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O MEDO EM CRIANÇAS DE INFÂNCIAS DIFERENCIADAS
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Zilma Ferreira Ramos de Queiroz
[email protected]
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Professora Dra. Jussara Maria de Carvalho Guimarães
[email protected]
Universidade Estadual de Montes Claros/Unimontes
INTRODUÇÃO
Partindo da idéia de que desde pequenos já experimentamos esse sentimento que atormenta
tanto a vida das crianças e também a dos adultos, é que buscamos entender esses medos, os
quais em sua maioria têm início na infância, a partir de experiências vivenciadas. Sabemos
que desde os primeiros anos de vida, as canções de ninar e histórias a nós contadas remetiam,
e ainda hoje remetem, a mensagens de medo nas crianças, dentre tantas: “boi da cara preta”,
”bicho papão”, monstros e bruxas, etc. A partir de então, e durante toda a nossa infância e
vida adulta, algumas situações de medo nos perseguem. Há então de se questionar: de quê as
crianças têm medo hoje?
Identificar hoje o conceito de criança tem sido um grande desafio, pois precisamos levar em
conta as referências que serão utilizadas, como também considerar a classe social. Pois os
conceitos de criança e infância variam de acordo com o tempo histórico, como também na
sociedade contemporânea. Segundo Ariés (1981, p. 17), até por volta do século XII, à arte
medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la, e acrescenta:
É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade.
É mais provável que não houvesse lugar para a infância neste mundo, uma miniatura
otoniana do século XI nos dá uma idéia impressionante da deformação que o artista
impunha então aos corpos das crianças, num sentido que nos parece muito distante
de nosso sentimento e de nossa visão.
Ariés (1981, p. 17) ainda nos informa que: durante o século XII, XIII, as crianças eram
representadas como sendo um “adulto em miniatura”. A infância era um período de transição,
logo ultrapassado e cuja lembrança era logo perdida.
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Foi for volta do século XIII, que surgiram alguns tipos de crianças um pouco mais
próximos do sentimento moderno, o anjo, depois o segundo tipo de criança seria o
modelo ancestral de todas as crianças pequenas da história da arte, e o terceiro tipo
de criança apareceu na fase gótica: a criança nua. E nos séculos XV e XVI as
crianças não eram mais representadas sozinhas, se tornaram uma das personagens
mais freqüentes dessas pinturas anedóticas. As crianças eram representadas com
suas famílias com seus companheiros de jogos, e ainda, a criança era representada de
diversas formas: no colo da mãe, brincando ou urinando. (ARIÉS, 1981, p. 20-21).
Ao refletirmos a respeito do conceito apresentado pela Sociologia da Infância, Guimarães
(2007, p. 38), indica que a concepção de infância/criança que conhecemos hoje é fato recente.
A mesma nos afirma que:
Sempre aconteceu do mesmo modo, existe, portanto, uma história. Durante muito
tempo, os pensamentos sobre os significados da infância e da criança estiveram
ancorados em diversas idéias e modelos sociais e, conseqüentemente, instalados nas
armaduras familiares, religiosas e culturais. Nos fala ainda que, a concepção que
hoje temos de infância /criança percorreu um longo caminho, foi sendo construída à
medida que os ideais pedagógicos, sociais, políticos foram se transformando.
Em relação ao medo, segundo o dicionário Aurélio: “é um sentimento de viva inquietação
entre a noção de perigo real ou imaginário, de ameaça; pavor, temor”. (DICIONÁRIO
AURÉLIO, 2001, p. 453). Os medos são experimentados pelo indivíduo e, nesse sentido, são
subjetivos; alguns, no entanto, são sem dúvida, produzidos por um meio ambiente ameaçador,
outros não. Como nos relata Tuan: “Certos tipos de medo perseguem as crianças, outros
aparecem apenas na adolescência e na maturidade”. (TUAN, 2005. p. 07). E ainda, Silva
(2006, p. 15) descreve que:
É praticamente impossível para nós, seres humanos, vivermos sem medo, e isso
pode ser confirmado em situações cotidianas, presentes na vida de todos nós, como
o simples ato de atravessar a rua. O medo de ser acidentado ou atropelado por um
automóvel nos leva a olharmos de um lado para outro da rua antes de atravessar .
Sobre a questão do medo, Campos (2001) diz que segundo a neurologia, o “equilíbrio
emocional é regulado por fatores moleculares por trás da resposta ao estresse e quando as
pessoas saudáveis são confrontadas com situações de ameaça, elas reagem com uma resposta
comportamental adequada”. Leite (2005) comenta que “todos nós temos alguns medos, sem
qualquer razão lógica, alguns são passageiros, outros demoram mais para desaparecer”.
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Os medos na infância nem sempre são previsíveis, o medo de fantasma e o medo de escuro
são considerados como medos normais nas crianças, mas os pais devem estar atentos no caso
de começar a provocar alterações na rotina da criança, em suas atividades sociais, na escola
ou na sua personalidade. Tuan (2005, p. 25) considera o medo de escuro como sendo um
medo universal, para o autor, este é um dos medos que aparecem na infância e continuam em
nossa vida adulta. Nos fala também que desde os primeiros meses de vida a criança começa a
ter medo, normalmente a criança não tem medo de animais, somente depois de cinco anos é
que as crianças aprendem a sentirem este tipo de medo devido ao desenvolvimento da sua
capacidade de dedução. (TUAM, 2005, p.24).
Sabemos que as crianças representam os seus sentimentos através do desenho, e que este
representa importante estratégia metodológica para a coleta de dados em pesquisa com
crianças. O interesse pelo desenho infantil data dos fins do século passado, por volta de 1880
a 1900, descobriu-se a originalidade da infância, depois as influências das idéias de Rousseau
e de outros teóricos, em Pedagogia, levou à distinção das diferentes etapas do
desenvolvimento gráfico da criança. Em 1962, o desenho começou a ser descoberto como via
de tratamento psicanalítico. (MEREDIEU, 2006, p.02). O desenho é a maneira que as crianças
têm de se comunicar no mundo, para Rabelo (2013, p. 11), é ainda uma linguagem singular,
que nos possibilita conhecer o mundo infantil e como esta criança se sente no mundo e nos
fala ainda, que podemos nos referir ao desenho como sendo uma maneira de contar coisas por
meio de formas, linhas e cores, transformar traçados em histórias.
Guimarães (2007, p. 146 – 147) cita Sans (2001, p. 29-41) o qual nos aponta as principais
características assumidas pelo desenho em idades distintas das crianças, conforme a mesma,
não podemos deixar de conhecer:
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- A criança de um a dois anos de idade, mesmo sem ter uma coordenação muscular
madura, é capaz de riscar em uma folha de papel, geralmente com linhas simples e
curtas.
- De dois a três anos, a criança começa a desenvolver o controle muscular suficiente
para empunhar um instrumento qualquer, e começar a rabiscar em diversas
superfícies, como no papel, na parede, na areia, na terra, implicando movimentos de
vaivém do braço, conseguindo manter o lápis na área do papel.
- Aos três anos, o movimento circular passa por uma simplificação até que surgem
os primeiros círculos. Depois de ter o domínio sobre as formas circulares, a criança
explora outras formas. Dificilmente, os adultos valorizam esta etapa de grafismo
infantil, mas é através dessa fase que a criança obtém a autoconfiança necessária
para progredir com mais vigor às etapas seguintes.
- Entre quatro e cinco anos, acontece o desenvolvimento dos pormenores que
seguem junto com o da figura, surgindo os dedos dos pés e das mãos, dentes,
orelhas, umbigo e outras constantes experimentações. A partir desse ponto, a criança
deixa a sua experiência gráfica privada, para desenhar mais habitualmente objetos
do mundo exterior, e colocá-los sem relação uns com os outros, até perceber que
pode representar situações e distribuir as imagens devidamente no papel. Nesta fase,
a figura humana não apresenta proporções corretas, pois o real valor está no
relacionamento emocional da criança com o que desenha.
- Aos seis anos, a criança descobre a relação entre seu desenho e a realidade.
Representar o real é o seu intuito, colocando em seus trabalhos, influências da
cultura na qual está inserida; sua capacidade de observação vai progressivamente
atuando na sua expressão plástica. A representação espacial se aprimora e os
motivos desenhados são colocados em seus lugares, formando assim a cena
desejada. É natural, nesta fase, a criança descrever verbalmente o que desenha como
se contasse uma história.
Pensando nesta importância é que desenvolvemos a nossa pesquisa em uma escola da Rede
Pública Estadual de Montes Claros – MG. Para atingirmos os objetivos propostos, realizamos
um estudo bibliográfico investigativo acerca do tema, um estudo a respeito do desenho
infantil e como apreciá-los.
Obtivemos a sustentação teórica tomando como base alguns autores como: Ariés (1981);
Ballone (2012); Froebel (2001), Gardner (1999); Groppo; Martins (2007); Guimarães (2012);
Maanen (1979), Marconi e Lakatos (20011); Meredieu (2006); Pillar (2012); Tuan (2005);
Tupinambás (2013); Rabello (2013), Santos; Machado (2009); Silva (2006) Rabelo (2013);
Santos (2012) entre outros. Foi realizada uma investigação a respeito dos medos da criança:
medos em infâncias diferenciadas, medos da criança/aluno, medo do espaço escolar, medos de
animais e situações. Verificamos os tipos de medos comuns apresentados pelas crianças, e
ainda, relacionamos a incidência dos tipos de medos de acordo com as categorias: espaço
escolar, situações e animais.
O percurso metodológico planejado foi embasado na abordagem quanti-qualitativa, com base
qualitativa, este tipo de pesquisa, segundo Santos e Machado (2009, p. 28), sustenta-se em
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“uma visão de mundo cujos fundamentos encontram-se na lógica da abordagem
fenomenológica, a qual ao valorizar o aspecto qualitativo se opõe ao aspecto quantitativo”,
embora este veio a aparecer neste trabalho, mas de forma bastante reduzida. Entretanto,
mesmo os dados colhidos por técnicas que privilegiam a análise qualitativa podem receber um
tratamento quantitativo, principalmente usando estas técnicas acumulam muitos casos
análogos no tempo e no espaço. (GROPPO; MARTINS, 2007, p. 106). Para Maanen (1979)
apud Santos e Machado (2009), a pesquisa qualitativa assume diferentes significados:
Como o de compreender um conjunto de diversas técnicas interpretativas que
objetiva descrever e decodificar os componentes de um sistema complexo de
significados. Pretende traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo
social; trata-se de reduzir a distância entre o pesquisador e o pesquisado, entre teoria
e os dados, entre o contexto e a ação. (MAANEN, 1979, p. 520)
Elegemos como instrumentos para a coleta de dados o desenho aliado à oralidade, para as
crianças de seis e sete anos sempre em duplas, devido ao fato de que as crianças falam
enquanto desenha, o questionário estruturado o qual foi aplicado para crianças entre dez e
onze anos de idade, e a observação participante, que se dispõe a compartilhar as experiências
dos sujeitos a serem pesquisados, pois esta segundo Lakatos (2005, p. 196): “consiste na
participação do pesquisador com a comunidade ou grupo”.
Optamos por este locus de pesquisa devido ao fato de já estarmos realizando trabalhos nesta
escola há mais de um ano e já possuir fácil acesso na mesma. A observação participante
aconteceu durante o desenvolvimento da pesquisa, que teve um período de duração de quinze
dias, quando observamos o comportamento e as falas das crianças enquanto desenhavam. O
questionário foi composto de três questões, onde a primeira questão foi de múltipla escolha e
as duas outras questões abertas.
Quanto ao desenho, podemos justificar a escolha por esta metodologia, dizendo que o desenho
é uma forma de linguagem muito utilizada pelas crianças, e é defendido por Froebel (2001,
p.145) apud Santos (2012, p. 14), onde aponta o ato de desenhar como um ato fundamental e
espontâneo do universo infantil. Para Rabelo (2013, p. 11): “o desenho é a maneira que as
crianças têm de se comunicar no mundo”.
No início do mês de agosto de 2013, foram entregues os Protocolos de Consentimento para a
escola, pais e alunos, informando a respeito do desenvolvimento da pesquisa. Após a
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aprovação, realizamos a observação participante de quinze dias e a aplicação do questionário.
Escolhemos duas turmas para realizar a pesquisa, uma turma com alunos de seis/sete anos, na
outra turma composta de alunos com idades de dez/onze anos, representando uma amostra de
10 alunos por turma. Os alunos de seis/sete anos de idade foram divididos em duplas para
facilitar a coleta de dados e suas respostas se deram através do desenho aliado à oralidade,
pois a criança dessa faixa de idade tem maior facilidade em expressar seus sentimentos
através do desenho, os alunos de dez/onze anos responderam o questionário.
Para tabulação dos dados coletados utilizamos o programa estatístico SPSS (Statistical
Package for the Social Sciences) 20 para Windows, onde realizamos a estratificação da
amostra através da escolha de 10 crianças para cada turma. A análise de conteúdo foi baseada
em Bardin (2008, P. 32), onde de acordo com Martins (2007, p. 96) nos salienta a respeito da
análise:
[...] um conjunto de instrumentos metodológicos, cada vez mais sutis em constante
aperfeiçoamento que se aplicam a diversos (conteúdos e continentes) extremamente
diversificados. O fator comum destas técnicas múltiplas e multiplicadas – desde o
cálculo de freqüências que fornece dados cifrados, até a extração de estruturas
traduzíveis em – modelos – é uma hermenêutica controlada baseada na dedução:
inferência. Enquanto esforços de interpretação, a análise de conteúdos oscila entre
dois pólos do rigor da objetividade e da fecundidade da subjetividade.
De posse de dados coletados iniciamos a análise, nos apoiando no referencial teórico,
embasando as repostas obtidas através do questionário e do desenho aliado à oralidade.
Devido a idades diferenciadas optamos por dois instrumentos, o questionário e o desenho.
Para análise de dados, todas as respostas dos questionários e desenhos foram analisados de
forma geral e escolhemos uma amostra de dez questionários e dez desenhos, os quais
respondem melhor os objetivos traçados para esta pesquisa. É importante salientar que
mantivemos os nomes reais das crianças sem o sobrenome em decorrência ao respeito que
devemos ter pelos autores das falas e desenhos.
A pesquisa de campo teve início no dia 23 de agosto, onde foram entregues os Protocolos de
Consentimento para os alunos. E antes da aplicação do questionário foi esclarecido para os
mesmos, os objetivos da pesquisa. Na primeira turma com alunos de seis e sete anos foi
aplicado o desenho aliado à oralidade, o qual se deu através de duplas para uma melhor coleta
de dados. A turma era composta por 30 alunos onde 23 realizaram o desenho, 07 não
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desejaram participar. Do total de alunos que participaram da pesquisa, foram 11 alunos com
idade de 06 anos e 12 com idades de 10 anos, onde 13 eram do sexo masculino e 10 do sexo
feminino.
Após responderem ao Protocolo de Consentimento, no qual foi solicitado aos alunos que
desenhassem o seu auto-retrato, o retrato da professora e o meu retrato, e ainda, que
assinalassem a resposta: quero participar da pesquisa ou não quero participar da pesquisa, a
qual se deu em um ambiente fora da sala de aula, o que não é recomendado, mas por questões
de ordem estrutural e para não haver nenhum atrapalho em relação ao desenvolvimento da
aula, optamos por assim agir. O tempo de duração para a aplicação do desenho para as
crianças de seis e sete anos foi de uma hora para cada dupla.
A segunda turma composta por 34 alunos, onde 33 responderam o questionário e o protocolo
de consentimento, um não respondeu o questionário, três não aceitaram participar da pesquisa
e um tinha idade de 17 anos, tivemos um total de 29 alunos que participaram da pesquisa,
sendo 24 com idades de 10 anos e 05 com idades de 11 anos, 19 do sexo masculino e 10 do
sexo feminino. Iniciamos a nossa pesquisa perguntando para as crianças: de que você tem
medo? Em seguida para citarem outros medos que possuem, e ainda, na escola de que você
tem medo?
Aplicamos do desenho aliado à oralidade para as crianças de 06/07 anos de idade, no dia
26/27 de agosto de 2013. A primeira criança a realizar o desenho foi a Kamily, com idade de
seis anos. Perguntamos de que você tem medo? A mesma respondeu: “tenho medo de
fantasma e lobisomem”. E para outros medos: “Tenho medo quando a moça que trabalha lá
em casa vai comprar pão, tenho medo de ladrão”. [Sic]
Esses tipos de medos são considerados como sendo medos fantásticos e o mesmo tem início
entre quatro e seis anos (GRISA E LEMES, 2008).
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FIGURA 01- Medo de lobisomem
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Nataly disse que tinha medo de chipanzé, no seu desenho tinha uma árvore e uma menina, um
arame farpado e o céu, mas acrescentou para outros medos, o medo de ser roubada, de escuro,
de morrer e cair da nuvem.
Nataly: Tenho medo de chipanzé, tenho muito medo de um chipanzé aparecer na
escola, tem árvores enormes na escola, muito altas, tenho medo de árvores altas,
gigantes, tenho medo de alguém me roubar e do escuro. [Sic]
Zilma: Por que o medo de arame farpado?
Nataly: Tenho medo de me machucar nele.
Para Pillar (2012, p. 248), é importante compreender o desenho da criança, conhecer o
contexto em que este foi realizado, ou seja, as circunstâncias em que o desenho foi criado.
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FIGURA 02 – Medo de chipanzé.
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Nataly diz ter medo de chipanzé, que está relacionado com o medo de animais, e diz ter medo
de árvores altas, gigantes e temer um chipanzé entrar na escola devido ao fato de a escola
possuir árvores altas, o que pode ser observado no seu desenho o medo do espaço escolar o
pátio.
A criança Geovana, com idade de 07 anos, desenhou uma cobra e um jacaré e usou somente a
parte inferior do quadro para realizar o desenho, deixando um grande vazio.
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FIGURA 03 – Medo de cobra
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Rabelo (2013, p.33) nos fala que a criança que não teve a possibilidade de criar livremente,
não pode expandir-se do papel, do mesmo modo que uma pessoa que jamais gozou liberdade
não sabe o que fazer com ela.
FIGURA 4: Medo de monstro
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Lara com idade de 06 anos, respondeu que tinha medo: “quando a minha mãe apaga a luz eu
saio correndo, tenho medo de aparecer um monstro, vou desenhar um monstro.” (sic)
Segundo Ballone (2001): “normalmente esses bichos imaginários despertam o medo na
criança durante a noite [...]”.
Guilherme respondeu ter medo de fantasma, então realizou o desenho do mesmo em silêncio.
O medo de fantasma, segundo Addário (2011), é considerado como sendo um medo do
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sobrenatural (monstros, espíritos, vampiros, bruxas), a fase mais comum é entre 4 a 6 anos, o
medo pode estar relacionado a programas de televisão com filmes que assiste.
FIGURA 05 – Medo de fantasma
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Maria Fernanda disse que estava desenhando um monstro, porque tinha muito medo de
monstro, durante o desenho foi descrevendo cada passo:
Eu vou fazer o seu cabelo assim bem desse jeito para cima, e ainda, eu tenho medo
de morcego que fica lá no teto, vou desenhar a minha casa, a minha casa tem
coqueiros assim bem na frente, vou fazer um morcego aqui no telhado e pintar todo
de preto, eu estou aqui do lado vou me desenhar, estou com um vestido vermelho e
estou com medo do monstro, vou fazer um morcego na cabeça do monstro, Há! Eu
tenho também medo de lobo. [Sic]
Maria Fernanda utilizou todo espaço da folha, e ainda usou várias cores, demonstrando sua
criatividade e também se mostrou muito expressiva no seu desenho, na sua fala e na forma de
relatar seu desenho.
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FIGURA 06 – Medo de monstro
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Observamos o seu medo por criaturas estranhas, ela foi desenhando diferentes imagens,
segundo Rabelo (2013, p.68), isso é porque vê o mundo de forma diferente.
FIGURAS 07 – Medo de monstro
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
A figura 07 retrata o medo de monstro relatado por Amanda. “Eu tenho medo de uma coisa
muito assustadora, monstro gigante.” [Sic] Conforme a criança desenhou um monstro e uma
menina, ilustrando o seu medo por monstros, ela nos relatou: “Vou desenhar um monstro
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gigante aqui e ele está pensando em uma menina”. E desenhou o rosto de uma menina dentro
do balão, perguntei quem é a menina? Disse: “sou eu, e vou desenhar também uma cobra,
tenho medo de cobra”. [Sic]
Segundo Passos (2007), aos 6 (seis) anos a fase é dos medos fantásticos: fantasma, bruxa,
Bicho Papão. Também costumam aparecer o medo de dormir sozinho e da morte. Amanda
desenhou o sol com olho e boca no canto da folha, nos leva aperceber que, ainda se encontra
na fase do animismo.
FIGURA 08: Medo de gigante
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
Pedro Augusto disse que tinha medo de monstro, “vou desenhar um gigante, e eu vou lutar
com ele”, o aluno desenhou o gigante e desenhou um balão escrito “poo”, “é uma porrada
que vou dar nele”. Conforme Rabelo (2013, p. 26), o desenho da criança exprime muito mais
o seu mundo pessoal do que seu mundo exterior.
Geovana usou todo o espaço para o desenho, disse que tinha medo do homem do saco,
perguntei por que tem medo desse homem do saco? Ela respondeu: “a minha mãe que disse,
ela falou que o homem do saco pega criança que fica na rua, vou desenhar o homem do saco,
ele carrega um saco nas costas, vou desenhar uma menina e homem do saco está olhando
para a menina por isso tem só um olho, está virado”. [Sic]
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FIGURA 09 – Medo do homem do saco.
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/2013.
E ainda segundo a aluna:
Geovana: “Eu também tenho medo de apanhar”
Zilma: Por que você tem esse medo? Sua mãe bate em você?
Geovana: Sim, ela bate quando fica muito brava. Também tenho medo de me
afogar. [Sic]
O medo do homem do saco apresentado pela criança é um medo provocado pelo adulto,
conforme Tuan (2005), os pais costumam utilizar-se do medo para disciplinar as crianças
provocando-lhes medo inclusive de figuras vingativas como bicho-papão, bruxas e fantasmas.
Nos fala ainda, que as causas mais comuns de medo na criança são os castigos dos adultos.
FIGURA 10 – Medo de escuro e Jason
FONTE: Pesquisa de Campo 26 e 27 de Agosto/ 2013
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Rafael relata o seu medo do escuro, e do Jason personagem de um filme:
Zilma: O que é este quadrado preto?
Rafael: Este é o meu quarto, ele está escuro, tenho medo do escuro. Vou desenhar o
Jason, tenho medo dele, porque ele carrega uma serra elétrica para matar as
pessoas. (Sic).
O desenho, segundo Derdik (2004) citado por Rabelo (2013, p. 31), pode ser considerado
como “o mapa da consciência”, pois segundo esse autor, a memória evoca, a imaginação
própria para o futuro e o presente é a realização. De acordo com o mesmo, “o desenho, de
certa forma, reflete alguns momentos da vida das crianças, momentos estes marcantes”. No
seu desenho utilizou somente a cor preta e deixou um grande vazio na folha, de acordo com
Tupinambá (2013, p. 69), a cor preta indica vida interior sombria, depressão, conflitos não
solucionados, tristeza, inibição e repressão.
Os medos apresentados pelas crianças de 06/07 anos, sujeitos da amostra foram: medos de
lobisomem, fantasma chipanzé, cobra, escuro, Jason, monstro e gigante, onde o mais citado
com 26,7 % foi o medo de monstro. O medo de monstros e fantasmas está ligado ao
imaginário da criança, conforme Ballone (2005). Para outros medos duas crianças citaram
medo do Jason e o restante deu respostas diferenciadas como: Árvores altas, de ser roubado,
arame, lobo, ficar só, ladrão, de um chipanzé aparecer na escola, jacaré, gigante, Jason, morcego e
afogar.
Quando perguntado: De que você tem medo na escola? Somente uma criança respondeu que
tem medo do espaço escolar o pátio, porque tem árvores muito altas e um chipanzé poderia
entrar na escola. Na pesquisa participante, outra criança relatou sentir medo da sala de aula e
da professora.
O medo segundo categorias: espaço escolar, pessoas, situações e animais, onde 41,2% das
crianças responderam sentir medo de animais, os quais são medos comuns na infância,
(TUAN, 2005, p. 24).
Na segunda turma, aplicamos o questionário, composto de três questões, uma fechada e duas
abertas. Onde na primeira questão perguntamos: De que você tem medo? Os medos
apresentados pelas crianças de 10 e 11 anos, sujeitos de nossa amostra: Medo de dormir
sozinho no escuro, de sombras e barulhos no escuro, de olhar debaixo da cama coberta, de
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olhar debaixo da cama coberta, Bicho papão e/ou outros monstros, de Monstros que podem
morar no telhado e/ou em alguma parte da casa, de ser abandonado em locais públicos, de
chuva e/ou trovão, de ladrão e/ou estranhos, de bruxa e/ou diabo, de fantasma, de não dormir
e/ou não acordar, da morte, de Animais (rato aranha, cobra camundongo etc.), referente à vida
urbana (elevador, caro, etc.), de situação (solidão, escuro, corredores, altura).
O medo da morte 15,6 % e o de ladrão e/ou estranhos 14,1 são os tipos de medos mais citados
pelas crianças. Para Tuan (2005), quando amadurecem, as crianças põem de lado os medos
infantis, mas ganham novos medos, a morte, é um medo novo, ainda, para Grisa e Lemes
(2008, p 04) esse medo aparece por volta dos nove anos. Já o medo de ladrão e/ou estranhos,
ainda segundo Grisa e Lemes (2008, p.03), o Bicho-papão, a bruxa, o fantasma, o homem do
saco, esses personagens que tanto amedrontaram as crianças no passado, aos poucos vão
sendo substituídos por temores reais, como sequestros, assaltos ou outras situações de
violência presentes em qualquer sociedade. Os outros medos citados: Medo de espírito
aparecer na minha frente, de cachorro com raiva, de perder meus pais, do diabo, de quebrar
algum osso, de criaturas estranhas, de seqüestrado, de andar sozinha, de assombração, de ser
atropelado e três não responderam, pode ser observado que as respostas foram diversificadas.
Na questão: De que você tem medo na escola? Os medos mais citados foram o medo ser
reprovado, de prova e supervisora, estes medos é adquirido ao entrar na escola, de acordo com
Tuan (2005, p. 26), as crianças ao entrar para a escola desenvolvem novos medos sociais. O
medo segundo categorias: espaço escolar, pessoas, situações e animais, com crianças de 10/11
anos. Analisando estas categorias, percebemos que os medos apresentados se referem a
animais com 46,2% dos medos citados.
Nos dados encontrados na turma de crianças de 10 e 11 anos, percebemos que os medos mais
citados pelas crianças são: o medo da morte, apresentado por quase todas as crianças, do
sobrenatural como bruxas e/ou diabo, sombras e barulhos no escuro, ladrões ou estranhos, ser
abandonado em locais públicos, animais e o medo de cachorro. Foi também percebido em
nossa análise, que as crianças adquirem novos medos ao entrar para a escola.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a importância de se buscar entendimentos a respeito dos medos sentidos pelas
crianças, neste trabalho realizamos um estudo a respeito do medo em crianças de infâncias
diferenciadas. Respondendo a pesquisa, de que as crianças têm medo hoje? Percebemos que
o medo é um sentimento presente em nossa vida desde o nascimento, o que foi possível
observar nas crianças quando as interrogamos a respeito de seus medos. A primeira turma
apresentou medos comuns à infância, como o medo do imaginário, sobrenatural e animais.
A segunda turma de crianças apresentou medo do sobrenatural, como monstros e bruxas,
então compreendemos que a criança muda a natureza do medo à medida que cresce e adquire
novos medos, o medo mais citado foi o medo da morte, o qual é um medo novo, nesta idade
10 e 11 anos, é comum o medo de situações como: apresentar na frente, castigos, provas e o
medo do escuro, que é considerado um medo universal de acordo com os autores discutidos
nesta pesquisa, o qual aparece na infância e continua ainda na vida adulta.
Diante dos resultados apresentados podemos finalizar a nossa pesquisa considerando como
respondidos a todos os objetivos propostos, e ainda, outras questões que esta pesquisa nos
instiga a investigar a respeito do medo, o qual vem sendo causa de insegurança e fobia na vida
das pessoas na sociedade atual.
A partir dessa investigação, que possamos parar para observar o comportamento e o
sentimento das crianças, e ainda, que possamos dar a elas uma educação de qualidade,
visando não somente a sua aprendizagem, mas pensar na criança como um sujeito autônomo,
construtor de seus conhecimentos, e com sentimentos, que, muitas
vezes são
incompreendidos.
Esta pesquisa nos permitiu buscar possibilidades de entendimento em relação aos medos
atuais presentes no imaginário infantil, além disso, possibilita uma discussão entre pais e
educadores a respeito da questão e de como enfrentá-lo, contribuindo para amenizar as
situações do medo presentes na vida cotidiana da criança, entender os motivos pelos quais as
crianças têm medo, quais são eles e como ajudá-las a enfrentá-los.
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REFERÊNCIAS
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O MEDO EM CRIANÇAS DE INFÂNCIAS - VII Coped-NM