Projeto Interciências-Biologia: produção de materiais didáticos reais e virtuais para o ensino de ciências Carla Cardozo Pinto de Arruda – UFMS ([email protected]); Paulo Robson de Souza – UFMS ([email protected]); Marilyn Aparecida Errobidarte de Matos – UFMS ([email protected]); Edy Wilson Ferreira Mendes da Silva – UNIGRAN ([email protected]); Brenda Cavalcante Matos – UFMS ([email protected]); Suelen Sandim de Carvalho – UFMS ([email protected]) Categoria D A criação e disseminação, pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), de acervos diversificados de materiais pedagógicos interessantes e de boa qualidade têm papel fundamental para esta instituição, contribuindo para reafirmar o princípio da indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão. Ao proporcionar a aplicação do conhecimento científico gerado pela instituição em prol da educação e, por extensão, da sociedade, queremos criar oportunidades para que professores e alunos vivenciem significativas experiências de integração (UFMS, 2010). O Projeto INTERCIÊNCIAS: AÇÕES DA UFMS PARA CIÊNCIAS, COMPUTAÇÃO E MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA vem sendo desenvolvido desde 2011 a partir de uma iniciativa integrada dos Cursos de Ciências Biológicas, Química, Matemática e Computação para o Edital CAPES/DEB Nº 033/2010 – “Investindo em novos talentos da rede de educação pública para inclusão social e desenvolvimento da cultura científica”. O projeto, associado à Casa da Ciência de Campo Grande – MS, propôs o desenvolvimento de oficinas para professores e alunos do Ensino Básico, concretizando uma importante parceria entre a Universidade e a Escola. O projeto alia-se ao pensamento de Freire (1997): “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino..., (...) o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade”. Desde 1992, licenciandos e professores do curso de Ciências Biológicas da UFMS vêm produzindo regularmente materiais de apoio ao ensino de Ciências Naturais e Biologia contextualizados à biodiversidade brasileira. Hoje, são mais de 40 produções editoriais, sendo 15 livros, quatro capítulos de livros e 21 produções de natureza diversa. Nesse período, foram realizadas diversas atividades de extensão relacionadas aos materiais produzidos, como jogos artesanais, textos avulsos, livros inéditos e um acervo fotográfico de mais de dez mil imagens – obtidas em expedições científicas, com colaboração de pesquisadores de diversas áreas (Zoologia, Botânica, Etnobotânica, Ecologia, Geologia, Arqueologia etc.). Estes materiais e pesquisas, sediados no Laboratório de Prática de Ensino de Ciências e Biologia da UFMS, se constituem em matéria prima para a elaboração de novos empreendimentos 1 educacionais, quer seja na forma de projetos aplicados, quer seja na forma de publicações impressas ou eletrônicas. Através deste projeto, a proposta do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas foi dar um destino social aos Objetos de Aprendizagem e outros materiais pedagógicos reais e virtuais produzidos no Curso, utilizando-os na capacitação e atualização de professores e alunos da Rede Pública de Ensino de Campo Grande, Estado de Mato Grosso do Sul, Brasil. Ao socializar estes materiais didáticos e preparar os professores para a sua utilização em sala de aula, estamos contribuindo para um ensino de Ciências de melhor qualidade, difundindo os conhecimentos, métodos e técnicas produzidos na Universidade. A característica fundamental do projeto é o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) voltadas ao ensino de ciências (ensino fundamental) e de biologia (ensino médio). Estas técnicas permitem o melhor aproveitamento das ferramentas de informática na produção de conteúdos (textos, imagens, esquemas) e instrumentos de apoio ao ensino de ciências/biologia, com ênfase na exploração dos programas Word, Corel Draw, Pagemaker e Photoshop. Um dos mais significativos instrumentos utilizados pelas TIC são os objetos de aprendizagem (OA). Segundo Sette (2000), objetos de aprendizagem são definidos como construções virtuais, programadas, além de permitirem designs, cores, movimentos e efeitos; são um novo tipo de instrução utilizando outras linguagens de computação. Configuram-se em imagens virtuais que formam um constructo de informações e saberes que têm por objetivo facilitar o processo de ensino e aprendizagem, exatamente pela mediação técnica das tecnologias, aqui denominadas pela pesquisadora como tecnologias da inteligência. Dentre os conceitos acadêmicos para OA, destacamos o de Beck, apud Wiley (2000): “Qualquer recurso digital que possa ser reutilizado para o suporte ao ensino. A principal ideia dos OAs é quebrar o conteúdo educacional em pequenos pedaços que possam ser reutilizados em diferentes ambientes de aprendizagem, em um espírito de programação orientada a objetos”. Os OAs, desenvolvidos em PHP e Flash, são baseados na proposta metodológica do projeto RIVED - Rede Interativa Virtual de Educação, a qual possui as seguintes características: i) elaboração do design; ii) roteiro; iii) produção do próprio objeto de aprendizagem; iv) e guia do professor. Após a elaboração, os OAs podem ser disponibilizados em repositórios nacionais ou internacionais, como o Banco Internacional de Objetos Educacionais, que possui objetos educacionais de acesso público, em vários formatos e para todos os níveis de ensino (http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/). Foram desenvolvidas três atividades, em forma de oficinas de 40 horas/aulas, oferecidas a professores da Rede Municipal e Estadual de Ensino de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, Brasil. As Atividades 1 e 2 foram realizadas no Laboratório de Informática do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS)/UFMS e na Sala de Informática da Casa da Ciência de Campo Grande, tendo como característica fundamental o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) voltadas ao ensino de ciências e de biologia. Segundo Sette (2000), o uso das TICs na escola tem evidenciado a necessidade de repensar questões relacionadas com a aprendizagem, com a prática do professor e como integrar as diferentes tecnologias numa perspectiva didática. O desenvolvimento de OAs não é tarefa simples. A literatura nos mostra que, para a criação desses objetos, necessita-se de uma equipe multidisciplinar, que reconheça a importância de combinar conhecimentos na área específica de um conteúdo disciplinar com conhecimentos sobre princípios de processo de aprendizagem. Quanto mais se conhece sobre o processo de aprendizagem, mais convincentes se tornam as simulações e atividades interativas, facilitando a aprendizagem. Desta forma, a Atividade 1 propôs oficinas de 2 instrumentalização para os programas utilizados durante a elaboração dos OAs e a Atividade 2 propôs o desenvolvimento de OAs utilizados no ensino de ciências e biologia. A Atividade 1, “Oficinas de instrumentalização para a elaboração de materiais didáticos virtuais”, abordou de forma prática quatro programas usualmente utilizados durante a elaboração de OAs: Flash, Movie Maker, WebQuest e Blog. Os professores participantes tiveram a oportunidade de explorar programas que podem ser utilizados como ferramentas didático-pedagógicas no ambiente escolar, modernizando as aulas e aproximando o aluno da escola. A Oficina de Flash teve como objetivo explorar o aplicativo Flash como ferramenta pedagógica para o ensino, oferecendo os passos iniciais para o professor criar animações dinâmicas e hospedá-las em uma página na internet. A oficina de WebQuest discutiu o conceito de WebQuest, apresentando fundamentação teórica e prática sobre o uso docente e discente das WebQuests, visando ao seu uso no ambiente escolar. Examinando os fundamentos do modelo proposto pelo autor Bernie Dodge, foram observados aspectos relacionados à aprendizagem cooperativa, construtivismo e desenvolvimento de habilidades cognitivas, mostrando a possibilidade de construção de ambientes de aprendizagem que aproveitem de modo eficiente e sistemático os recursos existentes na Internet. A Oficina Movie Maker teve como finalidade a instrumentalização do professor para a utilização de recursos do Movie Maker (WMM) como ferramenta pedagógica. Este software de edição de vídeo permite diversas situações pedagógicas, proporcionando aos alunos a criação de filmes, argumentos, dramatização de textos e histórias, tendo ao dispor vários cenários que podem ser utilizados a partir de diferentes perspectivas. Já a oficina de Blog instrumentalizou a criação de vários tipos de blogs, que podem servir como complemento ao ensino presencial, uma vez que estes sistemas digitais configuram-se em veículos privilegiados de comunicação. A Atividade 2, “Objetos de Aprendizagem de Ciências: Como desenvolver e utilizar?”, apresentou alguns materiais didáticos virtuais produzidos nas aulas de TICsBiologia, capacitando os professores para, a partir da sua utilização, desenvolverem em sala de aula dinâmicas de aprendizagem sobre o conteúdo. Os materiais virtuais produzidos (animações, jogos, histórias em quadrinhos etc.) podem ser publicados em meio digital, ampliando seu alcance. Alguns OAs são acompanhados de materiais utilizados em atividades práticas em laboratório, aliando teoria e prática. Como exemplos, “De olho no piolho” é uma história em quadrinhos virtual sobre a pediculose, acompanhada por jogos de aprendizagem; “Genética dos Grupos Sanguíneos/Sistema ABO” é uma animação sobre a transfusão de sangue e suas consequências; “Frevo da Capivara” é um vídeo que introduz conceitos de ecologia e manejo de animais do Pantanal brasileiro. Além de incentivar os professores a prosseguirem seu aprendizado de modo continuado, a oficina contribuiu para uma formação associada às demandas da sociedade moderna, notadamente em direção à inclusão digital. Na Atividade 3, “Coleção de Lâminas e Modelos Didáticos para o Ensino de Ciências e Biologia”, foram oferecidas oficinas teórico-práticas utilizando os laboratórios de Botânica, Biologia Geral, Microbiologia e Parasitologia do CCBS/UFMS, com o auxílio de professores, técnicos e licenciandos da Universidade. As atividades foram realizadas inicialmente através de uma abordagem teórica sobre os respectivos temas e reflexões sobre os conteúdos trabalhados. Em outro momento, os saberes adquiridos foram vivenciados através da prática, de forma interdisciplinar. Nas aulas práticas, os professores participantes aprenderam e confeccionar diferentes materiais didáticos e produziram uma coleção de lâminas contendo itens de Botânica (Anatomia Vegetal de Criptógamas e Fanerógamas), Microbiologia (diferenciação morfotintorial de bactérias e fungos - Figura 1), Parasitologia (Trypanosoma cruzi, Leishmania sp., piolhos e tênias - Figura 2) e Entomologia (montagem de coleção 3 entomológica contendo triatomíneos ou barbeiros, flebotomíneos, culicíneos e anofelinos - Figura 3). Na oficina de Biologia Celular, os professores montaram diferentes modelos de células e suas organelas, bem como desenvolveram modelos de divisão celular (Figura 4). Figura 1. Oficina de Microbiologia. Diferenciação morfotintorial de bactérias e fungos. (Atividade 3. Coleção de Lâminas e Modelos Didáticos para o Ensino de Ciências e Biologia). Projeto Interciências/Biologia 2011. Foto: Grupo Biolocus. A B Figura 2. Oficina de Parasitologia. Lâminas para identificação de flebotomíneos vetores das leishmanioses (A) e esfregaço de aspirado de medula óssea para identificação de formas amastigotas de Leishmania sp (B). (Atividade 3. Coleção de Lâminas e Modelos Didáticos para o Ensino de Ciências e Biologia. Projeto Interciências/Biologia 2011). Foto: Grupo Biolocus. 4 A B b C D E d Figura 3. Oficina de Entomologia. Ciclo biológico dos triatomíneos vetores da doença de Chagas (A, B e C). Coleta de insetos no Campus da UFMS para confecção da coleção entomológica (D e E)). (Atividade 3. Coleção de Lâminas e Modelos Didáticos para o Ensino de Ciências e Biologia. Projeto Interciências/Biologia 2011). Foto: Grupo Biolocus. 5 Figura 4. Oficina de Biologia Celular. Montagem de modelos de células, organização e divisão celular. (Atividade 3. Coleção de Lâminas e Modelos Didáticos para o Ensino de Ciências e Biologia. Projeto Interciências/Biologia 2011). Foto: Grupo Biolocus. As atividades oferecidas foram baseadas no ensino por explicação e confrontação com modelos (Pozo e Crespo, 1998). Neste enfoque, os modelos são o núcleo organizador, havendo um interesse explícito nos conteúdos conceituais. A 6 educação científica deve ajudar o aluno a construir seus próprios modelos, interrogálos e descrevê-los metacognitivamente a partir de modelos elaborados por outros. Através da exposição de diversos modelos alternativos, os alunos tornam-se capazes de relacioná-los e integrá-los, compreendendo as diferenças conceituais e reconstruindo o conhecimento científico. Através do Projeto Interciências, a Universidade cumpre seu papel de atualização e disseminação de conhecimentos produzidos, e por outro lado recebe o retorno da comunidade escolar sobre como anda a vida e o meio escolar; pode-se discutir e chegar a conclusões de como melhor traduzir os conhecimentos gerados para a linguagem escolar, uma vez que é a Universidade que forma os profissionais de ensino. “Só podemos ensinar até onde conseguimos aprender; só vale a pena ser educador dentro de um contexto comunicacional participativo, interativo, vivencial.” (Moran, 2009). Referências Bibliográficas Freire, P. (1997). Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra. Moran, J.M.; Masetto, M.; Behrens, M. (2009). Novas Tecnologias e Mediação Pedagógica. Campinas: Papirus. Pozo, J.I.; Crespo, M.G. (1998). Aprender y enseñar ciencia. Madrid: Morata. Rede Interativa Virtual de Educação. Acessado em 11 mai. 2009. Disponível em <http://rived.proinfo.mec.gov.br> Sette, S.S.; Aguiar, M.A.; Sette, J.S.A.S. (2000). Vivência na Escola: integração teoria e prática na formação de recursos humanos para Informática na Educação. Anais do SBIE – SBC. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (2010). Produção de materiais didáticos reais e virtuais para o ensino de ciências. Projeto aprovado no Edital CAPES/DEB Nº 033/2010: Investindo em Novos Talentos da Rede de Educação Pública para a inclusão social e desenvolvimento da cultura científica. WILEY, D. A. (2000). Connecting learning objects to instructional design theory : A definition, a metaphor, and a taxonomy. 2000. Disponível em: http://reusability.org/read/. Acesso em: 28 de abril de 2007. 7