GESTÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS COM A PARTICIPAÇÃO DE CATADORES: RELATO DE TRÊS CASOS DE BOAS PRÁTICAS NO BRASIL Saffer, M., Dr. Eng.º Químico - [email protected] Engebio Engenharia e Meio Ambiente Ltda. Rua João Abbott, 482 90460-150 – Porto Alegre – RS Izawa, M. K., Bióloga. – [email protected] Engebio Engenharia e Meio Ambiente Ltda. Rua João Abbott, 482 90460-150 – Porto Alegre – RS Duarte, G. A. A., Eng.º Químico. – [email protected] Engebio Engenharia e Meio Ambiente Ltda. Rua João Abbott, 482 90460-150 – Porto Alegre – RS Britz, E. B., Téc. Ambiental e graduando em C. Sociais. – [email protected] Engebio Engenharia e Meio Ambiente Ltda. Rua João Abbott, 482 90460-150 – Porto Alegre – RS Resumo: Visando divulgar e promover a troca de experiências relacionadas à gestão integrada de resíduos sólidos foi celebrado um convênio entre o Brasil e a Espanha e desenvolvido o “Manual de boas práticas em gestão de resíduos sólidos intermunicipais, com a inclusão de catadores”, através da Secretaria de Gestão (SEGES), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP), com Agência Espanhola de Cooperação Internacional e Desenvolvimento (AECID), sistematizando informações sobre gestão consorciada, tecnologias para a reciclagem, comercialização de produtos recicláveis e modelos de financiamento, com foco no diagnóstico da situação atual do Brasil e Espanha em relação à reciclagem, comercialização e atuação de catadores e consórcios intermunicipais de RSU, assim como sua forma de atuação, com estudos de boas práticas. Este artigo apresenta três casos de boas práticas em gestão de resíduos sólidos com destaque e reconhecimento em nível nacional no âmbito político, econômico e social. O levantamento de dados foi realizado através de visitas às unidades, entrevista, aplicação de um questionário previamente estruturado contendo questões sobre o histórico de formação, parcerias importantes, gestão, aspectos técnicos, de inclusão social e de recuperação e comercialização de materiais recicláveis, entre outros. A partir da analise de pontos fortes e pontos fracos de cada iniciativa selecionada e estudada, elencaram-se os principais pontos fortes os quais resultaram em destaques no âmbito de sua analise: político, social ou econômico. Keywords: Boas práticas, resíduos sólidos urbanos, reciclagem, catadores, inclusão social. Pg 1 Pg 1 MUNICIPAL SOLID WASTE MANAGEMENT WITH THE PARTICIPATION OF WASTEPICKERS: REPORT OF THREE CASES OF GOOD PRACTICE IN BRAZIL Abstract: In order to make the experiences exchange related to integrated solid waste management known and promote them, it was firmed an agreement between Brazil and Spanish and developed the “Good practices guide in solid waste management between cities, considering wastepickers inclusion”, through the Management Secretary (SEGES, Brazil) and the International Development Cooperation Spanish Agency (AECID, Spain), systematizing information about consortium management, recycling technologies, recyclable products sale and financial models , focusing on the diagnosis of the current recycling situation in Brazil, as well as trading and proceedings of wastepikers and consortiums between cities related to urban solid waste, even as the way they operate. This study presents three good practices cases about solid waste management recognized at a national level in the political, economic and social context. The survey was conducted by visiting wastepickers units, interview people and applying to them a questionnaire containing questions about the training history, important partnerships, management, technical aspects related to social inclusion and recyclable materials recovery and trading, among others. From strengths and weaknesses analysis of each selected and studied case, the main strengths have been chosen, which had their political, social or economical analysis emphasized. 1. INTRODUÇÃO O crescimento das cidades, a elevada concentração populacional e a expansão das áreas urbanas, associados ao atual modelo de produção e consumo, são fatores que têm contribuído para a formação de um cenário urbano com diversos impactos sociais e ambientais negativos, intimamente relacionados à geração de resíduos sólidos urbanos e ao seu gerenciamento inadequado. Os catadores de materiais recicláveis, informais ou organizados em cooperativas ou associações, vêm participando intensamente da cadeia produtiva de materiais recicláveis secos desde a fase de coleta, triagem, até seu beneficiamento primário. Em grandes centros urbanos, onde a densidade populacional é elevada, a taxa de geração per capita de Resíduos Sólidos Urbanos (RSU) é aumentada (entre 0,8 e 1 kg por habitante/dia) e composta por um percentual acentuado de materiais recicláveis secos passíveis de recuperação. O déficit de empregos formais, as precárias condições de trabalho, e baixos níveis de escolaridade e rendimento per capita, configuram desigualdades sociais agravantes que resultam no crescimento de trabalhadores informais e a expressiva atuação de catadores neste cenário. Visando a modificação desta situação no Brasil, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecida através da Lei 12.305/2010, prevê e o incentivo às organizações de catadores, assim como a participação formal destas na gestão integrada dos resíduos sólidos urbanos nos municípios e também na cadeia produtiva. Com o intuito de divulgar e promover a troca de experiências relacionadas à gestão integrada de resíduos sólidos foi celebrado um convênio entre o Brasil e a Espanha e desenvolvido o “Manual de boas práticas em gestão de resíduos sólidos intermunicipais, com a inclusão de catadores”, através da Secretaria de Gestão (SEGES), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP), com Agência Espanhola de Cooperação Internacional e Desenvolvimento (AECID), sistematizando informações sobre gestão consorciada, tecnologias para a reciclagem, comercialização de produtos recicláveis e modelos de financiamento, com foco no diagnóstico da situação atual do Brasil em Pg 2 Pg 2 relação à reciclagem, comercialização e atuação de catadores e consórcios intermunicipais de RSU, assim como sua forma de atuação. No âmbito da Subvenção “Fortalecimiento de las instituciones Públicas Brasileñas para la Prestación de Servicios Públicos de Calidad – 2011 (Cap. IV) 03000924/1754/11" o presente documento finaliza o contrato e apresenta o Manual de boas práticas de gestão de resíduos sólidos urbanos com a participação dos catadores. 2. METODOLOGIA Durante a primeira etapa do desenvolvimento deste estudo, foi realizado o levantamento de dados e elaboração do diagnóstico da situação nacional dos resíduos sólidos com enfoque na gestão, inclusão social e comercialização de materiais recicláveis e o levantamento de “boas práticas” existentes no país. Inicialmente foi realizada a busca de informações secundárias de boas práticas em evidência no Brasil focando organizações de catadores e a gestão governamental. Através de quadro comparativo de informações. A partir deste levantamento foram pré-selecionadas as práticas de maior relevância. As práticas das diferentes regiões foram analisadas através de critérios como: serviços executados, abrangência das ações, existência de ações sociais, existência de entidades parceiras, verificação de financiamentos, prêmios e histórico de sua formação e continuidade. Esta primeira etapa resultou em 13 casos de destaque. Dentre as práticas brasileiras, é evidente o destaque de boas práticas existentes na região sudeste, seguida pela região sul devido ao maior desenvolvimento socioeconômico destas regiões; o que foi ainda confirmado após contatos diretos com especialistas locais. Este fato é diretamente relacionado às diferenças regionais do país em relação ao desenvolvimento econômico e social. Para validar e orientar a seleção das boas práticas a serem apresentadas no Manual, após o levantamento de dados secundários foram realizados contatos com gestores municipais, ABES, pesquisadores e professores de universidades das regiões: sul, norte, nordeste, centro oeste, sul e sudeste para a verificação da atual situação das práticas selecionadas, o que auxiliou e resultou em uma pré-seleção de uma série de práticas em destaque. Após esta segunda etapa de avaliação e a consolidação com a coordenação do contrato, foram selecionadas para o Manual três casos que formam considerados com maior representatividade e abrangência dentro da temática deste estudo: Um Consórcio Intermunicipal, uma Cooperativa de Catadores e uma Rede de Cooperativas. Na Tabela 1 são apresentados os casos de Boas Práticas selecionados para o Manual, de acordo com o aspecto de maior relevância e destaque: político, econômico e social. Tabela 1 Casos de boas práticas escolhidos para o estudo. Tipo Político: Consórcio público intermunicipal Econômico: Rede de comercialização de recicláveis Social: Cooperativa de catadores de recicláveis Identificação CIGRES - Consórcio Intermunicipal de Gestão de Resíduos Sólidos. Cooperativa Central de Reciclagem REDE SOLIDÁRIA CATA-VIDA CARE - Cooperativa dos Agentes Autônomos de Reciclagem de Aracaju. Localização Região de Seberi, Rio Grande do Sul – Região Sul Região de Sorocaba, São Paulo – Região Sudeste Município de Aracajú, Sergipe – Região Nordeste Elaboração: Engebio, 2013. A partir da definição dos casos de boas práticas a serem estudados, foi realizado o contato direto com a coordenação das instituições selecionadas para apresentar o presente projeto e convidálos oficialmente para integrar este manual. Após o aceite, foram realizadas visitas técnicas de dois dias em cada instituição para a busca de informações e conhecimento de instalações, e entrevistas com pessoal envolvido na administração e operação. Em cada região foram realizadas visitas complementares para a contextualização da prática e complementação de informações em instituições parceiras como ONGs e Ministério Público. Para a padronização no levantamento de informações, foi Pg 3 Pg 3 elaborado um “check list” de informações a serem obtidas, o qual serviu de roteiro para as entrevistas e foi disponibilizado antecipadamente à administração das entidades a fim de esclarecer o teor das informações solicitadas e auxiliar no envio de dados complementares posteriormente às visitas. Em Aracajú, em complementação à contextualização e conhecimento da situação local, foram realizadas visitas à instituição social mantida pela Cooperativa CARE e ao lixão encerrado. Em Sorocaba foram realizadas visitas em diferentes instalações de operação da Rede Cata Vida e CORESO. 3. RESULTADOS A seguir são apresentados os resultados obtidos para cada caso específico. 4.1 Âmbito político O CIGRES – Consorcio Intermunicipal de Gestão de Resíduos Sólidos, com sede no Município de Seberi (10.897 habitantes. IBGE, 2010), Estado do Rio Grande do Sul, é formado por 29 municípios de pequeno porte, atendendo a uma população total de 172.728 habitantes. O consórcio é caracterizado por ser formado por municípios de pequeno porte, com menos de 4 mil habitantes, e cerca de metade da população localizada em zona rural. Os municípios integrantes do consórcio localizam-se em um raio de 60 km da sede do CIGRES em Seberi. A sede do CIGRES ocupa uma área total de 7,77 hectares de propriedade do município de Seberi, sendo que cerca de 3,5 ha de área utilizada. Há estudo de se adquirir uma área lindeira para expansão do aterro sanitário ou outras instalações em estudo de viabilidade. Devido às características socioeconômicas da região onde está inserido o consórcio, não existem nesta região catadores de recicláveis autônomos com principal atividade e fonte de renda a catação de materiais recicláveis. O desemprego ocorre principalmente na entre safra, mas não há interesse da população por atuar na atividade de catação de materiais recicláveis ou formar associações/cooperativas de catadores. Frente a esta realidade, a forma de contratação de funcionários para o consórcio através de concurso público é um diferencial, pois apesar de o trabalho não ser atrativo, o consórcio oferece estabilidade de emprego e garantia de direitos trabalhistas. Destaca-se também que há um mecanismo que impede a inadimplência: há um acordo estabelecido entre os municípios do consórcio que autoriza formalmente que os serviços prestados pelo CIGRES sejam diretamente debitados na conta corrente de cada prefeitura consorciada. O consórcio opera atividade de triagem (Figura 1), compostagem e disposição final em aterro sanitário, em sede própria. Figura 1. Esteira de Triagem. Pg 4 Pg 4 A organização dos municípios de forma consorciada garante o aumento de escala e a possibilidade de adoção de alternativas, tecnologias e a contratação de técnicos e serviços especializados que atendam as metas da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Plano Nacional de Resíduos Sólidos, o que não seria viabilizado se estes municípios realizassem sua gestão de forma individualizada devido aos altos custos de instalação e operação de unidades, ausência de técnicos especializados e recursos financeiros do município e geração per capita de RSU insuficientes para adoção de tecnologias adequadas. Apresenta-se na Tabela 2, a seguir, um resumo da analise crítica, destacando aspectos positivos e negativos. Tabela 2 Análise crítica - CIGRES: Aspectos positivos e negativos Aspectos Positivos Identificação Resultados Cobrança de pagamentos municipais (rateio) através de débito em conta da prefeitura. Contratação de trabalhadores através de concurso público Operação própria de planta de triagem, compostagem e aterro sanitário Extinção da inadimplência. Garantia de estabilidade de emprego e direitos trabalhistas. Redução de rotatividade. Planejamento e monitoramento interno do processo. Definição de tecnologias a serem adotadas. Aspectos Negativos Identificação Resultados Quadro pessoal não prevê técnico de nível superior Deficiência nos processos de triagem, compostagem e disposiespecializado para supervisão e coordenação da operação da ção final. planta Recuperação de materiais recicláveis abaixo do potencial esperado Não atendimento de normas, legislações e licença ambiental para operação dos processos. Definição e aquisição de tecnologias e equipamentos sem estudo técnico devido. Inexistência de coleta seletiva nos municípios e triagem direta de resíduos da coleta regular indiferenciada Redução da recuperação de materiais recicláveis. Comprometimento das condições de higiene e segurança dos trabalhadores. Elaboração: Engebio 2013. 4.2 Âmbito Econômico No âmbito econômico, a Rede Solidária Cata-Vida, com sede no Município de Sorocaba (586.625 habitantes. IBGE, 2010), Estado de São Paulo se destaca como uma cooperativa de 2° grau (cooperativa que agrega outras cooperativas) com o objetivo de comercialização conjunta de materiais recicláveis recuperados de cooperativas da região de Sorocaba, agregando valor ao produto através de padronização de procedimentos e processos de triagem e enfardamento, aumento de volume de material recuperado, e beneficiamento de plásticos e óleo. Atualmente Rede Solidária Cata-Vida é formada por 16 cooperativas, reunindo 270 cooperados. A Região administrativa de Sorocaba está localizada à sudoeste do estado de São Paulo, abrangendo 79 municípios com intenso aumento da população nos últimos anos, caracterizando-se como a terceira área de concentração da população do estado Pg 5 Pg 5 Atuando de forma isolada, as organizações de catadores da região eram dependentes dos atravessadores, pois não acumulavam volume suficiente de materiais para comercialização direta com empresas recicladoras, acarretando na venda de materiais a baixos preços, gerando consequentemente a baixa renda aos catadores. A Figura 2 apresenta a Central de Armazenamento e Comercialização da Rede Cata Vida. Figura 2. Central de Armazenamento e Comercialização da Rede Cata Vida. A Rede Cata Vida surgiu como uma rede solidária de comercialização de materiais recicláveis criada com o objetivo de buscar o fortalecimento dos catadores através da comercialização conjunta, da verticalização da cadeia produtiva, da capacitação continuada dos catadores, da educação socioambiental com a população e da articulação de políticas públicas para inclusão e remuneração dos catadores. Desde a sua criação, a Rede Cata Vida criou uma metodologia que vem sendo experimentada e validada ao longo de sua existência. Reconhecida publicamente, é baseada na prática da decisão e da construção coletiva, por meio da realização de reuniões periódicas, oficinas de planejamento e avaliação e cursos de capacitação. A Rede também conta com o trabalho exercido por facilitadores, escolhidos pelas próprias cooperativas para atuarem nas cooperativas. O avanço da Rede Cata Vida no ciclo da cadeia produtiva da reciclagem com o beneficiamento do óleo residual de fritura e dos polímeros PP e PE, além de proporcionar a agregação de valor com valorização do produto e, consequentemente, o aumento da renda dos catadores da Rede Cata Vida, também se tornou referência e tem atraído visitas de todo o país e do exterior para conhecer o processo de beneficiamento dos materiais e o trabalho desenvolvido pelos catadores. O reconhecimento ao trabalho desenvolvido também pode ser verificado através dos prêmios já recebidos: o prêmio EcoPET (2006) promovido pela Associação Brasileira da Indústria do PET, prática classificada na 2ª edição do ODM - Prêmio Objetivos do Desenvolvimento do Milênio Brasil (2007) promovido pelo Governo Federal, PNUD - Programa nas Nações para o Desenvolvimento e Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade, Prêmio CEMPRE (2010). O CEADEC e a Rede Cata Vida receberam também no ano de 2006, representantes da Associação de Empresas Recicladoras da Venezuela, que vieram conhecer a experiência da Rede para implantar projeto semelhante naquele país. Desta visita, a Associação produziu um vídeo em espanhol, divulgando a experiência da Rede e, posteriormente, o CEADEC foi convidado a proferir uma palestra na Universidade Federal das Forças Armadas da Venezuela. Em 2009, o CEADEC foi novamente convidado para participar de seminário de resíduos sólidos promovido por uma corporação vinculada ao Ministério do Poder Popular para Planificação e Desenvolvimento da Venezuela, a qual formalizou pedido de parcerias para a replicação da tecnologia social. Pg 6 Pg 6 A experiência do CEADEC com a Rede Solidária Cata Vida é uma tecnologia social integrante da RTS - Rede de Tecnologia Social e do Banco de Tecnologias Sociais da Fundação Banco do Brasil e está estritamente ligada com os objetivos da Política Nacional de Desenvolvimento Regional pela contribuição com o fortalecimento das organizações sócio-produtivas regionais e pelo fomento a políticas públicas de inclusão social e preservação e conservação do meio ambiente, buscando a melhoria da qualidade de vida na região de Sorocaba. Além do fortalecimento, inclusão e valorização dos catadores de materiais recicláveis no processo da coleta seletiva e triagem dos municípios envolvidos, a rede conquistou e ampliou ao longo dos anos parcerias com o poder público municipal. Uma condição essencial para a atuação em rede é a articulação constante de parcerias com o setor público, com o terceiro setor e a iniciativa privada, tendo em vista: A busca da sustentabilidade dos empreendimentos solidários dos catadores e da rede; O aumento da coleta seletiva nos municípios; A implantação de programas públicos de apoio e fomento à coleta seletiva; O aumento da renda dos catadores; O aumento do volume e da qualidade dos materiais comercializados pela rede; A ampliação do mercado dos materiais recicláveis; A qualificação do trabalho e da saúde dos catadores; A busca e a aplicação de tecnologias que favoreçam o trabalho dos catadores; A participação ativa dos catadores e/ou de suas representações em diferentes fóruns regionais de discussão de políticas públicas ambientais, sociais e de saneamento. Com objetivo de promoção e divulgação das atividades das cooperativas. São realizadas ações de sensibilização e cadastramento de residências em municípios onde as cooperativas associadas atuam na coleta de resíduos recicláveis e periodicamente são agendados mutirões de limpeza chamados de “carrinhadas”, pois inicialmente eram realizadas coletas através de carrinhos de coleta. Atualmente são utilizados os caminhões da Rede Cata Vida. A gestão é realizada de forma direta por um Conselho Administrativo formado por cooperados com a fiscalização de um Conselho Fiscal. A eleição é realizada através de Assembleia Geral por mandatos de 4 anos e não existe remuneração diferenciada pela ocupação de cargos administrativos durante o período de gestão da rede. A Coordenação Regional é formada por representantes de acordo com o número de cooperados da cooperativa associada. O controle de rateio dos recursos das vendas é feito a partir de guias de coleta e transporte de materiais, onde estes são qualificados e quantificados. No repasse já é realizado desconto de manutenção (operação e transporte) da rede de forma igualitária. O rateio entre os cooperados é realizado a critério de cada cooperativa, sem o acompanhamento da Rede Cata Vida. A renda média mensal dos catadores era de R$ 550,00 em 2012. (Salário Mínimo Nacional referência 2012: R$ 622,00). Desde sua idealização, a rede vem beneficiando um número crescente de cooperados ao longo dos anos, sendo um fator importante de integração, agregação e padronização de serviços e produtos dentre as cooperativas associadas, garantindo sua sustentabilidade desde a sua criação, em 1999. Apresenta-se na Tabela 3, a seguir, um resumo da analise crítica, destacando aspectos positivos e negativos. Tabela 3 Análise crítica – Rede Cata Vida: Aspectos positivos e negativos Aspectos Positivos Identificação Gestão realizada por cooperativados com apoio de parceira CEADEC Resultados Auxílio do CEADEC em elaboração de projetos e captação de recursos financeiros, Autonomia de cooperados na resolução de problemas e tomada de decisões. Pg 7 Pg 7 Visão empresarial da rede de cooperativas Troca de experiências entre cooperativas, Resolução conjunta de problemas e decisões em reuniões mensais, Capacitação de cooperados, Aquisição de equipamentos e veículos de uso comum entre as cooperativas, Maior força política, Padronização de controle e gestão das cooperativas associadas, Adoção da identidade da Rede Cata Vida em meios de comunicação e divulgação, Ações conjuntas de sensibilização da população e mutirões de coleta. Comercialização conjunta de materiais recuperados Aumento da escala de produção, Redução de custos de transporte, Padrão de qualidade de produto triado e enfardado, Venda direta para indústria, Possibilidade de maiores ganhos mensais pelos cooperados. Adoção de “Carta de princípios da rede Cata Vida” por Garantia de qualidade dos produtos triados e enfarcooperativas associadas. dados, Adoção de uma única identidade pelas cooperativas associadas, Garantia de direitos e qualidade de condições de trabalho pelos cooperados, Valorização do catador como agente ambiental. Operação de Divisão de Polímeros Agregação de qualidade e valor ao produto comercializado, Venda direta para indústria, Maior participação do catador na cadeia produtiva da reciclagem. Aspectos Negativos Identificação Resultados Apoio deficiente dos municípios Alguns municípios não possuem a coleta seletiva implantada, dificultando a triagem; Não há contrato nem pagamento por serviços prestados pelos catadores; Falta de auxílio sócio-econômico aos catadores. Redução de capacidade de processamento; Diminuição de volume e renda pela venda; Comprometimento na adoção de tecnologias e aquisição de equipamentos adequados. Ausência de profissional técnico especializado para operação e monitoramento de processo de triagem, enfardamento, transporte e beneficiamento de materiais. Elaboração: Engebio 2013. 4.3 Âmbito Social No âmbito social selecionou-se a CARE – Cooperativa dos Agentes Autônomos de Reciclagem de Aracaju, Município de Aracajú (571.149 habitantes. IBGE, 2010), Estado de Sergipe. A cooperativa se originou da necessidade de realizar inclusão social de catadores após o fechamento do lixão do município, em 1983, onde havia centenas de famílias vivendo do que catavam e muitas ainda residindo no interior o lixão, com o auxílio do Ministério Público Estadual. Em sua formalização haviam 12 cooperativados e atualmente são 85. Pg 8 Pg 8 No ano de 2001, por iniciativa da CARE em parceria com o MPE, foi criado o projeto Recriarte (Reforço Criativo Escolar). O foco do projeto é o atendimento em turno inverso ao período escolar de crianças de 6 a 14 anos da comunidade, através de atividades de reforço escolar, educação ambiental, artes, música, dança e promoção à saúde. A Figura 3 representa um dos trabalhos desenvolvidos pelo Recriarte. Figura 3. Confecção de escultura com materiais recicláveis. Inicialmente, o projeto surgiu para atender aos filhos de catadores fora de horário de aula, enquanto os pais estavam trabalhando na cooperativa. Atualmente o projeto atende 160 crianças em uma sede própria reformada desde 2010 e conta com apoio de algumas instituições e empresas, como a Ultragaz, grande apoiadora do projeto. Hoje atuam no projeto três estagiários cedidos pelo MPE, uma pedagoga e voluntários. Este projeto foi homenageado pelo Prêmio Caixa – Melhores Práticas de Gestão Local 2011. Outra iniciativa da CARE foi a organização da Mater – Associação de Mulheres Catadoras de Materiais Recicláveis, uma associação que atende atualmente 50 mulheres: 25 provenientes do lixão da cidade e 25 ex-presidiárias, com atividades de capacitação. Atualmente realizam cursos de artesanato e fazem peças de biscuit sob encomenda. A mais recente iniciativa da CARE é a formação da rede de comercialização CENTRALRECICLE - Central de cooperativas de materiais recicláveis do Estado de Sergipe, uma sociedade civil sem fins lucrativos, de duração indeterminada, fundada em 06 de Outubro de 2011 e regulamentada por lei. Foi criada a partir da necessidade de organização dos catadores e fortalecimento das Cooperativas existentes na região, buscando qualificar as bases para que as mesmas possam atuar nas políticas publicas sobre resíduos sólidos e comercializar o material recuperado conjuntamente. A cooperativa vem agregando ao longo dos anos um número crescente de famílias de excatadores do lixão ou atuantes nas ruas, através de projetos sociais mantidos ou organizados pela cooperativa. A cooperativa opera atividades de coleta seletiva em grandes geradores e parte do município e a triagem. Destaca-se que atualmente, por decisão em assembleia, foi definido que as mulheres das famílias de catadores iriam trabalhar diretamente na cooperativa como forma de garantir o sustento da família e atendimento de seus filhos. A sede da CARE está localizada em um bairro populoso e carente, onde os problemas envolvendo o desemprego, drogas e violência são frequentes. É importante destacar que os programas de financiamento para iniciativas relacionadas aos resíduos sólidos provêm de diversas fontes, desde fundações públicas como a Fundação Nacional de Saúde – FUNASA, instituições financeiras públicas como a Caixa Econômica Federal, até uma empresa estatal de economia mista, como a Petrobrás. Os projetos financiados não se limitam a Pg 9 Pg 9 investimentos estruturais ou equipamentos, podendo também abranger consultorias, capacitações entre outros. Apresenta-se na Tabela 3, a seguir, um resumo da analise crítica, destacando aspectos positivos e negativos. Tabela 4 Análise crítica – CARE: Aspectos positivos e negativos Aspectos Positivos Identificação Resultados Conselho de Fiscalização e Desenvolvimento Auxílio em elaboração de projetos e captação de recursos financeiros, Auxílio na gestão, tomada de decisões e transparência financeira para os cooperados, Articulação das parcerias para a viabilização de projetos e apoio técnico, institucional e político. Instalações e equipamentos próprios Longevidade e sustentabilidade, Maior patrimônio da cooperativa. Troca de cooperados trabalhadores: homens por Aumento da produtividade de triagem; mulheres Melhor controle assistencial das famílias de catadores. Projetos assistenciais Apoio assistencial às famílias de cooperativados, Apoio assistencial aos catadores não cooperados Aspectos Negativos Identificação Resultados Rotatividade de cooperados Falta de apoio governamental do município Descontinuidade no processo de triagem; Descontinuidade no acompanhamento assistencial das famílias dos catadores. Não há contrato nem pagamento por serviços prestados Não há qualquer auxílio de custos por parte do município. Baixa produtividade Impossibilidade de venda direta para indústria Baixa renda proveniente das vendas Sucateamento de equipamentos de beneficiamento adquiridos Ausência de um técnico especializado para operação e monitoramento do processo de coleta, triagem e beneficiamento de materiais recicláveis. Elaboração: Engebio, 2013. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da analise de pontos fortes e pontos fracos de cada iniciativa selecionada e estudada, elencaram-se os principais pontos fortes os quais resultaram em destaques no âmbito de sua analise: político, social ou econômico. Constatou-se que os pontos fracos recorrentes dentre as analises foram: a falta de apoio do poder público, indispensável principalmente nas etapas de formação dos empreendimentos e a ausência de profissional técnico especializado para operação e monitoramento de processo de triagem, enfardamento, transporte e beneficiamento de materiais, o que faz com que os processos não sejam economicamente sustentáveis em longo prazo. Estes dados indicam a necessidade da criação de politicas públicas consistentes, visando promover a criação e a manutenção destes empreendimentos, mantendo o foco na economia solidária, uma das alternativas aos meios de produção e consumo dominantes, responsáveis por constituir, em diversos setores da sociedade, cadeias de exclusão social e, consequentemente, a marginalização dos catadores. Pg 10 Pg 10 5. REFERÊNCIAS CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Prêmio CAIXA Melhores Práticas em Gestão Local 2011/2012. Reciclando para uma vida melhor: trabalho da cooperativa de reciclagem em Aracaju, Brasil. CAMP - Centro de Assessoria Multiprofissional. Boas Práticas na Reciclagem. Projeto Reciclando. Dezembro, 2009. CEADEC – Centro de Estudos e Apoio ao Desenvolvimento, Emprego e Cidadania de Sorocaba e Região. http://www.ceadec.org.br/ CONSELHO REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO DO MÉDIO ALTO URUGUAI. Plano Estratégico de desenvolvimento Regional. Frederico Westphalen, RS. Grafimax, 2010. FUNASA – Fundação Nacional de Saúde. Relatório de Gestão 2012. Brasília. Março, 2013. FUNDAÇÃO SEADE. – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. http://www.seade.gov.br IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. PNSB - Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2008. Rio de Janeiro, 2010. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. http://censo2010.ibge.gov.br/ MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Plano Nacional de Resíduos Sólidos. Brasília, agosto de 2012. UFRGS, 2010. - Estudo do perfil sócio-educacional da população de catadores de materiais recicláveis organizados em cooperativas, associações e grupos de trabalho. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Projeto: MEC - FNDE/CATADORES, junho de 2010. MINISTÉRIO DA SAÚDE: Fundação Nacional de Saúde. Relatório de Gestão 2012. Elaborado por Coordenação Geral de Planejamento e Avaliação CGPLA/DIREX. Brasília: 2013. Pg 11 Pg 11