A Questão da Autoria Feminina na Poesia de
Emily Dickinson
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©2015 Natalia Helena Wiechmann
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W6348 Wiechmann, Natalia Helena
A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson/Natalia
Helena Wiechmann. Jundiaí, Paco Editorial: 2015.
216 p. Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-462-0085-6
1. Emily Dickinson 2. Poesia 3. Crítica literária 4. Feminismo.
I. Wiechmann, Natalia Helena.
CDD: 810
Índices para catálogo sistemático:
Análise e crítica
Poesia
Literatura americana
801.95
821
810
IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
Foi Feito Depósito Legal
Dedico este livro ao meu marido, aos meus
pais e à minha irmã.
Agradeço à Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio financeiro concedido
durante os meses de pesquisa.
“Given her vocation, she was neither eccentric nor quaint; she was determined to survive, to use her powers, to practice necessary economies”1 (Rich, 1979, p. 101)
1. “Dada a sua vocação, ela não era nem excêntrica nem singular; ela era determinada a sobreviver, a usar seus poderes, a praticar economias necessárias”
(Tradução nossa).
Sumário
Apresentação........................................................................13
Introdução.............................................................................17
Capítulo 1
A Fortuna Crítica de Emily Dickinson.........................31
1. A editoração..............................................................................31
2. As primeiras recepções críticas: Susan Dickinson e
T. W. Higginson...........................................................................38
3. Dos primeiros anos do século XX à Nova Crítica..........45
4. A crítica literária feminista e Emily Dickinson............50
Capítulo 2
A Crítica Literária Feminista e a
Autoria Feminina................................................................65
1. O ideal feminino e a autoria feminina no patriarcado...72
2. O subtexto na autoria feminina..........................................79
3. A crítica literária feminista e a revisão do cânone........85
Capítulo 3
Emily Dickinson e a Poesia de Autoria Feminina....91
1. O lugar de Emily Dickinson na história literária........106
2. A poesia de Emily Dickinson.............................................120
2.1 A estrutura e a linguagem dos poemas...................121
2.2 Emily Dickinson: uma linguagem feminina?.......140
Capítulo 4
A Questão da Autoria Feminina na Poesia de
Emily Dickinson................................................................159
1. “The Soul selects her own Society —”..............................159
2. “I’m “wife” — I’ve finished that —”...............................174
3. “My Life had stood — a Loaded Gun —”.......................183
Considerações Finais........................................................197
Referências.........................................................................201
Apresentação
Alcides Cardoso dos Santos
Desde as primeiras publicações de sua obra poética, ainda no
século XIX, a figura da poeta Emily Dickinson foi associada a uma
aura de mistério e romantismo, o que inegavelmente contribuiu
para o interesse que sua poesia logrou receber junto ao público leitor. Fatos conhecidos de sua vida, como o vestido sempre branco
que a poeta usava, a sua reclusão na casa do pai, a sua escassa vida
social, a inexistência de marido, filhos ou amores, inflamaram a
imaginação pública fazendo surgir quase um mito, o da poeta que
abdica do mundo por seu recato e pela sua arte, mito de que os
editores amiúde lançaram mão para promover as suas vendas.
Porém, como em uma balança, se o mito em torno da poeta
fez crescer o interesse em sua vida, isso aconteceu, em certa medida, em detrimento de sua poesia, que sofreu as consequências
desta “romantização” da vida da poeta. As antologias de poesia
norte-americana até muito recentemente selecionavam os poemas
em que o tema do amor não correspondido ou da imortalidade
da alma eram mais evidentes, confirmando a imagem popular da
poeta pura como o branco de seus vestidos.
É somente a partir das décadas de 1970 e 1980 do século XX,
com o interesse da crítica feminista nas obras literárias escritas por
mulheres, que sua poesia começou a ser desvinculada da aura romântica. Mais que isso, é somente a partir desse momento que a
idealização romântica da poesia de Dickinson passou a ser vista
não como ingenuidade crítica, mas como materialização de valores
sexistas em certas obras literárias e em boa parte da crítica, culminando na percepção de que a idealização da mulher pela cultura
patriarcal também é o seu silenciamento.
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Natalia Helena Wiechmann
Inicia-se, então, um período de grande fertilidade dos estudos
críticos de Dickinson, que resultou na publicação de obras hoje consideradas de referência no estudo da poeta, tais como The Madwoman
in the Attic, de Sandra Gilbert e Susan Gubar (1979), The Wicked Sisters: Women Poets, Literary History , and Discord, de Betsy Erkkila (1992)
e Unsettling the Wilderness in American Literary History, de Susan Howe
(1993), apenas para citar alguns dos títulos mais conhecidos.
A poesia de Dickinson passa, então, a ser lida com mais seriedade e os seus aspectos inquietantes – o uso constante da elipse, os
travessões interrompendo a sintaxe, os poemas por vezes extremamente curtos, chamados “miniaturas”, as variações sintáticas não
raro corrigidas em edições “normativas” – passam a ser incorporados ao seus temas e imagens, denotando um esforço crítico de
compreensão da poeta para além de estereótipos ou idealizações.
Um dos pontos mais importantes desta “redescoberta” da poesia de Dickinson pela crítica feminista foi, sem dúvida, a questão
da complexidade do processo de criação poética, pois em uma sociedade patriarcal como a pequena Amherst, no estado de Massachussets – onde Dickinson nasceu, viveu e morreu – a vida pública, os grandes pensamentos e as grandes decisões eram privilégio
masculino, ao menos ao longo do século XIX. Como se tornar
uma autora, sendo que a autoria fôra sempre ligada à paternidade
e, como explicam Gubar e Gilbert, apesar de as mulheres terem o
privilégio da maternidade biológica, a paternidade cultural sempre
foi mais relevante e importante? Como pretender se inserir na linhagem de criadores ocidentais, que tem início na criação divina
e se perpetua com os grandes escritores e artistas, como Dante,
Shakespeare e Milton?
Para tornar as coisas ainda mais difíceis para a poeta de
Amherst, durante o século XIX várias mulheres conseguiram ser
aceitas como escritoras e inclusive ganhar o seu sustento do ofício
da escrita. Porém, o gênero em que essas primeiras escritoras podiam se manifestar era o ficcional – o romance – e a temática que
delas se esperava era a dos conflitos e tramas do lar e da família. Em
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A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson
outras palavras, se as escritoras do século XIX têm um papel fundamental no desenvolvimento do romance, por outro lado sua temática teve de ser bastante limitada ao chamado “romance familiar”.
Quanto à poesia, durante boa parte do século XIX ela foi considerada um gênero literário superior, reservado somente às grandes mentes, que logravam abstrair das coisas mundanas e delas
abstrair verdades eternas e pensamentos profundos. À exceção de
Cristina Rosseti na Inglaterra, raras são as poetas que conseguiram ser aceitas exclusivamente como poetas, o que pelo menos em
parte explica a recusa de Dickinson em publicar seus poemas e se
tornar uma pessoa pública, como o conhecido poema 260, “I’m
Nobody! Who are you?”, claramente afirma.
Emily Dickinson se tornou um caso exemplar para o estudo da
complexidade da autoria poética feminina; em seus poemas podemos perceber várias nuances desta difícil relação das poetas com
sua auto afirmação literária em uma sociedade que lhes impõe a
subordinação e o silêncio. Assim, nos poemas de Dickinson a crítica começa a perceber tanto momentos de auto-realização, como
quando a poeta chega a se comparar com Deus, como momentos
de apequenamento, nos quais a poeta se sente inferiorizada pela
sua condição de mulher.
A percepção da poesia de Dickinson como uma arena na qual
todas essas questões foram vividas revelou uma complexidade
que resultou em uma nova onda de popularidade da poeta, desta
vez por razões que teriam com certeza satisfeito a “mariposa de
Amherst”, como a poeta foi amiúde referida.
Este é, em linhas gerais, o interessante tema do livro de Natália
Helena Wiechmann, no qual a jovem pesquisadora se embrenha
pela crítica feminista para tentar entender melhor o processo de
autoria poética em Emily Dickinson. Se a complexidade do tema
poderia, em alguns casos, resultar em uma linguagem carregada de
jargões e obscuridade, o texto de Wiechmann é fluente, claro e ao
percorrer seus argumentos e exposições, temos a sensação da mão
segura de quem sabe o que está fazendo.
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