O Ano Internacional da Química e a hipótese de Avogadro Miriam de Magalhães O. Levada¹ Ana Laura Remédio Zeni Beretta² Celso Luís Levada³ Resumo: AVOGADRO será um dos homenageados durante as cerimônias do Ano Internacional da Química (2011), promovido pela Unesco e pela União Internacional da Química Pura e Aplicada. Amedeo Avogadro nasceu em 09 de junho de 1776, em Turim. Graduou-se em Direito e exerceu a profissão de advogado. Posteriormente estudou Matemática e Física e tornou-se professor na Academia de Turim. Ele é famoso por ter estabelecido, em 1811, o que hoje é chamada Hipótese de Avogadro em que volumes iguais de todos os gases, nas mesmas condições de temperatura contêm o mesmo número de moléculas. Infelizmente, isso teve pouca repercussão na época e, somente depois de 50 anos, no Congresso Karlsruhre (1860), foi reconhecida a grande utilidade de tal Hipótese. Palavras chaves: Avogadro, gases, Ano Internacional da Química. Abstract: AVOGADRO is one of those honored during ceremonies for the International Year of Chemistry (2011), sponsored by UNESCO and the International Union of Pure and Applied Chemistry. Amedeo Avogadro was born on June 9, 1776 in Turin. He graduated in law and worked as an lawyer. Later he studied mathematics and physics and became a professor at Academy of Turin. He is famous for having established in 1811, which is now called Avogadro's Hypothesis that equal volumes of all gases, under the same conditions temperature contain the same number of molecules. Unfortunately, only after 50 years in Congress Karlsruhre (1860), recognized the great utility of his hypothesis. Keywords: Avogadro, gases, International Year of Chemistry Introdução Não temos a pretensão que este texto seja enquadrado na área de história da Ciência, apenas temos como objetivo enaltecer o trabalho seminal de Avogadro que, de acordo com NOGUEIRA et al (2009) é pioneiro, sendo uma referência importante para o nascimento da teoria cinética dos gases. Lorenzo Romano Amedeo Carlo Avogadro, ainda muito jovem, tornou-se um bacharel em direito, obtendo inclusive o doutorado por volta de 1796. Seus interesses mudaram a partir de 1800, quando estudou Ciências exatas e optou pelo fantástico mundo da Química, ao estudo dos gases e descobriu importantes propriedades sobre esse estado da matéria (ALVES, 2010). Em 1809, GAY-LUSSAC mostrou que todos os gases se expandiam com o aumento da temperatura. A partir deste artigo, Avogadro, então, sugeriu que 149 todos os gases, a certa temperatura e pressão, deveriam conter o mesmo número de partículas por unidade de volume. No ano de 1811 o Journal of Physique, número 73, publicou o artigo de Avogadro intitulado “Essay on a Manner of Determining the Relative Masses of the Elementary Molecules” , que discute entre outras coisas a constituição molecular de gases. É uma data importante para a história da Química, pois, é uma referência sobre um conceito relevante, incompreendido por quase cinqüenta anos que, ainda hoje, depois de dois séculos continua a ser estudado. A Constante de Avogadro Quem nunca ouviu falar sobre o Número de Avogadro? Quem fez o ensino médio sabe que o número 6,02 × 1023 é uma constante física fundamental, conhecida como Constante de Avogadro, sendo um número padrão para representar um Mol de quaisquer entidades elementares de átomos, moléculas, íons, elétrons. O que muitos não sabem é que esta constante faz parte de um enunciado que demorou 50 anos para ser aceito. Segundo FELTRE (1996), a controvérsia teve início quando Avogadro enunciou sua famosa Hipótese, em 1811, sugerindo que volumes iguais de quaisquer dois gases na mesma temperatura e pressão contêm o mesmo número de partículas. De acordo com o enunciado acima é possível determinar o número de partículas em uma molécula de qualquer substância gasosa. Uma decorrência das idéias em questão foi o estabelecimento de uma constante importantíssima na Química que, inicialmente, recebeu o nome de Número de Avogadro e, posteriormente, substitui-se por Constante. Só em 1860, CANNIZZARO conseguiu mostrar, ao mundo científico, a importância do conceito de molécula, que ligada à Hipótese de Avogadro completaria brilhantemente a Teoria Atômica. Para OKI (2009), tanto o trabalho de Avogadro como o de Gay-Lussac foram rejeitados, especialmente por DALTON e BERZELIUS. Uma das principais razões que justificava seus 150 descréditos pela hipótese, se deve ao fato dela não estar relacionada com a teoria Dualística de Berzelius, amplamente aceita na época. Se o reconhecimento dos referidos trabalhos tivesse acontecido logo após sua formulação, provavelmente a distinção entre os conceitos de átomo e molécula teria acontecido antes, antecipando a compreensão das implicações do atomismo. De acordo com FILGUEIRAS et al (2009), o modelo de átomo de Dalton decorre da necessidade de explicar as proporções observadas nas reações químicas. O conceito central introduzido por Dalton, o peso atômico apresentava uma grande dificuldade. Como determiná-lo? Esta era a questão. Então, a hipótese de Avogadro completaria a teoria atômica, mas Dalton não concordava com a idéia de que volumes iguais de gases diferentes continham o mesmo número de partículas. Então, o período compreendido entre a proposta de Avogadro e o Congresso de Karlsruhe foi caracterizado por divergências metodológicas e conceituais entre esses estudiosos da Química. Na Alemanha, em 1860, o químico CANNIZZARO apresentou um artigo no Karlsruhe Congress, onde introduzia um novo sistema atômico, inteiramente baseado no trabalho de Avogadro, que foi um sucesso e tornou Avogadro famoso (MINATTI 2009). Posteriormente, RUDOLF CLAUSIUS, com a teoria cinética dos gases, deu mais uma confirmação da Lei de Avogadro. Finalmente, VAN 'T HOFF mostrou que a teoria de Avogadro é válida em soluções diluídas. A partir disso, Avogadro é saudado, por alguns estudiosos, como um dos fundadores da teoria atômica. CHAGAS (2003) diz que os textos de Química, Física e de História destas ciências não mencionam claramente as origens da introdução do nome constante de Avogadro, que teria sido proposta em 1909 por JEAN PERRIN, em seu artigo Mouvement brownien et réalité moléculaire. PERRIN associa também a constante de Avogadro a outras constantes físicas, como a carga do elétron, a constante de Boltzmann, k, e a constante de Faraday, F, estabelecendo que F = N e. 151 Determinação da Constante de Avogadro O primeiro cientista a medir o número de moléculas em qualquer substância foi LOSCHMIDT (1865), que usou a então nova Teoria Cinética dos Gases para calcular o número de Avogadro. O número obtido, com muita imprecisão, foi algo em torno de 2.6 1019. As primeiras medições precisas do Número de Avogadro só começaram a ser feitas quando Einstein publicou o artigo sobre o movimento Browniano. No artigo de Einstein (1905) sobre o movimento browniano há propostas para a estimativa do número de Avogadro, isto é, a elaboração de um método para obtenção de tal constante. Jean Baptiste Perrin, usando a teoria do movimento Browniano desenvolvida por Einstein, realizou várias experiências, a partir de 1908, com o intuito de determinar o valor do número de Avogadro, obtendo um valor de 6, 82 x 1023 moléculas em cada mol. Com isso, Perrin ganhou o Prêmio Nobel de Física no ano de 1926. Em termos de uma experiência de ensino básico, JONES E CHILDERS (1984) comentam que a constante de Avogadro pode ser determinada com razoável precisão por eletrólise. Então, prosseguem os autores, de acordo com a hipótese de Avogadro, um peso molecular de um grama, ou mol, de uma substância conteria um número definido N de moléculas. Sabe-se que, durante uma eletrólise, o número de Faraday, F, deve ser o produto do número N com a unidade elementar de carga elétrica, isto é, F = N e. Como F é conhecido com grande precisão, a Equação dada por F = N e, torna-se importante porque ela pode ser usada para determinar o número de Avogadro (N) com o conhecimento da carga elementar. Considerando que F = 96522C e que a carga elementar vale 1,6. 10 -19C, fazendo o quociente obtemos 152 Existem várias outras maneiras para determinação da constante de Avogadro, sendo que atualmente a técnica mais utilizada para tal finalidade é chamada de método de densidade cristalina por raios-X. Em termos de ensino médio, um experimento proposto por RICCHI (2001) usa materiais simples e de baixo custo como; azeite; carvão em pó; etanol; água; uma bandeja ou uma assadeira retangular grande; um conta-gotas; uma régua. Prepara-se uma a solução, de concentração adequada, do azeite em etanol. Coloca-se água a bandeja e, no centro aplica-se uma pequena quantidade do carvão em pó. Pinga-se uma gota da solução alcoólica do azeite sobre o carvão, de uma altura de, aproximadamente 20 cm. Observa-se a formação de um filme de azeite, sobre a superfície da água, delimitado pelo carvão. Considerando-se este filme como sendo monomolecular e constituído de ácido oléico calcula-se o número de moléculas do ácido graxo na gota da solução e, daí na massa molar. Os resultados obtidos são muito bons, ficando na ordem de 1023, o que é satisfatório, levando-se em conta a simplicidade da experiência e as aproximações feitas. Considerações finais A intervenção de CANNIZARO, no congresso de 1860, tornou Avogadro uma referência na Química, sendo que, em 1911, uma reunião em Turim comemorou o centenário da publicação do seu trabalho clássico e sua grande contribuição à Química foi reconhecida. O trabalho científico de Avogadro não é limitado à teoria molecular, pois, durante a carreira, ele propôs idéias originais sobre a estrutura dos dielétricos, o comportamento dos ácidos e bases, as relações entre afinidade química, eletricidade e magnetismo, o calor específico de gases, capilaridade. Como assessor científico academia de patentes de Ciências de Turim, ele analisou mais de cem pedidos de patentes sobre as mais diversas questões. AVOGADRO considerava que o progresso da pesquisa estava estreitamente relacionado com o ensino e tinha um interesse especial no problema da difusão do conhecimento científico em relação à preparação básica dos alunos nas 153 escolas primárias e secundárias. E neste sentido, ele era ativo na Universidade de Turim como professor de Física, divulgando conhecimentos principalmente destinados a formar professores do ensino médio (CIARDI, 2006). Com esses relatos podemos contribuir para exemplificar a importância de História da Ciência e sua inclusão na Educação Básica, motivando os alunos sobre questões científicas que podem ser abordadas em sala de aula. Como curiosidade, para ilustrar da magnitude da constante de Avogadro, imagine um computador contando de um até um bilhão em um segundo. Esta máquina levaria 20 milhões de anos para contar até 6 x 10 23. Finalizando, informamos que durante as solenidades comemorativas do Ano Internacional da Química (2011) está previsto uma homenagem a Amedeo Avogadro pelo bicentenário da formulação de sua hipótese sobre o estado molecular dos elementos gasosos. Referências ALVES, L. Equipe Brasil Escola- Sobre Amadeo Avogadro, disponível em http://www.brasilescola.com/quimica/amedeo-avogadro.htm, acessado em 20/11/2010. AVOGADRO, L.R. A., Essay on a Manner of Determining the Relative Masses of the Elementary Molecules , Journal de Physique, n. 73, p. 58-76, 1811, disponível em web.lemoyne.edu/~giunta/avogadro.html, acessado em 20/11/2010 CAMARGO, A. J. et al. A Hipótese de Avogadro. Trabalho do curso de Química. Universidade Estadual de Goiás, campus de Anápolis, 2005, disponível em http://www.cursodefisica.com.br/11-constante-de-avogadro.pdf CHAGAS, A. P. As origens históricas da constante de Avogadro. 29a Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química. CIARDI, M. Amedeo Avogadro e la POLITICA DELLA SCIENZA. In: Italia, LA CHIMICA NELLA STORIA, p. 103-107, Anno XXVIII, n. 2, Marzo – Aprile, 2006, disponível em http://www.didichim.org/download/2006-2_0.pdf acessado em 12/01/2011. FELTRE, R. Química. vol. 1, 4.ª ed., São Paulo: Moderna. 1996. FILGUEIRAS, C. A. et al. Química Nova na Escola, v.32, n.2, 2009. 154 MINATTI, DR. Amedeo Avogadro: uma entrevista do além!. Revista eletrônica do Departamento de Química da UFSC, disponível no endereço http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/entrevistas/avogadro.html, acessado em 10/11/2010 OKI, M.C.M. Controvérsias sobre o atomismo no século XIX. Química Nova na Escola, vol.32 n.4 São Paulo 2009. RAMOS; B. e MENDES, W. 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