Coletânea de contos
Vários autores
A roupa nova do Imperador
©2014 Vários autores
Contato: http://aroupadoimperador.blogspot.com
http://facebook.com/gloriosoimperiobrasil
Edição, Diagramação e Arte: Eber Josué
Impressão e acabamento:
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
G635r
Gonçalves, Gerson Silvestre Alencar et al.
A roupa nova do Imperador / Gerson Silvestre Alencar Gonçalves[et al.] – São Paulo: Eber Josué Dias de Oliveira, 2014.
186 p.
ISBN 978-85-8196-637-3
1.Literatura brasileira. 2.Ficção.
3.Contos brasileiros. 4.História do Brasil.
5.Brasil Imperial. 6.D Pedro II. I. Eber Josué (organizador). II. Série Glorioso Império do Brasil. III. Título.
CDD: B869.3
CDU: 82-3 / 82-92/94
Índices para catálogos sistemáticos
1.Literatura brasileira: 869.3
2.Ficção : Contos brasileiros: 869.308
Todos os direitos reservados.
É proibida a reprodução deste livro com fins comerciais sem
prévia autorização dos respectivos autores.
Coletânea de contos
Vários autores
A roupa nova do Imperador
1ª Edição
Três Corações-MG
Maio de 2014
PREFÁCIO
Falar de História é discorrer sobre a inesgotável
fonte de conhecimento que estava, está e estará sempre
diante de nós. Vai além do que é exato, do que, ao final,
mostrará o resultado matemática de uma operação do tipo
2+2=4.
A História é um prisma diante do qual há sempre
olhares, interpretações, imaginações e opiniões que podem
ser discutidas diferentemente e de vários ângulos.
Você verá neste livro versões de fatos em um determinado tempo histórico, exemplos puros da junção do
imaginário ao que bem poderia ter ocorrido – ou não. Para
lê-lo há que se ter muita criatividade, imaginação e disposição para se entregar, vivenciar e degustar cada fato maravilhosamente narrado por seus autores.
Nossos historiadores não se limitaram a comprovarem fatos, como tantos outros, mas se dispuseram a deixarem marcos em nós através de seus textos e falas inesquecíveis, capazes de tirarem sorrisos, risadas, murmúrios e,
acima de tudo, fazerem-nos pesquisar sobre o narrado.
A partir de agora você vivenciará situações exclusivas acerca de Dom Pedro II do Brasil, ocultas por todo esse
tempo nas mentes de pessoas cheias das mais criativas
lembranças e conhecimentos históricos, tudo narrado nos
mínimos detalhes: da agulha à pluma, do corte à prova, do
artesão ao Imperador, do autor a você.
Deixe-se transportar de volta ao passado, um passeio ao século XIX, de uma maneira menos monótona do
que na época escolar e de maneira mais palpável. Tire o
vazio e preencha a memória com estórias magníficas sobre
o Defensor Perpétuo do Brasil, sucessor direto daquele que
nos trouxe a independência política.
Entre neste livro sem pedir licença e participe com
afinco. Sinta-se como os personagens e imagine cada cenário.
Bem vindo ao mundo do Imperador. Sinta-se à vontade para apreciar sua nova roupa.
RAFAEL ALARCON
Músico
ÍNDICE
OBRAS PREMIADAS
Adriana Manfredini
Barba branca
Clarisse Souza
Orgulho, papos de tucano e lealdade
9
24
Edweine Loureiro
O alfaiate
Frederico Flosculo Pinheiro Barreto
A roupa selvagem de Pedro
36
42
Gerson Silvestre
Uma quase história de amor
Joan Saulo do Monte
A visita de Dom Pedro II à terra de Zé Lins
54
73
Neyd Montingelli
A camisola Real
Rafael Filter
Fios de ouro e pontos de sangue
89
104
Roberta Del Carlo
116
As costureiras do Rei
Schleiden Nunes Pimenta
Pedrinho, as barbas de pedra e Obá
123
MENÇÕES HONROSAS
Adnelson Borges de Campos
139
Invenção tropical
Amauri Chicarelli
As Ruas de Paris
148
Andre Carlos Moraes
159
O monarca e o caixeiro viajante
José Luis Rocha
Império da Alegria
168
Letícia Magalhães Pereira
174
O alfaiate de Vossa Majestade
A roupa nova do Imperador
Adriana Manfredini [São Paulo-SP]
Jornalista e mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade de
São Paulo, dedica-se a escrever crônicas e contos inspirados, em geral, na
diversidade humana das metrópoles. Já participou de diversos concursos
literários e teve textos publicados em duas antologias.
Barba branca
Tudo começou em uma tarde melancólica de início de outubro, logo após o cochilo imperial, naquele desbotado ano de
1877. Dom Pedro II estava em seu gabinete, a passar os olhos
pelas correspondências recebidas, quando ordenou ao secretário
particular:
– Chama lá o Bento, urgente!
A notícia de que o Imperador desejava sua presença imediata no palácio surpreendeu Bento.
– Despachei com o Imperador ontem e não me lembro de
nenhuma pendência... Diga que em pouco mais de um quarto de
hora lá estarei, disse o homem ao estafeta encarregado de transmitir o recado.
Bento, ou melhor, José Bento da Cunha Figueiredo era o
então Ministro de Estado dos Negócios. Na corte, ostentava o
título de Visconde do Bom Conselho.
Dom Pedro II já mostrava sinais de impaciência, pela espera, quando a porta se abriu e o secretário anunciou:
– ilustríssimo Visconde do Bom Conselho e Ministro de
Estado dos Negócios.
– Mande-o entrar – disse Dom Pedro II.
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O visconde entrou e cumprimentou o Imperador, que estava em pé, ao lado da ampla mesa que lhe servia de escrivaninha.
Sobre o tampo de mogno envernizado, havia uma baixela de prata
com meia dúzia de envelopes. Dom Pedro II pegou o primeiro da
pilha e o entregou ao nobre.
– Ilustríssimo visconde, o que vê neste envelope?
Bento colocou o monóculo, pegou a correspondência e
observou a caligrafia caprichada com a qual o nome do Imperador estava manuscrito. Virou o envelope para ler o remetente, no
caso o presidente da província de São Paulo. Nada naquele pedaço de papel chamava a atenção em particular.
– E então? – questionou Dom Pedro II.
– Majestade Imperial, eu vejo que se trata de uma correspondência oficial.
– Sim, sim, mas não é disso que estou falando. Observe
melhor.
– É um envelope que chegou pelo correio, selado e carimbado.
– E o selo, o que me diz do selo?
– É um dos selos atualmente vigentes, no porte de 100
réis. Se não me engano, é da última emissão lançada.
– Já vi que não percebe. Devolva-me a carta – disse o
Imperador, em um tom de voz beirando a impaciência.
Com o envelope na mão, apontando para o selo colado, o
Imperador perguntou:
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A roupa nova do Imperador
– Quem é essa figura estampada no selo, meu ilustríssimo visconde?
Bento achou a pergunta estranhíssima, pois o selo em
questão reproduzia monocromaticamente uma imagem do próprio Dom Pedro II.
– É Vossa Majestade Imperial em pessoa.
– É aí que está a questão, meu prestimoso Bentinho. Esse
não sou eu. O retratado no selo é um sujeito de barba preta, com
algumas ilusões na cachola, vestindo um jaquetão sóbrio e modesto. Imagine o susto de um brasileiro que só viu a imagem de
seu Imperador nos selos ao me encontrar agora, com a barba
esbranquiçada, um pouco mais pesado, a exalar maturidade?
Entende o que eu estou a dizer? Pois bem, precisamos atualizar
esses selos, porque é pela via postal que a imagem do Imperador
corre os quatro cantos do Brasil, ao menos até as paragens aonde
o correio chega.
– Entendo, entendo. Mas como este ministro e servo pode ser-lhe útil?
– Desejo que fale com a direção dos Correios para providenciar a substituição dessas estampilhas até o início do próximo
ano, se possível.
– Conte comigo, Majestade Imperial. Em um ou dois dias, terá notícias minhas.
– Assim espero. Vemo-nos em breve, passar bem – despediu-se o Imperador.
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O ministro deixou o Palácio Imperial decidido a livrar-se
logo da incumbência. Apesar do adiantado da hora, rumou diretamente da Quinta da Boa Vista para o Largo do Carmo, onde
ficava a administração postal do Rio de Janeiro. Bento conhecia
bem o diretor-geral dos Correios, o Dr. Luís Plínio de Oliveira, de
modo que poderia quebrar o protocolo e chegar sem avisar, mesmo com o sol já se despedindo. Com certeza, ele entenderia a
urgência da situação.
E foi, de fato, o que aconteceu.
Ao ser anunciado da presença do Ministro de Estados dos
Negócios, Oliveira suspeitou que houvesse algum motivo de algo
de força maior naquela visita repentina.
– Vim em missão imperial. Dom Pedro II me chamou hoje ao palácio para dizer que deseja substituir os selos nos quais
aparece com a barba preta por uma imagem mais atual, já com a
barba branca.
– Compreendo.
– E há alguma urgência, porque a Majestade Imperial
quer ver esses novos selos no máximo até os primeiros dias do
próximo ano. Será possível?
– Ilustríssimo visconde, acredito ser possível sim. Necessitaremos apenas ter em mãos um novo retrato do Imperador,
aprovado pelo mesmo, para providenciarmos a impressão. O
chefe da seção gráfica se encarregará de desenhar o modelo a ser
encaminhado para a American Bank Note Company, em Nova
Iorque, firma responsável por imprimir nossas emissões. Se não
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A roupa nova do Imperador
me engano, na semana que vem parte um navio do Rio de Janeiro
para os Estados Unidos da América. Então, temos alguns bons
dias para providenciar tudo, de modo que as primeiras folhas dos
novos selos possam chegar à corte entre fim de dezembro e início
de janeiro, no máximo.
– Em relação ao novo retrato, o senhor tem alguma sugestão?
– Para esses velhos selos do Imperador com a barba escura, utilizamos como base um retrato que aqueles fotógrafos estrangeiros, que andaram pela corte, o Stahl e o Wahnschaffe,
fizeram de Dom Pedro II em 1865. Lembro bem porque eu já era
o diretor-geral dos Correios na ocasião. Foi o próprio Imperador
que recomendou que utilizássemos aquela imagem. Podemos
proceder da mesma maneira. Não sei se é de conhecimento do
ministro, mas fui eu que sugeri a impressão dos primeiros selos
com a imagem do Imperador.
– Não me recordava.
– Havia pouco tempo que eu estava à frente da direção
dos Correios e, particularmente, não gostava dos selos que utilizávamos desde 1843, apenas com as cifras gravadas. Na primeira
oportunidade que tive, questionei meus subordinados por que
não seguíamos o exemplo da Inglaterra, estampando nos selos
postais a imagem do nosso soberano. Lembro-me dos olhares
incrédulos dos meus subalternos. Um deles, o Fagundes, que
trabalhava nos Correios desde muito antes da reforma postal de
1842, foi o único que se atreveu a me dizer algumas palavras.
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Num tom de voz que demonstrava sua indignação, afirmou-me
que ele e os demais empregados teriam pudores em macular a
imperial figura com um sujo e feio carimbo, de modo que era
mais adequado o Brasil continuar com os selos de cifras. Por esse
raciocínio, meu caro ministro, via-se a mentalidade tacanha que
reinava naquele ambiente.
– Como o senhor conseguiu reverter o conservadorismo e
levar adiante a ideia do selo com a imagem de Dom Pedro II?
– Tratei de escrever uma missiva ao antigo secretáriogeral dos correios da Inglaterra, Sir Rowland Hill, que havia deixado o posto havia pouco tempo, solicitando sua opinião sobre o
uso da imagem de monarcas nos selos postais. Meses depois recebi a resposta, muito positiva, na qual ele argumentava sobre a
importância que o selo postal representava para divulgar, de forma prática e sem grandes custos, a imagem real, no caso inglês, a
da Rainha Victoria, em todo o território por ela governado, reforçando entre os súbitos um sentimento de lealdade.
– Curioso é que, com outras palavras, Dom Pedro II utilizou-se desse mesmo pretexto para solicitar-me a atualização dos
selos.
– Não há coincidência, pois foi com esse argumento que
convenci o presidente do Conselho de Ministros a marcar uma
audiência com o Imperador, para que eu pudesse, pessoalmente,
apresentar minha ideia. No dia da audiência imperial, além da
resposta de Sir Rowland Hill, levei uma porção de envelopes estrangeiros, com selos da Inglaterra, obviamente, e também da
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A roupa nova do Imperador
Espanha, Prússia e Portugal, para ilustrar minha sugestão. Dom
Pedro II, para minha surpresa, não só aprovou a sugestão sem
muito pensar, como já tinha conhecimento daqueles selos, pois os
colecionava. Ele próprio mostrou sua preciosa coleção, enquanto
acertávamos os detalhes da impressão da primeira série com a
imagem do Imperador.
– E quanto à reação de seus subalternos?
– Ah, visconde, foi uma pândega. No primeiro dia de circulação dos selos com a figura de Dom Pedro II, houve uma espécie de motim. Ninguém queria mesmo sujar a face imperial. Pois
eu fui à expedição, peguei o carimbo e obliterei envelope por envelope, dando o exemplo. E naquele momento, institui que toda
vez que os Correios lançassem um selo novo, o diretor-geral ou
representante por ele indicado conduziria a primeira obliteração.
– Boa história, Oliveira. E quanto à nossa demanda atual?
– Peço apenas o obséquio de o ilustríssimo visconde marcar uma audiência o mais breve possível com o Imperador, para
cuidarmos da escolha do retrato. Na data e hora marcadas, comparecerei ao Palácio Imperial acompanhado do chefe da seção
gráfica. Quanto antes, melhor.
– Pois estamos acertados então. Passar bem – despediuse o visconde.
Dois dias depois, o estafeta do Palácio Imperial entregou
nas mãos de Oliveira o bilhete do Imperador, no qual solicitava o
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