O significado da codificação na modernidade jurídica: uma análise do
direito constitucional e seu contexto histórico filosófico.
Nara Dias Rodrigues Miranda
Mestranda em Direito Empresarial na FDMC
Resumo
O presente trabalho busca perquirir o contexto histórico e filosófico que norteou a evolução
da Codificação com as modificações de paradigmas filosóficos vigentes nas sociedades,
demonstrando a evolução do direito constitucional através da codificação desde as sociedades
antigas passando pela revolução industrial, duas guerras mundiais, o positivismo e os direitos
humanos, culminando no neoconstitucionalismo.
1 - Introdução
O presente trabalho busca cotejar a evolução histórico-filosófica das Constituições
e das sociedades que as geraram e a elas se submeteram.
Inicialmente abordaremos a codificação, seu significado sociológico e as
primeiras sociedades que adotaram o Constitucionalismo, precedendo inclusive a criação da
denominação hoje utilizada.
Na sequencia, analisaremos o Constitucionalismo Clássico e o Constitucionalismo
social, bem como dos reflexos sociais e a filosofia basilar de tais momentos jurídicos e
históricos.
Concluindo apresentaremos o neoconstitucionalismo, seu contexto histórico, as
modificações trazidas pela mentalidade pós-guerra e seus reflexos nas cartas constitucionais
em vigor.
Os estudos aqui apresentados tomam como fio condutor a obra escrita por
GROSSI, que analisa sob o ponto de vista da filosofia clássica a codificação.
2
– A codificação, seu contexto histórico, implicações filosóficas e seus significados
na modernidade jurídica.
1
Inicialmente cumpre delimitar um marco filosófico relevante quanto a polissemia
do vocábulo ‘código’. Código pode representar um conjunto de leis que regulamentam uma
mesma matéria - como Código Civil, Código Penal, etc; como pode ser atribuído a uma
codificação normativa geral de uma sociedade.
Apesar de existirem na atualidade inúmeros Códigos, enquanto conjunto de leis
que regulamentam matéria afim, o interesse do presente trabalho é acerca do Código enquanto
instrumento que irrompe em determinado momento histórico como fruto de autêntica
revolução cultural, modificando os fundamentos outrora consolidados.
Assim, a análise que buscamos demonstrará como ao longo da história este
Código surge em momentos de modificações filosóficas e sociais representando a ruptura
cultural temporal do momento histórico em que se insere.
O Código enquanto ato de ruptura com o passado, não se trata de um novo modo
de conceber as ordenações antigas; trata-se de um novo modo de conceber o direito (mudança
de paradigma).
Claro que observando a constituição de um novo Código ver-se-ia a continuidade
de conceitos antigos, já que seus elaboradores foram criados sob a influência do regime
antigo, tendo alguns conceitos arraigados e vislumbrados mesmo sob o manto da ruptura.
Afinal, como GROSSI1 acertadamente assevera em sua obra “a história nunca realiza saltos
impensados e o futuro sempre tem um vulto antigo”.
O Constitucionalismo, apesar da expressão ser recente, em sua essência, sempre
existiu enquanto necessidade social da criação de um conjunto de normas básicas
responsáveis por conferir poder ao soberano e regulamentar a convivência social.
Podemos, portanto, analisar a constituição como a compilação de um conjunto de
normas que ilustra o tempo e valores da sociedade onde sua vigência foi eficaz.
Em breve incursão histórica vejamos as modificações dos paradigmas sociais,
filosóficos e legais que nos conduziram ao neoconstitucionalismo que atualmente
conhecemos, com intuito de demonstrar como através da codificação é possível delimitar as
vontades e valores da sociedade que a ela se submete.
1
2.1
O constitucionalismo antigo
2.1.1
Estado hebreu
GROSSI, Paolo. Mitologias Jurídicas da Modernidade.
2
A primeira experiência constitucional de que se tem notícia, no sentido da fixação
de limites ao poder politico, ocorreu na denominada antiguidade clássica.
Na época de estruturação de seu antigo estado os hebreus adotavam constituições
regidas por convicções da comunidade e por costumes nacionais, os quais se refletiam nas
relações entre governantes e governados.
Nesse
período
poderíamos
apontar
como
principais
características
do
constitucionalismo: I) existência de leis não escritas ao lado dos costumes (opinio iuris et
necessitatis); II) forte influencia da religião; III) predomínio dos meios de constrangimento
para assegurar o respeito aos padrões de conduta das comunidades; IV) tendência a julgar os
litígios de acordo com as condições dadas a conflitos semelhantes.
Apesar da distancia histórica que nos repara podemos reparar que houve uma
nítida evolução histórica dos costumes existentes à época, mas alguns dos fundamentos
outrora erigidos e codificados ainda permanecem, mesmo que adaptados aos novos tempos e
as novas normas de conduta sociais.
2.1.2 Grécia
Durante dois séculos existiu na Grécia um ‘Estado político plenamente
constitucional’2, onde foi adotada a mais avançada forma de governo, a democracia
constitucional, tendo como exemplo a cidade-estado de Atenas com sua constituição Sólon
representando o início da racionalização do poder.
As principais características do constitucionalismo grego nas palavras de BULOS3
eram: I) inexistência de constituições escritas; II) a prevalência da supremacia do Parlamento;
III) a possibilidade de modificação das proclamações constitucionais por atos legislativos
ordinários; IV) responsabilidade governamental dos detentores do poder.
2.1.3 Roma
Em Roma o termo Constitucio designava determinadas normas feitas pelos
imperadores romanos que tinham o valor de lei (constituciones), sendo utilizado desde a
época do imperador Adriano.
2
3
LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constituicion.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada.
3
A democracia romana, apesar de menos mencionada e idealizada que a grega,
condicionou estruturas bastante características como ‘principado’ e ‘respublica’, como afirma
SALDANHA4.
Observe-se que sua principal característica foi considerar a liberdade não como
um bem ou uma qualidade da pessoa, mas como ‘bem objetivo e indestrutível, independente
da vontade individual’5.
2.1.4 Inglaterra (Reino Unido)
A experiência constitucional inglesa possui papel destacado na concepção de
constitucionalismo por ser centralizada no principio do rule of law.
O conceito de estado constitucional pode ser empregado pela primeira vez para a
Monarquia constitucional inglesa do século XVII, onde encontramos documentos escritos
mais próximos das constituições escritas modernas. Podemos exemplificar citando o
agreemente of the people (1647) e o instrument of government (1653).
As principais características do constitucionalismo na Idade Média, segundo
Rafael Jiménes Asensio, são: I) a supremacia do parlamento; II) a monarquia parlamentar; III)
a responsabilidade parlamentar do governo; IV) a independência do poder judiciário; V) a
carência de um sistema formal de direito administrativo; VI) a importância das convenções
constitucionais.6
2.2 – O Constitucionalismo Clássico
Num momento posterior à Idade Média alguns elementos passam a ser integrantes
de
todas
as
constituições,
num
período
constitucionalmente
denominado
de
Constitucionalismo Clássico, movimento que foi influenciado por pensadores como Locke,
Montesquieu, Rousseau, inspiradores das revoluções francesa e norte-americana, bem como
por Thomas Jefferson e pelos federalistas.
Neste contexto é possível identificar três elementos básicos comuns a todas as
constituições:
4
SALDANHA, Nelson. Formação da teoria constitucional. P. 14.
BONAVIDES, Paulo. Do estado Liberal ao estado Social. P. 162.
6
ASENSIO, Rafael Jiménes. Constitucionalismo. P. 225.
5
4
- SER TRANSBORDANTE - seguia sem tentar obrigar a sociedade a se manter
em margens muito vinculantes;
- SER PLURALISTA – estava em conexão com a sociedade e suas forças plurais,
expressando-as sem particularizações artificialmente construídas;
- SER EXTRA-ESTATAL – não registrava a voz do poder político contingente,
conservando-se de um indefectível condicionamento.
FACHIN acrescenta que a organização do estado e a limitação do poder politico
foram alcançadas por “meio de duas construções históricas distintas, porém contemporâneas:
a separação dos poderes (separação de funções), na vertente francesa, e o federalismo, na
vertente americana.”7
Neste período é importante destacar o momento ideológico e filosófico
representado por tais codificações, como a filiação ao iluminismo, especialmente clara nos
Códigos Napoleônicos. Onde é possível vislumbrar o conceito do Regente, ou Príncipe, como
homem modelo, com capacidade de compreender a natureza das coisas, decifrá-la e
reproduzi-la em normas que podem ser legitimamente pensadas como universais e eternas,
como se fossem regras sociais daquela harmonia geométrica que rege o mundo.
Aqui percebe-se a característica histórica marcante do Constitucionalismo
Clássico, onde o Regente é tido como uma figura acima das paixões e das mesquinharias
humanas, delineando-se também a conexão da codificação com o jusnaturalismo iluminista.
Precedida pela reforma religiosa, a cultura jusnaturalista também imersa em um
novo mundo secularizado precisava de um vigoroso gancho temporal, e isso foi oferecido
pelo novo sujeito político, protagonista do novo cenário europeu, o surgimento do Estado.
Com o avanço histórico o jusnaturalismo vem desembocar no mais agudo
positivismo jurídico. O Código, mesmo se portador de verdades universais, é reduzido à voz
do soberano nacional, à lei positiva deste ou daquele Estado. Como exemplo, temos o fato de
que a cada mudança dos paradigmas governamentais surge um novo Código.
Assim, a ideia de Código, tendo sido deposta da sua projeção original e natural, e
voltada a uma ordem universal, potencializa-se como expressão da ordem jurídica de um
estado delimitado em termos temporais e espaciais.
A divisão dos poderes, a lado de seu valor garantista, tem para o historiador do
direito a função de fundamentar o monopólio jurídico nas mãos do legislador, já nesse
7
FACHIN, Zulmar. Curso de direito constitucional. P. 41.
5
momento, identificado no detentor da soberania, aqui o jusnaturalismo revela sua dimensão
estratégica, a sagaz estratégia da classe burguesa no momento de conquistar o poder político.
O Código contém uma tipicidade inconfundível, em relação a todas as outras
fontes jurídicas que se manifestaram ao longo da história, que lhe é impressa por uma tríplice
tensão que o percorre, a tendência a ser fonte UNITÁRIA, COMPLETA e EXCLUSIVA.
A ideia do Código como fruto extremo do comportamento geral, realiza a redução
de toda a experiência em um sistema articulado e minucioso de regras escritas, contemplando
o máximo de institutos possíveis.
No entanto o Código não é completo em si mesmo. Sendo necessário ao aplicador
valer-se de outras fontes que possam acompanhar a realidade mutável que ocorre fora da
redução oriunda da codificação.
No projeto jurídico burguês, abstração e igualdade jurídica são noções
‘constitucionais’ que fundamentam o mesmo projeto, separando o mundo do direito dos
mundos dos fatos.
A factualidade começará a ser discutida na Itália, no final do século XIX,
denominada ‘Código privado social’.
A simploriedade da igualdade almejada pelo Código burguês foi expressa de
forma louvável na citação: “a majestosa igualdade das leis, que proíbe ao rico assim como
ao pobre de dormir debaixo das pontes, de mendigar nas ruas e de roubar o pão(...) ele eleva,
sob o nome de igualdade, o império da riqueza”.8
Tal citação busca demonstrar que o Código sofre de incomunicabilidade com a
realidade que regulamenta. O Código como resultado de uma monopolização da produção
jurídica por parte do poder político.
Assim, se o Código fala a linguagem de alguém, esse alguém é a burguesia que
fez a revolução e que finalmente realizou a sua plurissecular aspiração à propriedade livre da
terra e à sua livre circulação.
Admite-se o Código como única lei concorrente, o instrumento príncipe da
autonomia dos indivíduos. É por isso que o Código fala aos juízes, ou seja, aos seus efetivos
aplicadores, aos quais foi entregue a tranquillitas ordinis.
O procedimento de normatização conclui-se no momento em que a norma vem
produzida. Em seguida temos o momento da sua aplicação, ou seja, da vida da norma e sua
eficácia na sociedade para a qual foi criada. Como, mesmo quando da sua aplicação, a norma
8
Anatole France. Le lys rouge.
6
permanece uma abstração da realidade, ou seja, compacta e imutável, a interpretação assume
o papel exegético. Ou seja, a norma deve ser somente explicada através do olhar do
legislador, no intuito de esclarecer a intenção deste quando da sua elaboração e não de
perquirir os paradigmas históricos anteriormente existentes uma vez que isso alteraria a
expressão das modificações filosóficas e sociais contidas na nova norma posta.
2.3 - O constitucionalismo moderno – Modificações sociais e filsóficas após a
primeira guerra mundial
Um novo ciclo constitucional tem início após a primeira guerra mundial, trazendo
novos paradigmas e novas aspirações sociais e filosóficas.
Esta nova roupagem do constitucionalismo foi denominada de Constitucionalismo
Social, e teve como gatilho o esgotamento fático da visão liberal, impotente diante das
demandas sócias que abalaram o sec. XIX. Sob estes paradigmas muitas questões outrora
assumidas como restritas ao âmbito individual, passaram a ser assumidas pelo estado que se
tornou um prestador de serviços.
Os ciclos constitucionais verificados neste período são bem ilustrados na doutrina
de RUFFIA9 que assim os classifica:
a) Constituições de democracia marxista ou socialista (1918): típicas de países da
Europa centro-oriental e de alguns estados da ásia
b) Constituições de democracia racionalizada: (1919-1937) posteriormente à
primeira guerra mundial surgiu um importante conjunto de constituições, dentre as quais se
destacam a constituição mexicana (1917), constituição de weimar (1919) e a constituição
austríaca (1920), cuja elaboração contou com a colaboração de Hans Kelsen à época assessor
jurídico do Ministério da Guerra.
2.4 - O neoconstitucionalismo e seu contexto filosófico e histórico
O novo período constitucional traz em seu cerne uma série de características que
devem ser postas antes de analisarmos se a ideia de Código como apresentada até aqui
9
RUFFIA, biscaretti di. Introduzione al diritto costitucionale comparato. P. 96 e ss.
7
permanece válida, ou se tornou-se algo obsoleto e engessado, que não atende as demandas
sociais de um mundo globalizado. Neste contexto algumas considerações se impõem:
1) Rapidez da transformação social na civilização moderna. Observe-se que as
sociedades anteriores tinham um ritmo de transformação extremamente lento, o volume de
informações disponíveis e sua velocidade era menor, o deslocamento entre regiões
geograficamente distantes era lento e demorado e o contato com sociedades e culturas
diversos escasso ou inexistente para a maioria dos cidadãos. Atualmente o legislador se vê
diante de uma sociedade globalizada, cujas as modificações são constantes e velozes, que
frequentemente obrigam o legislador a uma atividade febril, modificando o conteúdo da
norma logo após tê-lo produzido.
2) A complexidade da civilização contemporânea. Considerando que a
codificação inaugurada em 1804 foi uma tentativa de redução da complexidade, é também
verdade que se tratava de uma complexidade passível de redução. Atualmente a situação é
inacreditavelmente diferente. A atual complexidade dificilmente poderá ser reduzida.
3) Tensão voltada a universalização. O Código encarnou a autêntica constituição
do Estado burguês se revestido de um caráter filosófico-político.
Neste contexto multiplicaram-se os níveis de legalidade. No século XIX, surge a
legislação especial ou excepcional criada pelo legislador ordinário; já no século XX, surgem
as Constituições como verdadeiras ordens normativas, concretíssimas, tornando-se portadoras
de um harmonioso sistema de valores.
Após os horrores e atrocidades cometidas durante a 2ª Guerra Mundial, o
positivismo jurídico foi repensado e mitigado, a valorização da pessoa humana passou a ser o
centro do Constitucionalismo e novos paradigmas começaram a nortear as Constituições ao
redor do mundo, buscando um ponto de equilíbrio que supere os limites positivistas antes
imperativos sem abandonar a positividade do direito.
No Estado Constitucional Democrático a jurisdição vai além da validade formal
das leis, buscando sua compatibilização com a Constituição, sobretudo no tocante aos Direitos
Fundamentais.
Assim, surge o chamado neoconstitucionalismo, que transita entre elementos das
tradições francesa, e seu forte conteúdo normativo, e norte-americana, com suas garantias
constitucionais, resultando em uma constituição transformadora e pautada em uma forte
atuação judicial.
8
Esse constitucionalismo pós-guerra apresenta além da necessidade de suprir as
deficiências apontadas por GROSSI acerca da velocidade e adaptabilidade das leis ás
negociações características próprias bem definidas e marcantes.
Observemos as características em destaque nos ciclos constitucionais relativos a
este período:
a) Constituições da democracia social (1946 até os dias atuais): abrange as
constituições do 2º pós-guerra adeptas de uma democracia clássica ou ocidental. Compreende
importantes constituições europeias como a francesa (1947), a alemã (1949), a portuguesa
(1976) e a espanhola (1978).
b) Constituições dos países em desenvolvimento: formado por um grupo de
constituições inspiradas, em sua maioria, no constitucionalismo clássico (modelo britânico,
francês ou norte-americano), ainda que não lhes faltem características das constituições
socialistas.
Sob o enfoque constitucional o constitucionalismo contemporâneo é decorrente de
uma nova visão da atitude interpretativa e das tarefas da ciência e da teoria do direito,
preocupadas em desenvolver um trabalho crítico e não apenas descritivo.
O neoconstitucionalismo trata de um modelo particular que se presta apenas para
sistemas constitucionais avançados, isto é, dotados de uma constituição democrática e voltada
para
assegurar
os
direitos
fundamentais
e
sua
efetividade.
Nesse
sentido
o
neoconstitucionalismo deve ser compreendido como uma teoria particular aplicável apenas a
um modelo de organização político-jurídica: o Estado Constitucional Democrático.
Segundo SANCHIS e em consonância aos questionamentos levantados por
GROSSI citamos abaixo as características destacadas pelo primeiro autor como atinentes ao
neoconstitucionalismo:
I) Mais princípios que regras;
II) Mais ponderação que subsunção;
III)
Onipresença da constituição, em todas as áreas jurídicas e em todos os
conflitos minimamente relevantes, em lugar de espaços isentos em favor da opção legislativa
ou regulamentária;
IV)
Onipotência judicial em lugar de autonomia do legislador ordinário; e,
9
V) Coexistência de uma constelação plural de valores, às vezes tendencialmente
contraditórios, em lugar de uma homogeneidade ideológica em torno de um punhado de
princípios.10
Sobre a lentidão do legislador e sobre sua incapacidade de corresponder às
solicitações de uma sociedade civil extremamente complexa GROSSI acredita ser necessário
repensar o sistema formal das fontes, também para torná-las mais consoante ao projeto e ao
desenho da carta constitucional; e repensar, principalmente, o papel da lei, que, lhe parece,
possa ser o de fornecer algumas molduras relevantes para o desenvolvimento da vida jurídica.
É claro que o Estado não pode abdicar da fixação de linhas fundamentais, mas
também é claro que se impõe uma simplificação do sistema legislativo onde a desconfiança
iluminista do social seja abandonada e um autêntico pluralismo jurídico se apresente, onde os
indivíduos sejam os protagonistas ativos da organização jurídica do mesmo modo que
acontece nas transformações sociais.
Aqui, nos deparamos com uma descontinuidade existente entre o conceito de
Código consolidado com o iluminismo e a Codificação fluida, dinâmica e elástica de que
necessitam as sociedades atuais.
3
– Conclusões
Face os elementos analisados e as legislações aplicadas à época resta concluir que
as constituições e sua aplicabilidade vem se adequando e se amoldando às sociedades que
elas regulamentam.
Isso gera um certo conforto quanto a aplicação positivista da lei, uma vez que a
mesma já se encontra mitigada na própria constituição que lhe confere eficácia e validade e
conforme demonstrado atende historicamente aos anseios e realidade fática do contexto em
que se insere.
Verifica-se que apesar da evolução social e mudanças de paradigmas a
codificação é indispensável, no entanto, assim como historicamente sua evolução
acompanhou os perfis das sociedades que a comportavam, hoje nos deparamos com a
necessidade de uma codificação cuja aplicação seja dinâmica e mutável como a sociedade, no
entanto, resguardando seus valores fundamentais privilegiados pela sociedade que a
comporta.
10
SANCHIS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo e ponderación judicial. P. 126-127.
10
Assim, na atual conjuntura, formada por situações dinâmicas, elásticas e mutáveis,
a codificação corre o risco de tornar-se um revestimento rígido demais, com um
envelhecimento precoce do texto normativo e de uma práxis que continua a galopar seguindo
os fatos, prescindindo das inadequadas regras autoritárias.
O grande desafio é que o se apresente como uma espécie de grande moldura,
como um ‘Código dos princípios’, que norteia e garanta segurança à sociedade sem tornar-se
rapidamente obsoleto frente às mudanças continuas que demandam regulamentação.
Referências
ASENSIO, Rafael Jiménes. Constitucionalismo. Barcelona: Ariel.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1996.
BONAVIDES, Paulo. Do estado Liberal ao estado Social. São Paulo: Malheiros, 2007.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 2005.
CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional Didático. Belo Horizonte: Del Rey,
2002.
FACHIN, Zulmar. Curso de direito constitucional. São Paulo: Método, 2008.
GROSSI, Paolo. Mitologias Jurídicas da Modernidade.
LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constituicion. Barcelona: Ariel, 1970.
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Coimbra: Coimbra Editora, 1990.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2006.
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. São Paulo: Editora Método, 2009.
RUFFIA, Biscaretti Di. Introduzione al diritto costitucionale comparato. Milano: A. Giuffrè,
1988.
SALDANHA, Nelson. Formação da teoria constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.
SANCHIS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y ponderación judicial. Madrid: editorial
Trotta, 2005.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros,
2004.
11
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