financeiro;
- À Secretaria de Estado de Saúde – SES e às minhas amigas de trabalho,
Nice e Maria Conceição, pela oportunidade e por permitirem minha saída
para fazer este curso.
- Às minhas irmãs, Regina e Mariza por existirem e aos demais familiares
que são de suma importância na minha existência.
- As minhas amigas de todas as horas, pela disponibilidade em ajudar e
sugerir, escutar e enxugar algumas lágrimas derramadas nos momentos
de incertezas. Obrigada pela compreensão e carinho.
- Aos colegas de mestrado pelos momentos de convívio e pelas experiências
compartilhadas.
- Às pessoas participantes deste estudo, pela receptividade e por
compartilharem os seus saberes.
-
7
"O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que
acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis,
coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.
Fernando Sabino
8
FERREIRA, Patrícia da Silva. A influência das práticas populares no cuidado
com a malária no município de Juruena – MT. 2008. Dissertação (Mestrado em
Enfermagem) – Curso de Pós-Graduação em Enfermagem, UFMT, Cuiabá. 113p.
Orientadora: Drª Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo.
RESUMO
Vários fatores colaboraram para a ocorrência da malária em Mato Grosso,
detacando-se dentre eles o intenso fluxo migratório entre a fronteira com outros
estados considerados endêmicos para a malária e o desequilíbrio ambiental
provocado pelo desmatamento, extração mineral e queimadas. A maneira como as
pessoas realizam o tratamento da malária está relacionada aos índices de
mortalidade e à redução da transmissão da doença. Entretanto, alguns fatores
podem influenciar na forma como as pessoas cuidam de sua saúde, especialmente
quando são infectadas pelo plasmódio causador da malária. Dentre esses fatores
podemos citar as reações adversas dos medicamentos, as condições ecológicas,
geográficas, econômicas, sociais e culturais, bem como crenças e valores das
pessoas do município pesquisado. Nesse sentido, a pesquisa teve por objetivo
geral analisar a influência das práticas populares no cuidado desenvolvido pelas
pessoas acometidas por malária no município de Juruena–MT e específicos:
descrever a rede de atendimento às pessoas portadoras de malária existentes no
município; identificar os conhecimentos que as pessoas têm sobre a malária e suas
formas de cuidado e compreender os aspectos culturais envolvidos na maneira
como as pessoas cuidam da malária. As pessoas investigadas foram usuários do
SUS com diagnóstico de malária, moradores do município de Juruena – MT. Os
dados foram organizados, categorizados e analisados com base no método de
análise de conteúdo apoiado na técnica de análise temática, fundamentada nos
conceitos de cultura, cuidado e Teoria do Cuidado Cultural de Leininger. Durante a
análise dos dados, emergiram duas categorias: categoria 1 - A rede de serviço de
saúde e terapêutica antimalárica e categoria 2 - práticas populares que influenciam
no processo de cuidar da malária. A primeira categoria gerou duas subcategorias: o
serviço de saúde e sua organização como espaço de diagnóstico e tratamento e a
terapêutica antimalárica e seus efeitos colaterais. O mesmo ocorreu com a
categoria 2, cujas categorias foram: o conhecimento das pessoas sobre formas de
transmissão e tratamento da malária; formas de cuidar/ tratar da malária.
Concluímos que em geral as práticas populares no cuidado com a malária pelas
pessoas pesquisadas são influenciadas pela cultura individual e coletiva presentes
naquela comunidade, pois é a maneira que encontraram para cuidar da saúde e
auxiliar na cura da doença. Desta forma, surge a necessidade dos profissionais de
saúde conhecerem e valorizarem o significado dessas práticas de cuidado e
aproximarem-se das realidades para proporem ações de cuidado, buscando maior
aproximação do conhecimento popular com o científico, a fim de sugerir políticas de
saúde próximas da realidade.
UNITERMOS: Malária; Cultura; Cuidados de saúde.
9
FERREIRA, Patrícia da Silva. A influência das práticas populares no cuidado
com a malária. The influence of popular practices in handling malaria in the
county of Juruena – MT, 2008. Essay (Masters in Nursing) Post Graduation
Course in Nursing, UFMT (Federal University of Mato Grosso), Cuiaba. 113p.
Orientation: Drª. Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo.
ABSTRACT
Several factors collaborated for the occurrence of malaria in Mato Grosso, the main
ones being the intense migration flow between bordering states considered endemic
to malaria and the environmental disequilibrium provoked by deforesting, mining
activities and land cleared by burniing. The way the people carry out the treatment
of malaria, has to do with the mortality rates and the reduction of the transmission of
the disease. However, some factors can influence the way the people take care of
their health, especially when they are infected bt the plasmodium causar of malaria.
Among these factors we can mention the adverse reactions of the medicine, the
bionomical, geographical, economical, social and cultural conditions, as well as
beliefs and merits of the people of the county researched. With that aim, the
research had as its general purpose in anyalizing the influence of the popular
practices of care carried out by those contaminated by malaria in the county of
Juruena-MT and specific, make a discription of the medical attendance system for
malaria infected people in the county; identify the knowledge the people have
concerning malaria and the forms of care necessary; understand the cultural
aspects involved in the way the people handle malaria. The people researched were
SUS (Central Health System) users with diagnosis of malaria and living in the
county of Juruena-MT. The data was arranged, grouped and analised based on the
method of analysis of content supported by the theme analysis technique, based on
cultural concepts, care and the Leininger Cultural Care Theory. During the analysis
of the data, two groups emerged: group 1 – The health service and anti-malaria
therapy and group 2 - Popular pratices that influence the malaria care process. The
first group produced two subgroups: the health service and the organization of the
treatment and diagnosis space and the anti-malaria therapy and their side effects.
The same thing occured with group rwo, which were: knowledge of the people in
regards to the transmission and treatment of malaria; ways of handling and treating
mnalaria..We came to the conclusion that in a general way, all the popular practices
to handle malaria, by those researched, are influenced by the individual and
colective culture present in the community, being its the way they discovered to take
care of their health as well as to help out in the cure of the disease. Thus, there is a
need for the health agents to get to know and value the significance of these care
practices, have a closer contact with local realities in order to propose care actions,
seeking to Narrow popular knowledge with scientific knowledge so as to sponsor
political health programs in tune with local realities.
Keywords: malaria, culture, health care
10
FERREIRA, Patrícia da Silva. La Influencia de la Prácticas Populares en el
Cuidado con la Malaria en el Município de Juruena – MT. 2008. Disertación.
(Máster en la Enfermería) – Curso de Postgrado en Enfermería, Universidad Federal
de Mato Grosso. Cuiaba, 113p. Orientación: Drª. Rosemeiry Capriata de Souza
Azevedo.
RESUMÉN
Vários factores colaboraran para la ocurrencia de la Malaria en Mato Grosso, dentre
ellos destacanse el intenso flujo migratório entre la frontera con otros Estados
considerados endémicos para la malaria y el desequilibrio ambiental provocado por
el deforestación, extracción mineral y quemadas. La manera como las personas realizan
el tratamineto de la malaria está relacionado a los índices de mortalidad y la
reducción de la transmisión de la enfermedad. Mientras, algunos factores pueden
influenciar en la forma como las personas cuidan de su salud, especialmiente cuando
són infectadas por el plasmódio causador de la malaria. Dentre eses factores
podemos citar las reacciones contrarias de los medicamentos, las condiciones
ecológicas, geográficas, economicas, sociales y culturales, bien como creencia y
valores de las personas del município pesquisado. En ese sentido la pesquisa tuvo por
objetivo general analizar la influencia de las prácticas populares en el cuidado
desarollado por las personas acometidas por malaria en el município de Juruena-MT
y específicos: describir la red de atendimiento de las personas portadoras de malaria
existentes en el município; identificar los conocimientos que las personas tienen
sobre la malaria y sus formas de cuidado; comprender los aspectos culturales
envolvidos en las formas de las personas lidiaren com la malaria. Las personas
investigadas fueron usuarios del SUS con diagnóstico de malaria, moradores del
município de Juruena – MT. Los datos fueran organizados, categorizados y
analizados con base en el método de análisis de contenido apoyado en la técnica de
análisis temática, fundamentada en los conceptos de cultura, cuidado y Teoria del
Cuidado Cultural de Leininger. Durante la análisis de los datos, emergeran dos
categorias: categoria 1 – La red de servicio de salud y terapéutica antimalarica y
categoria 2 – Prácticas populares que influencian en el proceso de cuidar de la
malaria. La primera categoria generó dos subcategorias: el servicio de salud y su
organización como espacio de diagnóstico y tratamiento y la terapéutica antimalarica
y sus efectos colaterales. El mismo ocurrió com la categoria dos, cuyas categorias
fueran: el conocimiento de las personas sobre formas de transmisión y tratamiento de
la malaria; formas de cuidar/tratar de la malaria. Concluymos que en general las
prácticas populares en el cuidado con la malaria por las personas pesquisadas són
influenciadas por la cultura individual y colectiva presente en aquella comunidad,
pues es la manera que encontraran para cuidar de la salud y auxiliar en la cura de la
enfermedad. De esta forma surge la necesidad de los profisionales de salud conocer y
valorizar el significado de esas prácticas de cuidado, aproximar de las realidades para
proponer acciones de cuidado buscando mayor aproximación del conocimiento
popular con el científico afín de proponer políticas de salud próximas de las
realidades.
UNITERMOS: Malaria;Cultura; Cuidados con la Salud
11
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
BIRD
Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento
CEM
Campanha de Erradicação da Malária
CEP
Comitê de Ética em Pesquisa
CODEMAT
Companhia de Desenvolvimento de Mato Grosso
CONEP/MS
Comitê Nacional de Ética em Pesquisa/ Ministério da Saúde
DDT
Dicloro-difeniltricloetano
FAPEMAT
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso
FSESP
Fundação de Serviços Especiais de Saúde Pública
FUNASA
Fundação Nacional de Saúde
HUJM
Hospital Universitário Julio Muller
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCRA
Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária
IPA
Índice Parasitológico Anual
LVC
Lâmina de Verificação de Cura
MS
Ministério da Saúde
OMS
Organização Mundial de Saúde
OPAS
Organização Pan-Americana de Saúde
PACS
Programa de Agentes Comunitários de Saúde
PCIM
Programa de Controle Integrado da Malária
PCMAM
Projeto Controle da Malária na Bacia Amazônica
PIACM
Plano de Intensificação das Ações de Controle da Malária na
Região Amazônica
PNCM
Plano Nacional de Controle da Malária
PNCM
Programa Nacional de Controle da Malária
PSF
Programa de Saúde da Família
RAVREDA
Rede Amazônica de Vigilância da Resistência às Drogas
Antimaláricas
RBM
Retroceder a Malária
SES/MT
Secretaria Estadual de Saúde de Mato Grosso
SESP
Serviço Especial de Saúde Pública
SIVEP
Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Malária
SMN
Serviço de Malária do Nordeste
12
SMS
Secretaria Municipal de Saúde
SNM
Serviço Nacional de Malária
SUCAN
Superintendência de Campanha de Saúde Pública
SUS
Sistema Único de Saúde
TCLE
Termo de Consentimento Livre Esclarecido
UBS
Unidade Básica de Saúde
USF
Unidade de Saúde da Família
WHO
World Health Organization
13
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1
Ciclo de infestação da malária no vetor e no hospedeiro
FIGURA 2
Localidades sentinelas do projeto RAVREDA em funcionamento em
2005
FIGURA 3
Localização geográfica do município de Juruena – MT
FIGURA 4
Vista aérea do município de Juruena – MT
14
LISTA DE FOTOGRAFIAS
F1
Hospital Municipal e USF Urbana I
F2
USF Urbana II e Unidade de Reabilitação
F3
USF Rural e Unidade de Saúde Bucal
F4
Prefeitura e Câmara Municipal de Juruena
F5 e F6
Assentamento Vale do Amanhecer - local de atividade garimpeira e
atualmente área de desmatamento e queimadas
F7
Medicamento Cloroquina
F8
Medicamento Primaquina
F9
Medicamento Mefloquina
F 10
Área utilizada pelos moradores da região para pesca
F 11
Boldo
F 12
Casca da quina em pó
F 13
Figatil
F 14
Salsaparilha
F 15
Sabugueiro
F 16
Melão de são caetano
F 17
Caferana
F 18
Picão
F 19
Armário para guarda de medicamentos homeopáticos
F 20
Própolis – medicamento homeopata
15
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1
Esquema terapêutico preconizado pelo MS/FUNASA
tratamento da malária por Plasmodium falciparum.
QUADRO 2
Esquema terapêutico para tratamento
Plasmodium vivax ou Plasmodium malarie.
QUADRO 3
Esquema alternativo para tratamento das infecções por
Plasmodium vivax em crianças apresentando vômitos, com
cápsulas retais de artesunato em 4 dias e primaquina em 7 dias.
QUADRO 4
Esquema de prevenção de recaída da malária por Plasmodium
vivax, com cloroquina dose única semanal, durante 3 meses.
QUADRO 5
Esquema terapêutico para tratamento das infecções por
Plasmodium falciparum com associação de artemeter mais
lumefantrina – Cartem.
QUADRO 6
Esquema alternativo para tratamento das infecções
Plasmodium falciparum com quinina, dociciclina e primaquina
das
infecções
para
por
por
16
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO..........................................................................................
19
CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO......................................................................
22
CAPÍTULO 2 – REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEITUAL........................
27
2.1 A malária: aspectos históricos e epidemiológicos...............................
28
2.2 Ciclo de infestação da malária no vetor e no hospedeiro...................
30
2.3 Políticas de saúde para o controle da malária no Brasil e em Mato
Grosso....................................................................................................
34
2.4 Os conceitos de cultura, cuidado e a Teoria do Cuidado Cultural de
Leininger ................................................................................................
42
CAPÍTULO 3 – METODOLÓGIA....................................................................
50
3.1 Tipo de estudo.....................................................................................
51
3.2 Cenário ...............................................................................................
51
3.3 Sujeitos do estudo ..............................................................................
53
3.4 A coleta de dados................................................................................
54
3.5 Análise dos dados...............................................................................
55
3.6 Aspectos éticos...................................................................................
57
CAPÍTULO 4 – A REDE DE SERVIÇO DE SAÚDE E A TERAPÊUTICA 58
ANTIMALÁRICA...............................................................................................
4.1 O serviço de saúde e sua organização como espaço para
diagnóstico e tratamento da malária...................................................
4.2
A
terapêutica
antimalárica
medicamentosa
e
seus
59
efeitos
colaterais.............................................................................................
64
17
CAPÍTULO 5 – PRÁTICAS POPULARES QUE INFLUENCIAM NO
PROCESSO DE CUIDAR DA MALÁRIA.......................................................
71
5.1 O conhecimento das pessoas sobre formas de transmissão e
tratamento da malária.........................................................................
5.2 Formas de cuidar/tratar da malária.......................................................
CAPÍTULO 6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................
72
77
94
REFERÊNCIAS ............................................................................................... 99
APÊNDICES ..................................................................................................
109
ANEXOS.........................................................................................................
113
18
APRESENTAÇÃO
Esta pesquisa é parte de um projeto maior intitulado “Motivos para
a não-adesão de usuários ao tratamento de malária por Plasmodium vivax”,
desenvolvido por um grupo de pesquisadores da Faculdade de Enfermagem,
vinculados ao Grupo de Pesquisa ARGOS, da Universidade Federal de Mato
Grosso (UFMT). O projeto é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado
de
Mato
Grosso
(FAPEMAT)
EDITAL
DE
GOVERNO/FAPEMAT
Nº007/2005 e tem por objetivo geral compreender os motivos que levam os
usuários dos serviços públicos de saúde do município de Juruena - MT a aderir ou
não, ao tratamento da malária. Este sub-projeto teve como foco de atenção a
influência dos aspectos culturais no cuidado com a malária.
O trabalho está dividido em seis capítulos. O primeiro capítulo
apresenta uma breve introdução à temática do estudo, sua justificativa e relevância,
bem como os objetivos geral e específicos.
Já o segundo capítulo denominado referencial teórico e
conceitual, discute os aspectos históricos e epidemiológicos da malária no âmbito
mundial, nacional, estadual e local. Apresenta o ciclo de infestação da malária no
vetor e no hospedeiro; discute as políticas de saúde para o controle da malária nas
três esferas de governo: federal, estadual e municipal; os principais conceitos e
teoria que dão sustentação à discussão do objeto de estudo, tais como a cultura, o
cuidado e a Teoria do Cuidado Cultural de Leininger.
O terceiro capítulo intitulado metodologia, descreve o tipo, os
sujeitos e o cenário do estudo, a coleta e análise dos dados e princípios éticos
observados em atendimento à Resolução nº196/96 do Comitê de Ética em
Pesquisa.
Os capítulos quarto e quinto apresentam e discutem as categorias
emergidas do trabalho de campo identificadas como: categoria 1 - A REDE DE
SERVIÇO DE SAÚDE E TERAPÊUTICA ANTIMALÁRICA, e a categoria 2 –
19
PRÁTICAS POPULARES QUE INFLUENCIAM NO PROCESSO DE CUIDAR DA
MALÁRIA.
O sexto capítulo se refere às considerações finais, no qual se
destacam os aspectos relevantes do trabalho e a importância de se trabalhar as
questões culturais no cuidado e tratamento das pessoas.
Esperamos que a leitura deste trabalho possa estimular o leitor a
refletir sobre a importância que a cultura exerce na forma como as pessoas cuidam
de sua saúde e sobre a necessidade dos profissionais de saúde reconhecerem e
compreenderem que o conhecimento dessas pessoas influencia nos modos como
elas se comportam em relação ao seu cuidado à saúde.
20
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
21
1 INTRODUÇÃO
A busca pelo conhecimento mais aprofundado na área da saúde e
enfermagem, bem como no processo pesquisa conduziu-me ao curso de pósgraduação, mestrado, oferecido pela Universidade Federal de Mato Grosso.
Durante a vivência na pós-graduação alguns questionamentos
referentes à prática de enfermagem começaram a emergir e a participação no
grupo de pesquisa foi de fundamental importância, por oportunizar momentos de
encontros, trocas e reflexões sobre o processo de cuidar. Foram nessas discussões
que percebi o quanto a cultura está relacionada ao processo saúde-doença,
principalmente no que se refere aos cuidados desenvolvidos pelas pessoas quando
apresentam alguma doença, em particular a malária foco de estudo do grupo.
A malária é mundialmente reconhecida como um grave problema
de saúde pública, incidindo sobre mais de 40% da população de 100 países e
territórios. Sua estimativa é de 300 a 500 milhões de novos casos e um milhão de
mortes/ano. Devido a sua ampla incidência e aos efeitos debilitantes, possui
impacto regional e econômico ao reduzir a capacidade produtiva da população
(BRASIL, 2006b).
Típica de regiões tropicais e subtropicais, essa doença atinge
principalmente países com baixo desenvolvimento socioeconômico. A Organização
Mundial de Saúde (OMS) listou 101 países ou territórios como sendo endêmicos
para a malária. Esta lista inclui: 45 países africanos, 21 países americanos, 04
países europeus, 14 países no Leste do mediterrâneo, 08 países no Sudeste
asiático e 09 países na região Oeste do pacífico, porém mais de 90% dos casos de
malária estão na África Sub-Saara. Fora do continente africano, a malária
concentra-se em apenas 06 países, sendo estes as Ilhas Salomão, a Colômbia, o
Vietnã, o Sri Lanka, o Brasil e a Índia (WHO, 1996).
No Brasil, a malária desencadeou, no passado, severos surtos
epidêmicos e na década de 1990 mais de meio milhão de casos foram registrados
na região Amazônica. Esta região é composta pelos Estados do Acre, Amapá,
22
Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. O Estado de
Tocantins, apesar de pertencer à região, é atualmente considerado área nãoendêmica, mas com risco de transmissão de malária (MATO GROSSO, 2005).
O risco de transmissão da malária na região Amazônica é
elevado, com áreas apresentando incidência parasitária anual (IPA) superior a 100
casos por 1000 habitantes. Em 2004, foram confirmados mais de 400 mil casos da
doença, prevalecendo as infecções por Plasmodium vivax num total de 79% e por
falciparum em torno de 21% dos casos (BRASIL, 2006a).
Nessa região, a malária ocorre de forma heterogênea incidindo
principalmente sobre populações que vivem em condições insatisfatórias de
habitação e trabalho devido à ocupação desordenada de terras, à exploração
manual de minérios, aos projetos de assentamento/ colonização agrária e à intensa
migração da zona rural para a periferia de cidades amazônicas (SILVEIRA;
REZENDE, 2001).
Vários fatores colaboraram para a ocorrência da doença em Mato
Grosso, dentre eles destaca-se o intenso fluxo migratório na fronteira com outros
estados considerados endêmicos para a malária, o desequilíbrio ambiental
provocado pelo desmatamento, extração mineral e queimadas. Esses fatores, além
de prejudicarem o controle da doença afetam o desenvolvimento econômico de
todos os estados envolvidos (MATO GROSSO, 2005).
O relatório da situação epidemiológica de Mato Grosso, no ano de
2006, revelou que em 2005, o estado registrou 9.774 casos de malária,
correspondendo a 2% do total de casos da Amazônia Legal, com aumento de
38,7% em relação a 2004. Dos 141 municípios existentes no estado, apenas o
município de Colniza contribuiu com 80% dos casos de malária na Amazônia Legal.
Além desse município outros dois merecem destaque: Juruena e Rondolândia, por
apresentarem IPA elevados (IPA ≥ 50 /1000 mil habitantes) (BRASIL, 2006a).
Com o processo de descentralização vários serviços como os
laboratórios de diagnóstico e tratamento se tornam acessíveis à população
amazônica, facilitando o diagnóstico precoce bem como o início do tratamento da
malária.
Na busca pelo controle da malária, a Secretaria de Vigilância em
Saúde do Ministério da Saúde estabeleceu uma política permanente para a
prevenção e o controle dessa endemia. Em 2003 foi implantado o Plano Nacional
de Controle da Malária (PNCM), que estabeleceu como prática geral do controle
23
medidas para o diagnóstico e tratamento dos casos, com objetivos e métodos
ajustados às características específicas de cada localidade (MATO GROSSO,
2005).
No período de 1999 a 2004 foram realizados em média, 2.150.000
exames de gota espessa/ano para detecção de novos casos. Em 2005, esse
número subiu para 2.618.000, além disso, foram realizados aproximadamente
546.000 exames classificados como Lâmina de Verificação de Cura (LVC)
(BRASIL, 2006b).
A maioria dessas lâminas é coletada pelos agentes de endemias e
cerca de 18% delas são coletadas pelos agentes comunitários pertencentes ao
Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e Programa de Saúde da
Família (PSF), designado atualmente como estratégia de Saúde da Família, no
âmbito do processo de inserção, cada vez maior do controle da malária nas USFs
em áreas endêmicas ( BRASIL, 2006b).
O tratamento adequado e oportuno da malária previne a
ocorrência de complicações, bem como a mortalidade pela doença e elimina fontes
de infecção para os mosquitos, contribuindo para reduzir a transmissão da doença
(BRASIL, 2001).
Os altos índices da malária no Brasil e em outros países estão
relacionados ao adoecimento das pessoas ao serem picadas pelo mosquito, à falta
de controle epidemiológico, bem como à resistência do Plasmodium falciparum a
drogas como cloroquina, quinino, e mefloquina que tem dificultado a cura das
pessoas e o controle da doença (ALECRIM et al, 2000).
Entretanto, alguns fatores podem influenciar na forma como as
pessoas cuidam de sua saúde, especialmente quando são infectadas pelo
plasmódio causador da malária. Dentre os fatores que podem influenciar no
processo de cuidar estão os relacionados às reações adversas dos medicamentos,
além das condições ecológicas, geográficas, econômicas, sociais e culturais das
pessoas do município pesquisado.
Embora literaturas abordarem que provavelmente os aspectos
culturais possam influenciar no cuidado das pessoas em relação a sua saúde, há
uma lacuna em relação a trabalhos que apontam como a cultura pode influenciar no
cuidado com a malária, pois de acordo com Carreira e Alvim (2002), as práticas de
cuidado à saúde expressam as manifestações culturais de um povo.
24
Nesse sentido, a cultura identifica o modo de vida de uma
determinada população e esta, segundo Azevedo (1998), pode ser considerada
como um feixe de representações, de símbolos e de atitudes que revelam
conhecimentos, crenças, valores, normas e símbolos.
Assim, surgiram os seguintes questionamentos: de que maneira a
cultura dos indivíduos pode influenciar no cuidado da malária? Que crenças têm
orientado os indivíduos acometidos por malária no seu processo de cuidar?
Portanto, partimos do pressuposto de que a cultura, por fazer
parte do processo de formação da pessoa, influencia o seu modo de viver e de
cuidar da saúde especialmente durante o tratamento da malária.
A busca por alguns desses questionamentos nos remete a
Madelaine Leininger, enfermeira que iniciou a discussão sobre a influência da
cultura em todo o processo de viver, em particular no processo saúde-doença das
pessoas, com um olhar antropológico (CARREIRA; ALVIM, 2002).
Para compreender a forma como cada pessoa cuida de sua
saúde, Leininger construiu a Teoria do Cuidado Cultural na qual propõe formas para
prestar o cuidado de maneira coerente com o modo de vida e crenças das pessoas.
Para
isso
sugere
ações
de
preservação/manutenção
do
cuidado,
acomodação/negociação e repadronização/reestruturação cultural do cuidado.
Desse modo, é importante compreender que o processo de cuidar
não se dá de forma isolada, mas sofre influências culturais que podem ser
modificadas de acordo com cada cultura (CARREIRA; ALVIM, 2002).
Assim, a Teoria do Cuidado Cultural se apresenta como
possibilidade de compreensão do objeto de estudo proposto neste trabalho, pois
segundo Leininger (1985), todas as formas de comportamento, atitudes e modo de
vida relacionados à saúde são culturalmente apreendidas e transmitidas, trazendo
então o entendimento de cuidado cultural.
Diante do reconhecimento da importância da influência da cultura
na forma de cuidar das pessoas, esta a pesquisa tem por objetivo geral analisar a
influência das práticas populares no cuidado desenvolvido pelas pessoas
acometidas por malária no município de Juruena – MT e específicos: descrever a
rede de atendimento às pessoas portadoras de malária existentes no município;
identificar os conhecimentos que as pessoas têm sobre a malária e suas formas de
cuidado; compreender os aspectos culturais envolvidos na maneira como as
pessoas cuidam da malária.
25
CAPÍTULO 2
REFERENCIAL
TEÓRICO E CONCEITUAL
26
2 REFERENCIAL TEÓRICO E CONCEITUAL
Neste capítulo, apresentamos alguns aspectos considerados
relevantes sobre a malária, tais como as questões históricas, epidemiológicas, ciclo
de infestação da doença no vetor e no hospedeiro, bem como as estratégias
desenvolvidas pelo serviço público de saúde para o controle da doença no Brasil e
em Mato Grosso. Descrevemos ainda os principais conceitos e teoria que dão
sustentação a discussão do objeto de estudo.
2.1 A Malária: aspectos históricos e epidemiológicos
Por ser uma doença tão antiga, a malária é referenciada desde o
início da Medicina ocidental. Hipócrates realizou descrições detalhadas sobre a
mesma e vários relatos surgiram na história romana e por toda a Idade Média. Em
todos esses relatos a malária foi encontrada em regiões pantanosas, de várzeas e
alagadiças (CAMARGO, 1995).
O termo malária vem do italiano, malaria, que significa ar ruim ou
nocivo, já paludismo vem do latim, palus, que significa pântano (CAMARGO, 1995).
É uma doença parasitária cujo controle tem sido buscado há séculos meio de ações
preventivas em várias partes do mundo. Ela pode ser conhecida como
impaludismo, febre palustre, maleita e sezão (BRASIL, 2005a).
O conhecimento técnico sobre o controle da malária vem se
acumulando, desde a Antiguidade, com a descoberta do agente etiológico pelo
médico francês Charles Alphonse Laveran, em 1880. Posteriormente o médico
britânico Ronald Ross descreveu o mecanismo natural de transmissão da malária
27
identificando o mosquito do gênero Anopheles como vetor da doença ao encontrar
no interior do mosquito formas do parasito, após se alimentar de sangue de um
portador de malária (BRASIL, 2004).
O primeiro medicamento eficaz contra a malária foi o extrato da
casca da quina. Segundo Camargo (1995), os chineses, desde o século II, já
usavam com sucesso infusões de uma planta chamada Artemísia para a cura da
malária, mas a droga só teve seu uso farmacológico no ocidente na década de
1980.
O uso da quina como febrículo originou-se no Peru, em meados
de 1600, chegando à Europa através de mercadores e jesuítas, porém o seu
princípio ativo – quinino variava de acordo com o corte da casca do tronco da
Cinchona (planta nativa dos Andes do Equador, Peru e Bolívia), em função de suas
inúmeras variedades. No início o quinino foi utilizado para todo o tipo de febre, mas
só era eficaz na febre malárica (CAMARGO, 1995).
O desenvolvimento de antimaláricos sintéticos, como pamaquina
(1924), mepacrina (1930) e cloroquina (1934) e do inseticida dicloro-difeniltricloroetano (D.D.T.) foram importantes para a redução de casos da doença. Como
conseqüência, por volta de 1970, os programas de erradicação havia livrado do
risco da doença cerca de 53% da população residente em áreas suscetíveis ao
aparecimento da malária. Contudo, na década de 1980, voltou a ocorrer um
aumento
progressivo
no
número
de
casos
na
maioria
dos
países
(portalsaude.gov.br/saúde).
A malária humana é uma doença parasitária que tem como
agentes etiológicos protozoários do gênero Plasmodium e é transmitida ao homem
pela picada de um mosquito do gênero Anopheles. Na América Latina, a maior
incidência acontece na Amazônia Brasileira, com registros de cerca de 500 mil
casos/ano. No Brasil, as espécies que causam a doença são o Plasmodium vivax e
o Plasmodium falciparum e, eventualmente, o Plasmodium malarie. É transmitida
por vetores, mosquitos do gênero Anopheles, destacando-se o Anopheles Darlingi,
que tem como criadouros preferenciais água limpa, de baixo fluxo, quente e
sombreada. Aproximadamente 99,5% dos casos de malária no Brasil ocorrem na
Amazônia Legal, se destacando os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato
Grosso, Maranhão, Pará, Rondônia e Roraima (BRASIL, 2004).
28
2.2 Ciclo de infestação da malária no vetor e no hospedeiro
A infecção se inicia quando esporozoítos infectantes são
inoculados no homem pelo inseto vetor. Estas formas desaparecem da circulação
sanguínea do indivíduo suscetível dentro de 30 a 60 minutos para alcançarem os
hepatócitos, onde evoluem. Após invadirem o hepatócito, os esporozoítos se
diferenciam em trofozoítos pré-eritrocíticos. Estes se multiplicarão por reprodução
assexuada do tipo esquizogônica, dando origem a milhares de merozoítos que
invadirão os eritrócitos (BRASIL, 2001).
O desenvolvimento dos merozoítos nas células do fígado requer
aproximadamente uma semana para o Plasmódium faciparum e vivax, e cerca de
duas semanas para o Plasmódium malarie. Nas infecções por P. vivax, o mosquito
vetor inocula populações geneticamente distintas de esporozoítos: algumas se
desenvolvem rapidamente, enquanto outras ficam em estado de latência no
hepatócito, sendo denominadas hipnozoítos. Estes, se não tratados, são
responsáveis pelas recaídas da doença, que ocorrem após períodos variáveis de
incubação, em geral dentro de seis meses para a maioria de cepas Plasmodium
vivax (BRASIL, 2001).
O ciclo eritrocítico começa quando os merozoítos teciduais
invadem os eritrócitos. O desenvolvimento intra-eritrocítico do parasito se dá por
esquizogonia, com conseqüente formação de merozoítos que se multiplicam por
divisão binária até serem liberados na circulação após ruptura do eritrócito, para em
seguida, invadirem novos eritrócitos. Depois de algumas gerações de merozoítos
sanguíneos,
algumas
formas
se
diferenciam
em estágios sexuados,
os
gametócitos, que seguirão o seu desenvolvimento no mosquito vetor, dando origem
aos esporozoítos (BRASIL, 2001).
O ciclo sanguíneo se repete sucessivas vezes, a cada 48 horas
nas infecções por P. falciparum e P. vivax e a cada 72 horas no P. malarie. O
período de incubação da malária varia de acordo com a espécie do plasmódio,
sendo de 8 a 12 dias para P. falciparum, 13 a 17 dias para P. vivax e 28-30 dias
para P. malarie (BRASIL, 2001).
29
A figura abaixo apresenta o ciclo de infestação da malária no vetor
e hospedeiro.
Figura 1 -. Ciclo de infestação da malária no vetor e hospedeiro
Disponível em www.dpd.cdc.gov/dpdx> Acesso em 12 de dezembro de 2006.
A fase sintomática inicial da doença caracteriza-se por mal-estar,
cefaléia, cansaço e mialgia, geralmente acompanhada da clássica febre da malária.
O ataque paroxístico inicia-se com calafrios que duram de 15 minutos a uma hora,
seguido por uma fase febril, com temperatura corpórea atingindo 41°C ou mais.
Após o período de duas a seis horas ocorre redução da febre, a pessoa apresenta
sudorese profusa e fraqueza intensa (BRASIL, 2001).
Desta forma, a malária caracteriza-se por acessos intermitentes
de febre, calafrios, cefaléia e sudorese. A febre geralmente vem acompanhada por
sintomas inespecíficos caracterizados por mal-estar, cansaço e mialgia. A
30
temperatura corpórea chega a atingir até 41°C, após um período de duas a seis
horas, a febre começa a diminuir e a pessoa apresenta sudorese e fraqueza
intensa. Em alguns quadros clínicos pode evoluir para formas clínicas de malária
grave e complicada acompanhada de forte cefaléia, hipertermia, vômitos,
sonolência e convulsões (malária cerebral), insuficiência renal aguda, edema
pulmonar agudo, hipoglicemia, disfunção hepática, hemoglobinúria (hemólise
intravascular aguda maciça) e choque, que às vezes levam a óbito cerca de 10%
dos casos (BRASIL, 2006c)
Em crianças, a sintomatologia clínica costuma ser inespecífica,
podendo não apresentar febre, sintoma mais importante da malária. Manifestações
como astenia, anorexia, tosse, náuseas, vômitos, diarréia, dor abdominal, tonteiras,
artralgia e mialgia aparecem como as primeiras queixas da doença. O fígado em
algumas situações aumenta de tamanho e deve ser palpado ao final da primeira
semana, enquanto o baço é palpado com maior freqüência ao final da segunda
semana (BRASIL, 2006c).
Outro sinal clínico observado é a colúria, que pode ser confundida
com o diagnóstico de hepatite, mas essa dúvida é facilmente esclarecida através da
dosagem de aminotransferases, que estarão mais elevadas na hepatite do que na
malária (BRASIL, 2005a).
Em relação à transmissão, a malária ocorre por meio da picada da
fêmea do mosquito Anopheles infectada pelo plasmódio. O vetor tem hábitos
alimentares nos horários do amanhecer e do entardecer e em algumas regiões da
Amazônia, apresenta-se com hábitos noturnos, picando durante todas as horas da
noite. Não há transmissão direta da doença de pessoa a pessoa. Raramente
ocorrem
transmissões
através
de
transfusão
de
sangue
infectado,
uso
compartilhado de seringas e, mais raro ainda, por via congênita (BRASIL, 2006c).
O diagnóstico preciso da doença só é possível pela demonstração
do parasito ou de antígenos presentes no sangue periférico da pessoa, através dos
seguintes métodos: Gota espessa – é o método oficialmente adotado no Brasil
para o diagnóstico da malária. Mesmo após o avanço de técnicas diagnósticas, este
exame é eficaz por ser um método simples, de baixo custo e fácil realização. A
técnica baseia-se na visualização do parasito através de microscopia ótica,
permitindo a diferenciação específica dos parasitos a partir da análise de sua
morfologia, e pelos estágios de desenvolvimento do parasito encontrados no
sangue periférico; Esfregaço delgado - possui baixa sensibilidade (estima-se que
31
a gota espessa é cerca de 30 vezes mais eficiente na detecção da malária),
entretanto, é o único método que permite com facilidade e segurança obter a
diferenciação específica dos parasitos a partir das alterações provocadas no
eritrócito infectado e, por último, os Testes rápidos para a detecção de
componentes antigênicos de plasmódio (testes imunocromatográficos), novos
métodos de diagnóstico rápido de malária. Realizados em fitas de nitrocelulose
contendo anticorpo monoclonal contra antígenos específicos do parasito,
apresentam sensibilidade superior a 95% quando comparados à gota espessa, com
parasitemia superior a 100 parasitos/μL. Entretanto, os testes hoje disponíveis
discriminam
especificamente
o
P.
falciparum
e
as
demais
espécies
simultaneamente, não sendo capazes de diagnosticar a malária mista. Por sua
praticidade e facilidade de realização, são úteis para a triagem e mesmo para a
confirmação diagnóstica, principalmente em situações onde o processamento do
exame da gota espessa é complicado, como áreas longínquas e de difícil acesso
aos serviços de saúde e áreas de baixa prevalência da doença (BRASIL, 2005a).
Existem ainda outros métodos utilizados para o diagnóstico de
malária como o Imunofluorescência Indireta, o Elisa e a Reação em Cadeia da
Polimerase (PCR), de grande importância para os laboratórios de referência para
malária (BRASIL, 2005a).
As medidas de prevenção e controle auxiliam no diagnóstico e
tratamento imediato e adequado da doença. Essas medidas devem ser adaptadas
à realidade de cada região, pois cada local possui suas particularidades. Tais
medidas garantem a redução do aparecimento dos casos graves, prevenção de
óbitos por malária, redução da fonte de infecção e diminuição da transmissão,
mantendo a doença em níveis epidemiológicos aceitáveis.
Dentre as medidas de proteção individual deve-se evitar o contato
do mosquito com a pele do ser humano. Como o anofelino possui hábitos de
alimentação noturnos, recomenda-se evitar aproximação de áreas de risco logo no
amanhecer e entardecer, usar repelentes nas áreas expostas do corpo, telar portas
e janelas e dormir com mosquiteiros. Medicamentos ou alimentos que promovam
sudorese com odor forte, tais como o alho, também têm sido utilizados para repelir
o mosquito (BRASIL, 2001; 2006c).
Como medidas coletivas, podemos citar: medidas de combate ao
vetor, com borrifação das paredes dos domicílios com inseticidas de ação residual
ou nebulização espacial com inseticidas do peridomicílio; medidas de combate às
32
larvas, mas essa prática tem sido pouco utilizada devido à extensão das bacias
hidrográficas e das mesmas serem contaminadas com larvicidas químicos; medidas
de saneamento básico para evitar a formação de criadouros de mosquito, que
surgem principalmente em locais onde ocorreram modificações ambientais
provocadas pelo garimpo (BRASIL, 2001; 2006c).
2.3 Políticas de saúde para o controle da malária no Brasil e em Mato
Grosso
As primeiras ações de combate à malária no Brasil foram
realizadas pela Fundação Rockefeller a partir de 1922, na região da baixada
Fluminense, no Estado do Rio de Janeiro. Nesse período, a investigação e o
controle da doença no país foram objetos de interesse apenas eventual ou
episódico (SILVEIRA; REZENDE, 2001).
Em 1923, o Departamento Nacional de Saúde Pública estabelecia
medidas profiláticas e de controle da doença por meio do diagnóstico
parasitoscópio de indivíduos suspeitos, a determinação do índice endêmico, o uso
de medidas antilarváricas, a telagem das casas, a distribuição de quinina às
pessoas sadias, o tratamento dos doentes e a realização de inquérito
epidemiológico relativo aos casos (BRASIL, 2006b).
Em 1930, o Anopheles gambiae procedente da África infestou a
cidade de Natal no Rio Grande do Norte, provocando surtos de malária. Esse fato
foi decisivo para a criação do Serviço de Malária do Nordeste (SMN), o qual tinha
como meta a erradicação da doença por meio de uma rígida disciplina, com ações
de combate antilarvárico e contra o vetor, além do tratamento da doença
(SILVEIRA; REZENDE, 2001).
No início de 1940, o controle da malária passou a ter alcance
nacional, com instituições atuando em diversas regiões tais como: o Serviço
Especial de Saúde Pública (SESP) na região Amazônica, o Serviço Estadual de
33
Malária de São Paulo e o Serviço Nacional de Malária (SNM) que cobria o restante
do país. A partir de 1950 o SNM passou a atuar também na região Amazônica.
Nesse período, a malária era altamente prevalente e dispersa pelo país, com mais
da metade dos casos registrados na região extra-Amazônica (SILVEIRA;
REZENDE, 2001).
Em 1956, foi criada a Campanha de Erradicação da Malária
(CEM) em substituição ao SNM, a princípio fazendo parte do Departamento
Nacional de Endemias Rurais e, a partir de 1965, se constituindo em agência
autônoma. Uma instituição dedicada exclusivamente à erradicação da doença em
atendimento às recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS)
(SILVEIRA; REZENDE, 2001).
Durante o período de atuação da CEM os dados epidemiológicos
no Brasil mostraram aumento no número de exames realizados para o diagnóstico
da malária e ao mesmo tempo diminuição do número de exames positivos
(LOIOLA; SILVA; TAUIL, 2002).
Porém a CEM apresentava seus limites não apenas na
inadequação a determinados padrões ou condições de transmissão, mas também
por desenvolver ações sem atender as particularidades de cada situação
(SILVEIRA; REZENDE, 2001).
Reconhecidos
esses
limites,
a
CEM
foi
incorporada
à
Superintendência de Campanha de Saúde Pública (SUCAM), com o objetivo de
elaborar estratégias que pudessem se adequar a cada realidade, bem como ajustar
a disponibilidade de recursos humanos e financeiros para dar maior cobertura e
efetividade nas ações (LOIOLA; SILVA; TAUIL, 2002).
Esta superintendência incorporou, ainda, o setor de Erradicação
da Varíola e o Departamento Nacional de Endemias Rurais, no entanto, suas ações
não se integravam ao sistema de saúde vigente da época (SILVEIRA; REZENDE,
2001).
Na busca por novos caminhos para o controle e tratamento da
malária é desenvolvido em 1989 um projeto de caráter especial - “Controle da
Malária na Bacia Amazônica” (PCMAM) com financiamento do Banco Internacional
de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD). Este teve por objetivos: reduzir a
prevalência da malária, com ações capazes de promover mudanças nas regiões
endêmicas mediante a incorporação de novas tecnologias e controle da malária em
comunidades indígenas (BRASIL, 2004).
34
De acordo com Loiola, Silva e Tauil (2002), o PCMAM colaborou
para a estruturação dos serviços de saúde locais, principalmente em relação ao
diagnóstico e tratamento da doença, bem como na descentralização do controle
das endemias. Esses autores ainda descrevem que em 1991 a SUCAM que era
responsável pela gestão e execução do PCMAM foi incorporada à Fundação de
Serviços Especiais de Saúde Pública (FSESP) juntamente com a Secretaria
Nacional de Programas Especiais e Secretaria Nacional de Ações Básicas de
Saúde, para se transformar em Fundação Nacional de Saúde (FUNASA).
Em 1992, ocorreu a Conferência Mundial Ministerial de Malária em
Amsterdã, que se tornou um marco ao propor ações para o controle e erradicação
da doença como: interrupção da transmissão em áreas com baixa incidência,
sobretudo em centros urbanos, ações para impedir que a malária fosse
reintroduzida em áreas livres de transmissão e interiorização do acesso aos
antimaláricos (WHO, 1996).
A partir desta Conferência as ações deixam de ser pautadas na
erradicação mundial da malária (controle do vetor) e voltam para o controle da
doença, devendo medidas preventivas ser adequadas às diferentes situações
epidemiológicas. Assim deixa de existir uma receita única para todos os países e
para todas as situações de transmissão. Nessa proposta, a malária é entendida
como doença resultante de múltiplos fatores determinantes, que vão além dos de
natureza biológica envolvendo também fatores ecológicos, econômicos, sociais e
culturais (SILVEIRA; REZENDE, 2001).
Desta forma o objetivo das ações de combate à malária passa a
ser o homem e não mais o vetor, prevenindo, assim, novos casos e óbitos
causados pela doença por meio do diagnóstico precoce e do tratamento imediato
da malária (BRASIL, 2006b).
Surge então o Programa de Controle Integrado da Malária (PCIM)
que teve por objetivo realizar o diagnóstico e o tratamento dos casos de malária de
forma rápida, detectar de forma precoce as endemias e aplicar medidas de
controle, fortalecer a vigilância epidemiológica, detectar e prevenir a doença em
áreas onde a transmissão da malária já fora interrompida e reavaliar
periodicamente a situação da malária no país. Porém, esse programa nunca foi
plenamente efetivado nos estados brasileiros (LOIOLA; SILVA; TAUIL, 2002).
Ao final de 1996 e início de 1997, a FUNASA elaborou um novo
plano para a intensificação das ações de controle da malária nos municípios de alto
35
risco na Amazônia Legal, entretanto, o que o diferenciava dos demais era a
determinação de firmar convênios com os municípios por meio de instrumentos
legais, transferindo recursos diretamente a eles (LOIOLA; SILVA; TAUIL, 2002).
As políticas de saúde pública no Brasil, além de diminuir a
morbimortalidade por malária visavam à redução das perdas sociais e econômicas
provocadas pela doença, mediante o fortalecimento dos níveis regional e local de
atenção à saúde. Para tanto, recomendava o aproveitamento do pessoal técnico
existente na rede de saúde – suficientemente treinado – e as instalações
disponíveis nos serviços de saúde locais (públicos e privados), de modo que cada
unidade fosse um ponto de vigilância e de atendimento à malária. Entretanto, o
controle da malária na região amazônica continuava sendo um desafio, em face da
ocupação desordenada ocorrida na região, desde meados da década de 1990
(BRASIL, 2005b).
Em outubro de 1998, a OMS lança uma campanha mundial
chamada de “Retroceder a Malária” (RBM) cujo objetivo era reduzir pela metade a
incidência da malária até o ano de 2010, buscando maior comprometimento dos
serviços de saúde, bem como dos setores governamentais e privados,
organizações não-governamentais e das próprias comunidades afetadas pela
doença (WHO,1996).
No ano de 2000 foi instituído o Plano de Intensificação das Ações
de Controle da Malária na Região Amazônica (PIACM). Este plano foi desenvolvido
prioritariamente em 254 municípios da Amazônia Legal, com o objetivo de reduzir
os casos de malária em 50% até o ano de 2002. Sua estratégia centrava-se na
mobilização política, estruturação dos sistemas locais de saúde, diagnóstico e
tratamento precoce, educação em saúde e mobilização social, capacitação de
recursos humanos e ações interinstitucionais, fortalecendo desta forma o processo
de descentralização e garantindo a sua sustentabilidade (BRASIL, 2004, 2006b).
Essas ações conseguiram reduzir em 38,9% o número de casos
de malária e em 41,1% o IPA até o final de 2001. Também foi observada uma
redução de 69,2% no número de internações e de 36,5% no número de óbitos por
malária no Brasil (BRASIL, 2004).
Porém, como estes resultados não foram homogêneos e o
objetivo governamental era manter os índices de malária em níveis aceitáveis
(IPA<10/1000 hab), bem como consolidar o processo de descentralização das
ações de controle da malária, foi implantado em 2003 o Programa Nacional de
36
Controle da Malária (PNCM), com a finalidade de fornecer diretrizes para o controle
da doença no âmbito federal, estadual e municipal, em parceria com a sociedade
organizada (BRASIL, 2004).
Essas diretrizes deveriam contemplar o apoio à estruturação dos
sistemas locais de saúde, diagnóstico e tratamento; o fortalecimento da vigilância
da malária; a capacitação de recursos humanos; a educação em saúde; a
comunicação e a mobilização social; o controle seletivo de vetores; a pesquisa; a
monitorização do PNCM e sustentabilidade política (BRASIL, 2004). As atribuições
e competências para a implementação do PNCM estão alicerçadas nas Portarias
GM Nº. 1.399 de 15 de dezembro de 1999 (BRASIL, 1999) e Resolução nº. 286 de
30 de agosto de 2001.
Destacamos aqui as atribuições de competência municipal que
estão definidas no PNCM (BRASIL, 2004) por exercer influência direta nos índices
do IPA de seus municípios. Sendo assim, compete aos gestores municipais:
•
A coordenação municipal do Programa de Controle da Malária;
•
Notificação de casos de malária;
•
Investigação Epidemiológica de casos notificados, surtos e óbitos por
malária;
•
Diagnóstico e início do tratamento de todos os pacientes com exame
positivo para malária, no prazo máximo de 24 horas, a partir da data da
coleta do exame;
•
Execução de busca ativa de casos de malária nas unidades de saúde,
laboratórios e domicílios;
•
Execução de ações de controle químico e biológico do mosquito vetor da
malária e eliminação de criadouros;
•
Envio regular dos dados da malária à Secretaria de Estado de Saúde,
dentro dos prazos estabelecidos pelo gestor estadual;
•
Análise e retroalimentação dos dados às unidades notificantes;
•
Divulgação de informações e análise epidemiológica da malária no
município;
•
Gestão dos estoques municipais de medicamentos, inseticidas e meios de
diagnósticos (kit diagnóstico) para o controle da malária;
•
Coordenação e execução das atividades de educação em saúde e
mobilização social de abrangência municipal;
37
•
Capacitação de recursos humanos para execução das atividades de
controle da malária
•
Estruturação dos núcleos de epidemiologia municipal, agregando ações de
vigilância de casos, entomológica, laboratorial e as operações de campo;
•
Apresentação quadrimestral dos resultados do programa ao Conselho
Municipal de Saúde, Câmaras de Vereadores e Secretaria de Estado de
Saúde.
Em 2001 é criada a Rede Amazônica de Vigilância da Resistência
às Drogas Antimaláricas - RAVREDA, com o objetivo de monitorar a resistência das
drogas antimaláricas em toda região amazônica, utilizando protocolos padronizados
para avaliação da suscetibilidade dos parasitos aos medicamentos. Fazem parte da
RAVREDA os seguintes países: Bolívia, Brasil, Equador, Colômbia, Guiana, Peru,
Suriname e Venezuela. Internacionalmente, o projeto é coordenado pela
Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e no Brasil, pela Secretaria de
Vigilância de Saúde do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004, 2006b).
A RAVREDA instalou e mantém localidades sentinela em sete dos
nove estados da Amazônia Legal, onde o tratamento das pessoas é monitorado
para avaliação da eficiência dos medicamentos antimaláricos. Nesta fase do
projeto, estão sendo realizados estudos de resposta terapêutica dos esquemas de
drogas de primeira escolha preconizados pelo MS, tanto para a malária vivax
quanto para a falciparum. A RAVREDA ainda desenvolve estudos sobre a adesão
de pacientes ao tratamento da malária vivax e falciparum, controle da qualidade dos
medicamentos, sensibilidade e estabilidade de testes de diagnósticos rápidos,
estudos in vitro de avaliação da suscetibilidade aos antimaláricos, diagnóstico da
situação de malária em gestantes nos estados do Amapá, Rondônia, Pará e
Amazonas e monitoramento da suscetibilidade dos anofelinos em todos os estados
participantes da Rede (BRASIL, 2006b).
A figura abaixo apresenta os estados e localidades sentinela onde
a RAVREDA realiza o monitoramento de resistência às drogas antimaláricas.
38
Figura 2 - Localidades sentinela do projeto RAVREDA em funcionamento em 2005.
Boa Vista
Careiro
Macapá
Belém
São Luís
Manaus
Coari
Augusto
Tucuruí Correa
Porto Velho
Buritis
Cuiabá
Fonte: Relatório RAVREDA 2005: Vigilância da resistência aos antimaláricos
Em 2003, a Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da
Saúde implantou o Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Malária
(SIVEP) na região amazônica, cujo objetivo foi melhorar o fluxo, a qualidade e a
troca de informações entre os municípios, estados e o governo federal (BRASIL,
2004).
A série histórica 1980-2005 de diagnósticos confirmados de
malária no Brasil revela que na década de 1980 e de 1990 a incidência de casos de
malária aumentou significativamente, e apenas no final da década de 1990 e início
do século vinte um, esses dados epidemiológicos começaram a diminuir
(www.saude.gov.br).
Segundo Atanaka-Santos et al (2006), o risco de transmissão da
malária nos estados que compõem a Amazônia Legal mostrou-se variado a
39
exemplo do Estado de Roraima que apresentou IPA (razão do número de exames
positivos de malária pela população) de 110,6 casos por 1000 habitantes e Mato
Grosso de 4,7 casos por 1000 habitantes, em 2000.
Estes autores ainda relatam que o Estado de Mato Grosso
registrou 15.287 casos, correspondendo ao IPA de 16,3 casos/mil/habitantes em
1980. Este índice apresentou crescimento constante atingindo em 1992, 95,2
casos/mil/habitantes. Já em 2002 com o declínio da incidência dos casos, o IPA
atingiu 2,7 casos/mil/habitantes.
Em Mato Grosso, a malária ocorre com maior incidência nas
regiões Norte e Nordeste, onde as condições locais favorecem o surgimento do
vetor, ou seja, do mosquito do gênero Anopheles (também conhecido por carapana,
muriçoca, mosquito-prego, sovela) por se tratar de regiões que possuem grande
extensão de mata com fluxo migratório intenso, grande concentração populacional
por assentamento, e de atividade econômica como garimpo e extração de madeira
(www.saude.mt.gov.br).
A explosão de casos de malária no norte mato-grossense está
associada à intensificação das atividades garimpeiras, que atraíram migrantes,
inicialmente de nordestinos e nortistas e mais tarde de sulistas, que recorreram a
esta atividade como complementar à agricultura. A incipiente estrutura de serviços
de saúde nas áreas de colonização recente, a dificuldade de acesso aos serviços
de saúde existentes e o difícil acesso dos profissionais de saúde à localidade
contribuíram para o aumento da mortalidade por malária no estado (ATANAKASANTOS et al, 2006).
No período de janeiro a dezembro de 2005, Mato Grosso registrou
um índice parasitário anual de 4,8/1000 habitantes, um aumento de 60% se
comparado ao ano de 2004, cujo índice foi de 3,0/1000 habitantes. Observa-se
também em 2005, um aumento considerável do IPA nos meses de maio a julho,
que, juntos, foram os responsáveis por 1,4% do IPA de 2005. Frente a esses
dados, profissionais da Secretaria de Saúde do estado elaboraram o “Projeto Força
Tarefa na Região Noroeste do Estado” na tentativa de controlar a malária nos
municípios de Aripuanã, Colniza, Juína e Juruena. O projeto foi financiado pelo
Ministério da Saúde, Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso e Secretaria
Municipal de Saúde e teve por objetivo implementar ações emergenciais de
controle da malária mediante a capacitação e estruturação dos serviços locais de
saúde para o enfrentamento da atual epidemia. Dentre as ações destacam-se:
40
delimitar áreas de assentamento, garimpos madeireiras e mineradoras; ampliar a
estrutura dos municípios para diagnóstico, tratamento da malária e controle do
vetor; capacitar os profissionais de saúde para diagnóstico/tratamento da malária e
controle vetorial; instalar serviços de diagnóstico e tratamento mais próximos dos
locais de infecção; implantar equipe itinerante para as regiões de maior risco de
transmissão; realizar busca ativa de casos estabelecendo parcerias com o PACS e
PFS e viabilizar estudos entomológicos, observando densidade, sazonalidade,
identificação de vetores, com vistas a orientar as ações de controle seletivo de
anofelinos. Essas ações contribuíram para a redução significativa no IPA no Estado
(MATO GROSSO, 2005)
Atualmente,
Mato
Grosso
dispõe
de
um
laboratório
de
Entomologia, localizado na capital, Cuiabá, mais especificamente no Hospital
Universitário Júlio Müller (HUJM). Esse laboratório é tido como referência nas
atividades de pesquisa entomológica para os vetores da malária e treinamentos em
vigilância entomológica voltados à capacitação de técnicos dos dezesseis
Escritórios Regionais de Saúde e municípios do estado (MATO GROSSO, 2005).
2.4 Os Conceitos de Cultura, Cuidado e a Teoria do Cuidado Cultural de
Leininger
A Cultura
Desde o século XIX há uma preocupação em estudar as culturas
dos seres humanos e esses estudos percorreram um longo caminho até adquirir o
sentido de costumes, modos de vida, práticas, crenças1 e valores2 de um povo
(SANTOS, 1983).
1
Crença – se refere à aceitação de uma proposição como verdadeira, seja ela comprovada
cientificamente ou não (AZEVEDO, 1998, p.17).
2
Valores – são objetos e situações consideradas boas, desejáveis, apropriadas, que
incentivam e orientam o comportamento humano (AZEVEDO, 1998, p.17).
41
O conceito de cultura pode ser apreendido a partir de diferentes
origens, germânica, francesa e americana. O termo germânico kultur era utilizado
para simbolizar todos os aspectos culturais de uma comunidade, enquanto a
palavra francesa civilization referia-se principalmente às realizações materiais de
um povo. Estes termos foram sintetizados por Edward Tylor no vocábulo inglês
culture que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer
outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma
sociedade (LARAIA, 1996).
No dicionário da Língua Portuguesa, Ferreira (1986, p.508) define
cultura como sendo padrões de comportamento das crenças, das instituições e
doutros valores espirituais e materiais transmitidos coletivamente, característico de
uma sociedade.
Tylor, em 1971, definiu cultura como sendo o comportamento
aprendido e que não depende de transmissão genética. Sendo assim, o homem é o
resultado do meio cultural em que foi socializado; é herdeiro de um processo
acumulativo que reflete no conhecimento e na experiência adquirida pelas
numerosas gerações que o antecederam (LARAIA, 1996).
Para Santos (1983), a cultura diz respeito à humanidade como um
todo, a cada um dos povos, nações, sociedades e grupos humanos. Cada realidade
cultural tem sua lógica interna que devemos nos preocupar em conhecer para dar
sentidos as suas práticas, costumes, concepções e transformações pelas quais
estas passam. O autor ainda afirma que cada cultura é o resultado de uma história
particular, porém pode ter características bem diferentes. Está associada aos
estudos, formação escolar, manifestações artísticas, lendas e crenças de um
determinado povo.
Helman (1994) também compartilha da idéia de que a cultura é
um conjunto de princípios herdados pelos indivíduos, enquanto membros de uma
sociedade em particular. Tais princípios mostram a eles a forma de ver o mundo, de
vivenciá-lo emocionalmente e de se comportar dentro de uma determinada
sociedade em relação às outras pessoas, a forças sobrenaturais e ao meio
ambiente.
Os antropólogos consideram a cultura como comportamento
aprendido, característico dos membros de uma sociedade, uma vez que o
comportamento instintivo é inerente aos animais em geral. Assim, os instintos, os
reflexos inatos devem ser excluídos. A cultura resulta então da invenção social, é
42
aprendida e transmitida por meio da aprendizagem e da comunicação (AZEVEDO,
1998, p.17)
Assim, cada pessoa age e se comporta segundo valores e
crenças compartilhadas em seu grupo, mas também segundo fatores individuais
(idade, gênero, altura, aparência, personalidade, inteligência e experiência), fatores
educativos (formais e informais, incluindo educação em uma subcultura religiosa,
profissional ou étnica) e fatores socioeconômicos (classe social).
Deste modo, a cultura é adquirida pelo homem a partir do mundo
que o rodeia, produto das pessoas e da sociedade e envolve hábitos alimentares,
modo de vestir, forma de saudar o semelhante, dentre outros (ULLMANN, 1991).
Para Azevedo (1998) qualquer sistema cultural e está num
contínuo processo de modificação, que pode ocorrer de duas maneiras: interna e
externa. A interna é resultante da dinâmica do próprio sistema cultura, esta pode
ocorrer de forma lenta, sendo alterada por eventos históricos tais como catástrofes
ou inovações tecnológicas; e a externa que é resultante do contato de um sistema
cultural com o outro ocorre de forma mais rápida, onde a troca de padrões culturais
se dá sem grandes traumas.
Já para Monticelli (1994), a cultura humana torna o indivíduo
capaz de transformar o mundo e, na medida em que transforma o mundo
transforma também a si mesmo, e este processo é dinâmico, ou seja, o homem cria
sua própria cultura e a modifica.
Apoiada nos conhecimentos de Geertz, Leininger e Langdon,
Monticeli (1997) apresenta as seguintes características da cultura: teia de
significados, que orienta os homens e dá significado às suas ações; dinâmica,
pois os indivíduos estão sempre reorganizando suas representações; pública (há
um consenso em relação aos significados), compartilhada (um indivíduo sozinho
não inventa uma cultura, pois é através das interações dos indivíduos
desempenhando e reinventando papéis sociais que a história se desenrola),
apreendida (independe da questão biológica), lógica (organizada), não é apenas
um produto, pois é importante saber como ela é produzida (relação /ter ação e
representação).
Além de apontar alguns elementos da cultura, a autora faz uma
aproximação deste conceito com o trabalho desenvolvido pela enfermagem, uma
vez ser está uma ciência a serviço do ser humano, sendo assim, se faz necessário
compreender que a cultura faz parte da vida individual e coletiva das pessoas.
43
Segundo Laraia (1996, p. 70) entender a dinâmica da cultura é um
elemento importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar
comportamentos pré-conceituosos, para a compreensão das diferenças entre povos
de culturas diferentes os quais podem ser facilmente identificados por uma série de
características, tais como: modo de agir, vestir, caminhar, comer, sem mencionar as
diferenças lingüísticas, fato mais imediato de observação empírica.
Sendo assim, neste estudo, o conceito de cultura se refere aos
conhecimentos repassados de geração a geração, os quais determinam a forma de
olhar o mundo, de se relacionar com o outro, de cuidar da sua saúde, do seu corpo;
um processo de aprendizagem que define o seu comportamento e sua capacidade
de inovações e invenções.
O Cuidado
O cuidado vem se constituindo no foco e expressão essencial da
Enfermagem ao longo da história. Entretanto, somente nas últimas duas décadas
têm emergido estudos sobre o cuidado e suas conceptualizações (Silva, 1997).
Segundo Maia (1998), a vinculação histórica da enfermagem com
o tema cuidado se dá há muito tempo. Porém, foi na década de 1990 que
estudiosos, pesquisadoras e teóricas da enfermagem, procuraram clarificar,
desenvolver e compreender o significado deste conceito.
O termo cuidado deriva-se do inglês carion e das palavras góticas
Kara ou Karon. Como substantivo, cuidado deriva-se de Kara, que significa aflição,
pesar ou tristeza. Como verbo, cuidar (de carion) significa ter preocupação por
sentir uma inclinação ou preferência, ou ainda, respeitar/considerar no sentido de
ligação de afeto, amor, carinho e simpatia (Gaut, 1983).
Na língua portuguesa, Ferreira (1986) define cuidar (do latim
cogitare) como imaginar, pensar, aplicar atenção, refletir, ter cuidado, julgar-se,
prevenir-se, acautelar-se, ter cuidado consigo mesmo e com sua saúde, a sua
aparência ou apresentação e, cuidado como precaução, cautela, diligência, zelo,
44
responsabilidade, pessoa ou coisa que é objeto de desvelos, pensado, imaginado,
meditado, previsto, calculado, suposto.
De acordo com Azevedo (2001) o cuidado tem sido estudado nas
perspectivas filosófica, psicossocial, fenomenológica e antropológica. Na filosofia o
cuidado é tido como um valor fundamental ou ideal moral, o qual tem o
compromisso de manter a dignidade e integridade do indivíduo. Dentro da
perspectiva psicossocial, a essência do cuidado reside na criação de vínculo
afetivo, empatia emocional do enfermeiro com o cliente. A fenomenologia por sua
vez, compreende o cuidado como algo que não pode ser tocado, mas sim
vivenciado pelas pessoas e na antropologia o cuidado é culturalmente apreendido,
pois a maneira como fomos cuidados ou expressamos cuidados refletirá na forma
de cuidar.
Desta forma, o cuidado revela-se como um fenômeno complexo
que não pode ser desvinculado do processo de cuidar da enfermagem, por se
configurar como uma teia complexa de ações e relações.
Nesse sentido Leininger prestou uma grande contribuição para o
desenvolvimento ontológico e epistemológico do cuidado de enfermagem ao
desenvolver as idéias sobre a enfermagem transcultural e posteriormente, a Teoria
da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural. Para a autora o cuidado
cultural são todas as formas de comportamento, atitudes e modos de vida que
estão relacionados à saúde e ao bem estar das pessoas (LEININGER, 1985).
Deste modo, as práticas de cuidado à saúde são manifestações
culturais de um povo, principalmente as não convencionais, pois foram
tradicionalmente repassadas pelas pessoas de uma determinada sociedade, por
isso existem diferenças entre o cuidado popular e o cuidado prestado pelos
profissionais de saúde (CARREIRA; ALVIM, 2002).
Como a cultura está relacionada à maneira como as pessoas
cuidam de sua saúde, Kleinman (1988) em seu modelo explicativo sobre a saúde e
a doença, apresenta três sistemas de cuidado à saúde: O sistema familiar ou
informal, o sistema popular e o profissional. O sistema familiar é o campo leigo
onde as doenças são reconhecidas, definidas e tratadas; o sistema popular que é
formado por curandeiros e populares (pessoas da comunidade) que compartilham
os valores culturais básicos, as visões de mundo da comunidade em que vivem e
as crenças sobre a origem, significado e tratamento das doenças e o sistema
45
profissional, que é a medicina científica, composta por profissionais de saúde
(MARUYAMA, 2004).
Teoria do Cuidado Cultural de Leininger
Desde a década de 1950, Leininger tem enfatizado a importância
de se estudar e escrever sobre o cuidar-cuidado nas diferentes culturas, como
também a necessidade de aprofundar por meio de pesquisas o conhecimento das
dimensões culturais essenciais ao cuidado de enfermagem, estabelecendo interrelações entre cuidado e cultura (MARTIN; ANGELO, 1998). Assim, começou a
explorar como as crenças, os valores e as práticas culturais podiam influenciar no
processo saúde-doença das pessoas.
Entretanto, foi em 1960 que Leininger começou a teorizar sobre a
relação do cuidado com a cultura, utilizando pela primeira vez os termos
enfermagem transcultural (AZEVEDO 1998, p. 29).
Leininger construiu a Teoria Transcultural de Enfermagem,
baseada na crença de que os povos de cada cultura são capazes de reconhecer e
definir maneiras através das quais experimentam e percebem o cuidado de
enfermagem, mas também, são capazes de relacionar essas experiências e
percepções às suas crenças e práticas gerais de saúde, onde o cuidado é
culturalmente construído. Definiu a teoria como um conjunto de conceitos e
hipóteses de enfermagem inter-relacionados, fundamentados nas necessidades
culturais das pessoas e grupos que incluem manifestações de comportamentos
relativas aos cuidados, crenças e aos valores com a finalidade de realizar um
cuidado de enfermagem efetivo e satisfatório (AZEVEDO, 1998).
Leininger (1985, p. 225-238) elaborou sua teoria para subsidiar as
ações de cuidado da enfermagem por identificar o contexto cultural como sendo
inerente e, ao mesmo tempo, condicionante de todos os aspectos que permeiam a
relação saúde-doença a partir dos seguintes pressupostos:
46
•
A enfermagem é um fenômeno essencialmente cultural que envolve
assistência às pessoas de acordo com seu contexto cultural ou estilo de vida
específico.
•
O cuidado tem sido, desde tempos remotos, essencial para o crescimento,
desenvolvimento e sobrevivência dos seres humanos.
•
O cuidado, as manifestações, os processos, os valores e as crenças de
enfermagem transcultural precisam ser explicados de maneira sistemática e
científica com bases humanísticas.
•
O cuidado humanizado é universal com suas especificidades em cada
cultura. É a característica central, dominante e unificadora da enfermagem.
•
O cuidado de enfermagem terapêutico e na maioria das vezes culturalmente
determinado e embasado, podendo ser culturalmente validado.
•
As culturas têm seu modo particular de comportamento relativo ao cuidado
que geralmente é conhecido pelos integrantes da própria cultura, mas
desconhecidos pelo profissional enfermeiro, cuja bagagem é diferente das
pessoas que cuidam.
•
Os processos, as funções e as atividades de enfermagem variam de acordo
com a estrutura social e o sistema cultural em relação à sua história cultural.
•
No sistema profissional de saúde não pode haver cura sem cuidado, mas há
cuidado sem ser para a cura.
No seu modelo de cuidado “sol-nascente”, aponta o caminhar de
uma subárea para a profissão denominada transcultural. Ela definiu a sua teoria
como sendo um conjunto de conceitos (cuidado, cuidar, cultura, cuidado cultural) e
hipóteses de enfermagem que incluem manifestações de comportamentos relativos
ao cuidado, às crenças e aos valores, com o objetivo de realizar um cuidado de
enfermagem satisfatório, bem como tornar o conhecimento e a prática profissional
culturalmente embasados, conceituados e operacionalizados (LEININGER, 1978).
Desta forma, Leininger (1985) apresenta três tipos de ações de
enfermagem que possibilitam ao profissional enfermeiro cuidar da pessoa de
acordo com sua cultura. A primeira é a preservação/manutenção do cuidado,
onde o enfermeiro vai atuar no sentido de guiar e favorecer as pessoas mantendo
seus valores culturais. A segunda ação é a acomodação ou negociação do
cuidado e a terceira é a repadronização/reestruturação cultural do cuidado.
A preservação/manutenção do cuidado é um fenômeno
culturalmente embasado, de assistir, facilitar ou capacitar a pessoa, que a auxilia a
47
preservar ou manter hábitos favoráveis de cuidado e de saúde. O enfermeiro deve
atuar no sentido de guiar e favorecer as pessoas a manter valores culturais próprios
que lhes são benéficos.
A acomodação/negociação do cuidadoé um ato culturalmente
embasado de assistir, facilitar ou capacitar, que revela formas de adaptação,
negociação ou ajustamento dos hábitos de saúde e vida das pessoas. Nesta etapa
o enfermeiro deve identificar os valores culturais da pessoa e negociar formas de
melhorá-los buscando promover a saúde.
A terceira e última ação é a repadronização ou reestruturação
cultural do cuidado, os modelos são reconstruídos ou alterados para auxiliar as
pessoas a mudar os padrões de saúde ou de vida, de forma a torna-lós significativo
ou congruente para ele. O enfermeiro assume o papel de interventor, propondo
ações conciliadoras entre a cultura e as necessidades de saúde das pessoas nos
aspectos em que os valores culturais forem considerados desfavoráveis à sua
saúde.
Desta forma, percebemos que há uma escassez de trabalhos que
abordem as práticas de cuidados populares em relação à malária, já que esses
cuidados estão associados à cultura das pessoas, que se entrelaça com uma rede
de significados compartilhados nos grupos sociais nos quais as pessoas estão
inseridas.
Portanto é importante que o profissional de saúde compreenda os
aspectos culturais para implementar ações voltadas à preservação, acomodação ou
repadronização dos cuidados com a saúde.
48
CAPÍTULO 3
METODOLOGIA
49
3 METODOLOGIA
3.1 Tipo de estudo
Esta pesquisa de caráter descritivo-exploratório de abordagem
qualitativa, face às suas características, tem como foco principal os fenômenos das
Ciências Sociais na medida em que busca compreender o fenômeno na perspectiva
dos sujeitos, contextualizado em seu ambiente natural. O investigador é o principal
instrumento da pesquisa (MINAYO, 2006).
Desta forma, a pesquisa qualitativa possibilita a aproximação com
o objeto de estudo na medida em que se pretende compreender as práticas de
cuidado desenvolvidas pelas pessoas a partir do seu cotidiano, suas angústias,
necessidades, crenças e valores. .
3.2 Cenário
A pesquisa foi desenvolvida no município de Juruena–MT. A
escolha deste município deveu-se aos crescentes índices de malária ocorridos na
região, em particular nos anos de 2003 e 2004 quando se registrou IPA de
41,00/1.000hab e 116,8/1.000hab respectivamente, alcançando o primeiro lugar no
ranking das doenças transmissíveis no município. Dentro da área de abrangência
de Juruena o assentamento Vale do Amanhecer se destacou por apresentar, nesse
período, respectivamente, 96,4% e 73,7% das lâminas positivas (MATO GROSSO,
2005).
O município de Juruena está localizado na região Noroeste do
Estado de Mato Grosso a 880 km de Cuiabá, com uma área total de 3.190 Km² e
com 6.217 habitantes (JURUENA, 2007).
50
A região que compõe o município foi fortemente explorada por
aventureiros e garimpeiros desde o século XIX, porém só foi desenvolvida a partir
da década de 80 por meio de projetos colonizadores implementados pela
Companhia de Desenvolvimento de Mato Grosso (CODEMAT) e pelos incentivos
fiscais do governo federal. O primeiro projeto de colonização em Juruena, visava
colonizar uma área de 200 mil hectares, assentando, em média, 1.000 pequenos e
médios agricultores oriundos da região Sul do país (FERREIRA, 1997).
A denominação Juruena está diretamente relacionada à referência
geográfica do rio Juruena, como também pelo fato de se prestar homenagem à
Juruena Empreendimentos de Colonização Ltda, empresa que colonizou vasta área
de terra no Noroeste mato-grossense (www.saude.mt.gov.br).
Figura 3 – Localização geográfica do município de Juruena – MT.
Fonte: http://pt.wikipedea.org/wiki/Juruena
Figura 4 – Vista aérea do município de Juruena – MT.
Fonte: http://pt.wikipedea.org/wiki/Juruena
51
O município de Juruena foi criado em 04 de julho de 1988, pela
Lei Estadual nº. 5.313, após o desmembramento do município de Aripuanã. Sua
população é formada por descendentes de alemães, paranaenses, italianos e
poloneses. Possui atividade econômica baseada no extrativismo vegetal, na
pecuária e na agricultura, porém a região já foi cenário do extrativismo mineral, ou
seja, áreas garimpeiras sempre estiveram presentes no local (FERREIRA,1997).
Desde 2000, o turismo vem sendo desenvolvido na região e
dentre os pontos turísticos está o rio Juruena e como opção de lazer os visitantes
podem desfrutar da pesca, dos passeios ecológicos e dos banhos na cachoeira do
Vale do Canamã (JURUENA, 2007).
O assentamento Vale do Amanhecer foi criado pelo Instituto
Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 1998, possui 14,4 mil
hectares de área, está localizado a 6,2 km da sede do município tendo como
principal via de acesso a rodovia MT-208. O local é dividido em linhas as quais
contêm os lotes residenciais e possui ainda uma reserva ambiental coletiva. A
chegada das primeiras famílias se deu em 2000 e a estimativa era de assentar
aproximadamente 250 famílias. Em novembro de 2005 estavam assentadas 220
famílias que permanecem até os dias atuais (INCRA, 2006; JURUENA, 2007).
3.3 Sujeitos do estudo
Os critérios que fundamentaram a seleção dos sujeitos do estudo
foram estabelecidos da seguinte forma: usuários da rede básica de saúde com o
diagnóstico de malária nos últimos três anos, identificados pelos funcionários do
setor de endemias do município, de ambos os sexos, com idade acima de 18 anos,
residentes no município de Juruena – MT de forma aleatória. A maioria dos
participantes da pesquisa residia no assentamento Vale do Amanhecer.
O número de sujeitos participantes da pesquisa foi delimitado com
base na saturação das informações coletadas. Participaram do estudo dezesseis
pessoas, sendo oito do sexo masculino e oito do sexo feminino, com idade entre
dezenove e sessenta anos. A maioria era casada e tinha o ensino fundamental
52
incompleto. A atividade de trabalho principal realizada por essas pessoas era a
agricultura familiar.
3.4 A Coleta de dados
A coleta de dados é uma das etapas da pesquisa que exige do
pesquisador maior tempo e trabalho, pois, segundo Chizzotti (1998), nesta fase é
importante reunir informações indispensáveis ao alcance dos objetivos.
A entrevista foi o meio considerado mais apropriado para se obter
as informações necessárias à compreensão do objeto deste estudo, pois, como
afirma Minayo (2006), possibilita a obtenção de dados tanto objetivos quando
subjetivos, como atitudes, valores, opiniões, idéias, crenças, maneiras de pensar,
sentir e atuar das pessoas.
Haguette (1997) define a entrevista como um processo de
interação social entre duas pessoas na qual uma delas, o entrevistador, tem por
objetivo a obtenção de informações por parte do outro, o entrevistado.
Para Leopardi (2001) é uma técnica em que o investigador
formula questões relativas ao seu problema e pode ser construída de diferentes
maneiras, porém sempre na perspectiva de encontro social no qual o pesquisador
busca compreender o que está no íntimo da pessoa informante, ou seja, além das
respostas ao questionamento, captar os sentimentos dos sujeitos pesquisados.
Nesta pesquisa a coleta de dados foi realizada por meio de
entrevistas semi-estruturadas. De acordo com Minayo (1994, p.108), na entrevista
semi-estruturada ocorre uma combinação de perguntas abertas e fechadas, onde o
entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto, sem resposta
ou condição pré-fixada pelo pesquisador.
Os dados foram coletados nos meses de agosto e setembro de
2007, seguindo um roteiro de questões fechadas e abertas previamente elaboradas
e testadas (teste-piloto) junto às pessoas que tiveram malária, residentes em
Cuiabá no período anterior à coleta (Apêndice A). A aplicação do teste-piloto foi
importante, pois identificamos se as perguntas estavam adequadas ao nível de
compreensão das pessoas e se as respostas possuíam informações que pudessem
auxiliar na compreensão do objeto de estudo. Após a realização de cada entrevista
53
as questões norteadoras foram reformuladas e novamente testadas, obtendo-se, ao
final, um resultado satisfatório.
As entrevistas foram realizadas nas residências das pessoas. A
escolha desse local auxiliou a coleta de dados, por ser um espaço informal e
familiar, o que minimiza o desconforto durante a entrevista e favorece o diálogo
com o pesquisador.
Nesses encontros, primeiramente foi explicado às pessoas os
objetivos da pesquisa e que poderiam deixar de participar da mesma a qualquer
momento, como também, foi informado sobre o sigilo dos dados. Após essas
informações foi entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice
B) para autorização da coleta de dados através da assinatura do documento.
Para o registro das informações foi utilizado um gravador de voz
digital, marca Coby, modelo BR–R 188.
3.5. Análise dos dados
Os dados foram organizados, categorizados e analisados com
base no método de análise de conteúdo apoiado na técnica de análise temática
proposta por Minayo (2006, p. 309), por ser, segundo a autora, [...] a mais simples e
considerada apropriada para as investigações qualitativas em saúde.
De acordo com Minayo (2006), a análise temática tem suas raízes
na linha positivista de análise de conteúdo, ou seja, ênfase na freqüência dos
significados, entretanto, dentre as suas variantes, comporta o estudo/ análise dos
significados. Para a autora, a noção de tema está ligada a uma afirmação a respeito
de determinado assunto e comporta um feixe de relações que pode ser
representado por uma palavra, uma frase, um resumo. Nesse sentido a análise
temática consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma
comunicação cuja presença ou freqüência signifique alguma coisa para o objetivo
analítico visado.
54
Operacionalmente a análise temática se desdobra em três etapas:
Pré-análise, Exploração do material e Interpretação (MINAYO 2006, p.316-18):
Primeira etapa: Pré-Análise - consiste na escolha dos documentos
a serem analisados e na retomada das hipóteses e dos objetivos iniciais da
pesquisa. Pode ser decomposta nas seguintes tarefas:
a) leitura flutuante do conjunto das comunicações. Consiste em
tomar contato exaustivo com o material deixando-se impregnar pelo seu conteúdo.
A dinâmica entre as hipóteses iniciais/emergentes, as teorias relacionadas ao tema
tornarão a leitura sugestiva e capaz de ultrapassar a sensação de caos inicial.
b) constituição do corpus organização do material de tal forma que
possa responder a algumas normas de validade: exaustividade (contempla todos os
aspectos levantados no roteiro; representatividade (representação do universo
pretendido); homogeneidade (obedeça a critérios precisos de escolha em termos de
temas, técnicas e interlocutores); pertinência (documentos analisados devem ser
adequados ao objetivo do trabalho).
c) Formulação e reformulação de hipóteses e objetivos, processo
que consiste na retomada da etapa exploratória, tendo por parâmetro a leitura
exaustiva do material e as indagações iniciais, pois a realidade não é evidente. Por
isso se fala também em reformulação de hipóteses, o que significa a possibilidade
de correção de rumos interpretativos ou abertura para novas indagações.
Segunda etapa: Exploração do material - esta fase consiste
essencialmente numa operação classificatória que visa alcançar o núcleo de
compreensão do texto. Para isso o investigador busca encontrar categorias que são
expressões ou palavras significativas em função das quais o conteúdo de uma fala
será organizado.
A categorização consiste num processo de redução do texto às
palavras e expressões significativas.
Terceira etapa: Tratamento dos resultados obtidos e interpretação
- nesta fase os resultados das entrevistas são categorizados, o que permite colocar
em relevo as informações obtidas. A partir daí o analista propõe inferências e
realiza interpretações, inter-relacionando-as com o quadro teórico desenhado
inicialmente ou abre outras pistas em torno de dimensões teóricas e interpretativas
sugeridas pela leitura do material.
É importante ressaltar que durante a análise dos dados estivemos
identificando as diversas formas de expressão sobre o cuidado com a saúde, em
55
especial durante o tratamento da malária, que permeiam o cotidiano dessas
pessoas e os fatores culturais que podem estar influenciando nesse cuidado.
Após a análise do material empírico emergiram duas categorias:
•
Categoria 1 – A REDE DE SERVIÇO DE SAÚDE E TERAPÊUTICA
ANTIMALÁRICA que se dividiu em duas sub-categorias: o serviço de saúde
e sua organização como espaço de diagnóstico e a terapêutica
antimalárica e seus efeitos colaterais
•
Categoria 2 – PRÁTICAS POPULARES QUE INFLUENCIAM NO PROCESSO
DE CUIDAR DA MALÁRIA. Nesta categoria encontramos duas sub-categorias:
o conhecimento das pessoas sobre formas de transmissão e tratamento
da malária; formas de cuidar/ tratar da malária .
3.6. Aspectos éticos
Esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) em atendimento à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que
regulamenta as pesquisas envolvendo seres humanos, Protocolo n° 329/CEPHUJM/07.
Para garantir o anonimato dos informantes, as entrevistas foram
identificadas com nomes de pedras preciosas encontradas na região brasileira,
como por exemplo; Rubi, Esmeralda e assim sucessivamente. A escolha desses
codinomes se deu por considerar as informações preciosas, ricas e importantes
para a compreensão do objeto de estudo.
56
CAPÍTULO 4
A REDE DE SERVIÇO DE SAÚDE E
TERAPÊUTICA ANTIMALÁRICA
57
4 A REDE DE SERVIÇO DE SAÚDE E TERAPÊUTICA
ANTIMALÁRICA
Neste capítulo abordaremos alguns aspectos relacionados ao
serviço de saúde e sua organização como espaço para o diagnóstico e tratamento
da malária e os efeitos colaterais da terapêutica antimalárica
4.1 O serviço de saúde e sua organização como espaço para o
diagnóstico e tratamento da malária
O serviço de saúde do município de Juruena é composto por um
Hospital Municipal, três Unidades de Saúde da Família (USF), sendo duas urbanas
e uma rural, uma Unidade de Reabilitação e uma Unidade de Saúde Bucal, ou seja,
um serviço exclusivamente público.
A rede de serviço de saúde pública existente em Juruena pode ser
observada nas fotografias abaixo
F1- Hospital Municipal e USF Urbana I
F2- USF Urbana II e Unidade de Reabilitação
58
F3- USF Rural e Unidade de Saúde Bucal
Fonte: Fotos da autora
F4- Prefeitura e Câmara Municipal
O hospital municipal foi construído com recursos financeiros
municipais, estaduais e contribuição da população local sendo inaugurado em
1996. É um hospital de pequeno porte com capacidade para 20 leitos distribuídos
entre as especialidades de pediatria, clínica médica, clínica cirúrgica, clínica
obstétrica e pronto atendimento. Seu quadro profissional é formado por 04 médicos,
01 enfermeiro, 20 auxiliares/técnicos de enfermagem, 01 técnico em radiologia, 01
nutricionista e 01 Fisioterapeuta.
O hospital ainda abriga em sua estrutura física uma USF urbana,
a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), onde está localizado o gabinete da
secretária municipal e o Setor de Vigilância Epidemiológica.
A primeira USF urbana foi implantada no município em 1998, em
substituição à UBS existente com a proposta de prestar assistência à saúde de
forma mais próxima da população tendo como foco de atenção as ações de
promoção, prevenção e educação em saúde. Em 2001 foi inaugurada a segunda
USF urbana e em 2005 a USF rural.
Todas as USFs possuem uma enfermeira, um médico, dois
auxiliares de enfermagem e agentes comunitários de saúde. A USF urbana
localizada no bairro Vila Nova abriga a Unidade de Reabilitação e a USF rural a
Unidade de Saúde Bucal.
Através da Lei Orgânica da Saúde, Lei nº. 8.080 de 19 de
setembro de 1990 e da Política Nacional de Atenção Básica, Portaria nº. 648/GM
de 28 de março de 2006, os serviços de saúde existentes na rede SUS, precisam
garantir a referência e a contra-referência aos serviços de maior complexidade,
59
porém na maioria dos municípios brasileiros este modelo de atendimento não
obedece a essa lógica (atenção básica, secundária e terciária), pois as pessoas
continuam a procurar atendimento especializado (secundário ou terciário) de
caráter curativo em detrimento da atenção básica seja pelo desconhecimento do
fluxo de atendimento ou mesmo pela deficiência do sistema em resolver os
problemas da comunidade de forma ágil e efetiva.
Em relação à malária o Ministério da Saúde (BRASIL, 2006c)
preconiza o seguinte fluxo de atendimento à pessoa com suspeita da doença:
Suspeito de malária
Preencher ficha de
notificação
Colher lâmina para
diagnóstico
Realização do exame
laboratorial
Investigar febre
Positivo
Iniciar tratamento
Acompanhar
tratamento
Colher LVC
(Lâmina de verificação de Cura)
Positivo
Notificar
Negativo
Sinais de
perigo
Encaminhar com urgência
para Unidade de Referência
Negativo
Alta com
recomendações
Adotar conduta recomendada
pelo supervisor
60
Para o controle das doenças infecto-contagiosas a SMS possui o
setor de Vigilância Ambiental e de Endemias que fica localizado no centro da
cidade, próximo ao hospital. É nesse local que se faz o diagnóstico da malária
mediante a realização do exame de gota espessa, se institui o tratamento
preconizado pelo MS com a distribuição da medicação específica seguida de
orientações e o controle da doença por meio de visitas domiciliares.
O assentamento Vale do Amanhecer faz parte da área de
abrangência da USF rural a qual deveria ser responsável pelo diagnóstico,
notificação, tratamento e acompanhamento das pessoas portadoras de malária
residentes nessa comunidade. Entretanto, o setor de Vigilância Ambiental e
Endemias é que se responsabiliza por todo esse processo e a comunidade já se
habituou a esse fluxo que foi estabelecido no município. Mesmo quando uma
pessoa procura a USF com suspeita de malária, é imediatamente encaminhada
pelo profissional de saúde ao setor de endemias no centro da cidade.
Entretanto, frente à endemia de malária registrada no município
de Juruena, em especial no assentamento Vale do Amanhecer, nos anos de 2003 e
2004, em decorrência da intensa atividade garimpeira desenvolvida no local, o setor
de vigilância ambiental e de endemias juntamente com profissionais da SMS,
gestores e comunidade buscaram estratégias para o controle imediato da malária
estabelecendo um sistema de comunicação visual (utilização da bandeira
vermelha) a fim de identificar e tratar os casos precocemente.
F5 e F6 - Assentamento Vale do Amanhecer – local de atividade garimpeira e atualmente
área de desmatamento e queimadas.
Fonte: Fotos da autora
61
As bandeiras vermelhas deveriam ser colocadas na entrada das casas
quando algum membro da família apresentasse sintomas sugestivos de malária.
Diariamente os agentes de endemias percorriam a região e ao visualizar as
bandeiras se aproximavam dessas casas para realizar o exame da gota espessa.
Se confirmado o diagnóstico de malária fazia a entrega do medicamento
imediatamente ou o mais rápido possível como pode ser observado nos seguintes
relatos:
A gente colocava uma bandeirinha pra mostrar que a gente tinha
malária. Onde tinha a bandeirinha, eles chegavam e traziam o
medicamento (Ágata)
Eles [funcionários] pediam para colocar a bandeirinha na estrada
se tinha alguma coisa [malária]. A gente colocava quando tinha e
eles já vinham ver a gente, ver o que o pessoal estava precisando
(Safira)
Quando estava com malária colocava a bandeirinha sim. Era de
cor vermelha. Quando o pai estava com malária ele colocava a
bandeirinha. Eles [funcionários] passavam e entregavam aqui a
bandeirinha (Esmeralda).
Aí eu coloquei uma bandeirinha. Eles [funcionários] colhiam o
sangue e descobriram que era malária (Diamante).
A bandeirinha foi uma idéia boa porque não precisava mais correr
atrás do agente. Ele [funcionário] já via a bandeira e passava aqui
(Granada).
Eu coloquei a bandeirinha. Fizeram [funcionários da saúde] uma
reunião e informaram que tinha um agente pra passar direto nas
linhas. Os agentes passavam, falavam pra gente e davam a
bandeirinha que era vermelha (Granada).
Caso a pessoa apresentasse sintomas tais como fraqueza
intensa, sinais de desidratação e/ou desnutrição o agente de endemias
encaminhava-a para avaliação médica no hospital.
A estratégia de utilizar a bandeira vermelha para sinalizar a
presença da malária pode ser comparada ao esquema de quarentena (plano de
urgência) utilizado no final da Idade Média na França e em todos os países da
Europa no momento em que a peste ou uma doença endêmica violenta aparecesse
na cidade.
62
Segundo Foucault (2000, p. 88), no esquema de quarentena
[...] todas as pessoas deveriam permanecer em casa para serem
localizadas em um único lugar; a cidade deveria ser dividida e
supervisionada por inspetores que deveriam percorrer as ruas
para ver se alguém saía do seu local; os inspetores deviam
apresentar relatórios informando tudo que tinham observado –
registro centralizado e solicitar as pessoas para se apresentar em
determinada janela para identificá-lo como vivo e por último,
praticar a desinfecção casa por casa, com a ajuda de perfumes
que eram queimados.
A estratégia utilizada pelo serviço para identificação dos casos de
malária (uso das bandeiras) surtiu efeito e sua eficácia para o controle da malária
nessa comunidade se devem à relação de proximidade estabelecida de forma
simétrica, dialogada e participativa entre os profissionais de saúde/ serviço de
saúde com seus usuários.
Não procurei o posto de saúde. O pessoal da saúde [setor de
endemias] que veio aqui olhava as pessoas que estavam mal,
fazia a lâmina e quem tinha malária eles foram na cidade e
buscavam o remédio (Safira).
Como se observa os profissionais de saúde do município
desenvolveram práticas de cuidados a partir das realidades vivenciadas pelos
moradores de forma a preservar e/ou acomodar cuidados para se evitar conflitos
culturais.
Esses
cuidados
geraram
na
comunidade
mudança
de
comportamento, tanto das pessoas em relação a sua saúde quanto dos serviços de
saúde em relação às pessoas e ao controle da malária. Isto reforça a necessidade
dos profissionais estarem próximos das comunidades para utilizar de forma
adequada estratégias de comunicação e mobilização social.
4.2 A terapêutica antimalárica medicamentosa e seus efeitos colaterais
O tratamento imediato e adequado da malária é a principal
alternativa para o controle da doença, visto não haver vacinas para a sua
prevenção e tem por objetivos prevenir formas graves da doença, reduzir sua
63
mortalidade, eliminar a fonte de infecção para o mosquito e conseqüentemente, a
transmissão da malária. Entretanto, esta terapêutica é influenciada pela cultura de
uma sociedade.
Para que o tratamento da malária possa ocorrer de forma
satisfatória é necessário avaliar o quadro clínico apresentado pela pessoa, sua
idade, identificar a espécie de plasmódio causador da doença e se a mesma já fez
tratamento antimalárico anteriormente (BRASIL, 2002).
Além disso, também é importante definir se a pessoa infectada é
um caso autóctone (contraiu a doença no mesmo município/local que está sendo
feito o diagnóstico), importado (malária contraída fora da zona onde foi feito
diagnóstico), introduzido (caso secundário direto, quando se pode provar que o
mesmo constitui o primeiro elo de transmissão local após um caso importado
conhecido) ou crípticos (malária diagnosticada em área com transmissão
interrompida quando não se consegue comprovar o local de infecção) (BRASIL,
2006c).
Visando obter maior eficácia no tratamento e cura da malária, o
Ministério da Saúde preconizou esquemas terapêuticos para cada espécie de
Plasmodium (Quadro 1,Quadro 2, Quadro 3, Quadro 4, Quadro 5, Quadro 6).
Nesses esquemas são utilizadas drogas como cloroquina, mefloquina e primaquina
na forma de comprimidos (F,7, F8, F9).
Caso a espécie de Plasmodium não seja identificada, deve-se
instituir o tratamento para o Plasmodium falciparum uma vez que a infestação por
esse protozoário apresenta manifestações clínicas graves, podendo evoluir para
óbito. Ao persistirem os sintomas ou agravo dos sinais clínicos o doente deverá ser
encaminhado para unidade de saúde de maior complexidade (hospital) (BRASIL,
2001).
Quadro 1 – Esquema terapêutico preconizado pelo MS/FUNASA para o tratamento
da malária por Plasmodium falciparum.
Drogas e Doses
1º, 2º e 3º dias
Grupos Etários
4º e 5º dias
6º dia
Quinina
Doxiciclina
Doxiciclina
Primaquina
comprimido
comprimido
comprimido
comprimido
8 a 11 anos
1e½
1
12 a 14 anos
2e½
2
15 ou mais anos
4
FONTE: BRASIL, 2006c.
2
2
3
64
Quadro 2 – Esquema terapêutico para tratamento das infecções
vivax ou Plasmodium malarie.
Drogas e Doses
1º. dia
2º. e 3º. dias
Grupos Cloroquina Primaquina Cloroquin
Primaquina
Etários
(Comp)
(Comp)
a
(Comp)
(Comp) Adulto Inf.
Adulto Inf.
Menor
1/4
1/4
6
meses
6-11
1/2
1
1/2
1
Meses
1-2
1
1
1/2
1
anos
3-6
1
2
1
2
anos
7-11
2
1
1
1 e 1/2
1
1
anos
12-14
3
1 e1/2
2
1 e1/2
anos
15 ou
4
2
3
2
mais
por Plasmodium
4º. ao 7º. dia
Primaquina
(Comp)
Adulto Inf.
-
-
1
-
1
-
2
1
1
1 e1/2
-
2
-
Fonte: BRASIL, 2006c.
Quadro 3 - Esquema alternativo para tratamento das infecções por Plasmodium
vivax em crianças apresentando vômitos, com cápsulas retais de artesunato em 4
dias e primaquina em 7 dias.
Drogas e doses
1º, 2º e 3º
Grupos Etários
4º dia
5º ao 11º dias
dias
Artesunato
Artesunato
Primaquina - comprimido
cápsula retal
cápsula retal
Adulto
Infantil
1 a 2 anos
1
1
-
1
3 a 5 anos
2 (A)
1
½
-
6 a 9 anos
3 (B)
1
-
2
10 a 12 anos
3 (B)
3 (B)
1
-
FONTE: BRASIL, 2006c.
(A) = administrar uma cápsula retal de 12 em 12 horas;
(B) = administrar uma cápsula retal de 8 em 8 horas;
Não recomendado esse tratamento para menores de 1 ano e maiores de 12 anos, e
crianças com diarréia.
65
Quadro 4. Esquema de prevenção de recaída da malária por Plasmodium vivax,
com cloroquina dose única semanal, durante 3 meses.
Número de comprimidos
Peso (Kg)
Idade
(150 mg/base/por semana)
5 – 6 Kg
< 4 meses
¼
7 – 14 Kg
4 meses a
½
15 – 18 Kg
3 – 4 anos
3/4
19 – 35 Kg
5 – 10 anos
1
36 Kg e mais
11 e + anos
2
2 anos
FONTE: BRASIL, 2006c.
Quadro 5 - Esquema terapêutico para tratamento das infecções por Plasmodium
falciparum com associação de artemeter mais lumefantrina – Cartem.
1º. dia
2º. dia
3º. dia
Peso
Idade
5-14 kg
6 meses
Manhã
Noite
Manhã
Noite
Manhã
Noite
1
1
1
1
1
1
8
2
2
2
2
2
2
14
3
3
3
3
3
3
14
4
4
4
4
4
4
a 2 anos
15-34
kg
25-34
kg
>35 kg
3
a
anos
9
a
anos
>
anos
Fonte: BRASIL, 2006c.
Quadro 6 – Esquema alternativo para tratamento das infecções por Plasmodium
falciparum com quinina, dociciclina e primaquina.
Drogas e Doses (comprimidos)
Idade
1º. 2º. e 3º. Dias
4º. e 5º. Dia
6º.. Dia
Quinina
Doxiciclina
Doxiciclina
Primaquina
8-11 anos
1 e 1/2
1
1
1
12-14 anos
2 e 1/2
1 e 1/2
1 e 1/2
2
4
2
2
3
15
anos
ou
mais
Fonte: BRASIL, 2006c.
66
F 7 –Medicamento Cloroquina
Fonte: Fotos da autora
F 8 – Medicamento Primaquina
F 9 – Medicamento Mefloquina
Fonte: Fotos da autora
Estudos revelam que o uso correto dos esquemas terapêuticos
são eficientes para o controle e cura da malária. Entretanto, há fatores que
interferem no tratamento da doença tais como a absorção do medicamento devido
a distúrbios gastrintestinais (diarréias e vômitos), aderência ao tratamento,
reinfecção e imunidade (SILVA et al, 2003). Abdon et al (2001) alertam para os
efeitos colaterais que esses medicamentos apresentam em particular alterações do
aparelho gastrintestinal (a diarréia), podendo ocorrer ainda prurido e anemia
aplástica.
Além das alterações gastrintestinais as pessoas que fizeram uso
dos antimaláricos em Juruena apresentaram como efeitos colaterais dor no fígado,
moleza, fraqueza, dor de cabeça, dor no corpo. Isto pode ser observado nas falas
abaixo:
67
Dava febre, dor de cabeça. Só que a primeira vez que eu tive
malária eu vomitava. Quando eu tomava o remédio tinha que
cuidar para não vomitar (Ágata)
O remédio da SUCAM ataca o fígado (Opala)
O remédio dava uma indisposição. Não dava vontade de nada e
nem podia sentir o cheiro da comida que dava uma vontade de
vomitar terrível. Dava um pouco de moleza, mas passava logo.
Dava uma fraqueza na gente, moleza, uma vontade de ficar
deitado (Rubi).
Sentia fraqueza, não conseguia comer. A gente está de idade e o
remédio é forte. Então eu sentia muita fraqueza, canseira, dor nas
pernas (Alexandrita).
A informação que a gente tinha era que o remédio acabava com o
organismo da pessoa, principalmente a visão, até porque a
malária já ataca a visão da gente (Topázio).
O remédio faz a gente ficar sem força. Faz a gente ficar uns dias
sem trabalhar. Não sei se é da malária ou do tratamento, porque
os comprimidos são muito fortes (Quartzo).
Entretanto, apesar da medicação apresentar esses efeitos
colaterais algumas pessoas não deixaram de tomar o medicamento por acreditar
que o mesmo é forte e cura a malária.
Assim, fica evidente que o uso do medicamento é resultante de
um processo de decisão o qual, segundo Leite e Vasconcellos (2003) levam em
conta fatores determinantes como a crença no tratamento proposto.
Vontade eu tinha de parar, mas não podia se não iria piorar.
Porque daí não sarava da malaria (Diamante).
Eu tomei o remédio certinho. Tomava para sarar. Pra melhorar
tem que tomar, não adianta parar. Para melhorar tem que tomar
porque senão tomasse a gente continuava ruim igual (ÁguaMarinha).
Eu tomava o remédio certinho. Porque eu sou assim: se tem que
tomar esse remédio eu tomo, só é para parar quando sarar
(Alexandrita)
68
O conhecimento que a comunidade possui sobre as drogas
antimaláricas e seus efeitos colaterais foram adquiridos por meio de experiência
pessoal, orientação dos profissionais de saúde, cuidado com familiares ou relatos
de outras pessoas que já tiveram a malária. Isto pode ser observado nas falas
abaixo:
Uns [pessoas da comunidade] falam que é bom e a gente toma o
remédio. (Ágata)
Eles [os funcionários] me deram o remédio e me explicaram
certinho e eu fiz do jeito que eles mandaram. (Ônix)
Dizem [os funcionários] que é o remédio da SUCAM que cura a
malária, então tem que tomar. (Opala)
Alves (1993), em seus estudos descreve que os conhecimentos
são constituídos de experiências diversas e que podem modificar-se no decorrer do
tempo,
pois
constituídos
são
continuamente
por familiares,
confrontados
amigos,
vizinhos,
por diferentes
diagnósticos
dentre
Portanto,
outros.
o
conhecimento das pessoas está em constante construção sendo reformulado e
reestruturado de acordo com os processos vivenciados pela comunidade.
Como
se
observa,
as
pessoas
entrevistadas
possuem
conhecimentos a respeito da importância da utilização do medicamento para
malária bem como dos seus efeitos colaterais.
Para minimizar os efeitos adversos da medicação no organismo
fazem uso de terapias complementares como chás e dietas alimentares. A terapia
complementar é uma prática de cuidado popular que os profissionais de saúde não
podem desconsiderar, pois é uma forma de acomodar o cuidado da malária,
evitando que essas pessoas deixem de tomar o medicamento preconizado pelo MS
e se tornem veículos de transmissão da doença.
69
CAPÍTULO 5
PRÁTICAS POPULARES QUE
INFLUENCIAM NO PROCESSO DE
CUIDAR DA MALÁRIA
70
5 Práticas populares que influenciam no processo de cuidar
da malária
Este capítulo discute a questão do cuidado popular à saúde, que
entendemos ser um conjunto de saberes e práticas relacionado à saúde. Esses
cuidados revelam a especificidade de uma comunidade, os quais estão permeados
de valores e crenças das pessoas pertencentes ao grupo.
Desta forma, identificamos duas subcategorias que emergiram
dos dados trabalhados e analisados possibilitando, assim, o alcance do objetivo
principal desta pesquisa que é analisar as influências da cultura no cuidado da
malária.
5.1 O conhecimento das pessoas sobre formas de transmissão e
tratamento da malária
Identificamos que as pessoas pesquisadas possuíam informações
referentes à malária tais como: sinais e sintomas, formas de transmissão,
diagnóstico, tratamento e medidas de prevenção que estão relacionados com a
forma que as pessoas compreendem o processo saúde-doença e a maneira como
lidam/cuidam de si nessas situações.
As pessoas geralmente associam os sintomas de moleza,
fraquezas e dores no corpo à malária por alterar a dinâmica de sua vida cotidiana.
Tais manifestações geram sentimentos de angústia, pois o corpo é o elemento de
ligação do homem com o mundo e a sua existência. Por conseguinte, a malária nos
remete ao mosquito, à atividade laboral (garimpo) e à água parada. Os relatos
abaixo reforçam essas percepções.
Achei que tava com malária porque dava muita dor de cabeça, mal
estar e vômito, então eu fiz a lâmina e deu malária. (Quartzo).
71
Sentia dores nas pernas, fraqueza. Daí eu tirei o sangue, fiz o
exame e deu malária (Esmeralda).
Olha, o mosquito da malária ele não dá de noite, é de dia mesmo,
no amanhecer e no anoitecer. É o horário que eles mais atacam
(Topázio)
Quando chegava às 05 horas evitava ficar na beira dos córregos,
porque esse horário que o mosquito mais ataca, as 05 da tarde e
às 07 da manhã (Água-marinha).
Alguma coisa que a gente pode fazer é não deixar vasilha com
água parada, cuidar para não ir à beira do córrego, para o
mosquito não pegar a gente. Outra coisa que tem que fazer é
bater veneno pra matar o mosquito (Diamante).
Não vai a lugar como garimpo porque vai pegar malária.....lá tem
muita água parada, depósito de água, vasilhames jogados, litros
de garrafa que ficam cheios de água. Daí o mosquito pica você e
transmite. Não adianta esconder do mosquito (Topázio)
Procurei o posto de saúde e lá eles me atenderam, fizeram a
lâmina e era malária mesmo. Aí me deram o remédio e aí eu fiz do
jeito que eles mandaram fazer (Ônix).
Essas falas reforçam os estudos de Uchôa e Vidal (1994), que
revelam que o universo social e cultural influencia na adoção de comportamentos
de prevenção ou de risco e sobre a utilização dos serviços de saúde.
Durante as entrevistas e leitura profunda destas, ficou evidente
que as pessoas participantes desta pesquisa possuem conhecimento dos aspectos
referentes à doença, porém nem sempre esses conhecimentos foram repassados
pelos profissionais de saúde que cuidam dessas pessoas, mas adquiridos ao longo
do tempo, servindo de orientação para as mesmas.
Passavam muito veneno, teve uma vez que eles passaram em
poucos dias, duas vezes. Só que agora não passam mais o
veneno, porque não tem mais malária (Safira).
O garimpo parou, a malária parou se continuar [o garimpo],
continua a malária (Granada).
Percebi que tava com malária quando começou a dar uma moleza
no corpo, febre, dor na nuca. Dói assim, aqui na frente, dói tudo.
Começa assim. Aí só cama e cobertor (Ônix).
72
Na época que tinha mosquito tinha que fazer fumaça mesmo. Era
feita com esterco de gado, porque era muito bom. Parece que
diminuía o mosquito (Água-Marinha).
É importante conhecer e compreender tais percepções, visto que
fazem sentido às pessoas orientando-as quanto a forma de enfrentar a doença. Por
outro lado, as informações sobre a malária oriundas dos profissionais de saúde são
importantes por proporcionarem aos membros da comunidade esclarecimentos a
respeito da doença, do mosquito transmissor, do diagnóstico e de medidas de
prevenção e controle de forma individual e coletiva.
No cotidiano da convivência com a malária cada pessoa reconstrói
seus significados em busca da melhoria das condições de vida e saúde. Entender
como se adquire a malária é importante para resignificar a doença e seu
tratamento.
Outro aspecto associado a malária é a relação com o mosquito. A
doença é algo externo, que vem de fora e entra no sangue, por isso a sua
preocupação com o ambiente e o tempo (clima).
Fechava a casa mais cedo, pra evitar o pernilongo, porque uma
época aqui tinha muito pernilongo, aí a gente fechava a casa mais
cedo. Antes de escurecer. Que nem assim na época da chuva é
perigoso pegar malária (Turmalina).
A busca pelos serviços de saúde possibilita detectar o agente
invasor na corrente sanguínea e assim proceder ao diagnóstico e tratamento.
Fui no posto e fiz a lâmina. Já faziam a lâmina e passavam o
remédio pra mim, mas não lembro qual era. (Turmalina).
Portanto, é importante lembrarmos que o conhecimento e a
informação sofrem influências da cultura local e o profissional de saúde deve estar
atento, valorizá-las e compreendê-las, buscando às vezes a manutenção,
acomodação e/ou repadronização do cuidado.
Entretanto, apesar do repasse de informações e da identificação
de locais como sendo de risco para a malária, alguns moradores de Juruena
continuam a utilizar os lagos para pescar ao entardecer, mesmo sabendo que é
neste horário que ocorre a maior incidência de picadas do mosquito transmissor da
malária.
73
F 10 - Área utilizada pelos moradores da região para pesca
Fonte: Fotos da autora
Para Helman (1994) os grupos sociais utilizam diversas formas
para explicar as causas das doenças, os tipos de tratamento, ou seja, a cultura
herdada pelas pessoas enquanto membros de uma determinada sociedade nunca
pode ser analisada num vácuo, mas sim, como componente de um complexo de
influências que se refere àquilo em que as pessoas acreditam e ao modo como
vivem.
Assim, a apreensão do saber se constrói no cotidiano e se
transmite de geração a geração, e o cuidado à saúde não está ligado somente a
serviços formais de saúde, mas também aos valores compartilhados dentro de cada
contexto social (SILVA et al, 1996). Por isso, é importante considerar que o cuidar
fundamenta-se a partir da visão de mundo de cada um, isto é, da cultura pessoal e
instituicional e social (FRANCO et al 1996, p. 27).
Nesta pesquisa, percebemos que o conhecimento que as pessoas
possuíam sobre a malária e suas formas de prevenção foram adquiridas não só
pelas informações repassadas pelos profissionais de saúde, mas também pelos
familiares e pela própria comunidade.
Além das medidas preventivas preconizadas pelas instituições de
saúde, as pessoas utilizam formas criativas para prevenir a doença utilizando
informações e recursos disponíveis na comunidade tais como o alho, o fel de paca
e a pinga.
74
As pessoas [da comunidade] falam prá tomar pinga com alho que
é bom. Deve ser pelo cheiro forte, que não pega a malária. (Onix).
Falavam [ pessoas da comunidade] que era bom tomar fel de paca
que aí não pegava mais malária. Pinga com alho também. Eu
tomei. (Quartzo).
Quem falou que era bom tomar chás foram meus vizinhos, depois
meu irmão que teve malaria comentou que minha mãe fazia para
ele. (Turmalina).
A gente aprende a cuidar da malária com o pai, com o avô, eles
vêm ensinando a gente (Ônix).
O povo falava que se não guardar dieta a malária volta.
(Turmalina)
Falaram [vizinhos] que não podia comer ovo, carne de porco,
chupar abacaxi. Porque senão ela [a malária] poderia voltar de
novo (Esmeralda)
Observamos que apesar de as pessoas possuírem conhecimento
sobre a malária e das experiências vivenciadas com a doença, alguns moradores
continuam a realizar os cuidados de proteção e prevenção da malária, visto que a
doença tem ocorrido na região. Mas para alguns a malária é percebida como algo
“natural”, por isso não dão importância. Essa crença ocorre pelo fato de as pessoa
poderem se infectar várias vezes e a morte em decorrência dela não ser aguda, o
que nem sempre leva à associação entre malária e morte.
Neste momento
se torna fundamental a participação do
profissional de saúde no sentido de auxiliar as pessoas a refletirem sobre suas
atitudes em relação à saúde orientando-as quanto à necessidade de repadronizar
as práticas de cuidado, pois a malária é uma doença que ameaça a vida de
inúmeras pessoas naquela localidade.
Apreender as representações da comunidade sobre a malária
pode ser um meio de ajudar a entender, bem como de mobilizar a comunidade e
gestores em saúde a reduzir os IPAs na região.
75
5.2 FORMAS DE CUIDAR/ TRATAR DA MALÁRIA
Práticas não convencionais de saúde vêm sendo utilizadas pelas
pessoas/ população para cuidar de sua saúde. De acordo com Siqueira et al (2006),
os principais recursos populares adotados são os chás caseiros, as benzeduras, os
banhos e a alimentação e dentre estes, o mais aceito é o chá.
Além dos chás e da alimentação, a prática da “homeopatia”3 foi
apontada como um recurso popular para tratar a malária. Esses recursos são
utilizados por um determinado grupo e servem de orientação para suas escolhas
quanto aos cuidados e tratamentos a serem desenvolvidos para a cura da doença.
Uso dos Chás
De acordo com Rezende; Coco (2002) a utilização de plantas
medicinais tem grande importância para a cultura e a Medicina. O registro do uso
de plantas como terapêutica data de mais de sessenta mil anos e as primeiras
descobertas foram feitas por estudos arqueológicos em ruínas do Irã. Na China
3.000 a.C já existiam literaturas que descreviam suas indicações terapêuticas.
Para os autores a medicina popular brasileira é influenciada pelos
índios, negros e europeus, essa miscigenação gerou diversidade de informações e
utilização para as plantas. Desde 1990, a utilização de chás para o tratamento de
doenças vem sendo incorporada aos serviços públicos de saúde , em especial não
Estado de São Paulo.
O uso terapêutico das plantas é um assunto que tem suscitado
interesse de muitos pesquisadores, inclusive os da enfermagem, pois de acordo
com Oliveira e Araújo (2007), 80% da população mundial já tiveram alguma
experiência com o uso de plantas para fins preventivos ou curativos. A utilização
das plantas medicinais como prevenção e cura de doenças é um costume que
3
Termo utilizado pelas pessoas da região para identificar os cuidados realizados pela
pastoral da saúde no tratamento da malária.
76
sempre existiu na história da humanidade, principalmente pela população com
baixas condições econômicas.
Na área de enfermagem e fitoterapia Nogueira é uma referência
fundamental desde o início da década de 80 ao defender sua tese de livre docência
pela Escola de Enfermagem da USP intitulada “Fitoterapia popular e enfermagem
comunitária” incentivando os profissionais de enfermagem a se utilizar desses
conhecimentos na tentativa de oferecer às pessoas elementos para uma vida
melhor orientando-as quanto à forma de utilização mais adequada das plantas
(REZENDE; COCO, 2002).
Vários fatores podem levar as pessoas a utilizarem as plantas
como terapêutica. Entre estes, os culturais, os sociais, os econômicos e ainda os
filosóficos (MACIEL; GUARIM NETO, 2006).
As pessoas, desde os tempos mais antigos, têm procurado se
manter saudáveis utilizando formas alternativas de cuidado, buscando a
manutenção da saúde e a cura de doenças. Essas alternativas sempre estiveram
ligadas a crenças e conhecimentos adquiridos ao longo do tempo (SILVA et al,
1996).
Essas crenças fazem parte da cultura das pessoas de um
determinado local que são construídas e influenciadas ao longo do tempo.
Monticelli (1994) afirma que sem os homens não haveria cultura e sem cultura não
haveria homens, pois a cultura é um código de símbolos partilhados pelos membros
de uma determinada comunidade.
A descoberta do chá ocorreu no ano de 2737 a.C, quando o
imperador chinês Shen Nung descansava sob uma árvore e algumas folhas caíram
em uma vasilha de água que seus servos ferviam para beber e atraído pelo aroma,
Shen Nung provou o líquido e adorou. Entretanto, o primeiro registro sobre o uso do
chá data do século III a.C. e o primeiro tratado com caráter técnico foi escrito no
séc. VIII, durante a dinastia Tang definindo assim, o papel da China como
responsável pela introdução do chá no mundo (BENDER, 2007).
Esse autor ainda descreve que a introdução do chá no continente
europeu ocorreu no início do séc. XVII em função do comércio que então se
estabelecia entre a Europa e o Oriente. Ao que parece, foram os holandeses que
levaram pela primeira vez o chá à Europa, intensificando o seu comércio, mais
tarde desenvolvido pelos ingleses. Na Inglaterra, o seu consumo difundiu-se
rapidamente, tornando-se uma bebida muito popular. Essa popularidade se
77
estendeu aos países com forte influência inglesa, primeiramente nos Estados
Unidos, depois na Austrália e Canadá.
O chá é uma das bebidas mais consumidas no mundo e seu
crescente interesse se deve aos estudos que o apontam como fonte de flavonóides
e de favorecer a diminuição dos riscos de aparecimento de doenças degenerativas
e do coração (MATSUBARA; AMAYA, 2006).
A Portaria do SVS/MS nº 519, de 26 de junho de 1998 (BRASIL,
1998) define os chás como,
Produtos constituídos de partes de vegetais, inteiras,
fragmentadas ou moídas, obtidas por processos tecnológicos
adequados a cada espécie, utilizados exclusivamente na
preparação de bebidas alimentícias por infusão ou decocção, em
água potável, não podendo ter finalidade farmacoterapêutica
(finalidade de atuar como medicamento, prevenindo ou tratando
doenças e/ou sintomas).
A bebida pode ser preparada por meio de infusão (método de
preparo no qual a água potável que ao atingir a temperatura acima de 90°C, é
vertida sobre as plantas e permanece em repouso por aproximadamente 10
minutos), decocção (a planta é mergulhada sobre a água potável e mantida em
temperatura acima de 90ºC por aproximadamente 5- 10 minutos); maceração (as
ervas são deixadas de molho por 12 horas), cataplasma (as plantas são
amassadas e colocadas diretamente no local indicado), gargarejos, inalação
(inalar o vapor das ervas em fervura) e banhos (REZENDE; COCCO, 2002).
A terapêutica pelo uso do chá pode ser considerada uma prática
popular, pois segundo Loyola (1984, p.3) as práticas populares são um conjunto de
técnicas de tratamento empregadas pelos especialistas não reconhecidos pela
medicina oficial (curandeiros). Estas práticas são desenvolvidas dentro de um
contexto social no qual os aspectos culturais são valorizados.
O uso do chá é uma prática popular muito utilizada pelos
participantes da pesquisa como complemento ao tratamento preconizado pelo MS.
Por ser uma comunidade que reside próximo à floresta e distante dos grandes
centros, é possível obter plantas para o preparo dos chás com maior facilidade que
em regiões urbanas. As principais plantas utilizadas para o preparo dos chás são:
o boldo, a quina, o figatil, a salsaparrilha, o sabugueiro, a erva de bicho, o melão de
São Caetano, a caferana e picão (chá e banho), ou seja, plantas típicas da região.
78
Esses chás são utilizados diariamente nas formas de infusão,
decocção e banho, às vezes obedecendo a um ritual, como utilizar um recipiente
especial para o preparo “não pode ser de alumínio porque se não o chá não
funciona” (Ônix).
Os chás são utilizados para auxiliar na recuperação do fígado por
acreditar que “a malária está no fígado” (Rubi, Esmeralda, Topázio, Diamante,
Turmalina)
Na tentativa de compreender as possíveis influências que a
cultura exerce sobre as pessoas no cuidado com a saúde, em particular no
tratamento da malária, buscamos identificar na literatura as propriedades das
plantas utilizadas pela comunidade pesquisada.
O boldo (Coleus Barbatus Benth) é indicado como auxiliar no
tratamento de doenças hepáticas e da vesícula biliar, tônico das funções hepáticas
e como laxativo. Diminui a cólica, aumenta e favorece o fluxo biliar, sendo indicado
para distúrbios da função digestiva e problemas leves no trato gastrintestinal como
má digestão, gases e intolerância à gordura (BIESK, 2005)
O chá de boldo sempre é bom, é bom para o fígado. Porque
quando tomava os remédios o fígado da gente doía muito. O
boldo ajudou a sarar da malária (Turmalina).
Tomava o chá de boldo quando estava com dor no fígado,
tomava o chá pra combater a dor no fígado (Diamante)
F 11 – Boldo
Fonte: Foto da autora
79
Moraes-de-Souza (2007) em seus estudos também descreve que
o boldo é indicado para os casos de má digestão, é útil na litíase biliar e nas
afecções do fígado.
A casca da Quina (Chinchona calisaya) serve para tratar anemias,
fraqueza, falta de apetite e principalmente para febre, em especial a febre causada
pela malária.
F 12 - Casca da quina em pó
Fonte: foto da autora
Durante o tratamento da malária usei os remédios da homeopatia
e também tomava a quina que é amarga e bom para o fígado
(Topázio).
A quina a gente fazia assim... rapa ela, coloca num copo de água
e deixa por 10 a 15 minutos, aí a água fica amarga e a gente
toma para a malária. (Ônix)
Segundo Vale (2005), a quina foi o primeiro medicamento a ser
utilizado para tratar a febre da malária bem como prevenir a doença. Desde então a
planta tem sido utilizada pelas pessoas no tratamento da malária inclusive pelas
pessoas pesquisadas.
O figatil (Vernonia condensata), também chamado de alumã
serve para dor no fígado e má digestão, para o seu preparo se utiliza folhas
frescas ou secas da planta (GOMES et al, 2001).
Para preparar o figatil pega a folha coloca no copo com um
pouquinho de água, amassa e depois toma. O chá era para
fortalecer o fígado. O cara que fazia o teste da malária falava que
o comprimido era forte e prejudicava o fígado. Então pode tomar
muito chá porque líquido é bom (Quartzo).
80
F 13 - Figatil
Fonte : Foto autora
Apesar de as pessoas entrevistadas fazerem uso do figatil para
fortalecer o fígado durante o tratamento da malária, não foram encontrados
trabalhos científicos que comprovem tal ação, mas sim de proteção gástrica
(FISCHMAN et al, 1991).
A salsaparinha (Smilax salsaparrilha) também é conhecida
popularmente como japecanga-do-campo. É um depurativo do sangue, combate a
gota, ácido úrico e reumatismo. Diminui a dificuldade em urinar, elimina pedras nos
rins e bexiga (http://ervasmedicinaispt.blogspot.com). As folhas e os ramos são
indicados como digestivo e para dores estomacais (ALICE et al, 2005).
F 14 – Salsaparilha
Fonte: www.ceunossasenhoradaconceiçao.com.br/plantas.
81
A salsaparinha é depurativa do sangue, mas é próprio para a
malária também. Ela é um mato que dá assim uns cipós e a gente
usa a raiz para fazer o chá (Ametista).
A indicação do uso da salsaparilha pelas pessoas coincide com as
propriedades da planta descritas na literatura.
O sabugueiro (Sambucus nigra) - é utilizado para tratar a febre,
gripe, infecções e outros. As propriedades do sabugueiro no uso medicinal são
consideradas desde a antiguidade, esse arbusto ajuda nas inflamações, é antidiarréico e anti-febrículo (GOMES et al, 2001).
F 15 – Sabugueiro
Fonte: Foto da autora
Tomava o sabugueiro para diminuir a febre, pra baixar a febre,
pra recuperar da malária. Fervia um pouquinho da flor com água
deixava esfriar e depois tomava (Safira).
Em relação ao sabugueiro, as pessoas entrevistadas utilizavamno para tratar especificamente a febre da malária e, não para curar a doença.
Em relação ao Melão de São Caetano (Mormodica charantia L),
são utilizadas da planta as folhas, o fruto e as hastes no preparo do chá. Segundo
Pereira et al (2005), é indicado para tratamento de hemorróidas, erisipela, pruridos
e lesões de pele. Também pode ser utilizado para regularizar o fluxo menstrual,
aliviar a cólica menstrual e abscessos.
82
F 16 - Melão de São Caetano
Fonte: Foto da autora
Tomava o Melão de São Caetano, que eles falavam que era para
o fígado, era amargo. Eu pegava a folha ou raiz, fervia na panela,
deixava esfriar e aí era só beber. É bom para o fígado que fica
doendo. (Ágata).
Tem um que eu usei que é o Melão de São Caetano. A gente
pega a folha e coloca em uma vasilha de ferro (não pode ser de
alumínio) tampada para ferver. Quando está abrindo a fervura,
tira do fogo, aguarda 15 minutos e tira a folha fora. Para tomar o
chá não pode colocar na geladeira. Eu tomava durante todo o dia
aos poucos. Ajudavam no fígado, porque o remédio sempre dá
aqueles negócios no fígado, ele fica inchado e melhorava da
malária (Rubi).
A literatura não faz nenhuma referência quanto ao uso desta
planta para o tratamento da malária. Entretanto, as pessoas a utilizam por acreditar
que auxilia na recuperação do fígado, consequentemente na melhora da doença.
A Caferana (Tachia guyanensis) é utilizada para dor de barriga,
como
anticoncepcional
e
abortivo
na
forma
macerada.
(http://www.ufmt.br/agtrop/revista7/doc/05.htm).
A gente sempre tomava coisa amarga: caferana, boldo tomava
esses remédios do mato. Amassava numa vasilha, colocava água
e tomava. O remédio do mato sempre é bom e ajuda abrir o
apetite. (Ônix).
83
F 17 – Caferana
Fonte: Foto da autora
Embora este relato não possua nenhuma relação com as
propriedades da caferana, as pessoas a utilizam por acreditar que estimula o
apetite minimizando assim a fraqueza, um dos sintomas da malária.
O preparado do chá Picão (Bidens pilosa) se dá a partir das
folhas e raiz é indicada para a hepatite e a icterícia. Ainda pode ser utilizado no
tratamento renal, gripe, febre, diabetes, dor de estômago e intestino (GUARIMNETO, 2006).
F 18 – Picão
Fonte: www.fiocruz.br/biossegurança/
Eu tomava bebia o chá de picão e tomava banho, pois eu ficava
mais forte. Tomava banho duas vezes por dia. Eles ajudam a
gente a melhorar. O chá é meio ruim, mas tem que tomar duas
vezes por dia. Põe na água a raiz e a folha e bebe. Aqui no sítio
tinha muito (Esmeralda)
84
Tomava chá de picão. Os outros, não sei. Era bom para anemia.
Eu preparava assim: Cozinha a folha e a raiz com dois litros de
água e deixe virar um litro. Coloca o açúcar e depois deixa esfriar
para então tomar, tomava até acabar, porque o picão não faz mal,
pode tomar direto. Ele ajudou porque eu estava com problema de
anemia (Turquesa)
O picão é para o amarelão. Depois que dá a malária, a gente fica
muito amarelo, então daí é pra tirar o amarelão da gente
(Diamante)
Segundo Armond et al (2005), o picão tem o princípio ativo
fenilacetileno que reduz a parasitemia da malária.
Como se observa nesses relatos as plantas na forma de chá são
muito utilizadas pela comunidade para o tratamento de doenças de maneira geral
inclusive da malária.
Segundo Kleinman (1988) o uso de chás é uma forma de cuidado
informal compartilhado entre familiares, amigos, vizinhos, porém não reconhecido
pelo sistema de cuidado profissional, que é sustentado na ciência médica e aponta
para a necessidade que temos, enquanto profissionais de saúde, de reconhecer e
valorizar as formas de cuidado compartilhadas no seu grupo aproximando assim da
sua realidade, seus valores e suas crenças individuais e coletivas.
O cuidado terapêutico não pode ser somente prescritivo, com
regras a serem cumpridas, mas dialogado abrindo assim possibilidades de se
preservar, acomodar ou repadronizar cuidados.
Para Sena et al ( 2001) é freqüente o uso de chás como terapia
complementar à medicação antimalárica em decorrência de costumes tradicionais
do meio familiar e/ou comunitário e das facilidades locais para o cultivo e
disseminação dessa prática. .
Segundo Loyola (1994, p. 138) o repasse dessas informações
resultam basicamente de experiências já vivenciadas pela família, por vizinhos ou
por moradores da comunidade onde estão inseridos e que essas trocas favorecem
a constituição de um “fundo comum” de experiências e conhecimentos terapêuticos
(LOYOLA, 1994, p. 138). Às
pessoas pesquisadas, as receitas dos chás são
repassadas pelos avós, pais, tios e vizinhos. Isto revela a dinamicidade da cultura,
ou seja, a cultura não se limita a determinado espaço de tempo e lugar, mas se
transmite de geração a geração.
85
Estudos realizados por Nogueira (1984) na região de São Paulo,
no período de 1979 a 1971, são semelhantes aos achados desta pesquisa, pois as
informações sobre a utilização de plantas medicinais também foram repassadas por
familiares.
O estudo desenvolvido por Luz (2001) no Estado de Roraima
também identificou que o conhecimento sobre plantas medicinais tinha origem na
tradição familiar passada por pais e avós.
No Brasil é comum a troca de receitas que utilizam plantas no
processo de cuidar, geralmente essas fórmulas são elaboradas por pessoas mais
idosas que tiveram a oportunidade de experimentar, testar e aprovar essas receitas
(MACIEL; GUARIM NETO, 2006).
Cuidados com a alimentação
Outro cuidado popular utilizado pela comunidade para auxiliar no
tratamento da malária se refere à alimentação.
A cultura brasileira adota alguns princípios que orientam a forma
como a dieta pode fazer parte do tratamento de doenças e estes geralmente estão
relacionados a restrição/consumo de alguns alimentos, em especial a carne de
porco, peixe e ovos (CARREIRA; ALVIM, 2002).
Isto pode ser observado nas falas das pessoas entrevistadas, que
reforçam a necessidade de manter uma dieta “leve” e de se evitar a “comida
remosa”4 que são as carnes de caça, carne de porco, ovo, peixe, leite e pimenta.
Quando a gente tá com malária não tem apetite pra comer nada,
mas coisa remosa não pode comer. Por exemplo, comer, ovos
pimenta, peixe, coisa gordurosa, bolinho pingado na banha. Acho
que faz mal para o fígado. (Ônix)
Não tomava leite. Por causa do fígado, porque ataca o fígado e
por isso leite a gente não toma. Sei lá. (Turmalina)
4
Comida remosa - termo utilizado na região para se referir a comida “pesada”, gordurosa e
“quente” de difícil digestão, que prejudica o fígado e agrava os problemas de saúde,
inclusive a malária.
86
Depende da comida, banha de porco, carne de porco. Faz a
malária voltar. Se não cuidar ela volta porque carne de porco é
comida remosa, faz mal. (Diamante)
A gente tem que guardar dieta. Não pode comer carne de porco.
Nem abobrinha você pode comer, porque volta a malária. Não
sara, você toma o remédio e a malária fica no fígado da gente. Aí
você tem que guardar dieta. (Granada)
A carne de porco e ovo faz mal, porque é muito remosa, muito
pesada, prejudica mais o fígado da gente. (Diamante)
Além dos alimentos considerados remosos, os ácidos como o
abacaxi e as bebidas alcoólicas também deveriam ser evitados, pois prejudicam o
fígado e, conseqüentemente o tratamento da malária.
O abacaxi a gente não deve comer, a laranja e o limão porque
esses a gente percebe que eles ficam assim queimando na boca
do estomago. Parece que o comprimido deixa o estomago da
gente sensível. Então aí já ataca (Alexandrita).
Tem que deixar de tomar bebida alcoólica e evitar o abacaxi,
porque é muito ácido e faz mal. Leite não tomava também.
Melancia, se já estava com malária e ela ainda não manifestou e
chupar melancia, ela manifesta. Ela revolta o fígado. Caldo de
cana também, se tomar a malária manifesta. Não pode leite
porque dizem que o leite é muito gorduroso. É deve ser por isso
que faz mal para o fígado (Ametista).
Não podia bebida de álcool nada e mais um monte de coisa que
não poda tomar. Porque se tomasse o remédio perdia o efeito. Só
podia era chá, água (Safira).
A bebida alcoólica não pode também. Não combina com o
remédio. Se tomar pode até morrer. A gente já viu né? Está com
malária toma o remédio e mais a cachaça e aí morre (Turquesa).
Segundo Guarim Neto (2006), a alimentação é capaz de retardar
a cura ou ocasionar doenças. As carnes de caça e de peixe ditas como remosas
com freqüência estão relacionadas com enfermidades de pele e estômago
A carne de porco, carne de caça de jeito nenhum, não pode.
Bebida alcoólica não pode e nem peixe. (...) Se você tem um
machucado, uma ferida e come carne de caça que é uma comida
remosa, a gente diz que a ferida vai voltar. Ela deve fazer mal
para o fígado (Ametista)
87
Segundo Canesqui e Garcia (2005) a alimentação é indispensável
para a vida e sobrevivência do ser humano, esta é modelada e influenciada pela
cultura impondo normas que prescrevem, proíbem ou permitem o que comer, ou
seja, cada cultura define quais são as substâncias que podem ou não ser
consumidas, embora essas definições omitam, às vezes, alimentos que de fato são
nutritivos.
Para Daniel e Cravo (2005) a proibição de certos alimentos está
presente nos diversos grupos sociais é norteada por regras, carregadas de
significados que se apóiam na observação e experimentação. Por isso, não devem
ser considerados irracionais ou desprovidos de uma lógica, mas valorizadas e
apreendidas pela riqueza que as informações contêm.
Essas regras foram identificadas em vários relatos das pessoas
pesquisadas.
O médico falava que podia comer de tudo, mas o rapaz lá depois
que fazia o exame falava que não podia comer carne de porco,
carne de bicho, gordura de porco. O resto da comida era normal.
Mas muita coisa a gente não conseguia comer. Nesse caso eu
acho que o médico estava errado e o rapaz certo, porque o fígado
está ruim e a malária ataca o fígado. Então se você come a carne
do porco o fígado vai ter que trabalhar mais que se comer um
arroz, uma sopa (Quartzo)
O pessoal [pessoas da comunidade] falava que se comer alguma
coisa que faz mal pro fígado só dá problema (Granada)
Não pode comer comida remosa porque ataca o fígado e a malária
tá no fígado (Ametista).
Se o fígado ta ruim, a malária ataca o fígado. (Quartzo).
Acho que a comida remosa faz mal para o fígado e a malária está
no fígado (Ônix).
Nota-se que o cuidado com a alimentação reforça a valorização
de seus costumes, das informações repassadas e preservação de seus hábitos
alimentares, levando-as a desconsiderar outras culturas.
Os relatos revelaram que algumas práticas de prevenção e cura
de doenças adotadas pela comunidade não estão fundamentadas em explicações
lógicas, mas pela crença de que a malária está no fígado. Assim, os grupos vão
estabelecendo normas e definindo caminhos para enfrentar as situações
88
vivenciadas no seu cotidiano, ou seja, buscam na identidade cultural a coerência
para suas práticas de cuidado (AZEVEDO, 1998).
A homeopatia como terapia alternativa.
Dentre as pessoas participantes da pesquisa, duas afirmaram não
terem utilizado os medicamentos preconizados pelo MS para o tratamento da
malária. Ao adquirirem a doença, optaram por fazer o tratamento alternativo
chamado por eles de “homeopático” oferecido pela Pastoral da Saúde cujo
diagnóstico da malária é realizado pelo método bioenergético.
Na pastoral é assim, através da energia. Não sei se vocês nunca
viram fazer. Usa um araminho. Não tem lâmina. Porque lá [na
pastoral] tem as apostilas com as figuras das doenças e aí você
vai colocando a Mao em cima das figuras. Esse exame é feito por
duas pessoas e então a gente sabe se está com malária
(Ametista).
A Pastoral da Saúde é uma organização cívico-religiosa, sem fins
lucrativos atuando de forma solidária, comunitária e político-institucional por meio
de ações que visam à promoção e prevenção da saúde. No município de Juruena
esta organização realiza o diagnóstico e tratamento de doenças, inclusive da
malária.
Tomazzoni; Negrelle; Centa (2006) relatam em seus estudos que
as pessoas acreditam no poder da cura dos produtos naturais fornecidos pela
Pastoral da Saúde, pois confiam nesse tratamento por apresentar redução dos
efeitos colaterais em relação aos alopáticos, embora a resposta terapêutica seja
mais lenta.
Eu nunca senti o gosto do remédio da SUCAM. Tratei tudo com o
remédio homeopático e chá caseiro. (Topázio)
A crença no tratamento proporcionado pela Pastoral da Saúde à
terapêutica tradicional da malária orientou a escolha desses moradores de Juruena.
Sena et al (2006) complementa dizendo que plantas medicinais contribuem para a
89
melhoria da saúde e estão ligadas diretamente as crenças, valores, conhecimentos
e práticas vivenciadas pelas pessoas.
Ele é um remédio que demora curar e se recuperar, porque ele
cura lentamente. A malária vence assim. Eu acredito. Para mim é
o melhor tratamento. (Topázio)
Um dos elementos culturais presentes na terapêutica homeopática
é a crença/fé de que o medicamento possa realizar a cura da malária. Para
Casarim; Heck e Schwartz (2005) a fé na homeopatia auxiliará no tratamento no
sentido de aumentar sua eficácia, objetivando a cura da doença.
A fé religiosa é um recurso com diferentes conotações que ajuda a
pessoa com determinada doença e seus familiares a vivenciarem essa nova
situação. Por meio de rituais religiosos, as pessoas esperam alcançar poderes e
verdades que não podem ser alcançadas pelo esforço consciente (MARUYAMA,
2002, p. 201).
Laplantine (1991, p. 173) define a homeopatia como uma das
formas de terapia alternativa cujo princípio da cura deve ser buscado no interior das
pessoas estimulando as defesas do organismo para produzir anticorpos. Assim esta
terapia é mais ativista que a alopata, pois leva em consideração o potencial de
autodefesa das pessoas, o que implica na participação ativa do doente no processo
de recuperação da saúde.
F 21 – Armário para guarda de medicamentos homeopáticos.
Fonte: Fotos da autora
90
F 23 – Própolis – medicamento Homeopata
Fonte: Fotos da autora
Como se observa existe na cultura dessas pessoas a crença de
que existem várias formas de se tratar a malária.
Dentre elas, o tratamento
homeopático apontado como uma alternativa ao tratamento preconizado pelo MS
considerado “muito forte” (Amestista).
Segundo Casarim; Heck e Schwartz (2005) as terapias não
convencionais utilizadas pelas pessoas durante o desenvolvimento da doença
refletem a necessidade de se tornarem sujeitos participativos do tratamento e cura
dos seus males. Sua escolha muitas vezes é influenciada pelo contexto em que
vive, ou seja, o tipo de assistência prestada e disponível na região ou ainda pelo
custo do atendimento cobrado pela assistência prestada.
Para as autoras as terapias alternativas acontecem informalmente
e são mais baratas, uma vez que utilizam plantas que produzem substâncias
químicas que podem ser usadas como remédio.
Portanto, as pessoas para enfrentarem seus problemas utilizam
de diferentes estratégias num processo de apropriação e construção de saberes
(SIQUEIRA et al, 2006). Essas pessoas que utilizam os cuidados da Pastoral da
Saúde não se preocupam com a comprovação científica dos recursos utilizados no
tratamento da malária, mas sim com as respostas às suas necessidades em
determinado momento.
A primeira discussão sobre o uso da terapia complementar e
alternativa no campo da saúde pública ocorreu em 1978 durante a Conferência
Internacional de Cuidados Primários em Saúde em Alma-Ata no Cazaquistão.
91
Posteriormente, as práticas alternativas de assistência à saúde
foram regulamentadas no âmbito da rede dos serviços públicos de saúde. Em
março de 1988 a Comissão Interministerial de Planejamento e Coordenação
(CIPLAN) emitiu a Resolução CIPLAN nº. 05 que definiu diretrizes, procedimentos e
rotinas para a implantação de serviços de acupuntura e técnicas alternativas nos
serviços públicos de saúde.
No entanto ainda era preciso implantar uma Política Nacional de
Terapias Alternativas e Complementares no SUS a qual foi efetivada pela Portaria
Ministerial nº. 971 de 03 de março de 2006 (BRASIL, 2006d), que regulamentou os
serviços de acupuntura, homeopatia, fitoterapia, entre outros.
Mas, embora a homeopatia seja reconhecida como terapia
alternativa, ainda não está comprovada sua eficácia na cura da malária. Entretanto,
pode ser considerada como coadjuvante no tratamento, pois assume uma postura
holística e naturalística diante da saúde e da doença (QUEIROZ, 2000, p. 367)
Portanto, os profissionais de saúde devem acompanhar essas
pessoas, buscando repadronizar suas práticas de cuidado para não se
transformarem em reservatórios da doença uma vez que a cura da malária só pode
ser comprovada com exames laboratoriais (lâmina de verificação de cura)
realizados após o término do esquema terapêutico instituído.
Como se observa, a cultura pode atuar de diversas maneiras na
vida de uma pessoa. Na saúde, ela influencia o seu significado e valor no cuidado,
por isso, compreender o processo saúde-doença é um desafio instigante para os
profissionais da área. Estes no momento de prestar o cuidado devem levar em
consideração não somente as práticas individuais, mas, procurar entendê-las
enquanto práticas culturais (AZEVEDO, 1998).
Desta forma fica evidente a necessidade dos profissionais de
saúde conhecer como as pessoas vivem seus valores, suas crenças, seus
costumes, para que possamos compreender o processo saúde-doença dessa
comunidade (TOMAZZONI; NEGRELLE; CENTA, 2006).
92
CAPÍTULO 6
CONSIDERAÇÕES FINAIS
93
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste capítulo apresentamos o caminho percorrido para a
construção da pesquisa, o alcance dos objetivos propostos, a síntese das principais
reflexões empreendidas, os limites do estudo, suas implicações para o estado e
profissionais de saúde local, bem como as suas contribuições.
Compreender a cultura e a forma como esta pode influenciar no
cuidado de saúde das pessoas com malária em uma determinada comunidade,
exigiu muito estudo e leituras aprofundadas sobre a temática, pois o contexto
cultural influencia as pessoas quanto ao seu modo de ser, de agir e de cuidar da
saúde.
A cultura vem sendo cada vez mais explorada pelo profissional
enfermeiro, pois segundo Leininger (1978) só com a compreensão e valorização
dos aspectos culturais é possível realizar um cuidado cultural humanizado. Para a
autora, o cuidado cultural é uma forma eficiente e gratificante de cuidar, uma vez
que é adaptada ao contexto das pessoas.
Segundo Dias; Araújo e Barroso (2001) o cuidar requer
observação direta, experiência participativa e reflexiva podendo ser evidenciado por
meio de expressões, ações, padrões, estilo de vida e significados.
Entretanto, para compreender a influência da cultura no cuidado
desenvolvido pelas pessoas acometidas por malária foi preciso conhecer os
aspectos históricos e epidemiológicos da doença, sua forma de transmissão,
medidas preventivas, tratamento indicado, políticas de governo para o controle da
malária nas esferas federal, estadual e municipal, em particular a estratégia
utilizada pelo governo do Estado de Mato Grosso para o controle da endemia
ocorrida no município de Juruena. Ainda nos apoiamos nos conceitos de cultura,
cuidado e na Teoria do Cuidado Cultural de Leininger especialmente nas ações de
preservação, acomodação e/ou repadronização de cuidado.
Em relação aos objetivos propostos para o estudo podemos dizer
que estes foram alcançados. Ao descrever a rede de saúde e sua organização para
o diagnóstico e tratamento da malária no município de Juruena identificamos que:
•
As pessoas não obedecem ao fluxo de atendimento estabelecido pelo MS,
pois ao invés de buscarem o primeiro atendimento na atenção básica (USF, UBS)
94
se dirigem para o nível terciário (hospital) ou órgãos administrativos ligados à SMS,
como por exemplo, o setor de Vigilância Ambiental e de Endemias.
•
No geral, as pessoas possuem conhecimentos sobre a malária em relação
aos sinais e sintomas, diagnóstico, formas de transmissão, tratamento e medidas
de prevenção individuais e coletivas. Estas informações são repassadas por
profissionais de saúde, familiares, vizinhos e pela própria comunidade.
•
Apesar desses conhecimentos, as pessoas lidam com a malária como se
fosse uma doença “comum” sem complicações significativas, chegando a ser
comparada à gripe. Isto se tornou mais visível durante as entrevistas quando
referem saber o que deve ser feito para prevenir a malária, mas na prática cotidiana
isso não é realizado.
Em relação às práticas de cuidado desenvolvidas pelas pessoas
para cuidar da malária verificamos que estas estão diretamente relacionadas ao
uso de chás (boldo, figatil, caferana, sabugueiro, picão, salsaparilha, quina e melão
de São Caetano), cuidados alimentares (restrição de alimentos remosos, ácidos e
bebidas alcoólicas) e utilização de tratamento alternativo – a Homeopatia,
desenvolvida pela Pastoral da Saúde.
O uso da terapia complementar ao medicamento antimalárico
preconizado pelo MS tais como uso de chás e restrições alimentares é freqüente. A
justificativa para sua utilização tem como foco o cuidado com o fígado, órgão que
sofre a ação dos medicamentos e que causam desconfortos gástricos como
vômitos, náuseas, diminuição do apetite, além das experiências repassadas por
pessoas, que tiveram malária e utilizaram terapia complementar. Portanto, são
práticas carregadas de valores culturais.
A homeopatia é uma terapia muito utilizada pela comunidade não
só para o tratamento da malária, mas também para tratar outras doenças a ponto
de substituir a terapêutica medicamentosa recomendada pelo MS. Sendo assim, é
preciso que os profissionais de saúde estejam atentos às possíveis conseqüências
que o uso da homeopatia como tratamento exclusivo para a malária possa causar,
pois cientificamente não há nenhuma comprovação de cura da malária utilizando
essa terapêutica. Assim essas pessoas correm o risco de tornarem foco infeccioso
da doença.
Aproximando esses achados da Teoria do Cuidado Cultural
podemos dizer que os profissionais de saúde do município de Juruena no
desenvolvimento de suas atividades têm preservado e /ou acomodado cuidados
95
relacionados ao tratamento da malária, pois além de distribuir e acompanhar o uso
da medicação antimalárica estimulam o uso de chás e dietas para auxiliar no
tratamento da doença. No entanto, necessitam repadronizar as formas de cuidar
das pessoas que utilizam a homeopatia como terapia alternativa à alopática
(Terapia antimalárica preconizada pelo MS).
Este estudo revelou a influência que a cultura exerce na vida das
pessoas, determinando a forma de olhar o mundo, de se relacionar com o outro e
de cuidar de sua saúde e da malária, que as práticas de cuidados profissionais não
podem ser distanciadas do contexto sociocultural de seus clientes. Nesse sentido
Leininger (1978) afirma que enfermeiro deve conhecer/ se aproximar da cultura das
pessoas às quais cuida, para realizar um cuidado cultural coerente, implementando
ações de preservação, acomodação e/ou repadronização nas formas de cuidar de
tal maneira que os significados culturais possam ser respeitados e valorizados.
Prestar o cuidado valorizando a cultura das pessoas é uma meta a
ser alcançada pelos profissionais de saúde, visto que exige de cada um de nós um
exercício de desconstrução de conceitos e práticas de cuidado que são
hegemônicas apoiadas na ciência, pois o processo saúde-doença não se limita à
dimensão física, mas também a dimensões sociais e culturais de cada pessoa e
portanto deve ser reconhecida no sistema de cuidado profissional.
As políticas de saúde voltadas ao combate e controle da malária
no Brasil e em Mato Grosso nos últimos anos têm buscado maior aproximação com
as realidades de cada região considerada endêmica para a malária, porém a
preocupação com os aspectos culturais das pessoas residentes nessas áreas é
incipiente.
Assim, o estudo aponta para a necessidade de reorientação das
práticas de cuidado e de pesquisas com o objetivo de aprofundar o conhecimento
sobre os cuidados populares desenvolvidos pelas pessoas em relação aos demais
problemas de saúde.
Esperamos que este trabalho possa auxiliar os profissionais de
saúde a refletirem sobre suas práticas de cuidado de forma mais abrangente, ou
seja, a partir de um olhar antropológico, onde conhecer o mundo das pessoas,
entender suas práticas, crenças e valores diretamente relacionados ao seu
processo de cuidar tenham impacto positivo no processo de promoção, prevenção
e recuperação da saúde sem que ocorram choques culturais
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106
APÊNDICES
107
APÊNDICE A
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO: MESTRADO EM ENFERMAGEM.
ROTEIRO DE ENTREVISTA
1 – Idade
( )18 a 30anos
2 – Sexo
( )Feminino
( )31 a 45anos
( )46 a 60anos
( )acima de 60 anos
( ) Masculino
3- Cor (Declarada)
( )Branca ( )Parda
(
)Negra (
)Amarela
4 – Estado Civil
( )Casado ( )Solteiro ( ) separado
( )Vermelha
( )viúvo ( )Amasiado
5 – Atividade principal nos últimos 15 dias
( )Agricultura ( )Pecuária ( )Turismo ( )Garimpagem ( )Viajante
( )exploração vegetal ( )pecuária ( )caça/pesca ( )mineração
( )construção de estrada/barragem
6 - Grau de escolaridade
( )Analfabeto
( )1º grau incompleto
( )1º grau completo
( )2º grau incompleto ( )2º grau completo ( )3º grau incompleto
( )3º grau completo.
7 – Religião: _____________________
Questão norteadora:
Conte como o senhor(a) pegou malária e como lidou com ela.
Atentar para:
Como a pessoa cuida de sua saúde
Como tratou ou acha que deveria tratar a malária
Atentar para crenças acerca da malária e detalhá-las.
108
APÊNDICE B
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO: MESTRADO EM ENFERMAGEM.
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado(a) a participar, como voluntário, em uma
pesquisa. Após ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir, no caso
de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento que está
em duas vias.em caso de recusa você não será penalizado(a) de forma
alguma. Em caso de dúvidas você pode procurar o Comitê de Ética em
Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Muller da Universidade Federal de
Mato Grosso pelo telefone (65)3615-7254.
INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:
Título do projeto:
A influência das práticas populares no cuidado com a malária no município
de Juruena - MT.
Pesquisadoras responsáveis:
Patrícia da Silva Ferreira e Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo.
Telefones para contato (inclusive a cobrar): (65) 3621-1657.
Objetivo principal do estudo: Analisar a influência das práticas populares
no cuidado desenvolvido pelas pessoas acometidas por malária no
município de Juruena – MT.
Detalhamento dos procedimentos: A informações serão colhidas através
de uma entrevista gravada, utilizando gravadores digitais de voz. Neste
momento da entrevista podem ocorrer desconfortos, pois a pessoa falará
“um pouco de si”. Esta pesquisa não oferece nenhum benefício direto, mas
estará colaborando na elaboração de estratégias políticas para o controle e
tratamento da malária. Não será oferecido nenhum tipo de ganho financeiro,
bônus ou gratificações. Os dados coletados serão utilizados exclusivamente
neste estudo e o nome da pessoa entrevistada (identidade) será mantida em
sigilo. O entrevistado poderá deixar de participar deste estudo a qualquer
momento.
Patrícia da Silva Ferreira
Pesquisadora
109
CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA NA PESQUISA
Eu, ____________________________________, RG/CPF______________,
concordo em participar do estudo “A influência das práticas populares no
cuidado com a malária no município de Juruena – MT”, como sujeito do
estudo. Fui devidamente informado e esclarecido pela pesquisadora Patrícia
da Silva Ferreira sobre a pesquisa, os procedimentos nele envolvidos, assim
como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação.
Foi-me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento,
sem que isto leve a qualquer penalidade ou interrupção de meu
acompanhamento/ assistência/tratamento.
Local e Data: Juruena, ____ de _________ de 2007.
_____________________________________
Nome e assinatura do participante ou responsável:
Observações complementares:
Em caso d e necessidade, entre em contato com Patrícia da Silva Ferreira,
na Av. Afonso Pena, 1222, a1, 301, despraiado. Cuiabá-MT.
Telefone:(65)3621-1657. E-mail: [email protected]. Caso necessite
poderá ligar a cobrar. Informações sobre o projeto fazer contato com o
comitê de ética em pesquisa do HUJM: (65)3615-7254.
110
ANEXOS
111
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patrícia da silva ferreira a influência das práticas populares no