1
ASPECTOS CONTROVERTIDOS DO ITCMD1
__________________________________________________________________________________
Cristiny Mroczkoski Rocha2
SUMÁRIO: Resumo; Abstract; Résumé; 1. Introdução; 2. Aspectos
fundamentais; 2.1. ITCMD; 2.1.1. Competência e Função; 2.1.2 Fato
Gerador; 2.1.3 Contribuintes e Responsáveis; 2.1.4 Base de Cálculo e
Alíquota; 2.2 Princípios Jurídicos da Tributação diretamente envolvidos;
2.2.1 Princípio da Capacidade Contributiva; 2.2.2 Princípio da Legalidade
Tributária; 3 Aspectos Controvertidos do ITCMD; 3.1 Problemática quanto à
progressão de alíquota; 3.1.1 Posicionamento jurisprudencial estadual; 3.2
Problemática quanto ao recolhimento do imposto no caso de doação; 3.2.1
A legislação estadual e a falta de lei complementar; 3.2.2 Incidência do
ITCMD nas doações com encargo ou sem encargo; 3.2.3 Incidência do
ITCMD nas separações conjugais e divórcio; 3.3. Tributação da herança:
possibilidade de incidência do IR e o bis in idem; 4 Recolhimento do
ITCMD no Estado do Rio Grande do Sul; 4.1 Imunidade, não-incidência e
isenção do ITCMD; 4.2 Recolhimento via judicial nos casos de inventário e
arrolamento; 4.3 Recolhimento do ITCMD por inventário na via
extrajudicial; 4.4 Recolhimento do ITCMD em escrituras públicas ou
processos judiciais de outros estados; 5 Conclusão.
RESUMO
O presente estudo visa analisar o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação
(ITCMD) no sistema jurídico brasileiro, buscando clarear sua incidência e debater sobre os aspectos
controvertidos existentes, considerando que este imposto carece de resoluções na esfera legislativa e,
conseqüentemente, no judiciário, cujas lacunas dão início a diversos posicionamentos doutrinários
conflitantes e diversas aventuras jurídicas dos contribuintes.
ABSTRACT
This study aims to analyze the tax of transmissions causa mortis and donation (ITCMD) in the
Brazilian legal system, seeking to clarify their incidence and discuss the existing controversial aspects,
considering that the tax needs resolutions in the legislative sphere and therefore, in the judiciary, that
giving rise to different doctrinal positions and several adventures of the taxpayers.
RÉSUMÉ
Cette étude vise à analyser l' impôt sur les transmissions causa mortis et de donation (ITCMD)
dans le système juridique brésilien, cherchant à clarifier leur incidence et discuter des aspects
controversés existants, considérant que cette taxe besoin des resolutions dans la sphère législative et,
par conséquent, dans le système judiciaire, qui donnent lieu des positions doctrinales différentes et
plusieurs aventures juridiques des contribuables.
1
Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado como requisito parcial para obtenção do grau
de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul -PUCRS. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora, composta pelo orientador, Prof.
Francisco José Moesch, Prof. Wremyr Scliar e Prof. Plínio Saraiva Melgare, em 20 de junho de 2011.
2
Autora: Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
– PUCRS. Contato: [email protected]
2
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objeto de estudo o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação
(ITCMD), que é um dos impostos mais antigos na história da tributação, possuindo relatos da sua
exigência desde Roma, sob a forma de vigésima sobre heranças e legados. No Brasil havia a décima
da herança ou legado (Alvará de 17.06.1809) e, a partir de 1891, coube aos Estados a cobrança do
imposto causa mortis.3
Iniciaremos o trabalho discorrendo sobre os aspectos gerais desse imposto, os quais
entendemos como fundamentais para o entendimento do tratamento atualmente dispensado pelo Fisco
Estadual, bem como no intuito de facilitar a compreensão das suas hipóteses de incidência. Também,
abordar-se-á, sobre as temáticas controversas existentes, passando por definição de conceitos,
características e posicionamentos doutrinários conflitantes.
A análise das temáticas mais atuais que envolvem o ITCMD, debatidas pelos doutrinadores e
na esfera judicial, são de suma relevância, em vista da imensidade de contribuintes alvo de sua
incidência, e, principalmente, por sua relevância jurídica, sendo que, para tanto, buscamos traçar o
liame com os princípios jurídicos da tributação - que se tornam os pilares para os posicionamentos a
respeito das controvérsias.
Por derradeiro abordaremos as hipóteses de isenção, não-incidência e imunidade previstas na
Lei 8.821/89 e na CF/88, bem como a análise da forma de recolhimento do imposto quando efetuado
inventário judicial, extrajudicial e processos judiciais de outros Estados.
2 ASPECTOS FUNDAMENTAIS
2.1 ITCMD
2.1.1 Competência e função
O âmbito do imposto sobre transmissão causa mortis e doação, doravante simplesmente
denominado ITCMD, está disposto no art. 155, I, da CF 88, que reserva aos Estados e ao Distrito
Federal a competência para a sua instituição.
A problemática reside em saber qual o Estado competente para a cobrança do tributo, questão
esta que pode ser sanada no §1º do art. 155 da CF 88, que estabelece: a) relativamente aos bens
imóveis e respectivos direitos, o imposto pertence ao Estado da situação do bem ou ao Distrito
Federal, se neste o bem estiver situado; b) relativamente aos bens móveis, títulos e créditos, o imposto
pertence ao ente público (Estado ou Distrito Federal) onde se processar o inventário ou arrolamento,
ou tiver domicílio o doador.
Porém, acerca da competência sobre as transferências de ações, mister repisar o entendimento
jurisprudencial. Preconiza a Súmula nº 435 do STF que “O imposto de transmissão causa mortis pela
transferência de ações é devido ao Estado em que tem sede a companhia”.
Hugo de Brito Machado4 elucida também que, nos casos em que o doador tem domicílio ou
residência no exterior, e, quando o autor da herança possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve
seu inventário processado no exterior, será a cobrança regulada em lei complementar, o que se torna
uma das problemáticas atuais, já que faltante a referida lei reguladora, o que leva alguns doutrinadores,
tais como o referido jurista5, lecionarem que esse imposto não poderia ser instituído, força do disposto
no art. 146, inciso III, da CF.
3
4
5
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 344.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 376.
MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2007. p. 400.
3
No que tange a função, o ITCMD é um imposto fiscal, ou seja, que busca carrear recursos para
os Estados e o Distrito Federal. Porém, não se pode excluir a hipótese de que possa ter também função
extrafiscal, pois neste tributo ela consistirá no desestimula ao acúmulo de riquezas, ou seja, na
concentração da renda.
Convém lembrar que é neste ponto que se insere a progressão de alíquota no tributo, a qual
trataremos mais adiante.
2.1.2 Fato gerador
Preliminarmente, importa ressaltar que o Código Tributário Nacional adotou a denominação
de fato gerador para caracterizar a situação de fato ou a situação jurídica que, ocorrendo, determina a
incidência de determinado tributo.
Luiz Emygdio F. da Rosa Junior, citando Amílcar de Araújo Falcão, conceitua:
O fato gerador constitui o dado essencial para a distinção dos tributos in genere
(imposto, taxa e contribuição de melhoria) e in specie (cada espécie de imposto),
pois, sendo aquela circunstância de fato em decorrência da qual nasce um
tributo, constitui o aspecto objetivo da relação jurídico – tributária.6
Adentrando-se no mérito do ITCMD, também se faz cogente tecer comentários sobre o
significado do vocábulo transmissão.
Eduardo Sabbag7 elucida que transmissão é a passagem jurídica da propriedade ou de bens e
direitos de uma pessoa para outra. Ocorre em caráter não oneroso, seja pela ocorrência da morte
(transmissão causa mortis), ou doação (ato de liberalidade).
No caso da transmissão causa mortis, Sasha Calmon Navarro Coêlho 8 disserta que “o fato
jurígeno deste imposto é o acréscimo patrimonial do herdeiro, do legatário, do meeiro e do cessionário
(quinhões ou meações)”.
Quando ao momento da ocorrência, Marilene Talarico Martins Rodrigues 9 complementa que o
fato gerador do imposto ocorre na abertura da sucessão, que se dá com a morte de determinada pessoa,
à qual pertencia os bens.
Tem-se considerado a data do óbito do autor da herança como fato gerador, pois com a sua
ocorrência abre-se a sucessão, transmitindo-se desde logo o domínio e a posse da herança aos
herdeiros legítimos e testamentários, preceito encontrado na lei civil, art. 1784 do CC.
Nesse ponto, Hugo de Brito Machado10 afirma que:
A morte opera automaticamente a transmissão da propriedade de todos os bens
que a pessoa natural possui. Seja por força de lei, simplesmente, seja por força
de ato de última vontade do autor da herança. A formalização dessa transmissão
de propriedade ordinariamente ocorre mediante o processo de inventário, e no
6
ROSA JUNIOR, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. Rio de Janeiro:
Renovar, 2005. p. 210.
7
SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1017.
8
COELHO, Sasha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p.
458.
9
RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. Artigos comentados. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva. (Org.).
Comentários ao código tributário nacional. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006. (arts. 1º a 95, v. 1).
10
MACHADO, 2010, p. 378.
4
âmbito deste o imposto é lançado pela autoridade competente e pago pelos
interessados.
Convém salientar que por esse motivo deve ser aplicada a alíquota vigente no momento da
abertura da sucessão (STF, Súmula 112), já que a partilha tem natureza meramente declaratória e não
atributiva da transmissão da propriedade.
Com efeito, há neste imposto uma pluralidade de sujeitos passivos, já que poderão haver
diversos herdeiros e legatários, razão pela qual também ocorrerão tantos fatos geradores quantos forem
estes (artigo 35 do CTN).
Nesse sentido, conforme lição de Luiz Emygdio F. da Rosa Junior 11, citando José Jayme de
Macêdo Oliveira, não importa a quantidade de bens deixados pelo de cujus ou objeto de doação para a
caracterização do fato gerador, mas sim a quantidade de beneficiários, herdeiros, legatários ou
donatários. E o mencionado jurista explicita o seu pensamento: assim, se o monte é formado por
apenas um imóvel, sendo três os herdeiros, a transmissão, para estes, de cada uma das três partes de
dito bem caracteriza distintos fatos geradores, com o que os três herdeiros obrigam-se a recolher o
ITCMD calculado sobre o valor de seu quinhão hereditário.
Mister destacar que na nossa lei estadual, a ocorrência do fato gerador do ITCMD está
disposta no art. 4º, que preconiza: na transmissão "causa mortis", ocorrerá na data da abertura da
sucessão legítima ou testamentária, mesmo nos casos de sucessão provisória e na instituição de
fideicomisso e de usufruto e a doação a qualquer título; b) se dará na data da morte do fiduciário, na
substituição de fideicomisso; c) na data da ocorrência do fato jurídico, nos casos não previstos nas
alíneas "a" e "b".
Ademais, sobre o tema, importa transcrever os posicionamentos jurisprudenciais que indicam
vetores na estipulação dimensional do fato gerador em estudo:
É legítima a incidência do Imposto de Transmissão "causa mortis" no Inventário
por morte presumida. (STF, Súmula 331)
Calcula-se o Imposto de Transmissão "causa mortis" sobre o saldo credor da
promessa de compra e venda de imóvel, no momento da abertura da sucessão do
promitente vendedor. (STF, Súmula 590)
Quanto ao disposto na supra-citada Súmula 590 do STF, cabe dizer que, sem dúvida alguma, a
incidência sobre o saldo credor dos contratos de promessa de compra e venda configura-se mais justa,
visto que parte do preço já foi recebido pelo de cujus, integrando-se aos bens a serem partilhados. O
imposto, portanto, somente incide sobre o benefício econômico deixado aos herdeiros, ou seja, o
crédito porventura existente.
Nesse passo, imperioso enfatizar que a jurisprudência do STJ assentou 12 que, no que concerne
à incidência do ITCMD sobre a promessa de compra e venda, somente ocorrerá quando o
compromisso tiver sido registrado, já que somente assim se transfere o domínio.
11
12
ROSA JUNIOR, 2005, p. 948.
TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS - IMÓVEL ALIENADO PELO DE
CUJUS MEDIANTE PROMESSA DE COMPRA E VENDA.
1. No direito brasileiro somente a transcrição transfere juridicamente a propriedade. A promessa particular de
compra e venda não transfere o domínio senão quando devidamente registrada.
2. O imposto de transmissão mortis causa, entretanto, findo o enfoque eminentemente civil, grava o benefício
econômico deixado aos herdeiros, guiando-se pelo critério do fenômeno econômico.
3. Imóvel vendido por compromisso de compra e venda não registrado, com pagamento do preço fixado pelo
de cujus, não gera imposto de transmissão mortis causa.
5
Porém, também se faz a ressalva à hipótese na qual a promessa de compra e venda realizada
anteriormente à morte do inventariado, havendo o efetivo pagamento do preço pelo adquirente, ou
seja, há a tradição do bem. Neste caso, o nosso TJRS já decidiu que não há a incidência do ITCMD, e
sim o imposto a ser pago será o ITBI, uma vez que o imóvel não mais pertencia ao de cujus à data de
seu falecimento. Segue ementa da decisão:
APELAÇÃO CÍVEL. ALVARÁ. TRANSFERÊNCIA DE BEM IMÓVEL
PERANTE O REGISTRO IMOBILIÁRIO. DESNECESSIDADE DE
INVENTÁRIO. 1. A matéria versa não sobre promessa de compra e veda, mas
sim sobre a necessidade ou não da abertura de inventário para regularizar a
venda de imóvel, já realizada através de contrato de promessa de compra e
venda, razão pela qual é deste 4º Grupo Cível a competência para apreciar o
recurso. 2. Tendo a alienação do imóvel em questão sido realizada anteriormente
ao falecimento do de cujus, por contrato de promessa de compra e venda
formalizado por escritura pública, e tendo o adquirente efetuado o pagamento do
saldo remanescente perante o agente financeiro ao qual hipotecado o bem, nada
obsta que seja, por meio de alvará, autorizado o registro definitivo da
escrituração do imóvel em nome do comprador. De igual sorte, o imposto
incidente sobre a transferência do bem não será o ITCMD, mas sim o ITBI, a ser
recolhido quando da emissão das guias respectivas pelo registro de imóveis, o
qual deverá onerar o adquirente, e não os sucessores do alienante. Apelo
provido. (Apelação Cível Nº 70028385268, Oitava Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: José Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em
04/03/2009).13
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. VENDA DE IMÓVEL. ITBI.
DUPLA INCIDÊNCIA. DESCABIMENTO. INCIDÊNCIA DE ITCD. Quando
um bem imóvel do espólio é vendido, o comprador paga o ITBI, razão pela qual
é descabida a pretensão de cobrar dos herdeiros, e por uma segunda vez, o
mesmo tributo. Dos herdeiros é passível de cobrança apenas o ITCD, incidente
sobre o fato gerador “transmissão causa mortis”, e a ser calculado com base no
valor do espólio e no quinhão que haverá de ser transferido a cada um deles.
AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. EM MONOCRÁTICA. (Agravo de
Instrumento Nº 70027653781, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Rui Portanova, Julgado em 25/11/2008).14
No tocante à hipótese de renúncia à herança ou legado, é certo que não se pode considerar a
transferência do bem ou direito renunciado como fato gerador do imposto, porque ao abdicar do que
lhe caberia, o sucessor também está abdicando da condição de herdeiro, impedindo que transmissão
que havia se operado com a morte do autor da herança.
Nesse sentido importa transcrever o disposto no art. 6º, II, da Lei 8.821/89:
Art. 6º - O imposto não incide:
[...]
13
14
4. Recurso especial provido.
(REsp 177.453/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 03/04/2001, DJ 27/08/2001, p.
300)
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Apelação cível nº 70028385268. Oitava Câmara Cível. Relator:
José Ataídes Siqueira Trindade. Julgado em 04/03/2009, DJ 17/03/2009. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>.
Acesso em: 28 mar. 2011.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de instrumento nº 70027653781. Oitava Câmara Cível.
Relator: RUI PORTANOVA. Julgado em 25/11/2008, DJ 01/12/2008. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>.
Acesso em: 28 mar. 2011.
6
II - na renúncia à herança ou legado, desde que feita sem ressalvas, em benefício
do monte e não tenha o renunciante praticado qualquer ato que demonstre
aceitação;
Acompanhando esse entendimento, citamos posicionamentos jurisprudenciais do Egrégio
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SOBREPARTILHA. RENÚNCIA
ADJUDICATIVA. NÃO INCIDÊNCIA DE ITCD. Tendo os herdeiros/filhos
procedido a renúncia adjudicativa do bem objeto de sobrepartilha, em favor do
monte mor, e não de alguém particularmente, não incide o ITCD. Precedentes
doutrinários. Tendo tramitado o inventário sob o abrigo da AJG, não há porque
não se conceder o benefício na ação de sobrepartilha, que envolve bem de valor
inferior. Agravo de instrumento provido. (Agravo de Instrumento Nº
70033266206, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José
Ataídes Siqueira Trindade, Julgado em 28/01/2010).15
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. SUCESSÕES.
INVENTÁRIO. RENÚNCIA ABDICATIVA. DESCABIMENTO DA
INCIDÊNCIA DE ITCD. Na renúncia abdicativa, em favor do monte, não há
transferência de bens ou transmissão de quinhões entre herdeiros, tampouco
cessão de direitos, visto que não há domínio ou titularidade pelo renunciante, já
que a renúncia pura e simples torna sem efeito o fenômeno da saisine (art. 1.784
do CC). Não havendo transmissão de patrimônio, não incide o ITCD. Art. 6º da
Lei Estadual nº 8.827/89. Precedentes desta Corte e do STJ. AGRAVO DE
INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70029484409, Sétima
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella
Villarinho, Julgado em 08/07/2009).16
Atente-se, porém, que o não recolhimento do tributo somente se dará quando a renúncia
ocorrer em benefício do monte, diferentemente do que ocorre quando o renunciante a faz em benefício
de determinada pessoa, que em conseqüência da mesma vem a receber o quinhão que pertenceria ao
renunciante. Neste caso, não podemos dizer apenas que ocorreu o impedimento da transmissão do de
cujus, mas trata-se de cristalina hipótese de doação do quinhão hereditário, motivo pela qual correta a
incidência do imposto.
Corroborando com o quanto explanado, transcrevemos os posicionamentos do TJRS:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. RENÚNCIA
ABDICATIVA. CESSÃO. A renúncia realizada nos autos, por favorecer pessoa
determinada, com a efetiva transferência patrimonial, é, na realidade, cessão de
direitos, razão pela qual se mostra correta a incidência de ITCD. Agravo
desprovido. (Agravo de Instrumento Nº 70023206477, Sétima Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em
18/06/2008).17
15
16
17
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de instrumento nº70033266206. Oitava Câmara Cível.
Relator: José Ataídes Siqueira Trindade. Julgado em 28/01/2010, DJ 05/02/2010. Disponível em:
<www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 28 mar. 2011.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de instrumento nº 70029484409. Sétima Câmara Cível.
Relator: André Luiz Planella Villarinho. Julgado em 08/07/2009, DJ 17/07/2009. Disponível em
<www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 28 mar. 2011.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de instrumento nº 70023206477. Sétima Câmara Cível.
Relator: Maria Berenice Dias. Julgado em 18/06/2008, DJ 26/06/2008. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>.
Acesso em: 28 mar. 2011.
7
Passando à análise do que concerne a doação, temos o seu conceito fornecido pelo Código
Civil Brasileiro, no artigo 538, que considera “doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade,
transfere seu patrimônio, bens ou vantagens para o de outra”. Incluem-se também as doações efetuadas
com encargos ou ônus, operando tanto sobre bens imóveis quanto móveis.
Destarte, no caso do imposto em estudo, o fato gerador ocorrerá quando da transferência dos
bens, sendo que, no especial de bens imóveis – o solo e tudo quanto se incorporar natural ou
artificialmente - se dará quando do registro da escritura de doação no respectivo Registro de Imóveis.
Ressalta-se, por fim, que o imposto não incide sobre a doação de bem móvel sobre o qual
incida ICMS – concessão de táxi, assim como também se excluem as transmissões de propriedade de
bens por ato oneroso entre vivos, as quais há a incidência do ITBI
2.1.3 Contribuintes e responsáveis
Os contribuintes do ITCMD são: no caso das transmissões “causa mortis”, o herdeiro ou o
legatário; nas doações, qualquer das partes atinentes à mesma, na forma da lei.
Impende ressaltar que não é possível determinar-se o contribuinte a partir de dispositivo
constitucional, restando aos Estados a liberdade para defini-lo.
Portanto, elucidamos sobre o tratamento dado no nosso Estado, que é o seguinte 18: a) nas
doações: caberá o recolhimento do imposto ao o doador, quando domiciliado ou residente no país; ao
donatário, quando o doador não for domiciliado ou residente no país; ao nu-proprietário, na extinção
do usufruto por morte do usufrutuário; ao beneficiário: na morte de um dos usufrutuários, em se
tratando de usufruto simultâneo em que tenha sido estipulado o direito de acrescer ao usufrutuário
sobrevivente ou na renúncia de usufruto, assim como na extinção de direito de uso, de habitação e de
servidões; b) nas transmissões "causa mortis", será contribuinte o beneficiário ou recebedor do bem ou
direito transmitido.
2.1.4 Base de cálculo e alíquota
É importante tratar da base de cálculo e alíquota conjuntamente, tendo em vista a estreita
ligação entre esses dois institutos, pois é a partir da daquele que se definirá o quantum debeatur e a
alíquota aplicável.
A base de cálculo é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos (art. 35 do CTN), sendo
certo que se utiliza o valor dos bens na data da avaliação realizada pela Receita Estadual (Súmula 113
do STF), bem como a alíquota vigente na data da abertura da sucessão (Súmula 112 do STF).
Nesse contexto, Leandro Paulsen19 esclarece sobre a base de cálculo:
É o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou
em Unidades Fiscais do Estado (Ufesp, em São Paulo), considerando-se o valor
de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão, ou realização do
ato ou contrato de doação.
Esta questão é de suma relevância, uma vez que, dependendo do(s) objeto(s) alvo(s) do
imposto, sejam bens imóveis, móveis ou direitos, há particularidades que devem ser atentadas.
18
19
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Fazenda. ITCMD. Disponível em: <http://www.sefaz.rs.gov.br/
Site/MontaDuvidas.aspx?al=l_itcd_faq>. Acesso em: 21 mar. 2011.
PAULSEN, Leandro. Impostos federais, estaduais e municipais. 4. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2008. p. 205.
8
Em regra geral, quando se trata de bens imóveis, aplica-se para a base de cálculo do “causa
mortis” o valor que serviu de base para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e
Territorial Urbana - IPTU ou sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR, sendo que isso não exclui o
direito dos interessados em requererem a avaliação judicial.
Os valores de bens móveis e seus direitos, como ações, títulos, créditos e etc., terão seu
montante determinado na data de sua transmissão ou ato translativo, pelo valor corrente no mercado.
No caso de ações, deve-se considerar o valor médio de sua cotação na Bolsa de Valores, na data da sua
transmissão. Porém, caso seja impossível a realização dessa cotação, considerar-se-á aquele preço
ocorrido até 180 (cento e oitenta) dias imediatamente anteriores, considerados a partir da
transmissão.20
Para uma melhor compreensão do que será utilizado como base de cálculo nas transmissões
“causa mortis”, importante destacar ainda o significado de monte- mor. Define De Plácido e Silva:
Monte é o acervo hereditário. Diz-se monte-mor a este acervo mostrado em sua
totalidade, segundo a arrecadação, quando ainda nada se fez para livrá-lo dos
encargos, que devem ser por ele suportados. Em oposição, monte-mor líquido já
será o acervo hereditário, quando todas as despesas foram atendidas e todas as
dívidas pagas, restando, assim, uma totalidade de bens livres de quaisquer
espécies de ônus ou encargos.
O monte líquido é o que será objeto da partilha, sendo certo que formará outros tantos montes
quantos sejam os herdeiros ou legatários, razão pela qual também se fala em quinhão hereditário.
Nesse sentido, portanto, está a se dizer que as bases de cálculo poderão ser distintas, e, sendo este
imposto progressivo, a determinação da alíquota aplicável deverá ocorrer em razão de cada base de
cálculo.
Ademais, quanto às alíquotas e sua progressividade, vale dizer que há de ser respeitado o teto
máximo fixado pelo Senado Federal, que é de 8%, conforme Resolução nº 9, de 05.05.92. Tal regra
encontra-se no art. 2º da Resolução, que reza que “as alíquotas dos impostos, fixadas em lei estadual,
poderão ser progressivas em função do quinhão que cada herdeiro efetivamente receber, nos termos da
Constituição Federal”. Salvo esta limitação, prevalece a liberdade dos Estados e do Distrito Federal
para estabelecer as alíquotas aplicáveis.
A utilização da progressividade é defendida como forma de realização do princípio da
capacidade contributiva, porém ainda há controvérsias quanto a sua constitucionalidade, tema que
ainda está sendo julgado no STF21, com, atualmente, três votos a favor da constitucionalidade da
progressão versus um voto contra, abrindo margem a grandes discussões sobre a legalidade da forma
de recolhimento imposta no nosso Estado.
Neste especial, cabe ressaltar que o nosso Estado também fixou a alíquota progressiva, que é
aplicada aos fatos geradores anteriores a 31/12/2009, e que gerou inúmeras ações judiciais, nas quais
os requerentes buscavam o recolhimento a menor, ao fundamento da falta de lei complementar a
instituir tal progressividade em um imposto real, ou seja, que é determinado em função da riqueza
aparente do contribuinte, sem levar em conta se tem ou não capacidade contributiva, o que ocorre nos
impostos ditos pessoais.
Após a aludida data, a alíquota utilizada é de 4% para transmissões causa mortis, e de 3% no
caso de doações, conforme artigos 18 e 19 da Lei 8.821/89, respectivamente, com redação dada pela
Lei 13.337, de 30/12/09.
20
21
MATOS, João Batista de. ITCMD. Revista Jurídica da Universidade de Franca. Franca, Universidade de
Franca, ano 5, n. 9, 2002, p. 99.
BRASÍLIA. Superior Tribunal Federal. Recurso extraordinário 562.045-0 - RS – Rel. Min. Ricardo
Lewandowski.
9
2.2 PRINCÍPIOS JURÍDICOS DA TRIBUTAÇÃO DIRETAMENTE ENVOLVIDOS
2.2.1 Princípio da capacidade contributiva
Para uma melhor compreensão dos aspectos controvertidos que envolvem o Imposto de
Transmissão “causa mortis” e doação é imprescindível deixar claro a abrangência e os fundamentos
que envolvem o princípio da capacidade contributiva, já que o mesmo encontra-se diretamente ligado
à temática.
O princípio da capacidade contributiva está disposto no parágrafo primeiro, do artigo 145 da
Constituição Federal, nos seguintes termos:
Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os
rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Vittorio Cassone,22 fazendo referência à citação de Baptista Pereira, faz interessante
observação: “O caráter condicionante da expressão „sempre que possível’, que confere ao legislador
ordinário certa ‘discricionariedade’ para aplicar o princípio, em certas circunstâncias, dentro,
logicamente, do critério da razoabilidade.”
Quanto à análise do §1º, do art. 145 da CF/88, verifica-se que os impostos, sempre que
possível, terão caráter pessoal, aplicando-se o princípio da capacidade contributiva aos tributos:
impostos, taxas e contribuições de melhoria.
Esse princípio tributário constitui a base para uma justiça fiscal, uma vez que os encargos
serão suportados e graduados de acordo com a possibilidade de cada contribuinte. Ou seja, capacidade
contributiva é a aptidão do indivíduo, enquanto sujeito passivo de uma obrigação cujo objetivo é o
pagamento de um tributo, de suportar a carga tributária, sem que o cumprimento desta obrigação
prejudique suas condições mínimas de existência, tenha efeitos confiscatórios ou prejudique o trabalho
e a livre iniciativa.23
É oportuno ressaltar que a graduação imposta está positivada na Constituição Federal apenas
em relação aos impostos, e não aos tributos, conforme ocorria na Constituição de 1946, uma vez que
são estes os maiores geradores da arrecadação tributaria. Aliás, é esse princípio que justifica a isenção
de determinadas taxas e da contribuição de melhoria, em situações onde é visível a inexistência de
capacidade contributiva daquele que seria o sujeito passivo da obrigação tributaria.
Quanto ao conceito, cabe referir ainda que a doutrina majoritária tem buscado derivar o
princípio da capacidade contributiva do princípio da igualdade, porém há também os que defendem ser
a capacidade contributiva um princípio autônomo.
Nesta esteira, alguns dizem que o princípio da capacidade contributiva é algo mais e algo
diferente relativamente ao princípio da igualdade24, enquanto outros defendem que é precisamente o
critério de aplicação do princípio da igualdade no âmbito do Direito Tributário. 25
22
23
24
25
CASSONE, Vittorio. Direito tributário: fundamentos constitucionais da tributação, classificação dos
tributos, interpretação da legislação tributária, doutrina, prática e jurisprudência, atualizado até a EC nº42, de
19-12-2003. São Paulo: Atlas, 2004. p. 207.
PASSARI, Alessandro Antonio. A natureza da capacidade contributiva. Revista Tributária e de Finanças
Públicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 93, 2010.
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 134.
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.
68 et seq.
10
Não tão distante deste entendimento, Humberto Ávila 26 disserta que igualdade tributária não é
apenas igualdade proporcional, mas também igualdade medida na capacidade contributiva do sujeito
passivo.
Seguimos a tese da corrente doutrinaria que entende a capacidade contributiva como um
subprincípio do princípio da igualdade, diante do fato de aquele ter menor abrangência que este, pois o
princípio da igualdade tanto se aplica para aquelas normas que possuem como finalidade a criação de
encargos, como para as de alteração de comportamentos (afetação dos direitos de liberdade). Já aquele,
entendemos que está diretamente ligado com a concretização da igualdade, como por exemplo, no
caso da criação de normas tributárias geradoras de encargos.
O caráter desse princípio é programático, uma vez que inexiste um parâmetro legal de caráter
nacional, fixando os contornos dos encargos oponíveis a cada contribuinte, relativamente a cada tipo
de imposto, não podendo se falar em uma observância impositiva do princípio mencionado.
Pontifica Kiyoshi Harada:27
Se, de um lado, o preceito programático não gera direito subjetivo para o
contribuinte, que não poderá bater às portas do Judiciário pleiteando que o
determinado imposto ajuste-se ao seu perfil econômico, de outro, esse preceito
produz efeito pelo seu lado negativo, à medida que confere ao contribuinte a
faculdade de exigir que o poder tributante não pratique atos que o contravenha.
Assim, o legislador ordinário está constitucionalmente proibido de instituir uma
progressividade na razão inversa da grandeza presumível da renda ou dos bens
sobre os quais incide o imposto.
É certo que a nossa Constituição prevê normas no sentido do incentivo ao desenvolvimento
econômico e social – art. 170 -, sendo que o anunciado princípio é basilar para a concretização de uma
política fiscal mais igualitária, representando, por conseguinte, diretrizes que servirão para guiar e
orientar a atividade legislativa infraconstitucional.
2.2.2 Princípio da legalidade tributária
Andrei Pitten Velloso28 ressalta que o princípio da legalidade tributária é um dos postulados
fundamentais do Estado de Direito, que foi assentado pelo Rei João “Sem Terra” ao promulgar a
Magna Carta de 1215. Durante a Guerra da Independência dos Estados Unidos, ecoou nos discursos
dos colonos americanos contra as pesadas exigências da Coroa Britânica, mediante o brado “No
taxation without representation!”. E nos dias de hoje, com a consolidação da rule of law, é
amplamente reconhecido n as democracias constitucionais.
No Brasil, em termos gerais, o princípio da legalidade está inserido no inciso II, do art. 5º da
CF: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Já no âmbito tributário, esse princípio é encontrado no artigo 150, I, da Carta, que prescreve:
“Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.
Ou seja, a Constituição outorga ao Estado o poder para tributar, o qual, mediante lei, criará ou
majorará tributos. Essa lei é ordinária, e a ela se equiparam também as medidas provisórias e as leis
26
27
28
ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 372.
HARADA, Kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 335.
VELLOSO, Andrei Pitten. Delegações legislativas no direito tributário. Revista Fórum de Direito
Tributário – RFDT. Belo Horizonte: Editora Fórum, ano 9, n. 49, jan./fev 2011.
11
delegadas, vez que nenhum tributo pode ser instituído ou aumentado via decreto, portaria, ordem de
serviço ou qualquer ato infralegal.
Fábio Pallaretti Calcini29, citando Roque Antonio Carazza, lembra ainda que em matéria
tributária, fala-se em princípio da estrita legalidade, reserva legal absoluta ou mesmo tipicidade
cerrada (artigo 97 do CTN), uma vez que se exige do legislador, para a criação ou majoração de
tributos, que toda a matéria seja tratada exaustivamente pela lei, sendo vedado delegar, em especial, de
forma indireta (ou sorrateira) aos demais poderes esta função. Bem por isso cabe à lei descrever
exatamente toda a estrutura do tributo, ou melhor, sua regra-matriz de incidência (ou hipótese de
incidência).
Neste diapasão, pode-se dizer que o princípio da legalidade também serve para garantir a
segurança nas relações do contribuinte com o fisco, que devem estar disciplinadas em lei, obrigando,
assim, tanto o sujeito passivo, como o ativo da obrigação tributária.
Em face desse princípio, deverá a lei conter: a descrição do fato tributável; a definição da base
de cálculo e da alíquota; o critério para a identificação do sujeito passivo da obrigação tributária, o
sujeito ativo e o prazo para pagamento. Tem-se, portanto, que deverá a lei prescrever tudo o quanto
seja necessário para a concretização da relação tributária.
Registre-se, todavia, que se a lei não fixar o prazo para a efetivação do pagamento do encargo,
no caso de tributos sujeitos a lançamento por homologação, fica ao dispor da Administração Pública
fixá-los imediatamente após a ocorrência do fato gerador.
Porém, nos casos dos tributos sujeitos a lançamento por ofício ou declaração, vale ressaltar a
norma inserta no art. 160 do Código Tributário Nacional: “quando a legislação tributária não fixar o
tempo do pagamento, o vencimento do crédito ocorre trinta dias depois da data em que se considera o
sujeito passivo notificado do lançamento”.
Em suma, Luciano Amaro30 ressalta:
(...) a legalidade tributária não se conforma com a mera autorização de lei para a
cobrança de tributos; requer-se que a própria lei defina todos os aspectos
pertinentes ao fato gerador, necessários à quantificação do tributo devido em
cada situação concreta que venha a espelhar a situação hipotética descrita em lei.
Sobre o princípio, Luiz Felipe Silveira Difini 31 ressalta, ainda, sobre as importantes exceções
existentes:
No direito constitucional positivo brasileiro, hoje vigente, há importantes
exceções ao princípio da legalidade no que se refere aos impostos de
competência da União. O art. 153, §1º, da CF estatui ser “facultado ao Poder
Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as
alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V”. Estes são os
impostos de importação, exportação, sobre produtos industrializados (IPI) e
sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativos a títulos ou valores
mobiliários (IOF).
A par dessa disposição, entende-se que há uma espécie de “revitalização‟‟ do princípio da
legalidade em relação aos impostos de competência da União, sendo que poderá o Poder Executivo,
29
30
31
CALCINI, Fábio Pallaretti. O princípio da legalidade tributária no direito brasileiro e a jurisprudência do STF.
Revista Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 95, 2010.
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 112.
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Manual de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 65.
12
através de portarias do Ministro da Fazenda, decreto do Presidente, etc, alterar as alíquotas desses
impostos sem lei, fulcro no art. 153, §1º, da Constituição Federal.
Tal exceção não se aplica, porém, aos impostos de competência dos Estados e Municípios,
sendo o princípio da legalidade absoluto em relação a estes entes federativos.
3 ASPECTOS CONTROVERTIDOS DO ITCMD
3.1 PROBLEMÁTICA QUANTO À PROGRESSÃO DE ALÍQUOTA
Para melhor elucidação deste aspecto controvertido, cabe, inicialmente, citar os ensinamentos
de Geraldo Ataliba:32
São impostos reais aqueles cujo aspecto material da hipótese de incidência
limita-se a descrever um fato, ou estudo de fato, independentemente do aspecto
pessoal, ou seja indiferente ao eventual sujeito passivo e suas qualidades. A
hipótese de incidência é um fato objetivamente considerado, com abstração feita
das condições jurídicas do eventual sujeito passivo; estas condições são
desprezadas, não são consideradas na descrição do aspecto material da hipótese
de incidência (o que não significa que a hipótese de incidência não tenha aspecto
pessoal; tem, porém este é indiferente à estrutura do aspecto material ou do
próprio imposto).
São impostos pessoais, pelo contrário, aqueles cujo aspecto material da hipótese
de incidência leva em consideração certas qualidades, juridicamente
qualificadas, dos possíveis sujeitos passivos. Em outras palavras: estas
qualidades jurídicas influem, para estabelecer diferenciações de tratamento
legislativo, inclusive do aspecto material da hipótese de incidência. Vale dizer: o
legislador, ao descrever a hipótese de incidência, faz refletirem-se
decisivamente, no trato do aspecto material, certas qualidades jurídicas do
sujeito passivo. A lei, nestes casos, associa tão intimamente os aspectos pessoal
e material da hipótese de incidência que não se pode conhecer este sem
considerar concomitantemente aquele.
É precisamente a distinção entre impostos de natureza pessoal e impostos de natureza real, que
impõe a inaplicabilidade do princípio da capacidade contributiva, àqueles impostos de natureza real,
sob a forma de progressividade, pelo que entendemos ser inconstitucional a incidência de alíquotas
progressivas nestas espécies de impostos.
O ITCMD é imposto que se enquadra na categoria de imposto real, ou seja, para o seu cálculo
não devem ser levados em consideração as características pessoais do contribuinte.
Ademais, importa fazer maiores comentários quanto ao princípio da capacidade contributiva,
razão pela qual trazemos novamente à baila o preceito do artigo 145, §1º, da Constituição Federal:
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão
instituir os seguintes tributos:
[...]
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os
rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte .
32
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p.141-142.
13
Em análise direta ao aspecto da progressividade, cremos que a expressão “sempre que
possível”, disposta do referido artigo, está intimamente ligada à categoria do tributo envolvido, se
imposto pessoal, deverá obedecer ao critério da capacidade contributiva, ou seja, é caso possível de
aplicação da progressividade; se imposto real, como no caso do ITCMD, teria sua base de cálculo
fixada de acordo com a totalidade dos bens transferidos pelo de cujus, não devendo haver incidência
direta e imediata do princípio da capacidade econômica do sujeito passivo, rechaçando-se a
progressividade.
Porém, a guisa de demonstrar o tratamento dispensado pelo Estado do Rio Grande do Sul
quanto ao imposto estudado, notamos que estes preceitos não foram sucessivamente seguidos,
conforme passamos a elucidar.
A Lei nº 8.821/89, com redação dada pelo Decreto nº 38.176/98, dispunha, no seu artigo 18
(ou art. 22 do Decreto) o seguinte texto:
Art. 22 - Na transmissão "causa mortis", por sucessão legítima, a alíquota do
imposto é definida com base no resultado da soma dos valores venais da
totalidade dos bens imóveis situados neste Estado, bens móveis, títulos e
créditos, bem como dos direitos a eles relativos, compreendidos em cada
quinhão, avaliados nos termos do art. 14, aplicando-se a seguinte tabela:
I - 1% (um por cento), caso a soma dos valores venais não seja superior a 14.012
UPF-RS;
II - 2% (dois por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a 14.012
UPF- RS e não exceda a 17.515 UPF-RS;
III - 3% (três por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a 17.515
UPF- RS e não exceda a 21.018 UPF-RS;
IV - 4% (quatro por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a
21.018 UPF- RS e não exceda a 22.769 UPF-RS;
V - 5% (cinco por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a 22.769
UPF- RS e não exceda a 24.521 UPF-RS;
VI - 6% (seis por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a 24.521
UPF- RS e não exceda a 26.272 UPF-RS;
VII - 7% (sete por cento), caso a soma dos valores venais seja superior a 26.272
UPF- RS e não exceda a 28.024 UPF-RS;
VIII - 8% (oito por cento), caso a soma dos valores venais exceda a 28.024
UPF-RS.
O que se depreende do dispositivo colacionado é que a premissa sustentada pelo nosso Estado
era de que o art. 145, §1º, da Constituição Federal, seria aplicável a qualquer espécie de imposto, seja ele
de natureza real ou pessoal, contrariando, por conseguinte o disposto nos artigos 153, §2º, I, 153, §4º,
156, §1º, I, e 182, §4º, II, todos da Carta Política, vez que, tais preceitos, além de revestirem a condição
de normas específicas, o que contrapõe o caráter geral do §1º do art. 145 da CF/88, permitem, de modo
expresso, ocorra a progressividade das alíquotas apenas em relação ao Imposto sobre Renda e Proventos
de Qualquer Natureza, ao Imposto Predial e Territorial Urbano e ao Imposto sobre Propriedade
Territorial Rural.
Logo, sempre que a Constituição Federal autoriza a progressividade das alíquotas, ela o faz de
modo expresso, o que permite concluir constituir tal progressividade, quando autorizada, na exceção à
regra.
3.1.1 Posicionamento jurisprudencial estadual
Quanto ao tema, o entendimento do nosso egrégio TJRS, segundo se percebe pelos arrestos
colacionados, é pela inconstitucionalidade da progressão, termos:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO E FISCAL. AÇÃO
ORDINÁRIA.
ANTECIPAÇÃO
DE
TUTELA.
CABIMENTO.
14
PROGRESSIVIDADE
DAS
ALÍQUOTAS
DO
IMPOSTO
DE
TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO. DESCABIMENTO.
APLICAÇÃO DA ALÍQUOTA PREVISTA NA LEGISLAÇÃO ANTERIOR
QUE DISCIPLINAVA A MATÉRIA. EXTINÇÃO DO USUFRUTO.
CONSUMAÇÃO COM A AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO.
INDEVIDA A INCIDÊNCIA DE JUROS, MULTA E CORREÇÃO
MONETÁRIA DESDE A MORTE DO ÚLTIMO USUFRUTUÁRIO. I) Para a
concessão da tutela antecipada, deve ser considerada a prova inequívoca, a
verossimilhança da alegação e a possibilidade de dano irreparável ou de difícil
reparação. Requisitos do art. 273 do CPC preenchidos em parte, no caso
concreto. II) Sendo indevida a incidência de alíquotas progressivas presente a na
Lei 8.821/89, penso seja o caso de afastar a incidência da referida lei e analisar a
legislação anterior, no caso a Lei Estadual nº 7.608/81, que prevê a alíquota
única de 4% para transmissão a título gratuito. III) O fato gerador do ITCD, no
caso, é a extinção do usufruto, que se consuma com a averbação do
cancelamento no registro imobiliário e não com a morte dos usufrutuários. Desta
forma, o prazo de 120 dias previsto no art. 30, III, do Decreto Estadual nº
33.156/89 para que o interessado postule a avaliação do imóvel e o conseqüente
pagamento do referido imposto, tem como termo inicial a averbação da extinção
do usufruto no registro imobiliário competente. Assim, é indevida a incidência
de juros, correção monetária e multa desde a morte do último usufrutuário.
AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº
70034959833, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 09/06/2010)
ITCD.
PROGRESSIVIDADE
DE
ALÍQUOTAS.
INCONSTITUCIONALIDADE. A progressividade de alíquotas prevista no art.
18 da Lei Estadual n.º 8.821/89 é inconstitucional. Precedentes jurisprudenciais.
NEGADO SEGUIMENTO. EM MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº
70042204339, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui
Portanova, Julgado em 13/04/2011)
AGRAVO
DE
INSTRUMENTO.
SUCESSÕES.
INVENTÁRIO.
INCONSTITUCIONALIDADE DA PROGRESSIVIDADE DAS ALÍQUOTAS
DO ITCD. APLICAÇÃO DA MENOR ALÍQUOTA PREVISTA.
ENTENDIMENTO PACIFICADO NO ÂMBITO DESTE TRIBUNAL E NO
STF. 1. Reconhecida inconstitucional a progressividade de alíquotas instituída
pela Lei Estadual 8821/89, que regula a cobrança do ITCD, impõe-se a
aplicação da menor alíquota prevista (1%). 2. Descabe a repristinação da
alíquota de 4%, prevista na Lei 7.608/81, pois a Lei n.º 8.821/89 não foi
inteiramente revogada. 3. Tampouco se há de falar em aplicação da Lei nº
11.337/2009, na medida em que o inventário remonta a 10.04.1991, logo
aplicável ao caso é a Lei nº 8.821/89, porquanto aquele primeiro diploma legal
entrou em vigor 90 dias após a sua publicação, sendo que foi publicada em
31.12.2009. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento
Nº 70041087248, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz
Felipe Brasil Santos, Julgado em 07/04/2011).
Os posicionamentos jurisprudenciais revelam que alguns magistrados apegaram-se à tese da
inaplicabilidade da Lei Estadual 8.821/89 e sim à aplicabilidade da Lei Estadual anterior – Lei
Estadual 7.608/81, que previa alíquota fixa, ao fundamente de a previsão da progressividade revogaria
a Lei estadual vigente.
Todavia, outro entendimento vem sendo pacificado no nosso TJRS, de que a Lei Estadual
8.821/89 não seria totalmente inconstitucional não devendo ser revogada, razão pela qual aplicável
seria a alíquota mínima fixada, qual é de 1% sobre o valor venal dos bens.
Esta “questio” deu origem a inúmeras demandas, pois os contribuintes buscavam a concessão
de liminares para obter o direito ao recolhimento com incidência da alíquota mínima, diante de estar
pendente a declaração –ou não- da inconstitucionalidade da progressão da alíquota perante o STF,
15
sendo que atualmente, o “escore” é três votos a favor da constitucionalidade da medida, versus um
contra.
Destarte, no nosso Estado, recentemente promulgou-se a Lei 13.337/09, que, buscando
diminuir as discussões a respeito deste tema e as conseqüentes “aventuras jurídicas”, estabeleceu, no
seu art. 1º, inciso III, que na transmissão causa mortis a alíquota do imposto é 4%, e, no que tange as
doações, será aplicável a alíquota de 3%, fulcro no art. 1º, inciso IV, da referida Lei.
Ou seja, para os fatos geradores ocorridos a partir de 31/12/2009, aplicáveis são as alíquota
supra-indicadas, e, aos anteriores, ainda aplicável a progressividade de 1% a 8% sobre as transmissões.
Porém, entendemos ser relevante destacar que, mesmo sendo estes os atuais posicionamentos e
votos a respeito da problemática, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 234.105-3/SP, em
relação ao imposto inter-vivos, sendo que que em muito se afeiçoa ao ITCMD, principalmente quanto
a sua natureza real, tanto que no voto no meritíssimo desembargador relator é feita a análise do “causa
mortis” conjuntamente, decidiu-se pela inconstitucionalidade da técnica da progressão de alíquota
enquanto ausente autorização constitucional expressa.
Entendemos que o tratamento ao ITCMD deveria ser o mesmo, pois o desapego à legalidade,
já que no presente caso também faltante permissivo constitucional que autorizasse a progressão de
acordo com a capacidade contributiva, fere a segurança jurídica, que constitui elemento vital de
confirmação dos valores do Estado Democrático de Direito.
Disto deflui que as disposições constitucionais não devem e nem podem ficar submetidas a
uma interpretação cambiante, pois se tal ocorrer, estaremos admitindo o absurdo, isto é: estar a
insegurança jurídica dos contribuintes protegida pelo Estado Democrático de Direito.
Entendimento diverso implicaria, conforme elucidado, na violação ao princípio da legalidade
estrita, consubstanciado no art. 150, III, a, da CF/88, vez que estaria se autorizando a cobrança de
imposto progressivo, sem lei anterior que o permita, sendo que tal interpretação deveria ser mantida
até ulterior modificação da Carta Maior. Só assim estar-se-ia afirmando a segurança jurídica do
cidadão, razão de ser do Estado Democrático de Direito.
3.2 PROBLEMÁTICA QUANTO AO RECOLHIMENTO DO IMPOSTO NO CASO DE DOAÇÃO
3.2.1 A legislação estadual e a falta de lei complementar
Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu
patrimônio bens ou vantagens para o de outra (artigo 530 do CCB).
Nesse sentido, Carlos Henrique Abrão 33 disserta que:
De fato, doador e donatário estabelecem as regras que situam a transmissão
patrimonial, ainda que exista a cláusula de usufruto, ou incomunicabilidade,
impenhorabilidade e inalienabilidade, eis que o fato gerador da obrigação
consiste na migração de propriedade, de cujo domínio ocorre uma alteração, no
ato da matrícula, seguindo-se o princípio da continuidade registrária.
Destarte, ocorrerá o empobrecimento do doador e o enriquecimento patrimonial do donatário.
33
ABRÃO, Carlos Henrique. Imposto sobre doação de bens. Revista Dialética de Direito Tributário. São
Paulo: Escrituras, n. 69, 2001, p. 43.
16
Quanto à incidência do ITCMD sobre as doações, a problemática reside na falta de lei
complementar reguladora a instituir o imposto, requisito disposto no artigo 155, §6º, inciso III da
CF/88.
Ives Gandra da Silva Martins34 conceitua lei complementar:
É, portanto, a lei complementar norma de integração entre os princípios gerais
da Constituição e os comandos de aplicação da legislação ordinária, razão pela
qual, na hierarquia das leis, posta-se acima destes e abaixo daqueles. Nada
obstante alguns autores entendam que tenha campo próprio de atuação – no que
têm razão -, tal esfera própria de atuação não pode, à evidencia, nivelar-se
àquela outra pertinente à legislação ordinária. A lei complementar é superior à
lei ordinária, servindo de teto naquilo que é de sua particular área mandamental.
Mesmo assim, os Estados-Membros e o Distrito Federal legislam sobre a matéria, em face da
autorização contida no art. 24, e parágrafos da CF.35
Ou seja, o ITCMD, ainda que não contemple as prerrogativas impostas pela CF/88, é imposto
devido ao Estado quando preenchidos os requisitos típicos fixados da lei, ou seja, quando ocorrer o
fato gerador do tributo, que implica na obrigação do pagamento, cabendo à lei, ainda, determinar
quem é o sujeito passivo, conforme se verifica do dispositivo supra - refrido.
Disciplina a nossa Lei Estadual 8.821/89 no seu artigo 3º, IV e V:
Art. 3º - O imposto de que trata esta Lei é devido a este Estado quando:
IV- os bens móveis, títulos e créditos forem transmitidos em decorrência de
doação em que o doador tiver domicílio neste Estado.
V- os bens móveis, títulos e créditos forem transmitidos por pessoa sem
residência ou domicílio no País e o donatário for domiciliado neste Estado.
A incidência do ITCMD se dá sobre todos os bens doados, sejam eles bens imóveis,
semoventes, veículos, máquinas, dinheiro, participações societárias e outros.
Na doação de bens imóveis, a ocorrência do fato gerador sobrevém da transcrição realizada
junto ao Registro de Imóveis, devendo o recolhimento ser perfectibilizado quando da celebração da
escritura pública.
No que concerne aos bens móveis ou direitos, o fato gerador ocorre no momento da tradição,
seja física, escritural, registral (quotas de capital ou ações na Junta comercial, por exemplo), etc.
Destarte, é competente para cobrar o tributo, no caso da doação, o Estado onde o doador tenha
domicílio.
Porém, aprofundando-se na matéria da competência para fixação do sujeito ativo para a
cobrança do ITCMD relativo à transferência por doação, cabe ressaltar a hipótese de quando o doador
reside no exterior ou lá possui domicílio, ou se o “de cujus” possuía bens, residia ou era domiciliado
no exterior, ou ainda se seu inventário já tiver sido processado no exterior, caso em que caberia à lei
complementar determinar quem deteria competência.
Nesse caso, Ives Gandra da Silva Martins 36 aconselha para a resolução do causídico:
34
35
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Necessidade de lei complementar para a conformação do imposto de
transmissão “Causa Mortis” e por doação de bens e recursos recebidos do exterior – inteligência do artigo
155, §1º, inciso III, da Constituição Federal. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Escrituras,
n. 99, 2003. p. 154.
FERNANDES, Regina Celi Pedrotti Vespero. Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação –
ITCMD. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 59-60.
17
Uma sugestão seria a de atribuir a competência ao Estado onde se situar a maior
parte dos bens, seguido do critério do ultimo domicílio no Brasil, antes da
mudança para o exterior ou, sendo impossível ou inexistente qualquer dos
critérios anteriores, o da residência ou domicílio dos donatários ou dos herdeiros
ou legatários. Fica a sugestão para o legislador complementar.
O mesmo doutrinador, no artigo citado alhures, sobre a necessidade da lei complementar,
publicado anteriormente à referendada obra, também dispôs:
[...] sempre que o direito pátrio tributário depender de compatibilização com o
direito estrangeiro, a necessidade de uma regulamentação nacional abrangente
impõe a exigência de lei complementar, se a matéria estiver fora de órbita federal
– como é o caso -, visto que, pela indissolubilidade da União, tal veículo tem sido
considerado desnecessário pela Suprema Corte em algumas “contribuições”
federais, pelo simples fato de que não haveria uma multiciplidade de entidades
com idêntica competência impositiva. [...] Sem lei complementar, portanto, não
pode ser cobrado o imposto do inciso I do artigo 155 da C.F., nas hipóteses do seu
§1º, III, em face da clara subordinação do legislador estadual à disciplina de
norma nacional sistematizadora.
Ora, nesse sentido acompanhamos o posicionamento do doutrinador, uma vez que faltante a
lei complementar reguladora da situação jurídica proposta, não pode o Estado legislar, descumprindo a
ordem de subordinação e dando origem a diferenciados tratamentos no âmbito nacional.
Não obstante, merece ser destacado quanto ao contrato de doação, que este é essencialmente
caracterizado pelo espírito de liberalidade, sendo que na doação feita em contemplação do
merecimento do donatário, bem como nas doações remuneratórias ou gravadas, não há de se falar na
perda deste caráter.
Em razão desse caráter, também é importante ressaltar que não se pode deixar de distinguir a
doação da prestação alimentos, pois mesmo que se revistam de características semelhantes – ato
gratuito com empobrecimento do devedor e enriquecimento do donatário- os alimentos decorrem de
imposição legal (pátrio poder); princípio da solidariedade familiar (filhos maiores ou parentes
carentes), ou social (idosos, pobres).37
Porém, é evidente que quando ocorrida a transferência de diversos bens a um mesmo
descendente, se verifica extrapolado o limite necessário às necessidades vitais básicas, razão pela qual
há a desnaturalização da característica alimentar e o conseqüente enquadramento da hipótese de
doação.
3.2.2 Incidência do ITCMD nas doações com encargo ou sem encargo
Conforme bem se elucidou anteriormente, é incontestável que nas doações puras ou
incondicionadas há a incidência do ITCMD, porém não é o mesmo que ocorre com as doações
efetuadas com encargo.
Isso por que existem leis municipais de diferentes Municípios autorizando o Executivo a doar
terrenos com encargos, como, por exemplo, para o objetivo de construírem-se creches, conjuntos
habitacionais, etc., com a expressa dispensa do ITBI, o que nos leva a pensar que esse tipo de operação
é fato gerador desse imposto.
Ocorre que, no nosso Estado, a legislação é cristalina quanto à incidência do ITCMD ao
contrato de doação com encargo, vez que, o art. 2º, parágrafo 1º da Lei 8.821/89 disciplina que “[...]
36
37
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Uma teoria do tributo. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 393.
PAULSE, 2008, p. 202.
18
considera-se doação qualquer ato ou fato em que o doador, por liberalidade, transmite bens, vantagens
ou direitos de seu patrimônio, ao donatário que os aceita, expressa, tácita ou presumidamente,
incluindo-se as doações efetuadas com encargos ou ônus”.
Sendo assim, no Estado do Rio Grande do Sul não há como haver questionamento quanto ao
tributo incidente.
Porém, não há posicionamento jurisprudencial a respeito da temática no nosso TJRS, sendo
que quanto ao posicionamento doutrinário, Kiyoshi Harada 38 conclui:
Na doação com encargo haverá apenas incidência do ITCMD, porque o caráter
de liberalidade permanece ainda que de forma restritiva. O certo é que no caso
de doação de terreno com a condição de construir uma creche, por exemplo, o
donatário adquire a propriedade do terreno de forma gratuita. A edificação é
fator que vem acrescer o valor do patrimônio transferido pelo doador.
O referido jurista, citando Mauro Luis Rocha Lopes, elucida ainda que o único caso em que
entenderia haver a incidência do ITBI seria o caso de o ônus relativo ao encargo ser proporcional ao
valor do bem transmitido, caso em que o contrato é bilateral e oneroso.
3.2.3 Incidência do ITCMD nas separações conjugais e divórcio
Neste especial, importante ter bem claros os conceitos de herança e meação. Herança é o
conjunto de bens ou o patrimônio deixado por uma pessoa que faleceu, ou seja, compreende todos os
bens, direitos e ações do de cujus, como todas as suas dívidas e encargos.
Enquanto isso, meação, no processo de inventário, significa a parte que cabe ao cônjuge
sobrevivente, na sociedade conjugal, parte essa que compreende a metade dos bens anotados no acervo
de bens, deixados pelo inventariante.
Ou seja, meação não implica herança, mas a um direito do sócio em ter para si a metade dos
bens da sociedade conjugal. Herança será a outra metade, que competia ao cônjuge falecido e por ele
poderá ser disposta em testamento.
Essa distinção é de suma relevância, porque se torna perceptível que no caso da meação não
há transmissão de propriedade não havendo, portanto, fato gerador a ensejar cobrança do ITCMD, vez
que a propriedade já era do cônjuge, razão pela qual dever-se-á atender aos dispositivos do Código
Civil que regulam o regime de bens, e, assim, deferir-se a herança aos herdeiros (Código Civil, art.
1.685).
Isto posto, o objeto da transmissão da propriedade é apenas a herança, tudo em relação ao
evento causa mortis.
O que importa, todavia, realçar, é o que ocorre quando do evento da doação, nas dissoluções
das sociedades conjugais.
Nesse caso, havendo a divisão desigual de bens por ocasião da partilha, ou seja, o excesso da
meação – ainda que o meeiro assuma a totalidade dos bens, correta é a incidência do ITCMD, isso se a
transmissão se der a título gratuito, conforme entendimento pacificado do nosso TJRS, conforme se
depreende do entendimento emanado no julgamento do Agravo de Instrumento Nº 70039018650,
Agravo de Instrumento Nº 70039621693 e Agravo de Instrumento Nº 70040667842, por exemplo.
38
HARADA, Kiyoshi. Doação com encargo: ITCMD ou ITBI?. Revista Jus Vigilantibus. Disponível em:
<http://jusvi.com/artigos/43359>. Acesso em: 28 abr. 2001.
19
Já não é o que ocorre no caso de a doação, pela separação conjugal, a título oneroso, hipótese
em que caberá o recolhimento do ITBI, conforme entendimento pacificado pela Súmula nº 29 do
nosso TJRS, que assim vem decidindo sobre a matéria:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIVÓRCIO. PARTILHA CONSENSUAL.
IMÓVEIS. EXCESSO DE MEAÇÃO. INCIDÊNCIA DE ITCD. DECISÃO
MANTIDA. 1. Correta a decisão que concluiu pela incidência de ITCD sobre o
excesso de meação, não sendo possível cogitar de mera acomodação patrimonial
que não configuraria hipótese de transmissão de bens. 2. O Decreto nº
33.156/89, que regulamenta o ITCD, dispõe no art. 30 que o imposto será pago
na dissolução da sociedade conjugal, relativamente ao valor que exceder à
meação transmitida de forma gratuita. Há, ainda, a Súmula nº 29 deste Tribunal
de Justiça: "Na dissolução de sociedade conjugal, ocorrendo divisão desigual de
bens por ocasião da partilha, incide o ITCD, se a transmissão se der a título
gratuito, e o ITBI, se a título oneroso". 3. A transmissão gratuita está equiparada
à doação, por previsão específica da Lei Estadual nº 8.821/89, que instituiu o
Imposto sobre a Transmissão "Causa Mortis" e Doação de quaisquer bens e
direitos. 4. Demonstrado está que há sim fato gerador para incidência do ITCD
por configurar hipótese com expressa previsão legal. POR MAIORIA,
NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, VENCIDO
O DES. RUI PORTANOVA. (Agravo de Instrumento Nº 70039622451, Oitava
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos,
Julgado em 09/12/2010).
Portanto, o aspecto do caráter oneroso é de suprema importância para traçar a hipótese de
incidência tributária no caso do ITCMD sobre as separações conjugais/divórcios.
3.3 TRIBUTAÇÃO DA HERANÇA: POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DO IR E O BIS IN
IDEM
Esta questão importa em discutir se a tributação da herança está sujeita exclusivamente ao
ITCMD ou se sobre ela também pode incidir o Imposto de Renda – IR, face à competência que a Carta
Magna outorga a cada uma das pessoas jurídicas de direito público interno.
Para uma melhor compreensão da temática, importa ressaltar os ensinamentos de Hugo de
Brito Machado:39
Em face das controvérsias a respeito do conceito de renda, há quem sustente que
o legislador pode livremente fixar o que como tal se deva entender. Assim,
porém, não nos parece que seja. Entender que o legislador é inteiramente livre
para fixar o conceito de renda e proventos importa deixar sem qualquer
significação o preceito constitucional respectivo.
Aprofundando o conceito de renda, Roque Antonio Carrazza 40 citando Luigi Vittorio Berliri,
aclara:
A renda tributável não pode ser constituída senão por uma nova riqueza,
produzida do capital, do trabalho ou de um e outro conjuntamente, e que seja
destacada de uma causa produtiva, conquistando uma autonomia própria e uma
aptidão própria e independente para produzir concretamente outra riqueza.
39
40
MACHADO, 2010, p. 332.
CARRAZZA, Roque Antonio. Imposto sobre a renda. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 35.
20
Renda, em poucas palavras, se traduz no excedente de riqueza obtido em determinado período,
deduzindo-se os gastos necessários a sua manutenção e obtenção.
O ponto chave desta temática reside em saber o âmbito do princípio da competência tributária
privativa, apontando até onde há a incidência de cada tributo – ITCMD e IR, levando em consideração
também os conceitos.
Sobre a competência tributária, dispõe o CTN, no seu artigo 8º que “O não-exercício da
competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a
Constituição a tenha atribuído”.
Observa-se, nesta esteira, que a Constituição permite à União a prerrogativa de instituir, pela
competência residual, impostos (art. 154) e contribuições sociais (art. 195, parágrafo 4º), aspecto que
de certa forma reforça a interpretação do princípio da competência tributária privativa.
Sobre a incidência do IR sobre as heranças, o que se analisa é o disposto no art. 23, da Lei
9.532/97, que permite a cobrança desse imposto quando da transferência de direito de propriedade por
sucessão, nos casos de herança, legado ou por doação em adiantamento da legítima, a transferência for
efetuada a valor de mercado e haver diferença a maior entre esse e o valor pelo qual constavam da
declaração de bens do de cujus ou do doador, havendo, portanto, a incidência de imposto de renda à
alíquota de quinze por cento, pelo ganho patrimonial.
Vittorio Cassone41, a respeito da temática, disserta que a herança está sujeita à tributação
privativa do ITCMD, porém isso não afasta a incidência do IR sobre a valoração superior à base de
cálculo para a apuração daquele, ou seja, sobre o excesso patrimonial cabe o recolhimento do IR, de
competência privativa para tributação da União.
Porém, transcrevemos o posicionamento doutrinário diverso de Aliomar Baleeiro 42 sobre o bis
in idem:
O conceito de renda, como acréscimo do valor, na enunciação teórica dos
economistas que o sustentam, envolve heranças, doações e os “rendimentos
psíquicos” ou “imateriais” (gozo da casa própria, automóvel, obra d‟arte, e até,
na opinião de alguns, as horas de lazer).
As legislações acolhem o conceito de renda-acréscimo, que coincide com
critérios de contabilidade, e inclui os prêmios de loteria, mas exclui heranças e
doações, sujeitas a impostos específicos, assim como os “rendimentos
psicológicos”, porque estes trazem dificuldades práticas de aplicação. [...]
Acompanhando o posicionamento do respeitável doutrinador, discorre Ricardo Lôbo Torres:43
[...] a dupla incidência significaria, do ponto de vista do sistema tributário
nacional, isto é, da racionalidade econômica, um absurdo; por isso mesmo a
legislação brasileira declarou isenta do imposto de renda a transmissão “causa
mortis”, consonando perfeitamente com o direito dos Estados Unidos, Inglaterra,
e Espanha, entre outros. Do ponto de vista do federalismo fiscal também seria
ilegítima a tributação, ainda que não houvesse a regra expressa de isenção, tendo
em vista que o imposto “causa mortis” pertence à competência privativa do
Estado-membro, que repele a cobrança concomitante por outro ente público, a
não ser que haja expressa previsão constitucional, como ocorre com o ICMS
relativamente ao IPI (art. 155, §2º, XI) e ao IOF (art. 153, §5º).
41
42
43
CASSONE, Vittorio. Tributação da herança: o art. 23 da Lei 9.532/97 em face das competências privativas da
união (IR) e dos estados (ITCMD). Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 184, 2011. p. 142.
BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1991. p. 183-184.
TORRES, Ricardo Lôbo. A incidência do imposto de renda na transferência de direitos de propriedade.
Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 32, p.82-83.
21
[...]
Qual é a justificativa ética e jurídica para a cobrança do imposto de renda do art.
23 da Lei 9.532/97?
A capacidade contributiva – o princípio da legitimação dos impostos segundo o
art. 145 da CF – não pode ser invocada. O de cujus não enriquecei nem obteve
acréscimo patrimonial. Os herdeiros e legatários já vão pagar o imposto causa
mortis verdadeiro, fundado na capacidade contributiva, e não terão qualquer
ganho de capital suscetível de ser objeto do tributo federal.
Ademais, Ricardo Cassone, 44 apontando citação de Sacha Calmon Navarro Coêlho, elucida
que “No caso em exame, de sobredobro, existem leis estaduais prevendo a tributação.
Conseqüentemente, não pode a União invadir áreas reservadas aos Estados da Federação. A invasão de
competência é escancarada e a bitributação odiosa”.
Adentrando-se mais na questão, o aludido doutrinador também exemplifica quando e como, ao
seu ver, e a partir da visão da maioria dos doutrinadores, há a correta incidência do IR sobre a herança,
sem prejudicialidade do critério da competência privativa quando o herdeiro lançar, por exemplo, em
sua declaração de renda, valor superior ao que serviu de base de cálculo para pagamento do ITCMD,
estando sujeito ao IR. O mesmo não ocorre quando o valor lançado é idêntico ao do pagamento do
ITCD, não ocorrendo, neste caso o bis in idem.
Contudo, nos posicionamos de acordo com os ensinamentos de Milton Delgado Soares45, que
elucida que a imposição do IR sobre o acréscimo patrimonial faz com que o mesmo incida, sem
autorização constitucional, sobre a mesma transferência que origina a cobrança do ITCMD, ou seja,
caracterizando-se o bis in idem, sendo certo que não cabe à União tributar sobre fato gerador de tributo
de competência estadual.
Outra questão para defender esse posicionamento é a de que o ganho de capital para a
cobrança do IR deve ser o realizado e não o futuro, e, neste caso, teríamos a tributação antes mesmo de
saber se tal ganho efetivamente ocorrerá, devendo a transmissão gratuita ser considerada como mera
transferência de capital de uma pessoa para outra, que é suscetível de imposição do ITCMD.
Ressalta-se que o ganho de capital efetivo, somente se daria na hipótese do bem ser vendido e
o valor recebido ser superior ao transmitido.
O mesmo ocorreria se o herdeiro lançasse em sua declaração o valor de mercado do bem
recebido, hipótese na qual a diferença do valor declarado para fins do recolhimento do ITCMD – valor
venal do IPTU, por exemplo - sofreria a incidência do IR, se a maior, pelo que muitos autores
entendem que assim se estaria resguardando a competência do Estado para tributar sobre a herança e a
da União sobre o acréscimo patrimonial.
Por fim, ressaltamos que esse entendimento é aplicado a partir da vigência do art. 23, da Lei
9.532/97, a partir de 1º de janeiro de 1998, ou seja, fatos geradores anteriores a essa data devem ser
regulados de acordo com a lei tributária vigente à época da transmissão da herança – quando ocorrido
o fato gerador, conforme entendimento do STJ no REsp 805.806/RJ.
4 RECOLHIMENTO DO ITCMD NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
Alhures, havíamos analisado as hipóteses de incidência do ITCMD e a conseqüente obrigação
tributária advinda da ocorrência do fato gerador. Porém, importa agora elucidar os procedimentos
utilizados ao recolhimento do tributo no nosso Estado, sendo imprescindível tecer comentários quanto
às hipóteses de imunidade, não-incidência e isenção do tributo.
44
45
CASSONE, 2011, p. 145.
Ibid., p. 150.
22
4.1 IMUNIDADE, NÃO-INCIDÊNCIA E ISENÇÃO DO ITCMD
Sasha Calmon Navarro Coelho46 ensina:
Se, sob o ponto de vista do Direito positivo, a imunidade e a isenção são
declarações expressas do legislador sobre fatos ou aspectos de fatos ou estados
de fato, negando-lhes efeitos tributários impositivos, não vemos como, neste
plano, compará-las com a chamada “não-incidência natural ou pura”. A
imunidade e a isenção são, exitem, vêm de entes legais positivos. A não–
incidência natural ou pura como tal inexiste, é um não ser.[...] Composto o perfil
da hipótese se incidência, já no plano da Ciência do Direito, pela conjunção das
regras de imposição com as de imunidade e isenção, tudo o que ficar de fora, à
volta desse perfil, estará na área de não-incidência.
Milton Delgado Soares47 contribui:
Desta forma imunidade seria uma limitação do poder de tributar fundada na
liberdade absoluta, tendo por origem a natureza das coisas e por fonte a
Constituição, com eficácia declaratória, diante da limitação preexistente do
direito de tributar, e irrevogável, por ser considerada cláusula pétrea do art. 60,
§4º, IV, da CR.[...]
Neste diapasão podemos afirmar que isenção, também denominada privilégio
não odioso, é limitação fiscal derrogatória da incidência, por atuar no plano da
norma e não no plano fático, que, em conseqüencia, possui eficácia constitutiva,
sendo, portanto, revogável com efeito restaurador da incidência, fundada na
idéia de justiça e que tem por origem o direito positivo e por fonte a lei
ordinária.
E por fim a não-incidência lato sensu compreenderia a imunidade, a isenção e a
não-incidencia propriamente dita, já que os três institutos evita-se a incidência
de tributo.
Pois bem, a isenção e a imunidade são regras jurídicas cujas previsões, em relação às
imunidades, podem ser encontradas na Constituição (art. 150, VI48) e, em relação à isenção, nas leis
infraconstitucionais.
Adentrando-se no mérito do ITCMD, a imunidade prevista na Constituição é ratificada no art.
5º da Lei Estadual 8.821/89, que também determina que a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, bem como as autarquias e as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público,
vinculadas às suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes, são imunes.
Já quanto à isenção, o art. 7º da referida lei está assim disposto:
Art. 7º - É isenta do imposto a transmissão:
I - de imóvel urbano, desde que seu valor não ultrapasse o equivalente a 4.379
(quatro mil trezentas e setenta e nove) UPF-RS e o recebedor seja ascendente,
46
47
48
COELHO, Sasha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo e da exoneração tributária. Belo Horizonte:
Del Rey, 1999. p. 164.
SOARES, Milton Delgado. O Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e as suas
hipóteses de incidência nos procedimentos sucessórios. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 92-93.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos
trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos
da lei;
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão
23
descendente ou cônjuge, ou a ele equiparado, do transmitente, não seja
proprietário de outro imóvel e não receba mais do que um imóvel, por ocasião
da transmissão; - Efeitos a partir de 01/01/01
II - decorrente da extinção de usufruto, de uso, de habitação e de servidão,
quando o nu-proprietário tenha sido o instituidor;
III - decorrente de doação em que o donatário for a União, o Estado do Rio
Grande do Sul ou município deste Estado:
IV - de imóvel rural, desde que o recebedor seja ascendente, descendente ou
cônjuge, ou a ele equiparado, do transmitente, e, simultaneamente, não seja
proprietário de outro imóvel, não receba mais do que um imóvel de até 25 (vinte
e cinco) hectares de terras por ocasião da transmissão e cujo valor não ultrapasse
o equivalente a 6.131 (seis mil cento e trinta e uma) UPF-RS; - Efeitos a partir
de 01/01/01
V -Revogado
VI - decorrente da extinção de usufruto, de uso, de habitação e de servidão,
relativos a bens móveis e imóveis, títulos e créditos, bem como direitos a eles
relativos, quando houver sido tributada a transmissão da nua-propriedade;
VII - decorrente de doação em que o donatário seja alguma das entidades
referidas nos incisos II, III e IV do artigo 5º; - Efeitos a partir de 01/01/93
VIII - de roupas, de utensílios agrícolas de uso manual, bem como de móveis e
aparelhos, de uso doméstico. - Efeitos a partir de 01/01/93
IX - "causa mortis" por sucessão legítima, cuja soma dos valores venais da
totalidade dos bens imóveis situados neste Estado, bens móveis, títulos e
créditos, bem como os direitos a eles relativos, compreendidos em cada quinhão,
avaliados nos termos do artigo 12, não ultrapasse a 10.509 (dez mil quinhentas e
nove) UPF-RS. (Redação dada pelo art. 1º, I, da Lei 11.074, de 30/12/97, Efeitos a partir de 01/01/01
X - cujo valor do imposto devido constante no documento de arrecadação resulte
em quantia inferior ao equivalente a 4 (quatro) UPF-RS.
XI - no período de 1º de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de 2014, conforme
relação de beneficiários, termos e condições previstos em instruções baixadas
pela Receita Estadual, por doação de bens ou direitos, ocorrida no Brasil ou
exterior, relacionada à realização das competições Copa das Confederações da
FIFA de 2013 ou Copa do Mundo da FIFA de 2014.
§ 1º - Nos casos das transmissões de que tratam os incisos I, IV, IX e X, o valor
da UPF-RS é o vigente na data da avaliação procedida pela Fazenda Pública
Estadual.
§ 2º - Revogado
§ 3º - Nas hipóteses dos incisos I e IV, a isenção somente beneficiará uma
transmissão realizada entre os mesmos transmitente e beneficiário ou recebedor
dos bens ou direitos. - Efeitos a partir de 01/01/90
§ 4º - Nos casos das transmissões de que tratam os incisos I e IV, se forem
transmitidos simultaneamente imóveis urbanos e rurais, ainda que apenas um de
cada espécie, não haverá direito à isenção. - Efeitos a partir de 01/01/90
§ 5º - A isenção de que trata o inciso III é extensiva às autarquias, às fundações
instituídas e mantidas pelo poder público e às companhias habitacionais
administradas pelo poder público, desde que o objeto da doação se destine às
respectivas atividades essenciais, observado o disposto em regulamento.Efeitos a partir de 01/01/90
§ 6º - A isenção prevista no inciso VII compreende somente os relacionados
com as finalidades essenciais do donatário.
§ 7º - Quando o donatário for entidade sindical de trabalhadores, instituição de
educação ou instituição de assistência social, a isenção prevista no inciso VII
condiciona-se à observância, por parte do donatário, do disposto nas alíneas do
parágrafo 4º do artigo 5º. - Efeitos a partir de 01/01/93
§ 8º - Para efeitos do disposto no inciso IX, excetuam-se da soma dos valores
venais nele referida aqueles relativos aos bens relacionados no Inciso VIII.
§ 9º - Para efeitos do disposto no inciso XI, na hipótese de haver pagamento
indevido do imposto, deverá ser observado o procedimento especial para
repetição do indébito previsto em instruções baixadas pela Receita Estadual.
24
Destarte, o valor da UPF-RS (Unidade de Padrão Fiscal do Rio Grande do Sul) para o ano de
2011 é de R$12,1913.49
Ainda, no caso de isenção, fazemos menção que no caso de o magistrado declará-la, ao julgar
o cálculo do imposto (CPC, art. 1.013, §2º), é hipótese plenamente possível, uma vez que a
competência pertencente à autoridade administrativa (CTN, 179), não exclui a competência do
magistrado.
Não obstante, o requerimento de isenção via judicial não depende da prerrogativa do mesmo já
ter sido realizado na esfera administrativa, conforme bem já decidiu o STJ no REsp 238161/SP.
Por outro lado, são casos de não-incidência (art. 6º da Lei Estadual):
Art. 6º - O imposto não incide:
I - Revogado
II - na renúncia à herança ou legado, desde que feita sem ressalvas, em benefício
do monte e não tenha o renunciante praticado qualquer ato que demonstre
aceitação;
III - na extinção de usufruto, se tiver sido tributada a transmissão da nuapropriedade até 28 de fevereiro de 1989;
IV - na doação, quando esta corresponder a uma operação incluída no campo de
incidência do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadoria e
sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação.
V - na extinção do condomínio, quando o valor transmitido não superar a cotaparte de cada condômino;
VI - Revogado.
Quanto à não-incidência, também vale dizer que, desde a abertura da sucessão, os frutos e
rendimentos percebidos, embora devam ser partilhados entre os herdeiros, ainda quem sobrepartilha,
já são dos herdeiros, logo não há incidência do ITCMD. Todavia, as despesas para a administração do
mesmo também não serão abatidas do monte-mor.50
4.2 RECOLHIMENTO VIA JUDICIAL NOS CASOS DE INVENTÁRIO E ARROLAMENTO
Aberto o processo de inventário, será feita a nomeação, pelo juiz, do inventariante, que
prestará compromisso. A partir desse fato, terá ele 20 dias para apresentar as primeiras declarações
(CPC, 993).
Passado esse prazo, o juiz mandará citar as partes, inclusive a Fazenda Pública, de acordo com
os preceitos do art. 999 do CPC. A partir disto, se abrirá prazo de 10 dias para vista das primeiras
declarações oferecidas pelo inventariante nomeado.
A Fazenda Pública, nos vinte dias posteriores à abertura de vista, cogitada no art. 1.000 do
CPC, dará a informação sobre o valor dos bens do espólio constantes do seu cadastro imobiliário. Se
os herdeiros concordarem com esse valor, pode-se aceitá-lo para o cálculo do ITCMD (CPC, 1.008).
Do mesmo modo, se a Fazenda não se opuser ao valor oferecido pelo inventariante, será o mesmo
aceto para fins de cálculo do tributo (CPC, 1.007).
49
50
RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Fazenda. ITCMD. Disponível em: <http://www.sefaz.rs.gov.br/
Site/MontaDuvidas.aspx?al=l_itcd_faq>. Acesso em: 21 mar. 2011.
PACHECO, José da Silva. Inventários e partilha na sucessão legítima e testamentária. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 570.
25
Entretanto, não entrando as partes em comum acordo, proceder-se-á a avaliação judicial dos
bens.
Dirimidas as questões a respeito dos valores dos bens, se passa a confecção do cálculo. Após
feito, ouvem-se: a) os interessados no prazo comum de cinco dias, que correrá em cartório; e b) a
Fazenda Pública, após o decurso daquele.
Se decorrerem impugnações, deverá o cálculo ser remetido à apreciação do contador, para as
alterações necessárias, quando procedentes as irresignações, e somente após ser submetido ao
julgamento pelo juiz (CPC, 1.013, §2º).
Pago o imposto, será emitida a certidão ou informação negativa de dívida para com a Fazenda
Pública, o que permite ao juiz proferir a sentença de partilha (CPC, 1.026).
O mesmo não ocorre nos casos específicos de arrolamento. Regina Celi Pedrotti Vespero
Fernandes51 discorre que, a teor do disposto no art. 1.036 do CPC, este é o procedimento utilizado
quando os herdeiros forem capazes e o valor do espólio for igual ou inferior a 2.000 OTN (obrigações
do tesouro nacional), hipótese na qual com o pedido de abertura do procedimento, deverá o
inventariante apresentar de plano as primeiras declarações devidamente instruídas, a partilha amigável
celebrada entre as partes e a prova de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas
rendas.
Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha e adjudicação, o formal de
partilha e os alvarás relativos aos bens só serão expedidos e entregues às partes após a comprovação
do recolhimento dos impostos, verificados pela Fazenda Pública (art. 1.031 e parágrafos do CPC).
4.3 RECOLHIMENTO DO ITCMD POR INVENTÁRIO NA VIA EXTRAJUDICIAL
O inventário e a partilha poderão ser feitos na via extrajudicial quando todos os herdeiros
forem capazes e concorde, inteligência do artigo. 982 do CPC, devendo todas as partes estarem,
obrigatoriamente, assistidas por advogado (art. 982, §1º, CPC).
O prazo para a abertura desse procedimento é de 60 dias a contar da abertura da sucessão,
ultimando-se nos 12 (doze) meses subseqüentes, podendo o juiz prorrogar tais prazos, de ofício ou a
requerimento de parte (art. 983 do CPC).
Destarte, os herdeiros devem proceder a quitação de todos os tributos relativos aos bens do
espólio, assim como efetuar o pagamento do ITCMD antes da lavratura das escrituras públicas de
inventário e partilha. Ressalta-se que, quanto à natureza deste documento, desde a origem já são títulos
hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como
para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento
de valores, independentemente de homologação judicial.
São documentos necessários à lavratura da escritura pública: 52 (a) certidão de óbito do autor da
herança (o falecido); (b) documento de identidade oficial com número de RG e CPF das partes e do
autor daherança; (c) certidões comprobatórias do vínculo de parentesco dos herdeiros; (d) escritura de
pacto antenupcial e seu registro, quando for o caso; (e) certidão de propriedade expedida pelo Registro
de Imóveis, dos bens imóveis, atualizada e não anterior à data do óbito; (f) certidão ou documento
oficial comprobatório do valor venal dos bens imóveis, relativo ao exercício do ano do óbito ou ao ano
imediatamente seguinte deste; (g) certidão negativa de tributos municipais que incidam sobre os bens
51
52
FERNANDES, Regina Celi Pedrotti Vespero. Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação –
ITCMD. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 115-116.
TRALDI, Mauricio. Inventário extrajudicial: condições, características e benefícios. Disponível em:
<http://www.pinheironeto.com.br/upload/tb_pinheironeto_artigo/pdf/020409103017anexo_bi2051a.pdf>. Acesso
em: 05 maio 2011.
26
imóveis do espólio; (h) certidão negativa conjunta da Secretaria da Receita Federal (SRF) e
Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN); (i) documentos comprobatórios do domínio e valor
dos bens móveis, se houver; (j) documento de informação da inexistência de testamento, a ser obtida
junto ao Colégio Notarial do Brasil; (k) certidão de Regularidade do ITCMD; (l) Certidão do IR,
DIAT e prova de quitação do imposto territorial rural, relativo aos últimos cinco anos, para bens
imóveis rurais do espólio.
Por fim, destacamos que o procedimento na via extrajudicial tem como benefício a livre
escolha do Tabelião pelas partes, bem como permite maior celeridade ao processo de inventário, vez
que incentiva a conciliação dos herdeiros, sendo procedimento que deve ser valorizado e considerado
pelas partes.
4.4 RECOLHIMENTO DO ITCMD EM ESCRITURAS PÚBLICAS OU PROCESSOS JUDICIAIS
DE OUTROS ESTADOS
Na transmissão de bens imóveis localizados no Rio Grande do Sul, quando se derem por
separação/divórcio, doação ou inventário realizado em outro Estado, seja por via judicial ou
extrajudicial, o procedimento a ser realizado pelo contribuinte, primeiramente, é a emissão de copia do
processo ou da minuta da escritura pública diretamente à Delegacia da Fazenda Estadual em Porto
Alegre, onde há a Agência do ITCMD.
Ademais, é impositiva a instrução da competente cópia com a seguinte documentação: no caso
de inventário é necessária a descrição completa dos bens a serem partilhados, a relação de herdeiros,
procuração dos inventariados, o plano de partilha; para os demais casos e incluindo o caso de
inventário, são necessárias as certidões de óbito/nascimento/casamento, a matrícula atual dos imóveis
a serem transmitidos, bem como informações adicionais a respeito do bens (estado de conservação,
medidas das construções, etc.).
Por conseguinte, a Agência do ITCMD fará a avaliação dos bens localizados no nosso Estado,
determinando o valor a ser recolhido à título do imposto, com a emissão e envio da competente guia
de arrecadação.
Efetuado o pagamento do imposto, é emitida a certidão de situação fiscal em nome do
inventariado/separando.
Contudo, não havendo imposto a ser pago, a certidão de situação fiscal será de plano enviada
ao remetente.
5 CONCLUSÃO
Diante de tudo o que foi exposto sobre o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação,
podemos concluir que é imposto de grande relevância vez que sua área de incidência é abrangente,
bem como ainda possui temáticas controversas.
Como dito no ponto inicial da obra, no Brasil esse imposto foi criado pelo Alvará régio de
17.06.1809 com o nome de “décima sobre heranças e legados”. Com a proclamação da República, o
imposto coube privativamente aos Estados na discriminação de rendas.
Com a evolução do ordenamento jurídico, o imposto sobre transmissão a título gratuito –
“causa mortis” e doação, estendeu-se aos bens e direitos móveis.
Ocorre que atualmente há várias questões controvertidas sobre o tributo, como a da
progressividade de alíquota – pendente de julgamento no STF, a falta de lei complementar a regular a
incidência no caso de doação, assim como o bis in idem que pode ocorrer na tributação da herança
27
quando também incidente o Imposto de Renda.
Essas temáticas levaram uma imensidão de contribuintes a buscar o Poder Judiciário, visando
segurança jurídica e a concretização de suas pretensões quanto a forma de recolhimento, diga-se, de
acordo com o que lhe é mais benéfico.
Como o objetivo principal do trabalho é fazer um abordado geral sobre a matéria e enfatizar os
posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, entendemos que a procura ao Poder Judiciário é uma
das melhores formas de resolver os conflitos encontrados, até porque, a ele cabe o resguardo das leis e
dos princípios jurídicos.
Com isso, acreditamos que as construções jurisprudências construirão, ao longo da história,
uma interpretação
Logo, a relevância do trabalho também se encontra em discutir tal implementação, que estaria
definitivamente desatendendo preceito constitucional, o que resulta em evidente discricionariedade do
Fisco Estadual, e vem a causar insegurança jurídica, já que todos os impostos ditos pessoais estão
definidos na Constituição Federal.
Porém, há inúmeros doutrinadores que se posicionam a favor da aplicação do princípio da
capacidade contributiva “sempre que possível”, de acordo com o disposto no parágrafo 1º, do artigo
145, da CF/88, mesmo nos impostos indiretos e reais, razão pela qual defendem a graduação de acordo
com os aspectos pessoais do contribuinte, e, por conseguinte, a atividade realizada pelos Fiscos
Estaduais.
Nesta esteira, o tema é de grande relevância tanto no aspecto econômico, social quanto jurídico.
Econômico, já que a incidência do ITCMD atinge um número incontável de contribuintes, e sua
base de cálculo é variável a partir do fato gerador ocorrido. Neste especial, também impende ressaltar
que há de se levar em conta que, nas transmissões causa mortis, ocorrem tantos fatos geradores
distintos quanto sejam os herdeiros ou legatários, ou seja, as bases de cálculo do imposto devem ser
separadas, fulcro no art. 35, parágrafo único, do CTN.
Social, uma vez que é um imposto de competência dos Estados e do Distrito Federal, devido por
toda pessoa física ou jurídica que receber bens ou direitos como herança, diferença de partilha ou
doação.
Importância jurídica, na medida em que tal imposto possui ainda questões controvertidas, entre
elas a da progressividade de alíquota, a responsabilidade do contribuinte (quem deve recolher o
imposto) e o local do efetivo recolhimento ao Fisco.
Portanto, demonstrada a suma importância do tema em questão e a sua atualidade, merecida é a
sua análise.
O Senado Federal é o responsável pela fixação das alíquotas máximas do imposto sobre
heranças e doações, a teor do art. 155, §1º, inciso IV, da Constituição Federal, cabendo, por
conseguinte, aos Estados e ao Distrito Federal o estabelecimento das mesmas, sem olvidar tal preceito.
O nosso Estado fixou alíquota progressiva em razão do valor da base de cálculo, dispondo que,
em função deste valor, as alíquotas podem variar de 1% a 8%, entendimento da Lei n.º 8.821/89.
Tal tratamento abriu margem a diversas discussões, uma vez que falta amparo na Constituição
para o tratamento dispensado pelo Fisco Estadual, que se defende evocando a aplicação do princípio
da capacidade contributiva.
28
Alguns autores sustentam que o princípio da capacidade contributiva é algo mais e algo
diferente relativamente ao princípio da igualdade.53 Outros defendem que é precisamente o critério de
aplicação do princípio da igualdade no âmbito do Direito Tributário. 54
Não tão distante deste entendimento, Humberto Ávila 55 complementa que “Igualdade tributária
não é apenas igualdade proporcional, mas também igualdade medida na capacidade contributiva do
sujeito passivo.”
Sob este enfoque, a corrente a favor da aplicação da progressividade da alíquota do ITCMD
afirma que é a forma de realizar o princípio da capacidade contributiva, ou seja, adequar o tributo à
capacidade econômica de cada contribuinte. Além disto, alegam que tal valoração pode desmotivar a
acumulação de riquezas e, ainda, contribuir para uma redistribuição de renda.
Porém, atualmente, foi promulgada a Lei 13.337/09, buscando diminuir as discussões a respeito
deste tema e as conseqüentes “aventuras jurídicas”, estabelecendo, no seu art. 1º, inciso III, que na
transmissão causa mortis a alíquota do imposto é 4%. Já no que tange as doações, será aplicável a
alíquota de 3%, fulcro no art. 1º, inciso IV, da referida Lei.
Lembra-se, contudo, que o entendimento da progressividade ainda pende de julgamento no STF,
estando, atualmente, com três votos a favor da constitucionalidade da medida, versus um contra.
A partir dessas definições, conjuntamente com a análise dos dispositivos infraconstitucionais e
posicionamentos doutrinários, objetiva-se a fundamentação necessária, a fim de que seja possível a
percepção da incompatibilidade existente na aplicação dada ao imposto em discussão com a nossa
Constituição Federal, bem como a elucidação dos seus aspectos controvertidos, que são de suma
importância, para uma melhor compreensão do tratamento dispensado à nossa Lei Estadual.
Então, para a sua concessão, o legislador tem tratado a matéria de maneira correta, pois veda
que o alimentante sobrecarregue seu patrimônio, impondo que os alimentos sejam devidos de acordo
com a possibilidade e a necessidade de ambas as partes. Porém, antes de tudo, não deve priorizar a
questão financeira, e sim a questão humanitária, familiar. O carinho e o afeto devem estar presentes
dentro das relações familiares e não somente a prestação pecuniária.
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