Os Jogos Paraolímpicos:
o contexto histórico e atual
Jane da Silva Gonzalez | [email protected]
Rodrigo Pereira da Silva
Grupo de Pesquisa em Estudos Olímpicos
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Brasil
0 | Abstract
The objectives of this study are to describe the evolution
of the Paralympic Games and to point out the importance
of the role of the physical educator working with physically
handicapped people. The paper is conceived in order to
demystify possible cultural, educational and/or physical
obstacles that may hinder the access to adapted sports.
Besides the physical benefit, sport offers handicapped
people the opportunity to test their limits and potentialities.
Handicap sportspeople may acquire enough autonomy and
self-confidence to overcome daily setbacks with happiness
and joy. The present study also approaches the main types
of physical handicap, suitable sport events and the
evolution of the Brazilian adapted sports in light of the
Paralympic Games.
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1 | Histórico
O esporte para pessoas com deficiência física teve início
após a 1ª guerra mundial (1914-1918), devido ao grande
número de lesões e amputações causadas em combate.
Em 1918, soldados alemães com deficiência adquirida após
a primeira guerra mundial, começaram a praticar as
modalidades de Tiro e Arco e Flecha. Mas o grande marco
foi em 1944, quando o Dr. Ludwig Guttmann, neurologista
alemão, a convite do governo inglês, estabeleceu um
programa para reabilitação de veteranos de guerra no
Hospital de Reabilitação de Stoke Mandeville, na cidade
inglesa de Aylesbury.
No princípio, a prática esportiva tinha um caráter de
reabilitação, mas com o crescimento do número de
praticantes, o Dr. Guttmann considerou a possibilidade de
organizar um campeonato para homenagear estes heróis
de guerra e divulgar o trabalho que estava sendo feito. Foi
então que ele idealizou os I Jogos de Stoke Mandeville, em
29 de Julho de 1948.
Souza (1994) enfatiza que foi após a Segunda Guerra
Mundial que a prática desportiva teve maior incremento no
contexto da prevenção e reabilitação. A partir daí, o esporte
para pessoas com deficiências físicas não parou de crescer
e, desde 1960, quando foram realizados os primeiros Jogos
Paraolímpicos (paralelo aos Jogos Olímpicos), vem se
tornando cada vez mais popular.
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2 | As Paraolimpíadas
Ao falar das Paraolimpíadas, é necessário que se faça
referência ao Dr. Ludwig Guttmann. Ele começou o trabalho
com aproximadamente 14 homens e duas mulheres na
modalidade de Arco e Flecha. Em 1948 ele idealizou os I
Jogos de Stoke Mandeville (paralelo aos Jogos Olímpicos de
Londres, 1948) com a participação de aproximadamente 20
atletas. Tal fato teve ótima aceitação, e quatro anos depois
houve a realização dos II Jogos de Stoke Mandeville, com a
participação de aproximadamente 130 atletas, entre
ingleses e holandeses. Foi então que os organizadores
decidiram realizar este evento anualmente, que não parou
de crescer a ganhar notoriedade.
O grande marco das Paraolimpíadas foi em 1958, quando o
governo italiano preparava-se para sediar as Olimpíadas
de 1960 em Roma, o então diretor do centro de Lesionados
Medulares de Ostia, Antônio Maglia, propôs que os Jogos
de Stoke Mandeville de 1960 se realizassem em Roma, após
as Olimpíadas. De acordo com Maglia, seria uma
oportunidade para mostrar ao mundo, que os portadores
de deficiência poderiam também ter sua Olimpíada.
Com o apoio do Comitê Olímpico Italiano, cerca de 400 atletas
portadores de deficiência de 23 países, participam da
competição que repercutiu positivamente em todo o mundo.
Seria a primeira “Paraolimpíada” Desde então, as
Paraolimpíadas acontecem duas semanas após os Jogos
Olímpicos, e nas mesmas instalações.
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Com o crescimento do esporte adaptado e da tecnologia
nele empregada, as Paraolimpíadas atingiram um patamar
invejável, e atualmente desfruta do status de ser o segundo
maior evento do mundo, perdendo apenas para as
Olimpíadas. Para estabelecer uma comparação, o número
de atletas que participaram dos primeiros Jogos
Paraolímpicos de Roma em 1960, subiu de 400 para 4.429
representantes de 139 nações em Atenas 2004 (Comitê
Paraolímpico Internacional - IPC).
3 | Modalidades Paraolímpicas
As modalidades esportivas para pessoas com deficiências
físicas são baseadas na classificação funcional, com o intuito
de agrupar os deficientes físicos em categorias, para que
possam competir em igualdade de condições com os demais
atletas de seus grupos. Além disso, atualmente apresentam
uma grande variedade de opções. As modalidades
paraolímpicas para deficientes físicos são o arco e flecha,
atletismo, basquetebol sobre rodas, bocha, ciclismo,
equitação/hipismo, esgrima, halterofilismo, futebol de 7,
natação, rugbi, tênis de campo, tênis de mesa, tiro, vela e
voleibol (Comitê Paraolímpico Brasileiro – CPB).
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4 | Os Jogos Paraolímpicos
Quadro 1: Os locais dos Jogos Paraolímpicos e o número de
atletas e países que participaram
5 | O Brasil nos Jogos Paraolímpicos
Em relação ao Brasil, a primeira representação brasileira em
Jogos Paraolímpicos foi em 1972, em Heidelberg, na
Alemanha, onde o Brasil não trouxe medalhas. As primeiras
medalhas paraolímpicas viriam somente nos Jogos
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seguintes, em 1976, nas Paraolímpíadas do Canadá,
realizada na cidade de Toronto. Com uma participação
discreta o Brasil conquistou duas medalhas de prata na
modalidade bocha. Já na Holanda em 1980, na cidade de
Arnhem, a delegação brasileira contou com a primeira
participação do time de basquete sobre rodas masculino,
mas sem conquistar medalhas.
Em 1984 os Jogos ocorreram em duas sedes diferentes, na
Inglaterra, na cidade de Stoke Mandeville, com a participação
apenas de atletas em cadeira de rodas, e nos Estados
Unidos, na cidade de Nova Iorque, com a participação de
atletas amputados, cegos e paralisados cerebrais. Na
Inglaterra o Brasil conquistou 21 medalhas, e nos Estados
Unidos, conquistou uma medalha.
Em 1988, o Brasil conquistou 27 medalhas nos Jogos
Paraolímpicos de Seul, na Coréia do Sul, quatro de ouro, 10
de prata e 13 de bronze. Mas esse ritmo crescente de
conquistas brasileiras em Paraolimpíadas não se confirmou
na Espanha em 1992. Nos Jogos de Barcelona, foram
conquistadas apenas sete medalhas, três de ouro e quatro
de bronze.
Mas nos jogos de Atlanta, no ano de 1996, nos Estados
Unidos, a delegação brasileira se recuperou e conquistou
21 medalhas, duas de ouro, seis de prata e 13 de bronze.
Esta recuperação transformou-se em afirmação, no momento
em que o paradesporto brasileiro conquistou 22 medalhas
nos jogos de Sidney em 2000, na Austrália.
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Quadro 2: As medalhas conquistadas pelo Brasil
em Jogos Paraolímpicos e a colocação no geral
O ápice do movimento paraolímpico nacional foi atingido em
Atenas, 2004, quando a delegação brasileira conquistou 33
medalhas, sendo 14 de ouro, 12 de prata e sete de bronze,
o que rendeu ao Brasil a 14ª colocação no quadro geral de
medalhas, igualando o feito de 1984. Vale destacar que ao
longo de todos esses anos, o Atletismo tem sido a principal
modalidade brasileira nos Jogos Paraolímpicos, conquistando
um total de 76 medalhas, sendo 21 de ouro, 35 de prata e
20 de bronze, conforme Quadro 2.
Ao longo dos anos, o movimento paraolímpico vem
conquistando a atenção e o respeito de milhões de pessoas
nos quatro cantos do mundo. Associado às palavras como
superação, atitude, garra, força, esperança, confiança, fé e
principalmente perseverança, os Jogos Paraolímpicos são
hoje o segundo maior evento do mundo.
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No Brasil, o ótimo retrospecto atingido nos últimos Jogos já
é sentido nas ruas, e é o responsável pela formação de
verdadeiros heróis nacionais, como por exemplo, o nadador
Clodoaldo Silva, ganhador de seis medalhas de ouro e uma
de prata em Atenas, 2004, um verdadeiro fenômeno.
E em tempos de muita competição, como nos dias de hoje, a
famosa frase do Barão Pierre de Coubertin, “o importante não
é vencer, mas simplesmente competir”, tem uma conotação
mais realista na atmosfera paraolímpica: o atleta deficiente
antes de competir oficialmente e representar seu clube,
associação ou até mesmo seu país, tem que competir com ele
mesmo, e contra as muitas barreiras impostas no dia a dia.
6 | O papel do profissional de Educação Física
no trabalho com pessoas com deficiência física
Houve um tempo, em que o profissional de Educação Física
dedicava-se apenas a dar aulas em escolas e clubes. Hoje
em dia, seu campo de atuação está muito ampliado.
Tradicionalmente, a Educação Física era vista como campo de
aplicação prática, e atualmente vem passando por modificações importantes, no momento em que os profissionais
começaram a se preocupar em fundamentar um discurso
acadêmico, para dar à área, um caráter científico e conseqüentemente mais visibilidade e credibilidade a todo tipo de
trabalho do profissional com a atividade física.
O esporte para pessoas com deficiência física, iniciou como uma
tentativa de colaborar no processo terapêutico de pessoas com
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algum tipo de lesão grave ou limitação motora, e logo cresceu e
ganhou muitos adeptos. Atualmente, mais do que terapia, o
esporte para esta população caminha para o alto rendimento e
o nível técnico dos atletas tende a crescer cada vez mais.
Um ponto importante na maneira de lidar com estas pessoas
é não enxergá-las como incapazes, e sim como portadores
de alguma capacidade. Brandão (2003, p.7) coloca que “há
deficiências que inibem a prática do desporto, ou este pode
até piorar a condição física do praticante. Mas a atividade
física vale-se do desporto como fator motivacional, tornandose atividade física desportiva”.
Todo o indivíduo, independente do tipo de limitação, possui
também um potencial a ser este trabalhado, quando feito
isso, sua capacidade de superação aumenta e ele consegue
atingir níveis maiores de aptidão.
É muito importante o estímulo que o treinador ou professor
pode dar a seus atletas e alunos, principalmente com as
pessoas
portadoras
de
deficiência,
comumente
descriminadas pela sociedade, e desmotivadas pela sua
própria condição.
Um marco neste tipo de trabalho no Brasil foi a edição do
decreto n°. 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que dispõe
sobre a Política Nacional de Integração da Pessoa com
Deficiência, e que consolidou as normas de proteção e definiu
explicitamente quem se enquadra em cada tipo de
deficiência. Este decreto foi de fundamental importância para
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acabar de vez com a marginalização imposta pela sociedade.
Estas pessoas, através da prática esportiva, têm uma
oportunidade para elevar sua auto-estima direta ou indiretamente, além de provar para a sociedade, o seu valor como
atleta e cidadão.
No Brasil, segundo o Censo realizado em 2000 pelo IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - existem 24,5
milhões de brasileiros portadores de algum tipo de
deficiência, o que significa que 14,5% da população brasileira
apresentam alguma deficiência física, mental ou dificuldade
para enxergar, ouvir ou locomover-se. Lembrando que
destes 14,5% de deficientes do Brasil, apenas 1,5% praticam
alguma modalidade esportiva (IBGE - Censo 2000).
É preciso que todos se conscientizem de que a prática
esportiva é um direito da população, independente de raça,
sexo, credo ou possível limitação física ou intelectual. O esporte
adaptado no Brasil ainda carece de divulgação e apoio, e
estes fatos impossibilitam que muitos indivíduos tenham
acesso à prática esportiva e usufruam seus benefícios.
7 | Referências
ASSOCIAÇÃO DE PARALISIA CEREBRAL DO PAÍS - APCB.
Definição de termos. Capturado em http://
www.sobama.org.br, em 21 mar. 2005.
BRANDÃO, I. Educação Física e Portadores de
Deficiências. Revista do Conselho Federal de Educação
Física, Rio de Janeiro, ano II, n°. 8 p.8-12, Agosto, 2003.
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COMITÊ PARAOLÍMPICO BRASILEIRO - CPB. Termos e
Definições. Capturado em http://www.sobama.org, em
05 de mar. 2005.
COMITÊ PARAOLÍMPICO INTERNACIONAL – IPC. Termos e
Definições. Capturado em http://www.paralympic.org,
em 15 set. 2005.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA –
IBGE. Censo do ano de 2000.
SOUZA, P. A. O Esporte na Paraplegia e Tetraplegia. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan S.A., 1994.
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Os Jogos Paraolímpicos - Centre d`Estudis Olímpics