COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. Influência da velocidade de rotação da mini-palheta na resistência de um solo siltoso Emanuele Amanda Gauer Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil, [email protected] Jucélia Bedin Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil, [email protected] Fernando Schnaid Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil, [email protected] RESUMO: O ensaio de palheta constitui-se em uma técnica rotineira na estimativa da resistência ao cisalhamento não-drenada de argilas, sendo ocasionalmente usado em solos siltosos. Dentre os fatores que influenciam as medições da resistência não-drenada, a velocidade de rotação pode ser considerada a mais importante devido à ocorrência de drenagem parcial durante o cisalhamento. Assim, o objetivo deste trabalho consiste em avaliar a influência da velocidade de rotação da palheta na resistência não-drenada de um material siltoso, de granulometria semelhante à dos resíduos de ouro, através de ensaios de laboratório utilizando uma mini-palheta. A interpretação através da normalização de resultados, correlacionando a velocidade adimensional V ao grau de drenagem U, possibilita a identificação de condições drenadas, não-drenadas e parcialmente drenadas. PALAVRAS-CHAVE: Resíduos de Mineração, Ensaio de Palheta, Resistência Não-Drenada, Condições de Drenagem, Solos Siltosos 1 INTRODUÇÃO de granulometria fina (Schnaid, 2009), como os siltes e os resíduos de mineração, esta pesquisa tem como objetivo ampliar a experiência de argilas a solos siltosos. Os ensaios de palheta são influenciados por vários fatores, como a velocidade de rotação da palheta, o tempo transcorrido entre a inserção da palheta e o início do ensaio, as dimensões da palheta, o índice aspecto (H/D), entre outros (e.g. Biscontin e Pestana, 1999). Dentre estes fatores, avalia-se neste trabalho a influência da velocidade de rotação da palheta na resistência de um material siltoso. A partir da análise proposta é possível identificar as condições de drenagem impostas ao solo durante os ensaios. A indústria da mineração produz milhões de toneladas de resíduos com elevado teor de água por ano no mundo e, por isso, a disposição destes rejeitos e a ruptura de barragens de armazenamento preocupa engenheiros e órgãos ambientais nacionais e internacionais. Estes materiais possuem características geotécnicas distintas dos geomateriais encontrados em depósitos naturais, têm granulometria predominantemente siltosa e condutividade hidráulica intermediária (entre 10-8 e 10-5 m/s). Por isso, a ocorrência de drenagem parcial durante ensaios de campo gera incertezas na estimativa de parâmetros constitutivos. O ensaio de palheta consiste de uma técnica simples, rápida, de relativo baixo custo e rotineiramente empregada na estimativa da resistência não-drenada de solos argilosos. Como esta técnica também pode ser utilizada para estimar a resistência não-drenada de solos 2 INFLUÊNCIA DA VELOCIDADE DE CISALHAMENTO A importância da velocidade de rotação da palheta nas medições da resistência não- 1 COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. realizaram ensaios de palheta em laboratório, utilizando uma palheta de 55 mm de diâmetro, em uma mistura bentonita-caulinita, com o objetivo de avaliar a influência da velocidade periférica da palheta na resistência não drenada do material. Bedin (2006) realizou ensaios de piezocone em resíduos de mineração de bauxita. Com o objetivo de avaliar as condições de drenagem, sendo os ensaios realizados com velocidade padrão (20 mm/s) e velocidade inferior ao padrão (2 mm/s). Na figura 1, pode-se observar as curvas de drenagem dos ensaios de palheta realizados por Biscontin e Pestana (1999 e 2001) plotados juntamente com os resultados obtidos por Blight (1968), Randolph e Hope (2004) e Bedin (2006). drenada foi reconhecida ainda no início do desenvolvimento da técnica. (Cadling e Odenstad, 1950). Várias pesquisas vêm sendo realizadas com o objetivo de avaliar este efeito (Perlow e Richards, 1977; Blight, 1968; Randolph e Hope, 2004; Chung et al (2006); Lehane et al (2009). Blight (1968) realizou ensaios de palheta em resíduos de mineração de ouro e de indústrias de fertilizantes, enquanto Randolph e Hope (2004) realizaram ensaios de piezocone em um depósito de argila. A metodologia proposta pelas duas pesquisas citadas anteriormente é semelhante. Blight (1968) definiu um conceito de fator tempo (T) para ensaios de palheta, expresso em função do diâmetro da palheta (d), do coeficiente de adensamento (cv) e do tempo de rotação (t): T= c v .t d² (1) O fator tempo está relacionado ao grau de drenagem medido através do torque a diferentes velocidades de rotação da palheta. Randolph e Hope (2004), por sua vez definiram um conceito de velocidade em função da velocidade de cisalhamento (v), do diâmetro da sonda ou da palheta (d) e do coeficiente de adensamento (cv), expressa na forma adimensional: V = v.d cv Figura 1. Grau de drenagem (Gauer, 2010). As curvas de drenagem foram traçadas utilizando a seguinte equação, proposta por Schnaid (2005): (2) Nesta pesquisa, os resultados de Randolph e Hope (2004) são adaptados para o espaço equivalente proposto por Blight (1968), sendo os resultados relacionados ao grau de drenagem (U) expresso como (Schnaid, 2005): U= (Q − Qñ ) (Qdr − Qñ ) U = a + (1 − a ). 1 cosh(b.V c ) (4) onde a, b e c são parâmetros representativos de cada material. A tabela 1 apresenta os parâmetros a, b e c utilizados no ajuste das curvas de drenagem da Figura 1. (3) Tabela 1: parâmetros utilizados para ajuste das curvas de drenagem. Material estudado a b c Resíduos de bauxita – Piezocone 0,05 0,12 0,8 (Bedin, 2006) Argila – Piezocone (Randolph e 0,05 1,5 0,5 Hope, 2004) Resíduos de ouro – Palheta 0,05 0,28 0,7 onde Qñ é a resistência medida através de ensaios não-drenados, Qdr é a resistência medida através de ensaios lentos drenados e Q é a resistência medida em condições intermediárias. Biscontin e Pestana (1999 e 2001) 2 COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. (Blight, 1968) Resíduos de fertilizante – Palheta (Blight, 1968) Mistura bentonita-caulinita – Palheta (Biscontin e Pestana, 1999) 0,05 0,8 0,6 0,05 0,55 0,75 ensaios é manual, fabricado pela Via Test, com instrumentação feita através de célula de carga instalada junto à parte superior da palheta. Um sistema de aquisição de dados permite o registro contínuo do torque durante o ensaio, sendo possível obter curvas torque x tempo e torque x deslocamento para cada um dos ensaios realizados. Os ensaios foram realizados em corpos de prova de 20 cm de diâmetro e 15,3 cm de altura (3 vezes a altura da palheta). O peso específico é semelhante resíduo de ouro usado nas comaprações (Bedin, 2010). O método utilizado na obtenção das amostras consiste na adição de água destilada ao material, homogeneizando a mistura. O material foi compatado em três camadas e inundados lentamente para que fossem obtidas amostras homogêneas. Após inundados, os corpos de prova foram ensaiados quatro vezes, no centro da amostra, com intervalo de uma hora entre cada ensaio. Os três primeiros ensaios foram realizados a uma velocidade e, no quarto ensaio, a velocidade foi aumentada. As velocidades de rotação de ensaio estão no intervalo entre 0,5 a 54 rpm, que correspondem a velocidades adimensionais de 2 a 285 para a palheta utilizada. 3 MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Materiais O material utilizado nesta pesquisa consiste de um material siltoso, obtido a partir da moagem de uma areia. O objetivo da utilização deste material consiste na comparação dos resultados obtidos com os resíduos de mineração com um material inerte. O material inerte foi produzindo no Laboratório de Engenharia Geotécnica e Geotecnologia Ambiental (LEGG) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A areia utilizada na moagem provém da cidade de Osório – RS. Após a moagem, o material foi passado na peneira 200 para retirada de 30% de finos, atingindo-se a granulometria próxima ao resíduo de ouro, como apresentado na Figura 2. 4 RESULTADOS Os resultados dos ensaios de palheta mostraram, de modo geral, uma redução na resistência com o aumento da velocidade de rotação da palheta, como apresentado na Figura 3. Observa-se na figura uma grande variabilidade nos resultados. apresentando uma dificuldade na repetibilidade dos resultados, conforme observado nas Figuras 4 e 5. Nas figuras observa-se que nos ensaios nãodrenados a ruptura ocorre em um tempo de aproximadamente 0,4 s para deslocamentos da ordem de 3 cm. Figura 2. Distribuição granulométrica (Bedin, 2009). 2.2 Programa Experimental O programa experimental consiste de ensaios de palheta realizados em laboratório utilizando uma palheta de 2,55 mm de diâmetro e 5,1 cm de altura. O equipamento utilizado nos 3 COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. Ensaios de Palheta 0.3 Torque (Nm) 0.25 0.2 54 rpm (não-drenado) 0.15 0,5 rpm (drenado) 0.1 10 rpm (parc drenado) 0.05 30 rpm (parc Drenado) 0 0 0.5 1 1.5 2 Tempo (s) Figura 3. Torque máximo em função da velocidade de rotação Figura 6. Ensaios de palheta – curvas torque x tempo Ensaios de Palheta 0.3 Ensaios não-drenados 0.25 Torque (Nm) 0.12 Torque (Nm) 0.1 0.08 03 - 54 rpm 0.06 01 - 54 rpm 0.04 10 rpm (parc drenado) 0.1 30 rpm (parc drenado) 02 - 54 rpm 0 0 0 0 0.5 1 1.5 Ensaios não-drenados 0.1 0.08 03 - 54 rpm 0.06 01 - 54 rpm 0.04 02 - 54 rpm 0.02 0 6 6 8 A Figura 8 apresenta as curvas de drenagem obtidas em ensaios de palheta: a curva obtida neste trabalho em comparação com as curvas de drenagem dos ensaios realizados por Blight (1968) e por Biscontin e Pestana (1999 e 2001). A Tabela 2 apresenta os parâmetros utilizados para ajuste das curvas de drenagem da Figura 4. . De maneira geral observa-se que as condições não-drenadas são obtidas para valores de V maiores que 100. Condições intermediárias ocorrem para valores de V entre 2 e 100, que correspondem à faixa de velocidades em que ocorre drenagem parcial. 0.12 4 4 Figura 7. Ensaios de palheta – curvas torque x deslocamento Figura 4. Resultados dos ensaios não-drenados – curvas torque x tempo 2 2 Deslocamento (cm) 2 Tempo (s) Torque (Nm) 0,5 rpm (drenado) 0.15 0.05 0.02 0 54 rpm (não-drenado) 0.2 8 Deslocamento (cm) Figura 5. Resultados dos ensaios não-drenados – curvas torque x deslocamento As Figuras 6 e 7 apresentam uma comparação dos resultados de ensaios drenados, parcialmente drenados e não-drenados. Cabe ressaltar que esta é uma comparação específica entre alguns ensaios, pois a repetibilidade dos ensaios drenados e parcialmente drenados não foi satisfatória. Figura 8. Grau de drenagem de ensaios de palheta 4 COBRAMSEG 2010: ENGENHARIA GEOTÉCNICA PARA O DESENVOLVIMENTO, INOVAÇÃO E SUSTENTABILIDADE. © 2010 ABMS. soils. Canadian Geotechnical Journal. Vol. 5, No 3, pp. 142-149. Cadling, L. e Odenstad, S. (1950). The vane borer: an apparatus for determining the shear strength of clay soils directly in the ground. Royal Swedish Geotechnical Institute, Proc…, V. 2, p. 1-87. Chung et al (2006). Effect of penetration rate on penetrometer resistance in clay. Journal of Geotechnincal and Geoenvironmental Engineering. ASCE, v. 132, No 9, p. 1188-1196. Gauer, E. A. (2010). Influência da velocidade de rotação da palheta na resistência de materiais siltosos. Dissertação (Mestrado em Engenharia) – Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, UFRGS, Porto Alegre, 130 p. Kim et al (2008). Effect of penetration rate on cone penetration resistance on saturated soils. Journal of Geotechnincal and Geoenvironmental Engineering. ASCE, v. 134, No 8, p. 1142-1153. 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Material estudado a b c Resíduos de ouro – Palheta 0,05 0,28 0,7 (Blight, 1968) Resíduos de fertilizante – Palheta 0,05 0,8 0,6 (Blight, 1968) Mistura bentonita-caulinita – 0,05 0,55 0,75 Palheta (Biscontin e Pestana, 1999) Material inerte – presente estudo 0,05 0,15 0,75 5 CONCLUSÕES Ensaios de palheta de laboratório foram realizados para avaliar a influência da velocidade de rotação na resistência ao cisalhamento de material inerte de granulometria siltosa. Os resultados apresentam dispersão acentuada, o que dificulta a avaliação das condições de drenagem. A interpretação através da normalização de resultados, correlacionando a velocidade adimensional V ao grau de drenagem U, possibilitou a identificação da ocorrência de drenagem parcial. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPq, à CAPES e à UFRGS pelo suporte financeiro. REFERÊNCIAS Bedin, J. (2006). Interpretação de ensaios de piezocone em resíduos de bauxita. 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