A Pós-modernidade e o operador jurídico José Affonso Dallegrave Neto IV Congresso Nacional dos Oficiais de Justiça Avaliadores Federais Curitiba 31/8/2011 PÓS MODERNIDADE: Origem: • nasceu da crise dos valores da modernidade; • a partir das promessas não cumpridas da Modernidade dos sécs. XVII a XIX • não é um movimento linear, uniforme e com data marcada (marco histórico), mas resultado de expressões de diversas áreas do conhecimento. • Na filosofia: Nietzsche, Foucault; Habermas; Jean Baudrillard • No cinema: Woody Allen e Michael Moore • Na pintura: o Surrealismo de Joan Miró e Salvador Dalí • Na música: Hip Hop • Gilles Lipovetski, filósofo francês, prefere “hipermodernidade", Pilares da Modernidade: • indivíduo, • mercado e • Tecnologia Pós-modernidade não rompe, mas exacerba estes valores: • Hiperindivíduo – narcisista, erotizado, egoísta e sem bandeira altruísta • Deus mercado consumidor e a ideologia neoliberal: fora do mercado = exclusão social • Tecnologia – super fragmentação do tempo e do espaço (conexão 24h); condição de existência é ter um PC, internet, email, ipod A expressão “idade pós-moderna”: • Iniciada por Arnold Toynbee (8º vol. de “Study of History” -1954) • Consagrada por Jean-François Lyotard: “A condição pós-moderna”, 1979; Nesta obra, Lyotard anunciou o fim de todas as narrativas grandiosas. Procurou atingir a “morte do socialismo clássico”, mas também incluiu: • a teoria da redenção cristã, • a teoria do progresso iluminista, • o espírito hegeliano, • o racismo nazista, dentre outras Contexto e conjuntura: • Em seu discurso, Habermas, filósofo alemão, sustenta: “a PM é uma tendência “neoconservadora”; “uma cultura de globalização e sua ideologia neoliberal”. • Globalização = base material e propícia da pós-modernidade • Globalização do que? (da produção, da mão-de-obra, da mídia e do consumo) “O mundo inteiro come big-Mac, ouve Lady Gaga, assiste Harry Potter e toma coca-cola” Pós-modernidade é um conceito teórico e científico? Há vozes discordantes: • Jean Baudrillard: pensador turboniilista que inspirou “Matrix” disse: “O conceito de pós-modernidade não existe. Eu próprio sou chamado de pós-moderno, o que é um absurdo”. “a noção de pós-modernidade não passa de uma forma irresponsável de abordagem pseudo-científica dos fenômenos. Seria piada chamá-la de conceito teórico” (In: Revista Época, 9 jun. 2003, p. 26). • Zigmunt Bauman, a Pós-Modernidade é “forma póstuma da modernidade”; prefere usar "modernidade líquida" - uma realidade ambígua e multiforme. IDEAIS e CRISE DA MODERNIDADE: • Liberdade; Igualdade, Fraternidade (Paz e Progresso) A Revolução Francesa de 1789 abriu caminho para a Modernidade • A liberdade é azul; • A igualdade é branca; • A fraternidade é vermelha; a) A Liberdade foi só um ideal com vários exemplos de ditaduras e violências; b) A Igualdade não se realizou nem avançou; c) A Paz pregada a partir do entendimento racional entre as pessoas não aconteceu; ao contrário tivemos muitos conflitos e guerras; d) O Progresso a partir da dominação da natureza foi uma promessa cumprida em excesso (política depredatória); • O capitalismo seria a utopia que pretendia conciliar estes 4 valores; contudo só priorizou a “liberdade do lucro” e não avançou na igualdade social. • A sua antítese, o Comunismo, fez o inverso (avançou na igualdade social, mas nivelou por baixo e sem avançar na questão da liberdade). • Logo, os sistemas entraram em crise; PROJETO DA MODERNIDADE: A partir do Iluminismo: • Antropocentrismo; • Método; • Ciência e • Discurso universal; (R. Descartes; I. Kant; H. Kelsen) Marcos teóricos: • Universalidade; • Autonomia e • Individualidade (*) ou “indivíduo universal autônomo” (homem médio independente) A realidade humana universal deve ser vista a partir do indivíduo (e não do coletivo); um indivíduo autônomo (capaz) e que prescinde de tutelas da lei, da família e do Estado; A CRÍTICA DA PÓS-MODERNIDADE • a MO pecou ao ver todos indivíduos de forma igual (sem particularidades) a partir de uma sistematização racional com valores pretensamente universais. Surgimento da 4ª. Geração dos DH • 1ª. 2ª. e 3ª. Dimensões • Hoje surge os DH de 4ª. dimensão: “o direito à democracia, à informação e ao pluralismo”. A PM é o grito da diferença e da emancipação das minorias (vg: movimentos étnicos, feministas, homossexuais; e de crenças religiosas minoritárias); • MO = nivela o indivíduo universal compreendendo-o a partir das grandes utopias racionais • PM = aceita a diferença entre os indivíduos, sem qualquer pretensão de compreensão VALORES DA PÓS-MODERNIDADE: 1)- Aversão à “Racionalidade pretensamente universal” • A PM é “arracional” (diferente de “irracional”); Lyotard = pós-modernidade é o fim das metanarrativas que pretendem explicar o presente, o passado e o futuro; (...) nem mesmo a ciência pode ser considerada uma garantia ou fonte da verdade. • Caem os grandes discursos de legitimação filosófica (utopias) *Admitem-se apenas pequenas utopias a partir de realidades concretas. Ex: “desenvolvimento sustentável” como “pequena utopia” dentro do capitalismo; (desenvolvimento econômico e social e proteção ambiental) • A tese central da PM é a realidade presente, concreta e existente. (aqui e agora) * Just do it – Nike • Sociedade fissurada pela velocidade; • Vive-se a era do instantâneo e do descartável No campo do Direito: • Profusão de MP (Medidas Provisórias); • Leis esparsas > Grandes Códigos; • Microssistemas jurídicos; • Tutelas de urgência; • Ritos sumaríssimos; • Lei do Divórcio direto e simplificado; 2)- O discurso tornou-se fragmentário • O discurso não é mais universal, mas fragmentário com atenção para as particularidades; • A Linguagem admissível é clara, objetiva; sem erudição e sem preocupação com o método: • ensaios > trabalhos científicos • linguagem pragmática > lógica; • Paradoxo: o discurso fragmentário é mais denso do que o geral • Linha de produção fragmentada: (fordismo x toyotismo = parceiras terceirizadas); produção Just in case < Just in time Efeito prático: • as especializações (ortopedista especialista em joelho); • os operadores jurídicos também tornaram-se fragmentários (advogados trabalhistas em prol dos bancários) ; • servidores especialistas em execução ou em cálculos; • consultas fragmentadas e pesquisas por palavras-chave 3) Relativismo dos Dogmas e dos Conceitos Universais; • Tudo é efêmero, relativo e eclético; • Há uma mistura de tendências; • Luís Roberto Barroso: "entre luz e sombra, descortina-se a pós-modernidade; o rótulo genérico que abriga a mistura de estilos, a descrença no poder absoluto da razão, o desprestígio do Estado". Caem as ortodoxias da Modernidade: • Kelsen – Teoria Pura do Direito • Kant – Crítica à Razão Pura • Descartes – Discurso sobre o método No campo do Direito: Relativismo das taxionomias herméticas: • Direito Publico x Privado; • Constitucionalização do Direito Privado; • Privatização do Direito Administrativo (princípio da eficiência – EC n. 19/98) Conceitos abertos e indeterminados > conceitos fechados Sistema jurídico de fusion = Civil Law e Common Law • (Ex: CLT + OJs) • Na cultura PM há relativismo das profissões (“escritor, jornalista, chef, fotógrafo”) • Há fusão até mesmo dos conceitos e das culturas: • Masculino x Feminino • Ocidente x Oriente Vive-se a “cultural fusion” • (na gastronomia, nas artes ...) • Na música e nas animações 4) Niilismo; nada tem valor; • Nihil – tendência para o Nada; ceticismo; • As meta narrativas são abandonadas; • O futuro e o passado não têm valor. • A Modernidade é criticada em seu marco fundamental: “a crença na Verdade, alcançável pela Razão, e na linearidade histórica rumo ao progresso”. • A PM não substitui o caminho da Verdade por outro alternativo, mas pela afirmação de que nenhum caminho é possível, necessário ou desejável. • Não há mais ética (universal), mas apenas deontologias (ou éticas setoriais) • Os jovens perderam suas bandeiras (marcha da maconha) No Direito: • crise de legitimidade da norma jurídica, vez que a base axiológica que a sustenta já não mais representa uma coesão dos grupos sociais; bancada dos ruralistas x bancada dos ambientalistas; • crítica ao monismo e ao conceito de norma abstrata universal; • retorno à defesa da autonomia privada das partes interessadas; • No Direito do Trabalho relativizam-se os dogmas e princípios (da proteção ao empregado; da irrenunciabilidade dos direitos) Nos costumes: • A partir da queda da Razão e do Método (“entropia”), a sociedade tornou-se “assimétrica” 5) Opção pelo estético, pela emoção e pela imagem digital • tudo como antítese à Razão Pura; • a estética vale mais do que a ética; • O “parecer” vale mais do que o “ser” (BBB); • Existência de Blogs, Sites e uso das Redes Sociais (Twitter, Facebook, Orkut) • A força da publicidade, da propaganda e da auto-promoção; • Profissional valorizado = mínimo de talento + intenso trânsito nas redes • “Com a internet cada um de nós pode ser o seu próprio editor. Não vivemos mais na era da informação (oligopolizada), mas estamos na era da colaboração e da inteligência conectada.” – Don Tapscott • No Direito: surgem os “processos eletrônicos e as “Varas digitais” • verifica-se forte apelo ao desejo e à emoção do consumidor para agregar valor ao produto 6) Diversidade e agrupamentos por afinidade de consumo • Indivíduo visto a partir de suas particularidades e subjetivismos que o distingue dos demais. - as pessoas se agrupam não mais por vínculos associativos, mas (efêmera e circunstancialmente) por afinidades de consumo e desejos; • Vive-se a era da diversidade das “tribos” “Os caracteres da socialidade antes calcada em células definidas, tal como a família, a comunidade, passa por transformações substanciais, que implicam na dissolução dos vínculos associativos e seus mecanismos de coesão e controle sociais, o que implica na reformulação do contexto social e das suas unidades basilares”. (In: Direito e diversidade na Pós-Modernidade. Newton de Oliveira Lima) No Direito: • O fenômeno de “dissolução dos vínculos associativos” explica porque os sindicatos e as associações perderam seu poder de articulação; • também pelo descompasso entre: empresas globalizadas x sindicato local Era das tribos urbanas • “a sociedade atual é basicamente formada por indivíduos que se associam em grupos. Vive-se, assim, a “era das tribos”. (In: “O tempo das tribos”. Michel Maffesoli. Forense Jurídica, 2006) CRÍTICAS, PARADOXOS e CONCLUSÃO • Aquele que não pertence a uma tribo ou pertence a uma tribo circunstancialmente frágil está fadado a ser vítima de bullying, discriminação e/ou preconceito étnico (xenofobia) • Com a resistência às metanarrativas, reduz-se o espaço de controle e de referência do Estado, da Religião e da Família sobre o indivíduo • “A misteriosa fragilidade dos vínculos humanos, o sentimento de insegurança que ela inspira e os desejos conflitantes de apertar os laços e ao mesmo tempo mantê-los frouxos...” – (Amor líquido – Zygmunt Bauman) • Preferência excessiva por Pornografia e Sexo Virtual Relações virtuais: • “ao contrário dos relacionamentos antiquados, elas parecem ser feitas sob medida para o líquido cenário da vida moderna, em que se espera e deseja que as “possibilidades românticas” surjam e desapareçam numa velocidade crescente e em volume cada vez maior” • (Amor líquido – Zygmunt Bauman) • Efeitos: o individuo está desamparado e sem referência; • Reação: ao invés do “carpe diem responsável” vive-se a síndrome do burn-out, a depressão, a tristeza, o pânico, a fluexitina, consumismo, as drogas, álcool (“antes as mulheres cozinhavam que nem as mães, hoje bebem como os pais”) (o mercado consumidor prefere pessoas agitadas e aflitas para vender mais) • O discurso pós-moderno como resultado da insatisfação dos valores da modernidade (indivíduo, mercado e tecnologia) não alcança os povos excluídos que sequer se serviram da modernidade (áfrica, índios, norte do BR) Hedonismo exagerado e sem ética. • Conferência dos Pedófilos • BALTIMORE, MD, EUA, 23 de agosto de 2011 • A organização B4U-ACT patrocinou o evento com profissionais de saúde mental e ativistas pró-pedofilia. • Os palestrantes falaram para os 50 participantes presentes sobre temas que variavam desde a noção de que pedófilos são “injustamente estigmatizados e demonizados” até a ideia de que “as crianças não são inerentemente incapazes de dar consentimento” para fazer sexo com um adulto. • Fonte: http://www.lifesitenews.com/news/evil-attendees-at-prominent-pro-pedophiliaconference-horrified-by-sessions CONCLUSÃO: • A PM é cética e se preocupa apenas com a satisfação material do tempo presente ao mesmo tempo que despreza o caminho, a verdade e a vida “Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade.” (Poema: “Mude...” de Edson Marques) *disponivel em www.twitter.com/DallegraveNeto