O Poder de 8 Milhões
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
SUPLEMENTO DO RELATÓRIO SOBRE A SITUAÇÃO DA POPULAÇÃO MUNDIAL – 2014
Ficha técnica:
Titulo: O Poder de 8 Milhões: Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
Propriedade: UNFPA – Moçambique
Representante: Bettina Maas
Equipa editorial: Gilberto Norte, Debora Nandja e Amâncio Miguel (histórias de vida)
Fotos: Yassmin Forte e Amâncio Miguel
Produção gráfica: Elográfico
Agradecimentos: Won Young hong, Amélia Zawangwone e Baisamo Juaia
http://mozambique.unfpa.org
https://twitter.com.UNFPAMOZAMBIQUE
www.facebook.com/pages/UNFPA-Moçambique
Endereço: Avenida Julius Nyerere, 1419
Maputo – Moçambique
2014
UNFPA – Criando um mundo
onde cada gravidez é desejada,
cada parto é seguro e o potencial
de cada jovem é realizado.
Nota da Representante
©Amâncio Miguel
ÍNDICE
Página 02
I
JOVENS: grandes números, grandes desafios,
grandes possibilidades
Página 03
II
Investir nos jovens: mais do que opção, uma
necessidade
Página 10
III
Os Jovens e o dividendo demográfico
Página 14
IV
Opções de políticas para criar e usufruir do
dividendo demográfico
Página 19
Considerações Finais
Página 23
Referências
Página 24
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
1
Nota de Abertura
Moçambique atingiu a marca de 8.1 Milhões de adolescentes e jovens
com idade de 10 a 24 anos, e esta continuará crescendo nos próximos
anos. Este feito constitui uma potencial chance de progresso social
e económico. Porém, a forma como respondemos às necessidades e
aspirações dos jovens é que definirá o futuro do país.
A educação é crucial. As habilidades e conhecimentos que os
jovens adquirem devem ser relevantes para torná-los inovadores,
pensadores e solucionadores de problemas.
O investimento na saúde, incluindo saúde sexual e reprodutiva
também é central. Quando os jovens transitam da adolescência
para a fase adulta de forma saudável, as opções para o futuro se
expandem.
Investimentos estratégicos podem tornar os jovens
conscientes dos seus deveres e dos direitos à educação, à saúde,
ao desenvolvimento e à viver uma vida livre de violência e
discriminação.
O Fundo das Nações Unidas para População (UNFPA)
reconhece que progressos em prol dos jovens tem sido dados.
Porém, ainda faz-se necessário reforçar as intervenções para
proteger os direitos de todos, incluindo os adolescentes e jovens.
Com políticas e investimentos apropriados, o país poderá criar a
oportunidade e aproveitar os benefícios do dividendo demográfico.
Esta terceira edição do suplemento do Relatório da Situação da
População Mundial surge num ano especial em que após vinte anos
de implementação, os países, incluindo Moçambique reiteraram
o seu apoio ao Plano de Acção da Conferência Internacional de
População e Desenvolvimento, que reconhece a importância do
papel dos jovens no desenvolvimento. Este é também um período no
qual temos a oportunidade de definir a agenda de desenvolvimento
Pós-2015. Assim sendo, para um país jovem, como é Moçambique, os
jovens devem estar no centro da visão de desenvolvimento Pós-2015,
de modo a conduzirem o futuro que queremos.
Bettina Maas
Representante do UNFPA em Moçambique
2
O P ode r de 8 M i l h õ e s
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
“Quando os jovens
transitam da
adolescência para a
fase adulta de forma
saudável, as opções
para o futuro se
expandem.”
©Yassmin Forte
CAPÍTULO I
JOVENS: grandes números,
grandes desafios,
grandes possibilidades
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
3
A crescente geração de adolescentes e jovens
está marcada por oportunidades e desafios.
Quando beneficiam do direito à saúde, à
educação e às condições de trabalho decentes,
os jovens se tornam uma força poderosa para o
desenvolvimento económico e mudança positiva.
Ademais, em Moçambique, a pobreza, a
desigualdade, as altas taxas de mortalidade e de
natalidade estão articuladas num círculo vicioso.
A redução da pobreza pelo investimento na saúde
e educação, especialmente para as mulheres e
raparigas, pode romper esse ciclo. Com acesso
à educação de qualidade, gozando de boa saúde
e tendo um emprego digno, há um aumento da
produtividade e melhores perspectivas de longo
prazo para os jovens, suas famílias e para o país.
Por outro lado, quando este potencial não é
aproveitado, os investimentos apropriados não são
feitos, a oportunidade de progredir e acelerar o
desenvolvimento é desperdiçada.
Tendências demográficas da população jovem
O país tem 8,1 Milhões de adolescentes e jovens, equivalente
a 33% da população. Mudanças demográficas marcadas pela
alta fecundidade e declínio da mortalidade ao longo dos anos
explicam o surgimento desta significante população jovem.
A taxa de natalidade continua alta no país, enquanto que
a partir da década de 1980, a mortalidade infantil regista
uma redução significativa, resultando no aumento das taxas
de sobrevivência e no surgimento de um número cada vez
maior de raparigas e rapazes que chegam à idade jovem.
Segundo as projecções, esta tendência estender-se-á até
2040, altura em que mais de 30% da população continuará
sendo composta por adolescentes e jovens.
As projecções indicam igualmente que a população
de Moçambique continuará jovem e crescendo a taxas
elevadas por muitos anos, devido à elevada fecundidade
que decresce lentamente. Porém, se a fecundidade
reduzir rapidamente, o país mudará drasticamente a sua
estrutura etária, resultando num crescimento acelerado da
população em idade activa, isto é, de 15 a 65 anos.
Gráfico 1: Proporção de Jovens de 10-24 e 15-35 anos de Idade na População Total.
Moçambique, 1970 - 2040
10 - 24 anos
15 - 35 anos
Percentagem
40
30
20
10
0
1970
1980
1990
1997
2007
2014
2020
2030
2040
Fonte: DNE, 1980; INE, 2010
Por quê estes números e tendências importam?
4
Mais de três milhões de jovens atingem a idade activa todo ano e algumas questões que se colocam são:
Haverá empregos suficientes para acomodar as suas necessidades de trabalho decente? Terão acesso à
informação e serviços que precisam para evitar a gravidez indesejada? Estará essa nova geração preparada
para oferecer todo o seu potencial?
A emergência deste contingente de população jovem poderá ter efeitos profundos no país. Se estes efeitos
serão positivos ou negativos dependerá largamente de como o Governo responde as demandas dos jovens.
Com as melhores políticas e investimento, assim como o engajamento dos jovens para melhorar o seu próprio
esta8geração
O Ppotencial,
ode r de
M i l h poderá
õ e s tornar-se a solução de problemas. Eles serão os empreendedores, agentes de
mudança
e
líderes
nas
próximas
Adolescentes e Jovens Moçambicanos décadas.
na Transformação do Futuro
Jovens, educação e mercado de trabalho
As evidências apontam claramente que a
educação constitui um dos principais desafios
para Moçambique, pois ela é fundamental para
que se aproveite a janela de oportunidade para o
desenvolvimento. Com a juventude que o país dispõe,
a educação é essencial para que esta tenha capacidade
para resolver os seus problemas e assegurar para si e
suas famílias condições de vida digna. A educação da
força de trabalho é fundamental para impulsionar o
desenvolvimento económico, porque as perspectivas
da sua participação no mercado de trabalho
dependem da sua formação.
O país registou alguns ganhos na educação que
também devem ser assinalados, principalmente no
que refere à redução do analfabetismo e a conclusão
do nível primário. Os dados do Censo 2007 mostram
que, entre 1997 e 2007, houve um declínio de
43% na taxa de analfabetismo dos jovens de 15
-24 anos. Entretanto, apesar destas conquistas, é
necessário aumentar o nível de escolaridade e reduzir
as desigualdades socioeconómicas e de género na
educação, pois as mulheres apresentam uma taxa de
analfabetismo de 47%, contra 25% nos homens.
Em relação às disparidades socioeconómicas, as
estatísticas indicam que apenas 11% das jovens do
quintil de riqueza mais baixo sabiam ler e escrever,
sendo 87% no quintil mais elevado (UNICEF, 2010).
O Inquérito Demográfico e de Saúde de 2011
constatou igualmente que, entre os jovens de 20 a 24
anos, pelo menos 45% concluíram o ensino primário
e apenas 8% tinham o nível secundário ou mais.
“Os dados do Censo 2007 mostram que, entre
1997 e 2007, houve um declínio de 43% na taxa
de analfabetismo dos jovens de 15 -24 anos.
Entretanto, apesar destas conquistas, é necessário
aumentar o nível de escolaridade e reduzir as
desigualdades socioeconómicas e de género na
educação, pois as mulheres apresentam uma taxa
de analfabetismo de 47%, contra 25% nos homens.”
A educação liberta a mulher,
Professora Olivete Morais, Maputo
“A educação abriu caminhos
para a minha progressão. Sou
professora desde 2002. Em
2010 terminei a licenciatura em Linguística e literatura
pela Universidade Eduardo
Mondlane (UEM). Lecciono
11a e 12a classe, na Escola
Secundária da Matola.
Frequento o mestrado em População e
Desenvolvimento na UEM e sou bolseira do
UNFPA. Com este mestrado serei capaz de
formular e realizar estudos de qualidade na
área de população e desenvolvimento. Como
professora, tenho em conta que toda a
política de educação passa, necessariamente, pelo
conhecimento da demografia do país. Ademais,
para uma boa planificação é preciso saber quantos
somos hoje e quantos seremos daqui a 20, 30 40,
entre outros aspectos.
Quero continuar a ser vista como o exemplo de
uma jovem que valoriza os estudos. Uma mulher
educada se liberta da dependência e, de forma
gradual, ela ganha autonomia e liberdade para
decidir e controlar o seu próprio destino.
Quero seguir a carreira académica - produzindo
trabalhos científicos que versam sobre várias
temáticas, com maior enfoque sobre a saúde
reprodutiva. Pretendo fazer o doutoramento.
Ligado à educação, emerge igualmente a
necessidade de se ampliar os postos de trabalho,
pois o país tem uma economia que cresce a 7%
ao ano – um nível elevado - mas que não tem
contribuído suficientemente para a geração de
empregos necessários. Um em cada cinco adultos
é desempregado em Moçambique (INE, 2013) e
o nível aumenta quando se olha para os jovens,
principalmente as mulheres jovens que têm tido
maiores dificuldades para encontrar emprego,
conforme ilustra o gráfico 2.
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Gráfico 2: Taxa de Desemprego por Área de Residência, Sexo e Idade.
Moçambique, 2013.
Total
15 - 19
20 - 24
63.8
49.7
50
46.6
44.1
40.1
22.5
31.6
34.9
20.3
17.2
Moçambique
33.2
29.2
Urbano
Rural
19.9
Homens
24.6
Mulheres
Fonte: INE, 2013
A Organização Internacional do Trabalho (OIT)
alerta para a relação directa entre desemprego juvenil
e exclusão social. Jovens desempregados e sem
rendimento dependem economicamente das suas
famílias - o que acarreta menor disponibilidade de
recursos para gastos e investimentos domésticos.
Com isso, as sociedades perdem os seus
investimentos em educação e os Governos perdem
em contribuições para sistemas previdenciários.
“Tudo isso é uma ameaça para o crescimento
potencial e desenvolvimento das economias”, afirma
a OIT (2010). Por esta razão, os governos e o sector
privado precisam de actuar com rapidez e preparar
os jovens para assumirem papéis produtivos e criar
empregos para eles no início da sua vida produtiva,
aponta o Relatório Económico sobre África, 2011.
Nunca foi meu sonho vender recargas. Quero ser informático
– Eugénio, Maputo
“A vida não é fácil, cada dia é uma incerteza, sem emprego seguro nada é fácil” diz Eugénio, 26 anos, vendedor
de recargas de telefonia móvel.
“Nunca foi meu sonho vender recargas, muito menos lavar carros. É uma alternativa para sobreviver.”
Eugénio começou a vender recargas em 2009, após concluir a 9ª classe, exactamente para custear os estudos,
face à incapacidade de seus pais. Ele é o quarto de seis filhos de uma família com poucos recursos.
Eugénio vende, em média, dez recargas por dia. O lucro de dez por cento por cada recarga ajuda nas despesas
de casa, onde vive com a tia, no bairro Luís Cabral, periferia pobre de Maputo.
“Também ajudo os meus pais e irmãos, que vivem no bairro do Aeroporto, pago o meu curso e compro
material escolar,” diz o jovem que não está preocupado em casar, “porque gostaria de dar o melhor à família
que criar”.
Eugénio ficou dois anos sem estudar, colocando na corda bamba o sonho de estudar informática, mas não o
suficiente para desistir: “Ainda quero fazer esse curso. Este ano vou concluir a 12ª classe e o curso de técnico
aduaneiro e na primeira oportunidade realizar o meu sonho. Quero ser informático”.
6
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
Jovens activistas do Programa Geração Biz, Maputo
Saúde Reprodutiva
Ao contrário da mortalidade, a fecundidade declinou
muito pouco ao longo dos últimos 60 anos, passando
de 7,1 filhos por mulher em 1950 para 5,9 em 2011.
Nas adolescentes, a fecundidade também diminuiu de
171 para 167 filhos para cada mil raparigas de 15-19
anos de idade, entre 1997 e 2011 (IDS, 1997, 2011).
Apesar da relativa diminuição da fecundidade
das adolescentes, esta ainda é considerada elevada.
Para Arnaldo e Muanamoha (2012), os padrões de
casamento constituem um importante determinante
do nível de fecundidade, na medida em que a idade de
casamento de uma mulher marca o início do período
de exposição regular à relações sexuais, a partir das
quais pode engravidar e produzir um nascimento.
Em 1980, pouco mais da metade (53,2%) das
mulheres de 15-19 anos estavam casadas. Esta
percentagem diminuiu para 45,2%, em 1997, e depois
para 45%, em 2007 (Arnaldo e Muanamoha, 2012).
Dados de 2011, mostram que entre as jovens de
15-24 anos, 12% casaram antes dos 15 anos e 30%
casaram antes dos 18 anos (IDS, 2011). Em termos
regionais, é na região norte e centro, particularmente
na Zambézia, Nampula e Cabo Delgado, onde
ocorrem casamentos precoces com maior frequência.
Paralelamente, o país depara-se com o problema
da gravidez na adolescência que está associado
aos casamentos precoces. Um estudo sobre a
gravidez na adolescência, realizado pelo UNICEF
em 2013, mostra que a maioria das jovens mães
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
7
O casal de enfermeiros, Élia e Eliseu, disponibiliza métodos de planeamento
familiar nas comunidades, Maganja da Costa, Zambézia
são casadas. A excepção ocorre nas zonas urbanas,
especialmente no sul do país, onde verifica-se que a
maternidade precoce acontece antes do casamento.
Os inquéritos demográficos e de saúde revelam que
a elevada prevalência da gravidez na adolescência em
Moçambique, parece estar a declinar, uma vez que,
em 2003, o país tinha 46,6% de jovens de 20-24
anos que declararam ter tido filhos antes dos 18 anos,
e 12,3% antes dos 15 anos. Em 2011, o percentual
passou para 40.2% e 7.8%, respectivamente.
As complicações durante a gravidez e parto
constituem uma das principais causas de morte
entre as adolescentes de 15-19 anos, nos países em
desenvolvimento (UNFPA, 2014). Moçambique não
foge a regra e tem a redução da mortalidade materna
como um dos desafios.
Apesar de ainda registar-se uma taxa de
mortalidade materna de 408 mortes por cem mil
8
nascimentos, é facto que esta reduziu de forma
significativa. Intervenções como a Campanha para
Aceleração da Mortalidade Materna (CARMMA),
a iniciativa de “Parto Humanizado”, são alguns
exemplos do esforço governamental para a melhoria
da saúde materna, que é um direito humano
da mulher. O aumento do acesso aos serviços
de planeamento familiar também é uma das
estratégias para a promoção da saúde reprodutiva,
particularmente dos adolescentes e jovens.
Actualmente, apenas 11.4% das jovens casadas de
20-24 anos usam métodos modernos de contracepção
e 23% destas jovens casadas gostariam de usar
algum método contraceptivo, mas não têm acesso
(IDS 2011). Portanto, a estratégia de planeamento
familiar visa, entre outros objectivos, responder às
necessidades insatisfeitas por contracepção.
Este panorama remete a uma reflexão sobre os
desafios de tornar o direito a saúde sexual e reprodutiva
e o empoderamento das mulheres uma realidade.
O Plano de Acção de Cairo reconhece que quando
as raparigas têm acesso à educação abrangente e
serviços de saúde sexual e reprodutiva, os casamentos
tendem a ser tardios, as taxas de fecundidade caem e a
produtividade da mulher aumenta.
O programa de Cairo acrescenta ainda que o
empoderamento das mulheres jovens não é um
fim em si, mas também um passo em direcção
ao desenvolvimento e erradicação da pobreza.
Reconhecendo esta importância, Moçambique tem um
compromisso forte em melhorar o acesso universal
aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, conforme
estipulado no Plano de Acção de Maputo. Programas
focalizados direccionados à grupos vulneráveis,
como adolescentes e jovens, pessoas portadores de
deficiência, mulheres vivendo nas zonas rurais, pessoas
vivendo com HIV têm sido implementados com
resultados positivos (UNFPA, 2014b). A cobertura
dos cuidados pré-natais é quase universal, tendo
abarcado 90.6% das mulheres em 2011.
Sendo o HIV uma das principais causas de
morte entre os adolescentes e jovens de 15 -24 anos
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
(INCAM, 2009), e cuja prevalência tem estado a
aumentar entre os jovens, especialmente entre as
raparigas (INSIDA, 2009), a Estratégia Nacional de
Combate ao HIV (PENIII) visa reduzir o número
de novas infecções. A Estratégia Nacional da
Saúde aborda a necessidade de se intensificarem os
investimentos para se atingir o acesso universal aos
serviços de saúde sexual e reprodutiva para todos.
O nosso trabalho ajuda a reduzir gravidezes na adolescência e casamentos precoces
– Rogimina Gonçalves, estudante e mentora, Nampula
Sou Rogimina José Gonçalves. Tenho 21 anos e estudo nutrição na UniLúrio,
em Nampula. Sou ponto focal das mentoras da província. Trabalho com as
mentoras da Ilha de Moçambique, Nacala-Porto e Cidade de Nampula.
Tornei-me mentora em 2014. Quando ouvi falar da iniciativa, notei que era
algo muito diferente, uma oportunidade para trabalhar com as raparigas
vulneráveis, levantar a auto-estima delas.
Todos os dias, vou ao encontro das raparigas vulneráveis nas comunidades
- raparigas que com menos de 18 anos tornaram-se mães, raparigas que
por causa de dificuldades não estudam ou são forçadas a fazer negócios
informais, raparigas deficientes, raparigas que vivem com HIV. Além de adquirir
habilidades para evitar a gravidez ou prevenir infecções de transmissão sexual,
as meninas beneficiárias aprendem a debater ideias, outras aprendem gestão
de negócios e mais.
Nos locais onde trabalho, encontro realidades diferentes. Na Ilha de Moçambique, por exemplo, prevalecem
os ritos de iniciação e casamentos prematuros; em Nacala e na cidade de Nampula, muitas raparigas recorrem
ao trabalho de sexo. Para cada um destes grupos, preparamos mensagens específicas. No caso das meninas
que estão no trabalho de sexo, falo sobre os riscos de sexo desprotegido e dos cuidados que devem ter para
evitar a violência.
Tenho uma história que me orgulha:
Na minha comunidade, havia um pai que estava a forçar a filha a casar cedo, porque ele julgava que a
primeira menstruação era suficiente para ela ter um marido e filhos. Esse é um caso que me deixou muito
triste, porque pelo que aprendi como mentora se ela casasse cedo, a vida dela seria complicada. Para
salvar a menina, falamos com os líderes comunitários e fomos ter com o pai (com um grupo de activistas
da Escola Secundária de Muatala). Na primeira visita, ele reagiu muito mal, estava irritado com a nossa
intromissão. Demos exemplos de mulheres que graças à educação e protecção singraram na vida. Fomos
mais vezes e ele compreendeu que a educação deveria ser a prioridade da filha.
Ser mentora é gratificante e não prejudica os meus estudos. É uma experiência que está a mudar a minha
vida, que me prepara para enfrentar os desafios da vida. Tenho o apoio dos meus pais, que acham que o que
faço é importante para a minha família e para a minha comunidade.
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Investir nos jovens:
mais do que opção,
uma necessidade
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
©Amâncio Miguel
CAPÍTULO II
“Podemos dizer que existem quatro necessidades primárias e
básicas que uma população em sociedade deseja: viver num
ambiente seguro, estar apto ao trabalho, ter acesso á boa saúde
pública e ter oportunidades educacionais”. Nelson Mandela
(Generation 2030 Africa)
Os países não se podem dar ao luxo de adiar o
investimento nos seus activos mais promissores
e inovadores, que são os jovens. Neste capítulo
apresentam-se oito argumentos do porquê esta
é a opção certa e urgente. Alguns argumentos
referem-se aos benefícios de uma perspectiva de
desenvolvimento a longo prazo, outros, por sua vez,
realçam resultados mais imediatos.
Argumento 2: Os jovens são dignos da parte dos
recursos que lhes corresponde
Argumento 1: Compromissos assumidos pelo
Governo
Os governos comprometeram-se a melhorar a
vida dos jovens, tanto ao nível regional, bem como
internacional. Isto inclui, desta forma, plataformas
de acção, tais como a Conferência Internacional
sobre População e Desenvolvimento (1994) e o
Programa Mundial de Acção para a Juventude (1995),
bem como convenções legalmente vinculativas, tal
como a Convenção sobre os Direitos da Criança
(1990). Moçambique assumiu estes compromissos
internacionais e os operacionaliza através dos
seus planos de desenvolvimento. Além dos planos
sectoriais, nos quais o investimento na juventude
está previsto em várias dimensões, existe a Política
Nacional da Juventude, que prevê a promoção do
movimento de associações juvenis e a promoção de
formação vocacional para a juventude, por forma a
aumentar a produtividade juvenil e apoiar na redução
da pobreza no país.
O argumento mais simples é baseado na equidade:
grande parte da população jovem em todos os
países em desenvolvimento e em transição é digna
de beneficiar-se de recursos. Este argumento tem
maior peso nos países menos desenvolvidos, onde os
jovens constituem a maior proporção da população
como um todo, e ainda mais prováveis de estarem
em situação de pobreza extrema. Em Moçambique,
as plataformas juvenis, como o Conselho Nacional
da Juventude e o Parlamento Juvenil, têm advogado
para a inclusão da juventude nos grandes projectos
de desenvolvimento, como os de recursos minerais,
não só como um caminho para a minimização
do desemprego juvenil, mas também como uma
expressão da juventude para a partilha da riqueza e
das oportunidades de crescimento social.
“Os países não se podem dar ao
luxo de adiar o investimento nos
seus activos mais promissores e
inovadores, que são os jovens.”
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
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Jovens estudantes após um debate sobre saúde sexual, Maputo
12
Argumento 3: Os jovens são fundamentais para o
desenvolvimento económico e social dos países
Argumentos 4 e 5: Os benefícios do investimento
macro e micro-económico em jovens
Um argumento mais sofisticado e baseado em direitos,
apresenta uma base moral e legal para direccionar mais
recursos para os jovens, especialmente raparigas e
mulheres jovens, devido à sua grande vulnerabilidade
à pobreza. A Política Nacional da Juventude de
Moçambique destaca esta questão, cujo principal
objectivo é aumentar a participação juvenil nos
processos de desenvolvimento económico, social,
cultural e desportivo.
O combate à pobreza, a universalização do ensino
de qualidade, a diminuição das desigualdades de
género, a garantia de um desenvolvimento social,
económico e sustentável cobertos pela agenda
dos ODM e pós-ODM não podem ser efectivos
se o país não investir nos oito milhões de jovens
de 10-24 anos ou 12 milhões se considerarmos
que a juventude vai até os 35 anos, conforme
recomendação da União Africana.
Nesta conjuntura, dois argumentos se destacam,
nomeadamente: os benefícios a médio prazo,
resultantes do investimento em jovens, e os benefícios
microeconómicos. O primeiro se baseia em evidências
dos benefícios macroeconómicos que podem originar
de um círculo virtuoso de investimento na saúde e
na educação das crianças e, em seguida, fortalecer
este investimento durante a adolescência, para a
consolidação do investimento inicial. Por outro lado,
o segundo argumento é de ordem microeconómica,
o qual pode ser levado a cabo em torno do retorno
económico dos investimentos em determinados
programas, com base em dados de rentabilidade
e informações sobre as quais as intervenções são
prováveis de ter maior impacto. Uma das mais
recentes intervenções com o foco no investimento
económico da juventude é a chamada Coalizão
Global, lançada, em Outubro de 2014, pelo Banco
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
Mundial, cujo foco é desafiar as barreiras que mantém
o desemprego da juventude, e criar um ambiente de
capacitação, empregabilidade e participação juvenil no
desenvolvimento económico de um país1.
Em Moçambique são escassos os estudos que
avaliam o impacto da empregabilidade juvenil na
renda familiar. Contudo, é facto que a entrada dos
jovens no mercado de trabalho contribui para o
aumento do rendimento familiar ou diminuição da
dependência.
Argumento 6: Apoiar os jovens nas suas
transições chaves
Por que os jovens necessitam de atenção
especial? Como resultado deste quesito, um
argumento baseado no estágio crítico dos jovens
no ciclo de vida, destaca os efeitos combinados das
dificuldades que os jovens, em particular as raparigas,
enfrentam na sua transição da dependência para a
independência.
Em Moçambique várias são as intervenções que
têm focado na juventude como um momento de
transição, onde as necessidades são específicas e
onde o investimento deve ser relevante por forma
a proporcionar alguma mudança no futuro da
população e do país. Algumas destas intervenções
têm o foco no indivíduo, e outras nos grupos e
associações. Alguns exemplos: O Programa Geração
Biz, com o foco na saúde sexual e reprodutiva; as
intervenções das Nações Unidas para a capacitação
juvenil com o foco na empregabilidade; e o trabalho
do governo na educação profissional e vocacional.
1
www.worldbank.org/en/news/press-release/2014/10/08/globalcoalition-tackle-youth-unemployment.print
Argumento 7: Benefícios a longo prazo: a redução
das probabilidades de desordem civil
O segundo argumento a longo prazo, que pode
atrair interesse particular dos decisores políticos que
não querem correr riscos, é baseado no reforço da
segurança nacional, diminuindo a actividade criminal
e a probabilidade de uma convulsão civil. Genericamente, os jovens são
desproporcionalmente responsáveis por crimes
violentos e são mais propensos a serem vítimas dos
mesmos. Nesta conjuntura, pesquisas mostram que
um “aumento de jovens” no seio da população, num
ambiente de economia fraca e de má governação,
pode estar associado à violência política e conflitos
sociais internos.
Entretanto, factores comuns incluem o grau do
aumento de jovens, um maior nível de população
urbana, uma maior proporção da população envolvida
em trabalhos não remunerados ou à procura de
emprego, e o grau de fraccionamento étnico da
população. Em Moçambique onde a guerra de
desestabilização teve um impacto bastante negativo
nesta camada, investir na juventude deve ser um
imperativo para a prevenção de violência politica e
conflitos sociais.
Argumento 8: Criar oportunidade para o
dividendo demográfico
Fazendo uma perspectiva a longo prazo, os decisores
políticos devem apreciar os efeitos da estrutura etária
de um país sobre o desenvolvimento económico.
Percebendo que o dividendo demográfico depende
do investimento em oportunidades de emprego, saúde
pública, igualdade de género e educação, Moçambique
deve fortalecer e aumentar os investimentos nestas
áreas urgentemente. O P ode r de 8 M i l h õ e s
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CAPÍTULO III
Os Jovens e o dividendo
demográfico
Moçambique é um dos países em desenvolvimento com
uma grande proporção de população jovem. As mudanças
na dinâmica demográfica e as emergentes oportunidades
que se registam, constituem uma oportunidade para
o país beneficiar do dividendo demográfico, se forem
implementadas políticas apropriadas.
14
O P ode r de 8 M i l h õ e s
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
Principais acções para criar o dividendo demográfico
Aumentar o acesso
à educação de
qualidade, em especial
para as raparigas
Aumentar
oportunidades
de emprego
Expandir acesso
a contracepção
Melhorar acesso
ao sistema
financeiro
©Amâncio Miguel
Aumentar
investimentos no
capital humano
para jovens
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15
O dividendo demográfico refere-se ao acelerado
crescimento económico que surge quando a taxa de
mortalidade e fecundidade diminuem e a proporção
de população em idade activa cresce a um ritmo
maior do que a população dependente, ou seja,
crianças e idosos. Com um reduzido número de
nascimentos a cada ano, a população dependente
(0- 14 anos) cresce a um ritmo lento relativamente a
população em idade activa (15-64 anos), que é a força
de trabalho.
Assim, há um reduzido número de dependentes
para alimentar, vestir, ensinar, cuidar o que faz
com que os investimentos possam ser alocados
em áreas produtivas, abrindo-se assim uma janela
de oportunidade para o rápido crescimento
económico e bem-estar das famílias (Lee e Mason,
2006). O dividendo demográfico não pode ser
visto como uma certeza, mas sim como uma
oportunidade.
O que os países em desenvolvimento como
Moçambique estão a vivenciar é uma oportunidade
de crescimento económico robusto, ou seja, de um
dividendo demográfico, dependente da queda da
fecundidade e da consequente mudança na estrutura
etária, da redução da razão de dependência e de
adopção de reformas económicas.
A importância da estrutura etária
Mudanças na estrutura etária de uma população
têm importantes consequências económicas pois,
conforme acima mencionado. A força de trabalho, as
poupanças tendem a ser maiores quando a população
em idade activa é maior que o grupo de dependentes.
Entretanto, ao analisar-se a estrutura etária de
Moçambique, verifica-se um cenário de população
predominantemente jovem, como resultado da
elevada fecundidade.
A população cresceu de 12,1 milhões em 1980
para 16 milhões em 1997 e 20,6 milhões em 2007,
podendo atingir os 41,5 milhões em 2035, segundo
as projecções do INE (INE, 2010). Por causa da
elevada fecundidade, o país continuará com um
crescimento populacional elevado até por volta de
2050 e uma população maioritariamente composta
por jovens, precisando ser transformada em
recursos humanos valiosos para a transformação e
desenvolvimento.
Gráfico 3: Tendências de Crescimento da População de Moçambique, 1980-2025
Milhões de habitantes
35.0
33.1
30.0
25.0
25.0
20.0
20.6
15.0
10.0
16.0
12.1
5.0
0
1980
1997
2007
Fonte: INE, 2010
16
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2014
2025
Gráfico 4: Pirâmide Etária. Moçambique 1960
Gráfico 5: Pirâmide Etária. Moçambique 2014
80+
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
25-29
20-24
15-19
10-14
5-9
0-4
80+
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
25-29
20-24
15-19
10-14
5-9
0-4
Homens
12
9
6
Mulheres
3
0
3
6
9
12
Homens
12
9
6
Mulheres
3
0
3
6
9
12
Fonte: DNE, 1980; INE, 2010
Fonte: DNE, 1980; INE, 2010
A estrutura etária da população também revela
que a taxa de dependência do país continua alta,
indicando que o país está numa fase muito inicial da
transição demográfica, onde o tamanho da população
dependente é praticamente equivalente ao da
população em idade activa. Para cada uma pessoa na
idade activa, temos uma pessoa dependente. Porém, a
medida que a fecundidade declina abre-se a janela de
oportunidade para o dividendo demográfico no futuro.
Dependem da adopção de políticas macroeconómicas
que incentivam os investimentos produtivos,
aumentam a oportunidade de emprego e promovem
um ambiente social e económico estável, propício
para um desenvolvimento sustentável (Bloom,
Canning e Sevilha, 2003). Requerem fortes
investimentos em capital humano, especialmente
na educação dos jovens, para que as gerações
quantitativamente maiores sejam também
qualitativamente mais produtivas.
A combinação de uma força laboral ampla, jovem
e capacitada para o emprego e um contingente de
pessoas dependentes relativamente pequeno constitui
uma situação muito favorável para o crescimento
económico, como demonstra a experiência dos
países sudeste asiático (Mason, 2002). Análises do
significativo desenvolvimento socioeconómico
registado em países como Corréia do Sul, Malásia,
Tailândia e Singapura mostram que 25% a 30% do
crescimento económico desses países no período de
1970 a 2000, é explicado pelos ganhos advindos do
dividendo demográfico (Mason, 2002).
Na década de 1960, países como Malásia e Coreia
do Sul apresentavam um nível de fecundidade
e desenvolvimento semelhante ao dos países
da África Subsaariana. Entretanto, estes países
asiáticos adoptaram uma estratégia centrada em
Aproveitar as vantagens do dividendo
demográfico
É preciso ficar claro que a estrutura etária jovem de
Moçambique constitui também uma oportunidade
de desenvolvimento económico. Se a fecundidade
reduzir rapidamente, mudanças na estrutura etária e
na razão de dependência ocorrerão, resultando numa
população com uma maior proporção de pessoas em
idade activa relativamente às crianças ou dependentes.
Uma maior proporção de força de trabalho não
representa apenas uma redução de gastos com
dependentes, mas tende a impulsionar o crescimento
económico através do aumento de investimento e da
acumulação de capital.
Mas os benefícios associados ao dividendo
demográfico não ocorrem de forma automática.
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17
Estudantes e activistas, Nampula
investimentos no planeamento familiar, na educação,
saúde e reformas económicas que impulsionaram
o crescimento económico e a criação de empregos
(Comissão Económica para África, 2013).
Lee e Mason (2011) estimam que uma acelerada
queda da fecundidade em alguns países da África
aumentaria a renda per capita num cumulativo de
30% a 32% entre 2010 e 2040 no Gana e Etiópia
e uma fecundidade constante neste período
reduziria o crescimento económico em 1,1% na
Nigéria. No Uganda, com um cenário de queda
acelerada de fecundidade e políticas económicas,
o PIB per capita aumentaria em dez vezes mais,
lê-se no relatório da Autoridade Nacional para a
Planificação do Uganda (2013).
Evidências mostram que Moçambique pode tirar
proveito do dividendo demográfico se, de forma
sustentável, realizar investimentos similares no
desenvolvimento de capital humano e adoptar e
decisivamente implementar reformas económicas.
18
Este reconhecimento também está reflectido
implicitamente na Estratégia Nacional de
Desenvolvimento, que apresenta a visão do país até
2035. Segundo a referida estratégia, Moçambique
deve passar de uma economia de rendimento baixo
para médio, nos próximos 20 anos. O documento
reconhece que a existência de uma população jovem
e economicamente activa constitui uma “força”
económico-demográfica que o país apresenta para
o sucesso da visão 2035. Adicionalmente, focaliza o
desenvolvimento de infra-estrutura de base produtiva;
desenvolvimento de capital humano; investigação,
inovação e desenvolvimento tecnológico; e
coordenação institucional como os quatro pilares
para a materialização da visão de prosperidade nos
próximos anos.
Contudo, cabe enfatizar que para o país criar
a oportunidade para o dividendo demográfico
e aproveitar os benefícios do mesmo, deve
primeiramente assegurar que a transição demográfica
seja acelerada. Isto pode ser feito através de
programas que resultem na redução rápida da
fecundidade, na garantia dos direitos aos serviços
de saúde sexual e reprodutiva, no acesso à educação
e na promoção da igualdade de género. A expansão
da população em idade activa, com a inclusão das
mulheres jovens na força de trabalho, assim como
a criação de empregos para a crescente força de
trabalho, especialmente para os jovens deve merecer
atenção especial.
Não olhar para os desafios do crescimento
populacional e para a redução da natalidade dificulta
as chances de progresso e redução da pobreza afirma
António Francisco, pesquisador do IESE (2014).
O P ode r de 8 M i l h õ e s
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
©Amâncio Miguel
CAPÍTULO IV
Opções de políticas
para criar e usufruir do
dividendo demográfico
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
19
Investir na saúde para criar o dividendo
demográfico
Programas e intervenções na saúde
constituem importantes elementos
para a queda da fecundidade e das
taxas de dependência.
E para Moçambique abrir a janela de oportunidade
para o dividendo demográfico, é necessário que haja
uma expansão do acesso aos serviços de planeamento
familiar, de modo que os indivíduos que queiram
prevenir a gravidez tenham meios para exercer os seus
direitos reprodutivos. Isso implica, em parte, ampliar
a demanda, acesso e uso de serviços de planeamento
familiar de qualidade, através das unidades sanitárias e
de intervenções a nível da comunidade.
Olhando para as experiências de Moçambique,
o país aprovou a Estratégia Nacional para o
Planeamento Familiar e Contraceptivos em 2010.
A estratégia incide na resposta às necessidades não
atendidas, uma vez que 28% das mulheres casadas
deparam-se com necessidades não atendidas por
contracepção. Estão a ser envidados particulares
esforços para se atingir as populações em zonas de
difícil acesso, de modo a responder às necessidades
das mulheres rurais, raparigas (e rapazes)
adolescentes, pessoas portadoras de deficiências e
mulheres vivendo com HIV.
A estratégia pretende aumentar o número de
utilizadores dos serviços de planeamento familiar e
contraceptivos, através da disponibilização de uma
variedade de métodos gratuitamente, nas unidades
sanitárias e comunidades.
Com o apoio das Nações Unidas e de outros
parceiros, o país está a envolver a sociedade civil
nas abordagens inovadoras sobre o planeamento
Ilza e Maria promovem a saúde sexual e reprodutiva através do MoBiz, Maputo
20
O P ode r de 8 M i l h õ e s
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
familiar. Jovens activistas estão engajados na educação
de pares e no marketing social, com recurso nas
tecnologias de informação.
Outras medidas chaves incluem:
OO Intensificar os investimentos estratégicos para se
atingir o acesso universal aos serviços de saúde
sexual e reprodutiva para todos.
OO Fortalecer o combate à gravidez na adolescência,
através do acesso à informação e serviços
sobre saúde sexual e reprodutiva, incluindo a
contracepção para os adolescentes e jovens
sexualmente activos.
OO Eliminar os casamentos prematuros e promover a
permanência das raparigas na escola.
OO Fortalecer a advocacia baseada em evidência,
assim como mecanismos de monitoria
para assegurar que o planeamento familiar
continue uma prioridade para o Governo e
os compromissos assumidos nesta área sejam
operacionalizados.
OO Combater a desnutrição crónica nas crianças
e promover a imunização. Estas questões são
importantes porque estão relacionadas ao
desenvolvimento cognitivo na fase adulta.
OO Promover campanhas de prevenção do HIV e
SIDA, especialmente para as raparigas cujo risco
de infecção tende a crescer.
Entretanto, o acesso à educação não é o único
desafio. Garantir que a educação tenha qualidade e
responda às necessidades do mercado de trabalho é
a melhor alternativa para a garantia da participação
juvenil no desenvolvimento do país.
O programa Geração Biz, que promove a
educação sobre saúde sexual e reprodutiva para os
adolescentes e jovens, dentro e fora da escola, é
referência como uma das intervenções em prol da
educação abrangente para os adolescentes e jovens
moçambicanos. O programa tem contribuído, ao
longo dos 12 anos de sua existência, na formação de
uma geração de líderes juvenis que advogam pelos
seus direitos sexuais e reprodutivos em todas as
esferas governamentais e da sociedade civil.
O UNFPA apoia a Coalizão - ONG nacional
que luta pelos direitos dos jovens - a implementar a
iniciativa Mobiz, uma inovação baseada no programa
Geração Biz, que utiliza uma plataforma digital para
aumentar o acesso á informação, serviços e produtos
de saúde sexual e reprodutiva para adolescentes e
jovens. Esta ONG, conjuntamente com AMODEFA
(Associação Moçambicana para o Desenvolvimento
da Família), implementa “Raparigas em Acção”,
outra inovação do Programa Geração Biz, que tem
o foco no desenvolvimento e no empoderamento
das raparigas mais vulneráveis, nas dimensões de
educação, saúde, cidadania e economia.
Garantir uma educação de qualidade
Para Moçambique tirar proveito do possível
dividendo demográfico, a juventude deve ter melhor
educação e habilidades para se tornar mais produtiva
e competitiva.
No que se refere à experiência do país, o Governo
criou os centros de formação profissional, expandiu o
ensino universitário para todas as províncias e alguns
distritos. Por outro lado, tem estado a introduzir
gradualmente a educação sexual nos curricula dos
alunos e de formação de professores.
“Com o apoio das Nações Unidas e de
outros parceiros, o país está a envolver
a sociedade civil nas abordagens
inovadoras sobre o planeamento
familiar. Jovens activistas estão
engajados na educação de pares e
no marketing social, com recurso nas
tecnologias de informação.”
O P ode r de 8 M i l h õ e s
Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
21
Para além das intervenções mencionadas, sugere-se
igualmente a adopção das seguintes medidas:
OO Assegurar a universalização do ensino primário e
priorizar a universalização do ensino secundário.
OO Reformar os currículos educacionais e métodos
de ensino de modo a focalizar a inovação,
desenvolvimento de capacidades, ciência e
tecnologia e empreendedorismo.
OO Desenhar estratégias para redução das
desigualdades regionais e de género no ensino
secundário e universitário;
OO Integrar a educação sexual compreensiva no
currículo escolar e de formação de professores.
Para que os adolescentes e jovens fora da
escola sejam também informados é igualmente
importante fortalecer programas não formais
de educação sexual e habilidades para a vida,
através de material de informação, educação e
comunicação, palestras, programas nas rádios
comunitárias e outros meios de comunicação
social usando também as línguas locais.
OO Aumentar o compromisso político com a
educação e aumentar a alocação orçamental para
melhorar as infra-estruturas escolares.
OO Ampliar a cobertura e os investimentos nos
centros de formação profissional de modo que
possam prover habilidades orientadas para o
mercado.
Um outro elemento chave para Moçambique
beneficiar do Dividendo Demográfico é a criação
de empregos. É fundamental que o governo se
focalize na criação de novos empregos para atender a
demanda da emergente população juvenil.
Governação e a criação de emprego
Boas políticas são importantes para criação de um
ambiente que favorece a expansão de oportunidades
de emprego no sector formal. O crescimento
económico sustentável por leis bem desenhadas,
instituições financeiras bem reguladas e instrumentos
que favorecem a abertura comercial, a flexibilidade
das leis de trabalho com vista a atrair o investimentos
externo e encorajar as firmas a expandirem e criarem
postos de trabalho (UNFPA, 2014).
22
Tomázia frequenta o curso de técnicos superiores de cirurgia, no Instituto
Superior de Ciências de Saúde, Quelimane, Zambézia
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Considerações Finais
Para Moçambique alcançar a visão de prosperidade e
competividade, é necessário focalizar num crescimento
económico inclusivo e sustentável, no qual o capital
humano desempenha um papel chave. Esta é uma
das principais mensagens da Estratégia Nacional de
Desenvolvimento 2015-2035, que destaca os jovens
como uma “força” chave neste processo.
O foco nos jovens também está reflectido em
vários instrumentos como a Política da Juventude, a
Política de População, e outras estratégias sectoriais
na área de saúde, educação, juventude, desporto, que
especificamente beneficiam a população jovem.
O compromisso assumido constitui um grande
passo em prol dos direitos dos jovens, mas que deve
ser seguida de uma melhor implementação capaz de
melhorar o bem-estar dos jovens e a protecção dos
direitos dos jovens.
A agenda pós-2015 constitui igualmente uma
excelente oportunidade para tornar efectivo o
investimento dada a incontestável importância deste
grupo populacional para o desenvolvimento.
Finalizando, ainda é necessário mais esforço e as
seguintes acções devem ser efectivamente reforçadas
e priorizadas para que os jovens estejam melhor
equipados para atingir todo o seu potencial:
I. Tornar real a universalização do serviços
de saúde sexual e reprodutiva, incluindo
o planeamento familiar. Efectivamente,
promover o declínio voluntário da
fecundidade, garantindo que todos os homens
e mulheres que desejam adiar ou limitar
os nascimentos tenham acesso a métodos
modernos de contracepção.
II. Promover a saúde materna e neonatal,
programas de nutrição.
III.Melhorar a qualidade de educação e expandir
o acesso ao ensino secundário, especialmente
para as raparigas.
IV. Ampliar as oportunidades de emprego nos
vários sectores e regiões do país, de modo
a atender a pressão da crescente população
jovem.
V. Prover cursos profissionais e vocacionais e
acelerar o crescimento económico, através
do desenvolvimento de sectores com alto
crescimento e criação de emprego como
factor crítico para beneficiar do dividendo
demográfico.
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Adolescentes e Jovens Moçambicanos na Transformação do Futuro
23
Referências:
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Arnaldo, Carlos e Hansine, Rogers. 2014. Dividendo
demográfico em Moçambique. Artigo apresentado a
Conferência do IESE 2014. Maputo: CEPSA, 2014.
Direcção Nacional de Estatística 1980. Panorama demográfico.
Maputo
Instituto Nacional de Estatística. 2010a. Projecções
demográficas 2007-2040. Maputo.
Instituto Nacional de Estatística. 2010b. Indicadores Sociais e
Demográficos. Maputo.
Instituto Nacional de Estatística. 2013. Inquérito Contínuo aos
Agregados Familiares: primeiro ciclo 2012/13. Relatório do
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economics crisis on youth. Geneva: ILO, 2010.
Lee e Mason. 2006. What is the demographic dividend?
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2006, Volume 43, nr 3.
Mason, Adrew. 2002. Capitalizing on the Demographic
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Ministério da Saúde, Instituto Nacional de Estatística.
2010. Inquérito nactional de prevalência, riscos,
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Moçambique. Maputo, Moçambique.
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Inquérito Demográfico e de Saúde. 1997, 2003, 2011.
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Mozambique Instituto Nacional de Estatística, US Census
Bureau, Measure Evaluation, CDC. 2012. Inquérito sobre as
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Norte, Gilberto e Chipembe, Cassiano. 2013. Mozambique
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República de Moçambique. 2014. Estratégia Nacional de
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Maputo. 2014
UNECA. 2011. Relatório ecconómico sobre África. Addis abeba
UNFPA. 2010. The case for investing in young people. Nova
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UNFPA. 2011. Pessoas e possibilidades num mundo de sete
bilhões, New York, UNFPA
UNFPA.2014. Gravidez na Adolescência: Desafios e respostas
de Moçambique. Maputo
UNFPA. 2014. The power of 1.8 billion of adolescents and
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UNICEF. 2011. Pobreza Infantil e disparidades em
Moçambique. Unicef, Maputo, Moçambique.
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World Bank. 2014. Global coalition
O P ode r de 8 M i l h õ e s
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UNFPA – Criando um mundo
onde cada gravidez é desejada,
cada parto é seguro e o potencial
de cada jovem é realizado.
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26
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