III Seminário do Centro de Ciências Sociais Aplicadas Cascavel – 18 a 22 de Outubro de 2004 A situação vivida por trabalhadores após demissão: um caso de bancários de Cascavel - Paraná Pedro Alves (Mestrando em Desenvolvimento Regional e Agronegócio, área de concentração: Gestão e Desenvolvimento Agroindustrial, da UNIOESTE, campus de Toledo/PR. Docente da UNIPAN-União Pan-Americana de Ensino e da FADEC - Faculdade de Cascavel). E-mail: [email protected]. Endereço: Rua Siqueira Campos, 804 Bloco “A” Apto. 404, Cep: 85.812-220. Cascavel – Pr. Telefone: (0XX45)9109-3483. Neide Tiemi Murofuse (UNIOESTE). E-mail: [email protected]. Endereço: Rua Treze de Maio, 1875. CEP: 85.813-210Cascavel – Pr. Telefone: (0XX45) 223-0229. Resumo: Trata-se de um estudo de caso que teve como objetivo investigar como ocorreu o enfrentamento e a adaptação de ex-bancários de uma instituição financeira, ao mundo do trabalho após sua demissão. Além de analisar a relação entre o (des)emprego e a introdução de novas tecnologias no setor bancário de Cascavel na visão de ex-bancários. Os dados foram coletados, por meio de entrevistas semi-estruturadas com quatro ex-bancários de uma instituição bancária, privada demitidos no período entre 1995 e 2000. O conteúdo das entrevistas foi analisado na perspectiva de uma abordagem qualitativa dos dados. Constatouse que foram diversas as dificuldades enfrentadas até conseguirem recolocação e adaptação em outra atividade, tendo alteração no padrão econômico dos entrevistados. Alguns dos entrevistados tinham conseguido se inserir novamente no mercado de trabalho formal, com um emprego protegido e outros estavam desprotegidos, ou seja, sem carteira assinada, sem uma série de benefícios e direitos legais. Evidenciou-se que a crise do emprego, trabalho informal, subemprego, precarização, exclusão social que se alastra assustadoramente no Brasil e muito citada por diversos estudiosos é uma realidade que causa vergonha, constrangimento e sofrimento a quem se encontra na condição de desempregado, como se fosse o único responsável pelo desempregado. Palavras-chave: Bancários, Desemprego, Demissão. 1. Introdução Concomitante às intensas e rápidas transformações que se processam na sociedade, especialmente no mundo do trabalho, a reestruturação produtiva tem produzido mudanças nos processos de trabalho através da introdução de novos equipamentos e novas tecnologias organizacionais. São mudanças que vêm ocorrendo, principalmente a partir dos anos 1970, nos países centrais, constituindo o chamado padrão de acumulação flexível, que tem como marca a introdução de novas tecnologias e novas formas de gestão e organização do trabalho para a produção (ANTUNES, 2000). Os espaços produtivos são transformados e novas estratégias são implantadas pelas empresas, visando o aumento da produtividade e do lucro, na tentativa de manter-se em um mercado cada vez mais globalizado e competitivo. A aceleração da reestruturação produtiva produziu uma profunda reorganização do trabalho tanto no interior da fábrica como externamente, tendo a automação um peso significativo. A implantação dessas novidades resultou em maiores ganhos, para as empresas, devido ao aumento da produtividade e da redução do número de trabalhadores utilizados na produção. Em decorrência do processo implementado, houve importantes mudanças nas formas de utilização da força de trabalho, com impactos significativos sobre a produtividade e a redução do emprego. Foi desencadeado “um processo de desemprego estrutural que, junto 2 com o trabalho precarizado, atinge cerca de 1 bilhão de trabalhadores, o que corresponde a aproximadamente um terço da força humana mundial que trabalha”, conforme Antunes (2000, p.190-1) Assim, as conseqüências de uma “[...] economia incapaz de manter e gerar novos empregos, a informalidade é uma estratégia para garantir a sobrevivência” (MATTOSO, 2000, p.11). Portanto, para o trabalhador, resultou a realidade da diminuição do trabalho formal (MATTOSO, 2000), do aumento do desemprego, da expansão do trabalho informal (SINGER, 1998; 1999) e da precarização do trabalho (ANTUNES, 2000). O processo da reestruturação produtiva nos setores industriais no Brasil ocorreu de forma desigual e teve o aprofundamento e intensificação do processo ocorrido a partir da década de 1990 (INVERNIZZI, 2000). A partir dos anos 1980 há uma redução da atividade industrial em nosso país, ao mesmo tempo em que ocorre uma ampliação do emprego no setor de serviços. O sistema financeiro brasileiro tornou-se um dos mais importantes subsetores do setor terciário da economia tanto pela sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) e na População Economicamente Ativa (PEA), quanto na difusão das novas tecnologias e das novas formas de organização do trabalho (SEGNINI, 1998). Ainda que as transformações no setor financeiro nacional tenham sido aceleradas na década de 1990, com as políticas de liberalização, desregulamentação e privatizações, cabe assinalar que as condições institucionais necessárias e indispensáveis foram oportunizadas a partir da política financeira e bancária adotada pelo governo militar do pós-64, com a finalidade de acelerar a taxa de desenvolvimento econômico e introduzir o país no processo de internacionalização do capital. A década de 1990 traz como elemento novo a política de informática que permitiu, aos bancos, incorporar as mais recentes inovações do mercado internacional (SEGNINI, 1998; 1999). Assim, acelerou-se a implantação das inovações tecnológicas e organizacionais com mudanças na forma de execução e organização do trabalho bancário brasileiro. Dentre as mudanças implementadas pelos bancos, especialmente a partir dos anos de 1990, estão as modificações nos layout e na forma de atendimento dos seus usuários. Com as máquinas de auto-serviço, os clientes passaram a executar várias atividades para o banco, possibilitando a diminuição do número de bancários no sistema financeiro nacional. O DIEESE estima que foram eliminados 40% dos postos de trabalho entre os anos de 1990 e 1997. Desta maneira, a automação bancária e a introdução de novas tecnologias organizacionais contribuíram para o desemprego de mais de 400 mil bancários entre as décadas de 1980 e 1990 (JINKINGS, 2002), ao mesmo tempo em que se conquista o aumento da produtividade e dos lucros bancários à custa da intensificação do trabalho para o bancário (SEGNINI, 1998). Para JINKINGS (1995, p. 61) o sistema de auto-atendimento e a generalização do uso de cartões magnéticos “repercutiram profundamente no trabalho bancário, reduzindo o movimento de clientes no interior das agências, extinguindo postos de trabalho e criando outros”. A automação não significou melhores condições de trabalho para os bancários. Ao contrário, contribuiu para o surgimento de novos problemas como o aumento da pressão, do controle, a intensificação e o tensionamento dos ritmos de trabalho, produzindo novos problemas de saúde (JINKINGS, 1998), dentre eles as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou como é chamado mais recentemente de Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) (MUROFUSE, 2000). A eliminação de postos de trabalho, superposição de agências, reestruturação das formas de gestão, fusão de postos de trabalho, bem como pelo uso intensivo das tecnologias da informação provocaram uma forte redução no mercado de trabalho bancário. Em 1986, a categoria bancária representava um milhão de trabalhadores e foi reduzida para 497 mil bancários em 1996, ou seja, em dez anos, 503 mil postos de trabalho foram suprimidos (SEGNINI, 1999). Diante desse contexto de eliminação de postos de trabalho, o presente estudo teve como objetivos gerais investigar como ocorreu o enfrentamento e a adaptação de 3 ex-bancários ao mundo do trabalho após sua demissão; analisar a relação entre o (des)emprego e a introdução de novas tecnologias no setor bancário de Cascavel na visão de ex-bancários. 2. Metodologia Trata-se de um estudo de caso, realizado numa perspectiva qualitativa com a utilização dos pressupostos teórico-metodológicos descritos por Triviños (1987) e Minayo (1998). A população foi constituída por ex-bancários demitidos entre os anos de 1995 e 2000. No levantamento realizado junto aos relatórios disponibilizados pelo Sindicato dos Bancários de Cascavel, foi constatado um total de dezoito ex-bancários em relação aos demitidos por um banco privado, com agência na cidade de Cascavel, situado na região oeste do estado do Paraná. Cabe destacar que essas demissões referem-se aquelas homologadas pelo sindicato bancário, portanto, o número total pode ser maior do que o obtido, uma vez que no período investigado foi fechado a unidade de compensação em Cascavel e o serviço transferido para centros maiores, como Curitiba, Londrina e São Paulo. Optou-se por investigar ex-funcionários dessa agência bancária, por ser um banco que, segundo o Relatório Anual do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Cascavel, constituía-se na expressão da diminuição do trabalho humano no período estabelecido para a pesquisa. De acordo com o referido relatório verifica-se desde 1995, ano após ano, uma progressiva diminuição do número de funcionários na cidade, ou seja, de 1.128 funcionários existentes em 31/12/95, registrou apenas 694 no final do ano de 2000. E na região oeste, que compreende 22 municípios do pólo Cascavel, o número de bancários no final de 1995 que era de 1.542 foi reduzido para 935 no ano de 2000 (RELATÓRIO, 2001). A amostra foi constituída por quatro ex-bancários, de ambos os sexos que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: a) ex-bancários que consentissem em participar de livre e espontânea vontade da pesquisa; b) possuíssem residência em Cascavel; c) tivessem trabalhado na agência bancária em Cascavel; d) tivessem sido demitidos entre os anos de 1995 a 2000 e) que tiveram a demissão homologada pelo Sindicato dos Bancários. A coleta dos dados ocorreu através de entrevistas semi-estruturadas, para verificar como se deu o processo de transição do emprego do banco e o impacto com o mundo do trabalho após sua demissão. As entrevistas foram gravadas em fita cassete e transcrita posteriormente. Os conteúdos das entrevistas foram analisados de acordo com os seguintes objetivos: verificar o local onde os ex-bancários estavam alocados, o que faziam na atualidade e como se adaptaram ao mercado de trabalho, estabelecendo relação entre o emprego protegido do banco com o mundo do trabalho após a demissão. 3. Resultados e Discussão O ingresso no banco privado dos entrevistados ocorreu na década de 1980, quando ainda eram jovens com idade variando entre 17 e 19 anos. A demissão ocorreu entre os anos de 1995 e 2000, portanto após um período de tempo razoável no banco. Os ex-bancários relembram que o ingresso no banco significou “a melhor coisa que me aconteceu” (E1), já que o trabalho bancário era visto como “algo maravilhoso, estava longe de qualquer coisa que imaginava” (E2), e representava uma ascensão profissional visto que os trabalhos exercidos anteriormente como balconista, funcionário de transportadora, secretária, recepcionista ou telefonista era considerado por eles como sendo “inferiores e pouco importantes” (E3), ainda que a admissão inicial tenha sido como contínuo do banco. A função de bancário era “bem vista na sociedade” (E4) que, além de proporcionar “status” (E2, E3, E4) haviam as vantagens do emprego bancário que incluía a “remuneração era o dobro do que ganhava [...] tinha vários benefícios, que até então nem conhecia” (E2), “bastante benefícios [...], quando você fazia hora extra recebia [...] tinha vale alimentação, [...] 4 atendimento médico [...] não precisava procurar atendimento mais baixo porque você tinha um padrão de vida bom” (E4). Essa valorização social da carreira de bancário relatada corrobora os resultados encontrados por Segnini (1998). O resgate do início da vida bancária dos entrevistados, indicou que todos eles tinham grandes perspectivas profissionais e durante o tempo que permaneceram no emprego eles desenvolveram atividades em diversos setores dentro do banco. O trabalho bancário foi considerado como “o único emprego de grande porte que tive até hoje, o bom emprego, o melhor de todos” (E3). Perguntamos então: o que fez com que a situação se revertesse e aqueles jovens entusiastas viessem a mudar de opinião, como relatam e a própria situação de cada um irá nos mostrar? Veremos que todos se sentiram desprovidos com o desemprego. Mas o banco não lhes dava segurança no início? É aí que entraremos na questão central desta pesquisa, a qual pretendemos responder ao nosso objetivo geral - analisar a relação entre o (des)emprego e a introdução de novas tecnologias no setor bancário de Cascavel na visão de ex-bancários. Assim, será que as inovações tecnológicas tiveram influência sobre o desemprego bancário, ou, o incremento tecnológico foi responsável pela diminuição do quadro funcional resultando em demissões? Em função do tempo de serviço no banco que variou entre 7 e 12 anos, constata-se que os entrevistados acompanharam o processo de mudanças implementadas no sistema financeiro nacional, como foi apontado por Jinkings (1995, 1998) e Segnini (1998, 1999). Na visão deles a saída do banco ocorreu devido à informatização, com as tecnologias implantadas e a modernização mudando do “banco manual para o banco eletrônico” (E3). Com a diminuição do número de bancários na agência, alguns foram sendo reaproveitados no processamento. Entretanto, com a modernização tecnológica, o setor de compensação de Cascavel deixou de existir e os trabalhos do centro de processamento passaram a ser efetuados por Curitiba e São Paulo. Esta realidade diferia do início da carreira bancária quando se “precisava de muita gente para fazer um serviço, às vezes eram quatro ou cinco pessoas para fazer um determinado serviço” (E1). Muitos serviços bancários foram terceirizados para as casas lotéricas, como o pagamento das contas de energia elétrica e da companhia telefônica. Com o fechamento da unidade de compensação, houve a dispensa de “todo o quadro, na época, eram, oito ou nove, os que não aceitaram transferência foram desligados” (E2). Além disso, como o “banco não quer mais atender o cliente; a sua meta é reduzir o quadro funcional e transferir para o cliente a instrução para que este se auto-atenda” (E3), havia uma pressão sobre os caixas bancários, inclusive com premiação, para que estes tentassem convencer os clientes a utilizarem o auto-atendimento. Aqueles que “conseguissem convencer o cliente a transferir alguns serviços da fila do caixa de balcão para o caixa eletrônico, significava ponto positivo, caso contrário, ponto negativo” (E3) e, assim, iam acumulando pontos no programa de premiação. Ainda que inicialmente houvesse resistência por parte dos clientes na utilização do caixa automático, com o tempo, instrução do caixa do banco incentivando dizendo que “o auto-atendimento, é prático, rápido, não precisa você vir na agência, vai lá fora no caixa-eletrônico” (E4) o cliente foi se habituando com a nova modalidade de atendimento. Portanto, na visão dos ex-bancários, a modernização tecnológica através do incremento do uso de auto-atendimento, aliado ao fechamento da unidade de processamento da cidade e a transferência dessa atividade para outros municípios, contribuíram para a diminuição do quadro funcional do Banco em Cascavel. Ainda que a tecnologia em última instância seja a causa do desemprego através da “difusão do auto-serviço facilitado pelo emprego universal do microcomputador” (SINGER, 1998, p.17) e pela “substituição do trabalho vivo pelo trabalho morto” (ANTUNES, 1999, p.212), cabe ressaltar que as 5 mudanças organizacionais no interior dos bancos estão ligadas “a questões econômicas, políticas e sociais e não simplesmente decorrentes de aspectos tecnológicos” (SEGNINI, 1999, p.191). Refazer a trajetória individual dos entrevistados, desde o momento da demissão até o emprego que estão exercendo na atualidade possibilita entender melhor as condições enfrentadas pelos ex-bancários. A demissão constituiu-se em um fato marcante na vida de todos os entrevistados, pela desestabilização e os sentimentos que foram assim expressos: “meio desnorteados”(E4), “não sabia que rumo tomar” (E1), “é como se tirassem o chão do teu pé” (E4), sentindo-se “triste”(E4) e “chorando como criança” (E1), enfim é “muito difícil enfrentar o desemprego” (E3). Relataram que vivenciaram o drama e o pânico do desemprego pós-banco, sentindo-se desnorteados após a demissão, porém, a necessidade de garantir a sobrevivência fez com que eles aos “poucos você vai vendo que [...] tem que batalhar, que tem que tentar aos poucos ir retomando tua vida, seguir progressivamente, porque se você ficar chateado, vai ficar doente, quem vai sofrer vai ser você” (E4). Foi evidenciado que a condição de desempregados os colocam em contato com um universo totalmente novo, diferente e desesperador. O despreparo deles ficou presente quando afirmaram: “só sei ser bancária, não sei mais nada na vida”(E1). Foi com a demissão que eles compreenderam que ser bancário é apenas uma função e “na verdade o bancário não é profissão”(E3). Para amenizar a situação de desempregado e sem ter direito a opções, os entrevistados tiveram que realizar diversas atividades, como revelam as falas a seguir: “fazia trabalhos para os colegas da sala e fazia trabalho para um gerente desse novo banco [...] trabalhar numa empresa terceirizada [...], que era um tele-marketing”(E2), outro entrevistado foi “montar uma microempresa de marmitex, em sociedade com outras três amigas que durou apenas três meses”(E1). Teve ainda aquele que foi trabalhar como vendedor de seguros de vida, títulos de capitalização e ficou por pouco tempo pois para continuar, teria que abrir uma empresa, fazer uma carteira de clientes, um “típico vendedor de seguros” (E4). Dentre os participantes do presente estudo, teve quem conseguiu uma única opção, após seis meses de desemprego. O mesmo foi trabalhar como frentista de um posto de combustíveis, em cuja atividade se mantinha por ocasião da realização das entrevistas. Outros trabalhavam como: gerente da sessão de livros de uma livraria; Consultora de Negócios Residente de uma empresa multinacional e o outro na função de Assessor de Diretoria, de uma associação comercial. Assim, cada um estava alocado em lugar diferente, exercendo atividade díspar. A informalidade torna-se uma estratégia para garantir a sobrevivência para o desempregado de uma sociedade com uma economia incapaz de manter e gerar novos empregos como afirmou Mattoso (2000). A precariedade das relações de trabalho ficou evidente nos relatos dos ex-bancários que o fato de “não ser registrado” e “não ter nenhum benefício” torna o emprego que “não lhe dá segurança” (E3). A forma desprotegida de trabalho resulta em subtração de benefícios e direitos que, apesar de limitados, a carteira assinada ainda proporciona, como em casos de doença e acidente de trabalho, aposentadoria, fundo de garantia e férias, por exemplo. Ainda que a demissão não tenha representado a redução na renda mensal, ela interferiu na vida social com a mudança de comportamento de pessoas que eram do círculo de convivência como explicita a fala a seguir: “veja o pessoal me cumprimentava na rua, me convidam para caçar, pescar. Hoje os caras [...] passam por mim e nem cumprimentam mais” (E3). A piora nas condições de trabalho também foi mencionada: “Somando tudo a renda é maior [...] no banco eu trabalhava com ar condicionado, hoje trabalho no frio durante a noite, além de trabalhar aos finais de semana e feriados”(E3). 6 No relato dos entrevistados a demissão do banco revelou aspectos positivos como a possibilidade de exercer um trabalho mais envolvente, expressando que “aqui eu estou usando muito mais agora o meu QI, digamos assim, do que lá porque lá era tudo tão automático e aqui não, todo dia tem alguma coisa diferente” (E1). Outras vantagens mencionadas foram o fato de que existe maior “disponibilidade de tempo, não tem que bater cartão (E2) bem como “não há tanta pressão, como havia no trabalho do banco” (E4). Mesmo que a pressão continue existindo, ela é considerada como sendo “administrável, uma pressão boa, ela é necessária até às vezes” (E2). Foi salientado também a questão financeira: “eu ganhava o valor que eu ganho hoje, mas, eu não tinha qualidade de vida, eu não descansava, eu vivia estressada, eu era insatisfeita no trabalho” (E2). 4. Considerações finais e conclusões A realização do presente estudo evidenciou que os entrevistados ingressaram como bancários quando ainda eram jovens e o emprego para eles representou uma ascensão social, independente da função ocupada no momento do ingresso no banco. Trabalhar no banco significava uma elevação no nível social, em função da remuneração e das vantagens e benefícios concedidos pelos bancos. Além disso, existia a expectativa de ascensão na carreira bancária e assim, foram exercendo diferentes funções ao longo do período de 7 a 12 anos em que permaneceram na instituição financeira estudada. Nesse período de trabalho bancário os entrevistados relataram que foram testemunhas das várias mudanças implementadas; como a passagem do banco manual para o banco eletrônico, a instrução para que o cliente utilizasse cada vez mais o auto-atendimento contribuindo desta forma para a diminuição do número de trabalhadores a cada dia. Os depoimentos dos ex-bancários de um banco de Cascavel, confirmam que a introdução da microeletrônica contribuiu para a diminuição do quadro funcional do banco. O desemprego no setor bancário foi confirmada com o levantamento realizado através do Relatório Anual do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Cascavel, junto ao Sindicato dos Bancários, em que verificou-se que ano após ano, desde 1995, houve uma progressiva diminuição do número de funcionários na cidade de Cascavel e região oeste do Estado do Paraná. O Banco investigado demitiu no período de 1995 a 2000, dezoito funcionários, que passaram pelo processo de homologação. Desses, foram entrevistados quatro ex-bancários que compuseram a amostra do presente estudo. O momento da demissão foi marcante para os entrevistados, especialmente em função da expectativa que se tinha de se manter no quadro funcional. Com a demissão, ele passou a conviver com um mundo desprovido de segurança, precisando enfrentar o mercado de trabalho, de igual para igual junto a outros tantos, face à gradativa diminuição do quadro funcional no setor. Corroborando com estudiosos da temática sobre desemprego e a precarização que se propaga em função da reestruturação produtiva implementada no mundo do trabalho, os depoimentos recolhidos na presente investigação, evidenciaram que os trabalhadores que antes da demissão eram bancários, após esse evento passaram a exercer diferentes atividades e em setores distintos. Por ocasião das entrevistas eles desempenhavam as funções de gerente de livraria, frentista em comércio de combustíveis, assessor de diretoria e consultor de negócios residente. Após a saída do banco, as dificuldades e barreiras que enfrentaram foram muitas, passando por situações as mais conturbadas até conseguirem se adequar novamente ao mercado de trabalho. Embora, tenham sido absorvidos pelo mercado de trabalho, houve a oscilação no padrão econômico e nem todos estavam protegidos no sentido de possuir um vínculo formal de trabalho com carteira assinada. A precariedade das relações de trabalho implica na retirada de uma série de benefícios e direitos legais, que antes possuíam quando tinham a carteira assinada. A exclusão do mercado formal de trabalho e o desenvolvimento de 7 atividades informais, constitui-se em um “regime de trabalho sem reconhecimento legal e em condições precárias, configurando assim uma situação de subemprego” (POCHMANN, 1998, p. 224). A presente investigação realizada com os ex-bancários da cidade de Cascavel/PR, apontou que a crise local do emprego, com reflexos no trabalho informal, subemprego, precarização, exclusão social, dentre outros agravantes, se alastra assustadoramente no Brasil e em escala planetária. O caso de nossa cidade – explicitada neste estudo de caso –, não é apenas reflexo do que ocorre em nível nacional e internacional, mas mostra que o movimento que ocorre é resultado do processo de intensificação da crise estabelecida na estrutura do capital, expressa de maneira mais evidente nas últimas três décadas do século XX e neste início de novo milênio. Nesse sentido, é possível conciliar o desenvolvimento tecnológico, econômico, social e humano? 5. Referências bibliográficas ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho. Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 3. ed., São Paulo: Boitempo, 2000. 258p. CHESNAIS, F. A mundialização do capital. Rio de Janeiro: Xamã, 1996. 335p. 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