A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson Conselho Editorial Av. Carlos Salles Block, 658 Ed. Altos do Anhangabaú, 2º Andar, Sala 21 Anhangabaú - Jundiaí-SP - 13208-100 11 4521-6315 | 2449-0740 [email protected] Profa. Dra. Andrea Domingues Prof. Dr. Antonio Cesar Galhardi Profa. Dra. Benedita Cássia Sant’anna Prof. Dr. Carlos Bauer Profa. Dra. Cristianne Famer Rocha Prof. Dr. Fábio Régio Bento Prof. Dr. José Ricardo Caetano Costa Prof. Dr. Luiz Fernando Gomes Profa. Dra. Milena Fernandes Oliveira Prof. Dr. Ricardo André Ferreira Martins Prof. Dr. Romualdo Dias Profa. Dra. Thelma Lessa Prof. Dr. Victor Hugo Veppo Burgardt ©2015 Natalia Helena Wiechmann Direitos desta edição adquiridos pela Paco Editorial. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada e estocada em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, de fotocópia, gravação, etc., sem a permissão da editora e/ou autor. W6348 Wiechmann, Natalia Helena A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson/Natalia Helena Wiechmann. Jundiaí, Paco Editorial: 2015. 216 p. Inclui bibliografia. ISBN: 978-85-462-0085-6 1. Emily Dickinson 2. Poesia 3. Crítica literária 4. Feminismo. I. Wiechmann, Natalia Helena. CDD: 810 Índices para catálogo sistemático: Análise e crítica Poesia Literatura americana 801.95 821 810 IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL Foi Feito Depósito Legal Dedico este livro ao meu marido, aos meus pais e à minha irmã. Agradeço à Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio financeiro concedido durante os meses de pesquisa. “Given her vocation, she was neither eccentric nor quaint; she was determined to survive, to use her powers, to practice necessary economies”1 (Rich, 1979, p. 101) 1. “Dada a sua vocação, ela não era nem excêntrica nem singular; ela era determinada a sobreviver, a usar seus poderes, a praticar economias necessárias” (Tradução nossa). Sumário Apresentação........................................................................13 Introdução.............................................................................17 Capítulo 1 A Fortuna Crítica de Emily Dickinson.........................31 1. A editoração..............................................................................31 2. As primeiras recepções críticas: Susan Dickinson e T. W. Higginson...........................................................................38 3. Dos primeiros anos do século XX à Nova Crítica..........45 4. A crítica literária feminista e Emily Dickinson............50 Capítulo 2 A Crítica Literária Feminista e a Autoria Feminina................................................................65 1. O ideal feminino e a autoria feminina no patriarcado...72 2. O subtexto na autoria feminina..........................................79 3. A crítica literária feminista e a revisão do cânone........85 Capítulo 3 Emily Dickinson e a Poesia de Autoria Feminina....91 1. O lugar de Emily Dickinson na história literária........106 2. A poesia de Emily Dickinson.............................................120 2.1 A estrutura e a linguagem dos poemas...................121 2.2 Emily Dickinson: uma linguagem feminina?.......140 Capítulo 4 A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson................................................................159 1. “The Soul selects her own Society —”..............................159 2. “I’m “wife” — I’ve finished that —”...............................174 3. “My Life had stood — a Loaded Gun —”.......................183 Considerações Finais........................................................197 Referências.........................................................................201 Apresentação Alcides Cardoso dos Santos Desde as primeiras publicações de sua obra poética, ainda no século XIX, a figura da poeta Emily Dickinson foi associada a uma aura de mistério e romantismo, o que inegavelmente contribuiu para o interesse que sua poesia logrou receber junto ao público leitor. Fatos conhecidos de sua vida, como o vestido sempre branco que a poeta usava, a sua reclusão na casa do pai, a sua escassa vida social, a inexistência de marido, filhos ou amores, inflamaram a imaginação pública fazendo surgir quase um mito, o da poeta que abdica do mundo por seu recato e pela sua arte, mito de que os editores amiúde lançaram mão para promover as suas vendas. Porém, como em uma balança, se o mito em torno da poeta fez crescer o interesse em sua vida, isso aconteceu, em certa medida, em detrimento de sua poesia, que sofreu as consequências desta “romantização” da vida da poeta. As antologias de poesia norte-americana até muito recentemente selecionavam os poemas em que o tema do amor não correspondido ou da imortalidade da alma eram mais evidentes, confirmando a imagem popular da poeta pura como o branco de seus vestidos. É somente a partir das décadas de 1970 e 1980 do século XX, com o interesse da crítica feminista nas obras literárias escritas por mulheres, que sua poesia começou a ser desvinculada da aura romântica. Mais que isso, é somente a partir desse momento que a idealização romântica da poesia de Dickinson passou a ser vista não como ingenuidade crítica, mas como materialização de valores sexistas em certas obras literárias e em boa parte da crítica, culminando na percepção de que a idealização da mulher pela cultura patriarcal também é o seu silenciamento. 13 Natalia Helena Wiechmann Inicia-se, então, um período de grande fertilidade dos estudos críticos de Dickinson, que resultou na publicação de obras hoje consideradas de referência no estudo da poeta, tais como The Madwoman in the Attic, de Sandra Gilbert e Susan Gubar (1979), The Wicked Sisters: Women Poets, Literary History , and Discord, de Betsy Erkkila (1992) e Unsettling the Wilderness in American Literary History, de Susan Howe (1993), apenas para citar alguns dos títulos mais conhecidos. A poesia de Dickinson passa, então, a ser lida com mais seriedade e os seus aspectos inquietantes – o uso constante da elipse, os travessões interrompendo a sintaxe, os poemas por vezes extremamente curtos, chamados “miniaturas”, as variações sintáticas não raro corrigidas em edições “normativas” – passam a ser incorporados ao seus temas e imagens, denotando um esforço crítico de compreensão da poeta para além de estereótipos ou idealizações. Um dos pontos mais importantes desta “redescoberta” da poesia de Dickinson pela crítica feminista foi, sem dúvida, a questão da complexidade do processo de criação poética, pois em uma sociedade patriarcal como a pequena Amherst, no estado de Massachussets – onde Dickinson nasceu, viveu e morreu – a vida pública, os grandes pensamentos e as grandes decisões eram privilégio masculino, ao menos ao longo do século XIX. Como se tornar uma autora, sendo que a autoria fôra sempre ligada à paternidade e, como explicam Gubar e Gilbert, apesar de as mulheres terem o privilégio da maternidade biológica, a paternidade cultural sempre foi mais relevante e importante? Como pretender se inserir na linhagem de criadores ocidentais, que tem início na criação divina e se perpetua com os grandes escritores e artistas, como Dante, Shakespeare e Milton? Para tornar as coisas ainda mais difíceis para a poeta de Amherst, durante o século XIX várias mulheres conseguiram ser aceitas como escritoras e inclusive ganhar o seu sustento do ofício da escrita. Porém, o gênero em que essas primeiras escritoras podiam se manifestar era o ficcional – o romance – e a temática que delas se esperava era a dos conflitos e tramas do lar e da família. Em 14 A Questão da Autoria Feminina na Poesia de Emily Dickinson outras palavras, se as escritoras do século XIX têm um papel fundamental no desenvolvimento do romance, por outro lado sua temática teve de ser bastante limitada ao chamado “romance familiar”. Quanto à poesia, durante boa parte do século XIX ela foi considerada um gênero literário superior, reservado somente às grandes mentes, que logravam abstrair das coisas mundanas e delas abstrair verdades eternas e pensamentos profundos. À exceção de Cristina Rosseti na Inglaterra, raras são as poetas que conseguiram ser aceitas exclusivamente como poetas, o que pelo menos em parte explica a recusa de Dickinson em publicar seus poemas e se tornar uma pessoa pública, como o conhecido poema 260, “I’m Nobody! Who are you?”, claramente afirma. Emily Dickinson se tornou um caso exemplar para o estudo da complexidade da autoria poética feminina; em seus poemas podemos perceber várias nuances desta difícil relação das poetas com sua auto afirmação literária em uma sociedade que lhes impõe a subordinação e o silêncio. Assim, nos poemas de Dickinson a crítica começa a perceber tanto momentos de auto-realização, como quando a poeta chega a se comparar com Deus, como momentos de apequenamento, nos quais a poeta se sente inferiorizada pela sua condição de mulher. A percepção da poesia de Dickinson como uma arena na qual todas essas questões foram vividas revelou uma complexidade que resultou em uma nova onda de popularidade da poeta, desta vez por razões que teriam com certeza satisfeito a “mariposa de Amherst”, como a poeta foi amiúde referida. Este é, em linhas gerais, o interessante tema do livro de Natália Helena Wiechmann, no qual a jovem pesquisadora se embrenha pela crítica feminista para tentar entender melhor o processo de autoria poética em Emily Dickinson. Se a complexidade do tema poderia, em alguns casos, resultar em uma linguagem carregada de jargões e obscuridade, o texto de Wiechmann é fluente, claro e ao percorrer seus argumentos e exposições, temos a sensação da mão segura de quem sabe o que está fazendo. 15