Responsabilidade social
Ideia é
implementar
um modelo de
gestão
compartilhada
Ponto verde com
inclusão é desafio
Arquivo
Emanuel Alencar
LISBOA,EspecialparaoRazãoSocial
Dois meses após a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº
12.305/2010), o Estado do Rio
se vê diante de um grande desafio: implementar um modelo
de gestão compartilhada para
o lixo aliado à inclusão social.
O acordo de cooperação assinado com a Sociedade Ponto
Verde de Portugal (entrevista
nas páginas 4 e 5), em maio,
caminha a passos largos. Para
além de Portugal, o “Modelo
Ponto Verde” é uma realidade
de sucesso em 26 países europeus. Consiste, de forma resumida, num sistema integrado
de responsabilidade pela gestão dos resíduos de embalagens — empresas, governo e
sociedade civil. Adaptar aqui
um modelo eficiente, com base na responsabilidade social
das empresas, incluindo os catadores, é o que está em jogo.
Na estimativa do governo estadual, são cerca de seis mil pessoas sobrevivendo no Estado
do Rio da coleta de recicláveis,
atuando em condições precárias e expostos a todo o tipo
de risco.
A nova lei brasileira estabelece como um de seus princípios “o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de
trabalho e renda e promotor de
cidadania”. Uma comitiva da
área ambiental do Estado do
Rio esteve na Bélgica, durante o
congresso do ProEurope (comissão que reúne as empresas
6 ● Razão Social
CATADORES DO Aterro de Gramacho vão ser incluídos, segundo garante o Estado do Rio
de reciclagem de embalagem),
e a questão foi a mais debatida
nas rodas de bate-papo, entre
um seminário e outro. O austríaco Christian Schereyer, coordenador da federação de gestão de resíduos de Styria, na
Áustria, expôs seu ponto de vista, com conhecimento de causa: coordenou um trabalho de
reciclagem em Curaçá, extremo
norte baiano, às margens do
Rio São Francisco.
— Um modelo piloto no
Rio e no Brasil só faz sentido
com inclusão social. Não
adianta fazer uma coleta seletiva sem apoio dos moradores. Um exemplo: se colo-
carmos no nordeste recipientes plásticos para coleta seletiva, estes recipientes
certamente seriam retirados de suas funções e passariam a virar coletores de
água. Há muita gente que ganha sua sobrevivência do lixo. Será custoso, difícil em
algumas regiões. Mas estas
pessoas terão que ser incluíd a s — d i s s e S c h e r e y e r,
acrescentando que na Áustria 63% do lixo produzido
são reciclados (e 27% vão
para incineração).
Vice-presidente da Johnson
& Johnson na América Latina,
Ricardo Bastos, que também
esteve no Congresso, defendeu a implementação de planos-pilotos e ressaltou que a
catação de lixo hoje é uma
questão de saúde publica.
— Nós, da indústria, não temos dúvidas de que este novo
paradigma vai chegar. Mas, dadas as diferentes realidades, teremos que adaptá-lo ao modelo
brasileiro. Temos que levar em
conta as contingências econômicas, políticas, sociais e educacionais. A adoção pura e simples do ponto verde europeu
não é o caminho.
Uma visita a uma usina no
Alentejo, em Portugal, que sucedeu o congresso de Bruxelas,
deu a dimensão de como o modelo pode caminhar por aqui.
Indústria de reciclagem que recebe cem mil toneladas de resíduos por ano de um consorcio de 15 municípios, onde vivem 250 mil pessoas, a Valnor
ainda conta com força de trabalho manual em suas linhas de
produção. Quem trabalha nos
setores de triagem na indústria
portuguesa — chamado por lá
de operador — ganha 550 euros por mês (aproximadamente
R$ 1.300), com direito a benefícios como vale-refeição e vale
transporte e todos os benefícios de um trabalho formal. Os
operadores usam luvas, tocas e
roupas especiais.
— A carga horária é de oito
horas. Há revezamento das
atividades a cada turno, para
evitar repetição – disse José
João Pinto Rodrigues, administrador da Valnor, cujos negócios movimentaram 10 milhões de euros em 2010 (20%
da fatura foi custeada pelos
municípios e o restante pelo
fluxo comercial e industrial).
Para a secretária do Ambiente do Rio, Marilene Ramos, o modelo ponto verde
fluminense não é um modelo
que exclui o catador.
— Não estamos pensando
em uma total mecanização do
processo de reciclagem. Não
queremos mais o catador catando indiscriminadamente, tal como ocorre hoje. É inadmissível.
Já estamos com projetos em
Gramacho para garantir emprego aos catadores depois do fechamento do lixão.
Para o engenheiro Emídio
Xavier, presidente da Empresa Geral do Fomento (EGF),
“os catadores não são uma invenção brasileira”:
— Nós também tínhamos.
Mas integramos estes atores
na triagem e fomentamos pequenas atividades industriais.
Isto tem que ser feito de maneira organizada.
O repórter viajou a convite da
SPBV
O GLOBO ● Terça-feira, 2 de novembro de 2010
Terça-feira, 2 de novembro de 2010 ● O GLOBO
Razão Social ● 7
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