Jurisprudencialização do Direito Reflexões no contexto da Processualidade Democrática GUSTAVO DE CASTRO FARIA Mestre em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro. Professor dos cursos de pós-graduação lato sensu em Direito Processual e Poder Judiciário do Instituto de Educação Continuada – PUC Minas. Professor do curso de pós-graduação lato sensu em Direito Processual Civil Constitucional da Faculdade Pitágoras Divinópolis. Professor dos cursos de pós-graduação em Direito Processual Civil e Direito Público do Instituto Universitário Brasileiro – IUNIB. Professor da Faculdade de Direito Padre Arnaldo Janssen. Professor do curso de Direito da Faculdade de Minas – FAMINAS BH. Professor de cursos preparatórios para concursos públicos. Advogado. Jurisprudencialização do Direito Reflexões no contexto da Processualidade Democrática Belo Horizonte 2012 CONSELHO EDITORIAL Álvaro Ricardo de Souza Cruz André Cordeiro Leal André Lipp Pinto Basto Lupi Antônio Márcio da Cunha Guimarães Carlos Augusto Canedo G. da Silva David França Ribeiro de Carvalho Dhenis Cruz Madeira Dircêo Torrecillas Ramos Emerson Garcia Felipe Chiarello de Souza Pinto Florisbal de Souza Del’Olmo Frederico Barbosa Gomes Gilberto Bercovici Gregório Assagra de Almeida Gustavo Corgosinho Jamile Bergamaschine Mata Diz Jean Carlos Fernandes Jorge Bacelar Gouveia – Portugal Jorge M. Lasmar Jose Antonio Moreno Molina – Espanha José Luiz Quadros de Magalhães Leandro Eustáquio de Matos Monteiro Luciano Stoller de Faria Luiz Manoel Gomes Júnior Mário Lúcio Quintão Soares Nelson Rosenvald Renato Caram Rodrigo Almeida Magalhães Rogério Filippetto Rubens Beçak Vladmir Oliveira da Silveira Wagner Menezes É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio eletrônico, inclusive por processos reprográficos, sem autorização expressa da editora. Impresso no Brasil | Printed in Brazil Arraes Editores Ltda., 2012. Plácido Arraes Editor Avenida Brasil, 1843/loja 110, Savassi Belo Horizonte/MG CEP 30.140-002 Tel: (31) 3031-2330 Coordenação Editorial: Fabiana Carvalho Capa: Vladimir O. Costa e Charlles Hoffert Diagramação: Danilo Jorge da Silva Revisão: Alexandre Bomfim F224 Faria, Gustavo de Castro Jurisprudencialização do direito: reflexões no contexto da processualidade democrática / Gustavo de Castro Faria. – Belo Horizonte: Arraes Editores, 2012. 169p. ISBN: 978-85-62741-62-3 1. Processo civil. 2.Direito – Jurisprudencialização. I. Título. CDD: 341.46 CDU: 347.91/.95 Elaborada por: Maria Aparecida Costa Duarte CRB/6-1047 www.arraeseditores.com.br [email protected] Belo Horizonte 2012 A Deus, minha verdade, por tanta luz, o que aumenta a cada dia minha fé. Aos meus pais, parte de mim, porque tudo que faço, já fiz e farei é pensando neles. À minha doce Camila, companhia de amor tranquilo e incentivador, que me completa absolutamente. À minha madrinha Helô, que, por me ver exclusivamente com os olhos do coração, sempre confiou tanto no meu trabalho. Aos meus grandes amigos, sempre ao meu lado, que só me trazem bons momentos. V Agradecimentos Ao Professor Rosemiro Pereira Leal, expoente máximo no estudo do Direito Processual Democrático, que, com a força de sua incontestável genialidade, impede-me de abandonar o status de orientando e renunciar à sua companhia acadêmica. Aos Professores Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias, Márcio Luís de Oliveira e André Cordeiro Leal, exponenciais exemplos de proficiência acadêmica, pela honra que me deram ao recomendarem a publicação deste trabalho. Ao Dr. André Faria, que sempre me fez acreditar ser maior do que realmente sou, minha eterna gratidão por seu magistério de vida e de advocacia. Aos amigos de jornada no Instituto de Educação Continuada – IEC PUC Minas, em especial aos Professores João Antônio Lima Castro, Sérgio Henriques Zandona Freitas, Carla Clark e Fabrício Veiga Costa, pelo apoio e confiança que sempre me dedicaram, meus sinceros agradecimentos. À Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, propiciadora da constante e proveitosa travessia entre a discência e a docência, enriquecendo a desafiadora trajetória acadêmica. Aos meus alunos, por todo carinho e respeito que me dedicam, retribuindo com sobras cada minuto de trabalho empregado no exercício da minha profissão. Ao editor Plácido Arraes, pela confiança, oportunidade e incentivo à produção jurídico-científica. VII “Imaginemos um jovem cientista que encontre um problema que não compreende. Que pode ele fazer? Sugiro que, mesmo que não o compreenda, pode tentar resolvê-lo e criticar a própria solução que lhe der. Visto que não entende o problema, sua solução será um malogro, fato que a crítica revelará. Deste modo, será dado um primeiro passo para indicar onde fica a dificuldade, e isto significa que será dado um primeiro passo para compreender o problema. Pois o problema é uma dificuldade, e compreender um problema consiste em descobrir que há uma dificuldade e onde a dificuldade se acha. E isto só pode ser feito descobrindo onde certas soluções de ‘prima facie’ não funcionam.” Karl Raymund Popper IX Sumário PREFÁCIO................................................................................................ XIII INTRODUÇÃO.......................................................................................1 Capítulo 1 DISCURSO IDEOLÓGICO E TEORIA CIENTÍFICA..................7 1 Considerações iniciais.......................................................................7 2 Ideologia e consenso acrítico...........................................................10 3 Ideologia e epistemologia científica...............................................19 3.1 Valoração da ideologia como contraponto argumentativo.19 3.2 Ideologia como técnica e a missão da ciência........................21 3.3 Ideologia e teoria científica.......................................................28 Capítulo 2 DISSENSO CRÍTICO E PROCESSO..................................................33 1 Verdade e conhecimento..................................................................33 2 Racionalidade crítica e rivalização teórica....................................36 3 Racionalismo e argumentação: o medium linguístico-processual na desconstrução do consenso acrítico....................42 4 Processo e participação como fator de legitimidade decisória..52 4.1 A conexão entre os princípios do contraditório e da fundamentação das decisões......................................................58 XI Capítulo 3 JURISPRUDENCIALIZAÇÃO DO DIREITO E PADRONIZAÇÃO DECISÓRIA.........................................................67 1 Efetividade do processo e consenso decisório..............................67 2 Da padronização decisória na legislação processual civil brasileira..............................................................................................72 3 Convergência entre os sistemas da civil law e da common law80 3.1 Da supervalorização de modelos estrangeiros........................80 3.2 Análise crítica da conjugação (e superação) dos sistemas da civil law e da common law..................................................85 3.2.1 Diversidade decisória e segurança jurídica no processo democrático............................................................................89 4 Razão normativa jurisprudencial e legitimidade decisória........97 4.1 Razão normativa e a “potência mística de imperatividade” 109 5 Súmulas e vícios de edição, interpretação e aplicação................113 6 Da vinculação às súmulas como critério objetivo para a promoção por merecimento............................................................118 7 Uniformização, estabilização e vinculação à jurisprudência no Projeto de Lei nº 8.046/2010 (novo Código de Processo Civil)...................................................122 7.1 Demandas repetitivas e o julgamento por amostragem.......127 8 Das “Câmaras Mistas de Revisão de Jurisprudência”: uma proposta de legitimação para a doutrina de precedentes...........133 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................137 REFERÊNCIAS........................................................................................141 XII Prefácio O professor Gustavo de Castro Faria vem dar a público a sua dissertação de mestrado (PUC Minas) que alcançou, em banca examinadora integrada por eminentes doutores em direito, a nota máxima de aprovação. O tema é deveras atualíssimo quanto ao alto grau de interesse que certamente despertará para o estudioso e praticante do direito: “Jurisprudencialização do Direito: reflexões no contexto da Processualidade Democrática”. Mais que uma proposta comparativa entre Jurisprudencialização e Processualização do direito, o que se nota na reflexão realizada pelo insigne e jovem professor é a sua profunda preocupação com o retrocesso a que a atuação do direito se vê exposta na prática dos tribunais ante as conquistas constitucionais obtidas no Brasil de 1988. Toda uma geração de juristas que esperava que os estudos do direito avançassem no Brasil após 1988 quedou-se em frustração continuada. A técnica e a ciência do direito a cada dia se associam à ideologia do pragmatismo que dogmaticamente insiste, com os aplausos obscurantistas de uma mídia nacionalmente orquestrada, em colocar a universidade a serviço de um empreendedorismo mercantilista orientado por uma econometria estratégica (dita economia!), voltada a promover um falso desenvolvimento autossustentável por campanhas retóricas de um voluntarismo patriótico e instintivo. Os conflitos jurídicos egressos dessa realidade paranoicamente homologada pela crença de que é possível aliar sustentabilidade e lucros crescentes, sem qualquer reflexão sobre a economicidade, são resolvidos pelo mito da sensibilidade e talento de integrantes de tribunais excelsos que, extrapolando a sua competência constitucional, ora criam direitos pela jurisprudência, ora a partir de leis por eles induzidas, transformando o direito num grande panorama casuístico engendraXIII do pelos próprios aparelhos da governança que colocam o carisma dos decisores (administradores, magistrados, parlamentares) como fundamento dos destinos nacionais. Nesses contornos fantasísticos, em que o direito continua sendo um acessório da economia neoliberal e social, a democracia instalada em 1988, com a edição de um estatuto constitucional equacionador de uma nova concepção de vida, liberdade e dignidade, não foi ainda objeto de estudo sério e rigoroso. É flagrante a ausência de suficientes investimentos em pesquisa jurídica nas bases orçamentárias das universidades, ficando estas na dependência de órgãos de fomento governamentais e empresariais que se regem pelo corporativismo de suas conveniências político-partidárias e de mercado ou de lideranças acadêmicas comprometidas com a mídia nacional e internacional do intercâmbio tecnológico, sem qualquer vinculação com a ordem econômica constitucionalizada no Brasil, que é jurídica, não contingenciável por políticas públicas de livre manejamento dos gestores do Estado. Em face de tantos desarranjos, o autor, já no introito de sua obra, põe em debate a ingente necessidade de se distinguir discurso ideológico e teoria científica em bases epistemológicas ainda não cuidadas pelos arautos da velha dogmática jurídica que melancolicamente ainda habita os pretórios e as academias do país. O consenso acrítico, que é hoje o êmulo dos pactos das governanças, é examinado pelo autor em seus tradicionais vértices do arcaísmo dos sistemas de civil e common law que, se não desconstruídos em seus conteúdos historicistas, são fatores de perenização de uma compreensão do direito em regime de perpétua colonização das consciências à serventia de um simulacro de democracia como mera expressão do escrutínio de um povo icônico secularmente capturado pela prudencialização eticista de uma prática de vida historicamente cruel e metafórica. Os itens trabalhados pelo autor são novidades que instigam uma contemporânea reflexão jurídica sobre a problemática paradoxal da multiplicação dos conflitos humanos pelas atividades dos próprios órgãos estatais encarregados de sua resolução. A partir do momento em que foi possível aos estudiosos do direito separar, com divisas nítidas, saber e conhecimento, tornou-se extremamente relevante explicitar o binômio repressivo de um saber-poder que, por si mesmo, justifica o exercício da arrogância monológica e apofântica de suas horrorizantes decisões. O julgamento por amostragem, oportunamente suscitado pelo autor em seus estudos, é exemplo de um poder decisório que se rende ao sistema probatício dos juízos ordálicos e tarifário que jamais atenderiam ao pleito de democracia pelo modelo da Constituição Brasileira de 1988, o que seria o mesmo que querer instalar incidentes de demandas repetitivas para a coletivização de julgamentos de causas ditas idênticas, a serviço da aceleração das decisões, sem apontar ex-ante os critérios legais de escolha da demanda-padrão como referente das repetições havidas. XIV Finalmente, o professor Gustavo sugere a criação de “Câmaras Mistas de Revisão Jurisprudencial”, que, embora não tenham sido objeto da dissertação, exibem um esforço que faz o jovem autor e professor de atenuar os efeitos perversos de uma jurisprudencialização inflacionária do direito brasileiro, que torna os tribunais, como no velho common law, o parlamento autêntico da produção das normas, eternizando, assim, a ideologia do estado de exceção, que é o lugar em que as ditaduras se disfarçam de democracia. No mais, o que esperamos é que a obra ora publicada ingresse nas salas de aula das Faculdades de Direito que possam ter ainda algum comprometimento com o pensamento não dogmático da ciência jurídica, e que, lida por uma nova geração de pesquisadores, possa contribuir para a decifração gradual das formas jurídicas de dominação que secularmente escravizam os povos. Deixo aqui, como orientador que fui da proveitosa dissertação do autor, os meus agradecimentos pelo honroso convite que recebi para prefaciá-la. Belo Horizonte, 22 de junho de 2012 ROSEMIRO PEREIRA LEAL Professor da UFMG e da PUC Minas (bacharelado, mestrado e doutorado em Direito Processual). Presidente do Instituto Popperiano de Estudos Jurídicos e Presidente-Fundador da Associação dos Advogados de Minas Gerais. XV