Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 OS LIMITES E AS POSSIBILIDADES DA INTEPRETAÇÃO EM NIETSZCHE Roney dos Santos Madureira Profa. Dra. Vânia Dutra de Azeredo Faculdade de Filosofia Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas [email protected] Ética, política, religião, questões de fundamentação. Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas [email protected] Resumo: O Presente trabalho visa investigar como Nietzsche procede a partir de sua afirmação de que não existem fatos ou fundamentos, nem mesmo qualquer “em si oculto”. Com esta posição percebemos a necessidade do filósofo em expressar, que apenas a interpretação é a forma como acessamos o mundo. Analisaremos, também, como se dá essa intepretação, quais são seus limites, e qual é a relação entre o interprete/interpretação a partir da aniquilação dos fundamentos. Palavras-chave: INTEPRETAÇÃO, LIMITE, IMPULSOS. Área do Conhecimento: Ciências Humanas – Filosofia – FAPIC/Reitoria. 1. INTRODUÇÃO Concernente a Friedrich Nietzsche (1844 - 1900) afirmamos ser sua filosofia – emprestando as palavras de seu comentador Eugem Fink – o filósofo da destruição. Em princípio esta afirmação pode suscitar ao leitor não familiarizado, um estranhamento, pois, comumente entendemos sempre, que a filosofia permanece no campo da construção. Esta filosofia da destruição apresentada por Nietzsche se mostra sempre com dois lados. É na medida em que destrói praticamente todos os conceitos produzidos anteriormente no caminhar da filosofia que ele faz urgir ao mesmo tempo uma filosofia produzida a partir de seus moldes, ou seja, simultaneamente quando ocorre à destruição nasce à construção de outro pensar que se coloca no lugar daquele que foi aniquilado. Foi esse exercício que o filósofo conhecido por filosofar a marteladas fez na construção de seu pensamento, e que a nosso ver ganha ares de originalidade e pioneirismo justamente por romper com o ordinário. É desta forma também, que ele lança críticas veementes à religião (especialmente ao Cristianis- mo) à moral, à estética, ao nacionalismo e, sobretudo aos valores estabelecidos socialmente. O trabalho que apresentamos aqui em forma de artigo é uma busca de andar com o filósofo no sentido de compreender sua posição transvalorada acerca do que ele mesmo denomina Interpretação. E, a nosso ver, é justamente por instituir uma interpretação sobre a interpretação a partir de valores não pensados que encontramos no trabalho de Nietzsche uma fonte riquíssima ainda não tão bem explorada quando falamos de “o se posicionar do homem nos domínios do mundo”. É na anulação das noções de fato e de fundamento ou de qualquer “em si oculto”, que Nietzsche pressupõe apenas a interpretação como possibilidade de perceber o mundo, cabe, portanto a nós –como sugere o filósofo – fazer uma caminhada com sua filosofia a fim de compreender suas reais intenções. Esse caminhar, em outras palavras do mesmo filósofo “ruminar”, pretende prioritariamente entender o que Nietzsche afirma ser fato, interpretação, aniquilação do fato e do fundamento e a permanência exclusiva da interpretação a partir das postulações de como o conhecimento se dá. É precisamente na dualidade entre efetividade e transcendência, que se alicerçava a construção do pensamento que vai desde Platão até Hegel. Alguns, no entanto, tiverem destaque na apresentação de suas teorias, mas nunca pensando poder escapar a posição sujeito/objeto ou objeto/sujeito. Descartes, apresenta sua filosofia e especialmente no tocante a teoria do conhecimento ganha uma visão nova, a racionalista. Também lança a dúvida metódica, e através desta conclui que só o pensamento é capaz de nos oferecer o saber certo, para tal definição Descartes segue Platão e suas concepções acerca das ideias que fundamentou todas as concepções da teoria do conhecimento no modernismo chamadas de racionalistas. Por sua vez, o próprio Platão faz do mundo uma divisão com apenas duas possibilidades, a sensível e a supra-sensível. Com seu famoso mito da caverna apresentado em seu mais conhecido livro “A Republica”, o discípulo de Sócrates nos faz saber Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 de forma alegórica que há um mundo onde estão às coisas que vemos ou sentimos, ou seja, o mundo sensível, e neste mundo a verdade são cópias de um mundo onde estão as formas originais e perfeitas, este é o supra-sensível. Sendo assim o que acessamos diretamente não é a forma ideal, e sim, variantes daquelas formas perfeitas que estão exclusivamente no mundo das ideias. etzsche faz se necessário adentrarmos no projeto fisiológico do filósofo, pois é de grande importância compreender o funcionamento deste processo que está no orgânico. Nas palavras de Nietzsche; “Quem interpreta? – Nossos impulsos” , com esta afirmação o homem é a soma destes impulsos que se digladiam constantemente e eles manifestam-se em nossas estimativas de valor. Ora, quando pensamos que Nietzsche afirma a inexistência do fato, ou objeto, concluímos que o filósofo alemão anula em certo sentido grande parte do conceito estabelecido na historia da filosofia. Permanece 1 assim o sujeito , pois esse é o que interpreta, e permanece também a relação entre o sujeito que interpreta e a interpretação. Essa permanência entre o sujeito e a interpretação é definitiva e ultima, não restando nada para o filósofo se não investigar essa efetividade. Mas como se dá essa interpretação? Como se perdura a relação interprete/intepretação? Precisamos considerar que Nietzsche em momento algum afirma a inexistência do objeto, o que ele afirma é que como estes objetos ou fundamentos nos são apresentados já são resultantes, ou seja, a forma como tudo nos é percebido já é intepretação. É na percepção que introduzimos a concepção de Nietzsche sobre os impulsos, e essa concepção a nosso ver é fundamental para continuarmos a descrever a ideia do filósofo neste trabalho. Todas as nossas relações de querer sentir e pensar são impulsos, ou seja, esses impulsos são nossas necessidades, e todos somos dotadas deles, desta forma podemos dizer que são eles que configuram a possibilidade de interpretação. “são nossas necessidades que interpretam o mundo: nossos impulsos e seus prós e contras. Cada Impulso é uma espécie de despotismo, cada um tem sua perspectiva, que ele desejaria impor como norma a todos os demais impulsos” [1] Notamos que até este momento já podemos compreender que a intepretação do mundo se dá exclusivamente por meio de nossos impulsos fisiológicos, assim como a grande reformulação empreendida por Nietzsche no tocante à historia do conhecimento e à percepção do homem acerca da realidade. Investigamos agora como o filósofo define o fato e o fundamento, e como se dá a aniquilação destes. Podemos afirmar como fato o objeto e como fundamento o mesmo que os filósofos modernos entendiam por aquilo que está estabelecido, está marcado, já postulado. Para a filosofia moderna o fato existe, o que se pretendia investigar é como o percebíamos. Nietzsche aniquila esta noção. Para ele o fato ou o fundamento não existem, mas com essa afirmação ele não pressupõe exatamente a não existência de tudo o que vemos ou sentimos, pois se assim fosse de certa forma – na opinião de alguns - ele estaria em uma posição de falta de critérios para avaliar, de falta de um sentido ou até mesmo colocando um direcionamento do homem ao nada. Para Nietzsche qualquer sentido já é uma forma avaliativa, uma interpretação. O filósofo afirma que o valor do mundo está em nossa interpretação, e que estas interpretações são as avaliações perspectivas por meio das quais permanecemos na vida, isto é, na vontade de potencia, e que o homem deve carregar em si a possibilidade de interpretar mais estreitamente a fim de perceber novos horizontes e novas possibilidades. Observemos que Nietzsche afirma serem nossos impulsos não só os responsáveis por interpretar, como também estimulados a interpretar a partir da constante guerra em que cada um dentro do sistema quer fazer perpetuar seu despotismo. A palavra sistema a nosso ver é a que melhor retrata essa junção de impulsos que funcionam com uma ordem. No livro “Nietzsche e a aurora de uma nova ética”, a comentadora Vania de Azeredo, acrescenta que para encontramos uma solução para a intepretação em Ni1 Nietzsche entende por sujeito uma estrutura social de muitas almas. Ainda sobre a anulação de fatos e fundamentos Nietzsche recusa a dar uma resposta ultima no tocante à moral, à politica e à estética. Nesse sentido nossas perspectivas é que nos permite interpretar. O positivismo representa um grande movimento que dominou boa parte da cultura europeia. Com inicio aproximado em 1840, e fim até quase o inicio da primeira guerra mundial, os membros desta doutrina afirmavam haver exclusivamente fatos para a explicação de tudo, inclusive da sociedade. Ao que Nietzsche responde sobre esta afirmação. “Contra o positivismo, que permanece no fenômeno: ‘só há fatos’, diria eu: não, justamente não há fatos, apenas interpretações. [2] Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 Quando se dirigir ao positivismo, Nietzsche ainda afirma que se houvesse uma natureza humana que desse conta da significação dos fatos e da realidade, ela então forneceria todas as explicações, mas o valor do mundo está em nossa interpretação, não podemos explicá-los, mas adentrá-los a partir de vários ângulos, vê-los sob diversos enfoques, ao analisa-los “perspectivá-los”. Ao avaliar o positivismo, por um momento pensou que as ciências poderiam ultrapassar a metafisica, mas em seguida constata que no positivismo o fato é sua ultima posição quando afirma que o sensível é o verdadeiro. Esse primeiro momento que nos referimos é o do quando Nietzsche escreveu Humano demasiado humano, aqui o filósofo flerta com a doutrina positivista. Contudo, quando da escrita de Assim Falou Zaratustra, anos mais tarde, Nietszche manifesta-se contrário, e lança sua crítica a doutrina. Percebemos, portanto que para Nietzsche a única forma de interpretar é pelos impulsos, e se segue a afirmação que todo o sentir, querer e pensar são relações de impulsos entre si. São também estes impulsos que manifestam as nossas estimativas de valor, ou seja, para o filósofo o homem é um estimador das coisas, e é nessa estimação que atribuímos as coisas os seus valores. Assim, se nossa única possiblidade e esta, ou seja, a de ver de um modo perspectivo, sempre também a única forma de acessarmos o mundo será o da perspectiva, ele nunca será verdadeira, sempre será uma intepretação pessoal, ou resultado de nossa própria avaliação. Ora, assim tudo o que conhecemos, é interpretação, e consequentemente, ela já é produto, ou resultante. Na forma como eu vejo, avalio ou estimo só o faço com estes resultados últimos. Esta definição é para todos os objetos, fatos, etc... não há, nada em nossa mente que não seja intepretação. Vejamos o que Nietzsche afirma inclusive acerca da moral no livro além do bem e Mal, paragrafo 20: “ Não existem fenômenos morais, mas somente uma intepretação moral dos fenômenos”, aqui é a interpretação quem ganha novamente e sempre a conotação de produto. Nossas intepretações constituem a efetividade, assim não há algo a ser interpretado, pois tudo já é interpretação. Percebemos então que não há um estagio final nessa relação entre interprete/intepretação a ser atingido. Podemos chamar este ato interpretativo como ilusão. Mas chamamos o ato interpretativo de ilusão não por não corresponder a uma verdade, mas sim porque a ilusão já é resultante, e é a única e exclusiva forma de avaliarmos o mundo. Assim, a verdade é uma verdade para mim, ou seja, é uma verdade para o interprete, para quem interpreta. Só atingimos esta verdade com a intepretação, ficando a questão de fato, fundamento ou signo no campo da inexistência.2 No mundo orgânico o que temos é um assenhorar-se e este assenhorar-se é um interpretar. Entendemos que Nietzsche afirma aqui que com nossos impulsos orgânicos, assenhoramo-nos do que é nos apresentado, e esse assenhorar em primeiro e única instancia já é uma intepretação. Ao falarmos de intepretação há de considerar também a intepretação feita sobre os textos Nietzschianos. Todo material que nos chegou do grande filosófo pode ter passado e ainda passar por uma infinidade de intepretações, de leituras e releituras. Consideramos que em cada caso ele é interpretado a partir da realidade do sujeito que o lê. Nietzsche propõe um decifrar de seu trabalho, e sugere uma cumplicidade do leitor com seu texto. É nesta cumplicidade que está imbuída a possibilidade de interpretação mais próxima da efetividade CONCLUSÃO Concluímos com a afirmação de que para o filósofo o mundo nunca é ou será verdadeiro, mas sempre resultado de nossa intepretação, ou seja, uma imposição de nossa intepretação. Toda a relação que põe em relação com qualquer ato de conhecimento que se dá é ato interpretativo, sendo ele a única forma de conhecermos. Interpretar e conhecer são a mesma coisa, e para o filósofo quem interpreta são nossos impulsos orgânicos. A inusitada forma de perceber a intepretação do mundo como forma exclusiva de capta-lo a nosso ver, foi um dos exercícios de maior valor na filosofia Nietzschiana, é aqui que como dissemos nos inicio do texto, sua filosofia de um lado destruidora de conceitos, de outro, construtora de concepções filosóficas. 2 É importante destacarmos que Nietzsche não é um relativista e que essa verdade, sendo uma verdade individual a seu ver não está no campo da relatividade. Para o filósofo há um valor estabelecido para a vida: ele escreve assim no “Crepúsculo dos ídolos”, 3. E preciso estender ao máximo as mãos e fazer a tentativa de apreender essa espantosa finesse (Finura), a de que o valor da vida não pode ser estimado. Não por um vivente, pois ele é parte interessada, até mesmo objeto da disputa, e não juiz; e não por um morto, por um outro motivo. – Que um filósofo enxerga no valor da vida um problema é até mesmo uma objeção contra ele, uma interrogação quanto à sua sabedoria, uma não-sabedoria. – como? Todos esses grandes sábios – eles não teriam sido apenas decadents, não teriam sido nem mesmo sábios? – Mas volto ao problema de Sócrates. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica – ISSN 1982-0178 Anais do II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação – ISSN 2237-0420 25 e 26 de setembro de 2012 REFERÊNCIAS [1] Nietzsche - Obras Incompletas, coleção “Os Pensadores”, tradução de Rubens Rodrigues Torres Filho, São Paulo, Abril Cultural, 1978. [2] IDEM,