A Cartografia da Violência no Campo no Centro-Oeste: Uma análise sobre o Estado do Mato Grosso José Victor Juliboni Cosandey (Universidade Federal Fluminense) Mestrando em Geografia pela Universidade Federal Fluminense [email protected] Resumo A incorporação de áreas de cerrado ao complexo agroindustrial de carne e grãos transformou a paisagem regional do Centro-Oeste brasileiro. Um dos Estados da federação em que os movimentos sociais campesinos e a violência se apresentam de modo expressivo é o Mato Grosso. No bojo desse processo, a violência se confirma como a face perversa do agronegócio. A fim de revelar tal situação, este artigo tem como objetivo apresentar uma cartografia da violência no campo em Estado do Mato Grosso. A ideia básica é associar a violência com as diversas atividades produtivas, de modo a ter um quadro menos reducionista da violência. Não há espaço neste texto para um aprofundamento de cada tipo de violência. O que interessa é sua cartografia. O que se verifica é que, a partir da ocupação de propriedades realizada pelos movimentos sociais, principalmente nas fazendas de cana, pecuária e soja, aparecem as mais diversas formas de violência no campo, como os despejos, prisões, expulsões e assassinatos. Todavia, há o trabalho escravo, pois de todas as violências no campo, este não decorre da ocupação, e sim do interesse dos latifundiários na exploração da mão de obra. Palavras-chave Violência, Cartografia, Agronegócio, Mato Grosso. Introdução Os conflitos sociais no campo aparecem, hoje em dia, num contexto de crise rural, tendo em vista a concentração fundiária e o desemprego. Todavia, tais questões remontam ao passado colonial brasileiro. Já os movimentos sociais de reivindicação da Reforma Agrária ganham mais expressão no século XX. Dentre os principais estão as Ligas Camponesas e o Movimentos do Sem-Terra. A ação desses movimentos se dá no embate com os atores do agronegócio ou oligarquias agrárias tradicionais. O resultado é o conflito entre interesses assimétricos acerca do modo de produzir no campo e da propriedade da terra. A partir do conflito, a violência no campo mostra a face dolorosa do trato com os excluídos ou inseridos precariamente nos espaços agrários do país. A violência é fruto da luta pela terra. Vale aqui lembrar que conflito e violência são conceitos distintos. Girardi e Fernandes (2008, pg. 339) afirmam que, o conflito no campo é uma reação às desigualdades impostas pelo modo capitalista de produção. O conflito surge a partir de redes territoriais de resistência; logo, o conflito é resultado e expressão da resistência ao poder dos atores do agronegócio. Por outro lado, as alianças políticas entre o Estado e os atores capitalistas se utilizam da violência para controlar o conflito. A violência emerge do conflito e caracteriza-se pelo ataque físico ou moral sobre as pessoas que resistem às forças dominantes do capital. Além da violência privada, também existe a violência praticada pelo Estado contra camponeses através de ações diretas e indiretas, passivas ou ativas. 1 A violência direta, como aborda Vigna (2001 apud GIRARDI, 2008, pg. 293), é a violência que usa a força física contra o camponês, sendo utilizada pelo poder privado ou pelo Estado. Destacam-se os assassinatos, os despejos e as expulsões da terra. Na violência direta e ativa, o Estado se utiliza dos despejos judiciais, com o uso da força policial no cumprimento das ordens de despejo e no controle dos manifestantes, o que pode provocar mortes. Já a forma passiva da violência direta aparece na omissão do Estado em relação à violência direta praticada pelo poder privado contra os trabalhadores rurais. Por fim, a violência indireta é uma prática concomitante do Estado, com fazendeiros e empresários. A ação política é a principal forma de execução dessa violência. Em termos geográficos, “a violência permite mostrar outra dimensão da criminalidade, que é a da territorialização da mesma: a formação dos territórios da violência e como a violência se realimenta pela inércia espacial” (FERREIRA e PENNA, 2005, pg. 167). Sendo assim, é no território que “a pobreza, a exclusão social, a omissão do estado, a violência e as carências tornam-se mais visíveis, mais presentes e escapam das máscaras que as abordagens setoriais lhes imprimem e minimizam” (Ibidem, pg. 157). Como aborda Martuccelli (1999, pg.158), “o raciocínio foi, durante muito tempo, sempre o mesmo: a violência "vinda de baixo" e uma resposta à violência "vinda de cima" e esta, por sua vez, uma maneira de controlar ou de prevenir a violência que vem de baixo”. Há duas razões principais para a ocorrência da violência no campo: a concentração de terra e a impunidade. Segundo Caralo, A concentração de terra está diretamente relacionada como a concentração do poder. Os poucos donos das terras, que sempre receberam privilégios e exerceram influência sobre as instâncias do Estado brasileiro, além de se sentirem donos da natureza e com isso explorá-la até à exaustão, também se comportam como se fossem donos das pessoas, especialmente as mais pobres. Em nome de seus interesses pessoais, financeiros e políticos, os latifundiários exploram, escravizam, ameaçam, torturam e matam aqueles e aquelas que ousam lutar contra seus privilégios. [...] A impunidade [...] é uma importante cúmplice da violência e traz para a cena, além da não penalização dos responsáveis pelos crimes, uma situação de atemorização da população e de impotência das autoridades (CARALO, 2005, não pág.). A resistência do poder é realizada pelos atores sociais que estão presentes em condições desvalorizadas pela lógica da dominação, erguendo, assim, “trincheiras de resistência com base em princípios diferentes dos que permeiam as instituições da sociedade, ou mesmo oposta a estes últimos” (CASTELLS, 1998, pg.24). O principal local onde ocorre a resistência, neste caso, é o acampamento. Acampamentos e assentamentos são novas formas de luta de quem já lutou ou de quem resolveu lutar pelo direito à terra livre e ao trabalho liberto. A terra que vai permitir aos trabalhadores – donos do tempo que o capital roubou e construtores do território comunitário e/ou coletivo que o espaço do capital não conseguiu reter à bala ou por pressão – reporem-se/reproduzirem-se no seio do território da reprodução geral capitalista. Nos acampamentos, camponeses, peões e boiasfrias encontram na necessidade e na luta, a soldagem política de uma aliança histórica. Mais do que isso, a transformação da ação organizada das novas lideranças abre novas perspectivas para os trabalhadores. Greves rurais na 2 cidade para buscar conquistas sociais no campo são componentes ainda localizados no campo brasileiro, sinal inequívoco de que estes trabalhadores, apesar de tudo, ainda lutam. (OLIVEIRA, 2001, pg. 194). Ao observarmos esta citação do professor Ariovaldo, percebe-se que a resistência e a luta são a razão da constituição das redes políticas campesinas. A articulação de interesses coletivos entre peões, camponeses, boias-frias, sem-teto nas cidades, igreja (Comissão Pastoral da Terra), professores, partidos políticos, estudantes, ONGs etc. anunciam formas de ação política com estratégias definidas para a realização dos objetivos pretendidos. Os acampamentos/assentamentos são os locais onde a resistência camponesa é organizada na forma de rede política. Conforme Brenneisen, A história está repleta de acontecimentos que têm demonstrado que os camponeses, longe da passividade a eles atribuída, têm resistido a toda sorte de dominação que lhes tem sido imposta. Esta resistência tem se dado seja de maneira localizada, espontânea, em pequena escala, na vida cotidiana, ou através da resistência em larga escala. A própria organização dos sem-terra constitui-se numa resistência em larga escala, que tem imposto mudanças na configuração da propriedade da terra no Brasil e nas próprias relações sociais no campo (BRENNEISEN, 2002, pg. 244). No geral, o conflito entre os jagunços/pistoleiros e os posseiros começa na tentativa destes últimos de garantirem um pedaço de terra para trabalhar, o que grandes proprietários não têm permitido. Conforme Oliveira (1994, pg. 69), “as lutas proliferam e os movimentos sociais, em diferentes lugares, vão surgindo, unificando lutas aparentemente específicas: luta por terra; luta por preços mais justos; e luta contra a política agrícola discriminatória”. Dilemas sociais do agronegócio no Mato Grosso O Estado do Mato Grosso possui como grande destaque de sua economia o agronegócio (ou agrobusiness, em inglês), numa nítida constituição de um meio técnico-científicoinformacional, conforme assinala Santos (1996). O espaço agrário e agrícola é marcado por latifúndios pecuaristas ou de lavouras temporárias de grãos e cana. A monocultura de alto conteúdo tecnológico incorpora pouca mão de obra. Grande parte da produção é voltada para o mercado externo, tendo como principais produtos a soja, o algodão, o milho, a pecuária e a cana. Segundo a estatística de produção agrícola realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, o Estado do Mato Grosso é o segundo maior produtor de grãos do país. Destaca-se como o segundo maior produtor de milho, o maior produtor de soja e algodão, além de ter mais 27 milhões cabeças de gado, o maior rebanho e produção de carne do Brasil. O agronegócio veicula princípios da modernidade, representações simbólicas da modernização, da industrialização, da globalização, do desenvolvimento do campo e da cidade. Se discurso é uma forma de poder, o discurso do agronegócio alterou padrões identitários da vida, desterritorializando diversos grupos sociais. Logo, há uma problemática a ser discutida. A grilagem de terras, por exemplo, é reconhecida como um dos vilões da violência no campo em 3 Mato Grosso, já que terras do Estado ficam em mãos de um pequeno grupo em vez de ser destinada para a Reforma Agrária. Além disso, a violência no campo vem obtendo números expressivos. Em uma rápida análise dos últimos dados de cada tipo de violência no campo, percebe-se que o número de trabalhadores escravos libertados em Mato Grosso foi de 308 em 2009, um pouco mais de 7% do total no Brasil. No entanto, segundo a CPT, entre os anos de 1995-2002 e 2003-2009, o estado do Mato Grosso apareceu em segundo lugar entre os números de trabalhadores escravos, perdendo apenas para o estado do Pará. Nos assassinatos, 16% dos casos, no Brasil, aconteceram em MT em 2009. Em 2006, o número de famílias despejadas no Brasil foi de 17.443, sendo que em Mato Grosso foram 525 famílias, ou seja, 3% do total em todo o país. Nas expulsões, em 2005, foram 4.366 famílias expulsas pelo poder privado e, em Mato Grosso, foram 448 registrados, ou seja, 10,26%. O único índice que apareceu com um valor bem abaixo do normal foram as prisões no meio rural. No Brasil, havia um número de 917 presos em 2006, porém em Mato Grosso ocorreu apenas uma prisão. Tais números revelam que o atual celeiro agrícola brasileiro é também um dos campeões da violência no campo. O avanço da fronteira agrícola em direção à faixa de tensão ecológica tende a ampliar tais números. Isso comprova que o agronegócio tem uma de suas bases de reprodução à violência aos que resistem aos atores dominantes da agricultura capitalizada. A estratégia da violência é uma forma de eliminar os obstáculos sociais para a reprodução exclusiva do agronegócio no cerrado. Uma visão da violência do campo em Mato Grosso A partir de dados coletados no site e em revistas da Comissão Pastoral da Terra (CPT), foram elaborados mapas, tabelas e gráficos com os índices de Assassinato, Prisão, Despejo, Expulsão e Trabalho Escravo. Em alguns dados não estavam disponíveis as atividades agropecuárias realizadas nas fazendas, glebas, assentamentos1. Logo, aproximadamente 4% das ocorrências da violência no campo não apareceram. O estudo em tela analisa as diversas formas de violência praticadas contra os trabalhadores rurais, tais como assassinatos e prisões, que possuem uma expressiva ocorrência e números mais concretos dos que os de tentativas de assassinato e ameaças de morte, também presentes nas pesquisas da CPT. Despejo e expulsões foram escolhidos para perceber qual é o principal poder (público ou privado) que retira os camponeses das terras por estes ocupadas. Por fim, a análise do trabalho escravo se dá pelo fato de ser a forma de violência no campo com maior destaque em Mato Grosso, perante o cenário nacional. Por mais que esses dados fornecidos pela 1 Alguns dados da CPT não foram considerados por não haver informações suficientes do local onde ocorreu a ação ou o número preciso de pessoas que sofreram a ação. 4 CPT possam não ser a totalidade2, mostram o quanto a violência no campo é um problema sério no Brasil. Mais do que números, são vidas, são informações sobre a situação dos trabalhadores do campo e revelam a luta dos camponeses. As tabelas, os gráficos e os mapas apresentados codificam os problemas e a violência a que estão submetidos diversos grupos sociais no campo. No levantamento dos dados, foi considerada a principal atividade de cada fazenda, já que há fazendas que apresentam mais de uma atividade, seja na agricultura, na pecuária, no extrativismo. Em todos os casos, com exceção do trabalho escravo, os conflitos que ocorrem nas fazendas são entre os acampados/assentados e fazendeiros. Outro dado importante a ser apresentado é a presença de pequenos produtores rurais, que, na verdade, são os assentados com a emissão de posse da terra, constituindo-se em cooperativa de produtores com produção diversificada de alimentos para subsistência do grupo e venda dos excedentes. Vejamos, a seguir, a distribuição geográfica dos tipos de violência em Mato Grosso, entre 1990 e 2009, por tipo de atividade produtiva. Assassinato Os homicídios no meio rural em Mato Grosso são frequentes todos os anos. Foram 35 assassinatos no período de 1994 – 2009, relacionados à pecuária, responsável por 14 mortes, à soja com uma morte e 20 mortes nas pequenas propriedades rurais. Os municípios com maiores índices neste quesito foram Colniza, Rosário Oeste e Peixoto de Azevedo, apresentando cada um cinco mortes. As razões para os assassinatos estão relacionadas à reintegração de posse por parte do MST. O conflito direto se dá entre o MST e os grileiros, que, normalmente, contratam pistoleiros para matar os trabalhadores rurais. Outra razão do assassinato é o bloqueio de estradas por parte de integrantes do MST e os conflitos com caminhoneiros. As mesorregiões que apresentaram homicídio no campo são o Centro-Sul, Nordeste e Norte mato-grossense (Mapa1). Segundo o "Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros" realizado pela OEI (Organização dos Estados Ibero-Americanos), no ano de 2004, a cidade mais violenta do Brasil, e com apenas 12 anos de existência (pertencia ao município de Aripuanã) é Colniza, localizada no noroeste do Estado, fronteira com o Estado do Amazonas e com Rondônia. Durante muitos anos sem sede do Poder Judiciário e com um policiamento ineficiente, o município sofreu e ainda sofre com a impunidade. Não faltam terras griladas por pessoas com poderes políticos e econômicos na cidade que vendem “suas terras” para empresas madeireiras. O desmatamento ilegal faz com que a cidade esteja entre os municípios que mais desmatam no Brasil, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). 2 Os dados fornecidos pela CPT são dinâmicos, podendo ser atualizados. Algumas informações tendem a ser corrigidas e/ou acrescentadas, mesmo após a publicação dos dados. Por isso, os dados trabalhados e publicados neste artigo podem ser diferentes dos apresentados em outras publicações. 5 Os pequenos produtores rurais, ou seja, os assentados são os que mais sofrem com esta ação (Gráfico1), correspondendo a um pouco mais de 57% dos casos. Os camponeses também são a maioria dos assassinados na pecuária e na soja, devido às ameaças e aos homicídios provocados pelos pistoleiros. O número é expressivo nas pequenas produções rurais, pois é a partir do assentamento/acampamento que os camponeses podem conseguir a terra improdutiva da qual eles invadiram. Porém, os fazendeiros não querem perder a terra que lhes pertencem. O problema não são as pequenas propriedades rurais, e sim a intimidação que os fazendeiros fazem perante os camponeses. As pequenas produções rurais são o único jeito que os camponeses acharam para conseguir terras para sua subsistência. 6 Diversos casos não chegam às autoridades, e ocorrem no meio rural, distante da área central do município. O mais assustador é que as pessoas encaram os assassinatos como algo natural, até porque não há repressão e punição que condizem com a violência. Como informa o relatório “Mapa da Falência”, realizado em 2010 pelo Sindicato dos Investigadores da Polícia Civil de Mato Grosso, presente no site 24HorasNews3, não há, em diversos municípios de Mato Grosso, policiais suficientes, ou há municípios sem policiais, como é o caso de Planalto da Serra. Falta fiscalização principalmente para combater a chegada dos grileiros. Embora os casos de assassinatos apareçam com certa frequência em Mato Grosso, há uma vantagem maior em impor o medo do que matar, pois o terror psicológico sobre os trabalhadores sem-terra faz com que haja uma saída deles da região, sem que exista a necessidade das mortes e, consequentemente, aparecimento da mídia e da policia. Prisão As prisões são efetuadas principalmente contra os acampados. Dentre as atividades que apresentam este tipo de violência estão: algodão (oito presos), cana (cinco presos), madeireira (um preso), mandioca (quatro presos), pecuária (26 presos), pequenos produtores rurais (35 presos), quilombola (dois presos) soja (28 presos). Há um total de 109 prisões, entre os anos de 1990 - 2006 (Tabela I). Tabela I: Prisões no campo em Mato Grosso UF Ano Municípios Número de Vítimas MT 1990-2006 Cuiabá 7 MT 1990-2006 Pedra Preta 1 MT 1990-2006 São Pedro da Cipa 5 MT 1990-2006 Luciara 1 MT 1990-2006 Terra Nova do Norte 4 MT 1990-2006 Cáceres 1 MT 1990-2006 Marcelândia 4 MT 1990-2006 Mirassol D'Oeste 8 MT 1990-2006 Nobres 1 MT 1990-2006 Peixoto de Azevedo 7 MT 1990-2006 Rosário Oeste 1 MT 1990-2006 Confresa 4 MT 1990-2006 Alta Floresta 1 MT 1990-2006 Canabrava do Norte 4 MT 1990-2006 Chapada dos Guimarães 1 MT 1990-2006 Confresa 6 MT 1990-2006 Guarantã do Norte 12 MT 1990-2006 Luciara 2 MT 1990-2006 Novo São Joaquim 3 MT 1990-2006 Rosário Oeste 1 MT 1990-2006 Sinop 4 MT 1990-2006 Terra Nova do Norte 1 MT 1990-2006 Nossa Senhora do Livramento 2 MT 1990-2006 Novo São Joaquim 1 MT 1990-2006 Sinop 27 Fonte: Comissão Pastoral da Terra (1990 – 2006), adaptado pelo autor. 3 Atividades Algodão Algodão Cana Madeireira Mandioca Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Quilombola Soja Soja Informações no site: http://www.24horasnews.com.br/index.php?tipo=ler&mat=353154, acessado em 20/02/2011. 7 As prisões ocorreram devido à posse ilegal de armas, confronto de manifestantes contra a polícia, despejos efetuados em algumas fazendas, tentativas de assassinato, acusação de roubo, desacato à autoridade e formação de quadrilha. As prisões ocorrem em todas as mesorregiões de Mato Grosso (Mapa 2). São raros os casos em que os fazendeiros e seus comparsas são presos. Isso só acontece caso haja uma fiscalização da polícia para verificar a existência de posse ilegal de armas e/ou formação de quadrilha, devido a esquemas relacionados à extração ilegal de madeira. De acordo com o gráfico 2, as atividades que apresentam um maior destaque são os pequenos produtores rurais (32,1%), soja (25,7%) e pecuária (23,8%). Nas pequenas produções rurais, as prisões ocorrem por ações de despejo provocado por forças policiais. A partir do momento em que há a reintegração da posse de terra que estava na mão dos camponeses e retorna ao fazendeiro, há conflitos de interesses. A partir daí qualquer manifestação contrária ao despejo gera violência e prisões. 8 Mesmo em terras cedidas pelo INCRA há conflitos. O quilombo Mata Cavalo, em Nossa Senhora do Livramento, foi criado em 1999, já que esta área foi reconhecida pelo INCRA como território de remanescente de quilombos. O problema é que esta terra hoje está em mãos de fazendeiros, que lutam para expulsá-los. Numa das ações de despejo, feitas pela policia, ocorreu a prisão de três representantes do quilombo. Expulsão A expulsão ocorre quando o poder privado impõe o medo e a expulsão (a partir dos pistoleiros, jagunços) das famílias nos assentamentos/acampamentos. Foram 1679 pessoas expulsas, sendo 570 na pecuária, 553 nos pequenos produtores rurais e 556 na soja (Tabela II). Infelizmente, muitas famílias expulsas não avisam aos órgãos competentes sobre as ações irregulares que são cometidas pelos contratados dos fazendeiros. O medo de retaliação desloca a família para outra área de acampamento. Tabela II: Expulsão no campo em Mato Grosso Fonte: Comissão Pastoral da Terra (1990 – 2005), adaptado pelo autor A expulsão ocorre principalmente a partir do conflito direto entre fazendeiros e posseiros. Os primeiros detêm armas e intimidam, e, caso necessário, assassinam quem “invade” seu território. Localizam-se na mesorregião Centro-sul, Norte, Nordeste e Sudeste do Estado do Mato Grosso (Mapa 3). A resistência à ação de expulsão provoca conflito e, consequentemente, pode provocar mortes. Em 2005, ocorreu uma morte na fazenda Serra Verde, em Santo Antônio do Leverger, uma morte na Gleba Conselvam, em Aripuanã e três mortes na Gleba do Gama, em Peixoto de Azevedo. Alguns fazendeiros podem até não confirmar a presença de pistoleiros, mas todo 9 As únicas atividades (pecuária, soja e pequenos produtores rurais) que apresentaram expulsões no campo tiveram praticamente o mesmo número de famílias expulsas. No geral, os pistoleiros intimidam os moradores, os agridem fisicamente ou assassinam. Os pistoleiros também atiram próximo ao acampamento para amedrontar os acampados. . Despejo O despejo ocorre quando o poder público expulsa as famílias dos sem terra de uma determinada fazenda com a ação policial. O número de despejo é expressivo, pois entre o período de 1990 – 2006 ocorreu o despejo de 17366 famílias, uma média superior a 1000 famílias despejadas por ano. As atividades rurais que estão envolvidas com despejo são, a saber: algodão (1346), banana (75), cana (991), pecuária (6263), pequenos produtores rurais (6801), piscicultura (500), quilombo (70) e soja (1340), conforme Tabela III. Tabela III: Famílias despejadas do campo em Mato Grosso UF MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT Período 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 Municípios Campo Verde Cuiabá Jaciara Pedra Preta Rondonópolis Ribeirão Cascalheira Confresa Cuiabá Jaciara Alto Boa Vista Araputanga Cáceres Canabrava do Norte Famílias Despejadas 440 286 120 200 300 75 9 282 700 114 1070 4096 318 Atividades Algodão Algodão Algodão Algodão Algodão Banana Cana Cana Cana Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina 10 MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 1990-2006 Confresa Guarantã do Norte Jauru Marcelânida Nova Olímpia Acorizal Aripuanã Canabrava do Norte Chapada dos Guimarães Confresa Cuiabá Diamantino Guiratinga Itiquira Novo Mundo Nova Mutum Novo São Joaquim Nova Xavantina Peixoto de Azevedo Porto Alegre do Norte Querência Rondonópolis Rosário Oeste Santo Antônio do Leverger Sinop Sorriso Jangada Nossa Senhora do Livramento Campo Verde Comodoro Sinop 80 35 100 50 400 305 1400 84 581 665 83 500 30 380 100 100 6 139 100 12 47 250 350 260 1400 9 500 70 400 700 240 Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Peq. Prod. Rurais Psicultura Quilombo Soja Soja Soja Fonte: Comissão Pastoral da Terra (1990 – 2006), adaptado pelo autor As ordens de despejo ocorrem principalmente na pecuária e nas pequenas produções rurais (Gráfico 3). Essas duas atividades representam 75% das ordens de despejos. Os produtores despejados buscam a terra improdutiva e grilada. O problema para os camponeses é que a justiça, em vários casos, dá parecer favorável para os grandes proprietários de terra. 11 Os conflitos entre fazendeiros/assentados são o principal motivo da ordem de despejo. Por mais que o INCRA ceda terras consideradas do Estado para famílias em regime de comodato, essas terras são usadas por fazendeiros há anos. A outra situação é quando diversas fazendas com terras improdutivas chamam a atenção e o interesse das famílias ligadas ao MST para o uso próprio. O problema é que os proprietários das fazendas possuem dinheiro para contratar bons advogados, dificultando a posse definitiva dessas terras aos sem-terra. Em Mato Grosso, os despejos ocorreram em todo o Estado, como ilustrado no Mapa 4. Em uma das fazendas, localizada entre os municípios de Várzea Grande e Jangada, predomina a piscicultura, atividade que não utiliza toda a fazenda, deixando espaços improdutivos. Sendo assim, 500 famílias sem-terra acamparam, mas acabaram sendo despejadas. Os trabalhadores, quando sofrem as ações de despejo ou expulsão, acabam tendo os seus pertences destruídos ou deixados para trás. Os animais criados, as plantações, os barracos e, em alguns casos, a própria vida. Depois, acabam indo para outros assentamentos ou acampam na beira da estrada, criando conflitos com os caminhoneiros. Nas terras griladas, o Estado, quando pressionado, move uma ação judicial para recuperar esta terra. Os produtores rurais sem-terra chegam à propriedade e acampam, pedindo a posse da terra ao INCRA. Só que o fazendeiro ou a empresa pede a reintegração de posse por considerar os acampados invasores. Dá-se início a uma “guerra” judicial, que pode durar anos. Trabalho escravo: as formas de combate do Governo Brasileiro Segundo a Convenção nº 29 da OIT (Organização do Internacional do Trabalho), de 1930, a expressão "trabalho forçado ou obrigatório" compreende a “todo trabalho ou serviço exigido de 12 uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente” (art. 2°). A escravidão é uma forma de trabalho forçado, que faz com que uma pessoa tenha total controle sobre uma ou um grupo de pessoas, que estão vivendo em situação, em geral, degradante, somada à impossibilidade de deslocamento devido ao isolamento geográfico ou coerção física, até pagarem suas “dívidas” com o patrão. A forma mais comum, no Brasil, de trabalho forçado é a servidão por dívida, que vem quase sempre associada com as outras três formas de cercear a liberdade já citadas. A servidão por dívida é caracterizada quando o dono da fazenda ou de qualquer empreendimento rural proporciona um empréstimo aos trabalhadores, contratados pelo “gato” (contratador da mão de obra), sob a forma de adiantamento de dinheiro. Em seguida os trabalhadores têm seus direitos confiscados. A partir de 1995, quando o governo reconheceu a necessidade de combater o trabalho escravo, foram criados o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) e o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Escravo (GERTRAF). O Grupo de Fiscalização Móvel tem como objetivo, como informa o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a erradicação do trabalho escravo, por meio de ações fiscais nos focos previamente mapeados. Em 2003, o governo Lula prometeu a erradicação do trabalho escravo. O GERTRAF foi substituído pela Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE), que elaborou o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, hoje em sua segunda edição. Além do CONATRAE, também existe nos Estados o COETRAE (Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo), que age nas ações de combate ao trabalho ilegal e desenvolve ações preventivas, repressivas e de políticas públicas, buscando alternativas para que estes trabalhadores não retornem ao trabalho escravo através da qualificação via cursos profissionalizantes. O Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, como salienta o MTE: ...apresenta medidas a serem cumpridas pelos diversos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, Ministério Público e entidades da sociedade civil brasileira. Atualização de propostas que já vinham sendo articuladas em anos anteriores, o documento considera as ações e conquistas realizadas pelos 4 diferentes atores que têm enfrentado esse desafio ao longo dos últimos anos . O MTE criou uma forma de tentar impedir o crescimento do trabalho escravo, a chamada Lista Suja. Os fazendeiros que estão nesta lista ficam proibidos de receber empréstimos de bancos estatais. A lista é disponibilizada para consulta pública no site do MTE, sendo usada, principalmente, por empresas que querem evitar a compra de produtos que advém do trabalho escravo, impondo o fim da comercialização desses produtos, pelo menos até a saída do nome do fazendeiro da Lista Suja. A atualização da Lista Suja é semestral. O cadastro, conforme o assessor da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do MTE, Marcelo Campos, consiste: 4 Extraído do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Disponível em: http://www.mte.gov.br/trab_escravo/7337.pdf, acessado em 20/01/2011 13 ...na inclusão de empregadores cujos autos de infração estejam com decisão definitiva e não estejam mais sujeitos aos recursos na esfera administrativa, bem como, da exclusão daqueles que, ao longo de dois anos, contados da sua inclusão no Cadastro, lograram êxito em sanar irregularidades identificadas pela inspeção do trabalho e atenderam aos requisitos previstos na Portaria retro mencionada5. Ainda segundo Marcelo Campos, o MTE, ...como subsídio para proceder às exclusões, adotou o seguinte procedimento: análise das informações obtidas por monitoramento direto e indireto nas propriedades rurais incluídas, por intermédio de verificação “in loco” e por meio das informações dos órgãos e das instituições governamentais e não governamentais, além das informações obtidas junto à Coordenação Geral de Recursos da Secretaria de Inspeção do Trabalho. Outro aspecto a ser esclarecido é aquele relativo aos empregadores que recorreram ao Poder Judiciário visando sua exclusão do Cadastro. Em cumprimento à decisão judicial (liminar), o nome é imediatamente excluído e assim permanece até eventual suspensão da medida liminar ou decisão de mérito. Havendo decisão judicial pelo retorno do nome ao Cadastro, este passa novamente a figurar entre os infratores e a contagem do prazo se reinicia computado o tempo anterior de permanência no Cadastro, até que se completem dois anos. A propriedade volta, então, a ser monitorada durante esse tempo restante, para efeito de futura exclusão por decurso de prazo e por 6 cumprir as demais exigências previstas na aludida portaria . Além disso, um fator de grande importância é a necessidade de reinserção dos trabalhadores resgatados. O governo os insere no programa Bolsa Família e no Programa Nacional Resgatando a Cidadania, projeto piloto em Mato Grosso, para fazer intermediação de mão de obra. Portanto, se alguma empresa estatal precisar de um trabalhador, procura os trabalhadores cadastrados neste programa. Trabalho esco52(a )cperíodo 2000–2009 No período de 2000–2009, foram 76 municípios com 7405 casos de trabalhadores resgatados. O Estado do Mato Grosso possui 141 municípios, metade deles tem registro de esco52idão. As principais atividades envolvidas com a esco52idão são: algodão (879 trabalhadores), cana (2066 trabalhadores), pecuária (2524 trabalhadores) e soja (1543 trabalhadores) (Tabela 6). As duas principais atividades agropecuárias do estado (soja e a criação de gado) correspondem a 62% dos trabalhadores encontrados, conforme Tabela IV. Tabela IV: Trabalhadores esco52(sa )ccampo em Mato Grosso (2000-2009) 5 14 MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT MT Porto Estrela Porto Espiridião Lucas do Rio Verde Sorriso Campos de Júlio Confresa Cuiabá Lambari d'Oeste Lucas do Rio Verde Nova Olímpia Poconé Feliz Natal Marcelândia Nova Ubiratã Pontal do Araguaia Carlinda Nova Ubiratã Nortelândia Rosário Oeste Bom Jesus do Araguaia Campo Novo do Parecis Marcelândia Nova Ubiratã Tapurah Alta Floresta Alto Boa Vista Araputanga Barra do Garças Brasnorte Cáceres Canabrava do Norte Cláudia Colniza Comodoro Confresa Diamantino Feliz Natal Guarantã do Norte Jauru Juara Nobres Nova Bandeirantes Nova Canaã do Norte Nova Guarita Nova Lacerda Nova Maringá Nova Monte Verde Novo Mundo Nova Mutum Nova Xavantina Paranaíta Peixoto de Azevedo Pontal do Araguaia Pontes e Lacerda Porto dos Gaúchos Querência Ribeirão Cascalheira Rondolândia Rosário Oeste Santa Rita do Trivelato 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 2000 - 2009 12 11 6 9 249 1179 35 96 40 67 400 15 5 12 23 13 6 58 11 26 14 9 6 69 43 65 6 17 61 5 11 18 16 6 98 1 20 95 101 106 100 66 11 9 3 10 49 126 33 17 19 223 16 10 14 58 9 33 10 75 Algodão Arroz Avicultura Avicultura Cana Cana Cana Cana Cana Cana Cana Carvoaria Carvoaria Carvoaria Extração de Látex Extrativismo Mineral Extrativismo mineral (calcário) Extrativismo mineral (pedra) Extrativismo Vegetal (Pau-de-Balsa) Madeireira Madeireira Madeireira Madeireira Milho Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina Pecuária bovina 15 MT Santa Terezinha 2000 - 2009 136 Pecuária bovina MT São Félix do Araguaia 2000 - 2009 165 Pecuária bovina MT São José do Xingu 2000 - 2009 94 Pecuária bovina MT Tabaporã 2000 - 2009 21 Pecuária bovina MT Tapurah 2000 - 2009 106 Pecuária bovina MT Vila Bela da SantíssimaTrindade 2000 - 2009 6 Pecuária bovina MT Vila Rica 2000 - 2009 436 Pecuária bovina MT Paranatinga 2000 - 2009 71 Produção de semente de capim MT União do Sul 2000 - 2009 29 Produção de semente de capim MT Alta Floresta 2000 - 2009 11 Soja MT Bom Jesus do Araguaia 2000 - 2009 7 Soja MT Brasnorte 2000 - 2009 24 Soja MT Campo Novo do Parecis 2000 - 2009 172 Soja MT Campo Verde 2000 - 2009 15 Soja MT Campos de Júlio 2000 - 2009 35 Soja MT Comodoro 2000 - 2009 100 Soja MT Gaúcha do Norte 2000 - 2009 9 Soja MT Ipiranga do Norte 2000 - 2009 6 Soja MT Lucas do Rio Verde 2000 - 2009 35 Soja MT Nova Canaã do Norte 2000 - 2009 11 Soja MT Nova Monte Verde 2000 - 2009 10 Soja MT Nova Ubiratã 2000 - 2009 377 Soja MT Novo São Joaquim 2000 - 2009 1 Soja MT Poxoréo 2000 - 2009 1 Soja MT Ribeirão Cascalheira 2000 - 2009 50 Soja MT Santo Antônio do Leste 2000 - 2009 71 Soja MT São José do Rio Claro 2000 - 2009 25 Soja MT Sapezal 2000 - 2009 245 Soja MT Sinop 2000 - 2009 118 Soja MT Sorriso 2000 - 2009 111 Soja MT Tangará da Serra 2000 - 2009 50 Soja MT Tapurah 2000 - 2009 59 Soja Fonte: Comissão Pastoral da Terra (2000 – 2009), adaptado pelo autor. As principais commodities em Mato Grosso são a carne, a soja, a cana, o milho e o algodão. Consequentemente são influenciadas pelas cotações do mercado internacional. Há produtores, como já sinalizado, que reduzem os custos trabalhistas e ignoram direitos humanos a fim de obter posições de destaque no cenário de competitividade. Daí o destaque destas atividades nos registros de trabalho escravo (Gráfico 4). 16 Há um total de 217 casos registrados como análogos a trabalho forçado neste mesmo período. A pecuária aparece em 113 casos, 52% das fiscalizações e diversas fazendas reincidentes. Conforme o Mapa 5, todas as mesorregiões registram este problema. O número de ocorrência aumentou nos últimos anos porque a fiscalização melhorou. A produção do etanol virou um dos grandes destaques da política ambiental brasileira. A fim de reduzir o custo de produção, há a ocorrência de escravidão por dívida nos canaviais. Um dos casos em Mato Grosso foi a Destilaria Araguaia (antiga Gameleira) que fica em Confresa. Em 2001, apresentou trabalho escravo, e o resgate de 105 pessoas. Em 2003, foram 13 libertados trabalhadores. Em 2005, o número de trabalhadores submetidos à escravidão na usina subiu para 1.003 pessoas. Por fim, em 2009, foram 55 trabalhadores libertos, ou seja, chegando a um total de 1176 trabalhadores em situações subumanas. Umas das mais importantes ONGs brasileiras contra a violência no campo e, principalmente, contra o trabalho escravo, a ONG Repórter Brasil, publicou, em 2009, o relatório “O Brasil dos Agrocombustíveis - Impactos sobre a terra, o meio e a sociedade - Cana 2009”. Consta no relatório que a Gameleira entrou para a lista suja do trabalho escravo, divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em novembro de 2003 e saiu em maio de 2008. Durante esse período, ela chegou a ter seu nome retirado da lista oficial de empregadores escravagistas por força de liminares, posteriormente derrubadas pela própria Justiça. O mesmo relatório aponta que, em 2006, A Gameleira passou a se chamar Destilaria Araguaia, uma tentativa de desvincular a imagem dos escândalos trabalhistas. [...] O MPT ofereceu à Destilaria Araguaia um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), por meio do qual a empresa se compromete a se adequar às normas de segurança e saúde no trabalho. Entre as medidas exigidas para que ela volte a funcionar está a construção de aterramentos para os geradores de energia elétrica, a instalação de dispositivos de abertura interna para câmaras frias e de sistemas de proteção 17 contra incêndios e explosões em áreas consideradas de risco. [...] A Destilaria Araguaia processa de 300 a 350 mil toneladas de cana por ano, produzindo cerca de 25 milhões de litros de etanol. [...] No período em que constava da lista suja do trabalho escravo, a então Gameleira não conseguia vender sua produção a grandes distribuidoras, comprometidas com o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Ao sair do cadastro oficial de escravagistas, porém, a agora Destilaria Araguaia voltou imediatamente a ser fornecedora da Petrobras. (REPÓRTER BRASIL, 2009, pg. 17-19) Além da cana, a intensa mecanização no setor sojicultor promove algumas atividades relacionadas à preparação do solo que envolve trabalho manual. O trabalho escravo na soja ocorre porque os fazendeiros utilizam os trabalhadores tanto para limpar antigos pastos quanto para derrubar mata nativa. São trabalhadores temporários, contratrados para serviços que requerem baixa qualificação profissional e grande força física. Assim como a soja, a colheita do algodão é praticamente toda mecanizada, mas existe a necessidade do serviço braçal de limpar a terra, catando as raízes e preparando para um novo plantio. Essa é a brecha para a introdução do trabalho escravo. Considerações Finais A violência no campo de Mato Grosso não é visível na paisagem. Em áreas extensas de soja, cana e gado, quem olha não percebe que, atrás do uso produtivo da terra, há uma face perversa, marcada pela concentração fundiária, assassinatos, despejos e trabalho escravo. É nesse cenário de contradições inerentes ao agronegócio que práticas de resistências se afirmam e anunciam conflitos fundiários. A luta é por direito à terra de trabalho em contraposição à terra de negócio. Sendo assim, o agronegócio já carrega em si resistências a uma racionalidade que é nociva à socio-biodiversidade. A cartografia da violência no campo em Mato Grosso apresenta resultados em consentâneo com o avanço da fronteira agrícola. O Mapa 6, da distribuição do trabalho escravo, entre 2000 e 2009, revela uma concentração de ocorrência na faixa de tensão ecológica, onde os problemas de desmatamento são mais relevantes, para fins de abertura da pecuária. É ai onde a fronteira avança por conta da nova logística de transporte que se dirige para o Norte, sobretudo no trecho da rodovia BR-163, em direção à Santarém (PA). O Nordeste de Mato Grosso é também uma área de abertura de novos projetos do agronegócio. Querência é o município de destaque no desmatamento para pecuária e lavoura de grãos. Já onde a fronteira já está consolidada, é a agricultura capitalizada a principal responsável pelo trabalho escravo. As prisões e expulsão de famílias se concentram também na faixa de tensão ecológica, em direção à floresta equatorial, área de interesse do agronegócio brasileiro. Por fim, os assassinatos repetem o mesmo padrão locacional devido as mesmas razões já assinaladas. Tal quadro sinaliza para o fato de a violência do campo em Mato Grosso ser resultado das contradições socioespaciais do capitalismo e da relação conflituosa entre as classes sociais. De acordo com Alentejano (2008), o conflito no campo é a manifestação dos antagonismos de classes sociais e da construção de identidades coletivas, motivadas por interesses coletivos 18 compartilhados e contrários à ordem capitalista. Para tanto, a luta exige formas de organização dos movimentos sociais. É nesse ponto que a constituição de redes políticas de resistências ao agronegócio se afirma na defesa de ideologias próprias e posição política de combate ao avanço da fronteira agrícola capitalista. A violência no cerrado mato-grossense é fruto do recuo da sociobiodiversidade em favor do agronegócio. De fato, os conflitos e a violência no campo são o meio pelo qual as representações e discursos da modernidade avançam e constituem territórios corporativos sob a égide do agronegócio internacional. O uso da força e do medo tem sido um dos imperativos das redes políticas das corporações para atingir os objetivos e metas pretendidos. Daí a importância da Reforma Agrária e da luta dos sem-terra por moradia, educação, alimentação, saúde, respeito à socio-biodiversidade e à função social da terra. A luta por tais direitos se traduz em conflito e violência. Logo, a violência no campo é um indicador de que os movimentos sociais organizados no campo são uma realidade. Todavia, infelizmente, as questões fundiárias ainda não são assumidas como um problema nacional, em face do peso da urbanização dominante do país, cenário por excelência das ideias de modernidade e progresso. O rural ainda carrega o estigma do atraso, do arcaico, do tradicional, do periférico e do vazio demográfico. Talvez o debate em torno dessas representações simbólico-ideológicas nas universidades, escolas e famílias contribuam para uma maior mobilização e militância na defesa dos sem-terra e de outra racionalidade socio-produtiva. Referências Bibliográficas: ALENTEJANO, Paulo Roberto Raposo. Uma análise geográfica dos conflitos no campo brasileiro. In: O Brasil, a América Latina e o mundo: espacialidades contemporâneas. Rio de Janeiro: Lamparina, 2008. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Comissão Especial do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana da Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Brasília, DF, 2003. Disponível em: http://www.mte.gov.br/trab_escravo/7337.pdf (acesso em 20/01/2011) BRENNEISEN, E.C.. Relações de Poder, Dominação e Resistência: o MST e os assentamentos rurais. Cascavel: Edunioeste, 2002 CARALO, Paulo de Tarso. Campanha Internacional contra a violência no campo: instrumento de luta pela reforma agrária e contra a violação dos direitos humanos. Disponível em: www.contag.org.br/imagens/docs/CampanhaInternacionalContraViolencia-Artigo.pdf. Acessado em Fevereiro de 2011. CASTELLS, Manuel. O Poder da Identidade (A era da informação: economia, sociedade e cultura), São Paulo: Paz e Terra, 1998, 2ª Ed. FERREIRA, I. C. B. & PENNA, N. A. Território da violência: um olhar geográfico sobre a violência urbana. GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, Nº 18, pp. 155 – 168, 2005. 19 GIRARDI, E. P.; FERNANDES, B. M. Geografia da conflitualidade do campo brasileiro. In: FERNANDES, B. M.; MEDEIROS, L. S. de; PAULILO, M. I. (orgs). História social do campesinato no Brasil – lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas e conquistas. São Paulo: Expressão Popular, 2008. MARTUCCELLI, D. Reflexões sobre a violência na condição moderna. Tempo Social; Revista de Sociologia da USP, n.º 11(1), 1999. pp. 157-175. ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Uma aliança global contra o trabalho forçado. Relatório Global do Seguimento da Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho – 2005. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/trabalho_forcado/oit/relatorio/relatorio_global2005.pdf>. Consultado em: 20/11/2010. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A longa marcha do campesinato brasileiro: movimentos sociais, conflitos e Reforma Agrária. Estud. av. vol.15 no.43 São Paulo, 2001. _______________________ Geografia das lutas no campo, 6 ed., São Paulo, Contexto, 1994 REPÓRTER BRASIL. O Brasil dos Agrocombustíveis: o impacto das lavouras sobre a terra, o meio e a sociedade. Volume 3: Cana-de-açúcar. Centro de Monitoramento dos Agrocombustíveis, 2009. Disponível In: http://www.reporterbrasil.org.br/documentos/o_brasil_dos_agrocombustiveis_v6.pdf (acessado dia 22/01/2011). SANTOS, M. A Natureza do Espaço. São Paulo: Hucitec, 1996. VIGNA, Edélcio. A bancada ruralista: um grupo de interesse. Argumentos. n.8. Brasília: INESC, 2001, apud GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposição teórico-metodológica de uma cartografia Geográfica crítica e sua aplicação no desenvolvimento do Atlas da questão agrária brasileira. 2008. Tese (Doutorado) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2008. Sites Consultados: portal.mte.gov.br (acessado em Janeiro de 2011) sigsif.agricultura.gov.br (acessado em Janeiro de 2011) www.24horasnews.com.br (acessado em Janeiro de 2011) www.cptnacional.org.br (acessado em Outubro de 2010) www.ibge.gov.br (acessado em Janeiro de 2011) www.incra.gov.br (acessado em Janeiro de 2011) www.inpe.br (acessado em Janeiro de 2011) www.oei.es (acessado em Fevereiro de 2011) www.oitbrasil.org.br (acessado em Janeiro de 2011) 20