Regresso às aulas: evolução silenciosa
Por Daniel Sampaio
Setembro é o mês do regresso às aulas. Estudantes, pais e professores fazem projectos e
prometem fazer melhor: como será possível corrigir os erros do ano passado e promover novas
maneiras de estar na escola?
Tenho ideia de uma evolução silenciosa que cresce em muitos dos nossos estabelecimentos de
ensino. De uma forma discreta, mas persistente.
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Dantes, o ensino só se preocupava com a absorção do conteúdo fornecido pelo único mestre, o
professor. O sistema antigo defendia que uma só medida tinha de servir a todos. O conhecimento
era difundido só num sentido, do mais velho para todos os mais novos. A pedagogia era baseada na
crença discutível de ser possível ensinar com êxito um grupo de estudantes organizado a partir da
idade cronológica dos seus membros, esquecendo à partida os diferentes níveis cognitivos e
emocionais, bem como as experiências de vida de cada um. O curriculum escolar era (é...)
elaborado em gabinetes ministeriais, fornecido aos professores por manuais que o interpretam à
sua maneira, organizando esta informação já digerida e pronta para ser transmitida ao aluno
"médio", que se supõe à partida desejoso de a receber sem contestação. Os estudantes que não
entram no paradigma recebem a medida correctora do "chumbo" ou, em escolas com outra filosofia,
são aceites pela "compreensão psicológica" de técnicos da área psicossocial. As medidas propostas
pelo Ministério da Educação não têm tido em conta as experiências de sucesso de muitos
professores e, em regra, propõem a acumulação de práticas do velho regime: mais aulas e mais
testes. As crianças e adolescentes eram avaliadas pela forma como respondiam às questões
"dadas" nas aulas e a partilha de conhecimentos não era encorajada: era habitual que os
professores quisessem um silêncio total na sala de aula e não era raro que estimulassem a
competição, para ver quem "sabia" mais.
Em muitas escolas o velho paradigma começa a ser substituído. Foram os estudantes os motores
desta evolução silenciosa. Nos anos 90 começaram a colaborar, a partilhar informação e a inovar
em cada instante: cresceram com a Internet, que revolucionou a sua socialização e a sua forma de
observar o mundo. Têm grande consciência dos seus direitos e não aceitam uma cartilha que não
lhes seja apresentada sem respeito, ou que apenas consagre uma visão unilateral da vida. Muitos
estão na escola porque é obrigatório lá estar, não porque a frequência faça grande sentido à
partida. Uns aprendem pelo ouvido, outros pelos olhos, outros ainda precisam de se deslocar e
manipular as coisas: é irrealista pensar que um grupo de crianças dos nossos dias possa ter grande
entusiasmo em estar 90 minutos em silêncio e prestar contas a mais de uma dezena de disciplinas,
como acontece no nosso 3.º ciclo...
Por isso, a evolução avança, apesar do esforço antiprogresso de alguns passadistas, eternos
defensores da transmissão linear dos conhecimentos. As novas tecnologias de informação e
comunicação, introduzidas de modo crescente nos últimos dez anos em muitas escolas, têm
contribuído para a mudança, mas não se pense que o computador resolve tudo: se for utilizado na
sala de aula à luz do velho paradigma, nada mudará. Tem de ser usado na perspectiva da
modificação do relacionamento professor-aluno, com o objectivo de facilitar e democratizar o acesso
à informação, cabendo ao docente a hierarquização e controlo sobre o decisivo e o acessório. Este
novo paradigma reforçará a autoridade do professor, porque o aproximará da visão do mundo dos
mais novos e o mostrará como um adulto próximo, mas diferente.
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Na evolução silenciosa, as escolas compreenderão que deverão ser locais onde se aprende, mais
do que territórios onde se ensina.
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