FENÔMENOS DE TRANSFERÊNCIA DE CALOR: UMA ABORDAGEM
PARA O ENSINO MÉDIO
Juliano Borges
[email protected]
Márcio André Martins
[email protected]
Resumo
Este trabalho apresenta uma abordagem para o ensino de conteúdos de Física Térmica –
transferência de calor, considerando o emprego de tendências atuais da Educação
Matemática. Esse enfoque permite aos professores de Física e Matemática trabalhar de
forma interdisciplinar, mostrando a ligação existente entre o conteúdo desenvolvido em
cada disciplina. Existe consenso quanto à necessidade da realização de experimentos no
ensino da Física. Entretanto, nas escolas públicas do Paraná a disponibilidade de
laboratório experimental não é uma realidade, por outro lado a implantação de laboratórios
de informática nesses espaços torna possível a realização de simulações numéricas em
ambiente informatizado. Nesse contexto se insere esta proposta, pretendendo contribuir
com as possibilidades de ensino-aprendizagem.
Palavras-chave: Transferência de Calor; Experimento Numérico; Ensino-Aprendizagem.
1. Introdução
Este trabalho consiste numa abordagem, de forma integrada, entre as tendências
metodológicas em Educação Matemática: Resolução de Problemas e Mídias Tecnológicas.
A Resolução de Problemas considera um aprendizado pelo qual o estudante tem a
oportunidade de aplicar conhecimentos matemáticos já adquiridos em novas situações, de
modo a resolver uma questão proposta. De acordo com Schoenfeld (1997), o professor
deve fazer uso de práticas metodológicas para a Resolução de Problemas, as quais tornam
as aulas mais dinâmicas e não restringem o Ensino de Matemática a modelos clássicos,
como exposição oral e resolução de exercícios.
As etapas de uma Resolução de Problemas não são rígidas, fixas e infalíveis. O
processo de resolução de um problema é algo mais complexo e rico, que não se limita a
seguir instruções passo a passo que levarão à solução, como se fosse um algoritmo.
Entretanto, de um modo geral elas ajudam o solucionador a se orientar durante o processo
(DANTE, 2003).
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Para Almeida (1999), quando o professor utiliza o computador como ferramenta
pedagógica torna-se mais consciente de sua prática, identificando os problemas, as
mediações e os estilos assumidos em sua maneira de agir, proporcionando formas de
promover uma melhor atuação e um maior aproveitamento dos alunos. Sendo o professor
mediador do processo de ensino e aprendizagem, deverá reconhecer o momento exato de
intervir no desenvolvimento dos alunos, compartilhando problemas, respeitando as
diferentes formas de pensar, os interesses individuais, e colaborando para que os alunos
possam entender, analisar e corrigir os possíveis erros, aprendendo a partir deles.
Mas é, sobretudo, nas questões metodológicas presentes nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (BRASIL, 1999) que reside um dos maiores potenciais do uso da
Resolução de Problemas e das Mídias Tecnológicas, principalmente no que se refere ao
uso do computador como recurso pedagógico. Nessa perspectiva, considera-se que os
ambientes gerados por aplicativos informáticos dinamizam os conteúdos curriculares e
potencializam o processo pedagógico.
Ao optar por estas tendências metodológicas – ao invés de apresentar a
Matemática ou a Física como na sequência: definição, exemplos, resolução de exercícios
na lousa; o professor se apresenta como um facilitador, um orientador do aluno frente a um
problema a ser resolvido através de experimentação. Tal processo se assemelha muito ao
trabalho de um pesquisador, onde a investigação é evidenciada e os resultados não são
considerados prontos e acabados.
Diante destas considerações – tendências metodológicas – surge a questão: Como
desenvolver um experimento numérico enfocando conteúdos de Física e Matemática que
seja adequado ao nível de Ensino Médio, considerando a Resolução de Problemas e as
Mídias Tecnológicas? Propõe-se, então, o desenvolvimento de uma atividade enfocando
fenômenos de Transferência de Calor. Esta proposta faz parte de um plano de trabalho de
iniciação científica, que tem como foco relacionar conteúdos de matemática aplicada
abordados no Ensino Superior ao nível de Ensino Médio.
Neste enfoque, os conteúdos específicos, de Física e Matemática, considerados
foram: Transferência de Calor, Equações Diferenciais, Sistemas Lineares, Funções,
Matrizes e Determinantes. Os fenômenos relacionados à Transferência de Calor e suas
propriedades elementares fazem parte do aprendizado da Física, assim como os demais
conteúdos, especificados anteriormente, compõem a grade curricular de Matemática em
nível médio e superior.
93
Com o desenvolvimento da revisão bibliográfica, constatou-se que os modelos
matemáticos que tratam de fenômenos de Transferência de Calor são abordados nos cursos
de equações diferenciais em nível superior. Entretanto, de acordo com a proposta do
presente trabalho, pode-se indagar: É possível adaptar estes modelos para o nível de Ensino
Médio? E, ainda: Quais os benefícios, em termos educacionais, gerados por esta
abordagem?
No âmbito do Ensino de Física, dentre as competências e habilidades a serem
desenvolvidas, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1999: 237),
podem ser destacadas: “compreensão de enunciados que envolvam códigos e símbolos;
capacidade de discriminar e traduzir as linguagens matemática e discursiva entre si;
expressão da linguagem física adequada e domínio de elementos de sua representação
simbólica”. Já as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná (2006), no que se refere ao
Ensino de Matemática, enfatizam a necessidade da criação de situações em que o estudante
tenha condições de constatar regularidades matemáticas, generalizações – padrões de
regularidade – e apropriação de linguagem adequada para descrever e interpretar
fenômenos matemáticos e de outras áreas do conhecimento.
Nesse sentido e na tentativa de apontar alternativa para uma abordagem,
envolvendo a Resolução de Problemas e as Mídias Tecnológicas, são apresentadas, na
sequência, algumas informações inerentes aos fenômenos de Transferência de Calor, os
modelos matemáticos e os procedimentos para simulação numérica computacional. O
modelo matemático – condução – é abordado de maneira que as ferramentas matemáticas
utilizadas são acessíveis ao aluno do Ensino Médio.
2. Processos de Transferência de Calor
O calor é uma forma de energia que é transferida de um corpo para outro em
virtude de uma diferença de temperatura entre eles. Essa transferência de energia pode
processar-se de três maneiras distintas: por condução, convecção ou radiação
(INCROPERA e DeWITT, 1996).
2.1. Condução
Ao se colocar uma das extremidades de uma barra metálica em contato com uma
fonte térmica, pode-se notar que a temperatura da outra extremidade torna-se cada vez
mais elevada. O que ocorre nesse caso é que o calor cedido pela fonte se propaga através
da barra até atingir a extremidade oposta. Esta modalidade pela qual o calor se propaga é
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denominada condução. A explicação para tal fenômeno é que as moléculas, ao vibrarem
com maior amplitude, conseguem aproximar-se das moléculas vizinhas, isto é, a
transferência real ocorre em nível molecular (SHMIDT, HENDERSON e WOLGEMUTH,
1996). Nessa aproximação, intensificam-se as forças repulsivas e, consequentemente, as
moléculas vizinhas passam a vibrar mais intensamente.
Assim, a energia térmica (calor) é conduzida de molécula para molécula, do meio
a que essas moléculas pertencem. Em outras palavras, pela colisão entre átomos e
moléculas do meio e a sub-sequente transferência de energia cinética, isto equivale a dizer
que o calor se transmite através da matéria, sem que esta se desloque. Em geral, o
fenômeno da condução ocorre nos meios na fase sólida.
2.2. Convecção
A transferência de calor por convecção é a transferência de energia entre um
líquido e uma superfície sólida, em que são presenciados dois fenômenos diferentes. O
primeiro fenômeno é a difusão ou condução de energia através do fluído devido à direção
do aumento de temperatura dentro do fluido (BRAGA, 2003). O segundo fenômeno é a
transferência de energia dentro do fluido devido ao movimento do fluido de uma posição
para outra.
A convecção é o processo de propagação de calor, no qual a energia térmica muda
de local, acompanhando o deslocamento da própria substância aquecida. Ao contrário da
condução, em que apenas a energia térmica se propaga e as partículas permanecem em
suas posições de equilíbrio, com movimento de vibração, na convecção a energia térmica
propaga-se acompanhando as partículas aquecidas da substância.
2.3. Radiação
A transferência de energia por ondas eletromagnéticas é chamada de transferência
de calor por radiação (SHMIDT, HENDERSON e WOLGEMUTH, 1996). Temos, como
exemplos, a maneira como o sol transfere energia para o sistema terra-atmosfera, através
do espaço vazio, ou ainda a transferência de calor de um forno para uma pessoa distante.
Esse processo não necessita de um meio para propagar o calor. A propagação é dada
através de ondas eletromagnéticas, que ao atingir um meio são absorvidas e transformadas,
em grande parte, em energia térmica. Qualquer meio material, em uma temperatura
superior ao zero absoluto, vai irradiar energia. Energia pode ser transferida por radiação
térmica entre um gás e uma superfície sólida ou entre duas ou mais superfícies.
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3. Experimento Numérico
De acordo com a proposta inicial, considera-se a resolução numérica de uma
situação-problema envolvendo transferência de calor. Ao iniciar essa atividade o professor
de Matemática pode discorrer sobre o termo “transferência de calor” que, muitas vezes,
não é percebido como um assunto que está presente no cotidiano dos alunos. Neste
momento, é importante explorar os conhecimentos que os estudantes já têm sobre este
fenômeno físico.
São exemplos de situações que envolvem transferência de calor: a exposição ao
sol, o aquecimento de um recipiente com água sobre o fogo, ou mesmo a transferência de
calor num dia frio de inverno no interior de uma casa para o exterior. Pode-se enfatizar,
nestas situações e em muitas outras onde o calor é o assunto principal, que a transferência
ocorre de três modos: condução, convecção ou radiação. A abordagem aqui considerada
está na transferência de calor por condução.
Propõe-se, então, uma investigação sobre a condução de calor em uma parede
plana, conhecendo-se as temperaturas em suas faces opostas, Ta e Tb, com Ta > Tb. Como
ocorre esta variação? Dentro da parede esta variação também ocorre, ou somente nas faces
opostas? É possível determinar o perfil de distribuição da temperatura no interior da
parede, conhecendo-se apenas as temperaturas Ta e Tb? Qual a Matemática envolvida neste
problema?
A Figura 1 representa uma parede plana, sem geração de energia interna, sendo
composta por um único material.
Tb
Ta
H
Figura 1: parede plana.
3.1. O Modelo Matemático abordado no Ensino Superior
A condução de calor é regida pela Lei de Fourier que estabelece que o fluxo de
calor, num ponto interior de um material, é proporcional ao gradiente de temperatura nesse
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ponto. O modelo matemático que expressa a condução de calor em coordenadas
cartesianas é dado por (INCROPERA,1996):
∂T
∂ ⎛ ∂T ⎞ ∂ ⎛ ∂T ⎞ ∂ ⎛ ∂T ⎞
⎟⎟ + ⎜ k
⎟ + q = ρc p
⎟ + ⎜⎜ k
⎜k
∂t
∂x ⎝ ∂x ⎠ ∂y ⎝ ∂y ⎠ ∂z ⎝ ∂z ⎠
(1.),
onde ∂T ∂x é a componente do gradiente de temperatura (T) na direção x, ∂T ∂y é a
componente do gradiente de temperatura na direção y, ∂T ∂z é a componente do
gradiente de temperatura na direção z, ∂T ∂t é a taxa de variação de temperatura em
relação ao tempo, c p é o calor específico (J/KgoC),
ρ é a massa específica (Kg/m3), k
representa a condutividade térmica do material (W/ KgoC) e q é a taxa de geração de
energia (W/m3). Existem diversas variações da “equação do calor”. Na sua forma mais
conhecida ela modela a condução de calor em um sólido homogêneo, isotrópico – as
propriedades do material se mantêm em todas as direções e por toda extensão – que não
possua fontes de calor – geração interna de calor.
3.2, Hipóteses Simplificadoras
Ao se considerar – hipóteses do problema – a condução de calor em regime
permanente (o tempo não influencia na transferência de calor, então ∂T ∂t = 0 ), a
ausência de geração de calor na parede (q=0) e a condutividade térmica constante (único
material), a Equação (1.) torna-se mais simplificada.
A parede (Figura 1) possui uma temperatura Ta mais alta em x = 0 e mais baixa Tb
em x = H. Estas são as condições de contorno do problema. A variável de interesse é a
temperatura T em cada ponto da parede. Como hipótese simplificadora, pode-se, ainda,
considerar uma única faixa ou camada da parede, o que torna possível uma análise
unidimensional – direção x.
x=0
T(0) = Ta
x=H
T(H) = Tb
Figura 2: representação unidimensional.
Desta forma (Figura 2), analisa-se a variação da posição x – variável independente
– e a variação da temperatura em relação a esta posição T(x) – variável dependente. O
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modelo matemático que descreve a variação de T em função da variação de x é dado por
(VERSTEEG e MALALASKERA,1995):
∂ 2T
∂ 2T
k 2 =0⇔ 2 =0
∂x
∂x
(2.)
Essa expressão traduz o “princípio de conservação da energia”: a energia que, por
unidade de tempo, entra pela face localizada em x, é igual à energia que saí pela face em
x+dx, no mesmo intervalo de tempo. Tratando-se desta abordagem em nível de Ensino
Médio, inicialmente, sugere-se que o professor de Física aborde os aspectos teóricos do
fenômeno em questão.
A Equação (2.) – equação da condução do calor unidimensional – é obtida da
Equação (1.), considerando-se a temperatura variando apenas na direção x ( ∂T ∂y = 0 e
∂T ∂z = 0 ) e pode ser resolvida analiticamente através de integrações sucessivas,
possibilitando a obtenção da expressão:
⎛T −T ⎞
T ( x) = ⎜ b a ⎟ x + Ta
⎝ H ⎠
(3.)
3.3. Desenvolvimento de um Modelo Matemático para o Ensino Médio
A obtenção da solução – Equação (3) – pressupõe, entretanto, o domínio de
ferramentas de Cálculo Diferencial e Integral. Como esse conteúdo não é acessível em
nível de Ensino Médio, propõe-se ao professor de Matemática, como alternativa, enfocar o
modelo discreto pela discretização do domínio de cálculo e substituição do operador
diferencial pelo operador de diferenças finitas.
Desta maneira, com a transformação do modelo contínuo para o modelo discreto,
a resolução do problema – obtenção do perfil de temperatura – pode ser obtida
considerando-se, como ferramenta matemática, o emprego de um sistema de equações
lineares, que constitui um conteúdo específico abordado no Ensino Fundamental e Médio.
Para discretizar a região representada na Figura (2.), considera-se n +1 pontos (x0,
x1, x2, x3, ..., xn, xn+1) sobre a distância H ao longo da qual o calor irá se propagar. Este
conjunto de pontos determina a localização em que será obtida a temperatura da parede, ou
seja, neste conjunto será traçado o perfil da variação de temperatura.
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x0
x1
h
x2
h
x3
xn
h
xn+1
h
H
Figura 3: malha uniforme
Os n+1 pontos dividem a faixa (ou camada) da parede em n subintervalos, que,
nesse caso, serão considerados com a mesma medida h, portanto: h = H/n e xi+1 = xi + h
com i = 0, ..., n.
Para obtenção da solução numérica, pode-se considerar o Método de Diferenças
Finitas (SMITH, 1985). Nesse enfoque, tem-se a expansão em Série de Taylor para as
soluções numéricas das temperaturas nos pontos xi, i = 1, 2,..., n.
Ti +1 = Ti +
Ti −1
∂ 2T h 2
∂T
h+ 2
+ ...
∂x i
∂x i 2!
∂T
∂ 2T h 2
= Ti −
h+ 2
+ ...
∂x i
∂x i 2!
(4.)
A notação Ti representa a solução numérica obtida para temperatura no ponto xi,
ou seja, T ( xi ) ≈ Ti . Da Expressão (4.), soma algébrica das equações e isolamento do
operador diferencial, tem-se:
T − 2Ti + Ti −1
∂ 2T
= i +1
2
∂x i
h2
(5.)
E, assim, sugere-se que o professor de Matemática enfoque o “princípio de
conservação da energia”, tratado anteriormente pelo professor de Física, considerando a
fração algébrica:
Ti +1 − 2Ti + Ti −1
, o que caracteriza uma ferramenta – em nível de Ensino
h2
Médio – para tratar de fenômenos de transferência de calor por condução.
Ainda, comparando a Equação (5.) e a Equação (2.), tem-se:
Ti +1 − 2Ti + Ti −1 = 0
(6.)
Com a região discretizada, representada na Figura (4.), tem-se a malha com n+1
pontos, em que xi representa os pontos da malha e Ti a temperatura nos pontos, para:
99
T0=Ta T1=? T2=? T3=?
x0
x1
x2
x3
...
...
Tn=?
xn
Tn+1=Tb
xn+1
Figura 4: mapeamento da temperatura da região discretizada.
De acordo com a Equação (6.), para i = 1, as temperaturas nos pontos x1 e x2 estão
relacionadas pela equação: T2 – 2T1 + T0 = 0, que implica, por operações elementares, em:
T2 – 2T1 = T0. Já para i=2, as temperatura em x2 e x3 estão relacionadas pela equação: T3 –
2T2 + T1 = 0 e, para i = n, tem-se: Tn+1 – 2Tn + Tn-1 = 0.
Neste ponto, o professor de Matemática pode apresentar a definição: “equação
linear é toda equação do tipo a1x1 + a2x2 + ... + anxn = k, com ai ∈ ℜ, i = 1,..., n e k∈ ℜ”
(YOUSSEF, 2009), enfatizando que os expoentes das incógnitas são sempre iguais a 1.
Neste momento, instiga-se os alunos ao questionamento: Qual a relação deste conceito
com a situação-problema abordada inicialmente?
Com isso, é possível estabelecer uma generalização – para mais equações, ou seja:
Qual a relação entre um sistema de equações lineares e um fenômeno de Transferência de
Calor? Percebe-se que, com a variação do índice que diferencia as variáveis, i = 1, 2,..., n,
o problema inicial – obtenção do perfil de temperatura na parede – fica, agora, determinado
pela busca de solução para o sistema de equações lineares que tem a seguinte estrutura:
2T1 − T2 = T0
⎧
⎪ − T + 2T − T = 0
1
2
3
⎪
⎨ ...
⎪− T + 2T − T = 0
n −1
n
⎪ n −2
⎩ 2Tn − Tn−1 = Tn+1
(7.),
onde T0 = Ta e Tn+1 = Tb são valores conhecidos – condições de contorno do problema.
Alguns aspectos relevantes sobre a estrutura do sistema (7) são abordados na
disciplina de Álgebra Linear, ministrada no Ensino Superior, dentre eles: a matriz
coeficiente do sistema (7.) pertence à classe das matrizes banda – matrizes estritamente
dominantes em diagonal ou definidas positivas. A definição de matriz banda força os
elementos não nulos a se concentrarem próximos da diagonal principal, o que garante a
existência de solução única para as incógnitas T2 , T3 ..., Tn , ou seja, o sistema de equações
100
lineares é possível e determinado. O sistema (7.) apresenta banda 3, as matrizes com
largura de banda 3, são chamadas “tridiagonal” (BURDEN e FAIRES, 2003). Estas
matrizes possibilitam simplificações consideráveis na resolução do sistema, devido ao
grande número de elementos nulos.
A estrutura apresentada pela matriz coeficiente do sistema de equações lineares
(7.) possibilita, entretanto, um momento de ricas discussões no que se refere à existência e
unicidade de soluções de sistemas de equações lineares em nível de Ensino Médio. Onde é
possível evidenciar a importância dos conceitos, e análises qualitativas em Matemática. Ou
seja, qual a garantia que a ferramenta matemática empregada será eficiente? Ou ainda, é
possível solucionar o problema inicial? E, esta solução, por sua vez, é única? Pois, se o
sistema fosse incompatível ou, compatível, mas indeterminado a aplicação de um
algoritmo numérico não traria uma resposta para o problema inicial!
A resolução do sistema linear (7.), não fica, agora, limitada à resolução mecânica
– execução de um algoritmo numérico – para obtenção dos valores dos xi e, sim, pela
obtenção das diferentes (variáveis) temperaturas em pontos distintos da parede. Esta
resolução pode ser obtida considerando-se as seguintes “procedimentos matemáticos”:
Método da Substituição (abordado no Ensino Fundamental); Escalonamento Matricial
(abordado no Ensino Médio) ou, ainda, pela Regra de Cramer (também abordada no
Ensino Médio). Para um número pequeno de pontos (n < 6), o professor de Matemática
pode conduzir os alunos à busca da solução com lápis e papel.
Ao se considerar mais pontos do domínio de cálculo, o perfil de temperatura
obtido torna-se mais refinado, ou seja, é possível se detalhar melhor o comportamento da
variação da temperatura na parede. Neste momento, o professor de Física pode conduzir
uma discussão enfocando aspectos qualitativos desta variação de temperatura. Assim, o
aluno pode explorar com mais detalhes o fenômeno estudado.
No entanto, com o aumento do número de pontos (variáveis), o número de
equações também aumenta. Surge aqui a necessidade de um instrumento que possibilite a
automatização dos cálculos. Mas, é importante ressaltar que, neste momento, é
extremamente relevante a compreensão dos conceitos e modelos matemáticos envolvidos
para, então, recomendar a utilização da planilha eletrônica – disponível nos laboratórios de
informática.
Com a exploração do real significado da obtenção da solução do sistema linear de
grande porte obtido, propõe-se o emprego da planilha Calc e a Regra de Cramer. O cálculo
101
de determinantes, necessários para utilização desta regra, é obtido com a seleção de uma
célula
qualquer
na
planilha
eletrônica
e
inserção
da
“=matriz.determ({
linha
})”.
de
comando:
Os
termos
são os coeficientes das equações que
formam o sistema. A separação de colunas é feita com uso de ponto e vírgula e a separação
de linhas com a barra vertical.
Os aspectos qualitativos da distribuição de temperatura ao longo da parede,
abordados pelo professor de Física, podem ser enriquecidos com a construção do gráfico
xi × Ti – posição versus temperatura. Para isso, considera-se a ferramenta “gráfico”, que
permite a construção, passo a passo, na planilha eletrônica Calc.
Como exemplo, uma parede com espessura de 12cm é mantida aquecida em uma
das extremidades por uma fonte térmica (radiação solar), com temperatura constante igual
a 20ºC. Num determinado momento, a temperatura no lado oposto é igual a 15ºC. Para
representação da variação da temperatura no interior da parede, em cinco pontos
latitudinais, pode-se considerar o sistema:
2T1 − T2 = 20
⎧
⎪ − T + 2T − T = 0
⎪
1
2
3
⎨
⎪ − T2 + 2T3 − T4 = 0
⎪⎩
2T4 − T3 = 15
(8.)
Cuja solução possui a seguinte representação:
T
x
Figura 5: variação da temperatura em cinco pontos latitudinais.
102
Aqui, o professor de Matemática do Ensino Médio pode explorar o aspecto linear
apresentado pela solução, enfatizando a condição de alinhamento mediante o emprego de
determinantes. Após a verificação, pelos alunos, desta condição, pelo cálculo numérico e
representação gráfica, é possível conduzir uma discussão sobre a necessidade de mais
pontos para uma descrição mais detalhada do fenômeno em questão. Surge, então, uma
oportunidade de abordar o termo “generalização” – tornar geral – tão empregado na
Matemática do Ensino Superior.
Neste sentido, busca-se a relação matemática funcional entre os pontos da parede
e suas respectivas temperaturas. Pela abordagem dos conteúdos específicos Equação da
Reta e Condição de Alinhamento, é possível obter uma expressão semelhante à equação
(3.) – que corresponde à regra que determina uma relação funcional do primeiro grau.
Observa-se que, de maneira acessível ao aluno do Ensino Médio, é possível obter o perfil
de temperatura em quantos sejam necessários para uma análise detalhada do fenômeno
físico.
De posse dos resultados numéricos e gráficos, sugere-se uma análise com o
retorno ao problema inicial com o intuito de interpretar e validar a solução obtida. Esta
análise pode constituir um momento de aprendizagem colaborativa, ao contar com a
participação dos professores de Física e Matemática, e o envolvimento dos alunos na
apresentação de uma resposta que “interessa” a todos.
4. Considerações
O experimento numérico apresentado visa contribuir para um aprendizado
significativo do fenômeno de transferência de calor – condução – de forma acessível aos
alunos do Ensino Médio. Atividades desta natureza não são encontradas em livros
didáticos para Ensino Médio. Entretanto, a abordagem considerada não pressupõe o
domínio de ferramentas matemáticas mais elaboradas, desenvolvidas no Ensino Superior.
Para realização dos experimentos apresentados são necessárias habilidade em
resolução de sistemas de equações lineares – conteúdo do Ensino Básico – e utilização de
planilha eletrônica para o desenvolvimento dos cálculos e representações gráficas. Os
recursos necessários resumem-se ao laboratório de informática, acessível à maioria das
escolas, permitindo ao aluno sair da situação de receptor para executor ou construtor do
conhecimento.
103
Apesar do experimento ser adequado para as escolas que possuem laboratório de
informática, o bom andamento deste depende da metodologia empregada pelo professor.
Poderá ser riquíssimo em termos de conteúdo. Entretanto, para isso é necessário o uso de
uma abordagem que contemple questionamentos e argumentações por parte do professor,
objetivando instigar o aluno para a busca da solução.
Como sequência a este trabalho, em nível de iniciação científica, propõe-se esta
abordagem para os casos de Convecção e Radiação.
5. Referências
ALMEIDA, M. E. Informática e Formação de Professores. [online] Disponível na Internet
via WWW. URL: http://www.proinfo.mec.gov.br. Arquivo capturado em: 14 de agosto de
2008.
BRAGA FILHO, W. Transmissão de calor. São Paulo: Pioneira Thompson Learning,
2003.
DANTE, L. R. Didática da Resolução de Problemas de Matemática. 12. ed. São Paulo:
Ática, 2003.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Média e Tecnológica,
Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC; SEMTEC, 1999.
BURDEN, R. L.; FAIRES, J. D., Análise Numérica. São Paulo: Pioneira Thompson
Learning, 2003.
FILHO, R. L. B. Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf>, Acesso em: 15/07/2009.
INCROPERA, F. P.; DeWITT, D. P. Fundamentals of Heat and Mass Transfer. 4. ed. New
York: Wiley, 1996.
104
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação – SEED. Diretrizes curriculares de
matemática para a educação básica. Curitiba: SEED, 2006.
SCHMIDT, F. W.; HENDERSON R. E.; WOLGEMUTH, C. H. Introdução às Ciências
Térmicas. São Paulo: Edgard Blücher, 1996.
SCHOENFELD, A. H. Heurísticas na sala de aula. In: KRULIK. S.; REYS, R. E. A
resolução de problemas na matemática escolar. São Paulo: Atual, 1997.
SMITH, G. D. Numerical Solution of Partial Differential Equations – Finite Difference
Methods. 3. ed., New York: Claredon Press, 1985.
VERSTEEG, H. K., MALALASEKERA, W., An Introduction to Computational Fluid
Dynamic: The Finite Volume Method. England: Longman, 1995.
YOUSSEF, A. N.; SOARES, A.; FERNANDES, V. P. Matemática. São Paulo: Scipione,
2009. 488p.
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