ORGANIZAÇÃO E RELAÇÕES DE TRABALHO NO SETOR DE SERVIÇOS DE SAÚDE Econ. Luiz Marcos de Oliveira Silva (Universidade Federal de Sergipe) 10 de Novembro de 2010 JUSTIFICATIVA • Importância econômica e social do setor de saúde; • Peso nos gastos públicos; • Representatividade das ocupações no conjunto do mercado de trabalho; • Perfil diferenciado das ocupações. OBJETIVO GERAL Dimensionar e analisar a evolução do mercado de trabalho no âmbito do setor de saúde brasileiro, principalmente a partir da década de 1990, desenvolvendo um estudo específico sobre as formas de organização e as relações de trabalho dos profissionais diretamente ligados à prestação de serviços de saúde. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Apresentar as transformações da gestão da força de trabalho no Brasil, que se assentavam em um quadro macroeconômico de ajuste estrutural; • Analisar o processo de desestruturação e desregulamentação do trabalho, considerando principalmente as reformas trabalhistas empreendidas durante o governo FHC; • Discutir em que medida se pode estender essa análise ao caso do setor de serviços de saúde; • Apresentar as particularidades do setor no processo de flexibilização das relações de trabalho, associando com o desenho institucional do sistema de saúde brasileiro. SEÇÕES DO TRABALHO • • • • Capítulo 1: Características e especificidades do setor de serviços de saúde; Formas de organização do trabalho; Novos arranjos entre os setores público e privado nos países avançados; Desenvolvimento capitalista no setor de saúde brasileiro. SEÇÕES DO TRABALHO Capítulo 2: • Estruturação e regulamentação do mercado de trabalho em saúde; • Dimensão do emprego no macro-complexo da saúde; • Análise do perfil dos ocupados em saúde e dos trabalhadores que compõem o núcleo do setor de atenção à saúde no Brasil. SEÇÕES DO TRABALHO Capítulo 3: • Quadro macroeconômico; • Reflexos sobre o mercado de trabalho; • Modificações no desenho institucional do sistema de saúde brasileiro; • Proliferação de modalidades alternativas de vinculação e remuneração no setor de saúde. CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS DE SAÚDE • Efeitos de encadeamento; • Uso intensivo de mão-de-obra; • Caráter cumulativo e não-substitutivo das tecnologias médicas; • Demanda imprevisível; • Capacidade ociosa; CARACTERÍSTICAS DOS SERVIÇOS DE SAÚDE (Cont.) • Baixa produtividade; • Custos crescentes; • Subjetividade médico-paciente; • Possibilidade de indução da procura; • Ocupações regulamentadas. QUANTO VALE A VIDA? “A economia, enquanto ciência da repartição eficiente dos recursos, pode emancipar-se da aritmética. Basta integrar o fato de que uma só vida humana pode assumir valores muito diferentes em função das circunstâncias” (BERÉSNIAK e DURU, 1999: 204). QUANTO VALE A VIDA? “O problema suscitado é o do relacionamento de uma procura infinita com um sistema finito... Será necessário decidir que tal doença, tal espécie de sofrimento, não irá dispor de qualquer proteção, que em certos casos a própria vida não terá nenhuma salvaguarda... É nesta circunstância que uma certa racionalidade se torna, em si mesma, escandalosa” (FOUCAULT apud BERÉSNIAK e DURU, 1999: 202). SUBSUNÇÃO DO TRABALHO INTELECTUAL NO CAPITAL • Complexidade do setor de saúde; • Dominação da classe médica sobre o processo de trabalho em saúde; • Legitimação da acumulação de capital; • Dependência do instrumental para procedimentos diagnósticos e terapêuticos; • Proliferação de modalidades alternativas de vínculação e remuneração; • Diminuição do status liberal da profissão. “(...) a capitalização da medicina ao mesmo tempo que reduz o trabalho puramente liberal à condição de forma residual, recria condições para a expansão do assalariamento e também do exercício autônomo, sendo esta última a forma predominante. Nesse sentido, não há contradição entre o trabalho autônomo e o processo de acumulação de capital. Ao contrário, este tipo de inserção no mercado pode inclusive assegurar rentabilidade às empresas no setor na medida em que o trabalho autônomo não implica em encargos trabalhistas” (Mehry et al (1989: 13). ESTIMATIVA DO EMPREGO GERADO NAS ATIVIDADES DE ATENDIMENTO À SAÚDE (1991) SETORES Núcleo OCUPAÇÕES Afins Setores Fundamentais Administração Pública Atividades Complementares Atividades de Apoio Demais Setores 917.987 31.264 26.156 27.389 123.729 19.625 24.568 11.493 50.456 Setor Saúde Núcleo 1.031.093 1,90% Setor Saúde Total 2.287.645 4,10% Total de Ocupados 55.293.313 100,00% Fonte: IBGE, Censo Demográfico (DEDECCA et al, 2005). Demais Corrigidas 959.330 57.125 38.521 ESTIMATIVA DO EMPREGO GERADO NAS ATIVIDADES DE ATENDIMENTO À SAÚDE (2000) SETORES Núcleo OCUPAÇÕES Afins Setores Fundamentais Administração Pública Atividades Complementares Atividades de Apoio Demais Setores 1.033.730 256.208 21.426 74.077 138.113 26.137 34.277 16.515 62.369 Setor Saúde Núcleo 1.388.294 2,10% Setor Saúde Total 2.735.889 4,20% 65.629.892 100,00% Total de Ocupados Fonte: IBGE, Censo Demográfico (DEDECCA et al, 2005). Demais Corrigidas 819.189 224.521 29.326 EMPREGO FORMAL EM SAÚDE (2000) Fonte: MTE - RAIS 2000. Extraído de Dedecca et al (2005a: 135). NÍVEL DE FORMALIZAÇÃO • No ano 2000, cerca de 1,9 milhão de empregados do setor de saúde pertenciam ao mercado de trabalho formal (69,4% das ocupações); • Mas apenas 724,6 mil (52,2%) dos ocupados em atividades do núcleo do setor de saúde estavam em ocupações formalizadas. Fonte: RAIS DISTRIBUIÇÃO REGIONAL DOS OCUPADOS EM SAÚDE Distribuição dos ocupados em saúde segundo a região 57,9 50,7 51,7 21,5 17,1 14,6 15,5 3,9 5,7 censo de 1991 Norte 21,5 15,1 7,3 5,9 censo de 2000 Nordeste Sudeste 5,2 pnad de 2002 Sul Centro-Oeste 7,3 NÚMERO DE MÉDICOS POR MIL HABITANTES – 1991 Fonte: IBGE, Censo Demográfico (Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil). NÚMERO DE MÉDICOS POR MIL HABITANTES – 2000 Fonte: IBGE, Censo Demográfico (Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil). NÍVEIS DE REMUNERAÇÃO Diferenciais de rendime nto hora entre grupos ocupacionais (1991 e 2000) Grupos ocupacionais Brasil Valores Absolutos (em reais) 1991 2000 Renda Saúde (A) 9,6 7,79 Renda Ocupação Agrícola (B) 3,56 3,06 Renda Ocupação Urbana (C) 8,58 5,37 Fonte: IBGE, Censos Demográficos (DEDECCA et al, 2005). Diferença relativa de rendimento hora (%) 1991 2000 (A) - (B) 169,60% 154,60% (A) - (C) 11,90% 45% RENDIMENTOS POR GRAU DE INSTRUÇÃO 35,0 Rendimento por hora 29,9 30,0 25,0 18,8 20,0 15,0 9,9 10,0 5,0 6,3 3,4 4,5 2,7 2,9 6,1 3,5 3,3 4,2 0,0 Analf. 1º Incomp. 1º Comp. 2º Incomp. Grau de instrução Censo 1991 Censo 2000 Fonte: IBGE, Censos Demográficos (DEDECCA et al, 2005). 2º Comp. Superior GRAU DE INSTRUÇÃO Distribuição da população ocupada e dos ocupados no setor de saúde segundo o grau de instrução (censo 1991 e 2000) Ocupados na Saúde População Ocupada 1991 2000 1991 2000 Analfabetos 6,0 1,6 17,4 8,4 1° grau incompleto 41,0 22,4 47,0 45,9 1° grau completo 13,1 10,0 9,7 10,0 2° grau incompleto 6,3 7,9 4,6 6,7 2° grau completo 14,9 29,9 11,7 18,0 Superior 18,7 28,2 9,7 11,1 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: IBGE, Censos Demográficos. PROPORÇÃO DE OCUPADOS POR GÊNERO - 2000 Ocupados em saúde no Brasil – 2000 P roporçã o e ntre hom e ns e m ulhe re s (ce nso de 2000) 69,5 62,1 67,1 70,4 75,2 69,0 30,5 37,9 32,9 29,6 24,8 31,0 Total Norte Nordes te Sudes te Sul CentroOes te homens mulheres Fonte: IBGE, Censo Demográfico. POSIÇÃO NA OCUPAÇÃO Distribuição dos ocupados na saúde e do total da população ocupada segundo a posição na ocupação, Brasil - 2000 (%) 50,01 40,29 27,64 22,01 20,19 8,65 Empregado do Setor Empregado do Setor Privado com carteira Privado sem carteira 6,63 Empregado do Setor Público Saúde Fonte: IBGE, Censo Demográfico. 16,46 Brasil 4,66 Autônomo ou contaprópria 3,4 Empregador IMPACTOS DAS REFORMAS SOBRE O DESEMPENHO DO PESSOAL DE SAÚDE Principais aspectos das reformas no setor de saúde Descentralização; Modificações em funções e estruturas; Modificações no financiamento e nas formas de remuneração; Novas modalidades de gestão: externalização ou contratação de terceiros, compra de serviços, autonomia de serviços, etc; Modificações nos modelos de atenção; Extensão da cobertura. Implicações para o trabalho do pessoal de saúde Maior resolução dos serviços; Novas funções e áreas de competência; Exigência de maior qualidade e produtividade; Mudanças na organização do trabalho e conformação de equipes; Ênfase no desempenho e sua avaliação; Modificações nos sistemas de incentivo; Regulação dos processos de desenvolvimento de recursos humanos. Fonte: Programa de Desenvolvimento de Recursos Humanos, OPS (1999). Adaptado de Quintana et al (2002: 192). FLEXIBILIZAÇÃO DAS MODALIDADES DE VINCULAÇÃO E REMUNERAÇÃO NO SETOR DE SAÚDE • Modelo baseado em serviços primários privilegia trabalho de baixa produtividade + contínua expansão da demanda por serviços de saúde = alta elasticidade-emprego. • É justamente na tentativa de burlar os constrangimentos econômicos e de ordem legal que os gestores de saúde estão adotando formas “flexíveis” de contratação e remuneração dos serviços. EXEMPLOS DE VINCULAÇÃO NO SETOR DE SAÚDE • • • • • • • • • • • Regime Estatutário Federal, Estadual ou Municipal; Emprego Público regido pela CLT; Regime CLT, para o setor privado; Contratos temporários ou por tempo determinado (que deveriam existir apenas “em caráter estritamente excepcional”); Cargos em comissão; Cooperativas de trabalho (credenciamento de profissionais); Bolsas de trabalho; Contratos de gestão com organizações sociais; Convênios com Org. da Soc. Civil de Interesse Público (OSCIP); Terceirizações de serviços por meio de empresas privadas; “Triangulações” por intermédio de Universidades, fundações de apoio, núcleos de ensino e pesquisa, associações comunitárias, empresas filantrópicas ou lucrativas etc. TIPOS DE REMUNERAÇÃO • Salário por cargo e a função exercida; • Pagamento por capitação; • Salário variável, por produtividade; • Pagamento por procedimento; • Pagamento por resultado; • Outras formas mistas. NÚMERO DE COOPERATIVAS, COOPERADOS E EMPREGADOS, POR SEGMENTO (2003) Ramo Agropecuário Consumo Crédito Educacional Especial Habitacional Infra-estrutura Mineral Produção Saúde Trabalho Turismo e Lazer Transporte Total Cooperativas % Cooperados % Empregados % 1.519 158 1.115 303 7 314 172 34 113 878 2.024 12 706 7.355 20,65 2,15 15,16 4,12 0,10 4,27 2,34 0,46 1,54 11,94 27,52 0,16 9,60 100,00 940.482 1.920.311 1.439.644 98.970 2.083 104.908 575.256 48.830 9.559 261.871 311.856 396 48.552 5.762.718 16,32 33,32 24,98 1,72 0,04 1,82 9,98 0,85 0,17 4,54 5,41 0,01 0,84 100,00 110.910 7.219 23.291 2.874 6 2.472 5.500 35 315 23.267 4.036 2 2.099 182.026 60,93 3,97 12,80 1,58 0,00 1,36 3,02 0,02 0,17 12,78 2,22 0,00 1,15 100,00 Fonte: Organização das Cooperativas Brasileiras, 2003. Disponível em: <www.ocb.org.br> Posição em dezembro de 2003. NÚMERO DE COOPERATIVAS, COOPERADOS E EMPREGADOS, POR SEGMENTO (2009) Ramo de Atividade Cooperativas Agropecuário 1.615 Consumo 128 Crédito 1.100 Educacional 304 Especial 15 Habitacional 253 Infraestrutura 154 Mineral 58 Produção 226 Saúde 871 Trabalho 1408 Transporte 1100 Turismo e Lazer 29 Total 7.261 % Associados 22,24% 942.147 1,76% 2.304.830 15,15% 3.497.735 4,19% 55.838 0,21% 469 3,48% 108.695 2,12% 715.800 0,80% 20.031 3,11% 11.396 12,00% 225.980 19,39% 260.891 15,15% 107.109 0,40% 1.489 100,00% 8.252.410 % 11,42 27,93 42,38 0,68 0,01 1,32 8,67 0,24 0,14 2,74 3,16 1,30 0,02 100,00 Empregados 138.829 9.702 42.802 3.716 9 1.406 6.045 103 2.936 55.709 4.243 8.660 30 274.190 % 50,63 3,54 15,61 1,36 0,00 0,51 2,20 0,04 1,07 20,32 1,55 3,16 0,01 100,00 Fonte: Organização das Cooperativas Brasileiras, 2010. Disponível em: <www.ocb.org.br> Posição em dezembro de 2009. CONCLUSÕES (I) • O setor de saúde adquiriu um expressivo grau de complexidade nas duas últimas décadas; • Proliferaram – em número e em importância econômica – as empresas de intermediação de serviços de saúde, exemplificadas pelas empresas de medicina de grupo, autogestão / planos administrados, cooperativas médicas e seguradoras; • A prática e a organização da atenção a saúde seguiam a duas lógicas distintas: a do trabalho independente e a lógica do trabalho coletivo; CONCLUSÕES (II) • Foi possível perceber, no início da década, a aceleração do processo de precarização do trabalho no setor de saúde brasileiro; • Reposicionamento do Estado trabalho Padrão de regulação do Processo de desregulamentação (ou perda de direitos) e de flexibilização das relações de trabalho; • Setor de saúde: Reforma do Estado + Municipalização + Constrangimentos Econômicos e Legais Formas “atípicas” de contratação (precárias e irregulares). RECOMENDAÇÕES • O setor ainda é responsável por um dos melhores perfis do mercado de trabalho: 1. Nível de formalização do emprego; 2. Padrão de remuneração; 3. Grau de instrução. • Portanto, é fundamental que sejam realizados investimentos em políticas de saúde voltadas à elevação do bem estar da população. Luiz Marcos de Oliveira Silva Economista (UFS) e Mestre em Economia Social e do Trabalho (IE/UNICAMP) Coordenador Executivo do Campus de Ciências da Saúde de Lagarto [email protected]