A INDISPENSÁVEL IMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES INTEGRADAS EM MATÉRIA AMBIENTAL
CRISTIANE APARECIDA RAMOS1
ALAIR KOENIG2
ÍTALO JOÃO CHIODELLI3
1. EXPOSIÇÃO DA PROBLEMÁTICA
O advento da Constituição Federal de 1988 traçou contornos paradigmáticos para a atuação do Poder
Público em se tratando da inarredável função de tutelar o meio ambiente. Com este ímpeto marcadamente
protecionista, a dita Constituição Cidadã trouxe em seu bojo normas de caráter eminentemente programáticas,
atribuindo o dever-poder direcionado aos poderes públicos de bem manter o meio ambiente, sendo este
compreendido como a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o
desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas4.
Dessa forma, no que pertine a tutela ambiental, a imperativa missão constitucional imposta de forma
direta ao seu destinatário primário, o Estado, na consagrada compreensão dos ditames do chamado
constitucionalismo dirigente 5, ficou conhecida como a doutrina da proteção integral do meio ambiente, até
mesmo porque “o reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se, na verdade, como extensão
do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao
aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida –, que faz com que valha a pena viver.”6
Não se pode negar o caráter de fundamentalidade do direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado como expressão do próprio direito à vida, o qual “em seu sentido próprio e moderno, não só se
mantém a proteção contra qualquer privação arbitrária da vida, mas além disso encontram-se os Estados no
dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e
todos os povos. Neste propósito, têm os Estados a obrigação de evitar riscos ambientais sérios à vida”.7
Assim, tem-se que o destinatário primário do dever-poder que decorre do direito fundamental ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado é o Estado, compreendido em todos os seus desdobramentos
organizacionais – mormente os poderes constituídos, dos quais emanam todas as decisões políticas originárias.
Ao se compreender o Poder Público, lato sensu, como o legítimo mantenedor do meio ambiente, há que
se pensar a formação das políticas públicas nesta matéria como oriundas de um complexo processo dialéticoinstitucional, aonde devem obrigatoriamente interagir todas as formas de expressão dos poderes
constitucionalmente atribuídos aos personagens estatais, o que, em nosso ordenamento jurídico, ocorre através
1
Promotora de Justiça da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR;
Assessora da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR;
3
Estagiário da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR;
4
SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional, cit., p.20
5
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3.ed. (reimpressão). Coimbra: Almedina, 1999.
6
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio- Ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto
Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993
7
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio- Ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto
Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993
2
de instituições públicas constitucional e legalmente constituídas – o que não afasta, por óbvio, a participação
popular, vez que o Brasil se insere num sistema democrático-participativo.
Por conseguinte, é ilógico pensar, ao menos em nosso ordenamento jurídico, em um sistema de tutela
ambiental composto por solitários entes estatais, haja vista que a complexidade do tema exige a participação
efetiva e concreta de todos os organismos públicos, sob pena de subverter as intenções de nossa constituição
dirigente, restando em prejuízo a formação das necessárias políticas públicas racionalmente traçadas.
É dentro desta sistemática plural de instituições no trato da matéria ambiental que deve se inserir a
atuação do Ministério Público, eis que a sua institucionalização retrata, nada mais nada menos, do que a própria
corporificação dos anseios sociais determinados pela Constituição Federal. Não é de hoje que os contornos
institucionais do Ministério Público se afastaram da antiga atribuição de “procurador da Coroa”, como defensor
dos interesses monárquicos, para o moldarem como o legítimo representante dos interesses da sociedade – lógica
esta que seguiu o próprio surgimento e evolução do Estado Democrático de Direito.
É sabido que o Ministério Público herdou ímpar função constitucional, qual seja, a de defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo-lhe atribuído, para tal
mister, caráter permanente e de independência com relação aos demais poderes constituídos.
Por conseguinte, não tardou o entendimento de que, sendo o direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado um direito difuso, de caráter transindividual, cabe ao Ministério Público zelar pela sua concreta
efetivação.
Sendo assim, há que se compreender que o Ministério Público está inserto nesta sistemática de tutela
ambiental, considerando que se trata de uma instituição cujo mandamento constitucional que lhe incumbe é
límpido no sentido de defender os interesses sociais e individuais indisponíveis.
E, como órgão público que é, tendo, para alguns8, natureza administrativa, deve este participar
ativamente da formação das políticas públicas em matéria ambiental, dialogando diretamente com os demais
poderes constituídos – seja o Legislativo, o Executivo ou o Judiciário. Estar inserto numa sistemática
constitucional plural implica que sua opinião e compreensão acerca das soluções políticas no trato do meio
ambiente deve ser ouvida e relevada quando da tomada de decisões.
Não é equívoco o entendimento de que cada membro do Ministério Público é um agente de
transformação política e social, pois age com vistas às peremptórias prescrições de nossa Constituição dirigente,
agindo não com discrição, mas com o compromisso institucional de promover os direitos e garantias
fundamentais constitucionalmente assegurados – assim devendo ser compreendido o sentido de “defesa da
ordem jurídica”, para além da insatisfatória afirmação de que o membro do Ministério Público é um custos legis,
quando na verdade é um custos iuris, pois promove a justiça e não somente a lei.
8
MAZZILI, Hugo Nigro; Regime Jurídico do Ministério Público; Saraiva, 7 Ed – 2013;
E não são poucos os instrumentos utilizados pelos membros desta instituição no exercício de suas
funções de concretizador de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, mesclando-se estes entre
procedimentos de natureza administrativa/extrajudicial – como a recomendação administrativa, as audiências
públicas e os inquéritos civis – e procedimentos de natureza judicial – como a ação civil pública, o mandado de
segurança e a intervenção na ação popular. Dessa forma, há que se observar que o Ministério Público possui
amplos poderes de atuação na matéria de proteção ambiental, seja na forma extrajudicial ou judicial.
No entanto, o que nos tem ensinado a prática cotidiana do exercício ministerial é a de que pouco adianta
o membro do Ministério Público assumir uma posição passiva quando defronte com questões ambientais de
ímpar interesse público. Tem-se observado que a atuação repressiva – quase sempre de caráter judicial! – não é
adequada para a tutela do meio ambiente, como se bem extrai dos casos de danos ambientais ocasionados por
atividades econômicas, cuja reversibilidade beira o impossível.
É de bom grado ressaltar que o membro do Ministério Público deve priorizar o trato das questões
ambientais de forma preventiva – ainda mais quando se põe em destaque os valores encerrados no princípio da
precaução ou prevenção, o qual prega o tratamento prioritário às medidas que evitem o nascimento de atentados
ao meio ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade9.
Portanto, se intenta esta instituição a defesa concreta do meio ambiente e de seus conseqüentes
desdobramentos, deve-se, em primeiro lugar, compreender que a sua atuação deve respeitar a pluralidade de
agentes também atribuídos da relevante missão constitucional de zelar pelo meio ambiente. Em conseqüência, se
o Ministério Público realmente deseja participar ativamente e de forma preventiva nas questões concernentes ao
meio ambiente, deve-se atentar ao planejamento institucional no sentido de efetivar ações integradas pautadas no
diálogo institucional, seja no âmbito interno da própria instituição, seja no âmbito externo, quando o Ministério
Público deve convergir seus interesses com os demais atores públicos.
Não há outro meio de se atuar de forma efetiva e com vistas à concretização dos anseios constitucionais
senão de forma integrada. Se o dever é recíproco, as providências públicas devem ser obrigatoriamente
integradas, considerando que a tomada de decisões não compete somente a um único poder/ente público –
competência esta que erroneamente se atribui somente ao Poder Executivo e aos respectivos entes da
Administração Pública indireta.
Porém, a realidade – quase sempre distante das prescrições teóricas!10 – tem nos ensinado que, na
prática, não é isso que acontece. Ao invés de uma ação integrada entre entes políticos e administrativos, o que se
vê é um caos decisório. De um lado, União, Estados e Municípios (expressados por seus poderes Executivo e
Legislativo) criando políticas públicas de baixo comprometimento social, de outro, entes da Administração
Pública indireta, Ministério Público e Poder Judiciário agindo em descompasso com aqueles órgãos – muitas
vezes porque a própria política pública já nasce equivocada e irracional. Está aí a discussão que permeia o novo
Código Florestal que não nos deixa mentir.
9
MILARÉ, Édis; Direito do Ambiente; 3 Ed. – Editora RT – 2001;
Como bem asseverava o poeta Ruy Guerra: “Há distância entre intenção e gesto!”; Fado Tropical – Chico Buarque;
10
No momento em que mais deveriam atuar integradamente – quando da criação da política pública em
matéria ambiental –, não o fazem, expondo as fragilidades de um sistema de cunho pluri-institucional que na
prática se torna uma guerra de interesses desconexos.
Daí é que se decorrem os inevitáveis problemas: conflitos danosos à manutenção democrática das
instituições; ingerências exercidas por órgãos de execução; interferência de um poder constituído sobre as
atuações de outro – mormente do Judiciário no Executivo; abertura para corrupção pública, dadas as confusas
instruções repassadas à sociedade que se vê empurrada ao descaso com a lei; etc. E o que, por óbvio, é mais
preocupante é o abandono da missão constitucional de tutela do meio ambiente por parte de todos esses entes
públicos, os quais acabam por desacreditar na possível solução dos problemas quando em face da complexidade
da realidade político-ambiental.
No entanto, quando se fala na existência de um dever-poder dos Poderes Públicos em satisfatoriamente
lidar com a tutela eficaz do meio ambiente, é evidente que os atores públicos não podem se arredar deste ímpar
mandamento constitucional, sob pena de transformar a excelente Constituição Federal da República Federativa
do Brasil numa mera constituição semântica – instrumento de simples exercício de perpetuação dos poderes dos
governantes em exercício, fato este que, não raras vezes, convoca à população ao protesto social e à
desobediência civil.
Há luz no fim do túnel e é isso que se pretende demonstrar aqui, em breves linhas, tentando-se fazer
compreender o conceito de ação integrada entre os múltiplos entes públicos e, ainda, a compreensão de ação
integrada dentro do próprio Ministério Público – o legítimo defensor do meio ambiente ecologicamente
equilibrado.
2. JUSTIFICATIVA
Em sentido objetivo, o que se deve compreender por ação integrada é que se trata esta de um conjunto
de deliberações substancialmente estruturadas, dialeticamente tecidas e concretamente efetivadas após a ativa
participação de agentes públicos múltiplos.
Desta definição, no que concerne aos seus destinatários, já é possível extrair uma dupla dimensão
subjetiva da ação integrada – uma que diz respeito a ação integrada entre agentes oriundos de entes públicos
diversos e outra que trata da ação integrada realizada por agentes componentes de um mesmo órgão público.
Para fins didáticos, classifica-se aquela em ação integrada mista e esta em ação integrada pura.
Evitando-se a prolixidade, falar-se-á aqui somente da ação integrada pura no âmbito interno do
Ministério Público (compreendido como instituição una), ou seja, aquela que integra agentes do Ministério
Público em geral.
Quando se afirma que é necessário realizar uma ação integrada pura dentro das deliberações e atuações
do Ministério Público em matéria ambiental, quer-se dizer que deve haver um planejamento institucional apto a
congregar os interesses unívocos da aludida instituição. Deve haver uma padronização de ações dentro do
próprio Ministério Público.
Ora, se o Ministério Público é composto por uma infinidade de membros, seja no âmbito da União, seja
no âmbito dos Estados-membros, todos imbuídos com a prerrogativa de independência funcional, como traçar
uma política interna una e convergente sem que isso caracterize uma ofensa à aludida garantia ou uma invasão
de competências constitucionais?
Simples: há que se criar instrumentos de diálogo internos entre os membros componentes desta nobre
instituição. Se a atuação do Ministério Público deve ser eficaz, inafastável é a necessidade de se propor um
diálogo institucional que congregue a opinião desses variados agentes de transformação político-sociais, sem que
isso caracterize uma ofensa à prerrogativa de independência funcional que detém cada um de seus membros.
Não se vislumbra outra forma de traçar um contorno institucional uno, uma identidade unívoca ao
Ministério Público sem que haja uma conformidade de atuação não contraditória por seus membros
componentes. Afinal, como explicar para a sociedade que, no âmbito do Ministério Público estadual, um agente
ministerial ofereça uma recomendação administrativa ao Município instruindo que se evite a criação de um
consórcio para a gestão dos resíduos sólidos enquanto que, na Comarca vizinha, outro membro entre com uma
ação civil pública cominando uma obrigação de fazer endereçada ao Município consistente em tomar parte no
mesmo consórcio que o outro membro entendeu prejudicial à concretização da eficaz manutenção do meio
ambiente?! Seria bastante louvável que cada membro tivesse um espaço de diálogo institucional com os demais
para conhecer da opinião alheia, o que, se tomadas esta de forma dialética e geral, poderá culminar na criação de
uma opinião una, convergente.
Aqui, neste momento, ressalta-se a atuação do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de
Proteção ao Meio Ambiente. É através deste órgão do Ministério Público que se visualiza o incentivo ao diálogo
institucional interno, à tomada de decisões conjuntas entre os membros componentes. Apesar de ser um órgão
auxiliar, sua atuação deve se dar com vistas à uniformização dos anseios institucionais, unindo-se aos órgãos
executivos para propiciar um ambiente de deliberações dialéticas.
Se não houver um consenso geral acerca do que intenta o Ministério Público com sua atuação funcional,
colocando-se em confronto as opiniões dos órgãos de execução – o Procurador-Geral, o Conselho Superior, os
Procuradores e os Promotores – é evidente que não se construirá uma identidade ao Ministério Público no trato
da matéria ambiental. Neste caso obscuro de falta de coerência na persecução de seu mister constitucional, perde
a sociedade que ficará despojada de uma atuação eficaz por parte da instituição com a qual mais se identifica.
Não há como criar uma política institucional de prevenção ao meio ambiente porque não há
planejamento interno. O que existe é a atuação isolada de Promotores e Procuradores de Justiça – ao menos no
âmbito estadual – que, apesar de suas nobres considerações acerca da matéria, não conseguem participar
efetivamente das políticas públicas externas, vez que pouco conhecem o que pensa o Ministério Público como
instituição.
Portanto, prega-se aqui a necessidade de diálogo interno entre os membros da instituição em questão,
criando-se um espaço amplo e aberto para as deliberações acerca das atuações futuras do Ministério Público em
matéria ambiental. Obviamente que não se afirma aqui que as aludidas deliberações tomadas pela totalidade dos
membros se tornariam normas internas de vinculação funcional – o que seria uma ofensa à independência
funcional que detém cada membro. O que se diz, em verdade, é que haveria mais ratio dentro da atividade
exercida pela instituição se fosse estimulado esse espaço de conferência – Congressos, Seminários, Fóruns,
Academia, etc –, cujas conclusões não vinculariam a atuação do membro, mas sim o orientariam sobre o
pensamento majoritário do Ministério Público acerca das questões específicas que permeiam a discussão e os
rumos da política ambiental. Eis a ação integrada pura.
Expostos os contornos que se pretendia acerca da necessidade de uma ação integrada interna do
Ministério Público, passa-se agora a analisar a ação integrada mista, a qual abordaria a atuação do Ministério
Público em conjunto com os demais entes públicos, cujas atribuições englobam a tutela ambiental.
Por ação integrada mista deve-se compreender, ao menos de acordo com as proposições desta tese, uma
deliberação substancialmente estruturada, dialeticamente tecida e concretamente efetivada por agentes oriundos
de entes públicos de origem diversa – no caso, entre os membros do Ministério Público e outros agentes públicos
de instituição díspar.
Não se está aqui a fazer ilações desconexas com a realidade quando se propõe uma ação integrada mista
em matéria ambiental entre um membro do Ministério Público e outro agente público, basta pensar naquela
situação de um Promotor de Justiça que, com postura ativa, propõe um amplo diálogo com membros da
Administração Pública direta municipal acerca das políticas públicas efetivadas para a gestão dos resíduos
sólidos de um Município, expressando sua opinião de forma clara e sendo esta devidamente ouvida.
E a proposta que aqui se expõe não aborda, nem de perto, a atuação judicial do membro do Ministério
Público na concretização de efetivas medidas em favor do meio ambiente – como, por exemplo, as melhores
formas de manutenção de uma área de preservação permanente ou o trato da mata ciliar –, pois esta pressupõe a
intenção de constranger de forma peremptória (decisão judicial) a atuação do ente público alvo. Pelo contrário, o
que se propõe aqui é um diálogo anterior à necessidade de tomada de medidas judiciais.
Se o membro do Ministério Público possui um amplo conhecimento do que pensa a instituição acerca
de questões específicas atinentes à tutela do meio ambiente (propiciada pela efetivação de ações integradas
puras), por óbvio que este terá mais segurança e disposição para participar ativamente das tomadas de decisões
em matéria ambiental – mormente quando o ente com o qual se dialoga é o Poder Executivo ou Legislativo.
É sabido que a política pública, apesar da insistente e retrógrada afirmação de que o Poder Público age
com discricionariedade na tomada de decisões acerca da formação e efetivação desta – o que é um contra-senso
quando se está diante de uma constituição dirigente –, se tornou, nos dias atuais, um verdadeiro instrumento de
garantia de efetivação de direitos fundamentais sociais sem comparativo no ordenamento jurídico brasileiro.
Convenhamos: uma decisão judicial que determina que o Estado custeie a preservação de uma área de
preservação ambiental não é mais efetiva do que o desenrolar de uma política pública, constitucionalmente
pensada, instituída e concretizada através de múltiplos órgãos com um corpo técnico habilitado e conhecedor da
matéria ambiental.
Sendo assim, o que se tem de mais efetivo na conformação do ordenamento jurídico brasileiro para a
concretização do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado é a possibilidade de desenvolvimento
de políticas públicas; todo o aparato constitucional excedente é repressivo, não preventivo. Não há razão sem um
public management11 da tutela ambiental. Ou a missão constitucional de trato do meio ambiente se desenvolve
através de políticas públicas universalmente arquitetadas ou se frustra a aludida prescrição, restando apenas a
tomada de medidas paliativas.
Portanto, se o Ministério Público deseja concretizar a sua ímpar missão de zelar por essencial direito
transindividual como é o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, ele deve obrigatoriamente
participar da formação de políticas públicas na área ambiental. E como se faz isso? Ora, participando ativa e
preventivamente das ações integradas mistas, atuando-se em conjunto com os demais entes públicos.
Está-se a falar aqui que o membro do Ministério Público deve ser pessoa corriqueira nos debates
travados no Palácio do Planalto, no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas, nas Prefeituras e nas
Câmaras Municipais, bem como nos órgãos da Administração Pública indireta, como o IBAMA, o IAP, etc.
Ainda, tais agentes componentes destes entes públicos devem ser persona grata nos gabinetes dos membros do
Ministério Público.
O que se incentiva aqui é o diálogo institucional para além das fronteiras políticas que assolam o
ordenamento jurídico brasileiro. Não se intenta aqui incentivar o exercício da política partidária e da política pela
simples política. Prega-se aqui a concretização do mandamento constitucional de tutela do meio ambiente do
Poder Público, o que implica em uma necessária e inarredável ação integrada entre os diferentes órgãos
atribuídos desta competência.
É evidente que o princípio da impessoalidade é corolário do diálogo que aqui se prega. O Ministério
Público, como órgão ouvinte da democracia que é, interessado apenas na manutenção do interesse público,
dialogará com os demais entes públicos com vistas à proteção do meio ambiente. E nada mais.
Se a atribuição de zelar pelo meio ambiente também incumbe ao Ministério Público, é natural que ele
participe da formação das políticas públicas na matéria ambiental. E como isso seria feito? Através de audiências
públicas, reuniões, projetos, fiscalização de contratos públicos e licitações, discussões constantes – que inclui a
participação da coletividade, sendo todas essas questões discutidas com transparência à população interessada,
como bem prescreve o princípio da participação comunitária, vez que a coletividade também é destinatária da
obrigação constitucional aqui discutida.
E não se trata aqui de meras discussões formais e protocolares. Afirma-se a necessidade de deliberações
acerca das especificidades das políticas públicas tendentes a tutela do meio ambiente. Tome-se como exemplo as
11
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Atlas, 2013;
discussões que circundam uma Prefeitura e uma Câmara Municipal acerca da necessidade de deliberar sobre as
formas de proteção da vegetação nativa da região ou a manutenção do patrimônio histórico municipal. Uma ação
integrada mista pressuporia um debate dialético entre todos os órgãos públicos envolvidos com a política pública
que se pretende implementar. Ouve-se a Prefeitura e suas autarquias, ouvem-se os vereadores, ouve-se o membro
do Ministério Público, ouve-se a população interessada. Após, travam-se as discussões e, principalmente, as
deliberações.
E nessa parte principal das deliberações o Ministério Público tem uma função fundamental: tornar as
conclusões obtidas uma prescrição obrigatória, valendo-se dos instrumentos que a ordem jurídica lhe fornece
caso haja inatividade.
Não há nada mais democrático em matéria de implementação de políticas públicas de tutela ambiental
do que o sistema de ação integrada que aqui se propõe, seja no âmbito interno do próprio Ministério Público (o
que deve ocorrer também dentro das demais instituições), seja no âmbito externo, nas interações
interinstitucionais. O diálogo é o principal e necessário caminho para a construção de deliberações racionais,
sendo o mais eficaz meio conciliatório entre entes públicos com semelhante atribuição constitucional de tutelar o
meio ambiente.
3. CONCLUSÃO
Propõe-se com a presente tese, portanto, a necessidade de efetivação das ações integradas para a solução
de problemas correntes na complexa área ambiental, dado o atual descompasso institucional que se observa no
trato da matéria.
Alinhou-se o conceito de ação integrada, sendo esta compreendida como um conjunto de deliberações
substancialmente estruturadas, dialeticamente tecidas e concretamente efetivadas após a ativa participação de
agentes públicos múltiplos. Para fins meramente didáticos, estabeleceu-se a diferença entre ação integrada pura e
ação integrada mista.
Sendo a ação integrada pura compreendida como o diálogo que deve haver no âmbito interno do
Ministério Público com vistas à formação de uma deliberação convergente que orientará a atuação funcional de
seus membros em matéria de meio ambiente, considera-se esta essencial para a padronização de uma opinião
ministerial em nível global, sendo possível dela extrair uma identidade, uma forma de pensar comum aos seus
respectivos membros, ao menos na temática que envolve a tutela do meio ambiente.
Ademais, com a implementação das ações integradas puras, será possível falar na concretização de
ações integradas mistas, as quais abrangeriam os diálogos e deliberações efetuados entre o Ministério Público e
os demais agentes públicos com atribuições constitucionais de tutela do meio ambiente.
Tal instrumento de interação institucional foi proposto com o ímpeto único de tornar mais eficaz a
criação e concretização de políticas públicas convergentes em prol do resguardo do direito fundamental a um
meio ambiente ecologicamente equilibrado, políticas estas que, com a participação democrática das mais
variadas instituições – mormente com a atuação prospectiva do Ministério Público de forma homogênea – teria
maiores probabilidades de obter êxito, chancelando como cumprida a missão constitucional de tutela do meio
ambiente.
Acredita-se que, com a concretização prática da presente proposta, estar-se-ia colaborando de
sobremaneira com o desenvolvimento democrático das instituições – com destaque à uniformização de atuação
do Ministério Público –, as quais deliberariam conjuntamente sobre os destinos e perspectivas do meio ambiente
em terrae brasilis.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BERCLAZ, Márcio Soares; ALVES, Leonardo Barreto Moreira; Ministério Público em Ação – Ed.
Juspodvm – 2013;
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio Ambiente – Paralelo dos
Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3.ed.
(reimpressão). Coimbra: Almedina, 1999.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26. ed. rev., ampl. e atual.
Rio de Janeiro: Atlas, 2013;
GARCIA, Emerson; Ministério Público; Lumen Juris – 2001, 2a Ed;
MAZZILI, Hugo Nigro; Regime Jurídico do Ministério Público; Saraiva, 7 Ed – 2013;
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; Curso de Direito Constitucional – Ed.
Saraiva, 8 Ed. – 2013;
MILARÉ, Édis; Direito do Ambiente; 3 Ed. – Editora RT – 2001;
SARLET, Ingo; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; Curso de Direito Constitucional –
Ed. RT – 2012;
SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional, cit., p.20
Download

a indispensável implementação de ações integradas em matéria