D I S C I P L I N A Química da Vida Ácidos carboxílicos Autores Carlos Roberto Oliveira Souto Humberto Conrado Duarte aula 12 Revisoras de Língua Portuguesa Janaina Tomaz Capistrano Sandra Cristinne Xavier da Câmara Governo Federal Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Revisora Tipográfica Nouraide Queiroz Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a Distância – SEED Ronaldo Motta Ilustradora Carolina Costa Editoração de Imagens Adauto Harley Carolina Costa Universidade Federal do Rio Grande do Norte Reitor José Ivonildo do Rêgo Diagramadores Bruno de Souza Melo Ivana Lima Vice-Reitor Nilsen Carvalho Fernandes de Oliveira Filho Secretária de Educação a Distância Vera Lúcia do Amaral Adaptação para Módulo Matemático Thaisa Maria Simplício Lemos Pedro Gustavo Dias Diógenes Secretaria de Educação a Distância- SEDIS Imagens Utilizadas Banco de Imagens Sedis (Secretaria de Educação a Distância) - UFRN Fotografias - Adauto Harley Stock.XCHG - www.sxc.hu Coordenadora da Produção dos Materiais Célia Maria de Araújo Coordenador de Edição Ary Sergio Braga Olinisky Projeto Gráfico Ivana Lima Revisores de Estrutura e Linguagem Eugenio Tavares Borges Marcos Aurélio Felipe Revisora das Normas da ABNT Verônica Pinheiro da Silva Divisão de Serviços Técnicos Catalogação da publicação na Fonte. UFRN/Biblioteca Central “Zila Mamede” Souto, Carlos Roberto Oliveira. Química da vida / Carlos Roberto Oliveira Souto, Humberto Conrado Duarte. – Natal, RN, : EDUFRN, 2006. 372p. : il 1. Química orgânica. 2. Química da vida. 3. Compostos de carbono. I. Duarte, Humberto Conrado. II. Título. ISBN 978-85-7273-332-8 RN/UF/BCZM 2006/84 CDU 547 CDD 661.8 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste material pode ser utilizada ou reproduzida sem a autorização expressa da UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Apresentação esta aula, você estudará a função ácido carboxílico. São apresentadas as regras da nomenclatura oficial, alguns comentários sobre a nomenclatura comum, a estrutura do grupo funcional e propriedades físicas. O estudo inclui ainda a acidez da função, os efeitos dos substituintes sobre ela e a sua utilidade em processos de isolamento e purificação. São apresentadas ilustrações e são propostos exercícios como recursos auxiliares para assimilação e entendimento do conteúdo, bem como da importância da química orgânica e dos ácidos carboxílicos no cotidiano. N Objetivos 1 2 3 4 5 Reconhecer e classificar ácidos carboxílicos. Aplicar regras oficiais da União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) para escrever o nome oficial de um ácido a partir de sua estrutura ou representar a estrutura a partir de um nome oficial. Prever as propriedades físicas e justificar diferenças entre os ácidos e outras funções. Justificar diferenças de acidez entre ácidos. Eplicar a importância da acidez para processos de isolamento e purificação de compostos orgânicos. Aula 12 Química da Vida 1 Definição e classificação de ácidos carboxílicos Ácidos carboxílicos são moléculas que apresentam o grupo carboxila, ou grupo carboxílico, assim chamado por incluir os grupos carbonila (veja a aula 11 – Aldeídos e cetonas) e hidroxila (veja a aula 7 – Álcoois), conforme a representação genérica a seguir. O R (ou Ar) C O H Os ácidos carboxílicos são classificados em função do grupo substituinte ligado ao grupo carboxila como: alifáticos R ¡CO2H, (R = alquil, alquenil ou alquinil); aromáticos Ar ¡CO2H, (Ar = aril). Dentre os ácidos carboxílicos alifáticos, há uma classe especial denominada ácidos graxos, caracterizada por cadeias lineares, com números pares de átomos de carbono. Importância dos ácidos carboxílicos grupo carboxila se mostra particularmente importante para a vida, animal e vegetal, possibilitando aos aminoácidos a formação de longas cadeias peptídicas, e com estas as proteínas. Essas moléculas orgânicas são as mais abundantes nos animais e desempenham importantíssimos papéis em todos os aspectos do metabolismo celular, como: estrutural (pele, tendões, cabelo), enzimático (catálise metabólica), transporte (hemoglobina), contrátil (fibra muscular), proteção (anticorpos), hormonal (insulina) e toxinas. Observe, a seguir, as representações de alguns aminoácidos. O 2 Aula 12 Química da Vida Exemplos de aminoácidos O O H2N CH C - H2N CH C O CH H CH O H2N CH C 2 2 2 O C N O H O CH2 C O H O CH H2N - CH C O H H O H2 N C H C H N ligação peptídica O HN C H C H Triptofano Ácido aspártico O H R N N Ácido glutâmico CH2 O muitos O O NH C H C R R Histidina Os aminoácidos também executam muitas funções biológicas, entre outras a de precursores de metabólitos, como a serotonina e a histamina (veja a aula 8 – Aminas). Os lipídeos representam outro grupo de biomoléculas fundamentais para a vida. Em grande parte, são ácidos graxos, ou derivados destes, que respondem por numerosas e diversificadas funções do metabolismo. Mais de 500 foram isolados de células e tecidos. Alguns ácidos graxos de ocorrência mais freqüente são listados a seguir com seus respectivos nomes, oficiais e comuns, número de carbonos e pontos de fusão. Tabela 1 – Ácidos graxos naturais ÁCIDOS GRAXOS SATURADOS Carbonos Nomes Comum Oficial ÁCIDOS GRAXOS INSATURADOS pf °C. Comum Nomes Oficial (todas cis) pf °C 12 Láurico Dodecanóico 43,9 14 Mirístico Tetradecanóico 54,1 16 Palmítico Hexadecanóico 62,7 Palmitoléico Hexadec-9-enóico 0,5 18 Esteárico Octadecanóico 69,9 Oléico Octadec-9-enóico 13,4 18 Linoléico Octadeca-9,12-dienóico - 5,0 18 Linolênico Octadeca-9,12,15-trienóico - 10,0 Araquidônico Icosa-5,8,11,14-tetraenóico - 49,5 Icosa-5,8,11,14,17-pentaenóico - 50,0 20 Araquídico Icosanóico 20 75,4 EPA Ácidos graxos são classificados, como saturados ou insaturados. Com duas ou mais duplas, são chamados de poliinsaturados. Os ácidos graxos insaturados naturais têm as seguintes características: cadeia com número par de átomos de carbono; nunca são ramificados; Aula 12 Química da Vida 3 as duplas nunca são conjugadas; todas as duplas ligações têm configuração Z (cis), sem exceção. Compare na tabela anterior os pontos de ebulição dos ácidos graxos insaturados com os dos saturados de mesmo número de átomos de carbono. Observe também a variação do ponto de ebulição em função do número de duplas ligações. Ligação dupla cis Como conseqüência da configuração cis nos ácidos graxos insaturados, as cadeias dobram-se inviabilizando o seu empacotamento firme, como os das cadeias saturadas, “estiradas” e com maior superfície de contato. Com a redução dos pontos de contato intermoleculares, há grande perda sobre as forças de London e, como conseqüência, os ácidos graxos insaturados apresentam pontos de ebulição menores do que os saturados. Quanto maior Ácido linoléico o número de duplas, ainda menor o ponto de ebulição. O ácido linoléico é o precursor de uma variedade de outros ácidos denominados de icosanóides, que nosso metabolismo produz para ações fisiológicas complexas e altamente importantes. É um ácido graxo essencial, deve ser incluído na dieta porque os mamíferos não têm enzimas para introduzir duplas ligações na cadeia além do carbono 9. Nosso organismo converte o ácido linoléico, com 18 átomos de carbono e duas insaturações, no ácido araquidônico, com 20 átomos de carbono e quatro insaturações cis não conjugadas. E, a partir deste, nosso organismo produz as prostaglandinas (também ácidos carboxílicos), assim denominadas por haverem sido descobertas nos anos 30 a partir de secreções da próstata. As prostaglandinas podem ser consideradas como hormônios locais por exercerem funções reguladoras no mesmo tecido especializado em que são produzidas, controlando, por exemplo, a pressão sanguínea, o processo inflamatório, a atividade digestiva, a contração do útero, a secreção das paredes do estômago, a coagulação sanguínea, a febre, a dor, o fluxo sanguíneo aos órgãos em particular, o transporte de íons através das membranas; e modulando a transmissão sináptica e a indução do sono. Ácido esteárico Confira, a seguir, as representações dos ácidos precursores e do esqueleto prostaglandina básico. O O OH O H O O H Ácido linoleíco 4 Aula 12 Química da Vida Ácido araquidônico esqueleto prostaglandina básico A estrutura prostaglandina básica consiste em um anel de cinco membros, com dois substituintes trans e em carbonos vizinhos. Ambos substituintes são lineares, um com oito carbonos e o outro, contendo a carboxila, com sete. As prostaglandinas diferem entre si por variações estruturais no anel de cinco membros, quanto à presença de uma dupla carbonocarbono, de um grupo carbonila, de um grupo hidroxila e das posições desses membros no anel. Nas cadeias, as diferenças incluem insaturações e a presença ou não de grupo hidroxila. Tais diferenças são expressas com letras e índices. Veja alguns exemplos a seguir. O O HO PGE O OH 1 HO O OH HO HO O PGF PGE 1 2 HO HO OH OH A partir de uma prostaglandina nascente, nosso metabolismo forma outros três ácidos carboxílicos relacionados: prostaciclinas, tromboxanos e leucotrienos, representados a seguir. O H O O OH OH O O O OH OH O OH HO OH Prostaciclina PGI2 Leucotrieno B4 Tromboxano TXA2 Leucotrienos, ácidos com três duplas ligações conjugadas, primeiramente encontrados nos leucócitos (por isso, recebe esse nome), induzem contração dos músculos das vias aéreas ligadas aos pulmões e estão implicados em reações alérgicas, inflamatórias e ataques cardíacos. São compostos que ocasionam os sintomas da asma e também estão implicados em choques anafiláticos. Tromboxanos são vasoconstritores e estimulam agregação plaquetária, a primeira etapa na coagulação sanguínea. Já as prostaciclinas são vasodilatadoras e inibem a agregação plaquetária, tendo o efeito oposto. Ainda sobre os lipídeos, deve-se destacar a importância dos ácidos biliares cólico e deoxicólico. Eles têm como precursor o colesterol, são sintetizados no fígado, armazenados na vesícula e secretados no intestino delgado, no qual atuam como agentes emulsificantes para que óleos e gorduras possam ser digeridos por enzimas hidrossolúveis. Confira as estruturas desses dois ácidos na ilustração seguinte. Aula 12 Química da Vida 5 Ácido cólico HO H3C Ácido deoxicólico O CH3 O CH3 OH H H3C H HO H Ácido cítrico O CH2 C O H O C H O C OH CH2 C OH O H H OH HO OH OH H O ácido cítrico, das frutas cítricas, é um metabólito central para nossas vidas. É tão importante na via metabólica, chamada de ciclo de Krebs, que este é conhecido como Ciclo do Ácido Tricarboxílico (CAT). O ácido pirúvico é outro metabólito produzido em nosso organismo na última etapa da glicólise, uma importantíssima via para extrair energia pela oxidação da glicose sem requerer oxigênio. Organismos empregam a glicólise para prover moléculas precursoras para vias aeróbicas, tais como o ciclo do ácido tricarboxílico. O C6 H12O6 glicólise Glicose 2 CH3 C Ácido pirúvico O C O H O ácido pirúvico formado, dependendo do metabolismo, tem três destinos: a redução a ácido lático (fermentação lática); a descarboxilação e redução a etanol (fermentação alcoólica); ou, sob condições aeróbicas, a descarboxilação e oxidação a Acetil-CoA, combustível para o CAT retirar energia liberando CO2 e água. Observe as equações. 1)- piruvato descarboxilase 2)- álcool desidrogenase CO2 + CH3 CH2 O H lactato desidrogenase O CH3 C O OH O C H3 C H C Ácido lático OH C Ácido pirúvico OH O condições C H3 C + C O 2 aeróbicas S C oA Acetil-coenzima A Ácidos carboxílicos têm grande valor na medicina como o analgésico ácido acetilsalicílico (AAS), conhecido como aspirina, o aminoácido L-DOPA, empregado no tratamento do mal de Parkinson, e o antiinflamatório Ibuprofeno. Observe as estruturas. 6 Aula 12 Química da Vida L-DOPA - fármaco Ácido acetilsalicílico HO Ibuprofeno O O O OH HO O OH NH2 O HO tratamento do mal de Parkson Apirina analgésico e antiinflamatório O ácido adípico tem importância industrial histórica como matéria-prima para obtenção de derivados de ácido. Na década de 30, ele foi empregado para a produção do poliéster polietileno, pela reação com o etanodiol (veja a aula 8), e da poliamida Nylon 66, a primeira fibra puramente sintética, assim chamada por ser sintetizada de dois monômeros diferentes, cada um contendo seis átomos de carbono. O HO Ácido adípico C CH2 CH2 CH2 CH2 O O Etano-1,2-diol C OH + H O CH2 CH2 O H Polietileno O C CH2 CH2 CH2 CH2 C (poliéster) + 2nH2O O CH2 CH2 O n O HO Ácido adípico O Hexano-1,6-diamina C CH2 CH2 CH2 CH2 C OH + H NH (CH2)6 NH H O 250°C 15 atm Nylon 66 O C CH2 CH2 CH2 CH2 C (poliamida) + 2nH2O NH (CH2)6 NH n A despeito de todas essas ilustrações, os ácidos carboxílicos não são importantes apenas por si mesmos. O grupo carboxila é o original de uma família de derivados de grande importância biológica e industrial, que você estudará na próxima aula. Nomenclatura dos ácidos carboxílicos Nomenclatura comum Os nomes comuns dos ácidos carboxílicos são usados desde um período anterior à descoberta de suas estruturas. São derivados do latim e do grego e indicam suas fontes naturais. A maior parte nos acompanha há muito tempo por serem os primeiros compostos orgânicos isolados e, provavelmente, serão de uso vulgar por muito mais tempo ainda, por isso, alguns devem ser familiares, como os listados a seguir. Aula 12 Química da Vida 7 Estrutura IUPAC Comum Derivação HCO2H Metanóico Fórmico (Latim), fórmica – formiga CH3CO2H Etanóico Acético (Latim), acetum; (Francês), vine aigre – vinagre CH3CH2CO2H Propanóico Propiônico (Grego), propion – primeira gordura CH3(CH2)2CO2H Butanóico Butírico (Latim), buttyrum – manteiga CH3(CH2)3CO2H Pentanóico Valérico (Latim), valeriana – planta floral CH3(CH2)4CO2H Hexanóico Capróico (Latim), caper – cabra CH3(CH2)6CO2H Octanóico Caprílico (Latim), caper – cabra CH3(CH2)8CO2H Decanóico Cáprico (Latim), caper – cabra CH3(CH2)10CO2H Dodecanóico Láurico (Latim), laurus – louro CH3(CH2)12CO2H Tetradecanóico Mirístico (Grego), myristikos – fragrante CH3(CH2)14CO2H Hexadecanóico Palmítico (Latim), palma – palmeira CH3(CH2)16CO2H Octadecanóico Esteárico (Grego), stear – gordura sólida CH3(CH2)18CO2H Icosanóico Araquídico (Grego), arachis – amendoim Na nomenclatura comum, as posições dos substituintes na cadeia principal são designadas por letras do alfabeto grego, iniciando pelo carbono adjacente à carboxila com alfa (D). A posição ômega (Z) é sempre o carbono mais afastado da carboxila, independentemente do número de carbonos da cadeia principal. Outros ácidos mais conhecidos por seus nomes comuns: F - aminobutírico (GABA) Z - hidróxicáprico O O HO O málico H 2N H O maleico piválico acrílico metacrílico O O O OH H fumárico OH OH gálico ftálico HO O HO HO O O HO OH O OH OH HO O OH O O O O OH HO OH OH Nomenclatura oficial Para determinar o nome oficial de um ácido carboxílico, primeiramente você deve identificar a cadeia mais longa que contenha a função. O carbono carboxílico é o de número 1 e, havendo um segundo grupo carboxila, o carbono desse grupo é considerado como o último da cadeia. As localizações dos carbonos carboxílicos não são mencionadas, por corresponderem às extremidades da cadeia. 8 Aula 12 Química da Vida Identificada a cadeia carbônica, substitui-se o sufixo -o do hidrocarboneto correspondente (alcano, alqueno ou alquino) por -óico ou -dióico. Ácido (3Z,7E)-Deca-3,7-dienóico Ácido 4-cicloexil-pentanóico O Ácido but-2-enodióico Ácido (3Z,6E)-Deca-3,6-dienodióico O O O O OH OH OH HO O OH OH Ácido (3Z,5Z)-6-metilocta-3,5-dienóico Ácido ((Z)-2-pent-3-enil) -hepta-4,6-diinóico Ácido hexanodióico O O O OH O H O HO HO Um terceiro grupo carboxílico pode se apresentar ligado diretamente à cadeia principal ou a uma ramificação. Um grupo carboxílico que não esteja ligado diretamente à cadeia principal é citado pelo prefixo -carbóxialquil, em que alquil corresponde à ramificação entre este e aquela. O carbono desse grupo não é contado como pertencendo à ramificação e deve ter sua localização indicada. Ácido 4-(2-carbóxi-etil)-5(2-carbóxi-propil)-nonanodióico 8 7 6 5 4 3 OH 2 1 O H O H O 2' 1' O O OH O Ácido 4-carbóximetil-octanodióico H O 9 O 8 7 6 5 4 2" 1" O 3 2 3" 1 OH O O H Para moléculas com três ou mais grupos carboxilas ligados diretamente a uma cadeia, os nomes são determinados seguindo-se estas regras: a cadeia principal é aquela que apresenta o maior número possível de grupos carboxila; os átomos de carbono dos grupos carboxila não são contados para determinar a extensão da cadeia; o sufixo acrescentado ao nome do hidrocarboneto correspondente à cadeia principal é composto por um prefixo relativo à quantidade de carboxilas ligadas diretamente à cadeia combinado com a terminação -carboxílico. Por exemplo, -tricarboxilíco, -tetracarboxílico, etc. Aula 12 Química da Vida 9 O (3) O 8 OH 6 7 O 5 4 OH 3 1 2 4 3 O OH O OH O O 1 2 O O H 7 OH 6 5 4 (1) O 3 2 1 O H OH O Ácido 2,3,7-Octano 2,3,7 tricaboxílico O H (2) Ácido - butano 1,2,3 - tricarboxílico OH O OH Ácido 2-(3-Carboxipropil) heptano - 1,1,5,6 - tetracaboxílico Observe bem que, no último exemplo, a cadeia principal não é a mais longa, mas a que tem o número maior de grupos carboxila ligados a ela diretamente. Alguns livros adotam outra metodologia alternativa considerando o terceiro, assim como outros grupos carboxila, como substituintes recebendo o prefixo -carbóxi e a molécula como um ácido dióico. Com essa consideração, os grupos carboxílicos mais distantes entre si definem início e fim da cadeia e são contados como dela. O O OH H O O OH H O O Ácido metanotricarboxílico Ácido 3-carboxi-propanodióico O O O OH H O Ácido pentano-1,3,5-tricarboxílico Ácido 4-carboxi-heptanodióico OH Ácido (E)-hept-1-eno-1,3,4-tricarboxílico Ácido (E)-4-carboxi-5-(S)-propil-hex-2-enodióico O O OH O OH O OH OH O HO OH Ácido (1E,4Z)-(S)-3-hidróxi-penta-1,4-dieno-1,3,5-tricarboxílico Ácido (2E,5Z)-(S)-4-carboxi-4-hidróxi-hepta-2,5-drenodióico Quando o grupo carboxila encontra-se ligado diretamente a um ciclo, identifica-se o nome do hidrocarboneto correspondente e acrescenta-se o sufixo -carboxílico. O carbono da carboxila não recebe numeração, porém, o carbono do anel ligado a ele é considerado o de número 1, com exceção para sistemas bicíclicos. O O O O H OH OH Ácido ciclopentanocarboxilico Ácido exo-Biciclo[2.2.1] heptano-2-carboxilico Ácido decaidronaftaleno-2-carboxílico O O OH Ácido cicloexanocarboxílico 10 Aula 12 Química da Vida OH O OH Ácido endo-Biciclo[2.2.2] octano-2-carboxilico Ácido biciclo[2.2.1] heptano-7-carboxílico O ácido aromático com o substituinte fenila tem o nome benzóico aceito como oficial e, havendo substituintes no anel, são considerados derivados desse ácido. Os demais aromáticos têm o sufixo -carboxílico precedido de sua localização acrescentada ao nome do ciclo. O O O H O O H O H O H Ácido Benzóico Ácido benzenocarboxílico Ácido 4-hidróximetil-benzóico Ácido Naftaleno-2-carboxilico Grupo acila é a designação dada a um grupo substituinte como resíduo derivado de um ácido carboxílico sem sua hidroxila. A nomenclatura oficial substitui o sufixo -óico do ácido carboxílico original por -oil e a nomenclatura comum emprega o sufixo -il em substituição ao -ico do ácido original. O O O O OH H O O O H O OH O Ácido 3-benzoil-pentanóico Ácido 2-acetil-pentanodióico Ácido 3-propionil-heptanóico Os nomes de ácidos carboxílicos contendo um grupo aldeídico ou cetônico na cadeia principal recebem a adição dos prefixos -formil ou -oxo, respectivamente. Como exceção à regra, de forma alternativa, nomes de grupos acila podem ser usados se incluídos na cadeia principal do ácido. O O O O O OH OH Ácido 4-oxo-butanóico (Ácido 3-formil-propanóico) OH O Ácido 4-fenil-4-oxo-butanóico (Ácido 3-benzoil-propiônico) O OH O Ácido 2-oxo-propanóico Ácido 3-propionil-heptanóico (Ácido 2-acetil-fórmico) Por fim, quando o grupo carboxílico estiver presente em moléculas com outro grupo de maior prioridade, como o grupo amônio, por exemplo, é designado pelo prefixo -carbóxi, como substituinte. Cloreto de 3-carbóxi-1-metil-piridínio Cl N + O H O Aula 12 Química da Vida 11 Atividade 1 Represente as estruturas dos ácidos carboxílicos a seguir. a) Ácido fenilacético d) Ácido 2-oxocicloexanocarboxílico b) Ácido 2-acetil-hexanóico e) Ácido pent-2-inóico c) Ácido (Z)-hex-3-enodióico f) Ácido propenóico Estrutura do grupo carboxila O carbono carboxílico tem hibridação sp para manter a ligação S na dupla C=O. Como você estudou na aula anterior, isso significa que o grupo carboxila é planar com ângulos de ligação próximos de 120°. Observe a seguir parâmetros físicos do ácido fórmico. comprimento de ligação (A) O H C=O C-O C-H C-H OH ácido fórmico ângulo de ligação 1,202 1,343 1,097 0,972 H-C=O O-C=O H-C-O H-O-C 124,10 124,9 0 111,0 0 106,3 0 No grupo carbonila, o átomo de oxigênio, mais eletronegativo que o de carbono, por efeito de ressonância desfaz a ligação S acumulando sobre si os dois elétrons dessa ligação, deixando, assim, o átomo de carbono com seu orbital p não híbrido vazio e com carga positiva. O átomo de oxigênio hidroxílico pode então entrosar um de seus dois orbitais p com elétrons não ligantes com esse orbital p vazio do carbono, conferindo caráter de dupla ligação entre a carbonila e a hidroxila. Confira com as representações: O R C R O 12 Aula 12 Química da Vida H + O O C R O H C + O - dipolo permanente - maior polaridade O-H que nos álcoois H Considerando essa conjugação, você pode concluir que há densidade eletrônica aumentada sobre o oxigênio carbonílico e reduzida sobre o hidroxílico, como também polaridade aumentada sobre a ligação O-H. Propriedades físicas Os ácidos carboxílicos são substâncias polares que apresentam momento de dipolo entre 1,0 e 1,5 D. Esses valores são inferiores aos valores médios de aldeídos e cetonas, porque o momento dipolar (P) é resultante de dois vetores em sentidos contrários, como mostrado a seguir. O O H R O R μ = 1,0 - 1,5 D R μ = 2,0 - 3,0 D Os ácidos carboxílicos formam ligações hidrogênio mais fortes que os álcoois, devido à densidade eletrônica acrescida da carbonila e a maior polarização da hidroxila, comentadas anteriormente. O dipolo leva à formação de dímeros estáveis nas fases líquida e sólida, conforme representação a seguir. Em alguns casos, os dímeros permanecem mesmo no estado gasoso. H O ligação O O hidrogênio O H A polaridade da função e a formação de fortes ligações hidrogênio determinam as propriedades físicas. Compare a seguir alguns valores de ponto de ebulição e solubilidade em água. H Estrutura Nome Mol pe * Solub. ** CH3(CH2)2CO2H A. butanóico 88,1 163 infinita CH3(CH2)3CH2OH Pentan-1-ol 88,1 137 2,3 CH3(CH2)3CHO Pentanal 86,1 103 reduzida CH3(CH2)3CO2H A. pentanóico 102,2 186 3,7 CH3(CH2)4CO2H A. hexanóico 116,2 205 1,0 ligação hidrogênio O H hidrofilia O O hidrofobia O H H O H H H * Ponto de ebulição (°C) **Solubilidade (g/100 ml água) Aula 12 Química da Vida 13 Os ácidos saturados com até 10 átomos de carbonos são líquidos e possuem pontos de ebulição maiores que os álcoois, aldeídos e cetonas de massas molares comparáveis. Os pontos de ebulição elevados são explicados pela natureza das ligações hidrogênio. Observe também o aumento no ponto de ebulição para cadeias maiores pelo conseqüente aumento na contribuição das forças de London. A solubilidade em água decorre do caráter hidrofílico do grupo carboxila devido a sua polaridade e ligações hidrogênio com a água. Entretanto, a cadeia carbônica apolar e hidrofóbica é contrária a essa dissolução e pode anular a hidrofilia em função de sua extensão. Observe na representação anterior as duas regiões em destaque (hidrofobia e hidrofilia). Verifique também nos dados anteriores a redução da solubilidade com o aumento da cadeia para os ácidos pentanóico e hexanóico. Agora, observe como ácidos dicarboxílicos têm os pontos de fusão elevados: Nomes e propriedades físicas de ácidos dicarboxílicos simples Oficial Comum Fórmula pf * Sol. ** Etanodióico oxálico HOOCCOOH 189 14 Propanodióico malônico HOOCCH2COOH 136 74 Butanodióico succínico HOOC(CH2)2COOH 185 8 Pentanodióico glutárico HOOC(CH2)3COOH 98 64 Hexanodióico adípico HOOC(CH2)4COOH 151 64 *ponto de fusão (°C) ** solubilidade em g/100 g H2O Os pontos de fusão elevados são naturalmente atribuídos ao maior número das fortes ligações hidrogênio devido à presença de dois grupos carboxilas por molécula. O mesmo argumento explica a menor solubilidade em água. Atividade 2 1 Ordene os compostos em ordem crescente do ponto de ebulição: I) ácido heptanóico, octanal, octanol; II) ácido propanóico, pentanol, etóxietano. 2 14 Aula 12 Química da Vida Comente as forças de atração intermoleculares desses ordenamentos. Acidez dos ácidos carboxílicos Ácidos carboxílicos apresentam acidez dissociando-se, em água, no próton e no ânion carboxilato, conforme a equação a seguir. ânion carboxilato R D+ O O C + O H O R H O R C O H + C O H O H H A acidez do grupo carboxila é explicada como conseqüência de dois efeitos eletrônicos, o indutivo e o de ressonância. A polarização de uma ligação por interações dipolares com um grupo adjacente, conhecida como efeito indutivo, atua nos ácidos sobre a ligação O–H como conseqüência da carga parcial positiva sobre o carbono carbonílico, induzida pelo átomo de oxigênio eletronegativo que polariza a dupla C=O. Tal polarização com efeito elétron-aceptor promove a dissociação. Observe as indicações na representação seguinte. R + G C O O G- H O efeito de ressonância atua no ânion carboxilato. Veja novamente a equação anterior e observe as duas formas de ressonância do ânion. Note que são idênticas! Ou seja, a carga negativa é igualmente deslocalizada sobre os dois átomos eletronegativos de oxigênio, fato que diminui a energia do íon favorecendo a sua formação. Na figura a seguir, há duas representações para o ânion carboxilato. Ele pode ser visualizado como um híbrido de ressonância ou como um sistema conjugado de três orbitais p contendo quatro elétrons. O átomo de carbono e os dois de oxigênio são hibridados sp, e cada um tem um orbital p não hibridado. A sobreposição desses três orbitais p forma um sistema orbital molecular S de três centros. Dessa forma, pode-se considerar que entre o carbono e cada átomo de oxigênio há meia ligação S, e que sobre cada átomo de oxigênio há meia carga negativa. Aula 12 Química da Vida 15 1 O 2 1 O 2 H H CH3 C C C O 1 2 1 O 2 H Há ainda que se considerar o efeito da dispersão da carga negativa sobre o equilíbrio no sentido reverso, o da associação do ânion carboxilato básico com o próton. A igual dispersão da carga negativa sobre dois átomos muito eletronegativos de oxigênio conferindo certa estabilidade ao ânion reduz sua basicidade de forma desfavorável ao equilíbrio, com efeito positivo sobre a concentração do próton. ânion alcóxido R O Ácidos carboxílicos são ácidos fracos, com valores de pKa variando entre 4 e 5. Porém, a acidez é cerca de 1 trilhão (10 12) de vezes superior à dos álcoois, que apresentam valores de pKa variando entre 15 e 18. Isso ocorre porque a dissociação do álcool resulta em um próton e um íon alcóxido. Veja que no ânion alcóxido a carga permanece concentrada sobre o único átomo de oxigênio, por não haver fatores estruturais para sua deslocalização. Esse ânion tem maior energia e, por isso, maior resistência ou dificuldade para ser formado. Você também pode concluir que a carga sobre um único átomo pode ser mais facilmente utilizada para neutralizar o próton. Ou seja, a basicidade do alcóxido é maior que a do carboxilato e o equilíbrio no sentido contrário à dissociação é favorecido. A diferença de energia entre as formações dos ânions alcóxido e carboxilato, representada a seguir, nos revela que a dissociação de um ácido carboxílico é menos endotérmica que a de um álcool. CH3CH2 O- + O + $G0 = 64 kJ/mol $G0 = 91 kJ/mol O CH3 C O- + H + $G0 = 27 kJ/mol CH3CH2 16 Aula 12 Química da Vida O H O CH3 C O H A acidez para os ácidos carboxílicos é expressa pela constante de acidez Ka, que relaciona o produto entre as concentrações do ânion carboxilato e do próton com a concentração do ácido não dissociado. RCO 2 H + H2 O Ke = [ RCO _ 2 ] [ H 3 O +] [ RCO 2 H] [H 2 O] [H 2 O] = constante K e x [H 2 O] = Ka Ka = _ RCO2 + H 3 O + _ [ RCO 2 ] [ H 3 O +] p K a = - log10 K a [ RCO 2 H] À medida que comparamos os valores de acidez entre diferentes ácidos, concluímos que quanto mais elevados esses valores, maiores são as concentrações dos íons, ou seja, maior o denominador. Como para cada mol de íons dissociados a concentração do ácido torna-se um mol menor, quanto maior a acidez, menor o denominador e maior a constante! As constantes de acidez dos ácidos carboxílicos, por apresentarem valores reduzidos, com potências negativas, são melhor expressas como pKa, que é o seu logaritmo negativo ou pKa = - log10 Ka. Por exemplo, para Ka = 1 x 10 – 5 Î pKa = 5,0. Portanto, quanto maior o valor de Ka, maior a acidez e menor o pKa. Em solução aquosa, um ácido será predominantemente dissociado, se o pH desta for superior ao pKa do ácido, e não dissociado, se o pH for inferior. Atividade 3 1 O pH do plasma sanguíneo varia entre 7,35 e 7,45. Nessas condições, o grupo carboxila do ácido láctico (pKa 3,07) existe principalmente como ácido ou como íon carboxilato? 2 Como o ácido ascórbico (Ka = 7,94 x 10 –5) se apresenta no plasma? 3 O ácido ascórbico em excesso é excretado na urina, que apresenta pH variando entre 4,8 e 8,4. Que forma do ácido ascórbico deve ser esperada na urina com pH 8,4? Aula 12 Química da Vida 17 Efeitos dos substituintes sobre a acidez dos ácidos carboxílicos Você poderia perguntar: qual a razão de haver variação de acidez entre os ácidos carboxílicos? Ácido Ka pKa Ácidos fortes Observe que a única diferença estrutural entre um e outro ácido carboxílico reside no substituinte. É necessário compreender os efeitos eletrônicos dos substituintes sobre o grupo carboxila para justificar a acidez. Compare na listagem a seguir a acidez de alguns ácidos. A dissociação de um ácido carboxílico é uma reação de equilíbrio. Qualquer fator que estabilize o ânion carboxilato, em relação ao ácido não dissociado, desloca o equilíbrio para maior dissociação, ou seja, maior acidez. Qualquer fator que estabilize o ácido em relação ao carboxilato resultará em redução da acidez. Lembre-se de que o átomo de carbono é elétron-deficiente no ácido, mas elétron-excedente no carboxilato. Assim, um substituinte elétron-doador estabiliza a carboxila e reduz a dissociação, enquanto um elétron-aceptor estabiliza o ânion carboxilato, facilitando sua formação ou aumentando a acidez. Compare os valores, a seguir, de pKa de ácidos com um substituinte elétron-aceptor no carbono adjacente à carboxila, com o pKa do acético. Fórmula CH3CO2H ICH2CO2H BrCH2CO2H ClCH2CO2H FCH2CO2H Nome Acético Iodoacético Bromoacético Cloroacético Fluoroacético pKa 4.76 3.18 2.90 2.86 2.59 Veja que um substituinte elétron-aceptor aumenta a acidez do grupo carboxila por várias ordens de magnitude, porque as interações entre os dipolos CHalogênio e o grupo carboxila são energeticamente desfavoráveis. Um átomo de iodo aumenta a acidez do ácido acético por um fator de 38. Pode-se observar também que quanto maior a eletronegatividade do halogênio, maior seu efeito indutivo e maior a acidez. Veja que enquanto o ácido cloroácetico tem a acidez aumentada cerca de 80 vezes, o fluoroacético a tem em 150! 18 Aula 12 Química da Vida Se um substituinte elétron-aceptor aumenta a acidez, qual o efeito a ser esperado para a presença de outros? Compare os efeitos de múltiplos substituintes elétron-aceptores a seguir. CH3CO2H ClCH2CO2H Cl2CHCO2H Cl3CCO2H F3CCO2H Nome Acético Cloroacético Dicloroacético Tricloroacético Trifluoroacético pKa 4.76 2,86 1,48 0,70 0,23 Fórmula Veja que o aumento no número de átomos de halogênio promove a acidez. O tricloroacético é mais que 10.000 vezes e o trifluoroacético é aproximadamente 34.000 vezes mais ácido que o acético. Efeitos indutivos são os mais elevados para ligações adjacentes e decrescem rapidamente com a distância entre os grupos interagentes. Os valores de pKa dos ácidos 2-, 3- e 4-clorobutanóico ilustram como os efeitos indutivos decrescem com a distância entre os grupos interagentes. Observe, através dos valores listados a seguir, como o efeito promotor sobre a acidez sofre redução sensível à medida que, na cadeia carbônica, o halogênio é distanciado do grupo carboxila. Fórmula CH3CH2CH2CO2H ClCH2CH2CH2CO2H CH3CH(Cl)CH2CO2H CH3CH2CH(Cl)CO2H Nome Butanóico 4-Clorobutanóico 3-Clorobutanóico 2-Clorobutanóico pKa 4,82 4,52 3,98 2,83 Embora a constante de dissociação para o ácido 2-clorobutanóico seja cem vezes maior que a do butanóico, para o 3-clorobutanóico, reduz-se a seis e para o 4-clorobutanóico é de somente dois. As diferenças nos valores de pKa refletem uma média das diferenças em energia entre o ácido e sua base conjugada, o ânion carboxilato. Então, você poderia perguntar: como os efeitos indutivos dos átomos de halogênio provocam diferenças de energia, contribuindo para a acidez dos ácidos carboxílicos? Considere o ácido tricloroacético. As interações entre os dipolos C–Cl e o grupo –CO2H são desfavoráveis energeticamente para o ácido, porque não cooperam para a redução da deficiência eletrônica sobre a carboxila, mas para aumentá-la. Porém, no ânion carboxilato os terminais positivos do dipolo carbono-cloro interagem eletrostaticamente de modo favorável com a carga negativa, contribuindo para sua dispersão. Atente para as representações a seguir. Cl grupo substituinte aumenta a polaridade sobre a carboxila Cl C Cl D O C O H grupo substituinte favorece a formação do carboxilato cooperando na dispersão da carga Cl Cl C O C O Cl Aula 12 Química da Vida 19 A conseqüência é que o tricloroacetato é mais estável em relação ao ácido tricloroacético do que o acetato em relação ao ácido acético. E o que dizer do efeito de substituintes elétron-doadores? Compare os valores de pKa: HCOOH = 3,75, CH3COOH = 4,76, C6H5COOH = 4,20 e considere o ácido fórmico, que não apresenta substituinte, como referencial. Veja que a acidez é menor cerca de dez vezes para o ácido acético e cerca de três para o benzóico. No ácido acético, o carbono do grupo metila tem hibridação sp, enquanto o carboxílico tem sp. Como orbitais híbridos sp têm maior contribuição de orbital s, seus elétrons sofrem maior atração do núcleo por estarem mais próximos do mesmo do que aqueles em orbitais sp. Por isso, um carbono sp tem eletronegatividade ligeiramente superior a um sp. E no caso do carboxílico, fortemente polarizado pelas 3 ligações com 2 átomos de oxigênio, sua eletronegatividade é ainda maior. Tal diferença de eletronegatividade dá origem ao efeito indutivo elétron-doador do grupo alquila, que reduz a deficiência eletrônica sobre o carbono carboxílico, estabilizando o ácido, e não coopera para a estabilização do ânion carboxilato. Observe a representação a seguir. grupo substituinte reduz a polaridade sobre a carboxila CH 3 D O C O H Você observa o efeito da hibridação do carbono do substituinte sobre a acidez, quando compara os valores de pKa dos ácidos: acético (4,7), propenóico (4,3), benzóico (4,2) e propinóico (1,8). Carbono sp é mais eletronegativo que sp aromático, por sua vez, mais que sp alifático, e este mais que sp. E quanto aos ácidos dicarboxílicos? Na listagem a seguir, os valores ilustram de forma interessante os efeitos dipolares sobre a acidez. Ácidos dicarboxílicos Nome oficial 20 Comum Fórmula Ka1 pka1 Ka2 pka2 Etanodióico oxálico HOOCCOOH 5,4 . 10-2 1,27 5,2 . 10-5 4,28 Propanodióico malônico HOOCCH2COOH 1,4 . 10-3 2.85 2,0 . 10-6 5,70 Butanodióico succínico HOOC(CH2)2COOH 6,4 . 10-5 4,19 2,3 . 10-6 5,64 Pentanodióico glutárico HOOC(CH2)3COOH 4,5 . 10-5 4,35 3,8 . 10-6 5,42 Hexanodióico adípico HOOC(CH2)4COOH 3,7 . 10-5 4,43 3,9 . 10-6 5,41 Cis-2-butenodióico maleico HOOCCH=CHCOOH 1,0 . 10-2 2,00 5,5 . 10-7 6,26 Trans-2-butenodióico fumárico HOOCCH=CHCOOH 9,6 . 10-4 3,02 4,1 . 10-5 4,39 1,2-benzenodicarboxílico ftálico 1,2-C6H4(COOH)2 1,1 . 10-3 2,96 4,0 . 10-6 5,40 Aula 12 Química da Vida Repare que para o ácido oxálico, há uma diferença de acidez entre as duas carboxilas superior a 1.000 vezes. No ácido malônico, essa diferença reduz para 700, no succínico para 28 e no adípico não chega a 10. Nos ácidos dicarboxílicos, um grupo atua como elétron-aceptor sobre o outro, aumentando mutuamente a deficiência eletrônica do carbono e favorecendo a dissociação. No carboxilato, esse efeito atua no sentido de dispersar a carga negativa, de estabilizar o ânion, favorecendo sua formação, conforme a representação a seguir. O H O C D O C O um grupo carboxila aumenta a deficiência H eletrônica do outro grupo carboxila favorece formação do carboxilato O C D O C O H O Dessa forma, a acidez é usualmente maior que a correspondente para um ácido monocarboxílico. Entretanto, a segunda dissociação é reduzida pelo efeito indutivo do carboxilato, que favorece a forma associada e ao mesmo tempo impõe resistência à formação de outro ânion, pela repulsão desfavorável entre suas cargas negativas. Portanto, a segunda constante de ionização é usualmente menor que aquela de um ácido monocarboxílico. Observe também, conforme você já estudou, que o efeito decresce rapidamente com o distanciamento entre os grupos. Há um destaque para o ácido maleico que apresenta uma diferença de acidez entre seus grupos igual a 18.000 vezes. Devido a sua configuração cis, o carboxilato da primeira dissociação estabelece uma ligação hidrogênio intramolecular com o segundo grupo não dissociado. Essa ligação estabiliza tanto o carboxilato como o ácido, desfavorecendo a segunda dissociação. O O C C O O H ligação H intramolecular Atividade 4 Por que os dois valores de pKa diferem mais para os ácidos dicarboxílicos de cadeias mais curtas do que para os de cadeia mais longas? Aula 12 Química da Vida 21 Sais de ácido carboxílico Ácidos são neutralizados com bases formando sais carboxilatos: carboxilato de amônio O R C O H 2N + H 3N R NaOH - H 2O O R R C O H NaHCO 3 - H 2 O, CO 2 carboxilato de sódio O R C O Na + A nomenclatura dos sais de ácidos suprime a palavra ácido e é composta pelos nomes do ânion carboxilato, e do cátion unidos pela preposição “de”. E o nome do ânion carboxilato é derivado do nome, oficial ou comum, do ácido carboxílico substituindo-se o sufixo -ico por -ato. Nos sais, a força de atração predominante é a eletrostática, entre íons, muito mais forte do que a ligação hidrogênio. Por essa razão, sais carboxilatos são sólidos, em geral inodoros, apresentam altos pontos de fusão e, comumente, decompõem-se sem chegar à fusão. Os sais de ácidos derivados de metais alcalinos e os carboxilatos de amônio são geralmente solúveis em água e insolúveis em solventes orgânicos apolares. Os carboxilatos de sódio e potássio com 12 ou mais carbonos são utilizados como sabões. O sabão, do latim saponis, é conhecido desde pelo menos 600 a.C. Os fenícios já preparavam um material coagulado por fervura de gordura de cabra misturada com cinzas de madeira. Do ponto de vista químico, o sabão é uma mistura de sais de sódio ou potássio de ácidos graxos, produzida pela saponificação (hidrólise alcalina) de gordura animal. A estrutura química do sal define o sabão como anfifílico ou anfipático, composto ou molécula que tem uma parte hidrofílica e outra lipofílica. Observe na representação seguinte que a extremidade carboxilato é iônica e, por isso, hidrofílica. A porção hidrocarbônica da molécula é apolar e hidrofóbica. Em água, as cadeias hidrocarbônicas longas se agrupam e se entrelaçam em aglomerados esféricos com o interior hidrofóbico e a superfície hidrofílica com extremidades iônicas, denominadas micelas e também representadas a seguir. O ONa Apolar 22 Aula 12 Química da Vida Polar A carga elétrica na superfície, além da hidrofilia, provoca repulsão eletrostática entre as micelas permitindo a dispersão do sabão na água. O interior hidrofóbico da micela interage com a sujeira hidrofóbica para removê-la da fibra ou superfície. Atividade 5 1 2 Sorbato de potássio é adicionado como conservante a certos alimentos para impedir o desenvolvimento de fungos e bactérias a fim de evitar riscos à saúde, possibilitando ao mesmo tempo um armazenamento mais prolongado. O nome oficial desse aditivo é (2E,4E)- hexa2,4-dienoato de potássio. Desenhe sua fórmula estrutural. O undec-10-enoato de zinco é empregado no tratamento de certas infecções fúngicas, particularmente, na Tinea pedis (pé-de-atleta). Desenhe sua fórmula estrutural. Utilidade dos sais carboxilatos Ácidos insolúveis em água podem ser solubilizados ou dispersos pela conversão em sais de metais alcalinos ou de amônio. Estes podem ser reconvertidos aos ácidos insolúveis originais pela acidificação da solução com ácido mineral. Essas reações possibilitam extrair ácidos carboxílicos de misturas com compostos neutros insolúveis em água, como um método de separação e purificação. O esquema seguinte representa a separação entre ácido benzóico e álcool benzílico. A mistura álcool-ácido é primeiramente solubilizada em éter dietílico. A solução resultante é agitada com NaOH aquoso, e o ácido benzóico, convertido à benzoato hidrossolúvel, é extraído da fase orgânica. As fases são separadas por decantação. A solução orgânica tem o éter removido por evaporação, restando o álcool (pe 205°). A fase aquosa é acidificada com HCl para precipitar o ácido benzóico, o qual é isolado por filtração. Aula 12 Química da Vida 23 mistura Ácool benzílico C H2 O H O + O H Ácido benzóico dissolução em éter fase etérea (álcool solúvel) destilação do éter solução 0,1 M NaOH fase aquosa (sal benzoato solúvel) O C H2 O H precipitação com HCl 0,1 M O H Atividade 6 Baseando-se na acidez, proponha um método que permita separar ácidos carboxílicos, fenóis e álcoois, insolúveis em água e presentes em uma solução orgânica. Resumo Nesta aula, vimos que os ácidos carboxílicos são compostos que apresentam o grupo carboxila, agregando carbonila e hidroxila, incluem grande parte dos metabólitos em vegetais e animais e têm importância industrial como matéria-prima para a vasta gama de produtos. São nomeados substituindo-se a terminação -o do hidrocarboneto correspondente por -óico, antecedido da palavra “ácido”, o grupo carboxila é polar e hidrofílico e estabelece ligações hidrogênio intermoleculares mais fortes que a dos álcoois, formando dímeros. A acidez é a característica principal dos ácidos carboxílicos, sendo menor que a dos ácidos minerais. Estudamos também que os substituintes elétron-aceptores aumentam a acidez e, quanto aos ácidos dicarboxílicos, vimos que apresentam maior acidez para a primeira dissociação e menor para a segunda, comparados aos monocarboxílicos. Por fim, aprendemos que a solubilidade em água dos sais carboxilatos é de grande utilidade para o isolamento e a purificação dos ácidos. 24 Aula 12 Química da Vida Auto-avaliação Empregando o conceito de ressonância, explique por que a acidez dos ácidos carboxílicos é cerca de um trilhão (10 12) de vezes maior que a dos álcoois de constituição similar. 1 Ainda que o ácido p-hidróxibenzóico (Ka 2,9 x 105) seja menos ácido que o ácido benzóico (Ka 6,3 x 105), o ácido o-hidróxibenzóico (salicílico, Ka 105 x 105) é 15 vezes mais ácido que o ácido benzóico. Explique tais valores. 2 Justifique os diferentes valores de pKa para os ácidos: benzóico= 4,2; fórmico= 3,8; tricloracético= 0,6. 3 Os ácidos carboxílicos a seguir têm nomes comuns bem conhecidos. Um, derivado do ácido glicérico, é intermediário na glicólise. Ácido maleico é um intermediário no Ciclo do Ácido Tricarboxílico (Krebs). Ácido mevalônico é intermediário na biossíntese de esteróides. Escreva os nomes, segundo a IUPAC, especificando a configuração. 4 C O 2H H C OH HO 2 C H C H 2O H Ácido glicérico C C CO2 H H Ácido maleico CH 3 HO C HOCH 2 C H 2 CH 2 CO2 H Ácido mevalônico Referências ALLINGER, Norman L. et al. Química orgânica. 2. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1976. BARBOSA, Luiz Cláudio de Almeida. Introdução à química orgânica. São Paulo: Prentice Hall, 2004. Aula 12 Química da Vida 25 INTERNATIONAL UNION OF PURE AND APPLIED CHEMISTRY. Recommendations on organic & biochemical nomenclature, symbols & terminology etc. Londres: IUPAC, 2005. Disponível em: <http://www.chem.qmul.ac.uk/iupac/>. Acesso em: 01 out. 2005. ______. Nomenclature of organic chemistry. Disponível em: <http://www.acdlabs.com/ iupac/nomenclature/>. Acesso em: 01 out. 2005. MCMURRY, John. Química orgânica. 4. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1996. SOLOMONS, T. W. Graham. Química orgânica. 7. ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 2003. VOLLHARDT, K. P. C.; SCHORE, N. E. Química orgânica, estrutura e função. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. WADE JÚNIOR, L. G. Organic chemistry. 4. ed. Upper Saddle River: Prentice Hall, 1999. 26 Aula 12 Química da Vida Anotações Aula 12 Química da Vida 27 Anotações 28 Aula 12 Química da Vida