Da Guarvaia à Pedra no Caminho
Breve História da Poesia em Língua Portuguesa
Texto de Ivan Lovison
Parte 1 – Trovadorismo
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Parte 1. O Trovadorismo!
O Trovadorismo foi a primeira manifestação literária da Língua Portuguesa.
Para que existisse o trovadorismo, preciso foi que existissem os trovadores.
Os trovadores eram uma espécie de poetas, cantores e tocadores de lira...
Eles andavam de feudo em feudo cantando suas cantigas em troca de cama para
dormir...
Comida para encher a pança...
E algumas moedas para poderem seguir viagem.
A coisa se dava mais ou menos assim...
Senhor Feudal
Servo
Senhor Feudal
Ora, quem vem lá?
Trata-se de um trovador, oh grande senhor deste feudo!
Pois que se chegue. Terás uma cama para dormir,
Uma perna de cabrito para encher a barriga. E muitos cobres para sua algibeira,
Desde que nos alegre com suas cantigas a noite inteira!
Trovador
No mundo não conheço ninguém que se compare a mim em infelicidade
Enquanto minha vida continua como vai indo, porque já morro de amor por vós, e ai!
Minha senhora vestida de branco e de faces rosadas,
Quereis que eu vos descreva quando eu vos vi sem manto!
Em infeliz dia me levantei, pois vos vi bela, e não feia!
E, minha senhora, desde aquele dia, ai! Tudo ocorreu muito mal para mim,
E vós, filha de Dom Paio Moniz, parece-vos suficiente e satisfatório,
Que eu deva receber, por vosso intermédio, uma guarvaia (por pintar vosso retrato);
Pois eu, minha senhora, como prova de amor, nunca de vós recebi, nem receberei
Nem o simples valor de uma correia.
Três
Essa aí é a Cantiga da Guarvaia.
Quatro
Também conhecida com Cantiga da Ribeirinha
Um
Guarvaia, em Portugal, naquela época, era uma espécie de manto luxuoso.
Dois
E Ribeirinha era o apelido da moça para quem essa cantiga foi escrita.
Um
A Cantiga da Guarvaia ou da Ribeirinha foi composta por Paio Soares de Taveirós,
provavelmente, no ano de 1198.
Dois
E essa cantiga é o primeiro texto literário da Língua Portuguesa de que se tem
registro.
1
Três
Ela é uma cantiga de amor.
Quatro
Nas Cantigas de amor que eram compostas naquela época, o eu-lírico, ou seja, o
sujeito que canta o poema, era sempre masculino, ou seja, um homem.
Um
Era sempre um homem cantando para uma mulher.
Dois
O assunto principal dessas cantigas era o sofrimento amoroso do eu-lírico perante
uma mulher idealizada e distante. Ou seja, o amor impossível.
Três
Mas, também havia outros tipos de cantigas.
Quatro
Havia as cantigas de amigo!
Um
Cantigas de amigo são cantigas de origem popular, que se utilizam de recursos que
propiciam facilidade na memorização. Esses recursos são utilizados, ainda hoje,
nas canções populares.
Dois
Na Cantiga de amigo, o eu-lírico é sempre uma mulher, embora o autor fosse
masculino, devido à sociedade feudal que não permitia às mulheres fazerem coisas
audaciosas, como por exemplo, compor cantigas.
Três
Nelas, a mulher cantava o seu amor por um amigo, quer dizer, por um namorado,
ou melhor, algum carinha de quem ela estivesse a fim.
Quatro
Mas, como a época era extremamente conservadora, dizia-se amigo, e não
namorado, e muito menos “carinha de quem ela estivesse a fim”.
Um
Na cantiga de amigo, a mulher reclamava à sua mãe, a uma amiga, ou então a
algum elemento da natureza, como a um vaso de flores, por exemplo, a distância do
homem a quem amava.
Trovador
Ai flores, ai flores do verde pino,
Sabereis vós noticias do meu amigo!
Ai Deus, onde estará ele?
Ai flores, ai flores do verde ramo,
Sabereis vós notícias do meu amado!
Ai Deus, onde estará ele?
Sabereis vós notícias do meu amigo,
Aquele que mentiu daquela vez em que esteve comigo!
Ai Deus, onde estará ele?
Sabereis vós notícias do meu amado,
Aquele que mentiu aquilo tudo que me havia jurado!
Ai Deus, onde estará ele?
Dois
E havia também a cantiga de escárnio.
Três
Nela, o eu-lírico fazia uma sátira a alguma pessoa.
Quatro
Essa sátira era indireta, cheia de duplos sentidos e ironias.
Um
Às vezes, a cantiga de escárnio se transformava em cantiga de maldizer, que era
quase a mesma coisa...
Dois
Só que na cantiga de maldizer a sátira era direta e sem duplos sentidos. Na bucha!
Trovador
Ai dona feia! Foste vos queixar
Que nunca vos louvei em meu cantar
2
Mas quero fazer agora um cantar
Em que vos louvarei por toda vida;
E verás como vos quero louvar:
Dona feia, velha e insandecida!
Ai dona feia! Que Deus me perdoe!
Pois tu tens um grande coração!
Para que eu louve com toda razão
Vos quero louvar por toda vida;
E verás qual será a canção
Dona feia, velha e insandecida!
Dona feia, nunca eu vos louvei
Em meu cantar, embora muito cantei;
Mas agora mesmo, um bom cantar farei
Em que vos louvarei por toda vida;
E vos direi como vos louvarei:
Dona feia, velha e insandecida!
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Todos
Um
Cantigas de amor...
Cantigas de amigo...
E Cantigas de escárnio.
Tudo cantando ao som da lira, pois o poema ainda não havia se separado da
música...
Esse era o Trovadorismo.
Período que compreende a parte 1 da história da poesia em língua portuguesa.
E agora, o que é que vem?
Agora vem a parte 2!
Parte 2 – O Humanismo
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Sapateiro
Diabo
Sapateiro
Diabo
Sapateiro
Diabo
Sapateiro
Diabo
Parte 2. O Humanismo!
Ao contrário da poesia trovadoresca, durante o Humanismo, a poesia
era feita para ser lida, e não mais cantada, como eram as cantigas medievais.
Ou seja, é nesse momento que o casamento entre poesia e música, acaba.
Acaba entre aspas, é claro, porque todos nós sabemos que os poemas jamais
podem deixar de ter certa... musicalidade.
Mas agora os poemas eram lidos ou declamados, e não mais cantados ao som da
lira, como antes.
Durante o Humanismo, o amor platônico não era mais tão freqüente. Os poetas
passaram a ser mais realistas e a abordar temas mais realistas também.
E passaram a ser mais freqüentes também os poemas de índole religiosa.
Teatro, poesia e valores religiosos. Tudo isso, junto e misturado, deu liga e se
tornou a grande coqueluche dos palácios portugueses durante os séculos XV e XVI.
Um cara que fez muito sucesso junto ao rei de Portugal e, por tabela, junto a toda
corte portuguesa daquela época foi Gil Vicente!
Ô da barca!
Quem vem aí?
Oh, um santo sapateiro honrado!
Mas por que vem tão carregado?
Mandaram-me vir assim...
Mas para onde é esta viagem?
Para o lago dos danados.
Cruz credo, excomungado!
E os que morrem confessados e perdoados
Onde têm sua embarcagem?
Não abuses de minha paciência, seu sapateiro deslavado!
Esta é a tua barca! Tu não passas de um danado!
Mas como pode ser isso?
Antes de morrer, fui confessado, perdoado e comungado!
Não mintas! Tu morreste excomungado!
Não confessaste coisa alguma, pois esperavas viver!
E antes disso, roubaste durante trinta anos o povo que te veio ver!
3
Sapateiro
Diabo
Sapateiro
Diabo
Sapateiro
Diabo
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Todos
Três
Embarca já cá nesta barca! Há muito que te espero!
Pois digo-te que não quero!
Hás de embarcar sem discussão!
Para o inferno é que não vou!
E as missas que assisti, de nada me valerão?
Ouvir missa, e continuar a roubar, é caminhar para o inferno!
E as ofertas que dei à igreja e aos finados, para onde me levarão?
E os dinheiros desviados, que dizes desses roubos então?
Vamos logo, para o lago dos danados, e sem discussão!
Gil Vicente foi o primeiro autor de teatro e também o primeiro grande poeta
português.
Essa obra aí, das quais vocês estão vendo uma pequena compilação, chama-se
“Auto da Barca do Inferno”.
Nela, como se pode notar nesse pequeno trecho, estão presentes algumas das
principais características da poesia Humanista.
O poema declamado.
O aspecto moral e religioso.
E a união da poesia com o teatro.
E agora passemos logo a próxima parte desse espetáculo, antes que este diabo nos
faça entrar a todos nesta barca!
E qual é a próxima parte?
A parte 3!
Parte 3 – Classicismo
Todos
Parte 3. O Classicismo!
Camões
As armas e os barões assinalados
Que, da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo reino, que tanto sublimaram.
Um
Os Lusíadas, de Luis Vaz de Camões, é o maior poema épico da História da Língua
Portuguesa!
Dois
E Camões é considerado um dos maiores, senão o maior poeta da Língua
Portuguesa de todos os tempos!
Três
E Camões também é o maior expoente do movimento poético-literário intitulado:
Classicismo!
Quatro
Universalismo!
Um
Racionalismo!
Dois
Antropocentrismo!
Três
Paganismo!
Quatro
Neoplatonismo!
Um
E todas as referências à cultura grega, possíveis e imagináveis!
Dois
Essas são as principais características do Classicismo!
4
Três
Por outro lado, o Classicismo também marca a criação do poema lírico e a
instituição do soneto.
Quatro
Sonetos são a marca do apuro formal que se revela na poesia a partir do
Classicismo!
Um
Sonetos são formados por dois quartetos e dois tercetos.
Dois
Quartetos: estrofes com quatro versos cada.
Três
Tercetos: estrofes com três versos cada.
Quatro
ersos com até dez sílabas métricas...
Um
Rimas consoantes e ricas...
Dois
Eis a poesia do Classicismo e do gênio Luís de Camões!
Camões
Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Três
Quatro
Três
E antes que todos nós morramos de amor, nos braços de Camões e de todo esse
lirismo do Classicismo, passemos logo à próxima parte...
qual é a próxima parte?
A parte 4!
Parte 4 – Barroco
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Parte 4. O Barroco!
Idade Média. Domínio total e absoluto da Igreja Católica sobre a sociedade.
Renascimento. Fim da Idade Média. Reforma Religiosa.
Surge o Luteranismo, o Calvinismo e o Anglicanismo!
E para conter a revolta que ameaça o império da hegemonia católica...
Surge a Contra-Reforma!
Fervor religioso!
Passionalidade!
A antítese, as ideias contrárias, o paradoxo!
Eis o Barroco!
Uma nova maneira de ver e pensar o mundo toma conta da Espanha, da Itália, da
França, de Portugal, enfim... de toda a Europa!
Tão forte que chegou até o Brasil!
Século XVI. O Brasil finalmente é descoberto.
E o primeiro movimento poético-literário que chega ao país do carnaval, é o
melancólico, comovedor e rebuscado... Barroco!
5
G. de Mattos
Meu Deus, que estais pendente em um madeiro,
Em cuja lei protesto viver,
Em cuja santa lei hei de morrer
Animoso, constante, firme, e inteiro.
Neste lance, por ser o derradeiro,
Pois vejo a minha vida anoitecer,
É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um Pai manso Cordeiro.
Mui grande é vosso amor, e meu delito,
Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito.
Esta razão me obriga a confiar,
Que por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor de me salvar.
Um
No Brasil, o Barroco teve início em 1601, com a publicação do poema épico
Prosopopéia, de Bento Teixeira.
Dois
Mas, o mais importante poeta brasileiro do período Barroco foi Gregório de Mattos.
Esse cara aí, que declamou esse poema tão lindo que nos fez chorar a todos...
Três
Pois é. Era justamente essa a intenção do Barroco: Comover.
Quatro
Ao contrário do pensamento Renascentista, que era racional e tinha ideias
antropocentristas, o Barroco é totalmente sentimental e teocentrista, ou seja, Deus
no centro.
Um
Tanto, que o nome desse poema aí é “A Jesus crucificado, estando o poeta para
morrer”. Vejam que coisa mais emocionante.
Não, não, gente. É muito emocionante! Nem sei o que dizer...
E antes que todos nós nos desmanchemos em tantas lágrimas, passemos logo à
próxima parte.
qual é a próxima parte?
A parte 5!
Dois
Três
Quatro
Três
Parte 5 – Arcadismo
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Parte 5. O Arcadismo!
O pastoril...
O bucólico...
A natureza amena...
A busca do equilíbrio! A revolta contra o colonialismo! A traição à coroa portuguesa!
A inconfidência!
6
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Todos
Um sentimento pré-romântico tomando conta dos poetas!
E nesse cenário, surge Tomás Antônio Gonzaga!
Um português naturalizado brasileiro que, assim como Tiradentes e tantos outros,
lutou pela Independência do Brasil!
Tanto, que acabou na prisão!
E foi na prisão, que Gonzaga, que tinha por nome arcádico Dirceu, concluiu o seu
poema mais importante.
Marília de Dirceu!
Gonzaga
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’ expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!
Três
Acusado de conspiração e preso em 1789, Gonzaga cumpriu sua pena de três anos
na Fortaleza da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro.
Quatro
Ao ser preso, teve seus bens confiscados.
Um
Foi separado de sua amada, Maria Doroteia, para quem escreveu este poema...
Dois
E permaneceu em reclusão por três anos, durante os quais escreveu a maior parte
das liras atribuídas a ele, pois não há registros de assinatura em qualquer um de
seus poemas.
Três
Em 1792, sua pena é comutada em degredo e o poeta é enviado a costa oriental da
África, em Moçambique, onde morre, em 1810.
Todos
E agora?
Três
E agora, a parte 6!
Parte 6 – Romantismo
Todos
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Parte 6. O Romantismo!
Lirismo...
Individualismo...
Subjetivismo...
Egocentrismo...
Medievalismo...
Indianismo...
Naturalismo...
Exagero...
Fuga da realidade...
A busca pelo exótico e pelo inóspito...
A idealização do mundo e da mulher...
E a extrema depressão, causada justamente por essa idealização não se
concretizar no mundo real.
Eis as características principais de um dos principais movimentos literários de que já
se teve notícia e de uma das principais maneiras de se pensar ainda tão presente
em nossos dias... O Romantismo!
O Romantismo, no Brasil, inicia em 1836, com a publicação do livro: “Suspiros
poéticos e saudades”, de Gonçalves de Magalhães.
7
Três
Mas, ao longo do tempo, podemos dividi-los em três fases.
Todos
Primeira fase!
Quatro
Idealização do Índio!
Um
Exaltação da Pátria!
Dois
Culto à natureza!
G. Dias
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, à noite –
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Todos
Segunda fase!
Três
Pessimismo!
Quatro
Narcisismo!
Um
Angústia!
Dois
Gosto pela morte!
Três
O mal do século!
A. de Azevedo
Se eu morresse amanhã, viria ao menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria
Se eu morresse amanhã!
Quanta glória pressinto em meu futuro!
Que aurora de porvir e que manhã!
Eu perdera chorando essas coroas
Se eu morresse amanhã!
8
Que sol! que céu azul! que dove n'alva
Acorda a natureza mais louçã!
Não me batera tanto amor no peito
Se eu morresse amanhã!
Mas essa dor da vida que devora
A ânsia de glória, o dolorido afã...
A dor no peito emudecera ao menos
Se eu morresse amanhã!
Todos
Terceira fase!
Um
Transição para o Realismo.
Dois
Sensualidade.
Três
Combate à escravidão.
Castro Alves
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... Estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras, moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente. . .
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais...
Qual um sonho dantesco as sombras voam!...
Gritos, ais, maldições, preces ressoam!
E ri-se Satanás!...
Parte 7 – Parnasianismo
Todos
Olavo Bilac
Parte 7. O Parnasianismo!
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Um
O parnasianismo foi um movimento literário essencialmente
poético, contemporâneo do Realismo e do Naturalismo.
Dois
O nome “Parnasianismo” vem de Monte Parnaso, a montanha que, na mitologia
grega era consagrada a Apolo e às musas.
Três
Mais uma vez, os autores procuravam recuperar os valores estéticos da Antiguidade
Clássica.
Quatro
Sacralidade da forma.
Um
Respeito às regras de versificação.
9
Dois
Preciosismo rítmico e vocabular.
Três
Rima rica e estruturas fixas.
Quatro
Preferência pelos sonetos.
Um
Objetividade e impessoalidade.
Dois
Combate ao exagerado subjetivismo romântico.
Três
Metrificação Rigorosa.
Quatro
Descritivismo.
Um
Preferência por temas históricos, objetos e paisagens.
Dois
A arte pela arte.
Três
E como essa é uma escola literária série, perfeccionista e precisa, não faremos
brincadeiras ou piadinhas.
Quatro
Trataremos apenas de apresentá-lo e pronto.
Um
Por favor, senhor Olavo Bilac, o senhor, que é o poeta mais representativo desse
movimento, queira brindar-nos com um de seus poemas.
Olavo Bilac
Muito obrigado. Recitarei: Ouvir estrelas, de minha própria autoria.
―Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizes, quando não estão contigo?"
E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas".
Dois
Três
E agora?
E agora, a parte 8.
Parte 8 – Pré-modernismo
Todos
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Parte 8. O Pré-modernismo!
Cubismo!
Valorização do presente!
Subjetivismo!
Ilogicidade!
Enumeração caótica!
Humor!
Palavras em liberdade!
Invenção de palavras!
10
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Dois
Três
Quatro
Um
Todos
Augusto dos Anjos
Substantivos soltos, jogados de forma anárquica!
Verso livre!
Negação da estrofe, da rima e da harmonia!
Negação dos verbos, adjetivos e pontuação!
Futurismo!
Expressionismo!
Dadaísmo!
Surrealismo!
Busca da emancipação do homem fora do lógico, da razão, da família, da pátria, da
moral e da religião!
Importância ao sonho e à exploração do inconsciente, praticando o automatismo
psíquico e a expressão, libertada da censura e sem o controle da razão!
Eis o Pré-Modernismo!
Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede!
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
Um
Esse aí é o Augusto dos Anjos, o cara mais esquisitão da poesia brasileira.
Dois
Também é conhecido como um dos poetas mais críticos do seu tempo.
Três
Até hoje sua obra é admirada tanto por leigos como por críticos literários.
Quatro
Sua poesia chocou a muitos, principalmente aos poetas parnasianos.
Dois
Hoje em dia, diversas editoras brasileiras publicam edições do seu único livro: Eu e
Outros Poemas.
Três
Sua linguagem é orgânica, muitas vezes cientificista e agressivamente crua...
Quatro
Mas sempre com ritmados jogos de palavras, ideias, e rimas geniais.
Um
Ele causava repulsa na crítica e no grande público da época.
Dois
E somente apresentou grande vendagem anos após a sua morte.
Três
As imagens da obra poética de Augusto dos Anjos são de dor, horror e morte.
Quatro
Há, em Augusto dos Anjos, uma solidariedade universal, ligada à desumanização
da natureza e até do próprio ser humano, o que reduziria todos os seres a uma só
condição.
Um
Marco de uma época e de todas as épocas...
Dois
Augusto dos Anjos...
11
Três
O poeta mais importante do Pré-modernismo brasileiro e um dos caras mais
interessantes, curiosos e intrigantes de todos os tempos!
Dois
E agora?
Um
E agora, a parte 9!
Parte 9 – Modernismo
Todos
Parte 9. O Modernismo!
Um
Tudo que se pensava durante o Pré-modernismo, amadureceu e se concretizou
após a Semana de Arte Moderna, de 1922.
Dois
É por isso que nem precisamos dizer nada sobre o Modernismo Brasileiro.
Três
Basta que se apresente os seus maiores poetas!
Osvald de Andrade
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
o português!
Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
na cama que escolherei.
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
12
Mário de Andrade
Eu insulto o burguês! O burguês níquel,
o burguês-burguês!
A digestão bem-feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo1 Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fora! Fora o bom burguês!...
Vinícius de Moraes
Para que vieste na minha janela meter o nariz?
Se foi por um verso, não sou mais poeta. Ando tão feliz.‖
Cecília Meireles
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?
Mario Quintana
Na mesma pedra se encontram,
Conforme o povo traduz,
Quando se nasce - uma estrela,
Quando se morre - uma cruz.
Mas quantos que aqui repousam
Hão de emendar-nos assim:
"Ponham-me a cruz no princípio...
E a luz da estrela no fim!"
Drummond
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra
Parte final - O final
Todos
Todos
Parte final. O final!
E para terminar uma peça sobre a história da poesia
Nada melhor que dizer versos com rima
13
Mesmo que estas sejam vazias
Da Guarvaia à Pedra no caminho
Como bem puderam ver e ouvir vocês
A história mudou, mas ainda é a mesma,
E da mesma maneira ainda há de acontecer
E já que estamos nos despedindo,
mais um Drummond nunca é demais
E a pergunta que fica no ar, é também poema que faz pensar
E drummondiando, e poetanto,
Vamos todos, drummondiando, poetar...
Todos
Que vai ser quando crescer?
Vivem perguntando em redor. Que é ser?
É ter um corpo, um jeito, um nome?
Tenho os três. E sou?
Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito?
Ou a gente só principia a ser quando cresce?
É terrível, ser? Dói? É bom? É triste?
Ser; pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas?
Repito: Ser, Ser, Ser. Er. R.
Que vou ser quando crescer?
Sou obrigado a? Posso escolher?
Não dá para entender. Não vou ser.
Vou crescer assim mesmo.
Sem ser Esquecer.
Ivan Lovison. Dois Vizinhos. 25 de fevereiro de 2010.
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Texto - COOPERMUNDI