A INDISPENSÁVEL IMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES INTEGRADAS EM MATÉRIA AMBIENTAL CRISTIANE APARECIDA RAMOS1 ALAIR KOENIG2 ÍTALO JOÃO CHIODELLI3 1. EXPOSIÇÃO DA PROBLEMÁTICA O advento da Constituição Federal de 1988 traçou contornos paradigmáticos para a atuação do Poder Público em se tratando da inarredável função de tutelar o meio ambiente. Com este ímpeto marcadamente protecionista, a dita Constituição Cidadã trouxe em seu bojo normas de caráter eminentemente programáticas, atribuindo o dever-poder direcionado aos poderes públicos de bem manter o meio ambiente, sendo este compreendido como a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas4. Dessa forma, no que pertine a tutela ambiental, a imperativa missão constitucional imposta de forma direta ao seu destinatário primário, o Estado, na consagrada compreensão dos ditames do chamado constitucionalismo dirigente 5, ficou conhecida como a doutrina da proteção integral do meio ambiente, até mesmo porque “o reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida –, que faz com que valha a pena viver.”6 Não se pode negar o caráter de fundamentalidade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como expressão do próprio direito à vida, o qual “em seu sentido próprio e moderno, não só se mantém a proteção contra qualquer privação arbitrária da vida, mas além disso encontram-se os Estados no dever de buscar diretrizes destinadas a assegurar o acesso aos meios de sobrevivência a todos os indivíduos e todos os povos. Neste propósito, têm os Estados a obrigação de evitar riscos ambientais sérios à vida”.7 Assim, tem-se que o destinatário primário do dever-poder que decorre do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é o Estado, compreendido em todos os seus desdobramentos organizacionais – mormente os poderes constituídos, dos quais emanam todas as decisões políticas originárias. Ao se compreender o Poder Público, lato sensu, como o legítimo mantenedor do meio ambiente, há que se pensar a formação das políticas públicas nesta matéria como oriundas de um complexo processo dialéticoinstitucional, aonde devem obrigatoriamente interagir todas as formas de expressão dos poderes constitucionalmente atribuídos aos personagens estatais, o que, em nosso ordenamento jurídico, ocorre através 1 Promotora de Justiça da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR; Assessora da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR; 3 Estagiário da 2a Promotoria de Justiça da Comarca de Palotina/PR; 4 SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional, cit., p.20 5 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3.ed. (reimpressão). Coimbra: Almedina, 1999. 6 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio- Ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993 7 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio- Ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993 2 de instituições públicas constitucional e legalmente constituídas – o que não afasta, por óbvio, a participação popular, vez que o Brasil se insere num sistema democrático-participativo. Por conseguinte, é ilógico pensar, ao menos em nosso ordenamento jurídico, em um sistema de tutela ambiental composto por solitários entes estatais, haja vista que a complexidade do tema exige a participação efetiva e concreta de todos os organismos públicos, sob pena de subverter as intenções de nossa constituição dirigente, restando em prejuízo a formação das necessárias políticas públicas racionalmente traçadas. É dentro desta sistemática plural de instituições no trato da matéria ambiental que deve se inserir a atuação do Ministério Público, eis que a sua institucionalização retrata, nada mais nada menos, do que a própria corporificação dos anseios sociais determinados pela Constituição Federal. Não é de hoje que os contornos institucionais do Ministério Público se afastaram da antiga atribuição de “procurador da Coroa”, como defensor dos interesses monárquicos, para o moldarem como o legítimo representante dos interesses da sociedade – lógica esta que seguiu o próprio surgimento e evolução do Estado Democrático de Direito. É sabido que o Ministério Público herdou ímpar função constitucional, qual seja, a de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo-lhe atribuído, para tal mister, caráter permanente e de independência com relação aos demais poderes constituídos. Por conseguinte, não tardou o entendimento de que, sendo o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado um direito difuso, de caráter transindividual, cabe ao Ministério Público zelar pela sua concreta efetivação. Sendo assim, há que se compreender que o Ministério Público está inserto nesta sistemática de tutela ambiental, considerando que se trata de uma instituição cujo mandamento constitucional que lhe incumbe é límpido no sentido de defender os interesses sociais e individuais indisponíveis. E, como órgão público que é, tendo, para alguns8, natureza administrativa, deve este participar ativamente da formação das políticas públicas em matéria ambiental, dialogando diretamente com os demais poderes constituídos – seja o Legislativo, o Executivo ou o Judiciário. Estar inserto numa sistemática constitucional plural implica que sua opinião e compreensão acerca das soluções políticas no trato do meio ambiente deve ser ouvida e relevada quando da tomada de decisões. Não é equívoco o entendimento de que cada membro do Ministério Público é um agente de transformação política e social, pois age com vistas às peremptórias prescrições de nossa Constituição dirigente, agindo não com discrição, mas com o compromisso institucional de promover os direitos e garantias fundamentais constitucionalmente assegurados – assim devendo ser compreendido o sentido de “defesa da ordem jurídica”, para além da insatisfatória afirmação de que o membro do Ministério Público é um custos legis, quando na verdade é um custos iuris, pois promove a justiça e não somente a lei. 8 MAZZILI, Hugo Nigro; Regime Jurídico do Ministério Público; Saraiva, 7 Ed – 2013; E não são poucos os instrumentos utilizados pelos membros desta instituição no exercício de suas funções de concretizador de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, mesclando-se estes entre procedimentos de natureza administrativa/extrajudicial – como a recomendação administrativa, as audiências públicas e os inquéritos civis – e procedimentos de natureza judicial – como a ação civil pública, o mandado de segurança e a intervenção na ação popular. Dessa forma, há que se observar que o Ministério Público possui amplos poderes de atuação na matéria de proteção ambiental, seja na forma extrajudicial ou judicial. No entanto, o que nos tem ensinado a prática cotidiana do exercício ministerial é a de que pouco adianta o membro do Ministério Público assumir uma posição passiva quando defronte com questões ambientais de ímpar interesse público. Tem-se observado que a atuação repressiva – quase sempre de caráter judicial! – não é adequada para a tutela do meio ambiente, como se bem extrai dos casos de danos ambientais ocasionados por atividades econômicas, cuja reversibilidade beira o impossível. É de bom grado ressaltar que o membro do Ministério Público deve priorizar o trato das questões ambientais de forma preventiva – ainda mais quando se põe em destaque os valores encerrados no princípio da precaução ou prevenção, o qual prega o tratamento prioritário às medidas que evitem o nascimento de atentados ao meio ambiente, de modo a reduzir ou eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade9. Portanto, se intenta esta instituição a defesa concreta do meio ambiente e de seus conseqüentes desdobramentos, deve-se, em primeiro lugar, compreender que a sua atuação deve respeitar a pluralidade de agentes também atribuídos da relevante missão constitucional de zelar pelo meio ambiente. Em conseqüência, se o Ministério Público realmente deseja participar ativamente e de forma preventiva nas questões concernentes ao meio ambiente, deve-se atentar ao planejamento institucional no sentido de efetivar ações integradas pautadas no diálogo institucional, seja no âmbito interno da própria instituição, seja no âmbito externo, quando o Ministério Público deve convergir seus interesses com os demais atores públicos. Não há outro meio de se atuar de forma efetiva e com vistas à concretização dos anseios constitucionais senão de forma integrada. Se o dever é recíproco, as providências públicas devem ser obrigatoriamente integradas, considerando que a tomada de decisões não compete somente a um único poder/ente público – competência esta que erroneamente se atribui somente ao Poder Executivo e aos respectivos entes da Administração Pública indireta. Porém, a realidade – quase sempre distante das prescrições teóricas!10 – tem nos ensinado que, na prática, não é isso que acontece. Ao invés de uma ação integrada entre entes políticos e administrativos, o que se vê é um caos decisório. De um lado, União, Estados e Municípios (expressados por seus poderes Executivo e Legislativo) criando políticas públicas de baixo comprometimento social, de outro, entes da Administração Pública indireta, Ministério Público e Poder Judiciário agindo em descompasso com aqueles órgãos – muitas vezes porque a própria política pública já nasce equivocada e irracional. Está aí a discussão que permeia o novo Código Florestal que não nos deixa mentir. 9 MILARÉ, Édis; Direito do Ambiente; 3 Ed. – Editora RT – 2001; Como bem asseverava o poeta Ruy Guerra: “Há distância entre intenção e gesto!”; Fado Tropical – Chico Buarque; 10 No momento em que mais deveriam atuar integradamente – quando da criação da política pública em matéria ambiental –, não o fazem, expondo as fragilidades de um sistema de cunho pluri-institucional que na prática se torna uma guerra de interesses desconexos. Daí é que se decorrem os inevitáveis problemas: conflitos danosos à manutenção democrática das instituições; ingerências exercidas por órgãos de execução; interferência de um poder constituído sobre as atuações de outro – mormente do Judiciário no Executivo; abertura para corrupção pública, dadas as confusas instruções repassadas à sociedade que se vê empurrada ao descaso com a lei; etc. E o que, por óbvio, é mais preocupante é o abandono da missão constitucional de tutela do meio ambiente por parte de todos esses entes públicos, os quais acabam por desacreditar na possível solução dos problemas quando em face da complexidade da realidade político-ambiental. No entanto, quando se fala na existência de um dever-poder dos Poderes Públicos em satisfatoriamente lidar com a tutela eficaz do meio ambiente, é evidente que os atores públicos não podem se arredar deste ímpar mandamento constitucional, sob pena de transformar a excelente Constituição Federal da República Federativa do Brasil numa mera constituição semântica – instrumento de simples exercício de perpetuação dos poderes dos governantes em exercício, fato este que, não raras vezes, convoca à população ao protesto social e à desobediência civil. Há luz no fim do túnel e é isso que se pretende demonstrar aqui, em breves linhas, tentando-se fazer compreender o conceito de ação integrada entre os múltiplos entes públicos e, ainda, a compreensão de ação integrada dentro do próprio Ministério Público – o legítimo defensor do meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2. JUSTIFICATIVA Em sentido objetivo, o que se deve compreender por ação integrada é que se trata esta de um conjunto de deliberações substancialmente estruturadas, dialeticamente tecidas e concretamente efetivadas após a ativa participação de agentes públicos múltiplos. Desta definição, no que concerne aos seus destinatários, já é possível extrair uma dupla dimensão subjetiva da ação integrada – uma que diz respeito a ação integrada entre agentes oriundos de entes públicos diversos e outra que trata da ação integrada realizada por agentes componentes de um mesmo órgão público. Para fins didáticos, classifica-se aquela em ação integrada mista e esta em ação integrada pura. Evitando-se a prolixidade, falar-se-á aqui somente da ação integrada pura no âmbito interno do Ministério Público (compreendido como instituição una), ou seja, aquela que integra agentes do Ministério Público em geral. Quando se afirma que é necessário realizar uma ação integrada pura dentro das deliberações e atuações do Ministério Público em matéria ambiental, quer-se dizer que deve haver um planejamento institucional apto a congregar os interesses unívocos da aludida instituição. Deve haver uma padronização de ações dentro do próprio Ministério Público. Ora, se o Ministério Público é composto por uma infinidade de membros, seja no âmbito da União, seja no âmbito dos Estados-membros, todos imbuídos com a prerrogativa de independência funcional, como traçar uma política interna una e convergente sem que isso caracterize uma ofensa à aludida garantia ou uma invasão de competências constitucionais? Simples: há que se criar instrumentos de diálogo internos entre os membros componentes desta nobre instituição. Se a atuação do Ministério Público deve ser eficaz, inafastável é a necessidade de se propor um diálogo institucional que congregue a opinião desses variados agentes de transformação político-sociais, sem que isso caracterize uma ofensa à prerrogativa de independência funcional que detém cada um de seus membros. Não se vislumbra outra forma de traçar um contorno institucional uno, uma identidade unívoca ao Ministério Público sem que haja uma conformidade de atuação não contraditória por seus membros componentes. Afinal, como explicar para a sociedade que, no âmbito do Ministério Público estadual, um agente ministerial ofereça uma recomendação administrativa ao Município instruindo que se evite a criação de um consórcio para a gestão dos resíduos sólidos enquanto que, na Comarca vizinha, outro membro entre com uma ação civil pública cominando uma obrigação de fazer endereçada ao Município consistente em tomar parte no mesmo consórcio que o outro membro entendeu prejudicial à concretização da eficaz manutenção do meio ambiente?! Seria bastante louvável que cada membro tivesse um espaço de diálogo institucional com os demais para conhecer da opinião alheia, o que, se tomadas esta de forma dialética e geral, poderá culminar na criação de uma opinião una, convergente. Aqui, neste momento, ressalta-se a atuação do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção ao Meio Ambiente. É através deste órgão do Ministério Público que se visualiza o incentivo ao diálogo institucional interno, à tomada de decisões conjuntas entre os membros componentes. Apesar de ser um órgão auxiliar, sua atuação deve se dar com vistas à uniformização dos anseios institucionais, unindo-se aos órgãos executivos para propiciar um ambiente de deliberações dialéticas. Se não houver um consenso geral acerca do que intenta o Ministério Público com sua atuação funcional, colocando-se em confronto as opiniões dos órgãos de execução – o Procurador-Geral, o Conselho Superior, os Procuradores e os Promotores – é evidente que não se construirá uma identidade ao Ministério Público no trato da matéria ambiental. Neste caso obscuro de falta de coerência na persecução de seu mister constitucional, perde a sociedade que ficará despojada de uma atuação eficaz por parte da instituição com a qual mais se identifica. Não há como criar uma política institucional de prevenção ao meio ambiente porque não há planejamento interno. O que existe é a atuação isolada de Promotores e Procuradores de Justiça – ao menos no âmbito estadual – que, apesar de suas nobres considerações acerca da matéria, não conseguem participar efetivamente das políticas públicas externas, vez que pouco conhecem o que pensa o Ministério Público como instituição. Portanto, prega-se aqui a necessidade de diálogo interno entre os membros da instituição em questão, criando-se um espaço amplo e aberto para as deliberações acerca das atuações futuras do Ministério Público em matéria ambiental. Obviamente que não se afirma aqui que as aludidas deliberações tomadas pela totalidade dos membros se tornariam normas internas de vinculação funcional – o que seria uma ofensa à independência funcional que detém cada membro. O que se diz, em verdade, é que haveria mais ratio dentro da atividade exercida pela instituição se fosse estimulado esse espaço de conferência – Congressos, Seminários, Fóruns, Academia, etc –, cujas conclusões não vinculariam a atuação do membro, mas sim o orientariam sobre o pensamento majoritário do Ministério Público acerca das questões específicas que permeiam a discussão e os rumos da política ambiental. Eis a ação integrada pura. Expostos os contornos que se pretendia acerca da necessidade de uma ação integrada interna do Ministério Público, passa-se agora a analisar a ação integrada mista, a qual abordaria a atuação do Ministério Público em conjunto com os demais entes públicos, cujas atribuições englobam a tutela ambiental. Por ação integrada mista deve-se compreender, ao menos de acordo com as proposições desta tese, uma deliberação substancialmente estruturada, dialeticamente tecida e concretamente efetivada por agentes oriundos de entes públicos de origem diversa – no caso, entre os membros do Ministério Público e outros agentes públicos de instituição díspar. Não se está aqui a fazer ilações desconexas com a realidade quando se propõe uma ação integrada mista em matéria ambiental entre um membro do Ministério Público e outro agente público, basta pensar naquela situação de um Promotor de Justiça que, com postura ativa, propõe um amplo diálogo com membros da Administração Pública direta municipal acerca das políticas públicas efetivadas para a gestão dos resíduos sólidos de um Município, expressando sua opinião de forma clara e sendo esta devidamente ouvida. E a proposta que aqui se expõe não aborda, nem de perto, a atuação judicial do membro do Ministério Público na concretização de efetivas medidas em favor do meio ambiente – como, por exemplo, as melhores formas de manutenção de uma área de preservação permanente ou o trato da mata ciliar –, pois esta pressupõe a intenção de constranger de forma peremptória (decisão judicial) a atuação do ente público alvo. Pelo contrário, o que se propõe aqui é um diálogo anterior à necessidade de tomada de medidas judiciais. Se o membro do Ministério Público possui um amplo conhecimento do que pensa a instituição acerca de questões específicas atinentes à tutela do meio ambiente (propiciada pela efetivação de ações integradas puras), por óbvio que este terá mais segurança e disposição para participar ativamente das tomadas de decisões em matéria ambiental – mormente quando o ente com o qual se dialoga é o Poder Executivo ou Legislativo. É sabido que a política pública, apesar da insistente e retrógrada afirmação de que o Poder Público age com discricionariedade na tomada de decisões acerca da formação e efetivação desta – o que é um contra-senso quando se está diante de uma constituição dirigente –, se tornou, nos dias atuais, um verdadeiro instrumento de garantia de efetivação de direitos fundamentais sociais sem comparativo no ordenamento jurídico brasileiro. Convenhamos: uma decisão judicial que determina que o Estado custeie a preservação de uma área de preservação ambiental não é mais efetiva do que o desenrolar de uma política pública, constitucionalmente pensada, instituída e concretizada através de múltiplos órgãos com um corpo técnico habilitado e conhecedor da matéria ambiental. Sendo assim, o que se tem de mais efetivo na conformação do ordenamento jurídico brasileiro para a concretização do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado é a possibilidade de desenvolvimento de políticas públicas; todo o aparato constitucional excedente é repressivo, não preventivo. Não há razão sem um public management11 da tutela ambiental. Ou a missão constitucional de trato do meio ambiente se desenvolve através de políticas públicas universalmente arquitetadas ou se frustra a aludida prescrição, restando apenas a tomada de medidas paliativas. Portanto, se o Ministério Público deseja concretizar a sua ímpar missão de zelar por essencial direito transindividual como é o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, ele deve obrigatoriamente participar da formação de políticas públicas na área ambiental. E como se faz isso? Ora, participando ativa e preventivamente das ações integradas mistas, atuando-se em conjunto com os demais entes públicos. Está-se a falar aqui que o membro do Ministério Público deve ser pessoa corriqueira nos debates travados no Palácio do Planalto, no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas, nas Prefeituras e nas Câmaras Municipais, bem como nos órgãos da Administração Pública indireta, como o IBAMA, o IAP, etc. Ainda, tais agentes componentes destes entes públicos devem ser persona grata nos gabinetes dos membros do Ministério Público. O que se incentiva aqui é o diálogo institucional para além das fronteiras políticas que assolam o ordenamento jurídico brasileiro. Não se intenta aqui incentivar o exercício da política partidária e da política pela simples política. Prega-se aqui a concretização do mandamento constitucional de tutela do meio ambiente do Poder Público, o que implica em uma necessária e inarredável ação integrada entre os diferentes órgãos atribuídos desta competência. É evidente que o princípio da impessoalidade é corolário do diálogo que aqui se prega. O Ministério Público, como órgão ouvinte da democracia que é, interessado apenas na manutenção do interesse público, dialogará com os demais entes públicos com vistas à proteção do meio ambiente. E nada mais. Se a atribuição de zelar pelo meio ambiente também incumbe ao Ministério Público, é natural que ele participe da formação das políticas públicas na matéria ambiental. E como isso seria feito? Através de audiências públicas, reuniões, projetos, fiscalização de contratos públicos e licitações, discussões constantes – que inclui a participação da coletividade, sendo todas essas questões discutidas com transparência à população interessada, como bem prescreve o princípio da participação comunitária, vez que a coletividade também é destinatária da obrigação constitucional aqui discutida. E não se trata aqui de meras discussões formais e protocolares. Afirma-se a necessidade de deliberações acerca das especificidades das políticas públicas tendentes a tutela do meio ambiente. Tome-se como exemplo as 11 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Atlas, 2013; discussões que circundam uma Prefeitura e uma Câmara Municipal acerca da necessidade de deliberar sobre as formas de proteção da vegetação nativa da região ou a manutenção do patrimônio histórico municipal. Uma ação integrada mista pressuporia um debate dialético entre todos os órgãos públicos envolvidos com a política pública que se pretende implementar. Ouve-se a Prefeitura e suas autarquias, ouvem-se os vereadores, ouve-se o membro do Ministério Público, ouve-se a população interessada. Após, travam-se as discussões e, principalmente, as deliberações. E nessa parte principal das deliberações o Ministério Público tem uma função fundamental: tornar as conclusões obtidas uma prescrição obrigatória, valendo-se dos instrumentos que a ordem jurídica lhe fornece caso haja inatividade. Não há nada mais democrático em matéria de implementação de políticas públicas de tutela ambiental do que o sistema de ação integrada que aqui se propõe, seja no âmbito interno do próprio Ministério Público (o que deve ocorrer também dentro das demais instituições), seja no âmbito externo, nas interações interinstitucionais. O diálogo é o principal e necessário caminho para a construção de deliberações racionais, sendo o mais eficaz meio conciliatório entre entes públicos com semelhante atribuição constitucional de tutelar o meio ambiente. 3. CONCLUSÃO Propõe-se com a presente tese, portanto, a necessidade de efetivação das ações integradas para a solução de problemas correntes na complexa área ambiental, dado o atual descompasso institucional que se observa no trato da matéria. Alinhou-se o conceito de ação integrada, sendo esta compreendida como um conjunto de deliberações substancialmente estruturadas, dialeticamente tecidas e concretamente efetivadas após a ativa participação de agentes públicos múltiplos. Para fins meramente didáticos, estabeleceu-se a diferença entre ação integrada pura e ação integrada mista. Sendo a ação integrada pura compreendida como o diálogo que deve haver no âmbito interno do Ministério Público com vistas à formação de uma deliberação convergente que orientará a atuação funcional de seus membros em matéria de meio ambiente, considera-se esta essencial para a padronização de uma opinião ministerial em nível global, sendo possível dela extrair uma identidade, uma forma de pensar comum aos seus respectivos membros, ao menos na temática que envolve a tutela do meio ambiente. Ademais, com a implementação das ações integradas puras, será possível falar na concretização de ações integradas mistas, as quais abrangeriam os diálogos e deliberações efetuados entre o Ministério Público e os demais agentes públicos com atribuições constitucionais de tutela do meio ambiente. Tal instrumento de interação institucional foi proposto com o ímpeto único de tornar mais eficaz a criação e concretização de políticas públicas convergentes em prol do resguardo do direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, políticas estas que, com a participação democrática das mais variadas instituições – mormente com a atuação prospectiva do Ministério Público de forma homogênea – teria maiores probabilidades de obter êxito, chancelando como cumprida a missão constitucional de tutela do meio ambiente. Acredita-se que, com a concretização prática da presente proposta, estar-se-ia colaborando de sobremaneira com o desenvolvimento democrático das instituições – com destaque à uniformização de atuação do Ministério Público –, as quais deliberariam conjuntamente sobre os destinos e perspectivas do meio ambiente em terrae brasilis. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERCLAZ, Márcio Soares; ALVES, Leonardo Barreto Moreira; Ministério Público em Ação – Ed. Juspodvm – 2013; CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio Ambiente – Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Ed. Sérgio Fabris,1993 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3.ed. (reimpressão). Coimbra: Almedina, 1999. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Atlas, 2013; GARCIA, Emerson; Ministério Público; Lumen Juris – 2001, 2a Ed; MAZZILI, Hugo Nigro; Regime Jurídico do Ministério Público; Saraiva, 7 Ed – 2013; MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; Curso de Direito Constitucional – Ed. Saraiva, 8 Ed. – 2013; MILARÉ, Édis; Direito do Ambiente; 3 Ed. – Editora RT – 2001; SARLET, Ingo; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel; Curso de Direito Constitucional – Ed. RT – 2012; SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional, cit., p.20