08,7235$=(53$8%5$6,/&DHVDOSLQLDHFKLQDWD/DP 6DOYHR%UDVLOQRPHGHYHJHWDO O Brasil é o único país do mundo cujo nome veio de uma planta, o paubrasil. Não sabemos ao certo como esta peculiaridade pode nos ajudar a sermos diferentes do resto do globo. Mas, pelo menos, em um nível simbólico, somos a única nação do planeta que está plantada em sua própria terra! Ora, isto já é uma boa semente com a qual podemos fazer poesia. Mas o objetivo deste trabalho é menos “poetar” e mais investigar os nossos quinhentos anos de história, contados sob a ótica desta madeira que nos foi tão primordial: o pau-brasil. Mas, se somos um país, com inúmeras florestas acredite se quiser, mesmo depois de tanta devastação! - por que escolher, então, o pau-brasil para ser o protagonista desta aventura? Simplesmente porque ele é, dentre todas as madeiras da flora brasileira, a de maior importância histórica. $iUYRUHSDXEUDVLO O pau-brasil é uma árvore da família das leguminosas. As árvores são consideradas vegetais superiores e podem ser divididas em três partes: o conjunto das raízes - também chamado de raizame -, o tronco e a copa. As raízes são os órgãos de fixação da árvore no solo e são responsáveis também pela alimentação da planta. O tronco é o caule, geralmente retilíneo e grosso, por onde circulam os nutrientes que fazem a árvore crescer, florescer e frutificar. Por fim, há a copa, que é uma verdadeira indústria de alimentos produzidos pelo processo chamado fotossíntese. Aquele em que, com a ajuda da luz solar, as folhas combinam a mistura mineral absorvida pelas raízes com o gás carbônico existente no ar. Bom, agora que já somos doutores em vegetais superiores, vamos examinar mais de perto esta árvore testemunha de nossa história. 9RFrMiYLXXPSDXEUDVLO" Poucos brasileiros já tiveram o privilégio de ver uma árvore de paubrasil. Isso porque as regiões onde eram encontradas grandes quantidades 1 desta espécie sofreram um violento processo de devastação que praticamente fez com que o pau-brasil fosse incluído na lista das espécies ameaçadas de extinção. Porém, graças a algumas iniciativas louváveis no campo da preservação do meio ambiente, nos últimos anos, nossa árvore aos poucos vai tentando recuperar seu status de cidadã brasileira. 0HXQRPHFLHQWtILFRp&DHVDOSLQLDHFKLQDWD/DPPDVSRGHPHFKDPDU GHSDXEUDVLO Talvez você não saiba, mas ás arvores são identificadas sempre por dois nomes. Um (às vezes, vários) é aquele como nós popularmente a chamamos e o outro é como os cientistas, preocupados com a classificação rigorosa de suas espécies, a denominam e registram. Com o pau-brasil não poderia ser diferente. Seu nome científico é &DHVDOSLQLD HFKLQDWD /DP.. Ora, mas isso mais parece um palavrão ou até mesmo uma ofensa para a pobre da árvore! Nada disso! Acontece que, como em todo nome científico, há neste batismo algumas regras bem simples que, uma vez conhecidas, tiram das palavras seu ar arrogante e indecifrável. Vejamos que regras são essas. Primeiramente, as palavras estão escritas em latim que, apesar de ser uma língua morta (ninguém mais fala latim hoje em dia), ainda batiza diversas descobertas da ciência. Vamos desvendar o primeiro mistério: o primeiro nome de uma árvore sempre diz respeito a seu gênero, aqui no caso, “Caesalpinia” - que na verdade é uma homenagem a um grande médico e botânico do século XVI - Andrea Cesalpino. Próximo enigma: o segundo nome de uma árvore se refere à sua espécie. A palavra “echinata” é a forma latina do adjetivo “equinado”, que nada mais quer dizer do que “vegetal cheio de espinhos”. Um bom exemplo de um sujeito prá lá de equinado é o ouriço-do-mar, não é verdade? E, por fim, a terceira palavra que dá nome a uma árvore é a abreviação do nome da pessoa que a registrou. “Lam.” é a abreviação de Lamarck, o botânico que, em 1789, descreveu o pau-brasil, conforme as normas da nomenclatura botânica. Viu como foi fácil desvendar o significado do nome científico! Agora, vamos aos nomes populares com os quais os indígenas, os europeus e, nós brasileiros, chamávamos e ainda chamamos, nossa amiga &DHVDOSLQLD: ibirapitanga, ibirapiranga, ibirapita, muirapiranga, orabutã, brasileto, paurosado e pau-de-pernambuco. Ufa! Até que foi bom ter prevalecido a forma “pau-brasil” para batizar nosso país, pois você já pensou se a outrora Terra de Santa Cruz adotasse, por exemplo, o nome Ibirapitanga. A esta altura 2 seríamos todos “ibirapitanguenses”. Nada contra a palavra em si, mas que “brasileiro” é muito mais fácil de pronunciar, ah, isso é verdade! &DUDFWHUtVWLFDVGRSDX EUDVLO Em relação à sua forma, ela é uma planta espinhenta (equinada, lembrase?) que chega a medir de 8 a 30 metros de altura. Seu tronco mede de 40 a 70 cm de diâmetro e suas folhas têm de 10 a 20 cm. Sua madeira é dura, muito pesada, compacta, resistente e de textura fina e incorruptível - como aliás deveriam ser muitos políticos brasileiros, não é verdade? Ah, se alguns deles tomassem lições com o pau-brasil!... A madeira é uniformemente laranja ou vermelho-alaranjada e se torna vermelho-violácea com reflexo dourado após o corte. Suas flores são amarelas, sendo que uma das pétalas apresenta uma mancha vermelho-púrpura. Das flores exala um suave perfume. A área de ocorrência do pau-brasil se estende do Rio Grande do Norte a São Paulo, sempre na floresta pluvial atlântica, mas sua freqüência mais expressiva se dá no sul da Bahia. As informações biológicas nos dão conta de que ela é uma planta semidecídua, heliófita ou esciófita. Se você ficou na mesma, não se desespere! Faremos uma breve pausa para esclarecer tais conceitos. Semidecíduas são as árvores das quais somente metade das folhas se desprende. Heliófitas são aquelas que precisam do sol (hélio) para se desenvolver. Já as esciófitas, são justamente seus opostos, pois elas precisam da sombra (escio) para sobreviver. Tais características são peculiares à floresta pluvial atlântica. Nossa ibirapitanga ocorre preferencialmente em terrenos secos e inexiste na cordilheira marítima, sendo uma planta típica do interior da floresta primária densa. Sua floração se dá a partir do final de setembro, prolongando-se até meados de outubro. Entre novembro e janeiro se dá a maturação dos frutos. As sementes são obtidas colhendo-se os frutos (vagens) diretamente da árvore quando iniciam a abertura espontânea. Em seguida, deve-se levá-las ao sol para completar a abertura e a liberação das sementes. Deve-se prestar muita atenção para o início da abertura das vagens, uma vez que esse processo não dura mais que alguns dias. 1 kg de sementes contém aproximadamente 3.600 unidades. Pronto, você está se tornando um especialista em orabutãs! (???) 3 3$8%5$6,/7(67(081+$'2'(6&2%5,0(172 4XHPGHVFREULXTXHP" O Brasil foi descoberto em 1500, certo? Bom, mais ou menos... Ao longo de nossa história, pesquisadores das mais diversas áreas (historiadores, antropólogos, arqueólogos e outros especialistas) têm se esforçado para rever a tese do “simples” descobrimento, como veremos um pouco mais adiante. No entanto, descoberta ou não, a terra brasileira abrigava, quando chegaram os primeiros exploradores europeus, povos que aqui já estavam há dezenas de milhares de anos. $SUpKLVWyULDGR%UDVLO Por Pré-história entendemos o período anterior ao conhecimento e à utilização da escrita. Como nossos indígenas eram todos povos ágrafos (que não conheciam, logo, não utilizavam a escrita), nossos primeiros registros escritos somente se deram com a chegada dos portugueses, em 1500. Portanto, todo o período anterior ao descobrimento é tratado pelos especialistas como a Pré-história brasileira. Para se saber um pouco deste período tão obscuro, recorre-se sempre à arqueologia, que é a ciência que estuda as coisas antigas. Os arqueólogos são aqueles seres obcecados por encontrarem vestígios de antigas civilizações nos mais diferentes lugares. Arqueólogo adora uma velharia. Por isso, a escritora de livros de mistério Agatha Christie (2 FDVR GRV GH] QHJULQKRV), que era casada com um arqueólogo, uma vez se saiu com esta: “A vantagem de ser casada com um arqueólogo é que, quanto mais velha, mais atraente me torno para ele!”Bom , mas voltemos à nossa Pré-história. Quando os arqueólogos encontram diversos indícios tais como objetos de pedra ou de cerâmica, pedaços de fogueiras, de casas e de túmulos, eles passam a analisar o possível comportamento dos grupos que deixaram tais vestígios. Tem sido assim com o estudo dos ancestrais de nossos indígenas. Diversos sítios arqueológicos (lugares que concentram grande variedade de vestígios) já foram encontrados e nos dão cada vez mais pistas da chegada dos primeiros habitantes do Brasil. Um dos sítios mais importantes é o Parque Nacional da Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato, no estado do Piauí. Lá, a arqueóloga Niède Guidon conseguiu reunir provas que revolucionaram as teorias sobre o povoamento 4 da América. Niède encontrou vestígios que datam de 41.500 anos. Antes, acreditava-se que a chegada dos primeiros homens à América tivesse ocorrido há 12 mil anos. Convenhamos que uma diferença de quase 30 mil anos é algo bastante significativo, daí a importância do trabalho de Niède e da preservação de tal sítio arqueológico - que já se tornou patrimônio da humanidade pela UNESCO. 'HRQGHYLHUDPQRVVRVtQGLRV" É unanimidade entre os cientistas a afirmação de que o homem americano não é autóctone. Ops! Vamos parar que lá vem palavra difícil! Autóctones são os seres nascidos na própria terra. “Auto” quer dizer “próprio”, como em “automóvel”, que designa “aquilo que se move por ele mesmo”, ou seja, com um motor. Já “ctone” significa “terra”. Isso quer dizer que os povos indígenas chegaram aqui vindos de outros lugares. Mas de onde? A tese mais difundida é a de que eles vieram, em levas sucessivas, da Ásia, pelo estreito de Bering, que fica a noroeste da América do Norte. Os primeiros grupos chegaram há pelo menos quarenta mil anos, na última era glacial. Eram povos caçadores que desconheciam a agricultura, já que o Velho Mundo, nesta época, não tinha passado ainda da Idade da Pedra Lascada. ³%UDVLO´GHVGHTXDQGR" Diz a tradição que o nome “Brasil” vem da madeira pau-brasil. Mas, às vezes, a tradição se revela insuficiente, pois, esconde outras possibilidades fascinantes de se adquirir um determinado conhecimento. Há, pelo menos, duas possíveis origens para o nome de nosso país. Comecemos pela tradicional. A história do pau-brasil remonta do século IX, ou seja, ao ano 900 d.C. Àquela época, a madeira era encontrada nas Índias Orientais, dentre as variedades de plantas que possibilitavam, por força de sua cor avermelhada, a produção de um corante, igualmente vermelho. Na Europa, para onde eram levados e destinados ao uso, tanto a madeira quanto o corante eram denominados “brecilis’, “brezil”, “brazily” ou “brasil”, todos nomes derivados da palavra latina “brasília” que significa “cor de brasa” ou “vermelho”. As árvores eram plantas que pertenciam a várias espécies de “&DHVDOSLQLD”, já difundidas e conhecidas principalmente na Índia, Sumatra e outras regiões da Ásia, sendo “sappan” (que significa igualmente “vermelho”), o seu nome no 5 arquipélago malaio. Data de 1128 o primeiro registro escrito do nome “brasile”, dado tanto ao corante quanto à madeira. Tal informação aparece em um tratado de Muratozi de Ferrara. Ainda nesta concepção tradicional, alguns estudiosos sustentam que a palavra veio diretamente do francês “brésil” que, por sua vez, é originário do toscano “verzino”, como era denominada na Itália a madeira usada para o tingimento. No entanto, há uma outra versão, mais deliciosamente misteriosa, que nos remete ao termo celta (um antigo povo que habitou a Europa) “bress”, origem do inglês “to bless” (abençoar). Segundo uma lenda celta do século IX, havia uma ilha chamada Bem Aventurança ou Terra Abençoada, ou ainda, Hy Brazil, situada nas brumas do Mar Tenebroso, o Atlântico. Desta versão compactuava o respeitado historiador Sérgio Buarque de Hollanda. Uma adaptação desta lenda pode ser conferida no divertido filme “Aventuras de Erik, o viking” do diretor inglês Terry Jones. Nele, Hy-Brazil se assemelha em muito à também lendária Atlântida... Dentro desta perspectiva mítica, há ainda um curioso registro do genovês Angelino Dalorto que, em 1325, descreveu assim a cidade imaginária Brazil: ³8PD LOKD QD PHVPD ODWLWXGH GD ,UODQGD GR 6XO 2 QRPH SRGH VHU JDpOLFRMiTXH%UHVDLOpXPQRPHGHXPDQWLJRVHPLGHXVSDJmRHDPEDVDV VtODEDV µEUHV¶ H µDLO¶ GHQRWDP DGPLUDomR &RQVLVWH QXP JUDQGH DQHO GH WHUUDFHUFDQGRXPPDULQWHULRUFRPLOKRWDV2PRUWDORUGLQiULRQmRSRGHYr ORHVRPHQWHXQVSRXFRVHOHLWRVIRUDPDEHQoRDGRVFRPDYLVmRGR%UD]LO´ O fato é que, mítica ou não, a WHUUDEUDVLOLV aparece nos mapas, desde 1339. No século XIV, os planisférios de quatro cartógrafos mostravam uma Ilha Brasil, a oeste dos Açores. O primeiro mapa com referências reais, no entanto, é o mapa encomendado pelo espião italiano Alberto Cantino a um cartógrafo de Lisboa. Nele se vêem papagaios, florestas e o desenho do litoral desde Cabo Frio até o Amazonas. Ora, o mapa data de 1502, época em que as expedições oficiais portuguesas só haviam visitado o Amazonas e a Bahia. Como então já era possível descrever em detalhes o litoral ao sul do território baiano? ³5HYHODQGR´R%UDVLO 6 Por que a missão - que já não era inédita - de travar comércio com as Índias teve que contar com a maior esquadra montada em Portugal: treze navios e mil e quinhentos homens? E por que, para chefiar tal empreitada, o rei d. Manuel I designou um comandante que não possuía a menor experiência como navegador: Pedro Álvares Cabral? Tais perguntas são feitas até hoje pelos historiadores que não se contentam com a tese oficial do descobrimento. Pensam eles que o 22 de abril, na verdade, foi uma “tomada de posse” de uma terra já conhecida. Vamos examinar as origens de tal hipótese. $VRULJHQVGRGHVFREULPHQWR Segundo a corrente histórica que propôs as questões com que se inicia o tópico anterior, para compreender as origens do descobrimento do Brasil é preciso recuarmos, no tempo, cerca de 400 anos e, nos deslocarmos, no espaço, em direção ao Oriente Médio. E eis que estamos prontos para irmos voltando aos poucos para o futuro! Em 1119, franceses em Jerusalém fundaram o Ordem dos Templários - uma congregação secreta composta por padres-soldados que tinha por objetivo difundir a fé cristã. Enquanto as cruzadas duraram na Europa, os templários receberam milhares de propriedades por doação ou herança e desenvolveram intensa atividade econômica. O seu símbolo máximo era o manto branco com que se vestiam onde estava desenhada uma cruz vermelha. Com a tomada da Palestina pelos muçulmanos, a Ordem passou a ser desprestigiada por toda a Europa, em especial pela monarquia francesa que lhe inflingiu uma sangüinária e injusta perseguição, ocasionada por dívidas contraídas com a abastada instituição militar e religiosa. Em 1307, então, os remanescentes da Ordem Templária rebatizada como Ordem de Cristo - tiveram acolhida em terras portuguesas, reino pobre e atrasado, cujo monarca estava interessado na especialização dos antigos templários no transporte marítimo de peregrinos para a Terra Santa e nas valiosas informações que estes adquiriam com os viajantes de toda a Ásia. Foi assim que, em 1416, a organização passou a ter como grão-mestre o infante d. Henrique, filho do rei português d. João I, resolvendo então concretizar um antigo projeto: circunavegar a África e chegar à Índia, ligando o Ocidente ao Oriente sem a intermediação dos muçulmanos que controlavam por terra tal percurso. A proposta recebeu o aval do papa Martinho V, que deu caráter de cruzada ao empreendimento. Assim, as terras tomadas dos infiéis passariam à 7 administração espiritual da Ordem de Cristo. Mas, somente em 1498, o cavaleiro Vasco da Gama conseguiu realizar a façanha. No entanto, o monopólio das informações - sempre secretas - dos cavaleiros da Ordem da Cruz aos poucos foi caindo, uma vez que outras nações passaram a adquirir a tão perseguida tecnologia náutica. Assim, em 1492, a Espanha descobriu a América do Norte - o que causou grande irritação no império português, somente abrandada pela assinatura de uma bula papal que dividia o pressentido Novo Mundo entre Portugal e Espanha. E aqui novamente a tradição do descobrimento perde força: depois de firmadas as negociações, o reino português resolveu esticar 370 léguas a oeste a linha imaginária que dividia as novas terras, reservando naturalmente o Brasil para sua administração. Tal acordo ficou conhecido como Tratado de Tordesilhas. (RTXH&DEUDOWHPDYHUFRPHVWDKLVWyULD" Bom, é chegada a hora da revelação: segundo essa vertente histórica, Pedro Álvares Cabral era um eminente integrante da Ordem de Cristo, única companhia religiosa militar autônoma do Estado que tinha autorização papal para ocupar - tal como nas cruzadas - os territórios tomados dos infiéis (no caso brasileiro, os índios). Por isso, se destacavam nas velas que aqui aportaram a cruz símbolo da ordem, que ainda tentou batizar por três vezes as novas terras descobertas (Vera Cruz, Ilha de Santa Cruz e Terra de Santa Cruz). Cabral, como se sabe, fincou uma cruz em tecido no solo do Monte Pascal e mandou rezar a primeira missa. Tais atos estariam plenamente em acordo com a orientação religiosa recebida por ele da Ordem da Cruz. Assim é que, como integrante de uma organização que detinha informações sigilosas a respeito de tantas conquistas, o comandante português nada mais veio fazer do que se apoderar de terras, há um bom tempo, conhecidas. (HLVTXHRHXURSHXGHVFREUHRSDXEUDVLO A primeira riqueza explorada pelos europeus em terras brasileiras foi o pau-brasil, árvore que existia com relativa abundância em largas faixas da costa brasileira. Embora seu valor fosse muito inferior às mercadorias orientais, a substância corante extraída da madeira foi de grande interesse 8 comercial para Portugal que, antes, a comprava dos mercadores do Oriente que atuavam nas rotas tradicionais do comércio indiano. Logo, a coroa portuguesa declarou a exploração do pau-brasil um monopólio real. Isso significava que só poderia dedicar-se a esta atividade quem obtivesse uma concessão da coroa portuguesa, que cobrava pelos direitos concedidos. A primeira concessão de exploração foi conferida a Fernando de Noronha (que, quem diria, virou nome de arquipélago paradisíaco!) ainda em 1501. O primeiro arrendatário e seus associados posteriores tinham como obrigação enviar naus à nova terra, descobrir “trezentas léguas de costa” e pagar uma parcela à Coroa, além de construir e manter fortalezas. Ao colono era vedado explorar ou queimar o lenho corante. Registra a História que, pela concessão obtida, Fernando de Noronha pagava, anualmente, 4 mil cruzados. Já em 1519 os negócios do primeiro arrendatário pareciam bastante promissores, pois a essa época já lhe fora possível retirar mais de 5 mil toras, segundo registro de Amazonas de Almeida Torres em seu livro %UHYHV1RWDVSDUDR(VWXGR)ORUHVWDOGR%UDVLO. Os espanhóis, em respeito ao Tratado de Tordesilhas, afastaram-se do litoral brasileiro. No entanto, corsários franceses - que não reconheciam a legitimidade do acordo - lá agiam com relativa liberdade, extraindo a madeira ilegalmente. A participação de nossos indígenas na extração do pau-brasil foi fundamental, pois somente as tripulações dos navios não davam conta de cortar e transportar uma árvore de grande porte. A princípio, o trabalho indígena foi conseguido por meio da prática do escambo, isto é, mediante a troca por algumas bugigangas e quinquilharias que despertavam neles grande interesse, como, pedaços de tecido, espelhos, e, às vezes, facas e canivetes. Mais habilitados no trato com os indígenas, os contrabandistas franceses, no entanto, conseguiram maiores vantagens que os portugueses. Porém, seu sistema de extração causou graves prejuízos às matas: ao invés de cortar as árvores, ateavam fogo na parte inferior do tronco, provocando assim muitos incêndios, que matavam animais e destruíam preciosas essências. 3DXEUDVLOOXFURVjYLVWDGHVWUXLomRDSUD]R Em pouco tempo, o índio passou a perceber o real comportamento do homem europeu. Quando, por qualquer motivo, ele se recusava a realizar o 9 trabalho desejado pelos europeus, estes apelavam para a violência e para o trabalho escravo. A exploração do pau-brasil não deu origens a núcleos coloniais fixos de ocupação e povoamento, uma vez que, realizada como atividade predatória, era nômade, deslocando-se pelo litoral à medida que a madeira ia se esgotando. Foram construídas apenas algumas feitorias - fortificações de caráter militar - em alguns pontos onde a madeira era mais abundante. Essas feitorias, construídas tanto por portugueses quanto por franceses, serviam para a defesa contra os concorrentes, contra ataques de tribos hostis e para o depósito das mercadorias. Como toda atividade predatória, a extração do pau-brasil foi se tornando cada vez mais difícil devido à escassez das árvores, que passaram a ser encontradas somente de 10 a 20 léguas da costa. Já em 1530, em alguns locais do litoral, o pau-brasil se tornara escasso, embora o Brasil tenha continuado a exportar a madeira até o início do século XIX. A exploração era bastante rudimentar, trazendo como conseqüência a destruição de grande parte de nossas florestas. Assim, com o descobrimento, iniciou-se também o desmatamento indiscriminado que ainda hoje ameaça nossa biodiversidade. 2 3$8%5$6,/ ( $ 1(&(66,'$'( '$ &216&,Ç1&,$ (&2/Ï*,&$ 9HJHWDomRWURSLFDOXPDYHOKDVHQKRUD A vegetação dominante do Brasil, com sua exuberante variedade, porte e beleza de flores e frutos, existe há cerca de 80 milhões de anos! Só para você ter uma idéia de tamanha antigüidade, o KRPRVDSLHQV - nosso ancestral mais imediato - surgiu há, apenas (literalmente), 1 milhão de anos. Tal vegetação não era exclusividade do Brasil, cobrindo todo o planeta Terra, de pólo a pólo, pois o clima geral era de verão úmido e contínuo. Mas como tudo que é bom dura pouco (embora não houvesse ainda nenhum homem para desfrutar de tal verão constante) começaram a ocorrer cataclismas geológicos e períodos de frio intenso (as chamadas eras glaciais) que modificaram o clima e a topografia da superfície e da biosfera terrestre. Assim, somente a faixa situada entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio 10 passaram a possuir aquela cobertura vegetal primitiva, numa profusão de luz, calor e umidade durante todo o ano, graças ao trânsito predominante do sol em torno da linha do equador. O Brasil situa-se exatamente nesta região, possuindo como herdeiras daquele período longínquo a floresta amazônica, a mata atlântica e outras formações que perfaziam um total de 5,2 milhões de quilômetros quadrados de área florestal, à época do descobrimento. )ORUHVWDDFDVDDQFHVWUDO O homem primitivo extraiu das florestas seus recursos de sobrevivência. O que hoje os escoteiros fazem simuladamente, nossos ancestrais faziam pra valer. A madeira era usada para a obtenção do fogo (com o qual eles cozinhavam seus alimentos e se defendiam) e para a confecção de armas (de defesa e caça) e parte das plantas servia de alimento a este ser ávido por sobreviver. O homem moderno manteve estes hábitos, aperfeiçoando-os. Assim foi que a madeira lhe serviu na confecção de barcos e navios, que possibilitou a realização das grandes viagens de navegação. 3URJUHVVRPHXEHPPHXPDO Há uma diferença fundamental entre as atitudes do homem primitivo e do homem moderno em relação aos recursos naturais de que eles necessitam. O homem primitivo tende a respeitar a natureza, encarando-a como uma entidade autônoma - que tem necessidades próprias e cuja existência deve ser, acima de tudo, preservada. Ao contrário, o homem moderno subjuga os recursos naturais às suas necessidades tecnológicas e econômicas. Isto pode parecer uma discussão estéril, mas convém pensarmos um pouco a respeito dela. Você pode argumentar que o atraso do homem primitivo é que o faz respeitar (por medo e ignorância) a natureza. E, ainda, que se o homem não tivesse dominado a natureza, estaríamos vivendo até hoje em condições precárias. Esta discussão, acredita-se, passa ao largo deste maniqueísmo. Pausa para explicação: maniqueísmo é um sistema de raciocínio que encara um problema somente por dois pontos de vista, o seu lado bom e o seu lado ruim, tratados de maneira estanque. Ou uma coisa é totalmente boa, ou ela é totalmente ruim. Portanto, vamos deixar de lado os argumentos maniqueístas 11 e vamos pensar que é possível ao homem aprender a adequar a conveniência de suas necessidades ao compromisso maior com a natureza, cujos recursos são tão caros à vida do planeta. +RPHPSUHGDGRUFLYLOL]DGR Um dos exemplos mais brutais de exploração predatória da natureza ocorreu com a extração do pau-brasil. A cobiça mercantilesca de portugueses e de outros europeus se estendeu durante 375 anos por sobre a mata atlântica, um produto potencial que demorou milhões de anos para se constituir. É, sem dúvida, um dos casos mais flagrantes, no mundo, da quase extinção de uma espécie vegetal pela economia destruidora do homem. Na base de tal violência estava o conceito (infelizmente, ainda hoje praticado em larga escala) de que a natureza funcionava como fonte de recursos ilimitados. Este comportamento se alastrou pelos sistemas sócioeconômicos posteriores, o que propiciou a devastação de, praticamente, 90% da mata atlântica e a quase extinção do pau-brasil. Da floresta original resta, hoje, cerca de 10%, pulverizada em matas dispersas, geralmente em propriedades particulares. A ilusão da existência permanente de novas áreas de exploração criou atitudes, visões de mundo e táticas de exploração econômica em que tudo era tirado, destruído e abandonado à própria sorte sem reposição alguma. Satisfazendo principalmente a vaidade da civilização européia, ao lançar no mercado os tecidos de cor púrpura, símbolo de dignidade e nobreza dos povos orientais, os exploradores europeus ignoravam que cada árvore derrubada havia percorrido aproximadamente 100 anos de existência até atingir a condição de corte. De forma brutal e incontrolada, eles abateram centenas de milhares de árvores distribuídas ao longo da costa, desde o Rio Grande do Norte até o Rio de Janeiro. As mais cobiçadas eram as de Alagoas e de Pernambuco, devido a sua coloração intensa e mais duradoura. A história conta sobre a Nau “Bretoa” que, em apenas uma viagem, transportou, em 1511, 150 toneladas do lenho, e sobre a exploração contínua do Cabo São Roque até Cabo Frio, retirando madeira na ordem de 300 toneladas por ano. O mesmo destino do pau-brasil tiveram também outras espécies, como os cajueiros do litoral e outras árvores frutíferas, extraídas sem o necessário replantio. 12 $TXDQWDVDQGDQRVVRVLVWHPDHFROyJLFR" Outras espécies hoje em dia são as irmãs trágicas do pau-brasil, em sua trajetória de violência e infortúnio. A vegetação dos mangues, que é indispensável para a reprodução da fauna marítima (moluscos, ostras, mariscos, caranguejos e peixes), tem sido destruída sistematicamente e esta situação tende a se agravar com outro fator igualmente nocivo: a poluição. A floresta amazônica vive dias de agressão e ameaça. Nossos rios viraram esgotos a céu aberto, oferecendo poluição às comunidades que deles se avizinham. As matas ciliares (que crescem às margens dos rios) e as matas que cercam lagos, açudes e represas também estão sendo devastadas, o que certamente contribuirá em muito para o ressecamento de diversas vias fluviais. 9LYDDGLIHUHQoD Um dos males que mais põem em risco a convivência harmônica entre os diversos povos e comunidades do planeta é certamente o etnocentrismo. Etno o quê? Etnocentrismo é a atitude do indivíduo em valorizar somente as coisas ligadas à raça a qual ele pertence, ou seja, à sua etnia, desprezando os valores e a visão do mundo de povos que agem diferentemente do seu. O etnocentrismo tem levado a confrontos sangrentos árabes e judeus, brancos e indígenas, e tantas outros grupos étnicos conflitantes. Como muito bem declarou o Papa João XXIII, “a integração é a harmonia dos desiguais”, portanto, caso o homem queira mesmo viver em um mundo globalizado, ele vai precisar urgentemente aprender a conviver com o “outro” em sua infinita “diferença”. O etnocentrismo sempre fez com que o branco tratasse o indígena de maneira inferior, relegando-o à condição de selvagem, em todos os aspectos. Ora, inicialmente, selvagem só quer dizer aquele que vive nas selvas. Mas por extensão, o branco deu à palavra um caráter de autoritária depreciação que acabou por contaminar outros sinônimos do termo. Basta lembrarmos que, para nós, um evento mal sucedido tornou-se “um programa de índio”. 8PDOLomRVHOYDJHP 13 Dizem os brancos que os indígenas são ingênuos e ignorantes, dando muita importância ao pensamento mágico e mítico que rege as culturas primitivas. No entanto, podemos parar um pouco e pensar que o pensamento racionalista, científico, do homem branco, tem nos ajudado a evoluir e a progredir em todos os terrenos da atuação humana, mas, no entanto, ele com certeza, não pode garantir nossa sobrevivência como espécie. A mesma razão “branca” que descobre a cura das doenças e calcula a idade do universo, também produz a bomba atômica e devasta o meio-ambiente. Sendo assim, seria muito bom que o homem pudesse voltar-se, de vez em quando, às lições de povos que pensam e agem de maneira radicalmente diferente da sua. Uma das lições mais brilhantes de um habitante da floresta foi recolhida pelo francês Jean de Léry, no século XVI, de um velho índio tupinambá. O índio e seus companheiros intrigavam-se com a intensa divisão do trabalho existente entre os colonizadores, não entendendo como as coisas que usavam não eram produzidas por eles próprios. Para um índio, cada um fabrica as coisas que usa e, de modo geral, todos fazem de tudo. Outra divergência estava na finalidade do trabalho. As sociedades indígenas recusavam o trabalho excessivo, não por incapacidade ou indolência, mas por considerá-lo inútil. Sem a ambição do branco em dedicar-se ao acúmulo de riquezas, eles limitavam-se a satisfazer suas necessidades pessoais, vivendo felizes desta maneira. O índio, trabalhava para viver, o branco parecia viver para trabalhar. Por isso, os índios não entendiam por que o colonizador vinha de tão longe para tirar tanta madeira da floresta. “- Os nossos tupinambás muito se admiram de os franceses e outros estrangeiros se darem ao trabalho de ir buscar o seu arabutã. Por quê vindes vós outros, maíres e perôs (franceses e portugueses), buscar lenha de tão longe para vos aquecer? Não tendes madeira em vossa terra? Seria pra levá-la a algum deus? Respondi que tínhamos muita, mas não daquela qualidade, e que não a queimávamos, como ele o supunha, mas dela extraímos tinta para tingir, tal qual o faziam eles com os seus cordões de algodão e suas plumas. Retrucou o velho imediatamente: - E porventura precisais de muito? - Sim - respondi-lhe - pois no nosso país existem negociantes que possuem mais panos, tesouras, espelhos e outras mercadorias do que podeis imaginar e um só deles compra todo o pau-brasil com que muitos navios voltam carregados. 14 - Ah! - retrucou o selvagem - tu me contas maravilhas - acrescentando depois de bem compreender o que eu lhe dissera - Mas esse homem tão rico de que me falas não morre? - Sim - disse eu - morre como os outros. Mas os selvagens são grandes discursadores e costumam ir em qualquer assunto até o fim, por isso perguntou-me de novo: - E quando morrem para quem fica o que deixam? - Para seus filhos, se os têm - respondi - na falta destes, para os irmãos ou parentes mais próximos. - Na verdade - continuou o velho, que, como vereis, não era nenhum tolo - agora vejo que vós outros maíres sois grandes loucos, pois atravessam o mar e sofreis grandes incômodos, como dizeis quando aqui chegais, e trabalhais tanto para amontoar riquezas para vossos filhos ou para aqueles que vos sobrevivem! Não será a terra que vos nutriu suficiente para alimentá-los também? Temos pais, mães e filhos a quem amamos; mas estamos certos de que depois de nossa morte a terra que nos nutriu também os nutrirá, por isso descansamos sem maiores cuidados.” )DWRVTXHVHUHSHWHPOLo}HVTXHQmRVHDSUHQGHP O brilhante raciocínio tecido pelo velho índio tupinambá no tópico acima demonstra como, às vezes, somos preconceituosos com as raças ou etnias diferentes das nossas, achando simplesmente que elas não têm o mesmo nível de civilidade que nós. Mas para deixar ainda mais clara a idéia de que os indígenas também refletem, filosofam e deliberam sobre assuntos de grave importância para a humanidade, vamos recorrer a outro testemunho precioso. O ano é 1854 e o país agora são os Estados Unidos. O presidente americano fez a uma tribo indígena a proposta de comprar grande parte de suas terras, oferecendo, em contrapartida, a concessão de uma outra “reserva”. O texto da resposta do chefe Seatte, distribuído pela ONU (Programa para o Meio Ambiente) tem sido considerado, através dos tempos, como um dos mais belos, profundos e poéticos pronunciamentos já feitos a respeito da defesa do meio ambiente. “Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra? Essa idéia nos parece estranha. Se não possuirmos o frescor do ar e o brilho da água, como é possível comprá-los? 15 Cada pedaço desta terra é sagrado para o meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada punhado de areia das praias, a penumbra na floresta, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados na memória e experiência de meu povo. A seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho. Os mortos do homem branco esquecem sua terra de origem quando vão caminhar entre as estrelas. Nossos mortos jamais esquecem esta bela terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs: o cervo, o cavalo, a grande águia, são nossos irmãos. Os picos radiosos, os sulcos úmidos das campinas, o calor do potro, e o homem - todos pertencem à mesma família. Portanto, quando o Grande Chefe em Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, pede muito de nós. O Grande Chefe diz que nos reservará um lugar onde possamos viver satisfeitos. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, nós vamos considerar sua oferta de comprar nossa terra. Mas isso não será fácil. Essa terra é sagrada para nós. Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhe vendemos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada, e devem ensinar às suas crianças que ela é sagrada e que cada reflexo nas águas límpidas dos lagos fala dos acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz de meus ancestrais. Os rios são nossos irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem lembrar-se de ensinar a seus filhos que os rios são nosso irmãos, e seus também. E, portanto, vocês devem dar aos rios a bondade que dedicariam a qualquer irmão. Sabemos que o homem branco não compreende nossos costumes. Uma porção de terra, para ele, tem o mesmo significado que qualquer outra, pois é um forasteiro que vem à noite e extrai da terra aquilo de que necessita. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, e túmulos de seus antepassados e não se incomoda. Rapta da terra aquilo que seria de seus filhos e não se importa. A sepultura de seu pai e o direito de seus filhos são esquecidos. Trata sua mãe, a terra, e seu irmão, o céu, como coisas que possam ser compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou enfeites coloridos. Seu apetite devorará a terra, deixando somente um deserto. Eu não sei, nossos costumes são diferentes dos seus. A visão de suas cidades fere os olhos do homem vermelho. Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreenda. 16 Não há lugar quieto nas cidades do homem branco. Nenhum lugar onde se possa ouvir o desabrochar de folhas na primavera ou o bater das asas de um inseto. Mas, talvez, seja porque eu sou um selvagem e não compreendo. O ruído parece somente insultar os ouvidos. E o que resta da vida se o homem não pode ouvir o choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite? Eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento encrespando a face do lago, e o próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros. O ar é preciso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo sopro - o animal, a árvore, o homem, todos compartilham o mesmo sopro. Parece que o homem branco não sente o ar que respira. Como um homem agonizante há vários dias, é insensível ao mau cheiro. Mas se vendermos nossa terra ao homem branco, ele deve lembrar que o ar é precioso para nós, que o ar compartilha seu espírito com toda a vida que mantém. O vento que deu a nosso avô seu primeiro inspirar também recebe seu último suspiro. Se lhe vendermos nossa terra, vocês devem mantê-la intacta e sagrada, como um lugar onde até mesmo o homem branco possa ir saborear o vento açucarado pelas flores dos prados. Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de comprar nossa terra. Se decidirmos aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo qualquer outra forma de agir. Vi um milhar de búfalos apodrecendo na planície, abandonados pelo homem branco que os alvejou de um trem ao passar. Eu sou um selvagem e não compreendo como é que o fumegante cavalo de ferro pode ser mais importante que o búfalo, que sacrificamos somente para permanecer vivos. O que é o homem sem os animais? Se todos os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontece com o homem. Há uma ligação em tudo. Vocês devem ensinar às suas crianças que o solo a seus pés é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam a seus filhos que ela foi enriquecida com as vidas de nosso povo. Ensinem às suas crianças o que ensinamos às nossas, que a terra é nossa mãe. Tudo o que acontecer à terra, acontecerá aos filhos da terra. Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos. Isto sabemos: a terra não pertence ao homem: o homem pertence à terra. Isto sabemos: todas as coisas estão ligadas como o sangue que une uma família. Há uma ligação em tudo. 17 O que ocorrer com a terra recairá sobre os filhos da terra. O homem não tramou o tecido da vida: ele é simplesmente um de seus fios. Tudo o que fizer ao tecido, fará a si mesmo. Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala com ele de amigo para amigo, não pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de tudo. Veremos. De uma coisa estamos certos - e o homem branco poderá vir a descobrir um dia: nosso Deus é o mesmo Deus. Vocês podem pensar que O possuem, como desejam possuir nossa terra: mas não é possível. Ele é o Deus do homem, e Sua compaixão é igual para o homem vermelho e para o homem branco. A terra lhe é preciosa, e feri-la é desprezar seu criador. Os brancos também passarão; talvez mais cedo que todas as outras tribos. Contaminem suas camas, e uma noite serão sufocados pelos próprios dejetos. Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do Deus que os trouxe a esta terra e por alguma razão especial lhes deu o domínio sobre a terra e sobre o homem vermelho. Esse é um mistério para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos sejam exterminados, os cavalos bravios sejam todos domados, os recantos secretos da floresta densa impregnados do cheiro de muitos homens, e a visão dos morros obstruída por fios que falam. Onde está o arvoredo? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. É o final da vida e o início da sobrevivência. (Tradução de Irina O. Bunning) 3$8%5$6,/0,/(80$87,/,'$'(6" ,Q~WLOSDLVDJHP" Talvez um dos maiores vícios da espécie humana seja querer atribuir uma função essencialmente prática a tudo o que a rodeia. De todos os elementos, o homem precisa extrair uma utilidade imediata, mecânica. Com a natureza, não é diferente. Seria tão bom se, em alguns casos, o homem abandonasse um pouco esta postura, deixando plantas, rios, animais etc., vivendo em sua “semiose natural”. Semiose natural é o estado em que a natureza vive em sua função primordial: de existência pura e simplesmente. 18 Tal estado é interrompido pelo homem quando ele resolve interferir no curso natural das coisas. Por exemplo: um rio está lá “na dele”, brotando de uma nascente, percorrendo matas, alimentando diversas espécies, abrigando outras tantas, tudo “numa boa”, sem sequer saber que é chamado de “rio”. Então vem o homem, este “pioneiro”, e resolve interferir na vida do rio: suja suas águas, rouba-lhe seus habitantes, altera seu curso até. Pronto! Mais uma inocência natural perdida! (YROXLUVHPSUHGHVWUXLUMDPDLV Convém sempre lembrarmos que a postura de quem defende a natureza não implica assumir uma posição retrógrada, ultrapassada, para a qual todo progresso é um mal em si. Se assim fosse, os ecologistas estariam defendendo a idéia de que o homem jamais deveria ter saído do estágio mais primitivo de seu desenvolvimento. Ora, ninguém é louco para compartilhar desta idéia! O que ecologistas e pessoas de bom senso de maneira geral estão sempre defendendo é que evolução não precisa combinar com destruição. A economia deve viver em harmonia com a ecologia. É o que se chama de “manejo sustentado”. Pense nisso! 'DPDGHLUDDRFRUDQWH Ao lado de sua função natural - fazer parte de determinado sistema ecológico - para o homem, o pau-brasil passou a ser alvo de outras utilidades, desta vez, de caráter cultural. Inicialmente, todos sabemos que o pau-brasil foi utilizado na fabricação de um corante denominado “brasilina”, outrora muito usado para tingir tecidos e fabricar tinta de escrever. A madeira do pau-brasil é dura e muito pesada (1 a 1,1 gramas por centímetro cúbico). O alburno (parte do caule) é claro e o cerne vermelho-laranja vivo, com acentuado brilho dourado quando porém cortado, escurecendo com o tempo, para castanho escuro avermelhado. Esse cerne é que contém a “brasilina” que, em contato com a água levemente oleada, se transforma em vermelho vivo, sendo comumente usada nas tinturarias até a descoberta dos produtos químicos . Mas você sabe exatamente como extrair desta madeira a famosa tinta avermelhada? 19 &RPRH[WUDLUGRSDXEUDVLOVXDWLQWDFRUDQWH A parte de extração do corante do pau-brasil é a serragem do cerne. E a cor que dele se extrai é o vermelho ou o rosa. Vamos à receita: • Quantidade. Junte 500 g de serragem para cada kg de fibras. • Tratamento Coloque a serragem em um balde com 7 litros de água na temperatura ambiente. Acrescente uma colher de sopa (10 ml) de amoníaco. Misture bem e deixe de molho por uma noite. • Tingimento Ferva por uma hora em tacho de cobre. Coe separando a serragem da tintura. Mergulhe as meadas. Cozinhe por 1 hora a 90º C. Retire as meadas e coloque-as à sombra para tomar ar por um dia. Retorne ao banho e cozinhe por mais 30 minutos. Enxagüe em água corrente. Observação: Repita a operação de tomar ar e retornar ao banho quantas vezes forem necessárias, até atingir a cor desejada. 3DXSUDWRGDREUD Além da tinta corante, o pau-brasil também foi muito utilizado na construção naval, na construção civil e em trabalhos de torno em marcenaria de luxo. Mas não se preocupe, não iremos ensiná-lo a construir um navio, uma casa ou um guarda-roupa! Mesmo porque na atualidade, a madeira é basicamente utilizada para a confecção de arcos de violino. 03%0~VLFDGRSDXEUDVLO 20 Com esta é impossível não filosofar um pouquinho. Quem diria: um país extremamente musical tem como nome de batismo (versão que cai como uma luva neste raciocínio) uma madeira da qual se extrai música! Estava escrito! Somos brasileiros e musicais, brasileira e musicalmente enraízados. Abstrações filosóficas à parte, vamos aos fatos concretos. Segundo dados históricos, coube a um gênio projetista francês do século XVIII, François Tourte, a criação do arco de violino a partir da madeira considerada a ideal - o pau-brasil - conhecido na França também como “Fernambouc”, uma corruptela de Pernambuco. Mas aqui, toda a elevação espititual que o som de um violino pode suscitar fica bastante comprometida quando se sabe que tanto não se fazem omeletes sem se quebrarem os ovos, quanto não se fazem arcos de violino sem se derrubarem árvores. Os dados a respeito do uso do pau-brasil na confecção de arcos de violino são bastante incompletos. Não existem números confiáveis sobre a quantidade de madeira exportada para este propósito e quanto se gasta de madeira para se fazer um arco. Negociantes de madeira relutam em divulgar estas informações, mas estima-se que anualmente negociam-se 200 metros cúbicos, embora este número possa aumentar, pois muita madeira é gasta no processo de fabricação dos arcos. (Um arco de violino típico requer o uso de 1 kg de madeira). O preço dos arcos varia de 2 mil a 5 mil dólares, sendo que nos Estados Unidos a média é maior do que na Europa. Existem poucos negociantes que importam a madeira para a Europa e para os EUA (três ou quatro comerciantes nestas localidades) e eles também suprem a demanda asiática do produto. A estimativa no número de profissionais que confeccionam arcos de violino varia mas a 7KH 6WUDG 'LUHFWRU\ (uma lista dos maiores confeccionadores e vendedores de arcos de violino do mundo) calcula mais de 250 nomes, entre pessoas e empresas. Imagina-se que existam no mundo cerca de 700 profissionais envolvidos na confecção dos arcos, sendo a grande maioria residente nos Estados Unidos, embora na Alemanha e na China haja um significativo número deles. No entanto, nem todos usam o pau-brasil. Na China, por exemplo, são usadas madeiras locais como a “Beech Fagus sp.” e no Brasil, alguns utilizam-se de uma espécie amazônica que, embora resulte em arcos de menor qualidade, serve bem aos propósitos de estudantes de violino. Um pequeno número de empresas está fabricando arcos com fibra de carbono, mas muitos músicos relutam em usá-los. A maioria dos confeccionadores de arcos trabalha sozinha e produz, no máximo, cerca de 50 arcos por ano, mas muitas empresas empregam de 10 a 21 20 pessoas, aumentando a produção especializada em arcos mais baratos para estudantes do instrumento. A maior produtora da Europa, por exemplo, é uma companhia suíça que vem fabricando 3000 arcos por ano, nos últimos 25 anos. Cerca de 75% dos arcos europeus são confeccionados por mais ou menos 10 oficinas da Alemanha, França e Suíça. Muito da madeira é processada no Brasil, reduzindo as toras brutas em cerca de um 1/4. Esforços são feitos para garantir a obtenção de pranchas com textura lisa, sem nós ou fendas. As pranchas são então exportadas e vendidas aos clientes que as armazenam para secagem. Depois, então, elas são cortadas em forma de arco, moldadas nas formas requeridas e secas novamente. Algumas companhias no Brasil já cortam a madeira diretamente em forma de arco para exportação. O que deve ser cobrado das autoridades competentes é uma rigorosa vigilância sobre essa indústria, a fim de evitarem abusos que levem a novos desastres ecológicos. Caso contrário, cada vez que um arco de violino no mundo fizer gemer o instrumento, seremos forçados a nele reconhecer o grito lancinante de um pau-brasil caindo ao chão, indefeso! 3$8%5$6,/80$+,67Ï5,$'(08,7$6&85,26,'$'(6 Esta seção bem que poderia se chamar Você sabia quê?”, pois são inúmeras as curiosidades que cercam a história de nossa madeira. Muito bem, prepare seu espírito fofoqueiro e vamos bisbilhotar um pouco a vida da velha senhora &DHVDOSLQLD • “Brasileiros”, inicialmente, eram chamados os negociantes da madeira vermelha, mas, dada a importância do pau-brasil, a denominação logo passou a abranger, igualmente, a todos os habitantes da nova terra. • Embora sem comprovação efetiva, prevalece entre pesquisadores a convicção de que a própria nau que levou a notícia do descobrimento a D. Manuel houvesse carregado toros de pau-brasil. • Na Holanda do século XVI, a população carcerária não devia querer ouvir falar em pau-brasil. Sabe por quê? Lá, as toras eram reduzidas a pequenos 22 fragmentos e raspas pelos presos nas casas de detenção e, nesse estado, entregues às tinturarias. • Pau-brasil: um nome em cada porto Nos países de língua francesa, ele é chamado de Bois de Brésil e de Bresillet de Pernambuco. Nos países de língua inglesa, ele é conhecido por Brazil-wood, Pernambuco-wood, Lima-wood, Nicarágua-wood, peach-wood, sapam-wood ou bukkum-wood. Na Argentina, o chamam de pinango. Na Índia, de sapam. E na Espanha, seus nomes são palo Brazil ou palo de Santa Marta. • A respeito de sua vasta lista de nomes, vale lembrar que o pau-brasil original mesmo, o legítimo, existe em uma única espécie no Brasil. O também famoso sapam, de origem indiana, apesar de muito parecido com o pau-brasil, é um gênero de uma família diferente da &DHVDOSLQLD. Portanto chamar um sapam de pau-brasil ou vice-versa constitui-se em uma tremenda gafe botânica! • O famoso naturalista Von Martius em sua “Viagem pelo Brasil” escreveu: “Numerosas como sejam essas plantas na América (as leguminosas) entretanto só raras vezes o olhar se depara com elas em conjunto, pois não são sociáveis e crescem separadas no meio de outras. Será erro crer que no Brasil se possam encontrar matas inteiras do nobre pau de tinturaria (...) Ele cresce isolado entre os mais diversos vizinhos na mata virgem”. • Especialistas em química e em medicina da Universidade Federal de Pernambuco estão realizando experimentos com o princípio ativo extraído do pau-brasil a fim de investigarem sua ação anti-neoplásica, ou seja, sua eficiência no combate a certos tipos de tumor. Em algumas aplicações em ratos, a substância conseguiu propiciar a inibição do tumor em até 87%. • A exploração predatória do pau-brasil foi assim descrita por um viajante do século XVI: “Quanto ao meio de carregar essa mercadoria [o pau-brasil], direi que, tanto por causa da dureza e conseqüente dificuldade em derrubá-la, é ela arrastada por meio de muitos homens; e se os estrangeiros que por aí viajam 23 não fossem ajudados pelos selvagens não poderiam sequer em um ano carregar um navio de tamanho médio. Os selvagens, em troca de algumas roupas, chapéus, facas, machados (...) cortam, serram, racham, atoram e desbastam o pau-brasil, transportando-o nos ombros nus às vezes de 2 a 3 léguas (de 13 a 20 quilômetros) por sítios escabrosos, até a costa junto aos navios ancorados, onde os marinheiros o recebem.” (Jean de Lery - Viagem à Terra do Brasil - 1557) • Pau-brasil: essa metamorfose ambulante A planta contém uma substância de nome brasilina que, quando entra em contato com o ar, se transforma rapidamente em uma substância carmesim usada como corante. A brasilina tem como característica apresentar mudanças de coloração dependendo do pH do banho do tingimento. Em meio ácido, com o mordente alúmen, produz uma cor rosa salmão; em meio alcalino, na presença de cobre, por oxidação do ar, pode chegar a um vermelho terra. • Por se tratar de um instrumento muito delicado, o arco de violino deve ser feito a partir de uma madeira flexível como o pau-brasil, sem nós e serrada de modo que as fibras acompanhem sua curvatura. Essa exigência limita o aproveitamento industrial a apenas 15% da tora. • Depois de serrada em pedaços de um metro por 12 milímetros de espessura, a madeira, futuro arco de violino, recebe uma camada de parafina para evitar a secagem e a rachadura que a inutilizariam. • Vejamos agora um exemplo de absoluta falta de consciência ecológica. Perguntado, certa vez, porque em um reflorestamento obrigatório por lei, plantou muito mais eucalipto do que pau-brasil, um grande negociante da madeira, do Espírito Santo, respondeu: “Eucalipto cresce rapidamente, enquanto o pau-brasil leva 100 anos para tornar-se uma árvore de corte. Por que, então, vou plantar uma coisa que nem meus filhos vão ver?” Confronte tal raciocínio com o do chefe Seattle. E aí? Quem é mesmo mais civilizado? • Nem tudo o que é bom pra Metrópole... O pau-brasil foi uma das árvores mais cobiçadas pelos europeus, após o descobrimento. Mas não eram só os europeus que o queriam: os habitantes da Capitania de Porto Seguro queriam aproveitá-la, mas Portugal não deixava ela era monopólio da “Coroa”, de acordo com um decreto de D. Manuel. 24 • O pau-brasil é coisa nossa! Diogo de Campos Moreno, a quem se atribui o “Livro que dá razão do Estado do Brasil”, defendeu o corte de pau-brasil pelos habitantes da Capitania de Porto Seguro que, para ele, seria o único “remédio” para diminuir um pouco a penúria em que a população vivia. • Primeira exportação: 5 mil toras Segundos fontes históricas, em 1511, Portugal importou pau-brasil, isto é, mandou cortar cinco mil toras da madeira, embarcando-as na nau Bretoa para Lisboa. Isso atiçou a cobiça de outros países, principalmente a França. • Je t’aime, pau-brasil Os franceses chegaram com uma expedição ao rio Doce onde os nativos tentaram convencê-los a desembarcar, com a condição de que ajudariam a cortar e carregar a madeira na nau. Os franceses não acreditaram: se aceitassem, seriam facilmente dominados e talvez comidos. Em 1558, outra nau francesa apareceu, desta vez em Itapemirim, na Capitania do Espírito Santo. Não teve tanta sorte: os tripulantes desceram, foram combatidos e vinte deles presos. Portugal chegou a fortificar Porto Seguro para rechaçar os invasores. • O pau-brasil e a pena de morte! Em 1775, a punição para quem cortasse pau-brasil ia do confisco dos bens até a pena de morte. Apesar disso, no Espírito Santo, ele era vendido a 240 réis o quintal. “Quintal” era a unidade de medida de peso vigente na época, equivalente a aproximadamente 60 quilos. • Em busca do tempo perdido Se quisesse renovar as antigas florestas, o Brasil precisaria de mais de 100 anos! • Coisas do arco da velha! No final da década de 70, um grande madeireiro capixaba afirmou: “Dos sete violinos Stradvarius que existem no mundo, conheci dois, um em Milão e outro em Paris, com arcos feitos de pau-brasil, numa época em que o país não havia sido descoberto. Há registros também de violinos europeus menos famosos, datados da Idade Média, com arcos fabricados em paubrasil.” 25 • Durante excursão que realizou pela “costa do pau-brasil”, em 1981, o botânico Francismar Francisco Alves Aguiar encontrou vários povoados com o nome de Pau-brasil. • A 100 km de Vitória (Espírito Santo) está localizado um dos povoados brasileiros com o nome de Pau-brasil. Ironicamente, lá a madeira está extinta, ficando o lugarejo localizado justamente em meio a uma espessa floresta de eucaliptos. • “Eu mesmo nunca vi pau-brasil, nem sei pra que serve.” e “A professora nunca me falou dele.” são frases recolhidas entre os habitantes de Paubrasil (ES), no início da década de 80. • O viajante Saint-Hilare, no século XIX, assim descreveu o desmatamento de que foi testemunha no mesmo local em que hoje se situa o miserável povoado de Pau-brasil : “Na época de minha viagem (1816 a 1822), já tinham vindo arrancar as raízes, depois de haver cortado todas as árvores.” • Na opinião do professor João Vasconcelos Sobrinho, a intensa e contínua exploração do pau-brasil pelos portugueses, associada à dos franceses, holandeses, ingleses e espanhóis, no período de 1500 a 1875, possivelmente tenha sido a causa do processo de desertificação do Nordeste. • Apesar da quase certeza da extinção do pau-brasil, em 1928, o então estudante de agronomia João Vasconcelos Sobrinho e o professor de botânica Bento Pickel, num local chamado Engenho São Bento, hoje sede da Estação Ecológica da Tapacurá da Universidade Federal Rural de Pernambuco, verificaram a presença de uma árvore de pau-brasil, eliminando qualquer dúvida sobre a sua extinção ainda em nossas matas. • Alguns historiadores registram como tendo sido efetuado em 1875 o último embarque de pau-brasil para a Europa. Mas a extinção efetiva desse comércio foi alcançada já em pleno século XIX, resultado do progresso registrado pela ciência e pela indústria, sobretudo no setor químico: a descoberta de anilinas extraídas da ulha, de fabricação mais econômica e de melhor qualidade, substitui o uso do lenho tintorial e, com isso, findou-se a “primeira forma de atividade econômica do Brasil”. 26 • Não há registros da existência do pau-brasil no sul do país e nem sequer na Amazônia. Não há referência dele nessas regiões nem mesmo pelos índios que as habitavam. • Os naturalistas Piso e Marcgravena registraram o pau-brasil com o nome tupi de Ibirapitanga na “História Naturalis Brasiliae”, em 1649. Dele também se ocuparam vários cientistas de renome como Velosso, Sprengel e Voguel. • Os historiadores são unânimes em afirmar que o primeiro ciclo da história econômica do Brasil foi o do pau-brasil. “Por este modo se tem feito muitos homens ricos” afirmou o historiador Brandônio. O ciclo do pau-brasil encerrou-se em 1875. Ou seja, foram ao todo 374 anos de exploração predatória. • Botanicamente, só existe uma espécie de pau-brasil, conhecida por &DHVDOSLQLD HFKLQDWD /DP embora outras espécies de árvores sejam erroneamente chamadas de pau-brasil, simplesmente por apresentar algumas semelhanças com a planta verdadeira. São, assim, os chamados falsos paus-brasil. Dentro da espécie &DHVDOSLQLD HFKLQDWD o que pode ocorrer são variedades ou raças geográficas que apresentam pequenas diferenças morfológicas na forma e na quantidade de acúleos (espinhos) e no tamanho dos folíolos e pinas (parte das folhas). Atualmente algumas pesquisas estão sendo realizadas no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, na Ceplac (BA) e na Embrapa (DF) em vistas de esclarecer essas controvérsias. • Como se produzem as mudas do pau-brasil? As vagens (frutos das leguminosas), contendo de 1 a 3 sementes, devem ser colhidas diretamente da árvore antes que se abram. O ponto ideal de coleta é quando os frutos estão mudando de coloração de verde para marrom (castanho). As vagens colhidas devem ser colocadas para secar ao sol por 1 ou 2 dias, tomando-se o cuidado de cobri-las com uma tela para evitar que, durante o processo de abertura das vagens, as sementes sejam atiradas para longe. Uma vez secas, as sementes podem ser semeadas tanto em canteiros como diretamente em recipientes individuais. No caso dos canteiros, a repicagem (transplante) das mudinhas para sacos individuais logo nas primeiras semanas após a germinação. O substrato tanto do canteiro quanto dos sacos deve ser terra de boa qualidade ou a mistura de 1 27 parte de esterco de curral bem curtido, 1 parte de areia e 2 partes de terra argilosa. O local do viveiro pode ser a pleno sol ou a meia sombra. O importante é manter a sementeira e as mudinhas sempre úmidas, porém sem encharcamento. Geralmente uma ou duas regas por dia é o suficiente. As sementes de boa qualidade e recém-colhidas normalmente germinam após o 4º ou 5º dia de semeadura e a porcentagem de germinação costuma ser alta, acima de 80%, podendo mesmo a chegar a 100%. As mudas crescem dos primeiros 6 a 12 meses cerca de 30 cm de altura. O desenvolvimento das plantas no campo, quando conduzidas adequadamente, é considerado moderado, cerca de 70 cm a 1 m em altura por ano e 1 cm em diâmetro. /(*,6/$d280',5(,72'$)/25(67$ 3DXEUDVLOHVVHIRUDGDOHL Um dos grandes males da civilização brasileira é o histórico desrespeito às leis, praticado tanto por nossos governantes quanto pelo próprio povo. Somos tragicamente uma nação fora-da-lei. Estamos sempre às voltas com atitudes ilegais, ilegítimas, legislando em causa própria, quando o melhor seria abraçarmos as grandes causas coletivas. No terreno da defesa do meio ambiente, não tem sido diferente. Há leis, mas o que acontece àqueles que as desrespeitam? Pouco. Muito pouco. Quase nada. Nada! Neste capítulo iremos tratar brevemente da história da legislação brasileira sobre o pau-brasil. Uma história de decretos bem intencionados tanto quanto inúteis. ([FHVVRHSXQLomR" Em 1542, a Coroa Portuguesa elaborou a 1ª Carta Régia que estabelecia normas disciplinares para o corte de pau-brasil e determinava punição ao desperdício de madeira nas regiões conquistadas. Esta foi a primeira medida, tomada pela coroa portuguesa em defesa das florestas, embora indiretamente, pois este interesse não foi despertado pela sensibilidade ao ameaçado 28 equilíbrio da natureza, mas pela evasão dessa riqueza sem controle da corte. As normas, porém, jamais foram cumpridas. /HLHFROyJLFDRXOHLGHPHUFDGR" Em 1605, Felipe II (III de Espanha) baixa o “Regimento do Pau-brasil”, fixando a exploração em 600 toneladas por ano, com o objetivo apenas de limitar a oferta de madeira no mercado europeu, e manter preços elevados. No final do século XVIII, a legislação sobre madeiras passou a ser freqüente. 0DGHLUDVGHOHL No Brasil Império, muitas outras proibições surgiram sem resultados, entre elas a Carta de Lei de outubro de 1827 delegando poderes aos juízes de paz das províncias na fiscalização das matas e na interdição de corte das madeiras de construção em geral; daí a popular terminologia madeiras de lei. Surgem leis criminais estabelecendo penas ao corte ilegal de madeiras, porém sem êxito. Mesmo a lei nº 601, em 1850 editada por D. Pedro II, proibindo a exploração florestal em terras descobertas, com fiscalização a cargo do município, foi ignorada. Justificava-se o desmatamento como necessário ao progresso da agricultura, instalando-se vastas monoculturas cafeeiras para alimentar o mercado de exportação. Recorria-se para esse desmatamento ao meio mais barato: o fogo. ,]DEHODSULQFHVDTXHOLEHURXJHUDO Na tentativa de controlar o desmatamento, em 1872, a Princesa Izabel, regente, autorizou o funcionamento da primeira companhia privada especializada em corte de madeira, mas em 1875 liberou totalmente de licença prévia qualquer corte de madeira nas matas particulares. 3UHFLVDVHGHFyGLJRIORUHVWDO7UDWDUDTXL O avanço desenfreado do homem, na sua voracidade extrativista, provocou, no fim deste período, a escassez do pau-brasil e de outras madeiras 29 de lei nas matas litorâneas, sendo muitas destas eliminadas para dar lugar à cultura canavieira. A exuberância das matas na orla litorânea e proximidades reduziu-se muito, e com o seu mártir maior, o pau-brasil quase extinto, iniciava-se em 1875 o período de abandono. Este abandono, não só do paubrasil mas de proteção à flora nacional avançou pelo período republicano; a espécie praticamente foi considerada extinta. Neste período o presidente Epitácio Pessoa, em 1920, preocupado com a preservação e restauração de matas, disse: “dos países cultos dotados de matas e ricas florestas, o Brasil é talvez o único que não possui um código florestal.” ,QFRQVWLWXFLRQDOLVVLPDPHQWH Assim, em 1921, apesar de criado o serviço florestal com regularização em 1925, ele não tinha respaldo na constituição de 1891, pois nela nada constava sobre matas ou sobre a própria palavra árvore, continuando o paubrasil relegado ao esquecimento, e as matas abandonadas. 'RSULPHLURFyGLJRIORUHVWDODJHQWHQXQFDHVTXHFH" Em 1934, um anteprojeto do Código Florestal de 1931, pelo decreto nº 23.793 foi transformado em lei, em defesa das florestas e matas particulares. O resultado pioneiro deste projeto foi a criação do Parque Nacional de Itatiaia, a primeira unidade de conservação no Brasil. Mesmo a existência de um Código Florestal não assegurava a total proteção dos remanescentes naturais do pau-brasil, que se estendiam do Rio de Janeiro ao Rio Grande do Norte. $iUYRUHTXHIDOWRXjFHULP{QLDGHVXDSUHPLDomR Em 1961, o presidente Jânio Quadros aprova um projeto enviando mensagem à Câmara, declarando o pau-brasil como árvore símbolo nacional, e o ipê, como flor símbolo nacional. Um substituto do projeto nº 1006, de 1972, por meio da lei nº 6607 de 7/12/78, declara o pau-brasil a Árvore Nacional, e institui o dia 3 de maio como o dia do pau-brasil. 30 $35(6(59$d2'23$8%5$6,/ 3UHVHUYHRTXHpVHX Apesar de toda devastação e truculência perpetradas contra nossa árvore símbolo, de tempos em tempos, surgem iniciativas que, se não irão garantir a perenidade da espécie, ao menos retardarão significativamente seu completo desaparecimento por sobre o solo da nação brasileira. Essas iniciativas têm de ser sempre comunicadas ao grande público a fim de vermos cada vez mais expandida nossa incipiente consciência ecológica. Vejamos alguns casos bem sucedidos de preservação do pau-brasil. )XQGDomR1DFLRQDOGR3DXEUDVLO3( Em 1972, um grupo de professores liderados pelo professor Roldão Siqueira Fontes obteve o apoio da direção da Universidade Federal Rural de Pernambuco (sede da Estação Ecológica do Tapacurá) para juntos lançarem uma campanha nacional em defesa do pau-brasil. Essa campanha recuperou a memória histórica do pau-brasil, desencadeando a iniciativa da produção e distribuição de mudas em todo território nacional. A campanha de divulgação lançada pela UFRPE incentivou cultivos ornamentais e implantações de bosques desta espécie em todo o país. Como exemplo, o Instituto de Botânica de São Paulo implantou um bosque de pau-brasil em sua área de visitação pública, em 1979, e, em 1980, um arboreto experimental na Reserva e Estação Experimental de Mojiguaçu (SP) , com mais de 600 árvores, que hoje estão com mais de 10 metros de altura, com uma produção anual de sementes usadas em pesquisa e produção de mudas. Graças a essa campanha foi criada, em 1988, a Fundação Nacional do Pau-brasil. 0XLWRDOpPGR-DUGLP%RWkQLFR5- Um grupo de pesquisadores do Jardim Botânico do Rio de Janeiro está estudando as características morfológicas e genéticas do pau-brasil, visando detectar possíveis variedades ou novas espécies. O pau-brasil ainda pode ser 31 encontrado desde Ilhabela (litoral norte de São Paulo) até a região de Cabo de Touros (Rio Grande do Norte). O programa do Jardim Botânico pretende subsidiar estudos e programas ambientais para a preservação e o replantio do pau-brasil. A 1ª fase da iniciativa faz parte do Projeto Mata Atlântica do Rio de Janeiro, financiado pela Shell e Fundação McArthur. Essa etapa mapeou cerca de 60 áreas verdes no litoral do estado do Rio onde ainda existem árvores de pau-brasil. Em entrevista ao jornal FSP, o biólogo Haroldo de Lima - idealizador do projeto - declarou que essas regiões do Rio “São pequenas ilhas verdes com áreas de mata com poucos exemplares de pau-brasil, em geral brotos e indivíduos jovens.” Elas se estendem de Pedra de Guaratiba, na cidade do Rio, aos arredores de Barra de São João, no litoral norte fluminense. Na serra da Capoeira, em Pedra de Guaratiba, estima-se que, em cerca de 500 mil m2 de mata, há apenas de 15 a 20 exemplares. Estudos genéticos das espécies estão sendo realizados para definir graus de parentesco entre elas e desenvolver tecnologias para a produção de mudas. ,QVWLWXWR)ORUHVWDO63 No Instituto Florestal, da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo, localizado no Horto da Cantareira, capital, há um bosque de pau-brasil, com cerca de 100 árvores com idade em torno de 30 anos. As sementes obtidas no Horto Florestal, em média de 2 mil anualmente, estão possibilitando a formação de mudas para distribuição em escolas e em praças públicas. 5HVHUYDELROyJLFD%$ No município de Santa Cruz de Cabrália, Bahia, a Comissão Executiva do Plano de Recuperação da Lavoura Cacaueira, órgão do Ministério da Agricultura, implantou uma reserva biológica de pau-brasil, em área de 1.100 hectares, destinada, principalmente à preservação dessa espécie vegetal e à realização de pesquisas objetivando o cultivo de essências nativas na região cacaueira da Bahia. 32 3(53(&7,9$6,$&/21$*(0'$(63e&,( +\%UDVLO+HOOR'ROO\ O que pode haver em comum entre nossa árvore símbolo e aquela ovelhinha de nome Dolly que virou manchete em todos os jornais do mundo há alguns meses. A resposta está na coqueluche científica deste final de século: a engenharia genética. Tal como ocorreu com o material genético de Dolly, nosso pau-brasil está sendo clonado a fim de vermos garantida sua sobrevivência. Vamos conhecer mais de perto este fascinante projeto de recriação da vida vegetal. %DKLDXPSRUWRVHJXURSDUDRSDXEUDVLO Em Porto Seguro, na Bahia, há quatro anos funciona um projeto de clonagem, ou multiplicação de árvores, visando ao repovoamento das áreas degradadas de mata nativa com pau-brasil. Trata-se do %DQFR *HQpWLFR GR 3DXEUDVLO que ocorre numa área de floresta adquirida em 1972 pela Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira) com a finalidade de preservar uma das últimas populações de pau-brasil da região, e que forma a Estação Ecológica do Pau-brasil, com 1.145 hectares. O projeto de recursos genéticos e biotecnologia, da Embrapa, sob a liderança do engenheiro agrônomo, Sérgio da Cruz Coutinho, consiste em localizar, etiquetar e mapear as árvores de pau-brasil existentes na região e, a partir de material coletado nos indivíduos encontrados, fazer clones em laboratório. Uma vez transformados em mudas, esses clones poderão ser replantados nas regiões onde a espécie não existe mais. Coutinho já participou do projeto de plantio de eucaliptos na área do Jari, no Pará e atualmente trabalha na Estação Ecológica do Pau-brasil. Tratase de uma área mantida pela Ceplac, órgão do Ministério da Agricultura que controla o cultivo de cacau, a 15 quilômetros de Porto Seguro. Fazendo divisa com a Estação Ecológica do Pau-brasil, está a Estação Veracruz, um reserva ambiental da Veracel Celulose. Juntas, as duas áreas somam 7.214 hectares de Mata Atlântica, com dezenas de milhares de árvores, mas apenas algumas centenas de pau-brasil. Cada família representa um conjunto de árvores com algum parentesco entre si. 33 'HVFREULQGRRSDXEUDVLO O trabalho de clonagem começa com a demarcação de sítios onde essas famílias estão sendo localizadas. Para encontrar as árvores, o pesquisador se utiliza dos mateiros, grandes conhecedores da floresta, que ajudam na abertura das trilhas, por meio das quais se chega às árvores. É possível que algumas delas sejam ainda da época do descobrimento. Uma vez descobertas as árvores, os mateiros voltam depois ao local com o pesquisador. Com uma bússola, ele marca a exata localização com o objetivo de fazer um mapa. Por meio desse sistema rudimentar, já foram achados 277 exemplares de paubrasil nas duas estações em um ano. $HVFDODGD O passo seguinte é colher ramos da copa dessas árvores. Por ser madeira bastante dura e pesada, mas de diâmetro não muito avantajado, o paubrasil é difícil de escalar. Pesquisadores e mateiros, às vezes, só conseguem colher esses ramos subindo nas árvores vizinhas. Tão árduo é o processo, que Coutinho já pensa em importar um método usado na Austrália: abater a tiros de rifle com mira telescópica os ramos da árvore. 5HSODQWDQGRR%UDVLO Depois de coletados, os ramos são enviados ao laboratório da Embrapa, em Brasília. Ali, os técnicos extraem o DNA, ou material genético das árvores, que permite identificar marcadores familiares destinados a estabelecer o “grau de parentesco”. Isso é necessário para determinar exatamente qual a variação dentro da população de pau-brasil, essencial para garantir chances de sobrevivência da comunidade a longo prazo. A diferença entre as diversas populações é importante para a saúde das plantas porque evita a endogamia - isto é, o resultado de cruzamentos seguidos de parentes próximos, que provoca queda no vigor geral da espécie. Identificando o DNA, é possível fazer a seleção das melhores árvores. No caso do pau-brasil, são aquelas com melhor brasilina. Essa substância, uma vez oxidada, produz a brasileína, corante responsável pela fama da espécie. Também é observada a acústica da madeira, apreciada ainda hoje entre os fabricantes de arcos de violino. A partir das melhores plantas, os 34 pesquisadores fazem um microenxerto LQ YLWUR. Assim que o primeiro broto sai da semente dentro do tubo, injeta-se o material que contém o DNA. Entre 8% e 10% dessas plantas germinam. Brotam o que os técnicos chamam de microestacas, prontas para ser plantadas nos lugares escolhidos. Cada uma delas é clone da árvore original. Embora o processo seja complicado e tenha pouco sucesso, depois de extraídas as microestacas seu enraizamento “pega” em 100% dos casos. Por enquanto, boa parte do processo de clonagem é feita no laboratório de Brasília, mas há outro sendo montado dentro da Estação Pau-brasil. O projeto está estimado em U$ 8,5 milhões para os três primeiros anos e já recebeu aplausos de representantes de entidades ambientalistas. 3(563(&7,9$6,,(67$d2(&2/Ï*,&$'23$8%5$6,/ 3Uy[LPD(VWDomR3DXEUDVLO Em 1969, o presidente da Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza, Dr. José Cândido de Melo Carvalho, sugeriu à Coordenação Técnica da Comissão Executiva do Plano de Lavoura Cacaueira (Ceplac) o estabelecimento de uma reserva biológica nos municípios de Porto Seguro e de Santa Cruz Cabrália (BA), tendo em vista a ocorrência de grande agrupamento natural de pau-brasil. Em setembro daquele ano, foram adquiridas três propriedades à margem da rodovia BR 367, a 16 km da sede daquele município que passaram a formar um conjunto de 1.145 hectares com a denominação de Reserva Biológica do Pau-brasil. Em 1977 passou a ser conhecida por Estação Ecológica do Pau-brasil, assumindo especial importância no contexto nacional, primeiro por ter sido a primeira estação ecológica criada no país e, segundo, por apresentar uma exuberante vegetação de porte arbóreo, um dos últimos maciços florestais remanescentes no leste do Brasil. Objetivos da Estação Ecológica: 1. Conservação permanente das espécies e comunidades representativas da mata do extremo sul da Bahia, mantendo áreas de florestas primárias intactas juntamente com sua fauna; 35 2. Caracterização das principais comunidades vegetais existentes, segundo os aspectos fisionômicos e inventariando as espécies ocorrentes em cada associação; 3. Estudo do crescimento e produção, especialmente das espécies arbóreas da flora regional, identificadas com recursos bióticos potenciais; 4. Estudo do comportamento e aptidões para reflorestamento em maciços homogêneos ou consorciado das espécies valiosas da região, das nativas de outras regiões do Brasil e das exóticas; 5. Estudo da silvicultura e manejo da floresta tropical, e 6. Criação de um banco de sementes e mudas de essências arbóreas. 3(563(&7,9$6,,,80)Ï5803$5$23$8%5$6,/ 2FRQFtOLRGDSUHVHUYDomR Em 1994, a associação Fauna e Flora Internacional (FFI) elegeu o paubrasil como a prioridade de seu programa de promoção da conservação de madeiras usadas na fabricação de instrumentos musicais. Em 1994 e 1995 a companhia musical EMI doou fundos a FFI para iniciar um projeto com organizações brasileiras a respeito do pau-brasil. Um levantamento inicial indicou que havia diversas iniciativas isoladas trabalhando com pesquisas de caráter essencialmente investigativo, mas poucos planos efetivos de preservação da espécie. Então, de um encontro realizado em maio de 1996 entre a FFI, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro e a Fundação Margaret Mee, nasceu a proposta de se realizar um fórum internacional para produzir planos de ação conjunta a fim de se reunirem esforços e recursos materiais e financeiros para a real conservação da árvore símbolo brasileira. O fórum, intitulado “A Conservação do Pau-brasil, &DHVDOSLQLD HFKLQDWD” foi realizado, de 26 a 29 de junho de 1997, em Búzios, estado do Rio de Janeiro. O encontro trouxe ao Brasil especialistas da árvore, grupos que trabalham com a preservação das florestas nativas brasileiras, 36 representantes da indústria de confeccionadores de arcos de violino e da indústria madeireira. O encontro tratou das características biológicas da madeira, das ameaças a ela inflingidas pela devastação das florestas e pelo comércio ilegal e de medidas de proteção e conservação que possam ser adotadas. Ao final do encontro, os participantes produziram um documento intitulado “Conservação e Manejo de Pau-brasil &DHVDOSLQLDHFKLQDWD– Plano de Ação”. 3$8%5$6,/$32(6,$'((;3257$d2 O escritor modernista Oswald de Andrade lançou, em Paris, em 1924, O Manifesto da Poesia Pau-brasil. A relação do manifesto poético com nossa árvore símbolo diz respeito ao fato de ter sido o pau-brasil nosso primeiro produto de exportação, desejando Oswald, então, criar a SULPHLUD SRHVLD GH H[SRUWDomREUDVLOHLUD, a poesia pau-brasil. No manifesto, Oswald atenta a todo instante para o fato de precisarmos estar mais voltados à nossa realidade, vendo o Brasil de “dentro para fora” e não com a visão estereotipada e preconceituosa típica dos colonizadores europeus que por tanto tempo nos dominaram. Tanto quanto nossa primeira riqueza, a poesia pau-brasil pretendia se revestir de um caráter primitivista, que assumisse criticamente os contrastes históricos e culturais a que fomos submetidos. Leia a seguir a íntegra do famoso manifesto: 0$1,)(672'$32(6,$3$8%5$6,/ A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, são fatos estéticos. O Carnaval do Rio é o acontecimento religioso da raça. Pau-brasil. Wagner submerge ante os cordões de Botafogo. Bárbaro e nosso. A formação étnica rica. Riqueza vegetal. O minério. A cozinha. O vatapá, o ouro e a dança. Toda a história bandeirante e a história comercial do Brasil. O lado doutor, o lado citações, o lado autores conhecidos. Comovente. Rui Barbosa: uma cartola na Senegâmbia. Tudo revertendo em riqueza. A riqueza dos 37 bailes e das frases feitas. Negras de jockey. Odaliscas no Catumbi. Falar difícil. O lado doutor. Fatalidade do primeiro branco aportado e dominando politicamente as selvas selvagens. O bacharel. Não podemos deixar de ser doutos. Doutores. País de dores anônimas, de doutores anônimos. O Império foi assim. Eruditamos tudo. Esquecemos o gavião de penacho. A nunca exportação de poesia. A poesia anda oculta nos cipós maliciosos da sabedoria. Nas lianas da saudade universitária. Mas houve um estouro nos aprendimentos. Os homens que sabiam tudo se deformaram como borrachas sopradas. Rebentaram. A volta à especialização. Filósofos fazendo filosofia, críticos, crítica, donas de casa tratando de cozinha. A Poesia para os poetas. Alegria dos que não sabem e descobrem. Tinha havido a inversão de tudo, a invasão de tudo: o teatro de tese e a luta no palco entre morais e imorais. A tese deve ser decidida em guerra de sociólogos, de homens de lei, gordos e dourados como Corpus Juris. Ágil o teatro, filho do saltimbanco. Ágil e ilógico. Ágil o romance, nascido da invenção. Ágil a poesia. A poesia Pau-brasil. Ágil e cândida. Como uma criança. Uma sugestão de Blaise Cendrars: - Tendes as locomotivas cheias, ides partir. Um negro gira a manivela do desvio rotativo em que estais. O menor descuido vos fará partir na direção oposta ao vosso destino. Contra o gabinetismo, a prática culta da vida. Engenheiros em vez de jurisconsultos, perdidos como chineses na genealogia das idéias. A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos. Não há luta na terra de vocações acadêmicas. Há só fardas. Os futuristas e os outros. Uma única luta - a luta pelo caminho. Dividamos: Poesia de importação. E a Poesia Pau-brasil, de exportação. 38 Houve um fenômeno de democratização estética nas cinco partes sábias do mundo. Instituíra-se o naturalismo. Copiar. Quadro de carneiros que não fosse lã mesmo, não prestava. A interpretação no dicionário oral das Escolas de Belas Artes queria dizer reproduzir igualzinho... Veio a pirogravura. As meninas de todos os lares ficaram artistas. Apareceu a máquina fotográfica. E com todas as prerrogativas do cabelo grande, da caspa e da misteriosa genialidade de olho virado - o artista fotógrafo. Na música, o piano invadiu as saletas nuas, de folhinha na parede. Todas as meninas ficaram pianistas. Surgiu o piano de manivela, o piano de patas. À pleyela. E a ironia eslava compôs para a pleyela. Stravinski. A estatuária andou atrás. As procissões saíram novinhas das fábricas. Só não se inventou uma máquina de fazer versos - já havia o poeta parnasiano. Ora, a revolução indicou apenas que a arte voltava para as elites. E as elites começaram desmanchando. Duas fases: 1ª) a deformação através do impressionismo, a fragmentação, o caos voluntário. De Cèzanne e Malarmé, Rodin e Debussy até agora. 2ª) o lirismo, a apresentação no templo, os materiais, a inocência construtiva. O Brasil profiteur. O Brasil doutor. E a coincidência da primeira construção brasileira no movimento de reconstrução geral. Poesia Pau-brasil. Como a época é miraculosa, as leis nasceram do próprio rotamento dinâmico dos fatores destrutivos. A síntese O equilíbrio O acabamento da carrosserie A invenção A surpresa Uma nova perspectiva Uma nova escala. Qualquer esforço contra o detalhe naturalista - pela síntese; contra a morbidez romântica - pelo HTXLOtEULR geômetra e pelo DFDEDPHQWR técnico; contra a cópia, pela LQYHQomRe pela VXUSUHVD. Uma nova perspectiva. A outra, a de Paolo Ucello criou o naturalismo de apogeu. Era uma ilusão ótica. Os objetos distantes não diminuíam. Era uma lei de aparência. 39 Ora, o momento é de reação à aparência. Reação à cópia. Substituir a perspectiva visual e naturalista por uma perspectiva de outra ordem: sentimental, intelectual, irônica, ingênua. Uma nova escala: A outra, a de um mundo proporcionado e catalogado com letras nos livros, crianças nos colos. O reclame produzindo letras maiores que torres. E as novas formas da indústria, da aviação. Postes. Gasômetros Rails. Laboratórios e oficinas técnicas. Vozes e tics de fios e ondas e fulgurações. Estrelas familiarizadas com negativos fotográficos. O correspondente da surpresa física em arte. A reação contra o assunto invasor, diverso da finalidade. A peça de tese era um arranjo monstruoso. O romance de idéias, uma mistura. O quadro histórico, uma aberração. A escultura eloqüente, um pavor sem sentido. Nossa época anuncia a volta do VHQWLGRSXUR. Um quadro são linhas e cores. A estatuária são volumes sob a luz. A Poesia Pau-brasil é uma sala de jantar domingueira, com passarinhos cantando na mata resumida das gaiolas, um sujeito magro compondo uma valsa para flauta e a Maricota lendo o jornal. No jornal anda todo o presente. Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do mundo.9HUFRP ROKRVOLYUHV Temos a base dupla e presente - a floresta e a escola. A raça crédula e dualista e a geometria, a álgebra e a química logo depois da mamadeira e do chá de erva-doce. Um misto de “dorme nenê que o bicho vem pegá” e de equações. Uma visão que bata nos cilindros dos moinhos, nas turbinas elétricas, nas usinas produtoras, nas questões cambiais, sem perder de vista o Museu Nacional. Pau-brasil. Obuses de elevadores, cubos de arranha-céus e a sábia preguiça solar. A reza. O Carnaval. A energia íntima. O sabiá. A hospitalidade um pouco sensual, amorosa. A saudade dos pajés e os campos de aviação militar. Paubrasil. O trabalho da geração futurista foi ciclópico. Acertar o relógio império da literatura nacional. 40 Realizada essa etapa, o problema é outro. Ser regional e puro em sua época. O estado de inocência substituindo o estado de graça que pode ser uma atitude de espírito. O contrapeso da originalidade nativa para inutilizar a adesão acadêmica. A reação contra todas as indigestões de sabedoria. O melhor de nossa tradição lírica. O melhor de nossa demonstração moderna. Apenas brasileiros de nossa época. O necessário de química, de mecânica, de economia e de balística. Tudo digerido. Sem meeting cultural. Práticos. Experimentais. Poetas. Sem reminiscências livrescas. Sem comparações de apoio. Sem pesquisa etimológica. Sem ontologia. Bárbaros, crédulos, pitorescos e meigos. Leitores de jornais. Pau-brasil. A floresta e a escola. O Museu Nacional. A cozinha, o minério e a dança. A vegetação. Pau-brasil. Oswald de Andrade (Correio da Manhã, 18 de março de 1924.) 80'2&80(172+,67Ï5,&2'( A seguir você lerá um de nossos documentos históricos mais antigos. Trata-se do “Regimento do Pau-brasil”, assinado em 1605 por Felipe II de Portugal e III da Espanha, no qual era fixada a exploração em 600 toneladas por ano. Menos que um libelo ecológico, o regimento objetivava limitar a oferta da madeira no mercado europeu, mantendo os preços elevados. A leitura do regimento propicia ainda uma outra aventura: uma viagem pela língua portuguesa escrita no século XVII, em Portugal. Atente para a enorme quantidade de formas diferentes (sobretudo ortográficas) daquelas utilizadas hoje pela língua escrita no Brasil. 41 5(*,0(172'23$8%5$6,/ Eu El-rei. Faço saber aos que este Meu regimento virem, que sendo informado das muitas desordens que ha no certão do páo brasil, e na conservação delle, de que se tem seguido haver hoje muita falta, e ir-se buscar muitas legoas pelo certão dentro, cada vez será o damno mayor se se não atalhar, e der nisso a Ordem conveniente, e necessária, como em cousa de tanta importancia para a Minha Real Fazenda, tomando informações de pessoas de experiência das partes do Brasil, e comunicando-as com as do Meu Conselho, Mandei fazer este Regimento, que Hei por bem, e Mando se guarde daqui em diante inviolavelmente. Primeiramente Hei por bem, e Mando, que nenhuma pessoa possa cortar, nem mandar cortar o dito páo brasil, por si, ou seus escravos ou Feitores seus, sem expressa licença, ou escripto do Provedor mór de Minha Fazenda, de cada uma das Capitanias, em cujo destricto estiver a mata, em que se houver de cortar; e o que o contrário fizer encorrerá em pena de morte e confiscação de toda sua fazenda. O dito Provedor Mór para dar a tal licença tomará informação da qualidade da pessoa, que lha pede, e se della ha alguma suspeita, que o descaminhará, ou furtará ou dará a quem o haja de fazer. O dito Provedor Mór fará fazer um livro por elle assignado e numerado, no qual se registrarão todas as licenças que assim der, declarando os nomes e mais confrontações necessarias das pessoas a que se derem, e se declarará a quantidade de páo para que se lhe dê licença, e se obrigará a entregar ao contractador toda a dita quantidade, que trata na certidão, para com ella vir confrontar o assento do Livro, de que se fará declaração, e nos ditos assentos assignará a pessoa que levar a certidão, e a pessoa, que levar a licença, com o Escrivão. E toda a pessoa, que tomar mais quantidade de páo de que lhe for dada licença, além de o perder para Minha Fazenda, se o mais que cortar passar de dez quintaes, incorrerá em pena de cem cruzados, e se passar de cincoenta quintaes, sendo peão, será açoutado, e degradado por des annos para Angola, e passando de cem quintaes morrerá por elle, e perderá toda sua fazenda. O provedor fará repartição das ditas licenças em o modo, que cada um dos moradores da Capitania, a que se houver de fazer o córte, tenha sua 42 parte, segundo a possibilidade de cada um, e que em todos se não exceda a quantidade que lhe for ordenada. Para que não córte mais quantidade de páo da que eu tiver dada por contracto, nem se carregue a cada Capitania, mais da que boamente se póde tirar della; Hei por bem, e Mando, que em cada um anno se faça repartição da quantidade do páo, que se ha de cortar em cada uma das Capitanias, em que ha mata delle, de modo que em todo se não exceda a quantidade do Contracto. A dita Repartição do páo que se ha de cortar em cada Capitania se fará em presença do Meu Governador daquelle Estado pelo Provedor Mór da Minha Fazenda, e Officiaes da Camara da Bahia, e nella se terá respeito do estado das matas de cada uma das ditas Capitanias, para lhe não carregarem mais, nem menos páo do que convém para benefício das ditas matas, e do que se determinar aos mais votos, se fará assento pelo Escrivão da Camara, e delles se tirarão Provisões em nome do Governador, e por elle assignadas, que se mandarão aos Provedores das ditas Capitanias para as executarem. Por ter informação, que uma das cousas, que maior damno tem causado nas ditas mattas, em que se perde, e destroe mais páos, é por os Contractadores não aceitarem todo o que se córta, sendo bom, e de receber, e querem que todo o que se lhe dá seja roliço, e massiço do que se segue ficar pelos mattos muitos dos ramos e ilhargas perdidas, sendo todo elle bom, e conveniente para o uso das tintas: Mando a que daqui em diante se aproveite todo o que fôr de receber, e não se deixe pelos matos nenhum páo cortado, assim dos ditos ramos, como das ilhargas, e que os contractadores o recebão todo, e havendo duvida se é de receber, a determinará o Provedor da Minha Fazenda com informação de pessoas de credito ajuramentadas; e porque outrosym sou informado, que a causa de se extinguirem as matas do dito páo como hoje estão, e não tornarem as árvores a brotar, é pelo mao modo com que se fazem os córtes, não lhe deixando ramos, e varas, que vão crescendo, e por se lhe pôr fogo nas raizes, para fazerem roças; Hei por bem, e Mando, que daqui em diante se não fação roças em terras de matas de páo do brasil, e serão para isso coutadas com todas as penas, e defesas, que estas coutadas Reaes, e que nos ditos córtes se tenhão muito tento á conservação das arvores para que tornem a brotar, deixando-lhes varas, e troncos com que os possão fazer, e os que o contrario fizerem serão castigados com as penas, que parecer ao Julgador. Hei por bem, e Mando, que todos os annos se tire devassa do córte do páo brasil, na qual se perguntará pelos que quebrarão, e foram contra este Regimento. 43 E para que em todo haja guarda e vigilância, que convém Hei por bem, que em cada Capitania, das em que houver matas do dito páo, haja guardas, duas dellas, que terão de seu ordenado a vintema das condemnações que por sua denunciação se fizeram, as quaes guardas serão nomeadas pelas Camaras, e approvadas pelos Provedores de Minha Fazenda, e se lhes dará juramento, que bem, e verdadeiramente fação seus Officios. O qual Regimento Mando se cumpra, e guarde como nelle se contém e ao Governador do dito Estado, e ao Provedor Mór da Minha Fazenda, e aos Provedores das Capitanias, e a todas as justiças dellas, que assim o cumprão, e guarde, e fação cumprir, e guardar sob as penas nelle contheudas; o qual se registrará nos Livros da Minha Fazenda do dito Estado, e nas Camaras das Capitanias, aonde houver matas do dito páo, e valerá posto que não passe por carta em meu nome, e o effeitto della haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação do segundo Livro, titulo trinta e nove, que o contrario dispoem. Francisco Ferreira o fês a 12 de Dezembro de 1605. E eu o Secretário Pedro da Costa o fis escrever “Rey”. 80$3$/$95$),1$/$5(63(,72'$35,0(,5$3$/$95$ '2%5$6,/ Ao longo de todo esse percurso, constatamos tristemente que o paubrasil é uma árvore que está em baixa, fora de moda, uma autêntica espécie ROGIDVKLRQ No entanto, o que é mais trágico é o fato de ela ser somente uma dentre milhares de espécies vegetais na mesma situação. E isso devido a um único motivo. Elas são habitantes das florestas, essas casas ancestrais que vão sendo extintas pouco a pouco. As florestas estão se constituindo cada vez mais em terras de ninguém. É certo que para os europeus, vindos de áreas semidesérticas, uma floresta era um terreno ameaçador, povoado por animais e indígenas “sempre” hostis, logo, um campo indomável. Daí a estratégia da devastação. Desmatar para dominar. A opulência e o vigor de qualquer floresta, contrariamente à sua fama de sítios invioláveis, caem literalmente por terra em conflitos de qualquer ordem: guerra, colonização, posse de terra etc. A conseqüência da devastação predatória é o aparecimento dos desertos florestais nos quais se destroem ou desaparecem diversas espécies de plantas e de animais, sem terem sido, ao menos, conhecidas, catalogadas ou 44 fotografadas. No rastro de uma floresta que tomba estão a erosão, o empobrecimento dos solos, as enchentes, as degradações de toda sorte e a perda de informações genéticas jamais recuperadas. A educação ambiental ODWRVHQVX é a única saída para o problema. Compreendendo a natureza, um dia poderemos atingir um nível de consciência ecológica comprometida firmemente com a preservação das espécies, sem o fanatismo dos ortodoxos ou a verborragia das leis inúteis. Quem sabe então, a partir daí, o pau-brasil abandone a retórica posição de símbolo para se tornar seguramente uma árvore fincada em solo brasileiro! 45