Liberdade Identitária como Direito Fundamental 1. Introdução Sexual e Reprodutiva: direitos e desafios em um mundo multicultural Anna Emília Arend dos Santos Fernanda Maciel Leão Larissa da Silva Araújo Luisa Teresa Hedler Ferreira A saúde é entendida de maneira abrangente pela Organização Mundial da Saúde (OMS), sendo compreendida como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças ou enfermidades” (OMS, 1946).2 Dessa forma, a abordagem da questão da saúde sexual deve entrar no âmbito do bem-estar dos indivíduos, inclusive no que diz respeito à sexualidade, indo além da ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis e mortes relacionadas direta ou indiretamente ao comportamento sexual e reprodutivo. Isso inclui, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, “uma abordagem positiva e respeitosa da sexualidade e das relações sexuais, bem como a possibilidade de ter experiências sexuais seguras e prazerosas, livres de coerção, discriminação e violência”(OMS, 2010). A saúde sexual engloba também a questão da saúde reprodutiva, observando o bem-estar de todos os envolvidos no processo, com especial atenção para a saúde materna e infantil. Esse artigo pretende abordar as principais questões relativas à saúde sexual e reprodutiva presentes na atualidade, considerando-as como um problema de saúde pública que se relaciona com os determinantes sociais da saúde (BUSS, PELLEGRINI , 2007) e com os padrões culturais das populações e grupos sociais. Este tema, em sua visão contemporânea, considera as questões de gênero, de diversidade sexual e as questões geracionais como elementos que estabelecem maior ou menor possibilidade de vivenciar a sexualidade e a reprodução como eventos da vida. Promover uma melhoria na saúde sexual e reprodutiva numa perspectiva de universalização do acesso torna-se um desafio ainda maior quando se tem em mente a diversidade de culturas existentes e suas mais diferentes visões acerca da sexualidade humana. As culturas locais devem ser levadas em consideração na formulação e promoção de políticas relacionadas a essa questão, dentro de patamares mínimos de respeito aos direitos humanos. O presente artigo aborda um conjunto de temas que compõem a extensa pauta da saúde sexual e reprodutiva: o aborto, um tema de saúde e de direitos na medida em que sua realização precária e insegura se relaciona com a ilegalidade da prática em muitos países, expondo mulheres e adolescentes a sérios riscos. No âmbito sexual, a violência praticada contra as mulheres e homossexuais é uma questão relevante que assume várias formas, indo desde o estupro até a mutilação genital, o Agradecemos muito Télia Negrão por seus preciosos comentários e sua valiosa contribuição, sem os quais esse artigo não teria a qualidade atual. 2 Para maiores informações, ver Preâmbulo da Constituição da OMS de 1946 em <http://www.promocaodesaude.unifran.br/docs/ConstituicaodaWHO1946.pdf >. Acesso em 21 Agosto de 2010. 491 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental que afeta a saúde física, psicológica, atinge a cidadania e nega na prática os direitos sexuais. Também o planejamento familiar, que inclui a informação, a educação sexual, o acesso a métodos contraceptivos e a anticoncepção de emergência entra nesta discussão, pois se trata de um tema que articula sexualidade e reprodução, e uma vez mais evidencia a estreita relação entre saúde e direitos. A ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), as visões e estigmas sobre elas e as diferentes possibilidades de evitá-las e tratá-las, bem como as vulnerabilidades sociais e de gênero também dizem respeito ao tema. Ainda que os problemas relativos à saúde sexual e reprodutiva representem um alto risco para as populações, incluindo o incremento nas taxas de morbidade, o tema ainda não foi tratado de maneira condizente com sua importância nos foros internacionais. A mais importante iniciativa internacional referente à questão ocorreu em 1994, na IV Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada no Cairo, na qual a noção de saúde reprodutiva foi incorporada pela primeira vez ao vocabulário das Nações Unidas, e a partir de então universalmente utilizada (GLASIER, 2006). Os 179 governos participantes acordaram em prover o acesso universal à saúde reprodutiva até 2015, com o objetivo de melhorar a saúde e o bem-estar de suas populações, reduzir o crescimento populacional e promover um desenvolvimento sustentável3. Entretanto, em razão de inúmeros fatores, este tema perdeu força na década de 1990, o que se refletiu na Cúpula do Milênio de 2000, quando foi emitida a Declaração das Nações Unidas para o Milênio. Nela, o acesso à saúde sexual não entrou diretamente, tendo a Declaração apenas tocado em alguns assuntos conexos ao tema, como a meta da redução da mortalidade materna (e infantil), a promoção da igualdade entre os sexos e o combate à AIDS. Muito há a ser feito, devendo ser levadas em consideração tanto a gravidade dos problemas relacionados à saúde sexual e reprodutiva, como a morte materna e o HIV, bem como a possibilidade de encontrar solução para estes desafios. Isso porque, por exemplo, a maior parte das doenças associadas à saúde sexual pode ser enfrentada com estratégias de prevenção e possui tratamento, não sendo seus custos os mais elevados. No entanto tratá-los como prioridade supõe a superação de entraves de diversas ordens, tais como a existência de sistemas de saúde pública acessíveis, o financiamento das políticas, a ampliação de recursos internacionais para o campo da saúde pública em especial para a saúde sexual e reprodutiva. Ademais, como desigualdades sócio-econômicas, de gênero e outras impactam profundamente o grau de vulnerabilidade às doenças, somente abordagens integrais e transversais poderiam dar a resposta a desafios tão elevados. Dito isso, é necessário ressaltar que a diversidade cultural presente nas populações é fator de base a ser considerado nas políticas de promoção do cuidado com a saúde sexual e reprodutiva. Tido como um assunto íntimo e restrito à esfera privada, a sexualidade é um tema que ainda representa um grande tabu em várias sociedades, já que é cercada por rituais e significados próprios a cada indivíduo ou grupo, campo histórico de significação e representação. É necessário, portanto, ir além da questão da saúde e procedimentos médicos e adentrar plenamente no âmbito da sexualidade. 3 Ver o Relatório da CIPD em <http://www.un.org/popin/icpd/ conference/offeng/poa.html >. Acesso em 15 de nov. de 2010. 492 2. Sexualidade, Direitos Sexuais e Multiculturalismo A sexualidade é tida um aspecto central da vida do ser humano, envolvendo a atividade sexual, as identidades de gênero, a orientação sexual, o prazer, a intimidade e a reprodução (Federação Internacional de Planejamento Familiar - IPPF, 2008). A constituição da sexualidade dá-se através de uma série de interações entre os fatores biológico, social, psicológico, político, cultural, ético, legal, religioso, histórico e espiritual. Há, portanto, uma enorme gama de possibilidades, podendo determinado indivíduo viver sua sexualidade das mais diversas maneiras. Encarar a sexualidade como um aspecto natural da vida humana e como parte essencial da própria ideia de humanidade contribui para o prosseguimento da discussão dessas questões e no enfrentamento dos tabus. Para que as pessoas consigam alcançar a maior qualidade possível em matéria de saúde, devem estar previamente em condições para exercer o poder de escolha em suas vidas sexual e reprodutiva (IPPF, 2008). A promoção das saúdes sexual e reprodutiva deve considerar cada pessoa e suas respectivas condições e preferências sexuais. Isso implica no exercício de sua autonomia, embora esse poder de escolha no campo da sexualidade seja muitas vezes limitado, inclusive no âmbito legal de um país, como é o caso, por exemplo, da aplicação da pena de morte a homossexuais, como ocorre em países como o Irã, Arábia Saudita, Mauritânia e Iêmen, entre outros. Outros fatores, entretanto, estabelecem obstáculos à livre sexualidade bem como impõem maior vulnerabilidade, notadamente para pessoas que integram como é o caso da população das camadas sociais menos favorecidas no acesso aos bens sociais e culturais, de adolescentes que iniciam suas vidas sexuais, de profissionais do sexo, homossexuais, travestis e transgêneros. Uma abordagem mais abrangente, a partir dos direitos humanos, supera a ideia da individualidade para buscar um paradigma de maior alcance, cuja sustentação encontra-se principalmente na dignidade da pessoa humana. A saúde sexual e reprodutiva deve ser entendida como um direito humano, essencial para a plena fruição da vida e da própria saúde. Como tal, trata-se de fomentar nos países que adotam este paradigma como base para sua vida, políticas públicas relativas à saúde sexual e reprodutiva que considerem a promoção dos direitos sexuais como um ponto fundamental. Apesar de sua estreita relação, a vida sexual deixou de necessariamente implicar na vida reprodutiva desde o advento e a disseminação do acesso aos métodos contraceptivos cientificamente comprovados a partir das décadas de 1960 e 1970, e 493 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental nos países que não impõem barreira nem ao planejamento familiar e nem à interrupção da gestação. Dessa maneira, a saúde reprodutiva e a saúde sexual, enquanto dimensões e enquanto direitos são diferenciados, sendo os primeiros mais reconhecidos pela comunidade internacional. Os direitos reprodutivos são relativos ao direito de decidir sobre a quantidade, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos, assim como à possibilidade de ter acesso à informação e aos meios adequados para uma tomada de decisão consciente e responsável (MATTAR, 2008). Esses foram mencionados inicialmente na primeira Conferência de Direitos Humanos de Teerã, em 1968, tendo sido posteriormente aprofundados na já citada Conferência de População e Desenvolvimento (CIPD) no Cairo, em 1994. Sua consolidação pode ainda ser vista na inclusão da melhoria da saúde materna e dos recém-nascidos como uma das metas do milênio. Quando se trata dos direitos sexuais, o quadro é distinto. Esses direitos referem-se à capacidade de exercer sua sexualidade de maneira livre de coerções, o que não é visto como socialmente aceitável em muitas culturas. Na própria CIPD de Cairo, algumas delegações expressaram o desejo de incluir o termo direitos sexuais na resolução, porém seu uso foi rechaçado por outras, que alegavam motivos morais ou religiosos (MATTAR, 2008). Os direitos sexuais permaneceram em segundo plano até serem associados à agenda internacional da saúde. Com a epidemia de AIDS na década de 1980, as atenções voltaram-se para o espectro da saúde relacionado à atividade sexual, sem que a reprodução estivesse necessariamente envolvida. A Federação Internacional de Planejamento Familiar (IPPF, na sigla em inglês) foi uma das primeiras organizações internacionais a formular uma lista dos direitos sexuais que, segundo a instituição, são conformados aos princípios de direitos humanos já existentes, sendo estes: a liberdade, a equidade, a integridade, a autonomia e a dignidade da pessoa humana (IPPF, 2008). Entre os direitos sexuais listados, encontram-se o direito de igual proteção perante a lei, independente de sexo, sexualidade ou gênero; direito à privacidade, com a não interferência em relação à autonomia sexual; direito à saúde e aos benefícios do progresso científico; direito de autonomia pessoal e reconhecimento perante a lei, direito à educação e informação; direito à vida, liberdade e integridade física; direito de optar pelo casamento, constituir família e decidir ou não ter filhos e direito de responsabilização e reparação, referente aos deveres do Estado (IPPF, 2008). É preciso atentar ao fato de que, embora os direitos sexuais tenham um caráter negativo, ou seja, de não intervenção estatal, também demandam por vezes uma ação positiva do próprio Estado para que sejam efetivados e protegidos (MATTAR, 2008). A não discriminação deve pautar as ações do Estado, tanto no que se refere aos atos de terceiros e particulares quanto aos próprios atos estatais. As particularidades de cada cultura, os tabus que giram em torno da atividade sexual e do prazer e as diversas expressões individuais de sexualidade contribuem para que a questão da promoção da saúde sexual e reprodutiva seja bastante complexa. No entanto, é inegável sua fundamental importância para o bem-estar de toda a humanidade, o que gera a necessidade de fomentar uma cultura de promoção dos direitos sexuais e reprodutivos como algo inerente à dignidade da pessoa humana. 494 3. Doenças Sexualmente Transmissíveis As Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) são provenientes de infecções geralmente transmitidas através do contato íntimo ou do ato sexual, embora também possam ser transmitidas de outras maneiras, como de mãe para filho – através do parto ou da amamentação - ou através do contato sanguíneo, por meio de seringas e agulhas compartilhadas. As DST estão intimamente ligadas à saúde sexual e reprodutiva dos seres humanos, e apesar de diversos esforços e avanços já terem sido feitos rumo à erradicação dessas enfermidades no mundo, elas ainda permanecem como um dos principais fatores que afetam a saúde da população mundial, constituindo ainda parte fundamental dos Objetivos do Milênio4. As DST afetam homens e mulheres de todas as idades, etnias e classes sociais, embora sua incidência varie segundo o contexto sociocultural, além de ser maior entre mulheres e, principalmente, em adolescentes5. Tal fato se deve principalmente às desigualdades de gênero que dificultam a proteção às relações sexuais e o acesso aos serviços de saúde. As DST são no geral mais facilmente tratadas quando descobertas em sua fase inicial. Entretanto, tais doenças nem sempre apresentam sintomas evidentes nos estágios iniciais, o que pode ocasionar a falta de tratamento e o consequente agravamento da doença, acarretando problemas como dificuldades na vida sexual, dores e desconfortos, infertilidade e até a morte.6 Uma das DST mais antigas existentes no mundo é a sífilis, doença que continua a infectar em larga escala: estima-se que 12 milhões de pessoas sejam infectadas anualmente, apesar da existência de métodos preventivos eficazes e baratos. As mulheres grávidas atingidas pela doença podem transmiti-la ao feto, causando sífilis congênita, e consequências graves para a gravidez, como abortos espontâneos e recém-nascidos com infecções graves, em 80% dos casos.7 Ao contrário de muitas infecções neonatais, a sífilis congênita é uma doença evitável que pode ser eliminada graças à detecção pré-natal eficaz e ao tratamento das mulheres grávidas infectadas. A eliminação da sífilis congênita reduziria o número de abortos, natimortos, 4 Disponível em: < http://www.objetivosdomilenio.org.br/>. Acesso em 03 out. 2010. 5 Disponível em: < http://www.who.int/vaccine_research/diseases/hiv/en/index.html>. Acesso em 17 nov. 2010 6 Disponível em: <http://www.copacabanarunners.net/dst.html >.Acesso em 17 de nov. de 2010. 7 Disponível em: < http://whqlibdoc.who.int/publications/2008/9789248595851_por.pdf> Acesso em 17 nov. 2010 495 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental lactentes prematuros e de baixo peso ao nascer e mortes pré-natais, contribuindo assim para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio em saúde materno-infantil8. Nesse sentido, a OMS lidera um programa para a eliminação da sífilis congênita como um problema de saúde pública. A estratégia se assenta em quatro pilares fundamentais: assegurar um compromisso político sustentável, aumentar o acesso e a qualidade dos serviços de saúde materna e neonatal, detectar e tratar mulheres grávidas e seus parceiros e estabelecer sistemas de vigilância, monitoramento e avaliação.9 Outra DST presente na atualidade é a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), causada pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). Desde o início da epidemia, o HIV infectou mais de 60 milhões de homens e mulheres com um total de mortes de aproximadamente 20 milhões de pessoas. Apesar da intensa resposta internacional à pandemia do HIV/AIDS, o HIV continua a se espalhar, causando mais de 14 mil novas infecções a cada dia, 95% das quais estão no mundo em desenvolvimento. Hoje, a AIDS é a principal causa de morte na África e a quarta no mundo.10 Em razão dos efeitos das DSTs na vida das comunidades, o controle destas doenças é uma prioridade para a OMS. Em maio de 2006, a Assembléia Mundial da Saúde aprovou a estratégia global que busca criar mecanismos técnicos e de defesa para a prevenção e controle das DST. Dentre as intervenções a serem implantadas encontram-se: a prevenção através da promoção de comportamentos sexuais mais seguros, a inclusão de tratamento para DST em serviços básicos de saúde e a prestação de serviços específicos para as populações de alto risco de contaminação. Ressalta-se ainda a importância de programas e abordagens para a mobilização do compromisso político de alto nível, que constitui a base essencial para uma resposta acelerada.11 Outro avanço a ser citado é a Declaração Política sobre o HIV / AIDS, aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 2006. Tal declaração oferece um forte mandato para ajudar a avançar na luta contra a AIDS, com intensificação no sentido do acesso universal à prevenção, tratamento, cuidados e apoio. Nesta também é reafirmada a Declaração de 2001 de Compromissos e Objetivos do Milênio, nomea- damente a meta de deter e começar a reverter a propagação da AIDS até 2015.12Ainda nesse sentido, pode-se citar a criação do UNAIDS, um Programa Conjunto das Nações Unidas no combate ao HIV / AIDS, que tem como objetivo a prevenção contra a AIDS, e o tratamento, os cuidados e o apoio aos portadores do HIV13. Como é o caso de outras doenças infecciosas, uma vacina segura, eficaz e disponível é, em última análise, necessária para complementar e reforçar a eficácia das estratégias de prevenção para controlar a pandemia do HIV / AIDS, especialmente em países em desenvolvimento. Nesse sentido, o Programa das Nações Unidas sobre HIV / AIDS (UNAIDS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) uniram-se com o intuito de estabelecer a nova HIV Vaccine Initiative (HVI) para impulsionar a criação de uma vacina contra a AIDS.14 4.Saúde e o direito à manifestação da homossexualidade Embora ainda hoje nem todos os países garantam aos seus cidadãos o direito à liberdade de escolha sexual – 85 países membros da ONU consideram práticas homossexuais um crime15 – há atualmente um apelo para que os direitos de livre expressão da sexualidade sejam amplamente respeitados16. No mundo atual onde pessoas se expressam de forma tão diversa, o respeito à singularidade e a tolerância de cada individuo torna-se fator de extrema importância. A prática homossexual já foi amplamente considerada crime, juntamente com outras práticas encaradas como anormais e imorais – como, por exemplo, o adultério. Posteriormente passa a figurar como uma patologia, sendo finalmente retirada, em 17 de maio de 1990 da lista de doenças mentais da OMS, passando a ser reconhecida como uma opção sexual17. Essa evolução é fruto da ação de movimentos sociais em sintonia com outros segmentos da sociedade e do estado. O direito à livre manifestação da sexualidade é parte dos Direitos Humanos reconhecidos internacionalmente e está ainda implicitamente previsto no Pacto Internacional so12 Disponível em: < http://www.unaids.org/en/default. asp>. Acesso em 03 out. 2010 13 Ibid 8 Ibid 14 Disponível em: < http://www.who.int/vaccine_research/ diseases/hiv/en/index.html>. Acesso em 17 nov. 2010 9 Disponível em:< http://www.who.int/reproductivehealth/topics/ rtis/syphilis/en/index.html>. Acesso em 17 nov. 2010 15 Disponível em: http://lesbianlife.about.com/od/ lesbianactivism/f/IllegalGaySex.htm Acesso em 17 nov. 2010 10 Disponível em: < http://www.who.int/vaccine_research/diseases/hiv/en/index.html>. Acesso em 17 nov. 2010 16 Disponível em: homofobia.php>. Acesso em 03 out. 2010 11 Disponível em: <http://www.who.int/mediacentre/ factsheets/fs110/en/index.html>. Acesso em 17 nov. 2010 496 17 Disponível em: < homofobia.php> Acesso em 28 nov. 2010 497 <http://www.onu-brasil.org.br/ http://www.onu-brasil.org.br/ Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental bre os Direitos Civis e Políticos, pois esse assegura o direito à privacidade e a livre manifestação de opiniões18. Apesar da crescente ampliação do reconhecimento aos direitos à livre manifestação sexual, persistem atitudes que refletem crenças e preconceito contra o exercício de sexualidades que fujam à heteronormatividade. O preconceito e a discriminação são prejudiciais à saúde física e psíquica, e a ocultação da sexualidade pode levar a sofrimentos e a dificuldades de tratamento de doenças sexualmente transmissíveis, além de favorecer a sua proliferação19. Há países, como o Irã, em que a prática homossexual é crime punível com a pena de morte; porém, transexuais são assistidos gratuitamente na realização de operações de mudança de sexo. Com isso, homossexuais recorrem à cirurgia de mudança de sexo para escapar da punição20. No continente Africano mais de 30 países criminalizam a prática homossexual. Entre eles, Nigéria, Sudão, Mauritânia e Somália preveem, em alguns casos, a pena de morte para quem praticar relações com pessoa do mesmo sexo21. Por outro lado, diversos outros países, como a Holanda, a Noruega, o Canadá e mais recentemente a Argentina, não só reconhecem os direitos a livre manifestação da opção sexual como também permitem o casamento entre pessoas do mesmo sexo22. Na comunidade internacional há setores que tentam propor a flexibilização das leis e o amplo apoio a manifestação da opção sexual. Louise Arbour, Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos observa: Nem a existência de leis nacionais, nem a prevalência do costume pode justificar o abuso, ataques, torturas e até assassinatos que as pessoas gays, lésbicas, bissexuais e transexuais são submetidos, por serem quem eles são ou pela maneira como são percebidos23 O “silêncio vergonhoso” com que a violência homofóbica24 é saudada pelos governos e pela sociedade, é, segundo Louise, a “rejeição definitiva do princípio fundamental da universalidade dos direitos”25. Os direitos de livre manifestação da orientação sexual, embora muitos avanços já tenham sido feitos, ainda enfrentam diversos desafios. A luta pela descriminalização da prática homossexual ainda é realidade onde ainda predominam leis e práticas preconceituosas. Surge dessa forma a controvérsia entre os direitos de uma nação de arbitrar suas próprias leis e os Direitos Humanos amplamente reconhecidos. Daí porque é relevante o trabalho em prol de uma convenção internacional sobre direitos sexuais e direitos reprodutivos, como forma de estabelecer um patamar mínimo de respeito e tolerância à identidade e orientação sexual. É necessário o reconhecimento de que as pessoas devem ser livres para exercer sua própria sexualidade independente do país onde estejam. Dessa forma, os esforços internacionais têm-se direcionado à tentativa de tornar mais flexíveis as leis de países que punam a homossexualidade, embora nem sempre tais tentativas sejam bem sucedidas. 18 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos artigos 17 ao 19: Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/pacto_dir_ politicos.htm,> Acesso em 17 nov. 2010 19 Disponível em: <http://www.unaids.org/en/KnowledgeCentre/ Resources/FeatureStories/archive/2007/20070507_int_day_against_homophobia. asp> Acesso em 28 nov. 2010 20 Disponível em: <http://www.cadastronacionalmedico.org/ noticia/136-A-legislacao-sobre-a-homossexuais-bissexuais-transgenerostransexuais-e-travestis-.htm> Acesso em 17 nov. 2010 21 Disponível em: < http://g1.globo.com/Noticias/ Mundo/0,,MUL1486041-5602,00.html> Acesso em 17 nov. 2010 5. Questões de Gênero: sexualidade e direitos sexuais Ao se falar de direitos sexuais e direitos reprodutivos em uma perspectiva cultural, o conceito de gênero emerge como elemento estruturador. Gênero e sexualidade são termos que se fundem e se confundem. Se fundem porque o padrão de sexualidade de cada cultura é definido pela percepção de gênero que nela vigora. Confundem-se, porque embora termos distintos, são muitas vezes tomados um pelo outro. Assim, para que se inicie um debate e uma análise das políticas e dos programas e intervenções de saúde sexual e reprodutiva, sejam elas realizadas por agentes estatais, organizações internacionais, organizações não governamentais e sociedade civil, é preciso, antes de tudo, que se discuta o conceito de gênero. Reconhecendo-se que há várias definições de gênero, optou-se inicialmente por discutir uma que o concebe como uma construção social a partir da divisão biológica entre os sexos. Essa construção está diretamente relacionada às particularidades de cada sociedade, de modo que é a partir da cultura de cada comunidade que se torna possível a formulação de um padrão de sexualidade. Frequentemente, esse conceito é superposto à palavra mulher, pois quando se fala desigualdade de gênero faz-se referência à desigualdade sofrida pelas mulheres (DIAS, 2005). Sob esse ponto de vista, o ser humano nasce dotado de determinadas características biológicas que os enquadram como um indivíduo do sexo masculino ou 22 Disponível em: < http http://lesbianlife.about.com/cs/wedding/a/ wheremarriage.htm> Acesso em 28 nov. 2010 24 Um tipo de violência caracterizada pela intolerância às relações entre pessoas do mesmo sexo. N.A. 23 Disponível em: < http://www.un.org/ecosocdev/geninfo/afrec/ vol21no1/211-gays-lesbians-combat-bias.html> Acesso em 28 nov. 2010 498 25 Disponível em: < http://www.un.org/ecosocdev/geninfo/afrec/ vol21no1/211-gays-lesbians-combat-bias.html> Acesso em 28 nov. 2010 499 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição feminino. A partir das características biológicas, o indivíduo passa por um processo de socialização em que sua identidade é construída. Nesse processo, o aspecto biológico determina o que é permitido ou não em termos de sexualidade, ao que a priori, é definido como feminino ou masculino. Acerca disso, BOURDIEU (2007) ao tratar da sexualidade das civilizações de um modo geral, com um foco nas sociedades ocidentais, explica como se dá a construção social da sexualidade masculina e feminina. A associação de determinadas características biológicas próprias do homem a certos conceitos26 permite a marcação da função do homem em sua comunidade. Da mesma forma associam-se outros conceitos às características do corpo feminino, marcando-se função da mulher nessa mesma comunidade. Em síntese, para este autor, a construção social da sexualidade é baseada na “socialização do biológico”, ou seja, na formação cultural dos indivíduos feita a partir da divisão biológica dos sexos, e na “biologização do social”, que significa a modificação os corpos de homens e mulheres para atenderem à construção social das sexualidades, como por exemplo, a circuncisão e a mutilação genital. Por ser caracterizada pela falta de atributos masculinos, a socialização da mulher se dá de forma a impor limites aos seus corpos, através da roupa, do andar, do olhar e da disciplina, que é coercitiva. E a socialização do homem ocorre no sentido de legitimar a dominação deles sobre as mulheres. Baseadas nessa dominação masculina, as estruturas sociais que se formam nas sociedades possibilitam a ocorrência da violência sexual tanto física quanto simbólica. Isto significa que o poder pode ser exercido sem coação, pois a socialização dá conta de criar uma predisposição, uma ‘inclinação’ dos corpos a aceitarem-na. Sobre isso MUSZKAT (1998, p. 226) afirma que: Para tornar-se homem ou mulher é preciso submeter-se a um processo que chamamos de socialização de gênero, baseado nas expectativas que a cultura tem em relação a cada sexo. É a família, como principal agência socializadora, quem tem as suas funções concentradas na formação das personalidades. Nesse espaço social, no confronto de gerações, os modelos sexuais são definidos pelas suas relações de poder seja no plano social, material ou emocional. Isso explica o porquê de haver uma relutância das mulheres em denunciarem violências físicas, sexuais e psicológicas que tenham sofrido, uma vez que foram socializadas geralmente no mesmo meio que seus parceiros, possuem uma estrutura de pensamento acerca da sexualidade e dos papeis sexuais semelhantes aos deles, e, portanto, acabam por conformar-se e reproduzir as relações que levam aos atos de violência. 26 Os conceitos associados ao biológico masculino dá-se por meio da forma como o corpo masculino se encontra na relação sexual: alto, quente, seco, fora, aberto. Esses conceitos nos remetem a assembleia, mercado, público. Ao mesmo tempo, o corpo feminino é visto não como oposto, mas como a falta de atributos masculinos. Por isso a função da mulher é realizar papéis que não são os dos homens, ou seja, no âmbito privado. 500 Liberdade Identitária como Direito Fundamental 6. Violência Sexual A partir disso, destaca-se a importância de refletir e discutir acerca da violência sexual, perpetrada de várias maneiras, por diversos agentes, e que acarretam diferentes conseqüências, afetando diretamente a saúde sexual e reprodutiva de ambos os sexos, e principalmente de mulheres. A OMS (CONTRERAS, 2010, p.7) define a violência sexual como: Todo ato sexual, a tentativa de consumar um ato sexual, os comentários ou insinuações ‘não-desejados’, ou as ações para comercializar ou utilizar de qualquer outro modo a sexualidade de uma pessoa mediante coação por outra pessoa, independente da relação que possua com a vítima, em qualquer âmbito, incluídos o lar e o local de trabalho.27 Significa dizer que violência sexual compreende uma gama de atos, incluídos coito sexual forçado (estupro), o contato ou comentário sexual não desejado (abuso sexual), perseguição sexual, mutilação genital, iniciação sexual forçada, tratamentos com fins sexuais, entre outros. Além disso, entende-se também que “outras formas de violência baseada no gênero” abrangem também casamentos infantis, estupro conjugal e violência em situações de conflito.28 Estima-se que “seis de cada dez mulheres no mundo sofram de violência física ou sexual ao longo de sua vida” (UNIFEM, 2009 apud CONTRERAS, 2010). Entre os efeitos da violência sexual, imediatos ou de longo prazo sobre a saúde das vítimas tem-se impactos físicos, psicológicos e sociais. As consequências físicas mais comuns costumam ser a infecção por doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), gravidez indesejada e abortos, traumas e lesões no trato reprodutivo; as psicológicas são principalmente transtorno de estresse pós-traumático e depressão; e as sociais incidem sobre as mulheres sob a forma de estigma e rejeição pelos seus parceiros, famílias e comunidades, além de uma queda de participação na força laboral.29 Segundo diversos estudos que tratam da violência sexual, percebe-se que as vítimas tem a vulnerabilidade aumentada, dando lugar a um ciclo de violência que pode ter como um dos agravantes a desigualdade econômica. Apesar dos esforços internacionais, ainda há exemplos de manifestações de violência sexual em larga escala no mundo todo. Na África, a iniciação sexual forçada é um problema alarmante, pois há a crença de que fazer sexo com uma adolescente ou mulher virgem traz a cura o portador de HIV. 27 acessado em Nov. 2010. Disponível em: http://www.svri.org/Violencia.pdf, 28 Disponível em: http://www.who.int/hac/techguidance/ pht/SGBV/en/index.html, acessado em Novembro de 2010. 29 Disponível em: http://www.who.int/gender/violence/ sexual_violence/en/index.html, acessado em Novembro de 2010. 501 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental Quanto às formas que a violência sexual se apresenta no mundo, são alarmantes os dados trazidos por estudos, como o Relatório sobre Violência das Nações Unidas (2002): sobre o tráfico de mulheres e meninas, estima-se que o Quirguistão traficou durante o ano de 1999 mais de 4 mil mulheres para fins de exploração sexual em países como Alemanha, Rússia, Cazaquistão, China, Turquia e Emirados Árabes (KRUG, 2002). O uso da violência sexual como arma de guerra mostra a dimensão da violação dos direitos humanos, em especial das mulheres. Nos conflitos na Bósnia e Hezergovina, por exemplo, cerca de 20 mil mulheres e adolescentes muçulmanas foram estupradas por soldados sérvios, em uma tentativa se fazer a limpeza étnica no país. (WOOD, 2006).30 putação do clitóris com extirpação parcial ou total dos lábios menores; e o terceiro é a extirpação parcial ou total dos genitais externos e sutura/estreitamento (costura) do orifício vaginal (infibulação). Além destas, há outras formas menos comuns de mutilação como perfuração, incisão, raspagem ou cauterização dos genitais e utilização de ervas para reduzir as secreções vaginais32. Entre as complicações para a saúde da mulher que sofreu MGF destacam-se: infecções na vesícula e urinárias, esterilidade, necessidade de novas intervenções cirúrgicas, morte de recém-nascidos e contaminação por doenças como tétano e HIV, entre outras.33 Mesmo com tantas complicações, por que a prática ainda se perpetua em diversas partes do mundo? As razões são várias, entre elas figuram: a crença de que a mulher se torna mais limpa e bela após a mutilação; assegura-se a virgindade34 e a fidelidade no casamento por mais tempo, pois a dor causada reprime o desejo sexual; a crença de que está apoiada na religião – embora a prática não seja respaldada por preceitos e ensinamentos religiosos –, além das noções de que o combate à prática é uma forma de negação da cultura. Outra forte causa é a tendência de perpetuação da prática, pois a mutilação genital, muitas vezes, é realizada pelas próprias mulheres, que tendo sofrido da mesma, entendem que a prática é parte de um conjunto de ações socializantes necessárias para a boa formação sexual da menina e adolescente, de forma a prepará-la para a vida adulta e o matrimônio. 35 Entre as várias formas de enfrentá-las, várias estratégias têm sido desenvolvidas: devido às condições inóspitas e utilização de material contaminante, em alguns lugares a prática tem sido realizada por profissionais de saúde, na tentativa de humanizá-la, considerando os sérios riscos e problemas de saúde que provoca, mesmo quando realizada sob condições de menor de risco de contaminação. Por consequência, mesmo com a intenção seja de humanizá-la, há a perpetuação da prática, levando as Nações Unidas36, a recomendar aos profissionais que se busquem outras soluções, como orientar as mulheres, ou ainda que se concentrem integralmente em combatê-la. O tema das mutilações genitais femininas costuma produzir perguntas, cujas respostas explicitam as profundas raízes culturais e psíquicas dos mecanismos de controle da sexualidade feminina pelos diversos povos: a crença de que a mulher 6.1 Mutilação Genital Entre as práticas tradicionais de violência, ancoradas em culturas, incluem-se as mortes por dote e por honra, os casamentos precoces, a morte de viúvas e a mutilação genital consideradas como violência sexual. São expressões evidentes da força da dominação masculina exercida sobre os corpos e mentes das mulheres ao longo de milhares de anos, que desafiam o esforço pela garantia de respeito aos direitos humanos.” Tais práticas, as mais difíceis de serem contestadas, estão entrelaçadas com as identidades culturais de certas comunidades. Entretanto, elas ferem os direitos humanos, principalmente o direito à vida e à integridade física, por isso precisam ser fortemente combatidas. Dentre as várias formas de violência tradicional destaca-se, aqui, a mutilação uma prática violenta, que gera graves problemas físicos, psíquicos, emocionais e sexuais para mulheres de várias partes do mundo. Segundo a Secretaria da Assembleia Geral da Saúde da OMS, estima-se que entre 100 e 140 milhões de mulheres tenham sido submetidas a procedimentos que resultam em mutilação genital feminina (MGF), e no continente africano, aproximadamente 3 milhões de outras vítimas são feitas a cada ano. Estas práticas são mais frequentes nas regiões ocidental, oriental e nordeste da África - no Egito 95% das mulheres sofreu de mutilação -, alguns países da Ásia e do Oriente Médio. Na América do Norte, a prática também ocorre em comunidades de imigrantes, embora com menor frequência, sendo condenadas.31 A Assembleia Mundial da OMS conceitua mutilação genital como uma prática que “abarca todos os procedimentos que resultam em uma violação total ou parcial dos genitais femininos externos ou outra lesão causada nos mesmos por motivos não médicos”. É classificada em três tipos básicos: o primeiro é a extirpação do prepúcio, com ou sem amputação total ou parcial do clitóris; o segundo é a am30 Texto disponível em: http://www.sscnet.ucla.edu/polisci/cpworkshop/papers/Wood.pdf, acessado em novembro de 2010. 31 Disponível em inglês em: <http://www.who.int/mediacentre/ factsheets/fs241/es/index.html >. 502 32 Texto disponível em: <http://whqlibdoc.who.int/publications/2008/9789241596442_por.pdf>. Acesso em nov. 2010. 33 Ibid. 34 BOURDIEU (2007) entende que o culto à virgindade é uma formas de se perpetuar a violência simbólica. 35 Texto disponível em: http://whqlibdoc.who.int/publications/2008/9789241596442_por.pdf , acessado em nov.2010. 36 Ibid. 503 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental se torna mais limpa e bela após a mutilação; assegura-se a virgindade37 e a fidelidade no casamento por mais tempo, pois a dor causada reprime o desejo sexual; a crença de que está apoiada na religião – embora a prática não seja respaldada por preceitos e ensinamentos religiosos –, além das noções de que o combate à prática é uma forma de negação da cultura. Outra forte causa é a tendência de perpetuação da prática, pois a mutilação genital, muitas vezes, é realizada pelas próprias mulheres, que tendo sofrido da mesma, entendem que a prática é parte de um conjunto de ações socializantes necessárias para a boa formação sexual da menina e adolescente, de forma a prepará-la para a vida adulta e o matrimônio. 38 Através da resolução sobre eliminação da mutilação genital feminina39 a Assembleia Geral da Saúde convoca os Estados a realizarem ações que se concentrem em combater a prática em várias frentes: através de uma mudança na educação, implementação de programas de saúde voltados para mulheres que sofreram mutilação genital e revisão-implementação de legislações que coíbam a prática. contraceptivos, o que deve ser visto com preocupação. Na Conferência do Cairo, em 1994, no Programa de Ação das Nações Unidas da Conferência Internacional em População e Desenvolvimento, as Nações Unidas alertaram que uma melhora nos níveis de morbidade e mortalidade materna depende de uma maior atenção em relação à saúde reprodutiva de mulheres e adolescentes, o que significa prevenção de gravidezes indesejadas. Para se reduzir esse níveis é preciso trabalhar com base na prevenção de gravidezes indesejadas e na redução de abortos “não-seguros”41. A CIPD (1994) compromete os países signatários com a redução de barreiras ao aborto inseguro, à eliminação de punições às mulheres que abortam e o atendimento humanizado as mulheres em situação de abortamento. Ainda em Berer, a realização de abortos seguros é a como a melhor estratégia de ação para que haja melhora da saúde reprodutiva. A modificação da legislação e sua colocação em prática é uma das primeiras modificações para que se tenham práticas seguras. (BERER, 2000). O que se verifica é que nos países em que a legislação é restrita, seja no tocante ao auxílio a mulher, seja no tocante aos serviços de aconselhamento (conselhos), ou na indiferença aos riscos e conseqüências da prática insegura, a proibição ou criminalização do aborto acarreta um custo muito mais elevado do que nos países em que a prática é legalizada. A falta de uma legislação que permita a realização de abortos seguros traz elevados custos econômicos para os Estados, uma vez que os sistemas de saúde pública obrigam-se ao atendimento às mulheres que realizaram o aborto em condições precárias e tiveram complicações físicas. Há também os custos sociais pagos pelas vítimas – de abortos inseguros, além da própria vida, aumenta-se o número de famílias desestruturadas pela falta de mães que deixam filhos em idades iniciais, ou que sobrevivem, mas sofrem de distúrbios psicológicos causados pela culpabilização que carregam (BERER,2000). Atualmente, há quatro tipos de legislação acerca do aborto: a que permite e apóia o aborto, como na Suécia; a que é restritiva, isto é, permite, mas nega o critério privado (decisão da mulher sobre seu próprio corpo), além de desencorajar/ proibir meios de implementá-lo, como na Irlanda; a que permite, mas dificulta o aborto, ou seja, não dá suporte, não disponibilizando serviços para tal, como nos EUA e no Porto Rico; e por último, a que permite, mas invade a decisão individual, pois é necessária a aprovação de outrem, como em Israel. A África do Sul figura como um país modelo no tratamento do aborto, porque além de considerar a liberdade da mulher e promover a assistência médica necessária, tem-se que o papel dos conselhos (formados por profissionais e agentes da saúde e sociedade civil) é extremamente importante para influenciar na desistência em realizar o aborto.42 6.2 Aborto Uma prática que tem sido alvo de polêmicas no mundo todo e que, se configura como um sério problema de saúde pública -sexual e reprodutiva, é a realização de cerca de 20 milhões de abortos inseguros por ano no mundo, causa de 13% das mortes maternas. Cerca de 25% das gestações no planeta são interrompidas por razões as mais diversas, destacando-se a falta de planejamento familiar. Enquanto se configura como um grave problema, as discussões levantadas se caracterizam mais por envolverem questões relacionadas com crença religiosa e filosófica do que sobre os impactos nas saúdes das mulheres e o direito reprodutivo da mulher. Temas como o início da vida desde a concepção e o direito da mulher de decidir sobre seu corpo polarizam o debate. Segundo BERER40(2000), atualmente verifica-se nos países uma acentuada queda nas taxas de fertilidade, e vários estudos atribuem tal feito a um aumento significativo do uso de métodos contraceptivos. Entretanto, segundo este autor, em alguns países como a Rússia e a Grécia, por exemplo, a queda tem como causa também um aumento no número de abortos. Nestes países, parcela das mulheres primeiramente recorre ao aborto para só depois iniciarem tratamentos com métodos 37 Bourdieu (2007) entende que o culto à virgindade é uma das formas de se perpetuar a violência simbólica. 38 Para mais informações, texto disponível em: http://whqlibdoc. who.int/publications/2008/9789241596442_por.pdf . Acessado em 16 nov. 2010. 39 Resolução disponível em https://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_ files/A61/A61_R16-sp.pdf, acessado em novembro de 2010. 40 Disponível em: http://www.who.int/bulletin/archives/78(5)580. pdf, acesso em 17 nov. de 2010 504 41 Termo em inglês: abortion unsafe. 42 Para mais informações sobre o aborto na África do Sul, consulte: “Making abortions safe: a matter of good health policy and practice”, disponível em http://www.who.int/bulletin/archives/78(5)580.pdf, acessado em 15 de out. de 505 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição 7.Desafios à saúde masculina A agenda dos direitos sexuais e reprodutivos ganhou a dimensão global através da IV Conferencia de População e Desenvolvimento do Cairo graças ao trabalho do movimento de mulheres para a substituição do paradigma populacional por um paradigma de direitos. Este fato caracterizou a sua discussão como um tema mais vinculado aos direitos das mulheres, consubstanciando o risco de substituir-se automaticamente os termos “gênero” por “mulher”. Ademais, a situação de saúde das mulheres no mundo e o foco sobre a maternidade (mortalidade materna) fortes elementos de discussão daquela agenda, somado ao fato de que os homens não têm assumido historicamente um papel ativo no processo reprodutivo. Daí porque do ponto de vista de uma agenda pública, a saúde dos homens ficou subsumida na discussão destes direitos, e que ganha maior relevância no debate sobre a AIDS quando o debate sobre a sexualidade ganha maior espaço. Nesta agenda os homens (homossexuais) ganham protagonismo, e somente anos depois a saúde sexual e reprodutiva masculina conquista espaço nas políticas públicas. Se até o momento se falou de saúde sexual e reprodutiva na tentativa de entender como a cultura predominante na sociedade, sob forte influência masculina se dá sobre os corpos femininos e como isso atua de forma a criar desigualdades entre os sexos e consequentemente prejuízos à saúde da mulher, é necessário também se pensar como a saúde masculina é impactada pelas normas de gênero e pelas hierarquias sociais. São recentes no mundo os são programas de saúde que levam em consideração o fato de que os homens também estão expostos a estas normas, que influenciam diretamente seus comportamentos como indivíduos e grupo social. No processo de socialização masculina, geralmente pouco lhes é encorajado o contato, a proximidade, da troca, a solidariedade e a cumplicidade. Os modelos heteronormativos, as noções de masculinidade, as representações sociais do macho, produzem uma idealização do masculino, que para prover tem que ser forte e imune às doenças. Isso resulta em baixo nível de autocuidado. Isso influencia, por exemplo, a dificuldade de prevenção de doenças, cuja prevenção se faz com exames de toques em parte do corpo socialmente vetadas pelo modelo de masculinidade, como o exame de próstata. Esta é uma das dificuldades encontradas pelos serviços de saúde, pois o diagnóstico é feito através do exame de toque retal, e os homens não aceitam serem tocados, ou no mínimo se sentem constrangidos com tal procedimento (GOMES, 2003). Uma revisão43 dos programas que procuram direcionar-se para o público masculino investiga o sucesso obtido em produzir mudanças na forma de se encarar 2010. 43 Para mais informações, consulte: Programming for male involvement in reproductive health, disponível em http://whqlibdoc.who.int/ hq/2002/WHO_FCH_RHR_02.3.pdf ,acessado em 10 de nov. de 2010. 506 Liberdade Identitária como Direito Fundamental a saúde masculina. O mais importante a se destacar é que, quanto mais abrangente e multimodal forem as políticas e os programas, melhor e maior se tornam os efeitos sobre a saúde sexual e reprodutiva de homens e mulheres, ou seja, que utilizavam do maior número de ferramentas possíveis, juntando profissionais, comunidades, grupos de discussão, mídia e trabalho governamental. Ao se tratar direito sexual como direito cultural e avaliar como a sexualidade se manifesta nas diversas comunidades para se obter o maior grau de aproximação e eficácia das políticas e programas de saúde sexual e reprodutiva. A visão binária que se tem de gênero promove uma concepção limitada de sexualidade, impedindo que se alcancem outras formas de se expressar as escolhas sexuais, e reduzindo estas formas de expressão de sexualidade dentro das categorias homem-mulher. Dessa análise antitética surgem dois problemas que destacamos a seguir para abarcar minimamente outras questões de saúde sexual e reprodutiva importantes. A primeira delas é a redução das categorias de analise de gênero entre feminino e masculino, negligenciando outras expressões da sexualidade como a bissexual, a transgênero, a intergênero, a intersex, entre outras. O que se tem feito com relação à saúde destes sujeitos, é inviabilizá-los e generalizá-los, reduzi-los a grupos de risco, com relação às políticas para a AIDS e DSTs. Quando se trata de uma política mais ampla de saúde sexual e reprodutiva, há muito mais uma preocupação destes sujeitos em relação à saúde sexual e reprodutiva do que a que se tem entre homens heterossexuais. Em estudo publicado em 2002 (MANZELLI & PECHENY, 2002)44, verificava-se um crescimento de infecções por DSTs entre homens que fazem sexo com homens, explicada pelo fato de que há uma complexidade em torno dessa sexualidade, de forma que não há como encaixá-los nos padrões formais masculino, nem no feminino. Assim, não há uma política de saúde sexual e reprodutiva voltada para estes segmentos. A outra preocupação advém da incompreensão do conceito de universalidade, previsto nas políticas públicas de saúde. Este é um debate que permeia a agenda sanitária há várias décadas, sempre que novas políticas se tornam necessárias. Com a emergência de novas sexualidades reivindicantes de atenção à saúde sexual e reprodutiva, a tendência a transposição de experiências pode ser um elemento de equivoco. A diversidade entre homens e mulheres, entre mulheres e entre homens, deve ainda considerar a possibilidade de outras sexualidades. A utilização de um conceito amplo de gênero, entendido como manifestação das diversas formas de sexualidade, permitirá a produção de políticas menos discriminatórias. Por outro lado, como indicou a ABRASCO (2005) 45 Gênero, pobreza e etnia se articulam na configuração de um perfil de agravos à saúde cuja superação requer uma adequada con44 Texto disponível em http://200.37.88.16/BAMAKO/books/ SIDA_y_sexo_entre_hombres.pdf#page=103 , acessado em 10 de nov. de 2010. 45 Boletim informativo da ABRASCO: Gênero e Saúde no 11º Congresso Mundial de Saúde Pública. 507 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental catenação entre políticas universalistas e ações focalizadas, propostas sanitárias e programas de desenvolvimento desenhados na perspectiva de gênero. Neste sentido, A focalização deve ser entendida como ação positiva no sentido de desenvolver estratégias específicas para grupos com necessidades especiais. Se o sistema é desigual, são necessárias ações próprias que revertam as desigualdades, e não uma focalização assistencialista, que ofereça cesta básica para pobres sem de fato contribuir para reverter a situação de pobreza. Dentre as políticas que tratam da saúde sexual e reprodutiva que foram efetivamente implementadas em vários países ao redor do mundo e surtiram um efeito significativo figuram as políticas de planejamento familiar. Inicialmente pautado pela preocupação com o crescimento acelerado da população e sua relação com a pobreza, há cerca de meio século, o planejamento familiar têm, atualmente, objetivos diversos: promover a liberdade de escolha dos indivíduos no tocante a suas vidas reprodutivas. Em 1974, na Conferência sobre População Mundial em Bucareste, os países em desenvolvimento questionaram a orientação das políticas de planejamento familiar, porque em muitos países se traduziram em estratégias de esterilização feminina. Sentindo-se cada vez mais pressionados pelos países industrializados a diminuir seu contingente populacional, sustentavam a visão de que o investimento na resolução das causas indiretas do crescimento populacional, como a pobreza, era negligenciado, enquanto o controle populacional era enfatizado. Ao final da discussão, prevaleceu a ideia da complementaridade entre o investimento no planejamento familiar e em outros aspectos do desenvolvimento que reduzem a demanda por filhos, como educação e a maior inserção das mulheres no mercado de trabalho, por exemplo. A partir da conferência de Bucareste iniciou-se o período de maior força nas políticas de planejamento familiar: na grande maioria dos países em desenvolvimento (excetuando- se aqueles localizados na África Subsaariana) conseguiu-se reduzir a taxa de fertilidade drasticamente – a mudança que levara um século nos países desenvolvidos deu-se em uma geração, graças, em grande medida, às políticas de planejamento familiar. (ONU, 2002). O número de filhos por mulher reduziu-se em 50%, e a taxa de mulheres que utilizavam contraceptivos aumentou de 10% a 60% entre os anos 1960 e 1990. Porém, em alguns países, a redução populacional se realizou por meio de políticas públicas coercitivas que ignoravam o respeito à vontade dos indivíduos (RONBINSON, ROSS,2007), culminando na esterilização de milhões de mulheres jovens, economicamente desfavorecidas e não-brancas, em sua maioria. A CIPD de Cairo foi um divisor de águas e constituiu uma mudança sensível nas políticas de planejamento familiar. Em Cairo, a denúncia das práticas coercitivas e as discussões sobre temas polêmicos, como o aborto, esterilizações forçadas e relação entre população e desenvolvimento levaram a uma mudança de abordagem nos temas da demografia, com as perspectivas de controle populacional perdendo força em favor do planejamento familiar, pautado pelos direitos reprodutivos, como uma das ferramentas para contribuir para a saúde reprodutiva e sexual, ladeados por políticas sociais e econômicas para reforçar os direitos das mulheres (ONU, 2004). 8.Planejamento familiar – saúde reprodutiva e direitos humanos. O planejamento familiar é um tópico essencial da saúde sexual e reprodutiva, uma vez que permite a indivíduos e casais decidirem livre e responsavelmente a respeito do número e da época em que desejam ter filhos, assim como o intervalo entre eles. Segundo a OMS (2004, p.5), ele é “reconhecido não apenas como uma intervenção essencial para a melhoria da saúde de homens, mulheres e crianças, mas também como um direito humano”. 8.1. Planejamento familiar - entre direitos reprodutivos e controle de natalidade O movimento internacional pelo planejamento familiar, que floresceu principalmente a partir da metade da década de 1960 até a década de 1990, teve seus esforços pioneiros realizados por associações não governamentais como a Federação Internacional de Planejamento Familiar (IPPF). Eles eram direcionados principalmente aos países em desenvolvimento, e por vezes eram motivados por visões de que o crescimento populacional seria uma das causas majoritárias da pobreza. Investimentos dos Estados Unidos, alguns países da Europa e do Banco Central logo seguiram, e em 1970 foi criado o Fundo de Populações das Nações Unidas (UNFPA, do inglês UN Fund for Population Activities46). 46 Fundo das Nações Unidas para atividades relacionadas à 508 8.2.Tendências recentes no uso de métodos contraceptivos. Os programas de planejamento familiar integram as políticas de saúde de vários países em todo o mundo, e mesmo que não consigam atingir a todas as mulheres47, há uma queda considerável na taxa de fertilidade. A variedade crescente de população (tradução livre) 47 Cerca de 40% dos casais com mulheres em idade reprodutiva, segundo as Nações Unidas (2002) ainda não acessam os recursos da contracepção, levando a gestações não desejadas, não planejadas ou prematuras. 509 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental novos métodos contraceptivos é uma das responsáveis desta taxa em países em desenvolvimento, além da variedade de métodos provocar impactos na diversificação da escolha do melhor método a ser utilizado também nas regiões desenvolvidas. Segundo uma pesquisa realizada pela Divisão sobre População do Secretariado das Nações Unidas em 1997 (ONU, 2002), feita com mulheres casadas (com uniões formais e informais), 62% dos casais com mulheres em idade reprodutiva no mundo fazem uso de algum método contraceptivo. No que se refere à escolha dos métodos, há dois padrões que se repetem em escala mundial: a preferência por métodos modernos, tanto pela progressiva disseminação e acesso quanto por sua maior eficácia, e a predominância de métodos utilizados por mulheres. Além de muitas culturas associarem os cuidados com a reprodução somente às mulheres, as próprias políticas de planejamento familiar, até recentemente não tinham homens como seu público alvo, tendência esta que se procura reverter (OMS, 2002). 10.2.1 Contraceptivos e diferenças regionais – história, cultura e política. As diferenças entre as regiões desenvolvidas e as em desenvolvimento no uso de métodos contraceptivos, entretanto, são significativas: a utilização de métodos tradicionais48, curiosamente, é maior nas regiões desenvolvidas, o que ocorre por razões históricas, de maior igualdade de gênero e menor desigualdade social, uma vez que a transição demográfica49 em grande parte dos países ocorreu antes do advento dos métodos modernos. Já nos países em desenvolvimento, 90% dos contraceptivos usados são modernos (ONU, 2002), tanto pelo fato de programas de planejamento familiar na maioria destes países terem iniciado após o advento das novas tecnologias contraceptivas, quanto pelo fato de serem considerados métodos mais eficazes. Outro contraste entre as regiões se refere à duração do método de escolha: enquanto no mundo desenvolvido predominam métodos temporários, reversíveis e de curto prazo, como pílulas de uso oral e preservativos, nas outras regiões do planeta predominam a esterilização feminina e DIU, métodos efetivos a longo prazo e que necessitam de intervenção médica. Isto ocorre principalmente por serem os métodos mais utilizados na Ásia, em especial na Índia e na China, países em que o planejamento familiar é adotado pelo governo com claro viés de controle populacional, negligenciando-se o direito à autonomia reprodutiva. Os métodos de longo prazo e com uma altíssima eficácia são considerados mais adequados às metas de diminuição da taxa de natalidade – mas em seu desrespeito à autonomia das pessoas, em especial das mulheres, vai contra um dos princípios dos direitos reprodutivos, a autonomia, que inclui a adequação do método a cada pessoa em sua condição individual e inserção social. Uma terceira diferença está na participação masculina no uso de contraceptivos: enquanto métodos que envolvem a participação masculina (preservativos, esterilização masculina e coito interrompido, entre outros) chegam a 50% dos métodos utilizados nos países desenvolvidos, a participação nas regiões em desenvolvimento é, em média, de 20% (ONU, 2002). Causas exatas para tal diferença são difíceis de serem apuradas, levando-se em conta a enorme diversidade de ambos os blocos de países, mas podem ser vistas a partir de padrões culturais, escolaridade, equidade de gênero e a participação ativa masculina nos assuntos relacionados à saúde reprodutiva, como a contracepção (HELZNER, 2002) – na superação da construção social de masculinidade estaria a chave para o reconhecimento da possibilidade de cooperação do casal em matéria de planejamento familiar. 48 Considera-se que os métodos tradicionais consistem em práticas como o coito interrompido, as duchas vaginais e o método do calendário, enquanto os métodos ditos modernos incluem métodos químicos, mecânicos e hormonais. 49 Processo em que a queda das taxas de mortalidade ocorrem de forma mais acelerada do que as de natalidade em determinado país, gerando um crescimento vegetativo grande. Segundo DIAS (2007) “A transição demográfica no Brasil tem sido muito mais acelerada do que nos países desenvolvidos, não se diferenciando, entretanto, do que vem passando outros países latino-americanos e asiáticos. Um bom indicador tem sido o rápido declínio da fecundidade”. http:// www.cedeplar.ufmg.br/pesquisas/td/TD%20318.pdf 510 8.3. – Demandas não atendidas. Apesar dos avanços tecnológicos e políticos dos últimos anos, aproximadamente um quinto das mulheres em uniões formais ou informais no mundo nas regiões em desenvolvimento não tem suas necessidades de planejamento reprodutivo atendidas – ou seja, desejam limitar o número de filhos ou aumentar o espaço de tempo entre uma gravidez e outra mas não estão usando nenhum método contraceptivo (ONU, 2002). As consequências são gravidezes indesejadas, em uma idade precoce ou em número superior à vontade da mulher. As causas para essa carência de planejamento familiar residem em diversos fatores: falta de educação sexual, de informação, acesso aos métodos contraceptivos disponíveis não são as únicas razões, que também incluem questões culturais e religiosas, que acabam condicionando a esfera econômica e legal. O componente cultural e religioso desempenha um papel crucial no acesso ao planejamento familiar – a reprovação de líderes religiosos e a oposição cultural à redução do número de filhos, além de constituírem uma razão por si só, também estendem suas influências à esfera política e legal, podendo constituir um dos motivos para os quais leis restritivas são mantidas. As desigualdades de gênero aqui assumem a forma da resistência dos parceiros ao uso de contraceptivos, seja por famílias numerosas serem vistas como sinal de virilidade, ou pelo uso de alguns métodos mais acessíveis, como o preservativo masculino, alegadamente reduzir o prazer sexual masculino durante a relação (HELZNER, 2002). Tais barreiras legais ao uso de contraceptivos em alguns países podem tanto excluir alguns grupos mais vulneráveis, ao dificultar ou proibir o acesso de adolescentes e pessoas que não estejam casadas a métodos contraceptivos (OMS, 2004) 511 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental quanto restringir a todos o acesso a alguns métodos, como por exemplo, proibir a venda em farmácias de contracepção de emergência50. A limitação das escolhas possíveis, seja resultado de políticas que priorizam apenas um método, seja de falta de condições econômicas do indivíduo, também é uma causa considerável para necessidades não atendidas. Para diminuir a distância entre a demanda por planejamento familiar e o número de pessoas efetivamente contempladas pelas políticas, não basta apenas disponibilizar métodos contraceptivos a um preço acessível e contar com o amparo legal. Afinal, assim como as causas dessa carência não se resumem a questões de logística ou econômicas, as ações para ampliar os direitos dos indivíduos escolher livre e responsavelmente a respeito de suas vidas reprodutivas passam também por questões sociais e culturais. A importância da laicidade do Estado evidencia-se nestas situações, em que há um grande risco de concepções religiosas e concepções pessoais comprometerem temas públicos e de Estado. A melhor forma de estabelecer um diálogo democrático apóia-se em importantíssimas práticas que complementam políticas de saúde pública: a educação e a informação. -alvo, incorporando suas ideias na formação de políticas. Respeitando sua cultura e necessidades, pode-se buscar a tomada de consciência e apropriação sobre a sua saúde reprodutiva sem tornar a invasão de privacidade – respeitar e incorporar o tempo e os costumes de cada comunidade nas políticas de conscientização é crucial para o sucesso de uma iniciativa (OMS, 2002). Embora as mulheres sejam majoritariamente as usuárias de contraceptivos, e os direitos reprodutivos devam ser vistos como pertencentes a cada pessoa, no caso das relações heterossexuais, o papel dos homens é crucial para a saúde reprodutiva. Seja de forma positiva, como parceiros comprometidos, ou de forma negativa, como agressores e limitantes das opções das mulheres. A própria construção social geralmente associada à masculinidade pode inibir o acesso de homens a informações corretas a respeito de sua própria sexualidade. A superação desse quadro é pretendida ao estimular o diálogo e a tomada de decisão em conjunto nos assuntos de planejamento familiar (OMS, 2001). A influência religiosa nas práticas sexuais de seus fieis é um tópico conflituoso para implementações de políticas de saúde reprodutiva. Como foi reconhecido na CIPD de Cairo, algumas instituições e grupos religiosos acreditam que certos direitos reprodutivos das mulheres não estariam de acordo com seus ensinamentos. Já houve experiências, porém, em que foi possível dialogar com líderes religiosos locais e chegar a um consenso, mesmo que frágil (OMS, 2001). Em outras circunstâncias foi necessário mobilizar forças sociais e do Estado para sua garantia. Enquanto há alguns pontos em que a natureza categórica de dogmas religiosos não é favorável a compromissos, a influência e o alcance de grupos religiosos, inclusive em grupos vulneráveis como adolescentes, em algumas sociedades podem ser bastante efetivos para disseminar um programa de saúde reprodutiva52(BOONSTRA, 2008). Envolver grupos sociais relutantes na elaboração do projeto, procurando manter um diálogo aberto, pode transformar opositores desconfiados em defensores do programa, tendo dele participado (OMS, 2001). 9. Educação sexual e campanhas de conscientização – benefícios e desafios. Iniciativas de educação sexual e campanhas de conscientização, como a Informação, Educação e Comunicação (Information, Education and Comunication – IEC)51 operam visando à mudança ou reforço de comportamentos individuais, assim como mudanças em normas sociais, tendo como objetivo a plena conscientização e controle sobre suas vidas sexuais e reprodutivas (OMS, 2001). Em muitas sociedades há uma cultura de silenciamento em relação à sexualidade, que acaba sendo terreno fértil para a criação de tabus e a disseminação de informações incorretas em forma de rumores. Disponibilizar informações científicas a respeito de contraceptivos é extremamente necessário, embora não seja o suficiente. A adequação das políticas a cada região e suas especificidades é de vital importância para que estas sejam bem sucedidas. Tal adequação tem iniciado, segundo a OMS, com pesquisas qualitativas para conhecer as necessidades do público50 Como a pílula do dia seguinte. 51 IEC é definida como iniciativas que procuram mudar ou reforçar determinados comportamentos(sejam eles comportamentos individuais ou padrões sociais) em um público-alvo, tendo em vista um problema e uma área específica, sendo focadas principalmente na prevenção e cuidados primários com a saúde. O objetivo principal dos programas é o de trazer às pessoas informações para que tomem pleno controle de suas ações em relação à saúde. As atividades são multidisciplinares, e envolvem o planejamento, implementação, monitoramento e avaliação dos programas. (OMS, 2001) 512 9.1. Adolescentes – sexo, política e o futuro de nosso mundo. Na Conferência de Cairo, em 1994, foi dada atenção especial às necessidades e direitos sexuais e reprodutivos de adolescentes, considerados como um grupo populacional especialmente vulnerável (ONU, 2002) – segundo a UNAIDS (UNAIDS apud ONU, 2001), metade das novas contaminações do vírus do HIV são em jovens de 15 a 24 anos. Suas demandas por planejamento familiar são as mais prováveis de não serem atendidas, seja por falta de informação ou até mesmo barreiras legais na 52 Exemplos de uma relação positiva entre grupos religiosos e o uso de contraceptivos pode ser encontrado em BOONSTRA, Heather D. Matter of Faith: Support for Comprehensive Sex Education Among Faith-Based Organizations” Guttmacher Policy Review, vol. 11, n.1, 2008. 513 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental obtenção de contraceptivos. Ademais, cerca de metade da população mundial tem menos de 25 anos, o que significa que um grande contingente de seres humanos está iniciando, ou está prestes a iniciar, sua vida sexual. Como é muito comum que a transição da infância para a vida adulta seja feita por adolescentes sem conhecimento, experiência ou orientação (ONU, 2001), faz-se necessário um especial esforço na educação sexual de adolescentes. Afinal, o tamanho, a prosperidade e a saúde da futura população mundial dependem, em grande medida, da atenção às necessidades educacionais e reprodutivas da juventude contemporânea. O processo do desenvolvimento sexual de jovens, além de envolver mudanças psicológicas e físicas, está intrinsecamente ligado a aspectos culturais. A transmissão de valores culturais também engloba os valores relacionados ao gênero e à sexualidade, construindo uma identidade dentro do contexto socioeconômico. Porém, em muitas sociedades, jovens são expostos às mais diversas fontes de informação e valores (a mídia, os pais, a escola, os colegas), muitas vezes com valores diferentes e conflitantes a respeito de gênero e sexualidade (UNESCO, 2009). Diante deste quadro, destaca-se a necessidade de prover informações confiáveis, para que jovens possam fazer escolhas conscientes e responsáveis a respeito de sua sexualidade. Porém, uma educação sexual integral, com ampla disponibilização de informações científicas e confiáveis a respeito dos métodos contraceptivos, seus efeitos e riscos, encontra muita resistência de pais, grupos religiosos e políticos. Persiste a ideia de que a exposição a informações sobre planejamento familiar levará jovens a adotar comportamentos precoces e promíscuos, além da preferência por uma educação sexual que doutrine adolescentes a praticar abstinência até o casamento (OMS, 2001). Noções essas sem consonância com o cotidiano de um contingente crescente de jovens ao redor do globo: o tempo entre a puberdade e o casamento tem crescido globalmente na medida em que a escolaridade aumenta e a emancipação feminina se consolida. A política de cada país em relação à educação sexual é condicionada por suas condições políticas socioeconômicas e culturais, e, no caso dos países em desenvolvimento, também há a influência de ajuda externa. Um grande número de programas e políticas é promovido ao redor do mundo, mas os principais países doadores se concentram em duas orientações opostas: a primeira, que tem como principais doadores os países da Europa Ocidental, costuma tomar as expressões da sexualidade de jovens como pressuposto têm seu foco em transmitir informações a respeito dos aspectos biológicos e emocionais da sexualidade e da contracepção, encorajando o uso de contraceptivos, que por vezes são oferecidos gratuitamente aos adolescentes (BOONSTRA, 2007); já a segunda orientação, até pouco tempo encabeçada pelos Estados Unidos da América, concentra-se em combater DSTs e gravidezes indesejadas através da promoção da abstinência sexual até o casamento e evidenciando as falhas e limitações de métodos contraceptivos (BOONSTRA, 2007). Desde a última eleição presidencial, porém, os EUA têm reformulado suas políticas referentes a educação sexual, tanto interna quanto externamente, tendendo a aproximar-se da primeira corrente. (BAROT, 2009) Um crescente número de governos ao redor do mundo já considera a educação sexual como uma prioridade para atingir metas de saúde, educação e de desenvolvimento do país (UNESCO, 2009). Isso se deve, em grande parte, ao potencial da educação sexual em minimizar o devastador impacto de doenças sexualmente transmissíveis. Se a educação sexual é feita com o objetivo de preparar jovens para tomar decisões livres e responsáveis a respeito de sua sexualidade, tendo em vista que estas decisões afetarão profundamente sua vida a curto e a longo prazo, torna-se vital tratar das DSTs, uma vez que têm o potencial de seriamente prejudicar ou até ceifar o futuro daqueles que apenas começaram sua jornada na vida. 514 10. Conclusão Este artigo teve a finalidade de abordar as principais questões referentes à Saúde Sexual e à Saúde Reprodutiva e sua trajetória para o reconhecimento enquanto direitos humanos, chamando a atenção os diversos obstáculos e desafios de diversas ordens na sua transformação em objetos de políticas públicas, por serem temas delicados e complexos. Muitas destas dificuldades estão relacionadas aos mitos, tabus, práticas e convenções sociais presentes em culturas altamente diferentes entre si, o que representa um desafio para a promoção da Saúde Sexual e Reprodutiva como direitos. Entre as questões desafiadoras está a necessidade de considerar e buscar a superação das desigualdades baseadas nas relações de gênero, no racismo e na intolerância, nas desigualdades sociais e de classe, nas diversas faixas e ciclos de vida, entre outras. Sendo a saúde reprodutiva já plenamente reconhecida como um direito e a saúde sexual em processo de seu reconhecimento, há documentos internacionais e nacionais que os ancoram. Há também resistências e intervenções, de forma a impedir sua garantia, como a religião e o conservadorismo. Há, sobretudo, desafios baseados na diversidade cultural, os quais devem ser vistos positivamente e não como argumentação para dar margem ao relativismo cultural, que dependendo da interpretação admite práticas que são violações aos direitos humanos. Como exemplo, este artigo cita as mutilações genitais, os estupros coletivos, os casamentos de crianças. O artigo trouxe à discussão a questão dos direitos, que segundo o paradigma dos direitos humanos pertencem a cada pessoa e ao mesmo tempo integram os parâmetros mínimos da humanidade. Tratando do direito à saúde, o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais menciona “o direito de toda pessoa desfrutar do mais elevado nível possível de saúde física e mental”. No que diz respeito à Saúde Sexual e Reprodutiva como um direito, um aspecto central ao qual se deve atentar é ao princípio da não-discriminação, ao lado dos princípios da autonomia, autodeterminação e privacidade. A multiplicidade de entendimentos sobre sexualidade e suas expressões deve por sua vez ser o que garante os direitos sexuais e os direitos reprodutivos. E não, pelo contrário, a sua negação. Tendo em vista que sexualidade e a reprodução são experiências humanas 515 Simulação das Nações Unidas para Secundaristas - 10ª Edição Liberdade Identitária como Direito Fundamental constitutivas das identidades e histórias pessoais, formas de expressar-se, e colocar-se no mundo, a saúde sexual e reprodutiva são importantes componentes para que o mais elevado nível de qualidade de vida seja possível. Mas para que a saúde física, mental, sexual, emocional e social seja alcançada, são indispensáveis as condições sociais para sua vivência, ao lado do respeito à diversidade e à dignidade da pessoa humana. uma discussão. In: Ciência e saúde coletiva. vol. 8, n. 3. 2003, p. 825-829. HELZNER, Judith. Adressing Gender Imbalances to Promove Reproductive Health. PROGRAMMING FOR MALE INVOLVMENT IN REPRODUCTIVE HEALTH. WHO, 2002. INTERNATIONAL PLANNED PARENTHOOD FEDERATION. Sexual Rights: An IPPF Declaration. Londres, 2008. KRUG, E.G. et al., eds. World report on violence and health. 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