International Catholic Child Bureau- Bice 44 rue de Lausanne - 1201 Genève - Suisse Tel: 00 41 22 731 32 48- Fax: (41 22) 731 77 93 http://www.bice.org Associação Beneficiente da Criança e do Adolescente em Situação de Risco-Pastoral do Menor Rua Franklin Tavora, n° 104 - Brasil Genebra/Fortaleza, 31.7.2015 Senhor/Senhora Título Endereço Assunto: voto contra a Emenda constitucional PEC 171/1993 sobre a idade mínima da maioridade penal das crianças e adolescentes em conflito com a lei Senhor(a) deputado (a), Os Senhores irão, nos próximos dias, reexaminar ou pronunciar-se novamente à respeito da Emenda constitucional PEC 171/1993, aprovada em primeiro turno, visando reduzir de 18 à 16 anos a idade da maioridade penal das crianças e adolescentes em conflito com a lei. Le Bureau International Catholique de l’Enfance (BICE), a Pastoral do Menor Brasil e as organizações parceiras do Programa Infância sem Grades estão muito preocupados com a Emenda à Constituição PEC 171/1993 aprovada em 2 de julho de 2015 e que será objeto de nova votação pela Câmara dos Deputados, antes de ser reenviada ao Senado Federal, se necessário.1 Aprovar essa Emenda equivale à defender uma modificação da Constituição que vulnerabiliza uma parte da população da qual o presente e o futuro do país dependem. A integração das crianças e dos adolescentes em questão poderá ser comprometida se eles forem tratados como adultos caso a prioridade dada à privação de liberdade se confirme pour uma nova aprovação de tal Emenda. Nós solicitamos aos Senhores que votem contra a Emenda à Constituição PEC 171/1993. Essa aprovação seria contrária à Convenção relativa aos direitos da criança (CDE) e aos compromissos internacionais do Brasil relativos aos instrumentos internacionais de direitos humanos. Nós queremos chamar a vossa atenção para as consequências do rebaixamento da idade da maioridade penal de 18 para 16 anos que equivaleria à tratar da mesma forma os casos juvenis aos dos adultos. Com essa Emenda, existe o risco de que o acesso à justiça das crianças e dos adolescentes seja afetado. Ela é, igualmente, contrária à várias disposições da legislação brasileira e do direito internacional, em virtude dos quais o Brasil tem a especial obrigação de proteger os direitos da criança. Ainda, a Emenda não leva em consideração os compromissos internacionais do Brasil relativos aos direitos humanos e à possibilidade de reinserção dos jovens. Do mesmo modo, essa Emenda denota uma falta de vontade das autoridades brasileiras em encontrar soluções políticas adequadas aos problemas da criminalidade, ao acesso aos direitos e ao cumprimento efetivo dos compromissos e das obrigações do Brasil relativo aos tratados internacionais ratificados. Uma nova aprovação dessa Emenda representaria um retrocesso. 1 Ver Comunicado do Bice : C/N° 001/2015 de 1° de junho de 2015. O artigo 23 do Código Penal do Brasil de 7 de dezembro de 1940, assim como, o artigo 228 da Constituição Federal de 5 de outubro de 1988 fixam a idade da maioridade penal das crianças e dos adolescentes em 18 anos. Essa disposição é frequentemente citada como modelo no mundo inteiro pois ela está em conformidade com a interpretação do Comitê dos direitos da criança das Nações unidas contida na Observação geral n° 10. O Brasil continua, por iniciativas individuais ou coletivas com o Grupo América Latina e Caribe (GRULAC) e outros grupos regionais, a se posicionar respeitosamente frente à letra e ao espírito da CDE, principalmente, os artigos 3, 37, 39 e 40. A Emenda em questão prejudica os esforços que o Brasil fez no plano nacional a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva que tinham, formalmente, se comprometido à não reduzir a idade da maioridade penal, e relega o Brasil, no plano internacional, ao patamar dos Estados que recuam na proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes. A Emenda ignora a violência e as inigualdades dos quais os adolescentes são vítimas. Ainda, os adolescentes não deveriam ser considerados como os responsáveis da violência no Brasil. As crianças e os adolescentes em conflito com a lei são apresentados, principalmente, pelos meios de comunicação, como pessoas que não são sujeitos de direitos e destinados à terminar seus dias em privação de liberdade; e isso é contrário ao interesse superior da criança como consideração primordial, ao tratamento com dignidade e humanidade dos adolescentes em conflito com a lei, à privação de liberdade como uma medida de último recurso, ao tratamento desejável da criança sem recorrer à via judiciária, ao recurso privilegiado das medidas de substituição da privação de liberdade e à necessidade de facilitar a reintegração na sociedade. A reabilitação e a reinserção deveriam ser garantidas através de programos sócio-educativos nos meios abertos com o intuito de optimizar os efeitos positivos das medidas alternativas à privação de liberdade. A constatação do aumento da violência e da delinquência juvenil é resultante de fatores combinados, tais como: a taxa de desemprego elevada nos jovens, a violência persistente e multiforme realizada contra as crianças e contra a sociedade brasileira em geral, o empobrecimento de uma grande parte da população, principalmente, os afro-descendentes e os índios brasileiros, a incapacidade das autoridades de combater as gangues e o tráfico de drogas, a fragilização das famílias, a taxa elevada do abandono e do fracasso escolar (43% das crianças de 7 à 14 anos não terminam o oitavo ano da escola fundamental na idade desejada), a impossibilidade de acesso à vários direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos, garantidos como prioritários às crianças e aos adolescentes pelo artigo 227 da Constituição brasileira. É preciso que as políticas públicas e sociais sejam efetivas no processo de reinserção social dos adolescentes em conflito com a lei penal e em conexão com a família, a escola e a comunidade. Nós queremos chamar a vossa atenção sobre o fato de que as crianças e os adolescentes não têm o mesmo grau de desenvolvimento físico e psicológico que os adultos, e, como consequência, um tratamento adaptado à sua personalidade é necessário. Ainda, se essa Emenda seja aprovada novamente, milhares de adolescentes de 16 à 18 anos virão aumentar ainda mais o já saturado número de detentos existentes nas prisões, expondo-os à superpopulação carcerária, bem como, às condições de detenção inumanas marcadas por atos de tortura e de violência sexual, com dificuldades de colocar em prática os programas de reinserção. Por outro lado, na detenção, os jovens estariam expostos à influência direta do crime organizado. Nós insistimos que a justiça retributiva defendida pela Emenda é de natureza à pesar mais no orçamento da justiça do país, à aumentar ainda mais as desigualdades, à desviar a atenção das medidas idôneas na luta contra a violência na sociedade e contra as crianças, e à excluir as crianças e os adolescentes marginalizados e vulneráveis da construção e do desenvolvimento do Brasil. Esperando que os Senhores votem contra a Emenda PEC 171/1993, nós vos enviamos, Senhores e Senhoras, Deputados e Deputadas, as nossas mais sinceras estimas. International Catholic Child Bureau- Bice Associação Beneficiente da Criança e do Adolescente em Situação de Risco-Pastoral do Menor