PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Programa de Pós-Graduação em Administração
Mestrado Acadêmico em Administração
Tatiana Souza de Almeida
AS EXECUTIVAS ENTRE A CARREIRA PROFISSIONAL E A VIDA PESSOAL
Belo Horizonte
2012
Tatiana Souza de Almeida
AS EXECUTIVAS ENTRE A CARREIRA E A VIDA PESSOAL
Dissertação
apresentada
ao
Curso
de
Mestrado
Acadêmico em Administração do Programa da PósGraduação
em
Administração
da
Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito
para obtenção do título de Mestre em Administração.
Orientador: Prof. Dr. Antônio Carvalho Neto
Belo Horizonte
2012
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
A447e
Almeida, Tatiana Souza de
As executivas entre a carreira profissional e a vida pessoal / Tatiana Souza
de Almeida. Belo Horizonte, 2012.
113f.: il.
Orientador: Antônio Carvalho Neto
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Administração.
1. Executivas. 2. Trabalho e família. 3. Mulheres – Vida e costumes sociais.
4. Horário de trabalho. I. Carvalho Neto, Antônio. II. Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Administração. III.
Título.
CDU: 396.5
Tatiana Souza de Almeida
AS EXECUTIVAS ENTRE A CARREIRA E A VIDA PESSOAL
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais e Fundação Dom Cabral, como
requisito para a obtenção do título de Mestre em
Administração.
Área de concentração: Administração
__________________________________________________________________________
Orientador Prof. Dr. Antonio Carvalho Neto (Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais)
___________________________________________________________________________
Profª. Dra. Flávia de Souza Costa Cavazotte (Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro)
___________________________________________________________________________
Profª. Dra. Juliana Oliveira Andrade (Fundação Dom Cabral)
Belo Horizonte, 22 de Fevereiro de 2013.
Aos meus filhos, Gabriel e Luíza, fonte de inspiração e razão
para fazer do conhecimento um caminho.
Às bravas mulheres, que através de seus exemplos
profissionais, nutrem o mundo no lar e no trabalho.
AGRADECIMENTO
Esta obra teve a felicidade de contar com o apoio de muitos. Graças a Deus! A fé que
me levou, no passado, a confiar que poderia ser possível, hoje me faz agradecer a Deus por ter
sonhado, acreditado e trabalhado para a construção desta dissertação. Tendo Deus como a
origem de tudo, eu O agradeço!
Sinto-me filha da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas e
neta do Programa de Pós-Graduação em Administração – PPGA da PUC Minas pelo curso de
graduação e mestrado realizado nesta instituição. Tenho orgulho de ter confiado a ela parte de
minha formação. Portanto, agradeço a todos os professores do PPGA da PUC Minas em
especial ao Professor doutor Roberto Patrus Pena pelo estágio docente e profundas
orientações sobre a conduta acadêmica e aos funcionários da secretaria – Jaqueline Araújo da
Silva, Cristiano Lima e Paola Alves.
A relação entre o orientador e seu orientando é conduzida pelo interesse ao tema de
pesquisa e mordida pelo “bicho” da curiosidade instigante. De um lado, a ingenuidade do
orientando em querer saber tudo sobre o tema. Do outro, a experiência e temperança do
orientador em mostrar que o que se aprendeu após longo tempo de estudo é apenas um ponto
na imensidão do tema. Posso dizer que tive a orientação necessária para fazer dos meus
estudos sobre o assunto esta dissertação. Ao meu orientador professor doutor Antônio
Carvalho Neto meus sinceros agradecimento pela orientação, pela amizade e pela companhia
em trabalhos futuros.
Esta dissertação é fruto da bolsa de pesquisa oferecida pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES no Programa de Suporte à PósGraduação de Instituições de Ensino Particulares – PROSUP que financiou meus estudos
durante todo o mestrado e consequentemente esta dissertação. A CAPES – PROSUP
financiou a apresentação dos artigos sobre o assunto que trata esta dissertação antes mesmo
do final deste trabalho apresentados em congressos da Associação Nacional de PósGraduação e Pesquisa em Administração – ANPAD e SEMEAD Desafio da Gestão:
Econômico, Social e ambiental organizado pelo Programa de Pós-graduação em
Administração da FEA-USP. À CAPES segue meus agradecimentos por confiar e acreditar na
minha capacidade enquanto aluna e estudante. Sem este apoio esta obra não seria realidade.
Muito obrigada! Outro apoio recebido foi pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
Minas Gerais - FAPEMIG que aproveito a oportunidade para registrar meu agradecimento,
obrigada!
Quem está a fim de colaborar pensa no bem comum, reconhece o esforço dos outros e
por isso mesmo ajuda, e sabe que muitas vezes as batalhas precisam ser vencidas na
composição de esforços e não com expressa individualidade, ainda mais quando se pensa em
trabalho em equipe de um grupo de pesquisa. Ao Núcleo de Estudos de Recursos Humanos e
Relação de Trabalho – NERHURT na pessoa de seus membros e do coordenador geral do
grupo Professor doutor Antônio Carvalho Neto, meus sinceros agradecimento, em especial
aos membros do subgrupo de pesquisa sobre as mulheres na pessoa de Carolina Maria Mota
Santos e da coordenadora Professora doutora Betânia Tanure.
Toda ajuda foi bem-vinda, seja gigante ou minúscula. A felicidade de estar ciente de
que houve tanta gente no mundo disposta a ajudar e a fazer as coisas “andarem” mesmo sem
se beneficiarem diretamente pelo que representa esta ajuda encanta de prestígio esta obra.
Assim, agradeço a minha amiga Simone Gonçalves dos Santos Xavier por suas leituras,
correções, reflexões, noites viradas estudando o tema, traduções de textos e apoio
incondicional. Às minhas colegas de turma Lidiene S. P. Costa e Júnia Fátima Carmo Guerra
pelos trabalhos e estudo durante o curso das disciplinas. À Helena Belintani Shigaki pela
amizade, carinho e apoio nas revisões dos textos que originaram esta obra.
Os pais são os colaboradores e parceiros durante toda a nossa vida. Neste trabalho, não
se posicionaram imparciais e, por isso os agradeço. Ao meu pai in memoriam pelo exemplo,
retidão e dignidade. À minha mãe, fonte de amor maior em vida.
RESUMO
Compreender como a mulher executiva brasileira, que chegou ao nível estratégico das grandes
empresas, tenta conciliar a carreira profissional e a vida pessoal é o objetivo deste trabalho.
Para tanto, buscou-se identificar como as executivas dividem o tempo entre trabalho e vida
pessoal, assim como o investimento que elas fazem no trabalho e na vida pessoal. A carreira
executiva é tradicionalmente vista como um modelo masculino pelas organizações. Entre as
demandas dessa carreira se encontra a disponibilidade de tempo superior a 8 horas de trabalho
e a expatriação, demandas estas que podem ser desafiadoras para as mulheres, que são
culturalmente responsáveis pelas atividades do lar. Contudo, as demandas da vida pessoal das
mulheres são tão exigentes quanto a carreira executiva que escolheram seguir, logo, justificase esse trabalho em função da importância social e organizacional do tema carreira da mulher
executiva. Apesar da barreira do “teto de vidro” nas organizações, que dificulta a ascensão
das mulheres em nossa cultura social machista, há uma tendência no atual ambiente de
negócios de maior valorização das habilidades tidas como femininas, em nome da
diversidade. A estratégia de pesquisa utilizada foi a qualitativa descritiva, com múltiplas
técnicas de coletas de dados, entrevista semi-estruturada, observação direta e artefatos físicos.
Foram entrevistadas 30 executivas ocupantes de cargo de primeiro, segundo e terceiro escalão
de grandes organizações em São Paulo e Minas Gerais. Os resultados indicaram três tipos de
modelos de carreira executiva exercida por elas: singular, heterogêneo e homogêneo. No
modelo singular, a vida pessoal não é considerada, semelhante ao modelo de carreira
executiva exercida tradicionalmente pelos homens. No modelo heterogêneo, há uma
possibilidade de conciliação, onde as demandas da carreira e da vida pessoal são fortemente
delimitadas, encontrando-se em parte numa intercessão e fusão, havendo situações em que a
vida pessoal e profissional se mostram mais ou menos independentes entre si. No modelo
homogêneo, as duas dimensões da vida das executivas, carreira e vida pessoal, estão tão
emaranhadas que não se consegue separar nem identificar onde começa uma e onde termina a
outra.
Palavras – chave: mulher executiva, carreira e vida pessoal, tempo de trabalho e vida pessoal
ABSTRACT
Understanding how Brazilian executive women achieve a strategic command level in big
companies, conciliating the professional career with the personal life, is the goal of this work.
For this purpose, it was crucial to identify how they try to equilibrate work and private life
demands as well as what investment they make both in their professional careers and in their
own personal lives. The executive career is traditionally seen by the organizations as a typical
job for men. The most important demands to fulfill these job are extensive journeys far
beyond 8 daily hours and also expatriations. These demands are really challenging for women
which respond for the household chores, after working all day long. On the other hand, their
personal lives also demand critical attention. So, the organizational and social relevance
regarded to the women executive career in Brazil justifies the goal of this work. Despite the
persistent “glass ceiling” barrier in our male-dominated society, it can be observed a tendency
to value the female skills in the name of the social diversity. The research strategy adopted in
this work was the descriptive-qualitative research method using multiples techniques to
collect data, performing semi-structured interviews through direct observation and physical
artifacts. Thirty women CEOs, directors and occupying the third level immediately below in
corporations situated in the states of Sao Paulo and Minas Gerais were interviewed. Results
suggest three types of women executive career models: singular, heterogeneous and
homogeneous. In the singular model the personal life was not considered at all as in the
traditional male executive positions. In the heterogeneous model there is some possibility of
reconciliation between personal and professional lives in such way that the demands of these
two lives are sometimes strongly delimited into an intersection or even fusion zone. However,
there are also some situations in the heterogeneous model where the professional and the
personal lives are both independent. In the third model called homogenous the career interest
and the personal life are both in constant conflict being extremely hard to separate one from
the other; here it is almost impossible to establish where one starts and where the other one
finishes.
Keywords: woman executive, career and personal life, work time and personal life
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 Composição por sexo dos funcionários em posição executiva, gerencial, de
supervisão e funcional das 500 maiores empresas do Brasil dos setores industrial, serviços,
comércio alimentos e produtos agrícolas no Período de 2001, 2003, 2005, 2007 e 2010........ 31
FIGURA 2 Representação da vida profissional das executivas segundo Belle (1994). .......... 51
FIGURA 3 Análise dos dados. ................................................................................................ 63
FIGURA 4 Representação da vida profissional das executivas da pesquisa. ......................... 92
LISTA DE QUADRO
QUADRO 1 Possibilidades de diversas dimensões temporais das executivas ........................ 42
QUADRO 2 Modelo de carreira .............................................................................................. 47
QUADRO 3 A percepção das executivas sobre a conciliação entre a carreira e a vida pessoal
de acordo com a faixa etária ..................................................................................................... 72
QUADRO 4 Fatores (des)favoráveis a conciliação entre a carreira e a vida pessoal, segundo a
situação familiar das executivas .............................................................................................. 74
LISTA DE TABELA
TABELA 1 As empresas geradoras da unidade de análise ..................................................... 55
TABELA 2 Seleção das executivas participantes ................................................................... 59
LISTA DE SIGLAS
ANPAD - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
CEO - Chief Executive Officer
CLT - Consolidação das Leis do Trabalho
FIEMG – Federação da Indústria do Estado de Minas Gerais
GE - General Electric.
GM - General Motors.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística.
MBA - Master of Business Administration
NERHURT – Núcleo de Estudos de Recursos Humanos e Relação de Trabalho
OIT - Organização Internacional do Trabalho
PEA - População Economicamente Ativa
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 15
1.1 Problemática ..................................................................................................................... 17
1.2 Justificativa ....................................................................................................................... 20
1.3 Objetivos ............................................................................................................................ 22
1.3.1 Objetivo Geral ................................................................................................................. 22
1.3.2 Objetivos específicos ....................................................................................................... 22
2 REFERENCIAL TEÓRICO .............................................................................................. 23
2.1 A evolução do papel da mulher no Brasil a partir da década de 1960 ........................ 23
2.2 Os desafios da conciliação da carreira da mulher executiva com a vida pessoal ....... 32
2.2.1 Dedicação de tempo para a carreira e para a vida pessoal das executivas. ................. 40
2.2.2 Tipos de investimentos na carreira e na vida pessoal das executivas. .......................... 46
3 METODOLOGIA DE PESQUISA .................................................................................... 53
3.1 Estratégia e Método de pesquisa ..................................................................................... 53
3.2 As empresas geradoras da unidade de análise ............................................................... 55
3.3 Estratégia de coleta de dados........................................................................................... 56
3.4 Estratégia de análise dos dados ....................................................................................... 61
4. ANÁLISE DOS DADOS .................................................................................................... 64
4.1 A difícil conciliação da carreira com a vida pessoal ...................................................... 64
4.1.1 Uma breve discussão sobre o perfil das executivas ....................................................... 64
4.1.1.1 Executivas com idade entre 50 e 60 anos .................................................................. 66
4.1.1.2 Executivas com idade entre 40 e 49 anos .................................................................. 68
4.1.1.3 Executivas com idade entre 30 e 39 anos .................................................................. 69
4.1.1.4 Uma breve conclusão sobre a conciliação entre carreira e vida pessoal segundo a
faixa etária das executivas ..................................................................................................... 70
4.1.2 Fatores que (des)favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal, segundo a
percepção das executivas de acordo com o estado familiar das mesmas .............................. 72
4.1.2.1 A percepção das executivas solteiras sobre os fatores que (des)favorecem a
conciliação entre a carreira e a vida pessoal ......................................................................... 75
4.1.2.2 A percepção das executivas das executivas separadas e/ou divorciadas sobre os
fatores que (des)favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal ........................ 75
4.1.2.3 A percepção das executivas casadas ou em união estável sobre os fatores que
(des)favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal ............................................ 77
4.1.2.4 A percepção das executivas que se casaram mais de uma vez sobre os fatores que
(des)favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal ............................................ 80
4.2 O uso da distribuição do tempo das executivas entre a carreira e a vida pessoal ...... 82
4.2.1 O tempo dedicado à vida pessoal .................................................................................... 82
4.2.1.1 Dedicação aos filhos ................................................................................................... 82
4.2.1.2 Dedicação aos cuidados com a casa .......................................................................... 84
4.2.1.3 Dedicação aos cuidados pessoais ............................................................................... 85
4.2.1.4 Dedicação ao lazer ...................................................................................................... 86
4.2.2 Tempo dedicado à carreira ............................................................................................. 87
4.2.2.1 Horas de trabalho excessivas ..................................................................................... 88
4.2.2.2 Tempo dedicado à viagens relacionadas à carreira ................................................. 89
4.2.2.3 Finais de semanas trabalhados .................................................................................. 89
4.3 O investimento na carreira e na vida pessoal ................................................................ 90
4.3.1 Executivas na faixa etária entre 50 e 60 anos ............................................................... 92
4.3.2 Executivas na faixa etária entre 40 e 49 anos ............................................................... 94
4.3.3 Executivas na faixa etária entre 30 e 39 anos ............................................................... 97
5 CONSIDERAÇÕES FINAS ............................................................................................... 98
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 103
APÊNDICE A - Roteiro de entrevista ................................................................................ 110
APÊNDICE B - Roteiro de observação durante a entrevista ........................................... 113
15
1 INTRODUÇÃO
Ao longo da história as questões relacionadas à discussão sobre gênero provocam
fortes reações em muitas pessoas (MARSHALL, 1984). Geralmente, este tipo de discussão é
encarado como um contexto de “guerra dos sexos”. A mulher tem sido discriminada em
relação ao homem na sociedade e isso não é diferente no ambiente de trabalho, entretanto não
se pode negar a evolução da carreira da mulher executiva.
As mulheres vêm buscando uma profissão que as levem a uma progressão na
construção de suas careiras, para tanto, aumenta-se o nível de escolaridade delas, que antes
eram enquadradas em trabalhos informais, domésticos e autônomos. Além da necessidade de
contribuir no orçamento doméstico, as mulheres têm optado por este caminho por também
existir uma demanda de realização profissional e independência financeira (GRZYBOVSKI;
BOSCARIN; MIGOTT, 2002).
No Brasil, a importância atribuída pelas mulheres no que diz respeito à capacitação
profissional pode ser demonstrada em números, quando 39% das mulheres passaram a ter
mais de 9 anos de estudos contra 35% dos homens. No ensino superior elas são presença
significativa nos cursos de Linguística, Letras e Artes (83%), Ciências Humanas (82%),
Ciências Biológicas (74%) e Ciências da Saúde (67,6%), considerados “guetos femininos”, o
que não impediu a presença delas nas áreas ditas “masculinas”, como Administração,
Arquitetura/Urbanismo e Direito (FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS, 2007).
Essa busca pela realização profissional e colaboração na renda doméstica, levaram as
mulheres a alcançarem um maior grau de instrução, resultando num crescente número de
mulheres matriculadas em universidades para cursos de graduação e especialização. Pode-se
concluir diante dos dados da Fundação Carlos Chagas (2007), que as mulheres quando
comparadas aos homens, seus colegas de trabalho, investem mais na formação profissional.
Como consequência, as mulheres passaram a ocupar cargos de liderança em várias áreas,
ainda que prioritariamente, em empresas de serviços comunitários e sociais (BRUSCHINI;
PUPPIN 2004).
Dado o cenário acima, pode-se notar que a carreira executiva das mulheres indica para
a sociedade o quanto o trabalho delas evoluiu e se qualificou, mas ainda tem muito a
percorrer. Nos anos de 1960, nos países escandinavos, começa a luta pela equidade de gênero
(FARIA, 2002). Na década de 1970, o movimento feminista ganha força na esfera global,
influenciando o surgimento de movimentos ao redor do globo, que lutavam pelos direitos das
16
mulheres ocuparem cargos antes ocupados pelos homens, ou ainda, simplesmente o direito de
serem mulheres e sendo assim, serem reconhecidas como parte constituinte de suas
respectivas sociedades (HOFFMAM; LEONE, 2004). No período de 1980 a 1989, pode-se
notar um avanço no esforço dos movimentos, pois as mulheres começam a assumir
simultaneamente um maior papel profissional, além do já estabelecido socialmente: maternal
e doméstico (ALMEIDA, 2007). Já nos anos de 1990, nota-se outro avanço, as mulheres
passam a ter maior presença que os homens no ensino superior, totalizando 60% no caso
brasileiro (BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001).
Na primeira década do segundo milênio, a identidade feminina passa a se voltar cada
vez mais para o trabalho, possibilitando a consolidação da carreira executiva para as
mulheres, o que pode sinalizar um caminho sem volta, apesar da representatividade ainda
muito inferior à dos homens nesta posição (ITABORAÍ, 2003; ALMEIDA, 2007; ETHOS;
IBOPE, 2001; 2003; 2006; 2007; 2010).
As mulheres têm maior probabilidade de atingir posições mais elevadas na carreira
dentro da administração pública, em comparação com o setor privado e também em empresa
de grande porte, onde a meritocracia é prioridade (BRUSCHINI; PUPPIN, 2004). As
executivas que exercem cargo de diretoria são de 21% no setor privado, contra os 44,8% dos
cargos de mesmo nível no setor público. Além disso, as diretoras possuem maior nível de
escolaridade, menor tempo de serviço, menores idades e ganham menos em relação aos
homens que ocupam a mesma posição no setor privado e em empresas de grande porte
(BRUSCHINI; PUPPIN, 2004). Deve-se levar em conta que a carreira da mulher depende
também da cultura organizacional, logo, empresas culturalmente machista darão menos
oportunidades às mulheres (BELLE, 1994).
Um dos desafios enfrentados pelas executivas é o fenômeno “Teto de vidro”, que pode
ser definido como um conjunto de barreiras sutis, por estarem enraizadas na cultura social;
transparentes, pelo poder de passarem despercebidas; e fortes o suficiente para impedirem
indivíduos
qualificados
de alcançarem
cargos
na alta hierarquia organizacional.
(MORRISON, 1992; STEIL, 1997). A presente dissertação trata das mulheres que
ultrapassaram o Teto de Vidro e conquistaram posições de poder muito disputadas pelos e
com os homens.
Interessante pontuar que as executivas pesquisadas por Bruschini e Puppin (2004)
acreditam que não há preconceito contra a mulher no mercado de trabalho, apesar de
reconhecerem que as empresas tradicionais, onde o machismo fala mais alto, demoraram a dar
abertura para as mulheres ingressarem nos cargos de direção. Contudo, pensam que contra
17
competência não há argumentos. Conclui-se, através dos pensamentos dessas executivas, que
fazer valer o predomínio da competência sobre uma cultura corporativa machista requer não
só a ocupação de mais espaços nesse nicho ocupacional de elite, mas também a obtenção de
melhor conciliação entre a carreira profissional e a vida pessoal dessas mulheres. Nota-se que
a proposta é conciliar as duas demandas e não equilibrar. Equilíbrio é dividir igualmente a
dedicação entre ambas. Conciliar é atender a necessidade de cada uma conforme a urgência e
o bem estar dos envolvidos.
1.1 Problemática
A vida pessoal e a carreira executiva são duas demandas, respectivamente, da esfera
privada e pública que interagem no papel feminino das, ainda raras, mulheres que chegaram
ao poder no Olimpo das organizações, no topo da hierarquia organizacional, que ainda é
considerado um império masculino. A carreira pode ser considerada uma demanda pública
devido ao seu exercício situado na esfera pública e da sua utilidade social. De acordo com
vários autores, Evans (2000); Tanure; Carvalho Neto e Andrade (2007), as mulheres são
minoria na cúpula organizacional, embora já atinjam 23% dos cargos mais cobiçados.
A carreira executiva é tradicionalmente percebida pelas organizações como um
modelo de carreira masculino e de notoriedade social. Por outro lado, a carreira executiva
requer disponibilidade de tempo e dedicação quase exclusiva. (LOMBARDI, 2006). Sendo
assim, para se tornarem executivas, as mulheres investem mais em conhecimento e
escolaridade do que os homens (BRUSCHINNI; PUPPIN, 2004).
Nota-se que as mulheres executivas procuram superar o preconceito, por serem
mulheres num modelo de carreira considerado tanto na sociedade, quando dentro das
organizações, como “masculino”. Estas mulheres então investem mais que os homens, seus
colegas de trabalho, pois, além da competência técnica, ainda tiveram que internalizar
atributos que os homens valorizam: disposição para assumir risco, racionalidade motivada
fortemente para ganhos materiais e agressividade para negociar. (LIMA; LIMA; TANURE,
2008). As executivas, apesar de terem investido alto e superado grandes desafios em suas
carreiras, não podem dar-se ao luxo de acomodarem em relação ao sucesso profissional,
devido aos desafios e instabilidades da carreira executiva, situação esta mais evidente e
suscetível para as mulheres.
18
A expatriação, fruto da internacionalização das empresas e consequência do mercado
contemporâneo mais globalizado, também se apresenta como desafio para as executivas, pois
é raro o marido deixar o emprego para acompanhar a esposa que foi expatriada, entretanto, o
contrário é muito comum e recorrente. (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).
As demandas da vida pessoal das executivas recebem influências da cultura do país e
da sociedade, como acontece no caso brasileiro na contemporaneidade, onde ainda se espera
que as mulheres se dediquem à família, reserve tempo para a maternidade e responsabilidades
com as atividades domésticas (BARBOSA; PEIXOTO; MEDEIROS; VALADÃO JÚNIOR,
2010), fruto de uma cultura machista presente na sociedade brasileira. (TANURE;
CAVALHO NETO; ANDRADE, 2010). Portanto, as pressões sociais e culturais fazem com
que as mulheres sejam criadas no seio familiar para desenvolver as capacidades citadas
anteriormente.
Além disso, estereótipos femininos são criados, atribuindo às mulheres características
“natas” como: intuitiva, emocional, empática, espontânea, maternal, cooperadora, capaz de
oferecer apoio e lealdade (MORGAN, 1996), o que não quer dizer que os homens não
apresentem tais características, e sim que o mercado espera encontrá-las preferencialmente
nas mulheres. Interessante ressaltar que os estereótipos citados, como emocional e maternal,
podem se configurar com características negativas dentro do ambiente profissional, sob uma
visão machista. Esta visão credita que tais comportamentos das mulheres podem trazer algum
risco para as negociações ambiente de trabalho (GASTRELL, 2011).
Cabe aqui apontar outra demanda da vida pessoal das mulheres, que está relacionada
aos cuidados com a aparência física e emocional. É recorrente que quando as mulheres não se
apresentam em vestidas, maquiadas ou sem acessórios, são julgadas como mulheres pouco
femininas. O mesmo tipo de julgamento ocorre quando essas mulheres, devido a algum
acúmulo de estresse e pressão, acabam por demonstrarem uma explosão de emoções ou algum
tipo de ataque histérico. (TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007). Com todas
essas expectativas em relação ao papel da mulher, as mesmas se veem impelidas em
desenvolver os vários papéis da vida pessoal, o que pode ser ilustrado pela frase de Simone de
Beauvoir: “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher”. Caso contrário, quando não são bem
sucedidas nas demandas da vida pessoal se sentem culpadas (EVANS, 2000).
Nas décadas de 1980 e 1990 houve uma maior contribuição da mulher na força de
trabalho, em nível global, o que resultou na atenção para o fenômeno da conciliação entre a
carreira profissional e a vida pessoal, sobretudo referente às responsabilidades familiares. Em
muitos países ainda predomina o modelo familiar, onde o homem é responsável pelo sustento
19
da casa e a mulher pelos cuidados do lar. No Brasil, nuance de mudanças, que começam a
surgir no período entre 1992 a 2005, quando o mercado de trabalho assiste a uma grande
inserção da mulher como força de trabalho, surgem novos modelos familiares. Modelos esses
em que tanto a mulher quanto o homem trabalham fora e compartilham responsabilidades
financeiras, sendo que a mulher, ainda assim, é a principal responsável com os cuidados da
casa e dos filhos. Conclui-se dessa forma, que a mulher realiza uma jornada dupla de
atividades, já que trabalha fora e dentro de casa. (SORJ; FONTES; MACHADO, 2007).
A conciliação dessas duas demandas pode ser considerada tarefa relevante para as
executivas contemporâneas, já que a maioria delas optou por casar e ter filhos. As executivas
correm contra o relógio biológico, engravidando muitas vezes após os 35 anos, devido ao
investimento de tempo e dedicação à carreira profissional. Contudo não desistiram de
engravidar nem que seja através da fertilização in vitro. (TANURE; CARVALHO NETO;
ANDRADE, 2007). Tal situação sugere que, apesar do alto investimento na carreira
profissional, atitude tradicionalmente “masculina”, elas conservam e realizam o desejo de ser
mãe, ícone da identidade da mulher.
No Brasil, o reconhecimento da problemática da conciliação entre trabalho e família é
de fraca legitimação, tendo por base as políticas públicas que não a favorece (como por
exemplo, muitas vezes os horários de atendimento das creches e das escolas não coincidem
com o período em que a mãe está no trabalho). Além disto, a flexibilização do trabalho, nos
anos de 1990, favoreceu a mulher a ocupar cargos de meio período com salários inferiores; e a
licença maternidade ainda pode ser vista como um agravante na hora da decisão de
contratação, diferentemente dos países europeus desenvolvidos. Outra situação agravante
deste cenário é a questão do homem brasileiro não possuir o hábito cultural de exercer
atividades domésticas e de se comprometer com a educação e a socialização dos filhos, assim
como com seus cuidados. (SORJ; FONTES; MACHADO, 2007).
As empresas tendem a contribuir negativamente com a conciliação da carreira
profissional com a vida pessoal. Entendem que “vestir a camisa da empresa” é estar
disponível 24 horas por dia, principalmente em se tratando de executivos. As organizações,
em busca de melhores resultados, estimulam a competição por metas cada vez mais ousadas,
alimentando o conflito entre a carreira e a vida pessoal (SOUZA et.al, 2009). Dessa forma, as
trabalhadoras que veem a carreira como um valor, optam por sacrificar a vida pessoal em
favor da carreira. Tal situação pode proporcionar sofrimentos futuros e desânimo com o
trabalho. (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE 2010). Porém, nota-se que o discurso
da qualidade de vida e a preocupação em perder executivos estratégicos, podem fazer com
20
que as empresas possibilitem, na medida do possível, a conciliação entre o trabalho e a vida
pessoal. (SANTOS PINTO, 2003).
O homem, parceiro amoroso, ainda pode ser um obstáculo para a mulher conciliar a
carreira profissional com a vida pessoal. Já que, em muitos casos, ele pressiona a mulher a
interromper a carreira após o nascimento do filho, isso ocorre em função da ideia cultural da
mãe ser a principal responsável pela criação do mesmo. Em contrapartida, a mulher tende a
optar pelo trabalho parcial (ITABORAÌ, 2009). Isso porque as mulheres assumem os cuidados
com o filho como algo normativo. (SANTOS, 2008). Pode ser que os homens, em sua
maioria, ainda não vislumbrem a carreira de suas esposas como um valor familiar.
O tema despertou a motivação da pesquisadora, que tem que lidar com seu
investimento na carreira acadêmica e suas responsabilidades como chefe de família. Logo,
tem como inspiração sua própria vida. Como salienta Marshall (1992), o tema de pesquisa
pode estar diretamente relacionado à vida do pesquisador, porém deve se abster de juízos de
valores arraigados. A pesquisa de determinado tema pode ser motivada por interesses
pessoais, que reflitam importância na vida do pesquisador e esse, por sua vez, deseja
aprofundar o conhecimento sobre o assunto para maior compreensão e desenvolvimento
intelectual.
Sendo assim, diante da problemática exposta acima e vivenciada pelas já não tão raras
mulheres que ousam lidar com demandas tão exigentes de tempo e investimento na carreira,
levanta-se a seguinte questão: Como a mulher que rompeu o “Teto de Vidro” concilia a
carreira profissional com a vida pessoal?
Para tanto, faz-se importante analisar como as executivas dividem o tempo entre
carreira profissional e a vida pessoal, além de analisar o investimento que estas, fazem na
carreira profissional e na vida pessoal.
1.2 Justificativa
Estudar a conciliação da carreira profissional e da vida pessoal das executivas é de
extrema importância para a sociedade, as organizações contemporâneas, as mulheres que
pretendem ascender na carreira executiva, as mulheres e os homens em geral, seus maridos e
colegas de trabalho. Espera-se que, sob a luz das informações deste trabalho, todos os
envolvidos acima citados possam ser de alguma forma beneficiados.
21
Justifica-se, portanto, o presente trabalho em função da importância social e
organizacional do tema carreira da mulher executiva. Apesar da barreira estereotipada dos
gêneros em nossa cultura social machista e da presença do “Teto de Vidro” nas organizações,
há uma tendência de maior valorização das habilidades tidas como femininas. Além disso, a
sociedade e as organizações estão se dispondo a enfrentar as consequências desse novo
contexto e ampliar o enfoque diretivo e a tomada de decisão para a inserção dos valores
femininos, respeitando a percepção das mulheres tanto nas questões sociais quanto nas
organizacionais. (OLIVEIRA; GAIO; BONACIM, 2009).
A sociedade e as organizações, sabendo como as executivas conciliam sua carreira
profissional com a sua vida pessoal, podem criar políticas públicas e políticas e práticas de
Recursos Humanos - RH que favoreçam ganhos econômicos mais equitativos entre os
gêneros. E as empresas poderiam se beneficiar da diversidade na cúpula organizacional,
podendo contribuir em estratégias competitivas, caso a diversidade lhes seja um valor.
Além do mais, esse trabalho poderá ainda ser útil aos gestores, consultores,
professores e estudiosos que tenham o compromisso de aperfeiçoar, continuamente, sua
postura, habilidades, práticas e atributos, na gestão de carreira aplicada, especialmente no
segmento feminino (MELO; APARÍCIO; OLIVEIRA; CALVOSA, 2009).
Muitas empresas consideram tal conciliação importante quando esta representa valor
para os funcionários “estratégicos” com alto grau de responsabilidades dentro da organização
e que não abrem mão da vida pessoal em favor da carreira profissional. (PINTO, 2003).
Podendo, então, incorporar tal ação no discurso de promover qualidade de vida no trabalho.
Outra justificativa se refere à importância do assunto para as mulheres que almejam a
conciliação entre a carreira executiva com a vida pessoal. Já que as mulheres, que ascendem
em suas profissões precisam saber conciliar diferentes demandas, anseios e expectativas que
recaem sobre elas, muito mais que os homens que chegaram ao poder (BOTELHO;
MORAES; CUNHA, 2008).
Por este ser um universo de difícil acesso, o fato de executivas terem conquistado
lugar na cúpula organizacional, este estudo vem contribuir com a literatura acadêmica.
Raramente consegue-se retratar pesquisas nesse nível organizacional, por ser limitado o
número de mulheres que ocupam tais posições nas grandes organizações; assim como a falta
de acesso à agenda dessas executivas. (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).
Sendo assim, pretende-se pesquisar um universo crítico na literatura, o das executivas que
mesmo sob os efeitos do “Teto de Vidro” e que conquistaram o lugar almejado pelos homens.
22
1.3 Objetivos
1.3.1 Objetivo Geral
Compreender como a mulher executiva brasileira, que chegou ao nível estratégico das grandes
empresas, tenta conciliar a carreira profissional e a vida pessoal.
1.3.2 Objetivos específicos
Identificar como as executivas dividem o tempo entre trabalho e vida pessoal;
Identificar o investimento que as executivas fazem no trabalho e na vida pessoal.
23
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Este trabalho parte do pressuposto do paradigma interpretativista, que
[...] se baseia na visão de que o mundo social possui uma situação ontológica
duvidosa e de que o que passa por realidade social não existe em sentido concreto,
mas é produto da experiência subjetiva e intersubjetiva dos indivíduos. A sociedade
é entendida a partir do ponto de vista do participante em ação, em vez do
observador. (MORGAN, 2007).
A teoria interpretativista entende os fatores contextuais, como construções sociais
compartilhadas dos indivíduos e dessa forma, a teoria enfatiza que as ações sociais se
orientam para dar sentido ao passado, tanto quanto ao futuro. Sendo assim, tenta-se
compreender o processo pelo qual as múltiplas realidades compartilhadas das executivas
surgem, se sustentam e se modificam através dos estudos já realizados anteriormente e em
complemento a esta dissertação. (MORGAN, 2007).
Esta dissertação busca dialogar com autores que já adotaram a corrente epistemológica
intepretativista, ao estudarem o tema da mulher executiva em Administração, que foram,
segundo Santos (2012): Bruschini (2000; 2006; 2007; 2009), Bruschini e Lombardi (2001);
Bruschini e Puppin (2004); Leone (1996; 1998; 2000) Leone e Baltar (2006; 2008) Tanure,
Carvalho Neto e Andrade (2007) Carvalho Neto, Tanure e Andrade (2010) e Betiol e Tonelli
(1991).
Este referencial teórico está dividido em quatro partes. Assim sendo esta divisão temse na primeira parte o preâmbulo sobre a evolução do papel da mulher no mercado de trabalho
no Brasil desde a década de 1960 até os dias atuais. A segunda parte discutir-se-á sobre o
desafio da conciliação entre a carreira e a vida pessoal das executivas. A terceira falar-se-á
sobre a divisão do tempo dessas mulheres entre a carreira e a vida pessoal. A quarta e última
parte referenciar-se-á sobre os tipos de investimentos que as executivas fazem tanto na
carreira, quanto na vida pessoal.
2.1 A evolução do papel da mulher no Brasil a partir da década de 1960
Na sociedade pré-capitalista a mulher se encontrava em posição inferior à do homem
nos campos jurídico, social, político e privado. As trabalhadoras dessa época assim só o eram
por necessidade de sobrevivência e dessa forma, eram alocadas em atividades desvalorizadas
24
pela sociedade e assim, seus respectivos salários representavam cerca de 25% dos salários dos
homens. (DEL PRIORE, 2011).
A força de trabalho feminino chegou a ser vista como um “exército reserva” da
população economicamente ativa, uma vez que a mulher se posicionou mais ativamente no
mercado de trabalho durante o período entre a I e II guerra mundial. Isso ocorreu devido ao
fato dos homens estarem escalados para as forças armadas e assim, suas esposas necessitavam
suprir a função de provedor deixada por eles. Ao final de cada guerra, as mulheres tinham de
ceder aos homens os espaços já ocupados, logo não tinham a oportunidade de aprimorar seu
trabalho e construir uma carreira. Interessante notar que até mesmo os postos de trabalhos em
escritórios, até então desvalorizados, eram cedidos aos mutilados da guerra e as mulheres
eram forçadas a retornarem à função de origem: “rainha do lar”. (BETIOL, 2000).
A partir dos anos de 1960, as mulheres da classe média começam a ingressar no
mercado de trabalho mesmo que em áreas não tão bem remuneradas e valorizadas, já que,
anteriormente a essa data somente as mulheres de classe mais baixa trabalhavam como
lavadeiras, arrumadeiras e etc. As mulheres da classe média entram no mercado de trabalho
como secretárias, professoras, enfermeiras, o que contribuiu para certa valorização do
trabalho da mulher. (ALMEIDA, 2007). Nos países escandinavos as mulheres começam,
nesse período, uma luta em favor da equidade entre homem e mulher. (FARIA, 2002). Em
geral, no caso do Brasil, até os anos de 1970, as mulheres casadas, com poder aquisitivo de
médio para alto, se quisessem ter uma profissão que fosse socialmente e culturalmente aceitas
estavam, quase que, predestinadas a serem professoras, enfermeiras e assistentes sociais. Com
os movimentos feministas, o controle da natalidade através da pílula contraceptiva e a entrada
da mulher nas universidades trouxe uma mudança no cenário. Dessa forma, as mulheres
passaram a decidir quando engravidar e ao optarem por adiar a gravidez tiveram maiores
possibilidades de se qualificarem melhor para o mercado de trabalho. (BRUSCHINI;
LOMBARDI, 2001; ITABORAÍ, 2003).
No Brasil, a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) da OIT (Organização
Internacional do Trabalho) ratificaram convenções da proteção do trabalho feminino. Essas
leis trabalhistas visam combater a discriminação da mulher no mercado de trabalho, na
medida em que proíbe a diferenciação de salário por gênero e critérios de seleção baseados
em sexo ou estado civil. Assim como, proporcionaram o direito à licença maternidade,
também proporcionaram para as mães que trabalhavam fora de casa a inserção de crianças, de
0 a 6 anos de idade, em creches. (DEL PRIORE, 2011).
25
A partir da década de 1970, os movimentos feministas ganham ainda mais força na
esfera global ocidental. No caso das mulheres brasileiras, intensificou-se a participação na
atividade econômica em um contexto de expansão da economia, com acelerado processo de
industrialização e urbanização. Prosseguiram nesse mesmo sentido na década de 1980, apesar
da estagnação da atividade econômica e da deterioração das oportunidades de ocupação no
país (HOFFMAM; LEONE, 2004).
Nas décadas de 1980 e 1990, o sentido do trabalho, para muitas mulheres da classe
média brasileira, começa a se transformar, fazendo com que as mesmas passassem a investir
mais na carreira, assumindo simultaneamente um maior papel profissional além do maternal.
Uma vez que, ainda se atribuía, quase que exclusivamente, à mãe a função de educar e
socializar os filhos. Por isso, as mulheres tendem a sentir muitas dificuldades em conciliar
esses dois papéis. (ALMEIDA, 2007).
Importante ressaltar que o desenvolvimento político, social, econômico e cultural do
país influencia na maneira de existir, viver, pensar e agir da população, que tende ao mesmo
movimento de evolução, e tal situação não poderia ser diferente com as mulheres. Elas, na
década de 1990, já concorriam às eleições diretas na esfera política, obtendo sucesso em
algumas cidades brasileiras, fruto da crescente consciência, por parte da sociedade, das lutas
dos movimentos feministas. Isto pode indicar a aceitação social de uma nova mulher que vai
além das fronteiras da esfera privada rumo à vida pública, tanto na política quanto no mercado
(DEL PRIORE, 2011).
Ainda na década de 1990 cresce o desemprego, afetando principalmente a População
Economicamente Ativa (PEA) masculina, o que contribuiu para realçar o percentual da
participação feminina no mercado de trabalho. Tal desemprego afetou também as mulheres
mais jovens, sendo a PEA feminina neste momento mais representada pelas mulheres adultas
(BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001; HOFFMAM; LEONE, 2004). Mulheres estas que
provavelmente já estavam no mercado de trabalho e permaneceram, enquanto as jovens
tiveram dificuldade de se inserirem nesse contexto.
Desta forma, as mulheres já inseridas no mercado de trabalho passaram a ocupar
cargos mais qualificados e remunerados, principalmente nas áreas de artes, humanas,
biológicas e saúde, conhecidas como guetos profissionais femininos. Essa realidade pode ter
sido influenciada também pela elevação da escolaridade feminina que superou a masculina, já
que nesse período cerca de 60% dos estudantes que concluíam o curso superior no Brasil já
eram mulheres. (BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001).
26
Outra influência para o forte ingresso da força de trabalho feminino, nas décadas de
1980 e 1990 no Brasil, foram as mudanças demográficas. Nota-se a redução da fecundidade
reduziu o tamanho das famílias, o que por sua vez, possibilitou a diminuição do tempo com os
cuidados dos filhos pequenos e a divisão do mesmo entre os cuidados com a família e a
carreira profissional. Além disso, o aumento do percentual de famílias chefiadas por mulheres
impulsionou a motivação para a construção de uma carreira sólida. (BRUSCHINI;
LOMBARDI, 2001).
O Brasil estava em intensa abertura econômica e em processo de desregulação da
economia, o que gerou crise de emprego para a indústria, com downsizing e o enxugamento
das estruturas organizacionais, onde os homens foram mais penalizados que as mulheres. Tal
situação pode ser confirmada na oscilação da PEA feminina e masculina dita anteriormente
(BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001; HOFFMAM; LEONE, 2004).
Mesmo com todos os encantamentos de um sentido maior do trabalho e a influência
dos contextos cultural, econômico e político, para as mulheres com alta escolaridade e sujeitas
a melhores empregos, estes não foram capazes de fazê-las abandonarem antigos valores e
funções, tais como tarefas domésticas, cuidados infantis, entre outros. Para a classe média
feminina, o trabalho é um projeto individual, tecido no seio da história familiar sob influência
cultural, capaz de proporcionar satisfação e status, além de contribuir para a formação da
identidade. Tais valores concorrem entre si dentro do da alma feminina, de forma a provocar
sentimento de culpa quando o antigo valor (atividade do lar) é preterido em relação ao novo
(carreira bem remunerada), ressaltando que ambos requerem grande quantidade de tempo e
dedicação. (ALMEIDA, 2007; CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).
Constata-se, portanto, que neste período (década de 1980 e 1990), que a participação
das mulheres no mercado de trabalho evoluiu. Os rendimentos femininos representaram um
significativo aumento para a contribuição da renda familiar em relação ao rendimento
masculino, que diminuiu nesse período. Isso impactou diretamente na desigualdade da renda
per capita no Brasil, o que reduziu a diferença entre a renda masculina e feminina, embora
permanecendo ainda a masculina como a maior. As mulheres em níveis ocupacionais mais
elevados no mercado de trabalho ocuparam as oportunidades nos guetos femininos como o de
atividades sociais (saúde, educação, previdência e assistência social), assim como serviços
auxiliares da atividade econômica e administração pública, disputando, muitas vezes, essas
ocupações com os homens. (HOFFMAM; LEONE, 2004).
O Estado de São Paulo, na década de 1990, apresentou uma mudança da inserção da
mulher em cargos de gerência e direção, aumentando em 10,7%, ao mesmo tempo em que
27
continua a aumentar a escolaridade feminina e a seletividade na contratação das organizações.
Apesar das mulheres virem alcançando, gradativamente, cargos mais qualificados no mercado
de trabalho, elas ainda representam a minoria. (MORAIS; LAIA; MENDONÇA; LEÇA,
2002).
As raras mulheres nos cargos de gerente e diretor também ilustram a reconstrução do
sentido do trabalho nas relações de gênero de forma sócio-histórica ao longo do tempo. Esse
fenômeno adquire caráter transformador tanto socialmente quanto individualmente.
(ALMEIDA, 2007). Isso pode ter contribuído para a elevação do número de mulheres de
classe média que passaram a contribuir com a renda familiar. (HOFFMAM; LEONE, 2004).
O perfil da mulher desde o final da década de 1990 é de trabalhadora, estudante,
participante dos partidos políticos, mas sem abandonar as velhas funções de dona-de-casa e
socializadora, assim como educadoras dos filhos, tarefas essas que também consomem horas
de trabalho. (DEL PRIORE, 2011). Contudo, para a mulher, o sentido da maternidade e do
trabalho é circunscrito pelos significados sócio-histórico que limitam o leque de opções para
que ela construa tal sentido. (ALMEIDA, 2007). Mesmo com o acúmulo de funções, ela não
se encontra em pé de igualdade com o homem na direção do núcleo familiar. Entretanto, é
vista como uma colaboradora do marido, que continua sendo o chefe da casa. Em relação ao
universo público, ela confronta-se com o “Teto de Vidro”. (DEL PRIORE, 2011).
“Teto de Vidro” ou “Glass Ceiling” são as barreiras criadas por atitudes ou tendências
da organização que impede que indivíduos qualificados, incluindo assim as mulheres, de
chegarem aos cargos da alta gerência executiva, relacionadas à cultura organizacional
machista. (KONECK, 2006). Tal fenômeno é fruto dos conflitos de gêneros, que são
pervasivos. Entretanto, nas organizações eles são fáceis de negar e difíceis tanto de provar,
quanto de estudar. O conceito “Teto de Vidro” surgiu nos Estados Unidos na década de 1980
para descrever as barreiras: sutis, por estarem enraizadas na cultura social; transparentes, pelo
poder de passarem despercebidas; e fortes o suficiente para impedirem as mulheres de
alcançarem cargos da alta gestão organizacional. (MORRISON, 1992; STEIL, 1997). Tal
fenômeno pode ser responsável por elas ainda serem a minoria na cúpula organizacional, uma
vez que são raras as mulheres que ultrapassam o terceiro escalão na administração
organizacional (DEL PRIORE, 2011) se comparadas com a quantidade de mulheres
trabalhadoras da base da pirâmide administrativa.
Nota-se que a constituição dessa nova identidade feminina, voltada para o mercado de
trabalho, recebe forte impacto das transformações nos padrões culturais e nos valores relativos
ao papel da mulher, fruto dos movimentos feministas desde os anos de 1970 (BRUSCHINI;
28
LOMBARDI, 2001). Observa-se que a autonomia profissional feminina foi o que permitiu a
mulher ter maiores oportunidades de disputar cargos com os homens abriu novos horizontes,
ainda que relativamente modestos, referentes à vida profissional e pessoal, o que afetou
diretamente a vida familiar. No Brasil, as mulheres de 25 a 44 anos possuem uma vida
profissional mais ativa, desde a década de 1980, por estarem mais escolarizadas,
consequentemente em condições técnicas de equidade com os homens e em alguns casos,
superam o conhecimento de seus parceiros. Além de serem socialmente aceitas para competir
por cargos com os mesmos, com possibilidade de exercer funções antes não exercidas por
elas. (ITABORAÍ, 2003).
Nessa situação, muitas mulheres tiveram que assumir um perfil agressivo mais
parecido com o dos homens, para ganhar o respeito de seus colegas de trabalho e se tornarem
parte do grupo. Tal situação não implica o abandono por completo da maternidade, mas sim o
adiamento, fato esse que se configura em um número maior de mulheres trabalhadoras de
classe média que passaram a ter filhos mais velhas. (TANURE; CARVALHO NETO;
ANDRADE, 2007; SANTOS, 2012).
As mulheres muitas vezes fazem questão de assumir sozinhas as atividades da rotina
com o bebê, devido ao imperativo socialmente construído: somente elas sabem cuidar dos
filhos. Muitas se sentem inseguras em relação aos cuidados com o bebê e/ou com quem deixar
a criança para trabalhar (creche ou aos cuidados de um parente ou babá). Isso pode chegar a
gerar culpa por não ficar o tempo integral com seu filho. (ALMEIDA, 2007; TANURE;
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2010). Dessa forma, a maioria das mães, após cumprirem
a licença maternidade, tendem a dividir seu tempo entre o trabalho e os cuidados com o filho.
(ALMEIDA, 2007).
Os países escandinavos têm como frente de batalha a igualdade de gênero desde a
década de 1960, como já dito anteriormente. Em especial a Suécia, que tem como
denominação: “Estado amigo das mulheres”. Isso por já encontrar em suas políticas públicas
medidas que favoreçam uma equidade nas questões de gênero como, por exemplo, licença
paternidade de até 13 meses para cuidar do filho. Tal benefício tem a intenção de fazer os
homens assumirem um papel mais ativo nos cuidados com o bebê e, assim, proporcionar uma
partilha mais igualitária nas atividades domésticas. Ainda assim, mesmo na Suécia, esse
padrão igualitário está longe de ser simétrico nas tarefas do lar (FARIA, 2002). No Brasil, a
licença paternidade é de sete dias, o que pode ser considerado pouco tempo para o homem se
envolver nos cuidados com o recém-nascido.
29
No Brasil, ainda na década de 1990, mesmo com um modesto crescimento das
oportunidades de emprego, salta o número de mulheres casadas com filhos, no mercado de
trabalho, seguido das mulheres chefes de família e das famílias monoparentais – aquelas
famílias caracterizadas pela presença do pai com filho ou da mãe com filhos. (ITABORAÍ,
2003). Tal situação pode significar que as mulheres que já se encontravam no mercado de
trabalho tiveram filhos e continuaram em exercício. Simultaneamente ao crescimento das
famílias monoparentais, aumenta-se também no mercado de trabalho o número de mulheres
casadas pertencentes à classe média. Segundo Itaboraí (2003), aponta que o percentual de
mulheres trabalhadoras, casadas com homens bem sucedidos financeiramente, cresce de
44,2% em 1986 para 54,5 % em 1996 no Brasil. Sendo assim, o número de oportunidades de
emprego diminuiu, mas não deixou de existir. As mulheres que já se encontravam no mercado
de trabalho, mesmo depois de terem filhos, permaneceram. E essas oportunidades de emprego
podem ter sido preenchidas por mulheres mais qualificadas, pertencentes à classe média.
Surgindo assim, um novo sentido de trabalho para a mulher. Não somente como necessidade
financeira, mas também como valor de satisfação profissional.
Dessa forma, há novamente uma reconstrução do sentido do trabalho da mulher, agora
para o homem que, na condição de marido, consegue perceber as vantagens da esposa
economicamente ativa. Além do benefício da complementação da renda familiar, o que eleva
o padrão de vida da família, ele ainda pode desfrutar de um melhor estado de espírito da
esposa, mais positivo, alimentado pela satisfação profissional.
No período de 2001 a 2010, a carreira da mulher dentro das 500 maiores empresas
para se trabalhar foi registrada na série histórica pelo Instituto ETHOS e IBOPE com
pesquisas editadas em 2001, 2003, 2005, 2007 e 2010. A amostra foi composta por empresas
de vários setores (47,6% indústria, 26,6% no serviço, 17,2% no comércio e 8,6% no setor de
alimentos e produtos agrícolas) na última pesquisa, em 2010. O percentual de mulheres em
cargos executivos vem aumentando. Comparados os dados de 2010 com os de 2007, constatase um decréscimo da presença feminina na base e nos níveis intermediários da escala
hierárquica. Mas olhando-se o topo, pode-se saudar um crescimento de 2,2 pontos. As
mulheres ocupam agora 13,7% do quadro executivo, um espaço historicamente inexpugnável
para elas. Considerada a série histórica, a partir de 2001, são 7,7 pontos de avanço em relação
a uma parcela inicial de 6% (ETHOS; IBOPE, 2001; 2003; 2006; 2007; 2010). A Figura 1
ilustra os dados citados anteriormente segue na próxima página.
30
Figura 1Composição por sexo dos funcionários em posição executiva, gerencial, de supervisão e
funcional das 500 maiores empresas do Brasil dos setores industrial, serviços, comércio
alimentos e produtos agrícolas no período de 2001, 2003, 2005, 2007 e 2010.
Fonte: Instituto ETHOS e IBOPE Inteligência, 2010
Esses dados reforçam a existência do “Teto de Vidro”. No entanto, também revelam
mulheres que conseguiram atingir o topo da hierarquia organizacional no Brasil apesar da
presença do mesmo. Em uma pesquisa com dados de 370 empresas brasileiras, pesquisadas
pelo instituto de pesquisa Sensus em 2007, Madalozzo (2011) concluiu que as mulheres têm
ascensão mais restrita ao cargo de Chief Executive Officer (CEO), caso a empresa em que
31
trabalhem tenha um Conselho de Administração constituído. Tais conselhos geralmente são
formados por homens que tendem a escolher seu semelhante para cargos estratégicos.
Em 2012, a revista, norte americana, Fortune publicou as 1000 CEOs das maiores
corporações dos Estados Unidos, das quais 20, do ranking de 1 a 500 são mulheres. O recorde
de 20 mulheres entre as 500 corporações superou as 12, de 2011. Houve um aumento de oito
para vinte CEOs mulheres. Entre elas estão: Meg Whitman da HP; Indra K. Nooyi da
PepsiCo, Inc.; Ellen J. Kullman da DuPont; Ursula M. Burns da Xerox Corporation e Marissa
Mayer da Yahoo.
No mesmo ano (2012), a revista brasileira Exame publicou as 11 mulheres presidentes
das grandes empresas no Brasil. Entre elas estão: Maria das Graças Foster da Petrobras; Grace
Lieblein da General Motors - GM Brasil; Adriana Machado da General Electric - GE; Andrea
Bertone da Duke Energy International e Regina Nunes da Standard & Poor‟s.
A presença das mulheres, ainda que em minoria, no comando das grandes
organizações pode indicar que é possível ultrapassar o Teto de Vidro. Mesmo com um gap de
tempo em relação à entrada da mulher no mercado de trabalho se comparada ao homem, ela
está avançando sem abandonar os papéis da vida pessoal, como o de mãe e esposa.
As mulheres estão ocupando cargo de poder na esfera política, o que pode abrir mais
caminhos para outras mulheres. Um exemplo disso, no Brasil, é a Presidente Dilma Rousseff.
No governo anterior, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em seus dois mandatos, tiveram
cento e três ministros nomeados, dos quais dez foram mulheres, entre elas a atual presidente.
Essa começou o governo com oito mulheres no ministério e secretarias e atualmente, há dez,
das cinquenta e duas pessoas nomeadas. O que pode indicar que, quando as mulheres chegam
ao poder abrem portas para outras mulheres. (PLANALTO, 2012).
A escolha de um CEO por parte do Conselho de Administração reflete não somente a
experiência e a capacidade do indivíduo, mas também sua similaridade com o perfil do
Conselho que o escolheu. Sendo a maioria de seus membros homens, esses podem levar
vantagens sobre as mulheres. (WESTPHAL; FREDRICKSON, 2001; MADALOZZO, 2011).
Da mesma forma, uma mulher presidente pode levar em consideração, além da experiência e
da capacidade das pessoas para compor sua equipe, a pessoa que mais se assemelha ao seu
perfil, tendo as mulheres maior chance.
A conciliação entre vida pessoal e vida profissional da mulher que compõe a PEA
feminina apresenta um nível de complexidade ainda maior, quando o filho é pequeno. Mesmo
que a Constituição de 1988 assegure o direito da mulher/mãe inserir seus filhos de 0 a 6 anos
em creches, tal direito não consegue atender à demanda das classes mais baixas. As mães
32
casadas de classe média, com filhos pequenos, que não queriam interromper sua carreira
profissional contratam uma babá. (ITABORAÍ, 2003). Nota-se que as mães tendem a se sentir
sobrecarregadas quando retornam às suas atividades profissionais após a licença maternidade.
Elas não têm mais o tempo em casa para adiantar suas atividades profissionais, já que o tempo
no lar é prioritário da criança. Abre-se então uma concorrência para o investimento do tempo
entre o trabalho profissional e os cuidados com o bebê. (ALMEIDA, 2007; TNURE;
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007).
Apesar de conseguir exercer diversas tarefas, as mulheres, no Brasil, ainda enfrentam
algumas dificuldades como: salários menores; preterição nas promoções a cargos de maior
responsabilidade e lidam ainda com o conceito de que o trabalho da mulher é um
complemento ao trabalho do homem, o que pode resultar em desqualificação do mesmo.
(DEL PRIORE, 2011).
2.2 Os desafios da conciliação da carreira da mulher executiva com a vida pessoal
As executivas recebem ainda maior número de demandas oriundas de fontes
complexas: carreira profissional e vida pessoal, tornando um desafio conciliá-las. Essa
conciliação pode causar modificações no estilo de vida da mulher. Conflitos presentes no
trabalho e na esfera pessoal causam problemas emocionais e físicos, além de interferir na
relação familiar e reduzir a satisfação relacionada à qualidade de vida. (TANURE;
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007; SOUZA et.al, 2009).
O senso comum machista diz que a mulher é prioritariamente destinada à esfera
doméstica; sua vida profissional, assim como a natureza de seus investimentos no trabalho, é
visto apenas como consequências de suas obrigações familiares. (BELLE, 1994). Sendo
assim, os desafios da carreira profissional para as mulheres são mais pesados se comparados
aos dos homens, como já dito anteriormente.
Na década de 1980, as empresas não ofereciam direcionamento para as mulheres
seguirem carreira executiva, elas tinham que desbravar seu próprio caminho rumo ao Olimpo
organizacional, o topo da hierarquia pois, até então, só o avistavam de longe. Para tanto,
precisavam de investimento psíquico para lidar com as barreiras do preconceito, o que pode
ter levado a mulher a ser mais agressiva para se igualar ao homem e se considerar diferente
das outras mulheres e, assim, ganhar a confiança dos executivos e ter oportunidade de chegar
33
ao Olimpo organizacional. (BETIOL; TONELLI, 1991). E algumas conseguiram atingir o
topo.
No entanto, a representatividade das mulheres em níveis mais elevados das
organizações é muito baixa, além de predominarem em serviços comunitários e sociais:
“guetos femininos”. No ano de 2000, as mulheres, ocupantes de cargo de diretoria,
representavam aproximadamente 20% do total de cargos de diretor no Brasil. (BRUSCHINI;
PUPPIN, 2004). Em 2007, a estatística parece não ter mudado, nos cargos de presidentes,
diretoras, vice-diretoras e superintendentes. (TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE,
2007).
Os números de mulheres que ocupam cargos de direção são elevados, quando não
superiores ao dos homens em áreas tradicionais femininas, como a social, a da cultura e a da
educação. As mulheres têm mais probabilidade de atingir posições mais elevadas na carreira
dentro da administração pública, em comparação com o setor privado – no setor público
representa 44,8% e no setor privado 20%, em 2000. Há também, maior presença de diretoras
em empresas de grande porte se comparadas com as de médio porte (BRUSCHINI; PUPPIN,
2004).
As transformações nas variáveis econômicas e culturais - mercado globalizado - que
permitiram contato com países culturalmente menos machistas, em que a valorização do
trabalho da mulher é exercida e constatada no maior número de executivas em suas
organizações, contribuíram para o ingresso da mulher na esfera pública. No entanto, não
foram suficientes para desvincular a imagem da mulher como a principal responsável pelos
trabalhos no lar. (BETIOL; TONELLI, 1991).
Há empresas no Brasil como a Incepa, Avon, Azaléia, Kodak, ABB, Unilever, Nestlé,
Sadia, entre outras, que estão adotando políticas de RH que revelam maior preocupação com a
valorização da mulher, quer como funcionária, quer como esposa de um funcionário, por
adotarem medidas que favoreçam a conciliação do trabalho com a vida pessoal, tais como
creche para as crianças de 3 meses a 6 anos próxima à empresa; ocupam-se da formação
profissional de filhos de funcionárias; oferecem licença remunerada para a mãe cuidar do
filho, quando este exige internação; montam escritórios na casa dos funcionários do setor de
vendas. (ARRUDA, 1996; Revista Exame 2010). Todavia, não se pode dizer que tais
benefícios estejam presentes em todas as empresas de grande porte.
Dado esse cenário de RH das empresas, pode-se observar que a carreira da mulher
depende também da cultura organizacional. A cultura das empresas pode facilitar o acesso da
mulher aos cargos mais estratégicos, pois, longe de ser uma parceira neutra na vida do
34
indivíduo, a empresa pode intervir de forma mais completa em suas representações da vida
profissional. (BELLE, 1994).
Para as executivas da pesquisa de Bruschini e Puppin (2004), o papel tradicional da
mulher afeta seus papéis profissionais. Se forem muito passivas, como prega o estereótipo
feminino, não tem garra suficiente para brigar por metas e objetivos, atividades demandadas
pela carreira executiva. A exigência de alta performance das mulheres em papéis femininos
tradicionais influenciados pela cultura machista, criando uma expectativa social da mulher ser
uma moça comportada, esposa dedicada ao marido, mãe zelosa e boa dona de casa impera que
seja ela também uma profissional competente. E essa demanda soa pra elas como pressão,
podendo gerar uma cobrança interna que corrobora com o conflito entre a carreira profissional
e vida pessoal. (BRUSCHINI; PUPPIN; 2004).
Com a soma desses papéis, a mulher fica em desvantagem pessoal no mercado por
carregar uma carga maior de responsabilidades em relação aos homens. Segundo Bruschini e
Puppin (2004), o aumento da participação das mulheres em vários níveis (político, técnico e
nas artes) se torna vitrine na esfera pública, o que pode contribuir para a construção social do
valor do trabalho feminino, ao mesmo tempo em que cria possibilidade de abertura de portas
nas empresas.
A exposição da ascensão da carreira da mulher pode influenciar na alteração do perfil
das executivas. Elas são mais jovens que seus colegas em cargos similares e estão no emprego
há menos tempo que eles; apesar do alto cargo ocupado, recebem menos se comparadas com
os mesmos. Essas diferenças podem ser atribuídas ao tempo que os homens estão no mercado
de trabalho, situação esta que não impacta na admiração delas por aqueles que exercem a
carreira executiva. Elas têm, geralmente, os homens como mentores em relação à profissão,
por ser esta historicamente uma carreira masculina. (BRUSCHINI; PUPPIN, 2004).
Nos anos de 1980, pesquisas realizadas no Brasil por Betiol e Tonelli (1991) e nos
Estados Unidos por Marshall (1992) revelaram que muitas mulheres se adaptam a essa cultura
dominante masculina, trabalhando mais que os homens para serem aceitas por eles nas
empresas, equilibrando a possível “desvantagem” de ser mulher. Em uma cultura
organizacional machista, o conhecimento intelectual feminino parece se tornar invisível aos
olhos masculinos de seus superiores. Mesmo nesta batalha pela adaptação, as mulheres
mantêm seus valores como a intuição e cooperação, considerados “socialmente femininos”,
que as tornam diferentes dos homens. (MARSHALL, 1992). O que não quer dizer que as
mulheres sejam, necessariamente, intuitivas e cooperativas e os homens não.
35
Nesta época, parecia que as executivas careciam de tempo para provar que podiam
conciliar suas carreiras com a maternidade, pois já havia certa valorização do “jeito feminino”
para lidar com conflitos. No entanto, a baixa taxa de mulheres em posições estratégicas
poderia ser indício de dúvida por parte das empresas em colocá-las nesta posição. Já nesta
pesquisa se identificava, dois tipos de preconceitos contra a mulher: sexual, ser inferior ao
homem para assumir postos de comando; e funcional, da desconfiança da disponibilidade da
mulher em investir no trabalho. (BETIOL; TONELLI, 1991). Estes mesmos preconceitos
foram percebidos na pesquisa de Tanure; Carvalho Neto e Andrade (2007), dezesseis anos
depois.
Outro fator interessante para se pensar é o perfil das raras mulheres que chegaram aos
cargos executivos. Observa-se que as mulheres executivas geralmente vieram da classe média,
situação esta que está associada a maior escolaridade, o que implica uma maior participação
no mercado de trabalho em cargos mais elevados em organizações ou ainda, trabalhos menos
precários quando se comparados com os trabalhos das mulheres menos escolarizadas. Nota-se
ainda que mulheres que chegaram aos cargos executivos além de possuir maior escolaridade,
tal característica está associada ao menor número de filhos que essas mulheres possuem ou
terão. Ter um nível maior de escolaridade também influencia em maiores possibilidades de
infra-estrutura no apoio para cuidar da criança e do lar. (BETIOL; TONELLI, 1991).
Ainda na década de 1980, Sulerot (1988), nos Estados Unidos, já salientava que as
executivas se enquadravam em um grupo de mulheres que se realizavam através do trabalho
por exercerem profissões que lhes agradavam, portanto tinham interesse e ambição pelo que
faziam. Pareciam ter apoio dos maridos, preocupavam-se com os filhos, mas não se viam sem
trabalhar. O que não mudou com o passar do tempo, conforme Tanure, Carvalho Neto e
Andrade (2007) ouviriam das executivas brasileiras dezenove anos depois.
Elas valorizam a carreira profissional ao ponto de fazerem muitos investimentos como
estudar, dedicar menos tempo à vida pessoal para se inserir em cargos mais estratégicos no
mercado de trabalho. Os estudos são vistos como uma preparação e até mesmo “passaporte”
para o mercado de trabalho em cargos mais qualificados. (BETIOL; TONELLI, 1991;
TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007).
Segundo a pesquisa de Bruschini e Puppin (2004), a percepção das executivas sobre o
desenvolvimento intelectual pode ser tida como valor para a carreira, uma vez que elas
consideram pré-requisito importante, tanto para promoção quanto para contratação, ter feito
curso superior em uma boa universidade brasileira ou fora do país, assim como ter feito
Master of Business Administration (MBA) e / ou especialização. Outro dado a se observar é o
36
interesse da mulher executiva em investir na carreira profissional, tal situação é demonstrada
através da quantidade de alunas matriculadas no terceiro grau, conquistando um maior
domínio intelectual, e da sua contestação aos modelos familiares tradicional, que a orientava
somente para o lar. (BELLE, 1994).
Outro investimento que as executivas precisam fazer além de saber lidar com as duas
demandas (profissional e pessoal), está relacionado à aparência física e à forma de se trajar.
As organizações acreditam que, ao cuidar da aparência física e da forma de se vestir, o
indivíduo se enche de energia, contribuindo para um clima positivo e oferecendo uma
sensação de bem estar. Tal investimento levaria a uma energização das relações e dos atos, ao
ponto de ser reconhecido pela organização. (BETIOL; TONELLI, 1991).
Nota-se que existe uma expectativa de que a mulher executiva precisa se mostrar de
forma sempre “positiva” para com a vida. Os indicadores externos dessa “positividade”
requerida pelo discurso organizacional aparecem ou se concretizam na forma de se vestir e na
forma de se relacionar. O “desleixo” no vestir pode indicar para o discurso empresarial um
descuido consigo mesmo que não é adequado nem para o homem. O desleixo externo é visto
como tendo uma correspondência com uma desorganização interna, uma falta de confiança e
autoestima. Dessa forma, o cuidar da aparência é uma demanda da vida pessoal e da carreira
profissional sem necessariamente haver uma correspondente dimensão interna de autoestima.
(BETIOL; TONELLI, 1991).
Em se tratando de barreiras que impedem as mulheres de atingirem cargos na cúpula
organizacional, nota-se uma dificuldade das executivas de falarem sobre o fenômeno “Teto de
vidro”. A maioria das executivas entrevistadas em pesquisas é unânime em dizer que não há
diferença de salário, entretanto tal informação se contradiz quando comparadas com os dados
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério do Trabalho. Outro
fato que indica a negação desse fenômeno pelas executivas está relacionado à contratação e
promoção. Elas acreditam que na empresa adota-se a meritocracia para presidir os processos
de ascensão hierárquica, portanto são contra os programas de cotas. Não abrem mão da
meritocracia, mesmo que tenham que trabalhar o dobro para provar seu valor. (BRUSCHINI;
PUPPIN, 2004).
Para as executivas, o estilo de liderança demandado pelas organizações exige
características do estereótipo masculino – agressivo, autoritário, lógico, racional, centralizador
– independente de ser homem ou mulher. Caso a mulher tenha esses atributos em seu perfil o
cargo é dela. O que já dá indício do fenômeno, uma vez que se faz necessário abrir mão do
37
perfil feminino e se “masculinizar” para ascenderem profissionalmente. (BRUSCHINI;
PUPPIN, 2004).
A negação da existência do “Teto de Vidro”, pelas executivas que já chegaram aos
níveis mais altos da hierarquia organizacional, pode ser uma estratégia usada por elas para não
se sentirem ameaçadas pelos homens, seus concorrentes em relação ao cargo e não indicar
fragilidade perante o desafio de conciliar sua carreira com as atribuições familiares. Tal
pensamento se realiza baseado nas contradições presentes em suas falas sobre a existência do
fenômeno na mesma pesquisa feita por Bruschini e Puppin (2004) mencionadas mais abaixo.
A demanda da mobilidade geográfica da carreira executiva pode ser considerada um
desafio para as executivas e um problema para as organizações quando necessitam expatriálas. Viagens, compromissos fora da cidade e fora do horário de trabalho, principalmente se ela
for casada e com filhos, pode ser um forte fator impeditivo para a ascensão profissional.
Geralmente a mulher não desloca o marido e os filhos em função da demanda da empresa
onde trabalha (BETIOL; TONELLI, 1991) e nem os homens tem o hábito de deixar seus
empregos para acompanhar sua esposa em função da expatriação. (TANURE; CARVALHO
NETO; ANDRADE, 2007; GIALAIN, 2009).
As executivas se destacam mais nas áreas que demandam relacionamento direto com
pessoas, ou cuidados administrativos devido à “sensibilidade” do gênero feminino. Há uma
expectativa da empresa de encontrar essas características estereotipadas nas mulheres. Elas
são minoria em áreas técnicas e financeiras. (BRUSCHINI; PUPPIN, 2004). Pode ser indício
do “Teto de Vidro” pensar que as mulheres não possuem características do estereótipo
masculino. Em contrapartida, os homens tendem a valorizar o trabalho da mulher quando suas
esposas estão inseridas no mercado de trabalho. (BETIOL; TONELLI, 1991). O que pode
influenciar na diminuição do preconceito.
As mulheres que conseguiram chegar ao topo da hierarquia organizacional acreditam
no fenômeno “Teto de Vidro” na medida em que assumem que a discriminação pode existir
de forma escamoteada, mais invisível e, principalmente, em razão da gravidez, seja em
decorrência dos quatro meses de licença-maternidade, seja em virtude das dificuldades
previstas com os filhos pequenos, como menor disponibilidade para viagens. Reconhecem
que as promoções ocorrem com mais facilidade para aquelas que têm mais condições de se
locomoverem. Admitem que estar disponível 24 horas por dia para a empresa implica menor
convívio com os filhos, ainda reafirmam que estar em eventos, reciclar-se, viajar, é difícil
para quem tem filhos pequenos. É por isso que muitas mulheres executivas fazem escolhas
objetivas de carreira: uma gerência média permite conciliar melhor os papéis pessoais e
38
profissionais do que uma gerência geral, que requer muitas viagens. (BRUSCHINI; PUPPIN,
2004). Assim, muitas mulheres já planejam a carreira para não chegar ao topo, esta situação é
incitada devido a algumas limitações que esta posição pode trazer para a vida privada.
O papel da mulher na família, como esposa e mãe, vem sendo reforçado culturalmente
desde a antiguidade, o que contribui para a formação de uma identidade cuidadora, passiva e
submissa do estereótipo da mulher que se contrapõe ao homem (racional, ativo e dominante).
No entanto não impediu suas ações na esfera pública, já que ao longo da história a mulher
vem atuando na esfera pública e privada, o que resulta em dupla jornada de trabalho e uma
constante tentativa de conciliação entre estas duas esferas da vida da mulher. (ARRUDA,
1996).
O modelo de mulher do lar, imposto desde a antiguidade, está sendo contestado não
somente pela evolução dos arranjos familiares, como a educação da mulher, que hoje se faz
voltada para a formação de uma família e para o mercado de trabalho, mas também por certa
modificação dos papéis profissionais da mulher, passando de postos subalternos a postos de
maiores responsabilidades. (BELLE, 1994).
No entanto, a pressão para a mulher dedicar-se integralmente à família em função dos
filhos pequenos ainda é muito forte nos dias atuais. Como exemplo, na década de 1990, nos
Estados Unidos, surge a entidade Female destinada a apoiar as mulheres que querem trocar o
emprego em prol dos cuidados com os filhos ainda pequenos. (ARRUDA, 1996). O que pode
levar a crer que marido e filho fazem parte da própria identidade da mulher. (BETIOL;
TONELLI, 1991).
Na relação empresa-família, o papel da mulher adquire cada vez maior
preponderância. A atividade da mulher no lar tem uma importância primordial na direção
material e moral da família, e na formação inicial do caráter e a educação dos filhos. Para
isso, faz-se necessária sua presença no lar e assim, um convívio maior com os filhos.
(ARRUDA, 1996). Fica certamente difícil, em relação ao tempo, a mulher estar se dedicando
à carreira profissional ou à vida pessoal, já que o homem não é parceiro nessa hora, padrão
esse de comportamento do homem que é alimentado culturalmente. Em sua maioria, os
homens acreditam que é função exclusiva da mulher a administração dos serviços da casa e
dedicação à educação dos filhos.
A executiva desde os anos de 1980, para ser respeitada, precisava lidar com as
demandas do cargo de forma muito semelhante às de seus pares homens e atender às
demandas da vida pessoal e familiar, sem perder a o “jeito de ser da mulher”. Provavelmente
o custo psíquico era acentuado, mas em contrapartida o enriquecimento pessoal obtido com
39
tal vivência é percebido na tentativa das executivas conciliarem a carreira profissional com a
vida pessoal. (BETIOL; TONELLI, 1991).
Além disso, grande parte das executivas tende a concordar que a cultura corporativa
influencia bastante e que as empresas mais tradicionais ou machistas vão resistir mais em dar
às mulheres cargos-chave. Com isso, elas têm consciência de ter, como qualquer trabalhadora,
uma desvantagem pessoal no mercado, uma carga maior: cuidar dos filhos, da família, da
casa. Segundo Bruschini e Puppin (2004), enquanto esta desvantagem não for superada,
dificilmente poderão dedicar-se integralmente à carreira escolhida, galgando seus degraus
mais elevados. Mas, como acreditam também que contra a competência não há argumentos,
consideram possível conseguir um equilíbrio entre o lado familiar e o profissional. Ou seja,
fazer valer o predomínio da competência sobre a cultura corporativa machista requer não só a
ocupação de mais espaços nesse nicho ocupacional de elite, mas também a obtenção de uma
conciliação entre o lado familiar e o profissional. (BRUSCHINI; PUPPIN, 2004).
O uso de tecnologias como laptop, internet, palm top, redes sociais dão suporte para o
executivo se fazer presente em vários lugares e não perder o controle organizacional.l
(PUMA; WETZEL, 2007). O que poderia contribuir para a conciliação do tempo da executiva
entre a carreira profissional e a vida pessoal. No entanto, os executivos fazem uso de tais
ferramentas quase que somente como extensor da sua jornada de trabalho. (TANURE,
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007; SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE,
2011).
Apesar do modelo de carreira executiva ser masculino, as organizações podem
encontrar vantagens em ter executivas compondo seus cargos de alto escalão. Para Koneck
(2006), as organizações encontraram na diversidade uma vantagem. Sendo assim, a forma de
liderança das mulheres na cúpula corporativa, ainda pouco representada, pode ser bem vista
pelas empresas.
Além disso, as particularidades da cultura organizacional de cada empresa podem
contribuir mais para uma melhor compreensão das representações das executivas quanto à sua
vida profissional. Se partir do pressuposto que todas as executivas vivem o conflito entre a
carreira profissional e a vida pessoal, os termos dessa conciliação seriam, sobretudo,
determinados por um fundo cultural que lhes propõe a empresa como autora (BELLE, 1994).
Apesar da questão conflitante, tanto as executivas de média como as executivas de alta
gerência acreditam ser possível obter sucesso na carreira profissional e na vida pessoal,
independente do cargo elevado que ocupem ou do tipo de liderança que exerçam. (KONECK,
2006).
40
O tempo é uma variável de conflito para as executivas que tentam a conciliação da
carreira profissional e a vida pessoal. Ele tende a ser mais rígido na organização e mais
flexível na vida pessoal. Sendo assim, pode provocar problemas na vida pessoal e
profissional, interferindo mais nas relações em família do que nas relações profissionais. A
lógica da jornada de trabalho faz com que o tempo da família seja o único a ser flexibilizado e
isso leva os filhos a cobrarem mais atenção de suas mães executivas, provocando dificuldades
no relacionamento familiar pela ausência das mesmas. Sendo assim, o tempo dedicado ao
trabalho provoca conflitos na família porque a atividade executiva é marcada pela sobrecarga
e pelo acúmulo de tarefas (SILVA; ROSETTO; REBELO, 2010).
Assim, além dos fatores gerados por estresse comum aos executivos de ambos os
sexos, alguns são próprios das mulheres executivas, tais como sobrecarga de trabalho,
conflitos de papéis, relações interpessoais, especificidades da carreira e o clima
organizacional (CHANLAT, 2005; TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2010).
2.2.1 Dedicação de tempo para a carreira e para a vida pessoal das executivas.
O tempo, apesar de ser essencial como parte da nossa experiência, é destituído de
realidade: "[...] tempo não é algo objetivo. Não é uma substância, nem um acidente, nem uma
relação, mas uma condição subjetiva, necessariamente devida à natureza da mente humana.''
Ele também foi denominado como “o sentido interno”. Assim, Santo Agostinho também o
definiu como algo subjetivo que tem a função de organizar internamente o indivíduo, ou seja,
provê-lo de parâmetros para lidar com as noções de passado, presente e futuro. O tempo é um
fluxo linear, não sensível na realidade concreta, vazio, uniforme e divisível em unidades
regulares. (KANT apud WHITROW, 1993).
Contudo, não foi só como fenômeno metafísico que o tempo despertou interesse. As
obras de Newton e Einstein forneceram contribuições significativas para o entendimento da
ideia de tempo. Esses trabalhos influenciaram a área das ciências naturais, como as das
ciências sociais. (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
Miller (2000) discute questões de temporalidade e sintetiza a concepção de tempo
único criada por Newton: “O tempo absoluto, verdadeiro, matemático, por si mesmo e por sua
própria natureza flui de maneira igual sem nenhuma influência externa, e com outro nome, é
chamado de duração” (MILLER, 2000, p. 22).
41
De acordo com a Teoria da Relatividade de Einstein, a percepção sobre um objeto
depende da posição do observador. Isto implica que um objeto pode ser percebido de maneira
diferente pelo mesmo indivíduo ou por outros indivíduos. No caso do tempo, a percepção
pode variar, por exemplo, em função do estado de movimento do indivíduo. É essa noção de
tempo, ou seja, a de tempo relativo, que influenciou o desenvolvimento do conceito de tempo
como construção social (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
O tempo pode causar sensação diversa em pessoas diferentes. Este tipo de "transcorrer
do tempo" não é, entretanto, o tempo físico. O tempo assume diferentes sentidos para as
pessoas nas diferentes culturas e nos diversos momentos da História, e a linguagem tem um
papel definitivo na construção da dimensão temporal (TONELLI, 2008).
Ele é um construto do homem, um componente importante do processo civilizatório e
parte de um processo social, não sendo possível elaborar um conceito de tempo
individualmente. Sendo assim, o tempo é visto como experiência coletiva, tendo como função
coordenar e integrar as relações sociais (ELIAS, 1998; PERISTA, MAXIMIANO, FREITAS,
2000).
O tempo pode ser percebido sob a perspectiva da econômica. E assim, ele passa a ser
visto como um recurso. Portanto, passível de administração, considerado como recurso que se
tornou escasso na sociedade contemporânea. Então, ele pode ser administrado e, portanto,
“rentabilizado” ou “desperdiçado”. O que endossa o ditado popular: “tempo é dinheiro”
(TONELLI, 2008) fruto de “Times is Money” dito por Benjamin Franklin. Assim, quem
souber geri-lo melhor poderá, a partir de sua utilização, “(...) criar valor e gerar mais valia”
(PERISTA; MAXIMIANO; FREITAS, 2000, p. 2).
A partir dessas definições de tempo, ele ainda pode ser classificado em dois. O
“Tempo de Relógio” aquele tempo absoluto dos relógios e dos calendários, ou seja, a noção
do tempo como algo relacionado a uma estrutura homogênea e divisível, de fluxo uniforme e
linear, objetivo, mensurável, externo e singular. E o “Tempo Social”, que abrange a noção de
tempo como um fenômeno subjetivo; construído, experimentado e partilhado individualmente
ou em grupo e, portanto, um tempo relativo, passível de diversas variações e interpretações
(SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
Considere-se a possibilidade de modelagem do tempo, no qual coexistam várias
dimensões temporais na experiência de vida de uma pessoa, cada uma delas possuindo uma
métrica (ou “ritmo”) própria (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011), por
exemplo:
42
- tempos biológicos, como o ritmo circadiano (períodos intercalados de vigília e sono),
escalonamento diário da alimentação, atividade física, etc (SCANFONE; CARVALHO
NETO; TANURE, 2011);
- tempos ligados ao trabalho, como uma jornada diária de oito horas, repouso nos fins
de semana, férias anuais e etc (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011);
- tempos de maturação psicológica, como períodos de adolescência, casamento,
cuidados com filhos, moradia etc (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011);
- tempo de lazer, como atividades esportivas sem rotina ou obrigação social, assistir
teatro ou cinema, jardinagem, culinária, leitura fora dos interesses profissionais, sair com
amigos, entre outros. (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
Com base nas dimensões temporais citadas acima por Scanfone; Carvalho Neto;
Tanure (20110), pode-se associá-las a pesquisa de Tanure, Carvalho Neto e Andrade (2007)
sobre o tempo das executivas conforme se apresenta na Quadro 1.
Quadro 1 Possibilidades de diversas dimensões temporais das executivas
Dimensões Temporais
Exemplos de dimensões temporais para as
executivas.
Tempo biológico
Tempo
ideal
para
o
corpo
biológico
engravidar naturalmente.
Tempos ligados ao trabalho
Jornada diária de mais de 11 horas.
Tempos de maturação psicológica
Casamento, cuidados com os filhos e
expatriação.
Tempos de lazer
Hobby, atividades que trazem relaxamento,
se divertir sem obrigações familiares ou
laborais.
Fonte: Elaborado a partir de Tanure, Carvalho Neto e Andrade (2007) e Scanfone;
Cavalho Neto; Tanure (2011)
As dimensões temporais tempo biológico, tempo de trabalho, tempo de maturação
psicológica, tempo de lazer apresentada por Scanfone; Carvalho Neto; Tanure (2011) e
exemplificado na vida das executivas por Tanure, Carvalho Neto, Andrade (2007) podem ser
definidas por tempo biológico o tempo que o corpo físico está apto a engravidar de forma
43
natural sem a intervenção de tratamento para fecundação ou a utilização de fertilização in
vitro.
O tempo de trabalho para as executivas vai além da carga horária de trabalho. Ele
engloba todas as atividades laborais fora do horário de trabalho, como reuniões após o
expediente, jantar de negócios, cursos que servem como investimento na carreira ou estudo
para realizações profissionais fora do horário de trabalho, leituras, envio de emails,
conference call, até o acesso à internet em prol do trabalho e as atividades de lazer e esporte
que envolva sua network.
No que diz respeito ao tempo de maturidade psicológica das executivas está ligado ao
desenvolvimento psicológico necessário para assumir mudanças que refletem tanto na carreira
como na vida pessoal, como casamento, maternidade, expatriação e etc.
O tempo do lazer das executivas está associado ao hobby, atividades que trazem
relaxamento, diversão sem obrigações familiares ou laborais. São atividades que não
envolvam cuidados pessoais de higiene ou estudos dedicados aos investimentos na carreira. O
esporte, jantares de negócios ou atividades com pessoas da network de interesse profissional
não contam como lazer. Apenas as atividades sem ligações com a carreira. Apesar de que para
muitos executivos, aqui engloba também as executivas, o trabalho é uma fonte de prazer. Mas
não é considerado lazer devido à sua rotina e obrigatoriedade.
Considerando-se todas essas dimensões, que coexistem e se interrelacionam na vida de
uma pessoa, enquadrar esse contexto na vida das executivas é pertinente, dessa forma, podese avaliar que as alterações em uma delas não necessariamente implicam alterações
equivalentes nas demais. (PEREIRA JUNIOR; GUERRINI, 2004). Ao contrário, podem
ocorrer processos de compensação, tal que, por exemplo, as mulheres adiem a maternidade
em função do tempo de preparação da carreira executiva e, consequentemente, percam o
tempo biológico natural da maternidade, o que pode levá-las a fazer fertilização in vitro.
(Tanure; Carvalho Neto; Andrade, 2007).
Outro indício a ser tratado é o tempo do trabalho. Desde o decorrer do século XIX até
o século XX, o tempo do trabalho vai se organizando em conformidade com o
desenvolvimento das sociedades industriais e das cidades, ou seja, o tempo linear do relógio
permite o controle disciplinar das relações de trabalho, conforme o seminal estudo de
Thompson (1967) e os trabalhos de Hassard (2000, 2000a, 2000b). O estudo de Taylor
(1987), com sua proposição do uso racional do tempo, é a representação, por excelência, da
regulação das atividades humanas no trabalho dentro dessa concepção linear, isto é, de um
tempo contínuo das sociedades industriais. (TONELLI, 2008).
44
O tempo do trabalho industrial passa a regular, também, as outras relações humanas e
estende seu domínio para outras dimensões da vida. O tempo do trabalho regula o tempo fora
do trabalho – da vida pessoal, das relações familiares, do lazer, das religiões – e define a
movimentação das pessoas e das mercadorias nas cidades (mas também fora delas), regulando
seus fluxos (TONELLI, 2008). Uma vez que a vida pessoal pode estar sendo vivenciada ao
redor do trabalho ou em função dele.
O tempo passa agora, na sociedade contemporânea, a ser descrito como um tempo de
simultaneidade e instantaneidade. Estamos agora diante de um tempo flexível e autônomo no
trabalho. Um tempo que transforma nossa identidade, no qual não mais as máquinas, mas
sistemas cibernéticos de automação permitem-nos maior liberdade (TONELLI, 2008). Por
outro lado, esta flexibilidade, que nos libera da condição de máquinas humanas, nos leva à
condição que Virilio (1996) descreveu como a de “um homem superexcitado”, imerso na
“lógica da corrida”, ou seja, permanentemente em busca de velocidade e competição.
Os executivos usam as novas mídias digitais, Ipad, Blackbberry e celulares para
possibilitarem a flexibilidade no trabalho, mas por outro lado os fazem estar em vários lugares
simultaneamente através do uso da conference call, por exemplo, o que, se por um lado
auxilia no tempo do trabalho, por outro “sequestra” o tempo da maturação psicológica e
tempo do lazer. (TONELLI, 2008).
Portanto, a complexidade da temporalidade pode estar nas diversas dimensões
temporais que se relacionam, ou seja, essa diversidade de tempos é integrada de modo
harmonioso ou conflituoso. (PEREIRA JUNIOR; GUERRINI, 2004). No entanto, para os
executivos, ela não se faz presente sem provocar estresse e dificuldades para conciliar
trabalho e família, tanto para os homens quanto para as mulheres. (TANURE, CARVALHO
NETO, ANDRADE, 2007; CARVALHO NETO, TANURE, ANDRADE, 2010).
As primeiras pesquisas brasileiras do século XXI informam que grande parte dos
executivos trabalha mais de 10 horas por dia. A pesquisa de Tanure (2002) pode confirmar a
premissa anterior, já que em sua pesquisa detectou que 626 executivos brasileiros de grandes
empresas, a média de horas de trabalho diário era de 11 horas e 68% trabalhavam
regularmente nos fins de semana. O Instituto Datafolha (2003) analisou as respostas de 161
executivos brasileiros, dos quais um terço deles disse trabalhar mais de 12 horas por dia e a
maioria 10 horas por dia. Essas duas pesquisas foram realizadas sob a perspectiva
quantitativa.
Tonelli (2005) pesquisou sob a perspectiva qualitativa 10 CEOs de multinacionais
situadas no Brasil, sendo duas multinacionais brasileiras. Constatou que a maior parte do
45
tempo eles dedicam as atividades profissionais. Interessante notar ainda que Scanfone,
Carvalho Neto e Tanure (2007) realizaram uma pesquisa quantitativa com 965 executivos de
344 grandes empresas atuantes no Brasil e identificou que os executivos (homens e mulheres)
trabalham mais do que percebem, pois não contabilizam o tempo utilizado com recursos
tecnológicos como notebook, blackbberry e afins fora do horário de trabalho.
Aguiar e Cyrino (2010) pesquisaram sob a perspectiva qualitativa 47 executivas da
região metropolitana de Belo Horizonte e como conclusão constatou-se que boa parte do
tempo diário delas é para dedicação profissional. Outro exemplo de como as mulheres
executivas dedicam maior parte do seu tempo ao trabalho fora de casa está na pesquisa de
Santos (2011), que realizou uma pesquisa qualitativa com 48 executivas que atuam nos
estados de Minas Gerais e São Paulo percebeu, que elas possuem uma carga horária diária de
trabalho de mais de 10 horas.
A complexidade de conciliar o tempo entre trabalho e vida pessoal das executivas
tende a ser conflituosa devido à densidade da demanda profissional e familiar. Nota-se que a
importância do tempo para as executivas está na tentativa, não sem sacrifício, de harmonizar
essas várias dimensões do tempo e assim, conciliar a carreira com a vida pessoal. Não é fácil
ajustar tanta coisa (atividades laborais, higiene pessoal, cuidados com os filhos, dedicação ao
marido e lazer) dentro de 24 horas diárias. Sendo assim, isso pode se tornar exceção e não
regra entre as executivas (TANURE, CARVALHO NETO, ANDRADE, 2007).
A percepção dos executivos de alto escalão (primeiro, segundo e terceiro escalão) em
relação ao seu tempo de dedicação à carreira e à vida pessoal é de significativa insatisfação
com o desequilíbrio dessas duas dimensões da vida. Os executivos chegam a trabalhar mais de
11 horas por dia e mais umas duas a três horas diárias de dedicação à carreira, considerando o
tempo usado para uso de ferramenta tecnológicas (laptops, blackberries, Ipad), além de
viagens, almoços e reuniões de negócios fora do horário de trabalho (SCANFONE;
CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
A insatisfação de homens e mulheres executivos com o desequilíbrio do tempo
dedicado à carreira e à vida pessoal já dura mais de 25 anos, com um atenuante de que hoje
eles se encontram com um grau maior de insatisfação, se comparado aos executivos fordistas
clássicos. Entretanto, a noção de tempo dedicado à carreira construída por eles é relativa à
cultura workaholic afim de atingirem o sucesso profissional (TONELLI, 2005; SCANFONE;
CARVALHO NETO; TANURE, 2011). Ainda assim, as mulheres executivas estão mais
insatisfeita do que seus colegas homens na mesma posição devido as obrigações familiares
adicionais (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).
46
Sendo assim, o tempo de trabalho do executivo é baseado no valor de que, quanto
mais se dedica a ele, maior chance de sucesso se tem. Consequentemente, as atividades
realizadas fora do ambiente organizacional, passam ser redirecionadas em função do trabalho,
principalmente em tempos atuais, onde a tecnologia pode facilitar a inter relação de tempo e
trabalho (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
Apesar dos quase 30 anos de insatisfação com o desequilíbrio entre carreira e vida
pessoal, as executivas e os executivos gostam muito do que fazem, sendo sua maioria
motivada pela superação de desafios oriundos dos cargos ocupados. Trabalhar em excesso
chega a ser uma questão de valor para o grupo social o qual eles fortemente pertencem
(SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
As mulheres parecem buscar, mais frequentemente, reduzir suas horas de trabalho para
melhor acomodar as demandas da família (NORDENMARK, 2002). Tempo pode se tornar
recurso, motivo de tensão e mola mestra na conciliação entre carreira e vida pessoal.
Interessante observar que além da problemática do tempo, as executivas venceram
alguns outros desafios relacionados com a carreira e vida pessoal e fizeram investimentos, os
quais se fazem necessários destacar, como é feito na sessão seguinte.
2.2.2 Tipos de investimentos na carreira e na vida pessoal das executivas.
A palavra carreira é oriunda do latim, via carraria, que quer dizer estrada para carros.
Seguindo o sentido de estrada como caminho que nos leva a algum lugar a palavra nos leva a
compreender a trajetória para atingir o sucesso profissional. Sendo o objeto de estudo desse
estudo as executivas que alcançaram os níveis mais altos das organizações situadas no Brasil,
far-se-á uma breve introdução sobre carreira.
Nos anos de 1970, carreira era definida levando em conta apenas a dimensão do
indivíduo, desconsiderando a complexidade dinâmica das organizações e da sociedade.
Carreira era uma sequência de atitudes e comportamentos, associada com experiências e
atividades relacionadas ao trabalho, durante o período de vida de uma pessoa (HALL, 1976).
Sendo assim, carreira passa a ideia de um caminho estruturado e organizado no tempo
e espaço que pode ser seguido por alguém como, por exemplo, o caminho trilhado por um
executivo em uma carreira de negócios ou a carreira de uma profissão como a carreira militar,
muitas vezes dentro de uma mesma organização (VAN MAANEN, 1977). Nesta época de
1970, os movimentos feministas lutam, pelo mundo, para que as mulheres se incorporarem à
47
força de trabalho, não se falava em carreira profissional para as mulheres. Assim, as mulheres
não seguiam carreira executiva nem militar.
Chanlat (1995) relata, a partir das sociedades industrializadas, dois modelos de
carreiras: o modelo tradicional e o modelo moderno. O primeiro vigorou até a década de
1970, marcado pela estabilidade, enriquecimento de tarefas, progresso e divisão sexual e
social do trabalho. A progressão da carreira era linear e vertical e os trabalhadores gozavam
de maior estabilidade no emprego. Já o segundo, caracteriza-se por oportunidades para
profissionais, tanto homem como mulheres pertencentes a grupos sociais variados. Sob esse
modelo, a progressão na carreira apresenta-se descontínua, mais horizontal que vertical e com
maior instabilidade no emprego, conforme apresentado no Quadro 2 seguir.
Quadro 2 - Modelos de Carreiras
Modelo Tradicional
Um homem;
pertencente
Modelo Moderno
Um homem / e ou uma mulher;
aos
grupos
socialmente pertencente aos grupos sociais variados;
dominante;
progressão linear vertical;
progressão descontínua horizontal e vertical;
estabilidade.
instabilidade.
Fonte: Extraído de CHANLAT, 1995
Atualmente, carreira é vista como uma sequência articulada de posições de trabalho de
forma a conciliar o desenvolvimento do trabalhador (tanto homens quanto mulheres) e da
empresa. E não mais um caminho rígido de cargos hierárquicos a ser seguido (DUTRA,
2006). Portanto, há a perspectiva do indivíduo, que engloba o entendimento e a avaliação da
sua experiência profissional. E há a perspectiva da organização, que engloba políticas,
procedimentos e decisões ligadas a espaços ocupacionais, níveis organizacionais,
compensação e movimento de pessoas. A carreira é fruto da conciliação dessas duas
perspectivas dentro de um contexto de constante ajuste, desenvolvimento e mudança interna e
externa (LONDON e STUMPH apud DUTRA, 1996).
Um fator que possibilitou a mulher seguir seu caminho rumo à construção de suas
carreiras foi o autogerenciamento da carreira. Pois esta atitude mostra-se como a mais forte
tendência para se lidar com o atual contexto organizacional, econômico e social, na medida
em que viabiliza aos sujeitos a possibilidade de escolha e de busca constante por novas
alternativas de atuação profissional (KILIMNIK; SANTANA; CASTILHO, 2007).
48
As pessoas, que percebem o trabalho como uma carreira, fazem um investimento
pessoal mais profundo nela e buscam principalmente avançar na estrutura organizacional,
alcançando uma posição social privilegiada, além de almejar maior poder e autoestima
(BELLAH et al., 1985). E sendo assim, as mulheres não são diferentes. Observa-se que dos
investimentos necessários que elas precisam fazer para a carreira executiva, se destacam os
que a literatura aponta como necessários para suplantar os desafios desta carreira para elas:
saber lidar com os preconceitos e discriminação; desenvolver ou aprimorar a capacidade de
liderança; saber lidar com o conflito trabalho e família; conciliar a maternidade e o trabalho
(BETIOL, TONELLI, 1991; TANURE, CARVALHO NETO, ANDRADE, 2007; LIMA,
LIMA, TANURE, 2009). Ainda inclui-se o nível de escolaridade, já que se comparadas aos
executivos elas possuem grau, maior do que estes, apesar deste grau não ser determinante na
hora de conquistar uma contratação e ou promoção em disputa com os homens
(HANASHIRO et al. 2005). De toda forma, caso não se tenha um grau de estudo elevado,
ninguém consegue ser nem recrutado.
O preconceito e a discriminação dentro das organizações são entendidos e estudados
como fenômeno Teto de Vidro. Fenômeno esse já explicado no capítulo 2.1, e aqui
novamente mencionado, uma vez que, este se faz presente como desafio da carreira executiva
para as mulheres. Portanto, as que almejam essa carreira ou já são executivas precisam
investir na forma de saber lidar com o Teto de Vidro.
As organizações são redes emaranhadas de relações, nas quais a questão entre homem
e mulher se encontra profundamente incrustada indo além da configuração dos espaços nos
quais as pessoas interagem. (MEYER, 2000). Então, o sexo ocupa importante aspecto na
formação de expectativas de papel nas relações interpessoais e de trabalho, já que ele é uma
das principais características da identidade pessoal (ELSASS; GRAVES, 1997).
Contudo, com o processo de reestruturação produtiva organizacional, fruto da
globalização, são oportunidades para que as mulheres emerjam com mais intensidade. Visto
que as organizações têm procurado por diversidade para a formação de seus quadros de
pessoal, visando promover maior criatividade e flexibilidade em seus produtos e processos.
Assim, aliadas ao aumento do número de mulheres entrando no mercado de trabalho, as
organizações em geral também se têm mostrado mais “receptivas” ao trabalho da mulher. Em
concordância, Belle (1994) acredita que tenha havido uma redução no nível de segregação de
sexo por aquelas organizações com visão voltada para o “futuro”.
Portanto, Belle (1994) defende que não existem mais espaços reservados, papéis
atribuídos em caráter definitivo, separações estritas ou muros intransponíveis entre a mulher e
49
o homem. O que se nota é uma segregação velada e disfarçada que atinge as mulheres no
ambiente de trabalho.
A questão da discriminação da mulher está incrustrada em quase todos os aspectos da
vida organizacional, tal situação também inclui: brincadeiras; políticas administrativas;
metáforas utilizadas; ambiente e uso de linguagem corporal. Tais situações se caracterizam
como formas de evidenciar o fenômeno do “Teto de Vidro” (WRZESNIEWSKI,
MCCAULEY, ROZIN, SCHWARTZ, 1997).
Sendo assim, as mulheres precisam investir emocionalmente e psicologicamente para
conviver com essas questões, mas não se deixarem abater, tendo consciência que contra
competência não há argumentos (BRUSCHINI E PUPPIN, 2004). Contudo, há estudos
recentes que sugerem que a percepção de desigualdade entre homens e mulheres impacta a
satisfação da mulher com seu emprego e sua identificação com a organização e, por meio de
seu efeito sobre as atitudes, também impacta a intenção das mulheres de trocarem de emprego
(CAVAZOTTE; OLIVEIRA; MIRANDA, 2010).
As mulheres enfrentam grandes barreiras, como a adaptação à cultura organizacional,
exclusão da participação em redes informais, menor mobilidade geográfica, menos
experiência profissional e menor participação em treinamentos formais, o que compromete o
avanço de suas carreiras. (McDONALD; BROWN; BRADLEY, 2001).
Os investimentos ligados ao saber liderar podem estar associados a uma postura mais
autoritária, agressiva, coercitiva e racional, de acordo com o estereótipo do homem. O que vai
ao encontro de estudos que sugerem que a mulher, para conseguir cargos de liderança ou
executivos, precisa obter esses atributos, ou seja, se “masculinizar” (LIMA; LIMA;
TANURE, 2009). Em contrapartida, há estudo que sugere exatamente ao contrário. Pelo fato
do estereótipo da mulher ser menos agressivo, coercitivo e mais propício a relacionamentos,
dão a elas novas oportunidades em cargos executivos, uma vez que as organizações estão em
busca de uma liderança diferente das realizadas tradicionalmente pelos homens. Têm-se
buscado líderes fundamentados em trabalho em equipe, o que, de acordo com os estereótipos
do homem e da mulher, essa se apresenta melhor perfil (BELLE, 1994).
Então a executiva precisa estar em conformidade com o tipo de liderança (tradicional
ou diferente da tradicional) que atenda à necessidade da organização. E assim, trabalhar suas
capacidades, habilidades e atitudes de acordo com a demanda organizacional. Ou, do
contrário, buscar construir sua carreira em empresas onde há afinidade com seu perfil de
liderança.
50
Saber lidar com o conflito trabalho-família é de grande importância, tanto para o
homem quanto para a mulher. Assim, O trabalho pode levar vantagem, uma vez que ele é
fonte de sustento para a família. Os executivos de um modo geral têm acreditado que há mais
consequências negativas se dedicarem menos tempo ao trabalho do que à família. O contrário
acontece para as executivas, pois elas tendem a priorizar a família em detrimento da carreira
(LIMA; LIMA; TANURE, 2009).
É comum aos executivos levarem trabalho para casa, ainda mais devido ao fato do uso
de tecnologia facilitou tal ação. A leitura de e-mails, a disponibilidade do Black Berry ou
Smartfone ligados vinte e quatro horas por dia à disposição das demandas laborais podem
fazer a mulher utilizar desses recursos em casa, quando usufrui e/ou contribui para a vida
familiar. Dessa forma, elas tendem a se sentirem culpadas por não conseguir dedicar-se
integralmente à família quando estão com a mesma. O status familiar, como casamento e
número de filhos, pode impactar negativamente em relação ao trabalho para as mulheres e
positivamente aos homens, se consideramos a cultura patriarcal, onde o homem é o provedor
e a mulher a cuidadora do lar (LIMA; LIMA; TANURE, 2009).
As questões relacionadas à interseção trabalho e família são fundamentais para o
investimento na carreira independente do sexo, quer seja homem ou mulher, uma vez que as
exigências impostas nas relações de trabalho afetam as relações familiares e vice e versa.
Todavia, a mulher enfrenta maior estresse nesse conflito, uma vez que elas tendem a trocar
responsabilidades familiares pelas responsabilidades do trabalho. Mesmo com a postura do
cônjuge em assumir atividades domésticas, a maior parte dessas atividades ainda é de
responsabilidade das mulheres (ANDRADE, 2012).
A vida profissional das executivas se situa em um único eixo, onde em um pólo se
encontra a carreira em modelo masculino, independente da vida pessoal e o outro a carreira
em modelo feminino, onde a carreira é obtida em detrimento da vida pessoal ou onde visa à
conciliação das duas demandas. No corpo do eixo se encontram os investimentos realizados
na carreira - estudos, saber lidar com o preconceito, saber liderar, saber lidar com o conflito
trabalho e família, conciliar a maternidade e o trabalho (BELLE,1994). A Figura 2, na
próxima página, ilustra esse eixo onde se situa a carreira das mulheres executivas.
51
Figura 2 - Representação da vida profissional das executivas
Fonte: Elaborado pela autora, a partir de BELLE, 1994
As executivas não se posicionam a uma, mas às duas dimensões em sua vida
profissional, a carreira e a vida pessoal, que elas vivenciam simultaneamente e que elas
aspirariam realizar em equilíbrio. Diferentemente dos homens executivos que tem a carreira
como única dimensão da sua vida profissional. A tensão entre o investimento na carreira em
busca de uma conciliação com a vida pessoal pode ser considerada como um ponto crucial em
torno do qual se constrói a identidade profissional da mulher (BELLE, 1994). No entanto,
alguns homens executivos já estão insatisfeitos com o desequilíbrio na distribuição do seu
tempo, com o predomínio da carreira em detrimento da vida pessoal, da vida afetiva, e ainda
mais do lazer (TANURE, CARVALHO NETO E ANDRADE, 2007).
Pesquisas revelam que o conflito entre carreira e responsabilidades familiares são
presentes entre as mulheres gerentes. O que contribuiu para muitas gestoras postergar a
maternidade, limitar o número de filhos, ou mesmo, desistir de dê-los (COHEN, 2001;
MAINIERO; SULLIVAN, 2006; CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).
O fenômeno Opt-Out, denominação criada em 2003 por Lisa Belkin na tentativa de
descrever o grande número de mulheres (na maioria mães) altamente qualificadas que
52
optavam por movimentos de carreira fora do mercado coorporativo. Sugere que as executivas,
atores desse fenômeno, buscavam formas alternativas de carreira, com o objetivo de
encontrarem trabalhos que os satisfizessem e que fossem mais compatíveis com o restante de
suas vidas, proporcionando a conciliação entre vida pessoal e profissional (MAINIERO e
SULLIVAN, 2006).
Mas para ser considerado como movimento opt out deve ser feitos de forma voluntária
pelo indivíduo, partindo do profissional e não da empresa. São considerados assim
movimentos como: afastamento temporário ou definitivo, denominado de off-ramps; de
redução, ou flexibilização da carga de trabalho, envolvendo recusa de promoções ou
diminuição de esforços para evitar promoções, denominado de scenic routes; ou saída da
organização para empreender (SCALABRIN; KISHORE; CASADO, 2009).
No entanto, lacunas na carreia, como a interrupção da mesma por um período, troca de
empresas em períodos curtos e trabalho parcial além de oferecerem menor remuneração pode
ser interpretado como um sinal de falta de compromisso para com a organização. O que
diminui o valor do empregado aos olhos da organização (VALCOUR; LADGE, 2008). Já
para Scalabrin, Kishore e Casado, (2009) o opt out pode sinalizar perda de vantagem
competitiva das empresas, uma vez que perdem profissionais estratégicos por não
proporcionar-lhes condições para conciliarem seus papéis e interesses.
É possível que a possibilidade de ter uma carreira profissional e uma família e
conseguir não atrasar a formação da família por razões profissionais podem contribuir para
que as mulheres se sintam que alcançaram o sucesso na carreira (VALCOUR; LADGE,
2008). Portanto, os investimentos na carreira e na vida pessoal ficam emaranhados. Podemos
entender que os investimentos na vida pessoal estão associados à construção da família
pessoal e essa por sua vez pode interferir na carreira.
53
3 METODOLOGIA DE PESQUISA
Neste capítulo apresentar-se-á toda a metodologia de pesquisa utilizada em quatro
partes: estratégia e método de pesquisa; unidade social empírica de análise; estratégia de
coleta de dados e estratégia de análise dos dados.
3.1 Estratégia e Método de pesquisa
O objetivo apresentado na introdução conduziu à opção pela execução de uma
pesquisa sob a perspectiva qualitativa descritiva. Ela visa entender e descrever o fenômeno
social “de dentro” da realidade das diversas executivas, analisando suas experiências
individuais e como grupo. Essas experiências podem estar relacionadas a histórias biográficas
ou a práticas cotidianas e profissionais das executivas que, apesar do teto de vidro,
conseguiram ocupar cargos de primeiro, segundo e terceiro escalão das grandes empresas
brasileiras; e se encontram diante do fenômeno da conciliação da carreira com a vida pessoal
(GIBBS, 2009).
Justifica-se a pesquisa qualitativa por pretender descrever, traduzir e compreender o
significado desta complexa atividade humana, tentando identificar os múltiplos fatores da
situação (LAVILLE, DIONNE, 1999). Sua classificação é descritiva por ter objetivos bem
definidos, procedimentos formais estudados e orientados para avaliação de alternativas de
curso de ação com o propósito de descrever as características das executivas enquanto grupo
(MATTAR, 1999).
Essa estratégia qualitativa partiu de focos de interesses amplos do tipo: como as
executivas, que ocupam cargo no topo do organograma organizacional, conciliam a carreira
com a vida pessoal; como elas lidam com os tempos de trabalho e não-trabalho e como elas
investiram nessas duas demandas que já foram consideradas incompatíveis para as mulheres.
Esses focos de interesses foram definidos na medida em que este estudo se desenvolvia e
consistiu em verificar como o fenômeno da conciliação entre carreira e vida pessoal se
manifesta nas atividades, procedimentos e interação diários das executivas de primeiro,
segundo e terceiro escalões das grandes empresas que operam no Brasil.
Assim, justifica-se por ser o fenômeno compreendido segundo a perspectiva dos
sujeitos, no caso as executivas, que são as participantes da questão que está sendo analisada.
O significado que elas dão às coisas e à sua vida é a preocupação essencial dessa
investigadora (GODOY, 1995a; 1995b).
54
O método de pesquisa que melhor se emprega nestas condições e, portanto utilizado,
foi o estudo de caso para a compreensão do fenômeno da conciliação da carreira com a vida
pessoal das executivas. Esse método é o mais adequado, por se tratar de um fenômeno em
plena discussão, mas ainda crítico pela falta de acessibilidade aos atores do mesmo (YIN,
1981). No caso desta dissertação, trata-se do estudo de caso das executivas que ocupam cargo
estratégico de alto nível organizacional. Um dos fatores que contribui para a utilização do
estudo de caso é o fato do sujeito de pesquisa ser de difícil acesso. Este é o caso da presente
dissertação, já que as executivas de alto escalão constituem-se em um grupo de acesso
restrito, graças à pouca disponibilidade de tempo em suas agendas; a disponibilidade das
mesmas em querer ceder informações pessoais e/ou organizacionais; e conseguir acesso a
algum contato de sua rede de relacionamento pessoal ou organizacional que lhes esclareçam
sobre o objetivo da pesquisa a priori.
O estudo de caso tem se tornado estratégia preferida quando os pesquisadores
procuram responder às questões “como” e “por que” certos fenômenos ocorrem e também
quando o foco de interesse é sobre fenômeno atual, que só poderá ser analisado em algum
contexto de vida real (GODOY, 1995a; 1995b), como no caso deste estudo.
Foi utilizada como técnica de coleta de dados a entrevista semi-estruturada e
observação direta não participante capaz de produzir anotações de campo. Para analisar os
achados, seguiu a orientação da analise de conteúdo.
A obtenção das informações mediante contato direto e interativo com as executivas
participantes das entrevistas, realizadas no local de trabalho das mesmas, pôde fornecer
evidências qualitativas como registro de campo, relatos verbais e as possíveis combinações
desses elementos (YIN, 1981). Sendo assim, procurou-se entender tal fenômeno segundo a
perspectiva das participantes (executivas ocupantes de cargos de primeiro, segundo e terceiro
escalão das grandes empresas brasileiras sediadas majoritariamente em São Paulo) da situação
estudada. A partir daí, realizou-se a interpretação do fenômeno com maior uso da subjetivação
da análise interpretativa (MARIZ et AL, 2004).
Pesquisadores qualitativos estão interessados em compreender o significado que as
pessoas têm construído, isto é, como elas criam o sentido do seu mundo e a experiência que
elas têm no mundo. A ênfase da pesquisa qualitativa está nos processos e nos significados,
pois os achados qualitativos são representações dos atos e expressões humanas (BALSINI;
GODOI, 2004). Tal como é esta pesquisa, que se interessa em compreender como as
executivas entendem o fenômeno da conciliação entre a carreira e a vida pessoal.
55
Escolheu-se a abordagem qualitativa por permitir compreender o fenômeno proposto
através do estudo e da análise integrada do mundo empírico em seu ambiente natural.
Examinou-se esse fenômeno contemporâneo em seu contexto da vida real, ciente que as
fronteiras entre fenômeno e contexto não são claramente evidentes (YIN, 1981). Realizou-se
uma investigação detalhada e profunda de uma unidade, grupo de executivas de alto escalão
em organizações com vistas a proporcionar uma análise do contexto e dos processos
envolvidos, onde múltiplas fontes de evidência são usadas para desenvolver uma descrição
holística da conciliação da carreira profissional e vida pessoal das executivas que ocupam
cargos de primeiro, segundo e terceiro escalão nas grandes empresas (GREENWOOD, 1973;
GODOY,1995; MEYER, 2001; HALINEN; TORNROSS, 2005). A história desse fenômeno
foi examinada como um processo de desenvolvimento, buscando isolar o padrão ou tema
central, conciliação entre a carreira e a vida pessoal das executivas que ocupam cargo na alta
hierarquia organizacional, que caracteriza o caso (GREENWOOD, 1973). Portanto, o estudo
de caso descritivo foi o mais indicado.
3.2 As empresas geradoras da unidade de análise
As empresas geradoras da unidade de análise foram as grandes empresas privadas
localizadas no Brasil, sejam elas de capital nacional ou multinacional, por servir de locus de
trabalho, “berço” das executivas, sujeito desta pesquisa.
A Tabela 4 ilustra as empresas onde as executivas trabalham quanto a sua origem
nacional e multinacional. E os setores de atuação de cada organização.
Tabela 1 – As empresas geradoras da unidade de análise
Setor/Empresas
Serviços
Indústria
Indústria/comércio
Indústria/serviço
Total
Nacional
Multinacional
8
2
0
3
1
10
0
3
9
18
Fonte: criado pela autora
Total
10
3
11
3
27
As empresas escolhidas foram as publicadas pela revista Exame de jun/ 2010 como as
melhores empresas para se trabalhar situadas nos estados de São Paulo e Minas Gerais.
56
A escolha das grandes empresas privadas se deu de forma intencional, visto que nelas
há maior preponderância de mulheres em cargos da alta cúpula organizacional do setor
privado. Em duas das empresas do setor de indústria e comércio foi entrevistada mais de uma
executiva. Em uma se entrevistou duas executivas do segundo escalão e em outra entrevistou
três do segundo escalão. Optou-se por todos os níveis estratégicos, pois as mulheres
ocupantes de tais cargos vivenciam o fenômeno da conciliação da carreira e da vida pessoal.
Entende-se por níveis estratégicos o primeiro escalão equivalente à presidência da
organização, o segundo escalão, vice-presidência e diretorias e terceiro escalão, gerentes.
A pesquisa considera o grupo das mulheres executivas de primeiro, segundo e terceiro
escalão que trabalham em especial no Estado de São Paulo e também em Minas Gerais, sendo
onze desse e 19 do outro. O que reforçou a característica de estudo de caso foi o fato de ser
um meio para se organizar os achados sociais, preservando o caráter unitário do objeto social
pesquisado, que pode ser uma pessoa, uma família ou um grupo social, como o das executivas
(GODOY, 1995).
3.3 Estratégia de coleta de dados
O acesso às executivas se deu devido à rede de relacionamentos da coordenadora do
subgrupo de pesquisa Mulheres, professora doutora Betânia Tanure. Esse subgrupo
pertencente ao grupo de pesquisa NERHURT – Núcleo de Estudo de Recursos Humanos e
Relação de Trabalho - coordenado pelo orientador desta dissertação. Esta dissertação é fruto
deste grupo de pesquisa, que começou os estudos sobre o trabalho das executivas desde 2005
e já gerou outros frutos anteriores como livros, tese de doutorado, dissertações e artigos em
periódicos. Além disso, outra forma de acesso ao sujeito de pesquisa foi por meio do processo
comumente denominado de “bola de neve”. Ao término de cada entrevista, solicitava-se para
a executiva uma indicação, para nova entrevista e assim sucessivamente.
Os dados primários foram coletados através de entrevista semi-estruturada, e da
observação direta. Respeitando os roteiros básicos de ambos, que se encontram em anexo,
mas com flexibilidade para introduzir, alterar ou eliminar questões, de acordo com as
necessidades da pesquisa, identificadas ao longo da entrevista (CRESWELL, 2007).
A observação direta permitiu coletar evidências e artefatos no local de trabalho das
executivas. "Estas evidências geralmente são úteis para prover informações adicionais sobre o
tópico em estudo" (YIN, 1989, p.91). Afim de, aumentar a fidedignidade das observações,
57
utilizou-se além do roteiro a presença mais de um observador (uma membro do grupo de
pesquisa) e, após as observações, comparou-se os resultados das observações relatadas para se
eliminar discrepâncias.
As observações permitiram encontrar artefatos físicos (porta retrato da família,
imagens religiosas, flores e etc.) presentes na sala de trabalho das executivas, que
constituíram em fonte de evidências registrada em notas de campo, que fizeram parte do
estudo de campo e forneceu informações complementares importantes sobre o caso em
estudo.
As entrevistas, com um tempo médio de duração de uma hora, possibilitaram fonte de
análise para esse estudo, pois as executivas tiveram liberdade de contar fatos da sua rotina
ainda não pensados neste estudo. Os temas discorridos na entrevista foram o investimento e
os desafios da carreira; relação com a maternidade; tempo dedicado ao trabalho e a vida
pessoal; prazeres pessoais e a conciliação da carreira profissional com a vida pessoal.
Esse tipo de entrevista é uma das técnicas mais utilizadas em pesquisa social, pois
apresenta algumas vantagens, tais como possibilitar a obtenção de respostas mais detalhadas e
profundas. Além de não carecer de um universo homogêneo, possibilita respostas com pouca
padronização e permite o esclarecimento de eventuais dúvidas no momento das entrevistas
(YIN, 1981).
Yin (2005) sugere que a técnica de entrevista, observação direta e artefatos pertencem
às fontes (documentação, registro em arquivos, entrevistas, observações diretas, observação
participante e artefatos físicos) que evidencia um estudo de caso, além de ser uma das mais
importantes fontes de informação para o estudo de caso.
Valorizou-se o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a
situação estudada. Para tanto, o pesquisador foi a campo buscando captar o fenômeno em
estudo a partir da perspectiva das pessoas nele envolvidas (GODOY,1995) e dos artefatos
físicos presentes no campo. Dessa forma, foi de suma importância estar pessoalmente com
cada executiva, e sempre que possível em suas salas de trabalho ouvi-las e observar não só
elas como também o ambiente de trabalho, além do que estava planejado no roteiro de
observação e de entrevista, pois esse procedimento pôde trazer riqueza científica até então não
pensada pelo pesquisador. Tal ação ajudou a validar o construto, tornando a entrevista semiestruturada; a observação direta e os artefatos físicos são as técnicas mais indicadas para este
estudo de caso.
Essas entrevistas tiveram como pontos fortes o direcionamento, ou seja, focaram
diretamente o tópico desse estudo de caso e a percepção dos sujeitos. O que não impede os
58
possíveis vieses, como alguma questão mal elaborada, imprecisão dependente da memória do
entrevistador ou a reflexibilidade - o entrevistador responde ao entrevistado o que ele quer
ouvir (EISENHARDT, 1989; YIN, 2005).
Com o objetivo de neutralizar o viés dependente da memória do entrevistador, as
entrevistas foram gravadas com gravadores digitais. Já os vieses da reflexibilidade e a
possiblidade da presença de perguntas mal elaboradas, repetiu-se mais de uma vez a mesma
pergunta de maneira diferente ao longo da entrevista. Assim, as perguntas da pesquisa
puderam ser mudadas e refinadas à medida que se definiu o que perguntar e para quem
perguntar (CRESWELL, 2007). Além disso, os pesquisadores do NERHURT já haviam
abordado esse mesmo público em pesquisa anterior o que possibilitou o compartilhamento
coletivo de impressões sobre possíveis vieses e mesmo a realização do pré-teste com duas
executivas.
Essa técnica de entrevistas semiestruturadas forneceu a autora desta dissertação
informações ricas e detalhadas sobre o tema em questão. As perguntas partiram de alguns
questionamentos básicos, apoiados na literatura que interessou à presente pesquisa, o que fez
com que surgissem outras interrogativas à medida que a entrevistadora recebia as respostas
das executivas (TRIVINOS, 1987).
Portanto, nem todas as perguntas que fizeram parte dessas entrevistas semiestruturadas
nasceram a priori. Elas são resultado não só do referencial teórico que alimentou a ação desta
investigadora, mas também de toda a informação que ela já recolheu como membro do grupo
de pesquisa NERHURT sobre esse fenômeno social que é como a executiva concilia a
carreira com a vida pessoal, objeto deste estudo (TRIVINOS, 1987).
Justifica-se a entrevista semiestruturada por estar interessado em compreender com
mais profundidade atitudes, valores e motivações do comportamento das executivas diante da
forma como elas conciliam a carreira com a vida pessoal (ABRAMO, 1979).
Aplicou-se entrevista semiestruturada com um entrevistador e um assistente, sempre
que possível, a fim de auxiliar nas observações do/e no campo. A presença do assistente
contribuiu para amenizar a influência do entrevistador sobre o entrevistado, o que auxiliou nas
observações do campo, para que informações importantes como a leitura do ambiente e a
presença de artefatos físicos contribuíssem para interpretar as informações expressas ou não
expressas nas falas das executivas.
Anotou-se como notas de campo comentários correntes das entrevistadas, e os
artefatos físícos, objetos, porta retrato, imagem religiosa, mesa grande, plantas no local da
entrevista. Notou-se os que foram utilizados por um número considerado de executivas ou um
59
comentário do fluxo de consciência em curso sobre o que está acontecendo na pesquisa,
envolvendo tanto a observação e análise - de preferência separados um do outro. Para tanto,
foi escrito todo tipo de impressão ocorrida, isto é, reagir ao invés de peneirar o que pudesse
parecer importante, pois nunca se sabe o que seria ou não útil no futuro (EISENHARDT,
1989).
À medida que se galgava níveis mais altos dentro das organizações, ficava cada vez
mais raro encontrar mulheres executivas, conforme identificado no referencial teórico. Devido
a este fato, observou-se que o número de executivas decresce à medida que se sobe no nível
hierárquico organizacional. O que não comprometeu a análise qualitativa. Segundo Bonoma
(1985) e Eisenhardt (1989), a quantidade de participantes selecionados para entrevista tem
pouca importância, uma vez que o objetivo é a saturação teórica ou a profundidade do
conhecimento.
Foram selecionadas treze diretoras, doze vice-presidentes e cinco presidentes, nos
estados de São Paulo e Minas Gerais como mostra a Tabela 5. Entendeu-se que essa
quantidade não foi significativa e sim relativa, o que determinou a quantidade de executivas
entrevistada foi a saturação dos dados.
Tabela 2: Seleção das executivas participantes
MG
SP
Total
I escalão (presidente)
1
4
5
II escalão (vice-presidente e diretor)
5
7
12
III escalão (gerente)
5
8
13
Total
11
19
30
Nível hierárquico organizacional
Fonte: criado pela autora
A importância da estratégia qualitativa justificou-se pela busca em compreender como
as executivas que chegaram aos escalões mais altos das grandes empresas situadas no Brasil
conciliam a carreira com a vida pessoal e, assim, identificar como o tempo e os investimentos
estão inseridos nessa complexa teia de demandas atualmente tão importantes para as
mulheres.
O roteiro de entrevista (APÊNDICE A, página 110) e de observação (APÊNDICE B,
página 113) foram elaborados a partir dos objetivos específicos apresentados na introdução,
60
com o propósito de responder à pergunta central desta pesquisa: Como as executivas
conciliam à carreira e a vida pessoal?
Houve dificuldades iniciais para conciliar a agenda das executivas a fim de conseguir
entrevistar várias em um mesmo dia. Suas agendas são complexas e mutáveis, elas estão
sempre viajando e em inúmeras reuniões internas e externas. O contato com suas secretárias
foram de primordial importância no sucesso dessa tarefa. Dessa forma foram realizadas várias
viagens de Belo Horizonte para São Paulo, pois esta pesquisadora reside em Belo Horizonte e
a maioria das executivas, que ocupam cargo tão alto nas grandes empresas, trabalham e
residem em São Paulo. Foram entrevistadas também executivas que residem e trabalham em
Belo Horizonte. Com essas, a dificuldade em agendar um horário foi menor, visto que, não
carecia de deslocamento entre estados. Levou três meses para conseguir a saturação teórica
dos achados ou a profundidade do conhecimento.
A maior parte das entrevistas foi realizada nas salas de trabalho das executivas das
empresas em que trabalham. O que possibilitou observar a sala das executivas e fazer essas
considerações em anotações de campo referente a artefatos encontrado. Depois das entrevistas
e até mesmo durante, elas mostravam fotos dos filhos, do marido, decorações religiosas que
sinalizavam suas crenças, além de cores e plantas com as quais diziam fazer questões de
decorar “seu” ambiente no trabalho. A unidade social empírica de análise – nesse caso o local
onde as executivas trabalham – diz muito sobre o jeito de ser do sujeito de pesquisa, pois é
seu cenário natural. E assim, foi possível estar relativamente envolvido nas experiências reais
dos sujeitos de pesquisa (CRESWELL, 2007).
Outras entrevistas foram realizadas na sala de reunião da organização em que
trabalham, o que proporcionou a atenção pela pesquisadora de como essas executivas
percorrem a empresa e como é seu comportamento ao encontrar com seus “colegas” de
trabalho. Elas nos recebiam num determinado andar do prédio e caminhavam conosco até a
sala de reunião. Notou-se o prestigio não só do cargo que elas ocupam, mas também da
postura pessoal delas entre as pessoas. Nessas ocasiões, as executivas não eram tão formais
como o cargo em si poderia supor.
Portanto, as múltiplas fontes, entrevista, observação não participante e artefatos
permitiu a técnica da triangulação, objetivando atingir a máxima amplitude na descrição e
compreensão do fenômeno da conciliação entre a carreira e a vida pessoal das executivas que
ocupam cargos na alta hierarquia organizacional. Esta técnica possibilitou melhorar a validade
do construto, lhe garantindo qualidade e averiguando as percepções das executivas, mediante
entrevistas e questionários, e os comportamentos e ações do sujeito, na observação direta não
61
participante; aos elementos produzidos pelos: artefatos físicos (TRIVIÑOS, 1987;
EISENHARDT, 1989; JICK, 1979; ADAMI; KIGER, 2005).
3.4 Estratégia de análise dos dados
Realizou-se análise de conteúdo por se tratar de um exercício de redução dos achados,
onde o texto é codificado em determinadas categorias. Nesse caso, em três categorias:
executivas com idade de 30 a 39 anos, 40 a 49 anos e 50 a 60 anos. Não foi encontrado
condições de categorização entre os níveis hierárquicos (I, II e III escalão) e sim por faixa
etária. As demais categorias foram: conciliação entre a carreira e a vida pessoal; a divisão do
tempo dedicado à carreira e a vida pessoal; e os investimentos realizados pelas executivas
tanto na carreira quanto na vida pessoal.
A análise de conteúdo “se constitui, antes, num conjunto de vias possíveis nem sempre
claramente balizadas para a revelação, alguns diriam, reconstrução, do sentido do conteúdo”
(LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 216).
Para tanto, a análise foi dividida em três fases: preparação dos dados; codificação e
recorte dos conteúdos; categorização e tratamento dos resultados. Na primeira fase foram
transcritas as entrevistas; organizados as notas de campo e os artefatos; e agrupados cada
documento com a sua respectiva respondente. Durante a segunda fase, se classificou os dados
em carreira e vida pessoal das executivas. Depois, os classificou de acordo com o nível
estratégico do cargo (primeiro, segundo e terceiro escalão), mas esta classificação não revelou
alguma distinção e/ou semelhança relevante para o fenômeno. Realizou-se outras
classificações, segundo a faixa etária e a situação familiar das executivas. Nessa ocasião,
emergiram evidências importantes para a descrição e compreensão do fenômeno em estudo.
Na terceira e última fase, analisou-se como as executivas conciliam a carreira com a vida
pessoal (GODOY, 1995; BARDIN, 2004).
Estes dados foram preparados na medida em que se realizavam as entrevistas. Pode ser
chamado também de pré-análise, esta etapa. Foi nessa fase, que se teve o primeiro contato
com os documentos que foram submetidos à análise, assim como o direcionamento com o
referencial teórico que orientou a interpretação e a preparação formal do material (GODOY,
1995).
62
Conduzido pelos pressupostos e pelo referencial teórico, e definidos os procedimentos
a serem seguidos, iniciou-se a segunda fase, de exploração do material. Nessa fase, examinouse os documentos selecionados e adotou-se os procedimentos de codificação, classificação e
categorização, de acordo com as categorias de análise.
À medida que os documentos eram lidos, no caso as entrevistas e anotações de campo,
fez-se necessário um movimento contínuo da teoria para os achados e vice-versa, o que
permitiu estabelecer categorias cada vez mais claras e apropriadas aos propósitos do estudo,
como a categorização das executivas por faixa etária dita anteriormente. Nessa etapa,
emergiram quadros de referências construídos a partir de elementos comuns encontrados nas
entrevistas (GODOY, 1995; BARDIN, 2004).
Na terceira e última fase, ocorreu o tratamento dos resultados e a interpretação. Com
suporte nos achados brutos, buscou-se categorizá-los como significativos e válidos através
dessas técnicas qualitativas explicadas ao longo deste capítulo. Isto proporcionou a
condensação de tais resultados e possibilitou estabelecer padrões, tendências ou relações
implícitas. Essa interpretação tentou ir além do conteúdo aparente dos documentos, pois
despertou interesse pelo conteúdo latente, o sentido que se encontrou atrás do imediatamente
empreendido (GODOY, 1995).
A Figura 3 na próxima página ilustra a análise realizada.
63
Figura 3: Análise dos dados
Realizado pela autora
64
4. ANÁLISE DOS DADOS
A análise dos dados se apresenta em três partes. A primeira se encarrega da difícil
conciliação da carreira com a vida pessoal das executivas. A segunda fica por conta do uso da
distribuição do tempo das executivas entre a carreira e a vida pessoal. A terceira e última parte
se refere ao investimento na carreira e na vida pessoal das executivas.
4.1 A difícil conciliação da carreira com a vida pessoal
A difícil conciliação da carreira com a vida pessoal das executivas está dividida em
duas partes. A primeira apresenta uma breve discussão sobre o perfil das executivas. A
segunda se refere aos fatores que favorecem e desfavorecem a conciliação entre a carreira e a
vida pessoal, segundo a percepção das executivas de acordo com o estado familiar das
mesmas.
4.1.1 Uma breve discussão sobre o perfil das executivas
Para se fazer essa breve discussão sobre o perfil das executivas se fez necessário
dividir em três partes segundo a faixa etária das mesmas: executivas com idade entre 50 e 60
anos; executivas com idade entre 40 e 49 anos; e as executivas com idade entre 30 e 39 anos.
Foram entrevistadas trinta executivas, sendo dezoito atuantes em empresa
multinacional e nove, em empresa nacional. Cinco delas ocupam cargo de primeiro escalão;
doze, cargo de segundo escalão e treze, cargo de terceiro escalão. Sete com idade entre 50 e
60 anos, treze com idade entre 40 e 49 anos e dez com idade entre 30 e 39 anos.
Em sua maioria, elas se vestiam elegantemente, com tailleur. Indicando a ainda forte
influência do estilo de roupa usado pelos homens. A literatura nos diz que muitas mulheres
nas décadas de 1970 e 1980 tiveram que se masculinizar para chegar ao poder (TANURE;
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007). Poucas estavam de saia. Uma em especial chamou
a atenção por se vestir com decote no busto e saia justa, um estilo bem ousado, diferente do
terninho, comum entre as executivas, por se recusar a usar roupa de estilo masculino. O que
contraria a literatura:
“Nunca usarei o tal tailleur. Aquilo é coisa de homem. Acho horrível! Credo! Adoro
ser mulher, gosto de me vestir assim. Já tive muitos problemas com isso. Em outra
65
empresa que trabalhei, nós passávamos pela avaliação 360º e não me davam nota
máxima por causa da minha roupa. Já chegaram a me pedir para usar outro estilo de
roupa. Mas eu falava não mudo mesmo. Veja quanto eu faço a empresa faturar com
o meu trabalho. Aí eles largaram do meu pé.” (Executiva ocupante do segundo
escalão em empresa multinacional).
Tal comportamento pode indicar mudança na identidade das executivas. Elas podem
não lutar mais por uma igualdade com os homens e sim por uma identidade feminina. Pelo
menos no estilo de se vestirem e de decorarem sua sala de trabalho. Muitas delas disseram
fazer questão dessa atividade. Essa mudança pode ser percebida também pela cor do esmalte.
A maioria abandonou os tons transparentes, mais clássicos, e usavam cores mais fortes, como
os tons de vermelho e bordô, por exemplo. Ou na estampa, de pele de onça na blusa, ou nos
sapatos. Todas estavam bem maquiadas e usavam acessório, colar, anel e pulseira. O que pode
sugerir certo avanço de uma postura “feminina” de se vestir.
Elas estudaram mais de dezessete anos, fizeram graduação, especialização no Brasil e
ou no exterior, algumas fizeram mestrado e duas chegaram até ao doutorado, sendo que uma
defendeu a tese, a outra só chegou a cursar as disciplinas. Isso indica que é uma tendência o
aumento de escolaridade no perfil das executivas, conforme apresentado na literatura
(BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001; GRZYBOVSKI; BOSCARIN; MIGOTT, 2002;
BRUSCHINI; PUPPIN 2004; FCC, 2007).
A maioria é casada, com filhos, e conta com uma equipe de familiares para cuidar dos
mesmos, como o marido, os pais; além dos empregados domésticos, babá, motorista ou escola
em tempo integral (BETIOL; TONELLI, 1991; ITABORAÍ, 2003; TANURE; CARVALHO
NETO; ANDRADE, 2007; DEL PRIORE, 2011).
Boa parte das executivas com idade superior a 47 anos casa mais de uma vez e forma
nova família, agregando os enteados. Sendo assim, os cuidados com os filhos se estendem aos
enteados que passaram a dividir o mesmo espaço familiar. Essa informação vem acrescentar
algo não mensionado no perfil das executivas expressado até o momento na literatura.
Todas trabalham doze horas por dia. O trabalho é full time. O Smart phone está a
postos vinte quatro horas por dia, inclusive nos finais de semana. São cobradas para lerem
seus e-mails o tempo todo. Quando há algum comentário sobre algum e-mail que ainda não
leram se sentem frustradas. Tal percepção corrobora com a literatura (TANURE;
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007; SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE,
2011).).
66
Além do perfil das executivas enquanto grupo, os dados salienta uma distinção entre o
perfil delas segundo a faixa etária em que se encontram. Sendo assim, se fez necessário
dividir em quatro partes: executivas com idade entre 50 e 60 anos; executivas com idade entre
40 e 49 anos; e as executivas com idade entre 30 e 39 anos; e uma breve conclusão sobre a
conciliação entre a carreira e a vida pessoal dessas executivas segundo esta faixa etária.
4.1.1.1 Executivas com idade entre 50 e 60 anos
As executivas com idade entre 50 e 60 anos, apresentam um perfil mais masculinizado
em relação às executivas com idade entre 30 e 49 anos, perfil este condizente com a literatura
(TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007). Elas são, em sua maioria, casadas,
com filhos jovens ou adultos, ganham mais que seus maridos. Eles as “ajudam” muito nas
atividades domésticas e na criação dos filhos. As que são divorciadas ou solteiras, contam
com empregados domésticos e tem maior disponibilidade para se dedicarem mais ao trabalho.
Confessam que a emancipação da mulher trouxe mais trabalho do que se tinha antes. Segundo
as mesmas, para a mulher, hoje, construir uma carreira, se for casada, ela tem que ter um
marido que a compreenda, filhos que aprendam desde cedo a valorizar a carreira da mãe e que
toda a família veja o trabalho como um valor. Entretanto, confessam que não são bom
exemplo para ninguém, em se tratando da conciliação entre a carreira e a vida pessoal.
Esse sofrimento causado por não conseguir conciliar a carreira executiva com a vida
pessoal se confirma na literatura (TANURE, CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007;
CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE 2010). Assim como, a pressão que a mulher
sofre para fazer tudo com excelência ainda se faz presente nos dias de hoje (BRUSCHINI;
PUPPIN, 2004).
Muitas foram expatriadas em função da carreira, moraram em vários locais do mundo,
conquistaram alguns amigos, mas não tem tempo para revê-los. Dessas executivas que foram
expatriadas todas são solteiras ou divorciadas. Não teve nenhuma que foi expatriada casada e
que o marido a tenha acompanhado, mesmo que a renda dele fosse menor em relação à da
esposa executiva, situação esta que vai ao encontro da literatura (BETIOL; TONELLI, 1991;
TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007; GIALAIN, 2009).
Para essas executivas, a conciliação entre carreira e vida pessoal foi difícil ou nem
chegou a existir. Quando mais jovens, tinham medo de dizer a verdade sobre a difícil ou
quase impossível conciliação entre carreira e vida pessoal, mas a maturidade as faz assumir
essa dificuldade. Antes diziam que tudo era maravilhoso. Hoje, reconhecem que puseram
67
muito mais esforço no trabalho que na vida pessoal. Muitas revelam que raramente almoçam
com os filhos, acabam deixando esse papel para os maridos quando esses têm mais
disponibilidade de tempo do que elas.
Atualmente, tentam recuperar o “tempo perdido” criando algumas regras para não
deixarem que o trabalho invada totalmente suas vidas pessoais, como por exemplo
disponibilizar maior atenção aos amigos. Acreditam que não tem mais mulheres na carreira
executiva por uma questão de opção a favor da conciliação:
“Não temos mais mulheres na carreira, mais mulheres presidentes, pois ela se dá o
direito de escolher quais os ingredientes que deverão fazer parte na sua vida, os
afetos, companheiro, filhos, netos, atividade intelectual, espiritual, etc. Qualidade de
vida não é igual a sucesso financeiro. Ela não perde seus valores por um barco novo.
Qualidade de vida não é abrir mão de seus valores para ganhar mais dinheiro [...].
As mulheres jogam o leque, muito mais rico, sobre a mesa e não acham interessante,
excitante se submeterem aos caprichos organizacionais” (executiva com 43 anos de
profissão).
Consideram que as mulheres ainda podem escolher entre ter uma carreira que as
permitam conciliar com a vida pessoal ou não. Não sofrem pressão social para chegar ao
primeiro escalão. Enquanto o homem, além de sofrer a pressão social para chegar ao primeiro
escalão, quer a presidência organizacional e ter mais dinheiro, mesmo que para isso deixem
sua vida pessoal de lado (TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007).
Algumas revelam a dificuldade de reter boas executivas, quando em determinado
momento elas optam em mudar de direção para montar seu próprio negócio ou decidem ir
para cargo público em função de mudança de valores:
“A principal razão de saída das mulheres em altos cargos não é pelo preconceito. Ela
sai por que ela não ver mais sentido de pagar o preço[...]. Não temos essa pressão
social em ser presidente [...]. Diferente do meu irmão que tem família, aí é questão
de gênero. Homem tem que trabalhar, ter muito dinheiro, para o homem isso é
maior. [...] se eu sair da empresa, o que vou fazer? Posso ter um ano sabático, ir para
França, ou plantar, etc. [...] Se meu irmão fala isso, minha mãe desmaia na hora. A
pressão sobre ele, pelo menos nesta geração, é muito maior. Já eu, ninguém vai me
internar num hospício. [...] Já vi mulheres em altos cargos irem embora. Falarem:
não quero mais, ta muito caro, ta muito tóxico, as organizações estão muito
perdidas” (executiva de segundo escalão de uma empresa multinacional).
68
Essa mulher, que tem como meta chegar até certo ponto na carreira executiva, é
diferente do homem. Encontramos na pesquisa algumas executivas com idade entre 50 a 60
anos, cuja preocupação não é em se tornar presidente e sim com o seu legado, ou seja, o que
deixará para a geração futura, as pessoas que virão após sua gestão na empresa.
4.1.1.2 Executivas com idade entre 40 e 49 anos
Das executivas que têm idade entre 40 e 49 anos, muitas estão no segundo casamento,
com filho e/ou enteado ainda bebê ou na primeira infância. E não sentem nenhuma culpa em
se dedicar mais ao trabalho. Reconhecem que dedicar-se igualmente à carreira e à vida
pessoal em todos os momentos da vida é impossível. O que admitem é uma conciliação dessas
duas demandas, dedicando maior atenção para aquela que disto mais necessitar no momento.
Entendem que no início de sua carreira precisam dispensar maior atenção ao trabalho. Da
mesma forma, quando os filhos são pequenos, requerem maior dedicação da mãe. Mas ainda
assim dedicam mais tempo ao trabalho. Elas sentem orgulho pelo trabalho que exercem. A
realização através do trabalho já foi percebida por Sulerot (1988) nos EUA na década de 1980
e por Tanure, Carvalho Neto e Andrade (2007) no Brasil, dezenove anos depois.
O problema é quando a sobrecarga de trabalho afeta à saúde. Só nessa hora que
decidem diminuir a carga horária de trabalho em favor da saúde, “o bem maior”. A carreira
executiva requer muito tempo e presença física no trabalho, apesar de toda a tecnologia da
informática. Elas acreditam que a demanda de tempo e presença física da carreira pode
interferir na vida pessoal. No entanto, pensam que não seriam mães melhores se não fossem
executivas. A ausência de culpa por dedicar pouco tempo à vida pessoal, principalmente aos
filhos, contrapõe-se à literatura (SILVA; ROSETTO; REBELO, 2010).
Essas executivas não abrem mão da carreira e nem dos filhos, já que optaram em ter
filhos depois dos 35anos, quando puderam abrir mão de algumas demandas em relação à
carreira, já que essa se encontrava em um momento mais maduro. Talvez essa determinação
as faça abrir mão de um marido que não entenda sua maior dedicação à carreira que ao
casamento:
“Homem é muito ciumento né, ciúme de atenção, carente né, a maioria deles. O meu
ex-marido achava assim, um absurdo assim, ele sempre teve ciúme do meu trabalho.
[...]. Você tem que estar casada com um homem que entende que você tem uma
carreira. E homem que entende que mulher tem carreira ta pra nascer ainda (risos)”
69
(executiva de uma multinacional, do segundo escalão, divorciada com filho de 10
anos).
Surge assim uma situação nova na literatura em relação às executivas, pois elas estão
abrindo mão do casamento em favor da carreira profissional. O que pode indicar que para elas
é mais importante uma carreira executiva de sucesso que atender a demanda de atenção do
marido ou parceiro amoroso. Isso contrapõe-se à literatura que diz que marido e filho fazem
parte da própria identidade da mulher. Interessante notar que elas também creditam que uma
possibilidade de conciliação entre a carreira e a vida pessoal está em se cercar de uma boa
equipe em casa, conforme apresentado na literatura (BETIOL; TONELLI, 1991) e no
trabalho.
4.1.1.3 Executivas com idade entre 30 e 39 anos
As executivas que têm idade entre 30 e 39 anos estudaram mais de 17 anos, fizeram
graduação, especializaram-se no Brasil ou no exterior. E são em sua maioria solteiras.
Algumas estão casadas recentemente, sem filhos ainda ou com filho bebê. O visual é de
roupas mais femininas, com acessórios, brincos, colares e anéis grandes, nada discretos,
camisas de babados e salto alto. A vaidade com cabelos e unhas é percebível por estarem
impecáveis. Trabalham mais de 12 horas por dia, o que corrobora com a literatura (TANURE,
CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007).
Diferente do que pensam as executivas de 50 até 60 anos, as executivas com idade
entre 30 e 39 anos dizem que a conciliação da carreira com a vida pessoal não é tão difícil.
Para elas, a conciliação da carreira com a vida pessoal não é tão difícil. Acreditam que é
plenamente possível conciliar a carreira executiva com a vida pessoal. O que vai ao encontro
da literatura (KONECK, 2006).
Elas tentam facilitar as coisas morando perto do trabalho com o objetivo de conduzir
seu lazer e atividades domésticas na mesma região geográfica. Assim, a academia, restaurante
e bares estão sempre perto. As amizades do trabalho são levadas para a vida pessoal.
Sendo assim, o “mundo” delas gira em torno do trabalho. Mas as casadas não veem
problema nisso, pelo contrário, sentem que a vida pessoal faz parte do trabalho e não o
contrário. Casaram com homens que também trabalham tanto quanto elas. Acreditam que eles
são mais propícios a entender a importância da carreira profissional delas. Entretanto,
70
reconhecem que, quando o assunto é responsabilidade com as atividades domésticas, eles
ainda deixam por conta delas.
Fazem compras on line ao invés de irem até o supermercado, assim as empregadas
recebem tudo em casa. Tudo em função de não perder tempo. Pois grande parte das horas do
dia é reservada para o trabalho. Mesmo com casamento recente, geralmente veem o marido
após as 21 horas. Antes disso, geralmente os dois estão trabalhando ou estudando em favor da
construção de suas carreiras.
As que já são casadas sem filhos pensam que a conciliação é tranquila pela a ausência
dos filhos. E que poderão ter algum conflito entre carreira profissional e vida pessoal quando
os filhos nascerem. Sabem que a responsabilidade pelos cuidados com os mesmos compete,
principalmente, a elas.
As que são casadas e com filho bebê, contam com uma equipe doméstica para
auxiliarem-nas. Além disso, tiveram uma licença maternidade conflituosa por não aguentarem
os quatro meses fora do trabalho. Muitas encontraram a solução para tal conflito em checar emails, reunir por telefone e aparecer na empresa antes do tempo determinado pela lei.
Essas mulheres com idade entre 30 e 39 anos estão no início de suas carreiras
executivas, ocupando cargo da alta cúpula organizacional. Por mais que digam que conciliam
a carreira profissional com a vida pessoal, isso não procede. Elas ficam muito mais tempo
dedicando-se à carreira que qualquer outra demanda da vida pessoal. Acreditam que
conciliam as duas demandas por não apresentarem conflito interno ou familiar devido à
dedicação máxima à carreira, principalmente as que ainda não foram desafiadas pela
maternidade.
4.1.1.4 Uma breve conclusão sobre a conciliação entre carreira e vida pessoal segundo a
faixa etária das executivas
De acordo com os dados discutidos pode-se dizer que as mulheres estão aumentando o
grau de escolaridade conforme indicado na literatura (BRUSCHINI; LOMBARDI, 2001;
GRZYBOVSKI; BOSCARIN; MIGOTT, 2002; BRUSCHINI; PUPPIN 2004; FCC, 2007) e
que isso pode se confirmar como tendência. Além disso, essas executivas voltam sua
identidade mais para o trabalho que para a vida pessoal (ITABORAÍ, 2003; ALMEIDA,
2007; ETHOS; IBOPE, 2001; 2003; 2006; 2007; 2010). Não só por dedicarem muito aos
estudos, como por optarem em engravidar depois dos 35 anos, o que também pode indicar a
71
prioridade à carreira (TANURE; CARVALHO NETO; ANDRADE, 2007; SOUZA et.al,
2009).
Dessa forma, o perfil da executiva é de trabalhadora; estudante; com poucos filhos, em
média; casam-se mais de uma vez e priorizam o trabalho em relação à vida pessoal. Desde a
década de 1990 esse perfil vem sendo salientado pela literatura (BETIOL; TONELLI, 1991;
DEL PRIORE, 2011). Pode-se notar que na primeira década do segundo milênio as executivas
conservaram o perfil da década passada e acrescentaram mais uma característica: elas se
casam mais de uma vez.
A diferença entre as executivas segundo a faixa etária classificada indica que, quando
a executiva é jovem e já atingiu o topo da hierarquia organizacional, ela não vislumbra algum
prejuízo pessoal por se dedicar quase que integralmente à sua carreira. À medida que a
maturidade vai chegando, elas já têm o que colocar na balança e perceber algum prejuízo
pessoal, mas, ainda assim, sentem orgulho pela carreira que construíram. O Quadro 3 da
próxima página sintetiza o que pensam as executivas sobre a conciliação da carreira com a
vida pessoal:
72
Quadro 3 - A percepção das executivas sobre a conciliação entre a carreira e a
vida pessoal de acordo com a faixa etária
Faixa etária
Conciliação entre a carreira e a vida pessoal
50 a 60 anos
Quando jovens, essa conciliação era percebida como difícil ou inexistente.
Sua atenção era voltada quase totalmente para a carreira, mas não diziam a
verdade. Nesta época afirmavam que a conciliação era perfeita. Agora, com
a maturidade, afirmam que hoje tentam conciliar graças às "regras" que se
impuseram para ora atender à carreira, ora a atender à vida pessoal.
40 a 49 anos
Equilibrar é impossível! Conciliar é viável! Equilibrar no sentido de dividir
igualmente o tempo e os investimentos, tanto para a carreira quanto para a
vida pessoal. Conciliar permite sua atenção voltar-se ora a uma, ora a outra,
conforme a sua necessidade em determinado momento. Talvez, por
pensarem assim, não se sentem culpadas ou em algum conflito pessoal.
30 a 39 anos
Dizem conciliar a carreira com a vida pessoal por não apresentarem conflito
interno ou familiar devido à dedicação máxima à carreira, principalmente as
que ainda não foram desafiadas pela maternidade. Mas elas dedicam quase
que integralmente à carreira, o que coloca em dúvida tal percepção de
conciliação.
Fonte: dados da pesquisa
Portanto, parece não ser possível equilibrar de fato a carreira executiva com a vida
pessoal. Já que a vida pessoal é, muitas vezes, negligenciada em favor da carreira. Precisam
de um parceiro que aceite o ritmo intenso de trabalho, talvez por isso casem mais de uma vez.
Precisam lidar com os filhos e muitas vezes com os enteados, frutos do segundo casamento.
E, só depois da maturidade, começam a valorizar a vida pessoal fora do trabalho, criando
regras que as façam “correr atrás do tempo perdido” em favor da conciliação.
4.1.2 Fatores que (des)favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal, segundo a
percepção das executivas de acordo com o estado familiar das mesmas
Considerou-se o estado familiar das executivas com o objetivo de tentar identificar
alguma relação entre este e a percepção delas em relação aos fatores que favorecem ou
73
desfavorecem a conciliação entre carreira e vida pessoal. Como estado familiar das executivas
entende-se: solteiras; casadas ou em união estável; mães casadas ou em união estável;
separadas e/ou divorciadas, sem filho ou com filho; casadas mais de uma vez.
São consideradas solteiras as que ainda não investiram no casamento ou em uma união
estável. Elas possuíam ou não namorado até o momento da entrevista. As separadas e/ou
divorciadas são as que já tiveram uma união estável ou casamento e depois romperam com
esses laços. As casadas são aquelas que casaram ou mantém uma união estável com alguém. E
as casadas mais de uma vez, aquelas que casaram ou tiveram uma união estável com mais de
uma pessoa.
Entre os fatores considerados pelas executivas de todos os estados familiares como
favoráveis estão: disponibilidade para o trabalho; a presença dos filhos; residir próximo à
empresa onde trabalha; sentir prazer com a carreira; marido ativo com as obrigações
paternais; equipe de apoio eficaz em casa e no trabalho; creche, berçário e escola em tempo
integral; problema de saúde, que a levam a refletir sobre como tem conduzido a vida como um
todo; evitar levar trabalho para casa; apoio do marido em relação à sua carreira; filhos
crescidos; deixar de ser centralizadora na forma de administrar; ausência de culpa; e sentir
orgulho pela profissão que exerce.
Já os fatores citados por elas que desfavorecem a conciliação entre a carreira e a vida
pessoal são: trabalho em excesso ou como única fonte de prazer; ausência de marido e filhos;
a falta de horário para começar e para terminar o trabalho; a presença do marido; marido
passivo na administração do lar; maternidade; não sentir prazer com a carreira; marido
passivo com as obrigações paternais; presença dos filhos, quando esses são pequenos;
incompatibilidade do marido com a carreira delas; gostar de muitas coisas.
No entanto, os fatores: disponibilidade para o trabalho; a presença ou ausência do
marido e a maternidade, são considerados favoráveis e desfavoráveis para a conciliação
segundo as executivas, o que determina tal condição é a situação familiar delas. O Quadro 3
na próxima página ilustra esses fatores.
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Quadro 4 - Fatores (des)favoráveis à conciliação entre a carreira e a vida pessoal
segundo a situação familiar das executivas
Situação Familiar
Favorece
Desfavorece
Solteiras
Disponibilidade para o
trabalho; a ausência de marido
e filho.
Trabalho em excesso.
Separadas/divorciadas
Disponibilidade para o
trabalho.
Trabalho como única fonte de
prazer; ausência de marido e
filhos.
A presença dos filhos; residir
Separadas/divorciadas
próximo à empresa onde
com filho(s)
trabalha.
A falta de horário para começar
e para terminar o trabalho; a
presença do marido.
Casadas sem filhos
Sentir prazer com a carreira;
marido ativo na administração
do lar; a ausência de filhos;
Casadas com filho(s)
Sentir prazer com a carreira;
marido ativo com as obrigações
paternais; equipe eficaz em
Não sentir prazer com a
casa e no trabalho; creche,
carreira; marido passivo com as
berçário e escola em tempo
obrigações paternais.
integral; problema de saúde;
evitar levar trabalho para casa.
Apoio do marido em relação à
sua carreira; filhos crescidos;
equipe de trabalho competente
Casadas mais de uma em casa e no trabalho. Deixar
vez
de ser centralizadora na forma
de administrar; ausência de
culpa; sentir orgulho pela
profissão que exerce.
Marido passivo na
administração do lar;
maternidade;
Excesso de trabalho; presença
dos filhos pequenos;
incompatibilidade do marido
com a carreira delas; gostar de
muitas coisas.
Fonte: dados da pesquisa
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4.1.2.1 Percepção das executivas solteiras sobre os fatores que (des)favorecem a
conciliação entre a carreira e a vida pessoal
As solteiras são jovens se encontram na faixa etária entre os 30 e 39 anos, sem filhos,
ocupam cargo no terceiro escalão. Elas dedicam-se quase que integralmente à carreira.
Reconhecem que as demandas excessivas do trabalho podem ser empecilho para uma
conciliação harmoniosa entre a carreira e a vida pessoal.
As solteiras se encontram em um estado não muito satisfatório em se tratando dessa
conciliação. Se por um lado esse estado civil parece proporcionar maior disponibilidade para
a carreira, por outro essa mesma disponibilidade também sequestra o lazer, a disponibilidade
para amigos e outras atividades prazerosas da vida pessoal. A não demanda de marido e filhos
parece condicionar toda sua vida pessoal para a carreira. Portanto, a culpa diante do desafio
perdido para a conciliação, explanado na literatura (SILVA; RSETTO; REBELO, 2010) se
expressa na fala das executivas solteiras e sem filho:
“[...] eu vivo insatisfeita com a minha vida pessoal, com as outras demandas que eu
tenho que gerenciar e com as demandas do trabalho, e o resultado disso é uma
grande frustração, uma permanente insatisfação, um sentimento permanente de
insatisfação, de não conseguir lidar com isso de uma forma satisfatória, não
excelente, mas de uma forma satisfatória, eu ainda não cheguei numa equação, então
você vive ali, você administra, mas não tenho satisfação nessa administração, não
sinto que tá bom, que tá suficiente, sempre com muita culpa né. Se trabalho estou
com culpa... se não trabalho estou com culpa porque não estou trabalhando. É muito
mais trabalho do que eu consigo efetivamente dar vazão” (executiva ocupante de
cargo do primeiro escalão).
4.1.2.2 A percepção das executivas separadas e/ou divorciadas sobre os fatores que
(des)favorece a conciliação entre a carreira e a vida pessoal
As separadas e/ou divorciadas sem filhos reconhecem também como desafio a
conciliação entre a carreira e a vida pessoal (LIMA; LIMA; TANURE, 2009). Elas se
encontram com maior disponibilidade para a carreira, assim como as solteiras. Alegam que a
falta de marido e/ou filho impedem uma conciliação harmoniosa. Ter o trabalho como única
fonte de prazer pode proporcionar conflito na conciliação entre carreira e vida pessoal.
Quando há dedicação excessiva ao trabalho, a família muitas vezes pode se tornar o
moderador da relação carreira e vida pessoal:
“mas eu não sou casada; então essa distinção entre a minha vida profissional e a
minha vida pessoal tá ficando mais e mais difícil, [...] eu posso chegar em casa e
ligar o computador e continuar trabalhando, não tem ninguém pra me puxar a orelha;
76
e eu acho que isso é uma coisa ruim, sabe, no médio prazo, assim, [...] porque o
amigo tu dispensa, tu deixa de sair, o marido tu não dispensa, dispensa uma ou duas
vezes, na terceira tu é dispensada” (executiva ocupante de cargo do segundo escalão,
separada).
Quando estavam casadas ou em união estável conciliavam melhor do que atualmente.
Ao contrário do que possa parecer, para essas executivas, formar uma família pode contribuir
para uma conciliação harmoniosa entre essas duas esferas da vida.
Elas trabalham muito, o que vai ao encontro da literatura (TANUE; CARVALHO
NETO; ANDRADE; SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011), são bem
remuneradas por isso, mas há falta de disponibilidade para usufruir os ganhos adquiridos.
Para elas, separadas e/ou divorciadas e sem filhos, precisam ser severas consigo mesmas e
incluir uma viagem curta ou tirar férias em sua agenda pessoal. Do contrário esse tipo de lazer
não acontece.
Das executivas separadas e/ou divorciadas com filhos, todas ocupam cargo do segundo
escalão em empresas multinacionais. Confessam que a conciliação acaba acontecendo entre a
carreira e a atenção ao filho. A vida se torna condicionada ao trabalho e a maternidade. Sobra
pouco tempo para o laser, conforme se apresenta na literatura (TANURE, 2002; TONELLI,
2005; SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2007; AGUIAR; CYRINO, 201;
SANTOS, 2011). Elas estão com idade entre 45 e 55 anos, são mães de filho único. Os filhos
encontram-se com idade entre 10 e 25 anos. Consideram a conciliação entre a carreira e a vida
pessoal razoável.
Algumas saem mais cedo do trabalho na sexta-feira para ficar com o filho e programar
o final de semana. Essa programação inclui o Smartfone sempre ligado e acessado para
atender qualquer solicitação laboral. Parte do domingo é usada para o planejamento da
semana que se inicia. Reconhecem que não tem horário definido para começar a trabalhar e
para terminar. O que pode indicar a prioridade ao trabalho. Almoçam diariamente com o filho,
mas geralmente, em meio às ligações telefônicas relacionadas ao trabalho.
Elas consideram que a presença do marido é um fator que pode prejudicar a
conciliação entre a carreira e a vida pessoal. Eles geralmente costumam ser muito ciumentos
em relação à atenção que suas esposas dedicam ao trabalho. Pensam que eles precisam ser a
prioridade na vida de suas esposas. O que não consideraram enquanto estavam casadas e/ou
em união estáveis. Acreditam ser difícil encontrar um homem que compreenda que, muitas
vezes, para a mulher a carreira é prioridade.
77
Para elas, um fator importante é a distância entre a residência e o local de trabalho.
Dessa forma, a proximidade da residência com a empresa onde trabalham favorecem a
conciliação, uma vez que se gasta menos tempo com o deslocamento. Assim como, levar o
filho às vezes para o trabalho pode favorecer a compreensão do mesmo em relação ao
trabalho excessivo da mãe. Segundo elas o filho tem que aprender desde cedo que a mãe é
uma executiva com uma demanda de trabalho superior em relação às demandas das mães de
seus colegas que não seguiram essa carreira ou que não trabalham.
4.1.2.3 A percepção das executivas casadas ou em união estável sobre os fatores que (des)
favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal
As executivas casadas ou em união estável são em sua maioria ocupantes de cargo em
terceiro escalão em empresas nacionais e multinacionais. Boa parte delas tiveram dois filhos.
As que estão com um tempo de casada inferior a três anos ainda não investiram na
maternidade. Elas sabem que a conciliação é possível, mas o equilíbrio não.
Se tiverem que dividir igualmente o tempo e os investimentos entre a carreira e a vida
pessoal como se tentasse um equilíbrio entre essas demandas não obteriam sucesso. Conciliálas é visto como possível. Conciliar é atender as duas demandas de forma que não precise
abrir mão definitivamente de uma em favor da outra. É dedicar-se às duas, conforme a
necessidade e urgência de cada uma. Sendo assim, ora a “balança” estará pesando mais para
um lado, ora para outro. Raramente está em equilíbrio, o que não significa conflito, e se não
há percepção de conflito, há uma sensação conciliação.
Entendem que, quando estão dentro da empresa trabalhando, sua atenção está focada
na carreira: “só uma emergência para pensar em casa e na família,” diz uma executiva mãe de
filho único. No entanto, quando estão em casa durante a semana não focam na vida pessoal. É
o tempo que sobra para estarem aprimorando os estudos vinculados à carreira. Deixam os
finais de semana para se dedicarem à vida pessoal. Sendo assim, elas acreditam conciliar
essas duas demandas de acordo com a necessidade de cada uma em seu determinado
momento.
Dizem não sentir culpa por essa conciliação de forma “desequilibrada,” por
trabalharem com o que gostam. O fato de dedicarem à carreira expressivamente se torna
recompensador pela satisfação que isso proporciona a elas. Os filhos se acostumam desde
cedo com a ausência da mãe, devido às viagens e sobrecarga laborais da mesma.
78
Em certos casos, os maridos contribuem para essa conciliação, à medida que se tornam
mais presentes na vida dos filhos em relação às mães: “Quando minha filha adoecia, ia minha
mãe e meu marido levá-la ao médico,” diz uma executiva casada há vinte e dois anos. Eles
almoçam com os filhos, buscam na escola e ajudam no dever de casa mais vezes em relação
às executivas. Isso pode ocorrer, quando o homem se disponibiliza para a paternidade, quando
a profissão dele não demanda uma excessiva carga horária de trabalho como a das executivas
e/ou quando a renda da esposa é a principal do lar.
Há casos em que, apesar da carreira do marido demandar investimentos tão intensos
como a dela, a solução foi o planejamento em conjunto com o cônjuge de como conduziriam a
família. O planejamento vai desde as atividades cotidianas, como levar à escola e auxiliar nos
deveres de casa dos filhos até a programação das férias com tempos distintos para os filhos e
para o casal. Dessa forma, se faz necessário a predisposição do homem em ser mais ativo na
condução familiar. Assim, elas acreditam que a conciliação da carreira com a vida pessoal
ocorre de forma natural.
Quando o marido também possui uma carreira que lhe demanda maior investimento de
tempo e dedicação, o que favorece a conciliação é o suporte social (babás, enfermeiras,
cozinheiras, motoristas) de extrema confiança para garantir a eficácia das atividades nos
cuidados com os filhos e nas atividades domésticas:
“Se você não tem uma estrutura em casa, fica estressada no trabalho, estressada com
menino, estressada com casamento, aí eu acho que as coisas podem realmente não
conciliar... Eu viajei, eu trabalhei até domingo e ele nasceu segunda-feira, eu viajei
até o sétimo mês de gravidez, e acho que não tive problema nenhum. Ele tinha cinco
meses quando eu viajei de novo, então você tem que administrar, tem que ser muito
prática. Num dá pra viajar e ficar chorando...” (Executiva casada há 13 anos mãe de
filho único e ocupante de cargo do terceiro escalão).
Essa estrutura garante a eficácia no atendimento das demandas da carreira e da vida
pessoal. Além de criar vínculos com os empregados domésticos, gerando uma relação
duradoura com eles podendo ultrapassar 20 anos. Talvez, devido a esses fatores, elas
consideram que a conciliação entre a carreira e a vida pessoal se deu de maneira natural. No
entanto, reconhecem que precisam investir num ponto psicológico para não se sentirem
culpadas por não se envolverem diretamente nas atividades demandadas pela maternidade.
Há ainda entre as executivas casadas e com marido que trabalham tanto quanto elas,
quem considera como fator que favorece a conciliação entre a carreira e a vida pessoal a
opção de creche, berçário e escola em tempo integral, que atendem as demandas das crianças
sem a necessidade da presença física da mãe. Essas instituições proporcionam para os filhos,
79
além das aulas colegiais, recreação, arte e cultura enquanto, os pais estão trabalhando. Mas,
ainda assim, precisam entender que não interagirão com eles durante o decorrer do dia.
Dessas executivas, as que consideram difícil a conciliação entre a carreira e a vida
pessoal, assim a consideram por entenderem que a emancipação da mulher lhes trouxe
maiores responsabilidades: “sempre me esforcei para a organização entender que tinha que
acompanhar meu filho doente, portanto, não trabalhar in loco (dentro da empresa),” diz uma
executiva do segundo escalão de uma empresa nacional do setor de serviço.
Problemas de saúde também são apontados por elas, como fatores que contribuem
para a conciliação entre a carreira e a vida pessoal. Segundo as executivas, a fragilidade da
saúde leva a reflexão sobre como tem conduzido sua vida como um todo. Durante essa
reflexão, dizem perceber algum conflito na relação carreira e vida pessoal antes imperceptível
por elas. Nesses momentos, querem recuperar a saúde e reorganizar a conciliação entre essas
duas demandas tão importante para elas.
Outro fator, que algumas executivas com filho ainda bebê disseram contribuir para a
conciliação, é se esforçar ao máximo para conseguir concluir todo o trabalho do dia na
empresa, evitando levar trabalho para casa:
[...] eu num deixo acumular... [...] eu consigo realmente ser multitarefas, eu faço
várias coisas e as coisas não atrasam; e eu simplifico. [...] açougue eu faço pelo
telefone, eu compro peixe pelo telefone, às vezes eu faço supermercado pelo
telefone, é... Enfim, eu num perco tempo no dia-a-dia, assim, eu não vou até a copa
tomar café nunca, é... Quando preciso eu procuro fazer minhas refeições em pé para
não perder tempo. [...] almoço rápido e saio cedo [...] eu acho que a grande sacada é
assim, é não desperdiçar o tempo; porque se você desperdiça, você sai daqui às
dezenove ou vinte horas, você começa a bater um papo aqui, bater um papo ali,
perde o tempo. Lógico, eu não sou uma pessoa antissocial, [...] mas eu evito aqueles
almoços de duas horas, muito, né, muito papo no corredor, reuniões muito cheia de
lengalenga, né, pra assim, ser bastante produtiva no horário que precisa ser pra poder
fazer as outras coisas. E, se precisa alguma coisa depois eu tento terminar de casa,
não tem problema, às vezes, né, abrir um e-mail, responder alguma coisa de casa
num é um estresse. [...] eu ponho meu filho pra dormir praticamente todos os dias,
num consigo, às vezes, dar o jantar, ou dar o banho, mas, eu chego do trabalho a
tempo da mamadeira antes dele dormir [...]. Brinco com ele. Ponho para dormir, eu
que acordo a noite, desde que ele era pequeninho, então a babá, nunca acordou de
noite; porque assim, [...] ela já fica o dia inteiro com ele, aí a fazer acordar de
madrugada eu acho uma sacanagem, porque ela vai ficar exausta, então eu falo „não,
à noite eu que acordo, então é eu quem fica com ele se precisar, às vezes durmo mal,
mas... você se habitua; então assim, no começo eu ficava exausta [...], eu num
dormia [risos], agora eu tipo durmo, acordo, vejo se chorou, volto a dormir
novamente, eu tenho um sono bom, então [...] essa questão de achar alternativas
práticas, [...] simplifica a vida. [...] essa é a minha organização de conciliação
(risos).” (Executiva com 32 anos, ocupante de cargo de terceiro escalão e com filho
de um ano e oito meses).
80
Todavia, tais ações podem levar a um desgaste físico e psicológico. Almoçar rápido e
em pé não é recomendado pelos especialistas (médicos, nutricionistas). A conciliação entre a
carreira e a maternidade pode proporcionar sacrifícios não percebidos pelas executivas.
Talvez seja em virtude da satisfação com o filho e da realização pessoal através do trabalho.
As executivas casadas ou em união estável que ainda não investiram na maternidade
são jovens com idade entre 33 e 39 anos, ocupam cargo de segundo e terceiro escalões,
trabalham em organizações nacionais e multinacionais. Elas reconhecem que uma postura
mais ativa do marido em relação à administração do lar pode favorecer a conciliação entre a
carreira e a vida pessoal delas. O contrário desfavorece.
Acreditam que a maternidade pode ser um fator desfavorável para a conciliação entre
a carreira e a vida pessoal. Sabem que existe uma cobrança para que a mãe tenha uma
disponibilidade total para o filho. Assustadas com o possível distanciamento das demandas
laborais, dizem se sentirem muito atraídas pela a carreira e que pensam ter problema em
relação à conciliação entre o trabalho e a maternidade quando os filhos chegarem. Expressamse desta forma por reconhecerem ser difícil a participação de seus maridos nessa conciliação
quando decidirem engravidar. Atualmente seus esposos não dividem com elas os cuidados
com os animais domésticos, nem com os afazeres do lar.
Essas executivas dedicam muito tempo ao trabalho, assim como seus maridos. O fato
de não terem filhos contribui para essa dedicação excessiva. Esses casais se encontram
geralmente após as vinte e uma horas, depois de terminaram a jornada. Enquanto um está em
viagem a trabalho o outro está trabalhando na cidade onde reside e vice e versa. Raramente, o
casal viaja ao mesmo tempo a trabalho. A carga horária excessiva do casal não provoca
conflito na relação dos mesmos. Sendo assim, consideram que conseguem conciliar de forma
satisfatória a carreira com a vida pessoal.
4.1.2.4 A percepção das executivas que se casaram mais de uma vez sobre os fatores que
(des) favorecem a conciliação entre a carreira e a vida pessoal
As executivas que casaram ou tiveram uma união estável mais de uma vez ocupam
cargo de primeiro e segundo escalão, tem idade acima de 42 anos, trabalham em empresas
nacionais e multinacionais, possuem filhos e enteados e investiram nos estudos adquirindo
título de especialistas. São mulheres que acreditam poder conciliar a carreira com a vida
afetiva, apesar do insucesso nos casamentos anteriores.
81
Consideram que a presença dos filhos prejudica a conciliação da carreira com a vida
pessoal, quando estes são pequenos. Em virtude das viagens, a possibilidade de estar o casal
viajando a trabalho pode se tornar um fator conflitante dessa conciliação. Depois que os filhos
crescem, consideram que a conciliação pode se tornar melhor caso haja a sensação de culpa
seja trabalhada psicologicamente:
“Minha filha, por exemplo, me pediu para eu brincar de mamãe e filhinha e eu odeio
(risos). Nenhuma executiva fala a verdade sobre isso, eu falo. Teve um dia que
estávamos brincando e ela me disse: “Mamãe você não serve para nada”. E eu disse:
“não é verdade. Eu sirvo sim. Eu trabalho para pagar as coisas para você”. Outro
exemplo foi na semana passada. Eu não pude viajar este mês, então ela disse: „as
minhas amigas vão viajar, vão para o shopping com as mães, etc‟. E eu disse: „As
mães das suas amigas saem no fantástico? As mães das suas amigas saem na capa da
revista?‟ Ela também diz: „mamãe eu adoro meu laptop, mas odeio o seu.‟”
(executiva com idade 47 anos de idade dois filho e dois enteados que moram com
ela).
Vê-se aqui neste exemplo uma tentativa de legitimação da ausência, um esforço no
convencimento da criança, para que esta criança assuma a ausência da mãe como algo que
tem um sentido positivo, uma batalha difícil de ser ganha.
Admitem que o excesso de trabalho possa afetar a vida pessoal. Esse excesso pode
fragilizar a saúde o que afeta a vida como um todo. Em muitos casos o primeiro casamento
não deu certo devido à incompatibilidade do marido com a carreira delas. Acreditam que ter
uma equipe competente em casa e no trabalho favorece a conciliação da carreira com a vida
pessoal. Afinal: “ninguém pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo,” diz uma
executiva com 42 anos, ocupante de cargo de primeiro escalão com filho de dois meses.
Portanto, deixar de ser centralizadora no estilo de gestão pode contribuir para essa
conciliação.
A ausência do sentimento de culpa por não conseguir dedicar-se integralmente à
maternidade ou ao matrimônio também é considerado por elas fator favorável à conciliação
entre a carreira e a vida pessoal. A falta de tal sentimento facilita na hora de educar os filhos:
“Então, assim, eu fico duas horas com eles e eu não tenho o menor remorso, eu
chego à casa à noite e eles não fizeram a lição, eu não tenho aquela coisa de tempo
de qualidade, eu estou fora de tempo de qualidade, se o tempo não for de qualidade,
ele não vai ser de qualidade, eu não tenho essa culpa. Eu só fiquei uma hora do lado
dele, agora eu vou ter que ler uma historia pra ele, que isso, de jeito nenhum. Ele
não fez a lição, ele tem que levar bronca, vai ter que fazer, vai ter que ir atrás da vida
dele, eu fui da minha, né?” (Executiva ocupante de cargo do segundo escalão, já teve
por duas vezes união estável e tem dois filhos).
82
Da mesma forma, o sentimento de orgulho pela profissão que exerce e o sucesso por
ter chegado ao nível estratégico das grandes organizações também são pontos favoráveis à
conciliação entre a carreira e a vida pessoal. Em contrapartida, o fato de a mulher gostar de
muitas coisas, lazer, família, filhos, carreira pode ser desfavorável à conciliação, pois
consideram difícil conciliar tantos encantos.
4.2 O uso da distribuição do tempo das executivas entre a carreira e a vida pessoal
Para analisar o uso do tempo pelas executivas dedicado à carreira e à vida pessoal
considerou-se tempo dedicado à carreira: carga horária de trabalho, trabalho realizado fora da
carga horária, como leitura de e-mails, reuniões, jantares e almoços de negócios, viagens a
trabalho, estudos, leitura de e-mails e ou elaboração e atividades relacionadas ao trabalho;
tempo dedicado à vida pessoal: horas com os filhos, atividades de gestão da casa,
relacionamento amoroso (marido, namorado), tempo com os familiares e amigos, higiene,
cuidados pessoais e lazer.
4.2.1 O tempo dedicado à vida pessoal
Segundo a percepção das executivas, a vida pessoal está cada vez mais entrelaçada
com a carreira profissional. Os dados indicam que a vida pessoal está dentro da carreira e não
o contrário. As demandas da vida pessoal estão relacionadas com as atividades dos cuidados
pessoais, do lar, dos filhos e da dedicação ao lazer. Então, dividiu-se este tópico em quatro
partes: dedicação aos filhos; dedicação aos cuidados com a casa; dedicação aos cuidados
pessoais e dedicação ao lazer.
4.2.1.1 Dedicação aos filhos
O tempo dedicado aos filhos vai naturalmente diminuindo à medida que eles atingem a
idade adulta. As executivas com idade de 50 a 60 anos sofrem da “síndrome” do “ninho
vazio”, quando os filhos adultos saem da casa dos pais. "Estou na fase de carência de mãe",
diz uma executiva com filha de 25 anos. Elas estão em uma fase da vida onde podem abrir
mão de certo tempo de trabalho para dedicar-se aos filhos, que estão começando a vida adulta
83
com todas as demandas de início de carreira e projetos da vida pessoal. Portanto, sem
disponibilidade para passar mais tempo com os pais:
“Hoje eles é que não se dedicam pra mim né (risos). Hoje eles são adultos, minha
filha trabalha o dia inteiro também, meu filho estuda, às vezes não vai almoçar. Eu
procuro no dia que eles vão almoçar em casa, ir almoçar. Se eles não vão eu procuro
ir fazer minha atividade física na hora do almoço.” (executiva com dois filhos de 26
e 22 anos).
Tal situação vai ao encontro da literatura em relação ao conflito vivenciado pelos
executivos em relação ao tempo e em especial pelas executivas, já que a mulher ainda é a
principal responsável pelos cuidados com os filhos (PEREIRA JUNIOR; GUERRINI, 2004;
TANURE, CARVALHO NETO, ANDRADE, 2007; TONELLI, 2008; CARVALHO NETO,
TANURE, ANDRADE, 2010).
Os filhos maiores de 21 anos não ficam em casa, alguns já casaram e construíram
família. Outros estão morando no exterior, ou não moram mais com os pais. Os que ainda
moram com os pais ficam pouco tempo com esses, em média uma hora por dia: “Meu filho
agora é que não tem hora. As coisas se inverteram. Procuro ser muito presente mesmo à
distância. Procuro sempre na hora do almoço ligar e falar com ele” (Executiva com filho de
25 anos e que mora com ela).
Portanto, mesmo depois dos filhos adultos, o conflito em conciliar o tempo entre
carreira e cuidado com os filhos permanece, conforme apresentado no referencial teórico por
Pereira Junior; Guerrini, (2004); Tanure, Carvalho Neto, Andrade, (2007); Tonelli, (2008);
Carvalho Neto, Tanure, Andrade, (2010).
As executivas com idade entre 40 e 49 anos possuem filhos adolescentes em sua
maioria. As executivas nesta faixa etária com filhos na primeira e segunda infância (antes e
após os sete anos) e na adolescência ainda dedicam mais tempo aos seus filhos se comparadas
com as executivas de 50 a 60 anos de idade, o que é de se esperar. Elas chegam a dedicar aos
seus filhos, no máximo, 4 horas por dia. Outras criam situações para que possam ficar mais
perto deles: “Já fiz curso de matemática sábado o dia inteiro com meu filho pra ficarmos
juntos. Para ele era necessário o curso, para mim era interessante.” (Executiva com dois filhos
de 15 e 20 anos).
Elas se esforçam para fazer pelo menos uma refeição diária em família. Confessam
que encontram melhor tempo à noite, após o expediente no escritório. Há executivas que, após
a família se recolher para dormir, ainda trabalham em casa com o objetivo deles não sentirem
84
tanto sua ausência, conforme apresentado no referencial teórico por Carvalho Neto, Tanure,
Andrade (2010).
Há executivas que dizem conseguir aproveitar a oportunidade do tempo simultâneo
oferecido pelas novas mídias digitais, como o Facebook, para, mesmo durante a carga horária
de trabalho, conviver com os filhos adolescentes, mantendo a comunicação com eles
virtualmente. O que comprova a simultaneidade do tempo, estar em vários lugares ao mesmo
tempo, salientado pela literatura (TONELLI, 2008) e a tentativa das executivas em
harmonizar, não sem sacrifício, as várias dimensões do tempo (TANURE, CARVALHO
NETO, ANDRADE, 2007).
As executivas com idade entre 30 e 39 anos não possuem filhos geralmente, mas há
raras exceções.
Portanto, o tempo que as executivas dedicam para cuidar dos filhos é classificado
como tempo de maturação psicológica – tempo dedicado ao casamento, filhos e expatriação,
conflituoso, podendo ser harmonizado com o uso das novas mídias (TONELLI, 2008;
SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011).
4.2.1.2 Dedicação aos cuidados com a casa
Elas relataram que possuem uma forte infraestrutura em casa que as permite dedicar
muito pouco à gestão do lar. Elas “terceirizam” o trabalho braçal, conforme indica a literatura
(Cyrino, 2012) devido ao fato de no Brasil ainda ser uma mão de obra barata (TANURE,
CARVALHO NETO, ANDRADE, 2007). Além disso, elas constroem uma relação de
“parceria” com os empregados domésticos:
“É, essa é uma coisa [...] das coisas que me permite trabalhar, foi até ter conseguido
construir esse... porque lá em casa tem outra estrutura. Tem gestão aqui e gestão lá.
Então aqui no Brasil a gente ainda se permite isso, não sei como seria no exterior,
porque não tem essa função toda. [...] Eu faço questão... num sei, de tratar bem; são
pessoas que já tão comigo há muitos anos, então a coisa já engrenou, já tem uma
rotina lá que funciona; atualmente é bem no telefone. [...] Ah, num dá nem meia
hora... nem meia (por semana). É bilhetinho... com babá é obvio que a gente
preocupa mais com o filho, então quando eu chego em casa de noite, ela tá lá, então
é uma pessoa que eu converso mais e tudo... agora o resto tá mais ou menos no
automático” (executiva casada há 13 anos com filho de 5 anos).
85
O tempo dedicado para os cuidados da casa não indicou relação que pudesse sugerir
uma categoria com o fato de ser casada com filhos pequenos ou adultos, nem se são solteiras
ou estão no segundo casamento. Houve relatos de executiva que dedica 10 a 15 minutos por
dia até 16 horas por semana. Houve mais uma vez uma leve semelhança entre as executivas
da mesma faixa etária.
Por exemplo, as executivas com idade entre 50 e 60 anos dedicam mais horas que suas
parceiras com faixa etária mais nova. Elas chegam a dedicarem em média 2 horas por dia para
a gestão da casa. O que consideram pouco tempo em relação às horas do dia, mas o suficiente
visto que possuem uma infraestrutura em casa competente que as permitem ficar apenas por
conta da gestão, impedindo o trabalho braçal conforme dito na literatura (Cyrino, 2012).
Entre as executivas com idade entre 30 e 49 anos houve relatos de dedicação de uma
hora por dia até meia hora por semana. Um tempo inferior ao das executivas entre 50 e 60
anos de idade. Elas contam com o apoio da mãe, conforme aponta a literatura e houve um
único relato, que mostrou um marido diferente dos demais: “Não faço isso. Esta parte fica
para meu marido.” (executiva casada há 22 anos com filhos de 10 e 17 anos). Houve
executiva que considera essa parte um hobby por serem atividades que lhes trazem prazer e
por serem exercidas fora da rotina semanal, uma vez que os empregados ficam com a parte
pesada, como já foi dito: “Minha empregada toca a casa. Ela me passa o que está faltando. No
final de semana eu cuido da casa, arrumar roupa dos filhos, jardinagem, mas só por que gosto.
É hobby” (executiva casada mãe de dois filhos de 2 e 5 anos).
A gestão da casa não parece ser uma atividade de prioridade para elas, visto que
podem delegar para os empregados domésticos e parentes. Da mesma forma que foi
apresentada no referencial teórico por Cyrino, (2012).
4.2.1.3 Dedicação aos cuidados Pessoais
As executivas dizem dedicar pouco tempo para cuidar de si. Em meio, à agenda muito
atribulada a primeira opção de corte em relação ao tempo é com os cuidados pessoais: “Na
hora do aperto você abre mão é de você. Não dá para contratar governanta (mostrou a unha
sem fazer). Corto o tempo para mim. É o que tem de tempo para cortar” (Executiva de II
escalão, solteira, com idade acima de 50 anos). A maioria delas afirma que dentro desse
tempo de cuidados pessoais está a massagem, a terapia, esporte e ginástica. Atividades essas
que relatam ter a finalidade de “esvaziar a cabeça”. No geral, indicaram dificuldade para
86
contabilizar esse tempo ou identificar atividades que exercem somente para elas, sem estarem
relacionadas à carreira ou ao trabalho, mesmo que indiretamente.
Algumas atribuem essa dificuldade em dedicar maior tempo para os cuidados pessoais
ao prazer que sentem no trabalho ou pela carreira.
Em relação a dizerem quantas horas dedicam por semana para cuidar de si, os relatos
foram bem variados. As executivas chegaram a afirmar que dedicam 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10 até 24
horas por semana para cuidarem de si. Mas nunca foram respostas precisas. Tiveram que
pensar muito, buscar na memória o que seria cuidar de si ou atividades relacionadas a isso.
Houve algumas executivas com idade entre 30 e 49 anos que afirmaram não abrir mão da
beleza. Elas se esforçam: “é porque eu vou ao manicure toda semana, [...] eu nunca tô
atrasada comigo, eu nunca tô com a unha por fazer, eu nunca tô com o cabelo feio, [...] isso
nunca acontece [risos]” (executiva com 32 anos casada com filho de 1 ano e oito meses e
grávida de sete meses do segundo filho).
4.2.1.4 Dedicação ao lazer
As executivas consideram lazer, assistir a filmes em casa, ir ao cinema, viajar, ler,
ficar em casa sem fazer nada, assistir novela, cozinhar para os amigos, receber gente em casa,
ficar com a família, brincar com os filhos, cuidar da casa e do jardim, jogar jogos no Ipad,
andar de bicicleta, ir a restaurantes e teatros, fazer arranjos de flores, fazer mosaico, brincar
com os filhos na rua, fazer churrasco com o marido, namorar, fazer compras, yoga, dança de
salão, hipismo, ouvir música. O que vai ao encontro do referencial teórico (SCANFONE;
CARVALHO NETO; TANURE, 20110).
Dividindo por faixa etária há pouca diferença. As que têm idade entre 30 e 39 anos
apontam certa dificuldade em desassociar o lazer fora da carreira. “Ah... fora de carreira; que
que eu gosto de fazer?” falou pensativa a executiva de 33 anos divorciada, sem filhos. Dizem
que gostam muito de sair com amigos, ir ao cinema, namorar, ler, ouvir música, dançar e fazer
yoga, conforme apresentado por Dumazedier (1980) na literatura. Mas afirmam também que
muitas de suas amizades nasceram no trabalho e são levadas para a vida pessoal. Portanto, não
se sabe se é mesmo lazer ou faz parte da manutenção da sua network (TANURE,
CARVALHO NETO, ANDRADE, 2007). O que pode sugerir serem as duas coisas ao mesmo
tempo. Portanto, a simultaneidade do tempo (TONELLI, 2008).
87
As executivas com idade entre 40 e 49 anos consideram lazer ficar com os filhos,
brincar com os mesmos e até o momento de “mãetorista” – levá-los e buscá-los nos eventos
que os filhos frequentam aos fins de semana. Ficar com marido também é considerado por
elas lazer. “Temos um combinado: toda sexta-feira saio com meu marido. A sexta é minha e
dele.” Afirma a executiva casada com dois filhos. Da mesma forma, cozinhar para a família e
amigos também é visto por elas como lazer. Segundo a literatura (SCANFONE;
CARVALHO NETO; TANURE, 2011) essas são atividades relacionadas ao tempo de
maturação psicológica, mas para essas executivas o lazer, está muito atrelado à família, o que
nos remete ao tempo simultâneo (TONELLI, 2008). O tempo de lazer dedicado à família pode
ser uma forma de estender o tempo com a mesma, uma vez que sua agenda profissional pode
influenciar a agenda pessoal (TONELLI, 2008).
Já as executivas com idade entre 50 e 60 anos reservam o tempo do lazer para as
viagens e encontros familiares, no sentido de mobilizar toda a família a se reunir, uma vez que
os filhos já não moram mais com elas. As viagens chegam a ser das mais simples, como ir à
fazenda por exemplo.
Assistir a filmes é uma atividade considerada lazer por todas essas faixas etárias ditas
acima. São vistas por elas como algo que as fazem “esvaziar a cabeça”: “(...) adoro filme, vejo
muito filme na televisão, porque meu marido não gosta muito de ir ao cinema e eu não gosto
de ir sozinha, então filme eu assisto direto, se tem uma coisa pra mim relaxar, é filme.” Disse
uma executiva com 54 anos, casadas, com filhos adultos. Pode-se considerar que o lazer está
no cotidiano das executivas de forma simples, com o objetivo de desconectar das
responsabilidades laborais, conforme apresentado no referencial teórico (SCANFONE;
CARVALHO NETO; TANURE, 20110).
4.2.2 Tempo dedicado à carreira
A carreira está no centro da vida das executivas. Os dados indicam que elas dedicam
mais tempo à carreira que à vida pessoal. São muitas horas de trabalho diário, viagens
nacionais e internacionais a negócios, além do trabalho nos fins de semana. O que vai ao
encontro da literatura (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011; TONELLI,
2005; CARVALHO NETO, TANURE, ANDRADE, 2010; SCANFONE; CARVALHO
NETO; TANURE, 2011).
88
4.2.2.1 Horas de trabalho excessivas
São muitas horas trabalhadas. Em média 12 horas por dia. Caso elas tenham o
recomendado de sono diário, que são oito horas, têm 4 horas para se dedicar à vida pessoal,
que, em certos casos, está atrelada à família, como as executivas com idade entre 40 e 49
anos. Portanto, sobra muito pouco tempo para a vida pessoal das executivas se analisado
segundo o tempo Newtoniano conforme o referencial teórico (MILLER, 2000).
As executivas com idade entre 50 e 60 anos todas declaram trabalhar 12 horas. Só
houve uma exceção: “Bem menos, 10h. Fiz esta mudança drástica, um negócio comigo
mesmo”. Afirma a executiva com 59 anos, divorciada e sem filhos. O que confirma a
literatura no tocante à mulher tentar reduzir sua carga horária para equilibrar as outras
demandas da vida (NORDENMARK, 2002). Mas mesmo assim, ainda é uma carga horária
superior às oito horas de trabalho diário.
Declaram trabalhar 12 horas de trabalho diário ou mais as executivas com idade entre
40 e 49 anos. Algumas afirmam que trabalham 14 horas por dia.
Já as executivas com idade entre 30 e 39 dizem trabalhar entre 9 a 14 horas por dia.
Mas não são tão precisas em dizer de fato. Tudo que fazem, fazem pensando no trabalho. É
como se estivessem o tempo todo trabalhando, mesmo que não estejam na empresa ou em
uma viagem ou atividade ligada ao mesmo. O que corrobora a literatura (TONELLI, 2008) e
como podemos perceber nesta fala:
“Que eu trabalho, trabalho... eu acho que eu trabalho 12h; por dia. [...] Se perguntar
quanto tempo eu penso em trabalho, eu muito possivelmente vou te dizer que...
quase 24h por dia, porque eu inclusive sonho a respeito de coisas do trabalho, sabe?
[...] eu acho que essa é a distinção, não de mulheres e homens, mas a distinção de tu
ter um cargo de relevância ou não. Se tu conseguir, realmente, chegar em casa e
desligar o chip, posso tá muito equivocada, mas eu acho que tu não tem condições
de tá num cargo de poder; porque no fundo, que que é a distinção entre as pessoas
que... tiveram sucesso... [...] Tu tá lendo o cardápio do restaurante, tá pensando „pô...
pô, isso aqui, é... podia ser pra área digital ... , isso aqui podia ser em iPad‟. [...] eu
acho que os altos executivos também são assim. Eles podem não tá trabalhando atrás
do computador, mas via de regra, tu de alguma maneira tu tá sempre refletindo a
respeito do assunto; tu vai dormir... eu brinco assim, o... o Blackberry é o meu
despertador; é a última coisa que eu faço, antes de dormir, é a primeira coisa que eu
faço quando eu acordo, e é... eu tenho tido muita insônia, eu acordo no meio da
noite, aquela maldita luzinha vermelha piscando, e eu... leio e-mail de madrugada,
de vez em quando... esses tempos eu comecei a responder uns e-mails de
madrugada, daí... me disseram que eu estava ficando insana, e eu agora me
constranjo, mas eu não respondo na madrugada, mas eu vejo de madrugada os emails, entende... estou trabalhando, ou num estou trabalhando, num sei te dizer. Eu
acho que no fundo, o cara que é... e eu acho que isso é um problema do mundo
moderno, principalmente depois do Blackberry, tu não para nunca, nunca... nunca, tu
não para nas férias, tu não para nunca.” (Executiva com 39 anos).
89
Sendo assim, o tempo aqui é muitas vezes percebido como tempo relativo de Eistein
mostrado por (SCANFONE; CARVALHO NETO; TANURE, 2011) e como o tempo
simultâneo apresentado por Tonelli (2008) discutido no referencial teórico.
4.2.2.2 Tempo dedicado a viagens relacionadas a carreira
As viagens a trabalho são recorrentes na vida dos executivos. Elas intercalam entre o
roteiro nacional e internacional. As viagens internacionais estão presentes nas agendas das
executivas que atuam em empresas nacionais devido aos negócios em outros países. As
executivas que trabalham em empresas multinacionais muitas vezes precisam visitar a matriz,
além de negócios em outros países também. A quantidade de viagens são bem distintas entre
as faixas etárias.
As executivas com idade entre 50 e 60 anos chegam a viajar duas vezes por mês
dentro do Brasil e até quatro vezes ao ano para o exterior. Viajam até oito dias por mês em
solo brasileiro e até por uma semana para além das fronteiras do país, as executivas com idade
entre 40 e 49 anos. As mulheres que já chegaram ao segundo e primeiro escalão, já não
viajam tanto como no início de suas carreiras. “Viajo pouco. Já viajei muito mais. Meus
diretores viajam e eu deixei de centralizar em mim. Consegui colocá-los para participar
disso.” (executiva com 47 anos ocupante de cargo de segundo escalão).
As executivas com idade entre 30 e 39 anos viajam mais em relação às demais. Elas
chegam a ficar até quinze dias por mês em viagem com roteiros nacionais e quatro dias ao
ano, em roteiros internacionais.
As viagens estão presentes na agenda das executivas, tanto oriundas do trabalho como
fonte de lazer. Podendo indicar que viajam mais a trabalho que motivadas pela vida pessoal.
O tempo aqui é entendido de forma newtoniana conforme apresentado na literatura (MILLER,
2000).
4.2.2.3 Finais de semana trabalhados
Para muitos trabalhadores o final de semana é sinônimo de descanso do labor.
Realidade bem diferente para executivos e executivas. Elas trabalham até quatro finais de
90
semana por mês. Foram raras as executivas que afirmaram não trabalharem final de semana.
Outras têm que se esforçar muito para não trabalhar durante esse período de descanso:
Para meu trabalho eu preciso estudar. E... o tempo que eu tenho pra isso daí é final
de semana, então sempre eu tô fazendo uma coisinha final de semana, né relacionada
a trabalho [...]. Não me pesa, mas é trabalho.” (executiva com 54 anos, casada, mãe
de duas filhas).
Trabalhar no final de semana faz parte da rotina das executivas. Agora, em elação à
quantidade de finais de semana por mês, dependerá da demanda e do momento em que a
empresa considerar crítico ou necessário. O que corrobora a literatura, no tocante à forma
como o tempo de trabalho influencia diretamente no tempo para o lazer e para a dedicação
familiar (TONELLI, 2008).
As atividades laborais do fim de semana que já fazem parte da rotina das executivas
podem não pesar para algumas, mas não é regra geral. Muitas precisam fazer um esforço para
que essas atividades não sequestrem o tempo dedicado à família:
“Eu não tinha filhos, meu marido sempre entendeu, nunca... e eu administro, por
exemplo, [...] eu acordo cedo, ele fica dormindo, eu trabalho, a hora que ele acorda,
eu já quase terminei, então a gente num... assim, eu sempre administrei pra num
comprometer... num ter que ficar trabalhando no sábado à noite, por exemplo, „ah,
ficou enrolando o dia inteiro, agora sábado à noite vou ter que trabalhar‟; não, vamo
organizar pra poder otimizar o tempo” (executiva com 32 anos, casada, grávida com
sete meses de gestação).
A necessidade de estar sempre atualizada com as demandas laborais oriundas dos emails as faz se sentirem na obrigação de manter o Smart phone sempre à mão. Dessa forma
não se sentem seguras por já possuírem todas as informações necessárias diante dos primeiros
comentários e ou questões da pauta das reuniões de segunda-feira.
O tempo dedicado para trabalho nos fins de semana pode ser interpretado como tempo
simultâneo conforme apresentado no referencial teórico (TONELLI, 2008).
Não foi encontrado nenhuma relação distinta ou que mereça ser apontada para
justificar a classificação por faixa etária ou hierárquica do cargo. Dessa forma, a análise aqui
se fez enquanto grupo homogêneo.
4.3 O investimento na carreira e na vida pessoal
As executivas investem tanto na vida pessoal quanto na carreira. Essas duas demandas
estão tão emaranhadas, conforme apresenta a literatura e sugerem os dados desta pesquisa.
91
Divide-se este tópico em três partes, segundo a faixa etária das executivas: de cinquenta a
sessenta anos; de quarenta a quarenta e nove anos; e de trinta a trinta e nove anos. Dessa
forma, pode-se observar se há alguma distinção ou semelhança em relação à idade delas.
Das cinco executivas ocupantes do cargo de primeiro escalão, nenhuma expressou que
o primeiro escalão fosse um cargo desejado por elas no passado. Sugerem que a presidência
“chegou até elas” como reconhecimento “natural” de seus esforços, e não como um desejo
alcançado com árduo esforço.
Para Belle (1994), a vida profissional das executivas pode ser representada por um
eixo, onde em um pólo situa-se a carreira em modelo tradicionalmente exercido pelos homens
executivos e no outro a vida pessoal, onde os investimentos se concentravam ao longo do
eixo, possibilitando um “equilíbrio” entre essas duas dimensões.
Os dados sugerem que as executivas solteiras sem namorado e separadas ou
divorciadas, com idade superior a 47 anos, sem filhos tendem a concentrar-se em modelo de
carreira tradicionalmente exercida pelos homens no modelo apresentado por Belle (1994). O
modelo de carreira (BELLE, 1994) que permite uma conciliação onde ora se investe mais na
vida pessoal, ora na carreira, mas com pontos de interseções entre essas dimensões, dizem
exercer as casadas ou em união estável, com filhos e com idade inferior a 50 anos, assim
como as separadas ou divorciadas com filho. No entanto, os dados relacionados a tempo e
investimentos dessas últimas nos revela que elas estão tendendo mais para um modelo de
carreira onde não há delimitação entre essas duas dimensões.
As executivas com idade superior aos 50 anos disseram exercer quando jovens o
modelo de carreira que possibilita a conciliação com a delimitação bem definida, por medo de
perder o “prestígio”, caso dissessem o contrário. Agora, com a maturidade, confirmam que
exercem um modelo de carreira sem delimitação definida entre a carreira e a vida pessoal.
Assumem que misturaram tudo, mas que estão se policiando para tenderem ao modelo de
carreira que lhes permite a conciliação com delimitação dessas duas dimensões.
As solteiras com namorado, separadas ou divorciadas, com idade entre 30 e 39 anos,
sem filhos, dizem que elas exercem o modelo de carreira sem delimitação entre a carreira e a
vida pessoal. Insatisfeitas com o modelo que exercem, dizem querer investir no modelo de
carreira que delimita as dimensões para atingir a satisfação em relação à conciliação. Tal
condição também se encontra as executivas com idade superior a 50 anos.
A Figura 4 a seguir ilustra o que indicam os dados.
92
Figura 4:
Representação da vida profissional das executivas segundo Belle (1994)
Dados da pesquisa.
4.3.1 Executivas na faixa etária entre 50 e 60 anos
Elas estudaram muito, conforme apresentado na literatura (HANASHIRO et al. 2005).
Casaram, tiveram filhos (apenas uma não teve filho), hoje eles se encontram na idade adulta.
Algumas separam ou divorciaram como dito no início deste capítulo (4.1). Todos esses
atributos do perfil dessas executivas também podem ser interpretados como indícios de
investimentos realizados ao longo de sua existência e juntamente com suas carreiras.
Elas começaram a trabalhar como estagiárias e trainees. Já foram analistas júnior,
plenos e seniores; superintendente; gerente; diretora e presidente. Há uma, em especial, que
começou em cargo bem mais simples como de office girl e secretária e hoje ocupa cargo de
segundo escalão é graduada, casada, com um filho de 25 anos (MELO et al, 2009). Nunca
93
interrompeu sua carreira, nem qualquer esforço foi feito em relação ao fenômeno opt out. Mas
enfrentou a decisão de ter que optar entre a carreira e a vida pessoal. Escolheu a vida pessoal,
quando não aceitou uma oportunidade de expatriação.
Em relação ao fenômeno opt out, duas executivas manifestaram tal movimento. Uma
interrompeu sua carreira para empreender por dois anos, mas não aguentou ficar sem os
desafios e o dinamismo da carreira executiva. Então, retomou-a. Outra diminuiu a carga
horária quando os filhos estavam com três e cinco anos. Retornou à carga horária depois de
três anos. O que se confirma na literatura (MAINIERO; SULLIVAN, 2006; SCALABRIN;
KISHORE; CASADO, 2009).
Passaram pela dificuldade de ser mulher em suas carreiras. Ouviram e ouvem piadas
que sugerem a inferioridade delas no “mundo dos negócios”. Quando tinham uma idade
inferior à atual, no início de suas carreiras, ficavam tensas com isto. Hoje não dão
importância. Atingiram um cargo estratégico, portanto provaram que têm competência para
estarem ali. Encontraram homens desapontados quando teriam que reunir-se com elas, como
mostra a fala a seguir: “Fui consultora em uma empresa italiana, fui questionada: “Você é
quem vai fazer essa apresentação”? Uma mulher?” “Eu disse: Só tem eu.” Este dado vai ao
encontro da literatura (WRZESNIEWSKI, MCCAULEY, ROZIN, SCHWARTZ, 1997;
BRUSCHINI; PUPPIN, 2004).
O investimento, também está relacionado com a gestão do tempo. Ter que dividi-lo
entre as atribuições da mulher, da empresa, da família e manter-se atualizada é um fator
complicador, mesmo com o apoio de um bom planejamento. Elas reconhecem que recebem
mais demandas da vida como um todo se comparadas com os homens (MAINIERO;
SULLIVAN, 2006; CAVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010; ANDRADE, 2012).
Investem também para fazerem um bom trabalho no cargo que ocupam, no sentido de
deixar uma marca do seu legado para os que virão depois delas na empresa. As que estão no
segundo escalão dizem que não têm ambição de crescer mais hierarquicamente na empresa.
Mas não abrem mão da presença constante de desafios. Estes são como “motor” para as
mesmas.
Algumas estão investindo em fazer suas equipes “andarem sozinhas” ou com baixa
interferência delas. Assim, sobraria mais tempo para outras demandas, como as da vida
pessoal, por exemplo. Outras apresentam como desafio a necessidade de se afirmar em seus
cargos, como exemplifica a frase a seguir: “Já bati na mesa. Os americanos, por exemplo, no
começo, foi difícil para eles me engolirem. Minha memória não diz que foi sofrimento. Não
tenho esse registro. Tinha muito prazer. Grande diferencial”.
94
4.3.2 Executivas na faixa etária entre 40 e 49 anos
Elas investiram em relacionamento amoroso, também, casaram, algumas fizeram isso
mais de uma vez, dado que não aparece entre as executivas com idade entre 50 e 60 anos.
Outras investiram em parceiros que já eram pais, recebendo enteados na formação de sua
família. Seus filhos hoje estão com idade superior a nove anos.
Os investimentos nos estudos levaram à conquista de títulos como a graduação, a
especialização, MBA, mestrado e até o doutorado, adquirido por uma executiva nesta faixa
etária. Tal dado vai ao encontro da literatura (HANASHIRO et al. 2005).
Em relação ao investimento no trabalho, elas se assemelham às executivas na faixa
etária acima de 50 a 60 anos de idade, há quem começou como auxiliar administrativo e foi
galgando cargos melhores (MELO et al, 2009).
Porém, há executivas que começam como empresárias e depois entram para trabalhar
em grandes organizações, já em cargos estratégicos. Além disso, há também quem fez o
seguinte percurso: coordenadora de área; consultora; coordenadora da América Latina;
superintendente; diretora; vice-presidente. Diferente de quem começou no setor bancário
como escriturária, caixa, analista financeiro, coordenadora, gerente e diretora (MELO et al,
2009).
Em relação ao fenômeno opt out, ele também se apresenta entre os desejos dessas
executivas, pois sentem necessidade de estudar fora do país como aprimorar o inglês e ou
vivenciar novas experiências em outras culturas (viver em outro país, a fim de ganhar novas
experiências) para isso teriam que interromper suas carreiras (MAINIERO; SULLIVAN,
2006; SCALABRIN; KISHORE; CASADO, 2009).
Outras se encontram na fase de rever a carreira, não sabem se vão continuar. Dizem
não almejar a presidência. Seus planejamentos futuros são para deixarem as organizações com
um “legado” que sirva de motivação para os funcionários que virão depois delas. Esses dados
sugerem que o fenômeno opt out está a caminho. Pode até não vir a se concretizar, mas já é
uma realidade em seus pensamentos, embora seja apenas uma minoria que coloca claramente
isto (MAINIERO; SULLIVAN, 2006; SCALABRIN; KISHORE; CASADO, 2009).
A gravidez e problemas de saúde são outros motivos pelos quais elas interrompem a
carreira. Ambos estados pressupõem licença médica prescrita, necessária e assegurada por lei.
Mas, mesmo assim, as executivas trabalharam em casa nesses períodos. Essas interrupções
não podem ser consideradas opt out por não serem ações voluntárias das executivas em
95
interromper suas carreiras. Foram “repelidas” por motivo de “força maior” (SCALABRIN;
KISHORE; CASADO, 2009).
Tiveram que investir no equilíbrio psicológico para lidarem com o machismo dentro
das organizações, muitas vezes expresso, nas piadas e comentários dos funcionários. Elas
entendem isso como dificuldade que tiveram que superar, conforme apresentado na literatura
(BRUSCHINI E PUPPIN, 2004).
Há executivas que souberam lidar com o duplo preconceito o de serem mulher e o de
serem jovens, do tipo: “O que essa menina de 26 anos...”, diz ter ouvido uma executiva do
primeiro escalão. Hoje, segunda a mesma, teve uma experiência que também julgou uma
pessoa por ser mais nova. Teve uma reunião com um rapaz de 28 anos. No início achou
estranho, devido ao preconceito, mas se policiou e recordou que já esteve do outro lado. O tal
rapaz é sócio do banco, tem 28 anos, mas mesmo com a presença do preconceito inicial a
reunião foi sensacional: “Ele a conduziu muito bem,” diz a executiva com satisfação de ter
vencido o preconceito e pelo sucesso da reunião em si.
Outras tiveram que ir mais além, convencer toda a organização que a forma de se
vestir não prejudicaria seu desempenho, a exemplo desta fala:
“Uma vez em outra empresa, eles me mandaram trocar de roupa. Lá a gente fazia
avaliação 360 graus com todos os pares e a diretoria inteira, né, fazia avaliação dos
funcionários. Durante 3 anos seguidos eu fui a que teve maior número de pontos na
avaliação. [...] Todo ano eles me mandavam trocar de roupa. Todo mundo era
adequado, mas eu xingava demais, eu era muito rebelde [risos]. Eu sempre fui
rebelde. Eu sempre trabalhei pra caramba. Mas não vem falar o que eu posso, o que
eu não posso não. O importante é o resultado do meu trabalho, então eles não me
viam como uma profissional, eles me viam como uma, que roupa que eu estou
usando, que roupa, agora eu já sei que eu exagerava mesmo [risos]. Mas, barreiras
assim, com relação, por exemplo, a esse cargo de gerente que eu ocupei, depois me
falaram que ser casada é que fez a diferença. Se eu não fosse casada não iam colocar
uma gerente financeira solteira no tamanho da empresa do jeito que era. Mas eu
pensei, o que uma coisa tem a ver com a outra? Impõe mais respeito”. “Até porque
eu andava de mini-saia com as pernas de fora, e com os peitos de fora [risos], mas
eu era nova, tinha 20 e poucos anos, eu era magrinha. Eu trabalhava pra caramba
dava um resultava enorme, eu falava: „não vou trocar de roupa não, eu ando é assim,
se não quiser me manda embora‟. Eu era rebelde demais. E eles não mandavam
fiquei lá 7 anos” (Executiva ocupante de cargo de segundo escalão em uma empresa
multinacional).
96
A sensualidade das mulheres pode ser vista como uma barreira à sua ascensão nas
organizações. As executivas precisam investir na forma de se vestirem e de se “comportarem”
no ambiente corporativo.
Outro investimento citado é a conciliação entre a carreira e a vida pessoal. Para elas
essa conciliação é primordial, conforme apresentado na literatura (LIMA; LIMA; TANURE,
2009).
A conciliação da carreira com a maternidade também é interpretado como um
investimento, que, quando bem conciliado, pode não atrapalhar o crescimento profissional,
como apresenta essa fala: “A gente tem uma executiva, que ela foi promovida duas vezes
durante a licença maternidade,” diz uma executiva de 40 anos, casada há vinte anos, com
filhos de nove e vinte anos de idade, que ocupa cargo de terceiro escalão. No entanto, a
mesma executiva reconhece que a gravidez em si pode ser um empecilho no sentido de adiar a
ascensão das mulheres. Diz ela: “Se tem uma oportunidade numa área que você seria perfeita
e você tá grávida, as pessoas evitam te chamar, porque elas sabem que vão ficar com você
fora durante um tempo (risos)”.
4.3.3 Executivas na faixa etária entre 30 e 39 anos
Elas investem na vida pessoal, sobretudo na formação da família. Até as solteiras
possuem um relacionamento amoroso, assim como as separadas ou divorciadas. Elas ainda
não tiveram filhos.
Seus estudos são investimentos que já lhes renderam título de graduação e
especialização. Somente uma chegou a cursar as disciplinas do doutorado, mas não defendeu
a tese, o que a impossibilitou de adquirir o título de doutora. Os estudos são um investimento
primordial para a carreira executiva, conforme explanado na literatura (HANASHIRO et al.
2005).
Ocuparam cargos desde os operacionais até os estratégicos, mas começaram na
maioria pelo estágio e/ou trainee. Diferentes das executivas pertencentes à faixa etária acima
de 39 anos, que começaram em cargos que não exigiam curso superior.
Elas não interromperam suas carreiras e estão num momento em que a carreira é
prioridade. Já foram expatriadas ou estão se preparando para tal. Portanto, o fenômeno opt out
não é vivenciado nem pensado pelas executivas nesta faixa etária.
97
A única exceção já tinha sido expatriada para fora e para dentro do país e interrompeu
sua carreira voluntariamente, porque queria trocar de orientação profissional e/ou de empresa.
Estava em falta com a família, sua avó estava doente, precisava de um tempo para realmente
analisar o que era importante. Esse dado indica que o fenômeno opt out pode ser vivenciado
até mesmo por uma jovem executiva que ainda não passou pela experiência do matrimônio
nem da maternidade.
Elas ainda investem bastante no preparo psicológico para lidarem com o preconceito.
Muitas passaram pelo duplo preconceito de serem jovem e mulher. Vencer o preconceito
dentro das grandes empresas ainda é no Brasil um desafio, o que corrobora a literatura
(LIMA; LIMA; TANURE, 2009).
Elas ouvem frases do tipo: “Bonitinha logo burrinha...” “Não sinto confortável em ter
uma chefe mulher...” “O salto não cabe aqui.” Uma delas, além de ser presidente em sua
organização, ainda é a representante da área na federação estadual da indústria. Então ouviu
muitas coisas do tipo: “Vai falar o sindicato mais gostosinho”. Isso, porque além de ser
mulher era a mais nova, a “mascote”. Tal informação também vai ao encontro da literatura
(WRZESNIEWSKI, MCCAULEY, ROZIN, SCHWARTZ, 1997)
Elas dizem que, para saber lidar com o preconceito, precisam se concentrar na questão
do mérito. Sabem a hora que acordam e tudo que oferecem a empresa em relação à dedicação
ao trabalho. Então, ouvem piadas ou frases preconceituosas e agem como se aquilo fosse
irrelevante. Muitas disseram que devolvem esses tipos de frases com sorriso nos lábios e falas
do tipo: “Olha só, ainda tenho que ouvir isso...” “O salto não cabe?! Não tem problema, eu
uso uma botinha.” Esse dado está de acordo, mais uma vez, com a literatura (BRUSCHINI E
PUPPIN, 2004).
O investimento na carreira que se destaca é em formar uma equipe capacitada e com
valores éticos; conciliar os estudos com o trabalho; e proporcionar sucesso da área onde
atuam na empresa.
98
5 CONSIDERAÇÕES FINAS
A conciliação entre a carreira e a vida pessoal das executivas que ocupam cargo de
primeiro, segundo e terceiro escalão nas grandes empresas brasileiras, está longe de ser uma
questão superada. Tal situação ocorre devido à complexidade desse
fenômeno
contemporâneo, e a complexidade em questão se agrava com a mutação decorrente das
transformações sociais desde o desenvolvimento do mercado até o comportamento dos
indivíduos, que ainda alimentará muitas pesquisas futuras.
A representação da vida pessoal e profissional das executivas pode ser ilustrada por
um eixo, onde a extremidade esquerda, o meio e a extremidade direita, são respectivamente os
modelos de carreiras exercidos por elas: singular; heterogêneo; e homogêneo. O primeiro,
singular, expressa um modelo de carreira semelhante ao modelo de carreira masculino, onde
são desconsideradas as demandas da vida pessoal. O segundo modelo, heterogêneo, apresenta
uma possibilidade de conciliação, onde demandas das carreiras e da vida pessoal são
fortemente delimitadas, encontrando-se em parte numa intercessão e em duas outras partes
independentes entre si. O terceiro modelo, homogêneo, apresenta uma espécie de fusão, onde
não há condições de separar a vida pessoal da carreira, formando um campo homogêneo
dessas duas dimensões.
O modelo de carreira executiva singular é exercido por muitas executivas,
principalmente as solteiras, sem filho, com idade inferior a 39 anos e as separadas e/ou
divorciadas, também sem filhos, com idade superior a 47 anos. Elas têm o trabalho como
maior fonte de prazer, o que pode ter contribuído para exercerem esse modelo de carreira
singular, tradicionalmente usado pelos homens, onde não se leva em conta a vida pessoal.
Além do fato óbvio de não terem filhos, o que as deixa livres de qualquer obrigação familiar.
Elas não conseguiram descrever sua vida pessoal. Tudo era sobre e para o trabalho, as
viagens, os almoços, até mesmo o tempo que ficam em casa.
A carreira vista dessa forma indica que as mulheres trabalham tanto quanto os homens,
ou até os superam para conseguir e garantir o lugar alcançado no topo da hierarquia
organizacional, objeto de desejo de qualquer executivo, homem ou mulher. Pode ser que essa
postura é indício do teto de vidro ainda presente nas organizações, pois se faz necessário para
toda executiva no início de carreira exercer o modelo de carreira masculino, exercendo tal
modelo ela se considera apta a competir com certa “igualdade” com os homens seus colegas
de trabalho. Essas são questões para se aprofundarem em trabalhos futuros.
99
A satisfação proporcionada pelo trabalho pode evoluir para um vício. As que exercem
um modelo de carreira singular declaram que o trabalho no momento é a única fonte de
prazer. Sendo assim, toda a sua atenção está relacionada com o trabalho. Elas estão
trabalhando mesmo depois do expediente da organização e quando estão em casa aproveitam
para exercer atividade que lhes adiantarão o trabalho na empresa. No almoço, o pensamento é
sobre trabalho e confessam que muitas vezes sonham com o trabalho. Nota-se assim que a
carreira sequestrou o tempo e outros possíveis investimentos da vida pessoal.
A possibilidade de conciliação entre a carreira e a vida pessoal se encontra mais
presente nos desejos das executivas que em via de fato. Há de se desconfiar das executivas
que dizem se enquadrar no modelo heterogêneo, o que possibilita alguma conciliação. Tal
desconfiança ocorre porque as demandas da vida pessoal são tão intensas quanto as da
carreira para as executivas que exercem tal modelo, uma vez que são casadas ou em união
estável, com filhos e com idade inferior a 50 anos. Além do mais, as executivas em mesma
situação familiar, mas com idade superior aos 50 anos, confessam que não diziam a verdade,
quando tinha idade entre 40 e 49 anos, sobre a conciliação. Exerciam um modelo de carreira
homogêneo, no qual não se consegue distinguir a vida pessoal desvinculada da carreira, mas
em seu discurso afirmavam viver a conciliação tão desejada. Contudo, não podemos dizer que
a conciliação entre a carreira e a vida pessoal só exista no mundo das ideias, ou que não
exista.
O modelo de carreira heterogêneo, que possibilita a conciliação entre a carreira e a
vida pessoal pode existir desde que considere sua forma flexível. A mobilidade desse modelo
é fruto da tensão exercida pelas demandas da carreira e da vida pessoal localizadas nas
extremidades do eixo da representação da vida profissional das executivas. Assim, ora os
investimentos e tempo das executivas estão voltados mais para a carreira, ora mais para a vida
pessoal, sem a presença de tanto conflito em algumas dessas dimensões devido à flexibilidade
do mesmo. São raríssimas as executivas que conseguiram atender o “dragão da carreira” e o
“leopardo da vida pessoal”. Elas precisaram barganhar acirradamente com a família, muito
mais que com as organizações. Essa situação é totalmente diferente de uma negociação
familiar harmônica do tipo “monge tibetano” que elas tentam demonstrar nas falas.
Para exercerem esse modelo de carreira heterogêneo, que possibilita a conciliação, as
negociações com a família são fundamentais. O marido ou parceiro amoroso precisa apoiar a
carreira da mulher e cumprir com as responsabilidades paternas, portanto dividir com elas a
educação e socialização dos filhos. No entanto, tal situação ainda se apresenta como desafio
para a maioria dos homens.
100
Os filhos precisam compreender a grande ausência da mãe, que é fruto das atividades
profissionais da mesma. Contudo, há de se pontuar que a criança precisa de afeto materno. Ao
tentar “terceirizar” esse afeto, a executiva se desespera com o medo de perdê-lo para as babás,
por exemplo, pois a criança retribuirá o afeto a esse terceiro. Somente quando se transforma
em adulto o ser humano não só compreende a ausência da mãe, como muitas vezes, necessita
ou a deseja.
Por mais que as executivas contêm com uma equipe eficaz de empregados domésticos
em casa, elas têm que trabalhar mais, gerenciando essa equipe, e tendo alguma presença em
casa. Para isso, na área organizacional elas precisam exercer uma liderança menos
centralizada, onde a equipe tenha autonomia para “caminhar sozinha”. O que é um desafio
para qualquer pessoa que exerça o poder.
A carreira e a vida pessoal são dimensões emaranhadas e muito complexas. É difícil
até mesmo para as executivas descrevê-las desvinculada uma da outra. A impressão que dá é
que elas abriram mão da vida pessoal para se dedicarem integralmente à carreira.
De maneira geral a vida profissional tem um grau de importância muito maior em
relação à vida pessoal para as executivas. Elas dedicam boa parte do seu tempo, à carreira,
conquistando títulos como até mesmo o mestrado, por exemplo. Notou-se que elas adiam o
matrimônio ou união afetiva; adiam a maternidade e trabalham em média 12 horas por dia. O
que faz as executivas diferentes da maioria das mulheres brasileiras. No Brasil, a idade média
para a mulher se casar é de 26 anos. Somente 30% dos nascimentos em 2010 foram de mães
com idade superior a 30 anos, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE, 2011), quadro inverso quando estudamos executivas.
O trabalho em excesso se torna um gargalo comprometendo o aprimoramento dos
estudos. A carreira demanda cada vez mais conhecimento como MBAs, cursos de línguas e
talvez, em certos casos, até o mestrado profissional. Mas como dedicarem aos estudos
trabalhando em média 12 horas por dia como essas executivas? As que conseguiram, assim
fizeram sacrificando boa parte da vida pessoal. Muitas fizeram o uso da simultaneidade do
tempo proporcionado pelos recursos das novas tecnologias, da informação, que possibilitam
fazer duas coisas ao mesmo tempo, da mesma forma que possibilita, de certa forma, estar em
dois lugares ao mesmo tempo, também. Sendo assim, elas pensam, inspiram e transpiram
trabalho.
A intensidade de tempo e investimento na carreira só é desacelerada diante da
tragédia, quando ficam com a saúde comprometida. O tratamento de doenças graves, com
101
possibilidade de risco de morte, as leva a repensar seus hábitos e transformá-los, de forma a
atender seus desejos, entre eles a conciliação entre carreira e vida pessoal.
Diante desse risco de morte, elas começam a rever sua postura diante da vida como um
todo e começam a realizar seus desejos, entre eles o de conciliar a carreira com a vida pessoal.
Começam a direcionar seus investimentos para exercer o modelo de carreira heterogêneo, que
pode possibilitar tal condição. Mesmo em plena consciência que a vida pode ser interrompida,
elas recusam a seguir o fenômeno opt out. Esse fenômeno opt out é fruto do teto de vidro. As
executivas reconhecem que o preço cobrado pelas organizações é muito alto, o que faz até
mesmo algumas delas mudarem de profissão em nome da conciliação da carreira com a vida
pessoal e da qualidade de vida. Mas a grande maioria permanece na carreira.
A vida pessoal das executivas está divida entre os cuidados pessoais, do lar, dos filhos
e do lazer. O marido ou parceiro amoroso não fez parte diretamente nominal dessa dimensão,
pois ele está associado ao lazer realizado em família. Tem-se que o marido se torna “faca de
dois gumes” em suas vidas: se apoiarem a carreira da esposa e forem ativos na administração
das tarefas do lar e nas responsabilidades paternais, são considerados importantes; do
contrário, são dispensáveis. Raríssimas executivas afirmaram reservar um tempo para seu
cônjuge. Entretanto, a literatura afirma que casar e ter filhos faz parte da identidade da
mulher, mas para as executivas desta pesquisa o marido ou parceiro amoroso não é primordial
na distribuição do tempo dedicado à vida pessoal. Talvez, porque, via de regra, a figura de um
parceiro amoroso masculino esteja ficando distante do universo das mulheres executivas, dada
a impossibilidade de o homem realmente dividir com a mulher as responsabilidades
familiares.
Há contradição entre a percepção das executivas, quanto ao fato da presença do filho
ser ou não favorável à conciliação entre a carreira e à vida pessoal. As que se encontram com
filhos ainda pequenos não se sentem confortáveis em reconhecer, ou de fato não reconhecem,
que após a chegada do mesmo, a demanda da vida pessoal aumenta muito e tenciona a
conciliação. Diferentemente das executivas que ainda não tiveram filho ou das que os têm, na
fase adulta, que reconhece a dificuldade.
A mãe, enquanto vivencia a experiência da maternidade pode se sentir constrangida ou
de fato não perceber que o filho, fonte de imenso prazer, possa ser também o inibidor de outro
prazer, a carreira. A imprecisão desse achado se dá numa limitação da pesquisa em não
considerar uma análise psicológica das questões familiares das executivas.
A maternidade como fator que desfavorece a conciliação e consequentemente impacta
na carreira da mulher, indica a presença do teto de vidro, uma vez que a paternidade não
102
compromete a carreira do pai pelo contrário, se torna motivação para melhorias no despenho
da carreira, gerando até maior remuneração.
Outra contradição é quanto à relação amorosa. As solteiras sem namorado e as
separadas ou divorciadas não consideram a presença de marido ou companheiro amoroso
como um fator favorável à conciliação entre a carreira e à vida pessoal das executivas. O que
contradiz as executivas que estão no primeiro, segundo, terceiro ou quarto casamento. A
tentativa de encontrar um parceiro amoroso ou um marido que compreenda o tipo de modelo
de carreira exercido por elas pode indicar que de fato não é tão simples para elas manterem-se
casadas com um homem culturalmente machista, como é o caso da maioria dos homens
brasileiros.
Por outro lado, para uma minoria, o marido ou parceiro amoroso está relacionado com
o lazer em família. A opção delas por um maior controle da carga horária de trabalho, devido
aos compromissos prazerosos em família, é um fator relevante para a conciliação entre a
carreira e a vida pessoal, algumas vezes exercida no modelo de carreira heterogêneo. Afinal,
para controlar um determinado prazer, nada melhor do que outro prazer.
Sendo assim, a pesquisa sugere que a carreira executiva pode ser exercida em três
possíveis modelos: singular, heterogêneo e homogêneo, o que impactará diretamente na vida
pessoal das executivas. O prazer que elas sentem pelo trabalho pode servir de bússola nas
“trilhas” da vida pessoal das mesmas. No entanto, não se pode negar que a situação familiar
também influencia (em menor proporção) na construção do modelo de carreira exercido. A
complexidade do fenômeno da conciliação entre a carreira e a vida pessoal nos conduz a
novos estudos como, por exemplo, estudar tal fenômeno sob a perspectiva do cônjuge, dos
filhos, da organização na pessoa do (a) superior (a) e dos (a) liderados (a) das executivas.
Se os desafios enfrentados por essas executivas que conquistaram postos de comando
na alta hierarquia das maiores e melhores empresas para se trabalhar no Brasil são de tal
monta como mostrados neste estudo, é de se supor que o fenômeno seja de muito maior
abrangência nas demais organizações.
103
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110
APÊNDICE A - Roteiro de entrevista
Data: ____________________
1. Empresa:
2. Nome:
3. Idade:
4. Cargo:
1o escalão
2o escalão
3o escalão
Considerando este o presidente
5. Tipo de Empresa:
Nacional
Multinacional
6. Qual é a proporção de homens e mulheres que trabalham na sua empresa na sua
cidade? __________. E na empresa como um todo? ________________.
7. Formação:
Área
No seu país
No Exterior
a. Graduação
b. Especialização
c. Mestrado
d. Doutorado
16. Quanto ao seu relacionamento afetivo:
Solteira
Casada
Separada / divorciada
Viúva
Você considera que o seu relacionamento atual é estável? Fale sobre ele (tempo, divisão
de espaço e despesas)
111
17. Possui filhos
Sim
Não
Quantos? 2 Que idade têm seus filhos? ________ Moram com você? _____
Você possui enteados?________ Moram com você? __________________
18. Quantas horas dedicadas por dia aos filhos / enteados?
19. Quantas horas por semana você dedica para cuidar da gestão da casa (babás,
motoristas, faxineiras, etc.)?
20. Quantas horas por semana você dedica para cuidar de si (salão, esporte, terapia)?
21. Quantas horas você trabalha por dia (incluindo compromissos fora do horário de
trabalho)?
22. Se você viaja a trabalho, por quantos dias no mês deve se ausentar da sua cidade em
média? Viagem no Brasil _______ Viagens para o exterior _______________
23. Como foi a história de conciliação entre vida pessoal e profissional? ... (culpa?)
24. Houve momentos em que você teve que optar entre carreira profissional e vida
pessoal?
25. Você já contemplou a possibilidade de buscar outro trabalho ou de deixá-lo devido à
incompatibilidade com sua vida pessoal?
Nunca
Poucas vezes
Com frequência
Quase sempre
Sempre
26. Considerando o mês, em média, em quantos finais de semana você trabalha? Inclua o
trabalho em casa e fora da empresa em eventos e também pela internet (tipo relatórios,
projetos, leituras técnicas obrigatórias)
Zero
Um
Dois
Três
112
Quatro
27. O que você faz em seu tempo de lazer, fora das obrigações com a carreira e fora das
obrigações familiares?
28. Já interrompeu sua carreira profissional? Qual motivo? Este motivo interferiu na sua
chegada ao poder?
29. Por quais cargos você passou até o atual?
30. Quais são os seus maiores desafios quanto à carreira?
31. Encontrou alguma dificuldade ao longo da sua carreira?
113
APÊNDICE B - Roteiro de observação durante a entrevista
Entrevistada:
1)Aparência física:
2) postura:.
3) Domínio das informações profissionais:
4) Domínio das informações pessoais:
5) Emoções positivas aparentes:
6) Emoções negativas aparentes:.
7) Emoções aparentes:
8) Indícios de trabalho full-time:
9) Local:
10) Sem classificação:
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As executivas entre a carreira profissional e a vida pessoal