Mesa Redonda: Beijing+20: perspectivas y desafíos Eleonora Menicucci Ministra de la Secretaría de Políticas para las Mujeres del Brasil XII Conferência Regional sobre a Mulher da América Latina e Caribe Santo Domingo, República Dominicana, de 15 a 18 de outubro de 2013. Mesa Redonda: Beijing + 20: perspectivas e desafios Gran Salón, dia 17 de outubro (quinta-feira), das 14h45 às 18h. Intervenção da Ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres Gostaria de registrar a minha satisfação em compartilhar essa mesa redonda, moderada por Sonia Montaño, Diretora da Divisão de Assuntos de Gênero da CEPAL, com: - Diane Quarless, Diretora da Sede sub-regional da CEPAL para o Caribe; - Moni Pizani, Diretora do Centro Regional de ONU-Mulheres para a América Latina e o Caribe; - Thokozile Ruzvidzo, Diretora do Centro Africano para as Questões de Gênero e Desenvolvimento Social da Comissão Econômica para a África; - María Ángeles Durán, Professora de Investigação do Instituto de Economia, Geografia e Demografia do Centro de Ciências Humanas e Sociais da Espanha; - Sergia Galván, Diretora Executiva do Coletivo Mulher e Saúde da República Dominicana; e, - Gisela Alonso, Presidenta da Agência Cubana de Meio Ambiente. Pensarmos Beijing + 20, perspectivas e desafios, é bastante instigante. Um olhar sobre a Declaração e a Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em Beijing em 1995, já traz a tona a atualidade de suas propostas. Por um lado, temos no mundo avanços a registrar na implementação da Plataforma de Ação. Pensando em nossa região, podemos destacar importantes avanços, a exemplo da criação dos mecanismos governamentais de políticas para as mulheres ou das legislações para enfrentar a violência contra as mulheres. Se olharmos para trás, se olharmos vinte anos atrás, quantos mecanismos governamentais de políticas para as mulheres existiam? Hoje, 19 anos depois, segundo dados do Observatório de Igualdade de Gênero da América Latina e Caribe (que também não existia em 1995), temos grande parte dos 33 países da região com algum mecanismo de executivo incrustado na estrutura estatal. Essa é uma das áreas decisivas de especial preocupação da Plataforma de Ação de Beijing. No Brasil, por exemplo, a Secretaria de Política para as Mulheres foi criada apenas em 2003. Antes da SPM tínhamos unicamente o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, instituído em 1985, com a finalidade de promover, em âmbito nacional, políticas para eliminar a discriminação contra as mulheres. Mas um órgão dentro do Ministério da Justiça. Se olharmos para trás, se olharmos vinte anos atrás, quais políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres tínhamos? Hoje, todos nossos países, em menor ou maior grau, têm programas e políticas para enfrentar esse flagelo, têm leis para prevenir, punir ou erradicar a violência doméstica. Essa é outra das áreas decisivas de especial preocupação da Plataforma de Ação de Beijing. No Brasil, por exemplo, em 2006 é promulgada a Lei 11.340, que cria mecanismo para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, mais conhecida como Lei Maria da Penha; em 2007, na abertura da primeira Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lança o Pacto Nacional Pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, acordo federativo entre o governo federal, os governos dos estados e dos municípios brasileiros para a implementação de políticas públicas integradas em todo território nacional. Agora, neste ano de 2013, a Presidenta Dilma lançou o Programa Mulher Viver Sem Violência que tem o objetivo de construir serviços de grande porte que integre as distintas áreas de enfrentamento à violência. Da mesma forma, distintos países da região elaboraram legislação de enfrentamento à violência contra as mulheres, e vem desenvolvendo políticas nesta área. Mas não vou me deter aqui enumerando avanços. Eles são muitos, mas todas nós reconhecemos que são insuficientes. Insuficientes para assegurar a todas as mulheres condições dignas de vida, com igualdade de direitos, com direitos plenos. Como é fácil constatar, olhando as políticas implementadas em nossos países (e os relatórios apresentados para esta Conferência, que estão disponíveis no site, nos dão bem essa visão) esses avanços não são homogêneos e nem lineares, mas caminham, de uma maneira geral, numa mesma direção. Nos interessa aqui, em particular, pensar os desafios que temos pela frente. É preciso reconhecer que nenhum país da região atingiu os patamares propostos pela ampla plataforma de ação de Beijing. Também por isso, quero destacar a importância de atuarmos cada vez mais em bloco, como região, nos diferentes fóruns internacionais, para aprovarmos acordos, declarações e outros instrumentos internacionais que reforcem a decisão de nossos países de termos sociedades mais igualitárias. Temos experiências positivas nesse sentido. Recordo aqui um bom exemplo: a prioridade que demos à ampliação dos direitos das trabalhadoras domésticas contribuindo para o debate em todo o continente e o avanço e aprovação de legislações nacionais. Para além de aprofundarmos os acordos de Beijing, transformando sua plataforma uma realidade, precisamos incluir novos desafios, a exemplo do que fizemos recentemente, quando da aprovação do Consenso de Montevidéu sobre População e Desenvolvimento: avançamos, para citar apenas um aspecto, na promoção dos direitos LGBTs. Considero importante pensarmos os desafios e colocarmos como marco fundamental a para a agenda de Desenvolvimento Pós-2015, os Consensos aprovados na Região: o Consenso de Montevidéu sobre População e Desenvolvimento, que incorpora a perspectiva da igualdade de gênero e do enfrentamento a todas as formas de desigualdade e discriminação em todo o seu texto, com um enfoque de direitos humanos; o Consenso de Brasília, que aponta para a necessidade mudança dos paradigmas de desenvolvimento e o fortalecimento da ação do Estado para fazer frente à volatilidade das finanças e da economia internacional, garantindo que nossos países não sejam tributários de uma visão de economia predatória – ação que tem sido fundamental para enfrentar as crises econômicas internacionais. E, finalmente, os desafios a serem apontados no Consenso de Santo Domingo, que aprovaremos aqui. No tema central desta conferência, as Tecnologias de Informação e Comunicações, quero retomar as palavras da Presidenta Dilma, em sua viagem recente aos Estados Unidos: "As tecnologias de telecomunicações e informação não podem ser novo campo de batalha entre os estados. Este é o momento de criamos as condições para evitar que o espaço cibernético seja instrumentalizado como arma de guerra, por meio da espionagem, da sabotagem, dos ataques contra sistemas e infra-estrutura de outros países." Queremos que estas tecnologias, cada vez mais sofisticadas, sejam aliadas cotidianas para a ampliação dos direitos e do acesso de cada pessoa, nas mais remotas áreas, à informação, à cultura, à cidadania, tornando nossas democracias mais fortes, cada vez que cidadãos e cidadãs possam conhecer melhor a realidade. Mas é fundamental garantir o direito à soberania dos países, à privacidade dos indivíduos. Mais uma vez, é a Presidenta Dilma quem me inspira quando enfatizou que o sem o “o direito à privacidade, não há efetiva liberdade de expressão e opinião e, portanto, não há efetiva à democracia. Sem respeito à soberania, não há base para o relacionamento entre as nações”. Da mesma forma, o acesso das mulheres às novas tecnologias precisa ser reforçado também nos marcos de uma educação, cultura e comunicação não discriminatórias e igualitárias e da democratização dos meios de comunicação. Em relação à Agenda Pós-2015, consideramos fundamental que, para além do objetivo dedicado ao empoderamento das mulheres e à promoção da igualdade de gênero (Objetivo nº 2 – “Empoderar as mulheres e alcançar a igualdade de gêneros”), todos os demais objetivos devem ser permeados pela perspectiva da igualdade de gênero, no entendimento de que as políticas implementadas em qualquer área têm impactos diferenciados na vida de mulheres e homens e podem ser efetivas no sentido de reduzir as desigualdades existentes ou, ao contrário, podem vir a reforçá-las. Isso nos tem sido lembrado pelo movimento feminista e de mulheres latinoamericano que, em suas múltiplas formas de organização e mobilização, mantém a chama necessária para que os governos e a sociedade em nosso continente não descuidem de sua responsabilidade com a igualdade entre mulheres e homens. É imprescindível enfatizar também que a diversidade que caracteriza as mulheres demanda intervenções que considerem as especificidades e necessidades de cada grupo social. Historicamente, a intersecção de características como sexo, raça, etnia, orientação sexual, deficiência, região de origem, com o importante tema da migração, entre outras, contribui para criar situações de maior ou menor vulnerabilidade no acesso aos serviços ofertados e no usufruto dos direitos constitucionalmente assegurados. E, hoje, nossos países não podem mais fechar os olhos à transição demográfica que coloca na ordem do dia o envelhecimento da população. E é fundamental que sejam consideradas as interseções entre múltiplos fatores de discriminação e desigualdades, enfatizando que a discriminação de gênero está entrelaçada a outras formas de discriminação Não é possível construir uma Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 que aceite a violência contra as mulheres. Atenção especial precisamos dar ao tráfico de mulheres e meninas para fins de exploração sexual, bem como a violência exercida em áreas de conflito. Não é possível construir um mundo sustentável que aceite uma educação discriminatória, sexista e racista. Os processos de desenvolvimento devem buscar comprometer-se, ademais, com a superação das dificuldades e precariedades no acesso aos serviços públicos de saúde, garantindo o pleno exercício dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos. Avançando em mudanças legislativas que assegurem às mulheres o efetivo controle sobre sua reprodução. Nenhuma mulher pode ter sua vida ou sua saúde comprometida por não ter este direito. Nenhuma mulher pode morrer por falta de assistência ou mesmo de dificuldades de acesso aos serviços de saúde. No caso da tragédia da mortalidade materna, o Brasil se orgulha com as políticas públicas que interferiram positivamente na redução de mais de 51% das mortes maternas, incluindo aquelas decorrentes de abortos inseguros. Sabemos que ainda não atingimos o índice ideal que é o de não termos nenhuma mulher morta por omissão de assistência e por riscos preveníreis. Pensar o desenvolvimento sustentável e a Agenda Pós-2015 com a inclusão das mulheres, significa reconhecer também o cuidado de pessoas, o trabalho doméstico e para o autoconsumo – tarefas realizadas, em sua maioria, por mulheres - como elementos de sustentação do conjunto das pessoas, e que necessitam ser compartilhados por toda a sociedade. A construção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável deve decorrer da participação ativa dos diferentes setores sociais, tradicionalmente excluídos destes processos. Inúmeras ações, resistências e alternativas construídas pelas mulheres ao longo dos anos apontam para a efetivação da soberania alimentar e energética, com iniciativas que articulam outras formas de produção, consumo, uso da energia, da água e do solo. E neste âmbito, a ação das trabalhadoras rurais e das mulheres indígenas tem sido fundamental. Fundamental não apenas na produção de alimentos, na defesa dos bens comuns, na resistência a dinâmicas de produção que agridem o meio ambiente, mas também na sua presença combativa em todo o continente como parte de um movimento de mulheres forte e demandante. Para o Brasil, todo esse processo está vinculado a um novo paradigma de desenvolvimento, em que sustentabilidade e desenvolvimento econômico associam-se de forma estrutural à igualdade, à distribuição da riqueza e a igual distribuição do trabalho e dos bens. Aliás, não se constrói autonomia econômica das mulheres se não eliminamos a gritante desigualdade salarial e de rendimento persistente entre mulheres e homens. Ao pousarmos a agenda Pós-2015 temos de evitar que se repita o reducionismo em relação ao tema das mulheres e da igualdade de gênero que criticamos nos Objetivos do Desenvolvimento do Milênio, por não terem incorporado, de maneira ampla, os acordos expressos na Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher e no Plano de Ação de Cairo. Enfatizar como fundamental a incorporação das políticas de igualdade de gênero na agenda de erradicação da pobreza, na medida em que o ônus da pobreza recai sobre as mulheres de forma contundente. Portanto, é necessário que as políticas de enfrentamento à pobreza caminhem junto com as políticas de enfrentamento a todas as formas de desigualdade; Nosso marco fundamental deve ser a construção de Estados consolidados e democráticos que assegurem a toda a sua população, em condições de igualdade, o acesso à justiça, educação, saúde, moradia, trabalho e demais direitos humanos e sociais. E que fortaleçam formas participativas de governo como garantia para o efetivo exercício da democracia. Muito obrigada.