O trabalho com a literatura infantil:
Um estudo de caso em duas pré-escolas da rede municipal do Recife
Cássia Maria dos Santos1
Vancleize Maria da Silva2
Sylvia De Chiaro3
Resumo
O presente artigo tem como objetivo principal verificar como está sendo desenvolvido o
trabalho com a literatura infantil em duas pré-escolas da rede municipal da cidade do Recife.
Por acreditarmos que seja um veículo que proporciona às crianças desenvolvimento cognitivo,
emocional e social, analisamos de que forma professores da educação infantil trabalham a
mesma em sala de aula, identificando se as leituras se adéquam ao nível de desenvolvimento da
criança, averiguando se reconhecem a sua importância para o desenvolvimento desta,
analisando se em sua prática conseguem despertar o interesse e atenção de seus alunos e
avaliando a possibilidade desta prática influenciar no comportamento leitor destes. Para isso,
realizamos uma entrevista com duas professoras da rede e observações em suas turmas. Com
base nos estudos, verificamos que as professoras desenvolvem de forma competente o trabalho
com literatura infantil em sala de aula uma vez, que adéquam o livro a faixa etária de suas
crianças, reconhecem a importância da literatura, despertando o interesse dos alunos em sua
forma de contar história e ainda pudemos perceber que a sua prática influi positivamente no
comportamento leitor das crianças, aumentando a freqüência de escolha das mesmas em relação
aos livros infantis em suas atividades.
Palavras-Chave: literatura infantil, desenvolvimento cognitivo, afetivo e emocional,
comportamento leitor
.
1 Introdução
Para construir uma sociedade letrada, onde homens e mulheres dominem a
leitura e a escrita, fazendo uso constante de sua prática, se faz necessária uma grande
contribuição dos pais e professores durante a infância.
É importante desde cedo, para a criança, o contato com os livros, pois o livro é
uma fonte valiosa que propiciará ao universo infantil, através da fantasia e da
imaginação, uma compreensão maior de si e do mundo a sua volta.
Por isso é tão relevante colocar a disposição da criança diversas leituras de
maneira fascinante e prazerosa, construir o habito da leitura, criando rotinas de rodas de
leituras onde a criança possa criar e recontar a partir do que já se leu, possa manusear os
livros de forma que sinta prazer, encantamento e familiaridade com os mesmos.
1
Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação – UFPE. [email protected]
Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação – UFPE. [email protected]
3
Professora do Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais do Centro de Educação – UFPE.
[email protected]
2
2
O professor será o mediador entre os seus alunos e o mundo da leitura. Por esse
motivo, a literatura infantil, seja ela por meio dos contos de fadas, aventuras, fábulas,
livros de imagens, animais, gibis, lendas, mitos, histórias modernas e coleções, devem
fazer parte de sua rotina e levada muito á sério, escolhendo e planejando atividades
adequadas e diferenciadas em sua pratica pedagógica.
A literatura infantil constitui-se uma peça fundamental para a formação de
novos leitores, alem de educar, instruir e divertir, ela contribui valorosamente na
construção de adultos pensantes e críticos. E é pensando nessa contribuição que o
educador infantil deve valorizar, na sua prática, o ato da instrução e também da
ludicidade em sala de aula para que haja possibilidade do aluno, enquanto adulto, se
constitua um “ser” leitor.
Sobre isso, nos diz Arce e Martins (2007)
Ao oferecer uma linguagem capaz de seduzir, a literatura infantil pode
ocupar um bom espaço na vida das crianças. Se levarmos em conta
que nesse período se inicia o caminho para o mundo dos livros,
podemos arriscar e dizer que uma criança que tem contato com o livro
tende a ser um adulto leitor (p.163).
Ao longo de nossa formação acadêmica, ao estudarmos as disciplinas de
Metodologia da língua portuguesa 1 e 2 e Educação infantil, tivemos contato com várias
literaturas onde se abordava a importância de trabalhar nas pré-escolas a literatura
infantil, devido as suas contribuições para o desenvolvimento intelectual e emocional
das crianças .
Tais estudos nos fizeram refletir sobre o direito e a necessidade dos alunos de
educação infantil a terem acesso desde cedo, ao fantástico mundo da leitura. Sabemos o
quanto é importante à criança nessa fase ampliar seu conhecimento de mundo através da
emoção, da curiosidade que a instiga a imaginar, sonhar e lidar com situações diversas.
Isso tudo é possível através do universo da literatura infantil.
A partir desses estudos, nos indagamos como os professores das pré-escolas da
rede municipal de ensino vêm trabalhando essa temática com seus alunos e o que
acontece na prática. Mais especificamente, buscamos responder as seguintes perguntas:
(1) As leituras propostas pelos professores se adéquam ao nível de desenvolvimento de
seus alunos? (2) Os professores reconhecem a importância da literatura infantil para o
desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças? (3) Os professores
conseguem, em suas práticas de contação de histórias, despertar o interesse e atenção de
3
seus alunos pela leitura? e (4) o trabalho com literatura infantil dentro de sala de aula
pode influenciar no comportamento leitor da criança?
2 Discussão Teórica, Revisão de Literatura ou Referencial Teórico
2.1 Literatura Infantil
Foi na Europa, no século XVII, com a consolidação da classe burguesa e da
economia capitalista, que nasceu a necessidade de escolarização das grandes massas de
operários. Nesse período, o homem passou a ter outra leitura de mundo que acabou por
desencadear um aumento da leitura.
Dessa forma, as crianças da nobreza liam grandes clássicos e as mais pobres,
lendas e contos folclóricos (literatura de cordel, muito popular nessa época).
Nesse mesmo século, estudiosos viam a importância de se trabalhar a literatura
infantil envolvendo a construção de historias, pois tratava-se de um gênero literário
produzido por adultos e destinados exclusivamente ao público infantil.
Segundo Cunha (1999)
A história da literatura infantil começa a delinear-se no exercício do
século XVIII, quando a criança pelo que deveria passar a ser
considerado um ser diferente do adulto, com necessidades e
características próprias, pelo que deveria distanciar-se da vida dos
mais velhos a receber uma educação especial que a preparasse para a
vida adulta (p. 22).
A literatura infantil leva a criança a um universo onde a imaginação é aflorada e
ela pode ser transportada de um mundo a outro vivendo diferentes realidades e emoções,
por isso a importância para o seu desenvolvimento. Cagnet (1996) diz:
Literatura infantil é antes de tudo literatura, ou melhor, é arte:
fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, a vida
através da palavra. Funde os sonhos e a vida prática; o imaginário e o
real. (p.7).
Ao trabalhar literatura em sala de aula com as crianças, além da funcionalidade
de desenvolver nas mesmas, um mundo de imaginação, criatividade e fantasia, o
profissional também terá que levar em consideração outro aspecto muito importante
nessa fase: adequar os livros as diferentes faixas etárias, considerando os estágios de
desenvolvimento de cada criança.
2.2 A importância da Adequação do Livro a Faixa Etária
4
A leitura pode e é necessária ser estimulada desde cedo. No entanto, é
importante que o professor da educação infantil tenha uma preocupação com os livros a
serem trabalhados com seus alunos.
A escolha correta, e um planejamento coerente com a leitura a ser realizada irão
despertar nas crianças o interesse e motivação que farão parte de uma experiência rica
em suas vidas.
Ao escolher o livro de história o professor precisa então, ter noção dos muitos
interesses apresentados por seu público e atentar para aspectos fundamentais na hora
dessa escolha, como as imagens, as ilustrações trazidas, o tema da historia, as cores
apresentadas, a linguagem do texto etc.
Existem situações em que o professor acredita estar levando algo satisfatório,
mas para as crianças se revela pouco interessante e assim ocorre algo muito comum com
os profissionais que não utilizam critérios de escolha: o desinteresse e dispersão dos
alunos pela história contada nos momentos de leitura. Sobre isso, Gomes (2011) nos
fala sobre a importância da observação dos seguintes aspectos: ilustração, propriedade
da imagem, estética coerente com o tema e as emoções sugeridas pela obra, destaque
dos elementos figurativos (cor, tamanho de imagens, disposição espacial) e quantidade
ótima de detalhes.
É comum, educadores apresentarem, em algumas situações, obras literárias para
as crianças manuseá-las, mesmo assim, as mesmas não se mostrarem motivadas nem
mesmo interessadas pelo material.
Por este motivo, se dá o grande valor para adequação dos livros a faixa etária
como também aos estágios psicológicos de cada criança. Estes precisam ser observados
e levados em consideração na hora das escolhas desses materiais. Nessa perspectiva,
Coelho (2002), afirma que os estágios psicológicos da criança são um importante fator
para a apropriação dos textos e por isso considera as diversas etapas do
desenvolvimento infantil.
Este autor aborda em seu livro cinco categorias que direcionam as fases do
desenvolvimento psicológico da criança quanto à leitura: o pré-leitor, dividida em
primeira infância (15 meses a 3anos) e segunda infância (3 a 5 anos); o leitor iniciante (6
e 7 anos); o leitor-em-processo (8 e 9 anos); o leitor fluente e (10 e 11 anos) e o leitor
crítico (12 anos em diante).
5
É importante frisar que os níveis/estágios que foram colocados acima são
aproximados, pois as faixas etárias de acordo com o desenvolvimento podem variar de
aluno para aluno, por isso é necessária a percepção cuidadosa do professor a respeito de
seus alunos para a realização de um trabalho produtivo.
Levando em consideração esse cuidado, não apenas de acordo com a faixa etária
mas também com as observações de sala de aula, é a fase pré-leitora na segunda
infância, a fase na qual se encontram inseridos os alunos que foram sujeitos
participantes da pesquisa, realizada em duas pré-escolas da rede municipal de Recife.
Essa fase é caracterizada por ser a fase onde a imaginação e a fantasia são fatores
constantes na vida de uma criança. É nessa etapa que a ludicidade e o pensamento
mágico são predominantes. A criança necessita aumentar e de fato aumenta seu
vocabulário rapidamente e com isso amplia a rede de perguntas, os “porquês”. Faz
também parte dessa fase o egocentrismo na criança.
Nesse período o tempo para as crianças não terá sentido, pois as mesmas não se
importarão com o passado ou com o futuro e dessa maneira só o tempo presente tem
importância. Haverá também um fortalecimento na aquisição de sua linguagem.
Nesse sentido, os livros adequados a essa fase devem ter predomínio da imagem,
(gravuras, ilustrações, desenhos, etc.), sem texto escrito, ou com textos curtos e
esclarecedores que podem ser lidos, ou dramatizados pelo adulto. As imagens devem
propor uma situação que seja enriquecedora para a criança, ou seja, não somente de
maneira, atraente, mas que a conduza a um mundo de magia e fantasia.
A graça, o humor, um clima de expectativa, ou mistério são fatores essenciais
nos livros para o pré-leitor. Tais fatores estimulam o desenvolvimento cognitivo,
emocional e social das crianças. Dessa forma, percebemos a importância do educador
estar consciente do quanto essa pratica, além de ser interessante para a criança, se
constitui em um ótimo instrumento no desenvolvimento desses aspectos.
2.3 A literatura infantil e o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das
crianças.
A literatura infantil tem de fato uma grande relevância na vida da criança, ela
propicia que sejam trabalhados diversos fatores que serão primordiais para seu
desenvolvimento cognitivo, suas emoções e também aspectos de cidadania.
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Abramovich (1997) pontua que a partir do contato com um texto literário de
qualidade a criança é capaz de pensar, perguntar, questionar, ouvir outras opiniões,
debater e reformular seu pensamento.
Nessa perspectiva, o professor deve proporcionar as crianças, o acesso a
diversos tipos de literatura infantis para o crescimento crítico, reflexivo e emotivo das
mesmas. No entanto, o educador precisa ter em mente que a motivação e a criatividade,
serão imprescindíveis e por isso a importância do lúdico nessa fase para o bom
desempenho na prática e do que se espera do aluno ouvinte.
E assim, ao realizar as leituras e ao inserir os alunos neste ambiente, o educador
poderá formar leitores críticos e conscientes de suas ações. Na revista Criança (2005,
pg.18), Perroti nos diz: “a criança pode ainda não saber ler e escrever, mas já produz
texto: ela pensa, fala se expressa”.
A escola é um lugar que pode e deve propor um ambiente de leitura e escrita nas
mais diversas situações. Nesta mesma revista (Criança, 2005, pg. 22) Calande nos
mostra: “tanto nas lúdicas, leitura de livros de historias, poesias, brincadeira com travaslínguas e parlendas e até os usos mais sociais - jornais, listas e cartazes”.
Quando se compartilha a história, com as crianças, o texto proporcionará muitos
sentimentos diferentes como, por exemplo, o de alegria, tristeza, raiva, medo etc. além
de possibilitar que as crianças desenvolvam o aprendizado, quando fazem diversas
interpretações, emitem suas opiniões sobre o que foi lido e essas situações contribuem
para a autonomia do pensar das mesmas. Nesse sentido, é importante trazer a literatura
infantil como um veículo que irá proporcionar as crianças um melhor desenvolvimento
cognitivo. Como diz Abromavich (1997):
O ouvir histórias pode estimular o desenhar, o musicar, o sair, o ficar,
o pensar, o teatrar, o imaginar, o brincar, o ver livro, o escrever, o
querer ouvir de novo (a mesma história ou outra). Afinal tudo pode
nascer dum texto (pg.23).
Por isso, a importância e uma real preocupação com o trabalho e estímulo à
literatura infantil no desenvolvimento de uma criança. Provavelmente, o fato de poder
ter o contato ao ouvir e manusear o livro despertará na mesma um envolvimento e
interesse que contribuirá significativamente na sua construção enquanto sujeito leitor e
na descoberta e entendimento mais amplo da realidade em que está inserida. Dessa
forma, os educadores devem ter a literatura infantil como um meio de socialização, um
instrumento que auxilie a inserir as crianças no mundo.
7
Bettelheim (1996), nos fala:
Para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve
entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida,
deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto
e a tornar claras suas emoções; estar harmonizada com suas
ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e,
ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a
perturbam... (p.13).
E assim, trabalhando a literatura infantil em sala de aula com as crianças
podemos fazer com que as mesmas interajam com os diversos textos trabalhados de
forma que possibilite o entendimento do mundo em que vivem e que construam, aos
poucos, seu próprio conhecimento.
Abromovich (1997, pg. 17) nos diz:
é através de uma historia que se podem descobrir outros lugares,
outros tempos, outros jeitos de agir e de ser, outra ética, outra ótica...
É ficar sabendo Historia, Geografia, Filosofia, Política, Sociologia,
sem precisar saber disso tudo e muito menos achar que tem cara de
aula... Porque, se tiver, deixa de ser literatura, deixa de ser prazer e
passa a ser didática, que é outro departamento.
Esses são alguns dos motivos que justificam ser tão relevante para a formação de
a criança ouvir não só uma, mas várias histórias em sua rotina, seja ela familiar ou
escolar.
Mas esse “ouvir” também deve ser pensado. Não é qualquer forma de contar
história que vai garantir que ela, mesmo adequada ao desenvolvimento dos alunos, se
torne interessante. Por isso, tanto quanto adequar a escolha do livro e reconhecer sua
importância ao desenvolvimento dos alunos é importante o educador inserir em sua
prática a “contação de histórias”, assumindo um caráter lúdico e prazeroso para as
crianças.
3.4 Educador x Práticas de Leituras: A formação de futuros leitores
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998), entre suas
várias orientações sugere que:
Os professores deverão organizar a sua prática de forma a promover
em seus alunos: o interesse pela leitura de histórias; a familiaridade
com a escrita por meio da participação em situações de contato
cotidiano com livros, revistas, histórias em quadrinhos; escutar textos
lidos, apreciando a leitura feita pelo professor; escolher os livros para
ler e apreciar. Isto se fará possível trabalhando conteúdos que
privilegiem a participação dos alunos em situações de leitura de
8
diferentes gêneros feitas pelos adultos como contos, poemas,
parlendas, trava-língua etc. propiciar momentos de reconto de
histórias conhecidas com aproximação da história original no que se
refere à descrição de personagens, cenários e objetos ou sem a ajuda
do professor. (p.117).
Vemos que o educador é a peça fundamental que vai mediar os seus alunos ao
mundo da leitura através de práticas atraentes que estimulem na criança o prazer pela
leitura.
Se os professores pré-escolares tiverem essa consciência de que o modo como se
apresenta o mundo da leitura para os pequenos vai contribuir para a formação do futuro
leitor de amanhã, introduzindo em sua prática pedagógica momentos envolventes de
leituras, de fato estará formando futuros leitores cheio de criatividade em nossa
sociedade. Vadez e Costa (2007) dizem:
É essencial ouvir histórias, ter contato com os livros, “ler” as paginas
com os olhos, seguir as pegadas do enredo e apoderar-se do conto,
seja no ouvir ou no viver a história. É preciso estimular a criança
desde cedo, a conviver com os livros, incentivá-las a ouvir, falar,
observar, valorizar a cultura, trazendo temas presentes nas histórias
como forma de conhecer o mundo e as diferentes vivências e relações.
Pensar e preparar o ambiente onde serão desenvolvidas as leituras
como também o modo como serão realizadas farão uma grande
diferença, pois dependendo da maneira como foi pensada, preparada e
realizada, o leitor infantil pode ser muito facilmente envolvido durante
o momento da contação de histórias (p.173).
Se o professor não inserir, em sua pratica pedagógica, atividades que estimulem
o despertar das crianças para a leitura de maneira prazerosa, que estimulem o contato
com o livro, como também o interesse pelos mesmos, de fato estas crianças poderão ser
prejudicadas em relação às demais crianças que tiverem essa oportunidade.
O profissional da educação terá uma posição importante e decisiva para
transformar o mundo da leitura em um mundo de prazer para os seus alunos, rodeando a
escola de livros e materiais em espaços aconchegantes e próprios para a contação de
história, seja na biblioteca ou em cantinhos para a leitura.
Sobre isso, nos afirma Oliveira e Paiva (2009, p.5): “É com criatividade que a
literatura infantil vem contribuir na formação de leitores passando a constituir um
homem que faz uso da fantasia e da imaginação, que concretiza os sonhos nas diversas
situações reais de sua vida concreta.”
Na revista Criança, 2005, Magda Soares nos diz: “O papel do professor é
intermediar o contato do aluno com a escrita e a leitura, colocar o livro disponível e
orientá-lo no seu uso, no seu convívio com o material escrito” (p.20)
9
A consciência do educador tem que estar voltada à forma como serão
desenvolvidas as atividades referentes a leitura, pois dependerá da escolha e da maneira
como o profissional da educação conduzirá este momento, para que cause nos alunos o
encantamento e o prazer pela leitura.
O professor deve abolir de sua prática pedagógica a idéia da obrigatoriedade da
leitura e dos alunos verem essa prática como algo punitivo e obrigatório, pois tais
momentos devem ser os mais acolhedores possíveis fazendo com que o educador se
empenhe não somente nas escolhas, mas também no modo como conduzirá as
atividades que envolvem a prática de leitura, instigando a interação das crianças o
tempo todo com o professor e colegas de classe, estimulando sua imaginação e
criticidade.
Cavalcanti (2002), nos fala: “O leitor infantil pode ser muito facilmente
envolvido pelo momento da “contação”, desde que o processo seja bem conduzido”. Em
seu livro Caminhos da Literatura Infantil e Juvenil, a autora nos coloca que existem
varias formas de o momento da leitura ser prazeroso, dinâmico e de estímulos para
novas descobertas, impulsionando o leitor a reflexão a partir do texto contado. Dessa
forma, esta autora cita critérios fundamentais e necessários para facilitar o momento de
leitura e contação historias como:
1º conhecer o texto com profundidade.
2º sensibilizar o grupo para o momento da escuta.
3º criar ambiência convidando para entrar no mundo do “faz de conta”.
4º apresentar o livro ao grupo, dizendo o titulo, autor, mostra a capa.
5º ler pausadamente, mas demonstrando intimidade com o texto e o entusiasmo pela
leitura.
6º a cada pagina virada, mostrar as ilustrações, desenhos e palavras.
7º durante a leitura, procurar não interromper a narrativa.
8º dirigir o olhar para o grupo e perceber o nível de tensão, atenção.
9º permitir que os ouvintes expressem seus sentimentos com relação aos diversos
aspectos do texto sem represálias.
10º permitir que o aluno manuseie o livro lido, prestando bastante atenção a esse
contato.
É nesse sentido que a organização, o cuidado e consciência da realização desses
pontos pelo professor de educação infantil, é fator primordial a um bom funcionamento
de sua prática educativa no que se refere à utilização da literatura infantil na escola.
10
3 Delineamento Metodológico
A pesquisa realizada possui caráter qualitativo, pois esse método de pesquisa é
útil e preciso para reconhecer e explorar o que acontece com os fenômenos estudados e
as interações que se instituem, possibilitando o estímulo ao desenvolvimento de novas
compreensões (Bartunek; Seo, 2002).
Utilizamos como instrumentos em nossa pesquisa a observação e a entrevista
semi-estruturada, pois como a pesquisa qualitativa tem como foco principal interpretar
os fenômenos, consideramos esses métodos essenciais em nossa metodologia.
As observações e entrevista buscaram responder, como já vimos antes, aos
seguintes objetivos de pesquisa: (1) Identificar se as leituras propostas pelos
professores se adéquam ao nível de desenvolvimento da criança; (2) Averiguar se os
educadores reconhecem a importância da literatura infantil para o desenvolvimento
cognitivo, emocional e social das crianças e se os mesmos focam em sua prática estes
objetivos; (3) Analisar nas práticas de leituras do educador se o mesmo consegue
despertar em seus alunos o interesse e atenção pela leitura; (4) Observar e analisar em
que medida o trabalho de literatura infantil dentro de sala de aula pode influenciar no
comportamento leitor da criança.
Fizeram parte de nossa pesquisa, duas escolas da rede municipal de ensino do
Recife. A composição dos sujeitos da pesquisa constituiu-se de duas professoras da
educação infantil e seus respectivos alunos com faixa etária entre quatro e cinco anos de
idade. Por questões éticas os nomes das mesmas não serão divulgados e as
identificaremos por professora I e professora II.
A coleta de dados foi realizada em três etapas, no sentido de responder a todos
os objetivos da pesquisa. Foram elas:
Primeira etapa: consistiu em uma entrevista semi-estruturada, gravada, com os
professores a respeito das leituras realizadas em sala de aula com o propósito de
responder ao primeiro, segundo, terceiro e quarto objetivo da pesquisa.
Segunda etapa: etapa referente à observação vídeogravada em sala de aula, foi
composta por três momentos:
(1) O primeiro momento constituiu-se por uma observação inicial, a qual
nomeamos de pré-teste, do comportamento leitor da criança. Para este momento,
11
preparamos um ambiente aconchegante em cada escola pesquisada, colocando além de
livros de diversas literaturas infantis, brinquedos e massa de modelar e observamos a
atitude da criança no ato de sua escolha de que atividade realizar (este momento
constituiu-se em uma primeira fase na análise do objetivo 4, sobre o comportamento
leitor da criança)
(2) Em um segundo momento, pedimos para as professoras das salas de aula
pesquisadas, que trabalhassem com literatura infantil. Dessas aulas, cinco foram
analisadas. Este momento da etapa atende aos objetivos 3 e 4. O terceiro focando na
análise do “como” as professoras contam as histórias, isto é, o processo que as mesmas
realizaram no momento da leitura, e se as mesmas conseguiam envolver as crianças
durante a hora da contação.
A análise foi realizada de acordo critérios estabelecidos por Cavalcanti (2002): o
conhecimento aprofundado do texto pelo professor, a maneira como o profissional
sensibiliza o grupo para o momento da contação de história, a preparação de um
ambiente atrativo para o desenvolvimento do imaginário da criança entre os outros
critérios da autora vistos por ocasião da fundamentação teórica. Abrange o quarto
objetivo no sentido de trabalhar a contação de histórias com as crianças de forma a
propiciar, no terceiro momento de observação (pós-teste), analisar se o comportamento
da criança frente aos livros de história, depois de várias aulas de contação, tornou-se
diferente do momento inicial (pré-teste).
(3) Em um terceiro momento, pós-teste, com o intuito de analisar a influência do
trabalho com literatura infantil em sala de aula no comportamento leitor da criança,
realizamos a mesma situação do pré-teste para observar se depois das aulas de contação,
os alunos permaneciam com as mesmas escolhas ou se aumentava a quantidade de
alunos na escolha pelos livros. Essa ultima etapa da metodologia, consistiu em
responder o objetivo 4 da pesquisa.
4 Resultados e Discussões
Os resultados da coleta e análise dos dados são apresentados aqui a partir dos
objetivos da pesquisa. Segue abaixo, portanto cada um dos objetivos e suas análises
correspondentes:
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1) Identificar se as leituras propostas pelos professores se adéquam ao nível de
desenvolvimento de seus alunos
Na entrevista, quatro perguntas foram construídas voltadas a responder ao 1º
objetivo deste trabalho. Na primeira delas, buscamos saber se a professora segue algum
critério para a escolha do livro; a professora I nos fala que escolhe livros com temáticas
transversais que possam se trabalhadas em sala de aula. A professora II, ao escolher os
livros infantis, se utiliza de critérios como: maior quantidade de gravuras e histórias
dinâmicas. A segunda questão voltada a este objetivo versava sobre a existência da
predominância de imagens ou escrita nos livros adotados pelas mesmas. A professora I
adota alguns apenas com imagens e outros com imagens e escritas. A professora II
revela que nos livros que trabalha predominam as imagens, pois acredita que a educação
infantil necessita delas. Nas observações, pudemos perceber que, de fato, nas escolhas
das professoras I e II, os livros apresentavam textos curtos onde o colorido das imagens
e ilustrações apresentadas chamavam a atenção dos alunos.
No momento da leitura, ambas tentavam criar uma atmosfera de humor,
mistério e expectativas, estimulando o desenvolvimento cognitivo, emocional e social
de seus alunos durante toda historia.
Como vimos na fundamentação teórica, a fase pré-leitor é a fase onde estão
inseridos os alunos das professoras I e II, e segundo Coelho (2002), os livros adequados
devem ter o predomínio de imagens, gravuras, ilustrações e desenhos, sem textos
escritos ou com textos curtos e esclarecedores que podem ser lidos e dramatizados pelos
adultos. Portanto, concluímos que as leituras propostas pelas educadoras se adéquam ao
nível psicológico de desenvolvimento de seus alunos.
A terceira questão abordava sobre as características dos textos escritos, caso os
livros trabalhados em sala os contivesse. Mais especificamente, a questão perguntava se
esses, uma vez presentes, eram curtos ou longos. Sobre isso, a professora I nos fala que
trabalha textos escritos curtos e a professora II que os livros aparecem com textos curtos
e longos, predominando os curtos, pois o texto curto em sua opinião chama mais
atenção.
A última questão que responde a esse objetivo versa sobre os temas que são
propostos no momento da escolha dos livros. Na hora de decidir, a professora I aborda
os temas seguintes: saúde, higiene bucal, piolho, amizade, valor da família, a
importância da escola.
13
Gomes (2011) em seu artigo nos mostra a importância de atentar, entre outros
aspectos, ao tema da história a ser apresentado para as crianças e nesse sentido, chama a
atenção para a necessidade de priorizar temáticas que cativem e despertem na criança o
interesse e motivação na hora da leitura.
A professora II trabalha temas em sala de aula como: meio ambiente, bons modos,
saúde, higiene, alimentação, disciplina, sexualidade e corpo humano. Isso nos mostra
que os textos das respectivas docentes se adéquam a fase de desenvolvimento dos seus
alunos. Ambas docentes nos mostraram em suas aulas, quando traziam os livros, que
seguem aspectos já estabelecidos por Gomes (2011), quando ao comentar sobre as
seleções dos livros trabalhados em sala de aula, elenca leituras curtas e que possam ser
dramatizadas, dando dinamismo a sua aula, e instigando seus alunos para o momento da
contação.
Segue um quadro, com os critérios dos autores que nos fundamentam nesse
objetivo:
Quadro I
Critérios Gomes (1) e
Coelho( 2) pré- leitor
(1)
Ilustração/propriedade
da imagem.
(1) Estética coerente
com
o
tema:cor,tamanho
da
imagem,disposição
espacial/emoções que a
obra literária sugere.
(2)
Predomínio
de
imagem/sem
texto
escrito, ou textos curtos
e claros.
(2)
imagens
que
conduzam a um mundo
de magia e fantasia/
graça, humor e clima de
expectativa e mistério.
Professora I
Professora II
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim, apenas uma das aulas o
texto foi longo, mas a
professora, seguiu apenas a
imagem para a contação.
Sim
Sim
QUADRO I: Resultados das duas professoras referentes à adequação do livro ao nível de
desenvolvimento dos alunos
A partir dos itens marcados acima, podemos perceber que as educadoras
selecionam seus livros baseados nos critérios estabelecidos pelos autores apresentados
acima. Mesmo a professora I, não cumprindo um dos critérios em uma de suas aulas e
14
havendo de fato uma dispersão, tentou usar da criatividade para cativar a atenção de
seus alunos.
2) Averiguar se os professores reconhecem a importância da literatura infantil
para o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças e se os
mesmos focam em sua prática estes objetivos
Ainda na entrevista, duas perguntas respondiam ao nosso 2º objetivo de
pesquisa. A primeira delas perguntava às professoras, a importância de se trabalhar
literatura infantil na pré-escola. A professora I respondeu que é importante trabalhar
literatura infantil na pré-escola porque a criança já vai se apropriando do mundo da
leitura desde a fase inicial. Semelhante ao que diz Perroti (2005) quando pontua que a
criança pode ainda não saber ler e escrever, mas já produz texto: ela pensa, fala e se
expressa.
A segunda professora acredita ser fundamental trabalhar literatura infantil na
pré-escola porque trabalha a oralidade, reflexão, argumentação, escrita e criatividade
além de proporcionar aos alunos a idéia de começo, meio e fim. O depoimento desta
professora coloca-nos diante do que Abromovich (1997) nos diz quando chama atenção
para o fato de que a partir do contato com um texto literário de qualidade a criança é
capaz de pensar, perguntar, questionar, ouvir outras opiniões, debater e reformular seu
pensamento.
A segunda dessas perguntas da entrevista visava saber o objetivo das mesmas ao
contar historias para seus alunos. A professora I respondeu que objetiva fazer com que
eles viagem no mundo da imaginação, desenvolvam a sua linguagem oral, escrita e
corporal. O objetivo da professora II ao contar histórias é “passar moral”, tornando-os
responsáveis em suas atitudes, tanto em sala de aula como em qualquer outro lugar. Este
seu objetivo em especial nos mostra a importância concedida pela professora à literatura
infantil no sentido de desenvolvimento social das crianças não somente no ambiente
escolar, mas também fora dele.
Os objetivos apresentados pela professora I ao contar história, contempla a fala
de Bettelheim (1996):
Para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve
entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida,
deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto
e a tornar claras suas emoções (p. 13)
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O quadro abaixo, nos mostra a posição de cada professora diante do reconhecimento
da literatura infantil para o desenvolvimento da criança:
Quadro II
Reconhece articulação
literatura x desenvolvimento
Emocional
Professora I
Professora II
Sim
Sim
Cognitivo
Sim
Sim
Social
Sim
Sim
QUADRO II: Resultados das duas professoras referentes ao reconhecimento da importância da literatura
infantil para o desenvolvimento emocional, cognitivo e social.
Assim, concluímos que as professoras desenvolvem um trabalho pautando a
importância da literatura infantil para o desenvolvimento cognitivo, social e emocional
de suas crianças de sala.
3) Analisar, nas práticas de contação de histórias do professor, se o mesmo
consegue despertar em seus alunos o interesse e atenção pela leitura.
Duas questões da entrevista buscaram responder ao 3º objetivo, uma delas
tratava sobre a maneira como são apresentadas as histórias em sala de aula e a outra
pergunta abordava sobre o que as professoras acreditam ser importantes no momento da
contação para envolver as crianças.
A professora I relatou que apresenta as histórias trabalhadas em sala de aula
através de contos, com livros, historias a partir de áudio e bonecos fantoches. Acredita
ser importante no momento da contação para envolver as crianças: cenário, objetos que
chamem atenção das crianças e uma preparação para embarcar no mundo da
imaginação.
De acordo com o RCNEI, (1998, p. 117):
Os professores deverão organizar a sua prática de forma a
promover em seus alunos: o interesse pela leitura de histórias; a
familiaridade com a escrita por meio da participação em
situações de contato cotidiano com livros, revistas, histórias em
quadrinhos; escutar textos lidos, apreciando a leitura feita pelo
professor; escolher os livros para ler e apreciar. Isto se fará
possível trabalhando conteúdos que privilegiem a participação
dos alunos em situações de leitura de diferentes gêneros feitas
pelos adultos como contos, poemas, parlendas, trava-língua etc.
propiciar momentos de reconto de histórias conhecidas com
aproximação da história original no que se refere à descrição de
personagens, cenários e objetos ou sem a ajuda do professor.
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A educadora, ao trabalhar em sala de aula através de contos, livros, histórias a
partir de áudio e etc., segue orientações do referencial curricular nacional para a
educação infantil.
Percebemos ainda que a mesma acredita ser importante uma
preparação para embarcar na imaginação da criança e sobre isso, nos diz Cavalcanti
(2002) uma vez sendo bem conduzido, o leitor infantil pode facilmente ser envolvido
pela contação. Ainda sobre o assunto nos fala Valdez e Costa (2007):
...Pensar e preparar o ambiente onde serão desenvolvidas as
leituras como também o modo como serão realizadas farão uma
grande diferença, pois dependendo da maneira como foi
pensada, preparada e realizada, o leitor infantil pode ser muito
facilmente envolvido durante o momento da contação de
histórias(p.173).
A professora II relatou que apresenta as histórias em sala de aula de forma
surpresa, com muito suspense, que traz uma caixa mágica para despertar o interesse.
Acredita ser importante no momento da contação de história fazer com que os alunos
entrem nas histórias, que eles se sintam nelas e o mais importante é eles estarem
envolvidos para escutarem até o fim.
Quando aborda que apresenta as histórias para a turma com suspense, ela
proporcionará como foi visto na fundamentação teórica, muitos sentimentos diferentes
como, por exemplo, o de alegria, tristeza, raiva, medo etc.
A educadora, ao demonstrar interesse que seus alunos entrem na história,
aproxima-se do pensamento de Abromovich (1997, p.17) que nos fala: “é através de
uma história que se podem descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir
e ser, outra ética, outra ótica...”
Nas cinco observações realizadas na sala de aula da professora I, vimos que a
mesma conhece bem os textos trabalhados, uma vez que demonstrava segurança e
facilidade ao contar para as crianças. A educadora, em todos os momentos das leituras,
sensibilizava a turma para o momento da escuta, organizando a sala de aula sempre em
semicírculo, perguntando quem conhecia a história do dia, o que iria conter dentro dela,
etc. Além disso, criava uma ambiência que estimulava o aluno a entrar no mundo do
“faz de conta”, como por exemplo, quando convidava os alunos a fecharem os olhos,
pedia que imaginassem o lugar da história e que se imaginassem naquele lugar, levando
assim o grupo a participar da leitura também no mundo do faz de conta.
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Em todas as histórias contadas apresentava o livro ao grupo, falando o título e
mostrando a capa, no entanto, ela não informou o nome dos autores em nenhuma
situação contada e essa informação é importante para esse momento, segundo
Cavalcanti(2002). A professora lia o texto pausadamente e demonstrava intimidade e
também entusiasmo na maioria das vezes observadas. Mostrava página por pagina dos
livros, apontando as ilustrações, desenhos e palavras. Circulando pela sala de aula com
o livro aberto e passando de cadeira em cadeira para que todos pudessem observar de
perto e acompanhar o desenvolvimento da historia e durante a leitura a mesma também
procurava não interromper a narrativa.
A educadora, nesse processo de contação, também dirigia o olhar para todo o
grupo e observava em seus alunos a atenção e a tensão existente com a história
realizada, permitia que os ouvintes expressassem seus sentimentos e opiniões sem
represálias. E por fim, em quase todas as observações permitia que os alunos
manuseassem o livro lido, em apenas duas delas, não permitiu esse fato. No entanto,
observamos que a mesma não prestava atenção a esse contato, considerado por
Cavalcanti (2002) como um importante critério.
Nas cinco observações que também foram realizadas na sala de aula da
professora II, a mesma demonstrou conhecimento da maior parte dos textos trabalhados.
Percebemos, no entanto, que apenas na terceira observação esta professora fez uso de
sua criatividade durante toda leitura, criando o texto a partir das imagens que surgiam a
cada pagina do livro.
Notamos também, que em todas as observações realizadas, existiu por parte da
professora II a sensibilização do grupo para o momento da leitura. A profissional,
depois de ler o título e mostrar a capa do livro, questionava os alunos sobre o que os
mesmos achavam que o mesmo trataria, convidando seus alunos para o momento da
contação. Antes de iniciar duas das leituras que observamos, pediu aos alunos que
encostassem a cabecinha na mesa, fechassem os olhos imaginando-se em lugar muito
lindo iniciando a leitura. A cada pagina virada do livro a profissional questionava os
alunos sobre o que os mesmos estavam vendo, fazendo com que se mostrassem atentos
durante a contação.
Apesar de, na entrevista, esta professora ter dito que sempre trazia uma caixa
mágica para despertar o interesse dos alunos, em nenhum dos dias durante as
observações de nossa pesquisa ela trabalhou com este recurso.
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Em todas as observações a professora II mostrava para os alunos a capa e o título
do livro, porém, como a professora I, nunca citava seus respectivos autores, que, como
vimos segundo Cavalcanti seria muito importante. Sua leitura era feita pausadamente
mostrando-se íntima com a maioria dos textos trabalhados passando bastante
entusiasmo para os alunos. A cada página do livro convidava os alunos a atentarem para
os desenhos as ilustrações apresentadas no texto.
Durante a leitura procurava não interromper em nenhum momento a narrativa, a
maioria dos alunos mostrava-se atenta a esse momento e ela seguia com o texto fixando
o olhar na turma. A professora II sempre permitia que os alunos expressassem seus
sentimentos ao ouvir o texto. Após a o momento da leitura, permitia que os alunos
tivessem contato com o livro lido, e ao contrario da outra professora prestava atenção a
esse manuseio. Apenas em uma das nossas observações, a professora não deixou que
alguns alunos apreciassem o livro porque desobedeceram no ato da leitura.
Como falamos nos procedimentos metodológicos, observamos o momento de
leitura e contação de historias, a partir de critérios que Cavalcanti (2002) defende como
sendo necessários e fundamentais. No sentido de tornar mais clara a observação desses
critérios, segue quadro abaixo:
Quadro III
Critérios Cavalcanti (2002)
Professora I
Professora II
1 Conhecer o texto com profundidade.
Sim
Sim
2 Sensibilizar o grupo para o momento
da escuta.
3 Criar ambiência convidando para
entrar no mundo do “faz de conta”
4 Apresentar o livro ao grupo, dizendo
o titulo, autor, mostra a capa.
5
Ler
pausadamente
mas,
demonstrando intimidade com o texto
e o entusiasmo pela leitura.
6 A cada página virada, mostrar as
ilustrações, desenhos e palavras.
7 Durante a leitura, procurar não
interromper a narrativa.
8. Dirigir o olhar para o grupo e
percebe o nível de tensão e atenção.
9. Permitir que os ouvintes expressem
seus sentimentos com relação aos
diversos aspectos do texto sem
represálias.
10. Permitir que o aluno manuseie o
livro lido, prestando bastante atenção a
esse contato.
Sim
Sim
Sim
Sim
Menos o autor
Menos o autor
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim
Sim, porém não
prestava atenção a esse
manusear.
Sim, em apenas uma
de nossas observações,
não permitiu.
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QUADRO III: Resultados das duas professoras referentes ao atendimento aos critérios de
Cavalcanti(2002).
Assim, podemos concluir que as professoras seguem os critérios estabelecidos
por Cavalcanti (2002), na grande maioria de seus itens. As pequenas exceções
observadas não parecem interferir na consideração de que as mesmas, no que diz
respeito ao modo como conduzem a contação de história em suas salas, de fato,
conseguem despertar em seus alunos o interesse e atenção pela leitura.
4) Observar e analisar em que medida o trabalho de literatura infantil dentro de
sala de aula pode influenciar no comportamento leitor da criança.
A última questão da entrevista buscava saber a opinião das professoras sobre a
possível contribuição da contação de histórias em sala de aula na formação do leitor
infantil. A professora I respondeu que considera o momento da contação muito rico uma
vez que, fazer a leitura de imagens e contar histórias contribui sim para a formação do
leitor infantil. Para ela, a criança aprende a fazer o uso da leitura através da contação de
histórias e leitura de imagens.
A professora II considera em sua resposta que o trabalho com literatura infantil
na escola contribui para a formação do leitor infantil porque se eles têm acesso a livros,
futuramente despertarão para os mesmos. Reflete que nessa fase, mesmo sem saber ler,
as crianças fazem a “leitura de imagens”. Em sua prática, esta professora diz que
considera importante pegar, manusear o livro para que haja o despertar para a leitura, e
relatou que às vezes pede para que eles desenhem a história contada. Como vimos na
fundamentação teórica, ouvir e manusear um livro desperta nas crianças um
envolvimento e interesse que contribuirá significativamente na construção enquanto
sujeito leitor e na descoberta da realidade em que se insere o que vai, portanto ao
encontro daquilo que encontramos nessas respostas da professora II.
O processo de observações na sala de aula relativo a este objetivo, como vimos
pela ocasião da metodologia, iniciou-se com um pré-teste a fim de percebermos as
escolhas das crianças diante de uma situação em que diversos brinquedos e livros foram
colocados à disposição dos mesmos. O foco de análise recaiu pois, nas observação de
suas preferências antes de um trabalho direcionado de literatura infantil. Depois do préteste, iniciaram-se as aulas, cinco ao todo, em que foi trabalhada a contação de histórias
pelas professoras para ao final, acontecer o momento de pós-teste. Neste, a mesma
situação foi apresentada para a criança com o objetivo de saber se o comportamento de
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escolha das mesmas havia mudado em decorrência deste trabalho. Isto é, o pós-teste
permitiu analisar em que medida o trabalho de literatura infantil dentro de sala de aula
pode influenciar no comportamento leitor da criança.
Na escola da professora I, dos dezesseis alunos participantes no dia do pré-teste,
cinco alunos de imediato se interessaram logo pelos os livros. Outros cinco alunos em
nenhum momento se importaram com a presença dos livros, eram duas meninas e três
meninos. E seis destes alunos escolheram os brinquedos, mas em determinado momento
observam alguns livros, pegavam , olhavam e soltavam ou ficavam com os dois nas
mãos.
Ainda nesta escola, nas aulas que observamos o trabalho de contação de história,
as crianças mostravam-se sempre interessadas e participantes no momento da leitura.
Apenas uma das alunas da professora mostrava-se desinteressada em todas as
observações realizadas. Este momento nos mostrou ser enriquecedor por que foram
aguçados a imaginação, a curiosidade e seus sentimentos dos alunos.
Após as observações, no dia da realização do pós-teste estavam presentes dez
alunos. Observamos que três crianças foram logo de encontro ao livro, as outras para os
brinquedos e pouco depois a maioria pegava um livro para folhear e ficava com o
brinquedo do lado. Dos dez, apenas três dessas crianças não pegaram o livro de forma
alguma.
Assim, nesta escola percebemos que a literatura infantil pode influenciar o
comportamento leitor de forma positiva quando trabalhada de maneira competente. O
que nos dá suporte para essa conclusão foi o fato de que os alunos permaneceram com
as mesmas escolhas, uma vez que escolhiam os livros e também os brinquedos, ou
apenas os livros e que também inicialmente, cinco alunos não pegaram nos livros,
porém no pós-teste mesmo com dez alunos participantes o numero de alunos sem pegar
nos livros foi menor que no pré-teste.
Nas observações do pré-teste na escola da professora II, participaram quinze
alunos, e desses quinze, doze interessaram-se pelos livros. Desses doze: quatro alunos
em nenhum momento se interessaram por outro objeto a não ser o livro; dois alunos,
que inicialmente escolheram carrinhos, ficaram observando a capa do livro e pouco
depois deixaram os carros e optaram apenas pelos livros e seis desses alunos brincaram
com os brinquedos, no entanto, mesmo com eles algumas vezes observavam e
folheavam com interesse os livros colocados na sala. Ocorreu de apenas uma aluna que
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não pegou de maneira nenhuma o livro, só uma bola e dois alunos que brincaram todo
do pré-teste de carrinhos.
Pudemos perceber nesse pré-teste que a maioria dos alunos se identificavam com
livros infantis, pois a presença dos brinquedos não diminuía a procura por livros que
chamavam suas atenções. Nas aulas que observamos a turma da professora II,
demonstravam interesse e entusiasmo nas histórias apresentadas uma vez que a docente
oportunizara as crianças o ouvir, o manusear e também a manifestação de seus
sentimentos.
Ao término das observações, voltamos à escola para realizar o pós-teste assim
como na escola da professora I. Nesse dia estavam na sala de aula dez alunos, cinco a
menos que no dia do pré-teste. Percebemos que três alunos escolheram os livros de
imediato, duas folhearam os livros e ao mesmo tempo seguravam os brinquedos. Uma
das alunas, mesmo de posse de um brinquedo, folheava bem atenta cada página de um
livro, enquanto sua colega “dava chapinha” no seu cabelo.
Observamos que uma das alunas, a única que no pré-teste em nenhum momento
se interessou pelo livro sempre segurando uma bola, no pós-teste de imediato se
interessou pela bola, porém segurando ainda a bola, pegou um dos livros e começou a
folheá-lo. Aos poucos, seu interesse pela bola foi totalmente substituído pelo livro
Chapeuzinho Vermelho. Logo em seguida, se interessou e folheou outros livros e não
pegou mais a bola até o final do pós-teste. Três dos alunos se dividiam entre o brincar,
olhar os livros dos colegas e manuseá-los. Uma destas alunas, que consideramos a mais
interessada nos livros e em escutar histórias, identificava o livro pela capa e saia
mostrando para professora que já tinha visto ou assistido aquela história. Depois de
passear pelos livros, ela também mexia nos brinquedos, no entanto os largava quando a
sua frente via algum livro que chamasse sua atenção. Nenhum dos alunos desta escola
portanto, deixou de ter contato com algum livro neste momento do pós-teste.
Mesmo tendo também um número reduzido de alunos nessa escola no pós-teste,
o entusiasmo desta aluna todas as vezes que pela capa identificava uma história já lida e
a mudança no comportamento de alguns alunos nos chamou bastante atenção e nos fez
concluir que também na escola da professora II, as leituras que esta realizou durante as
pesquisa influenciaram positivamente o comportamento dessas crianças a respeito dos
livros. Os alunos de fato deram preferência aos livros e todos tiveram contato em algum
momento com eles, mesmo tendo a sua disposição diversos brinquedos.
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As tabelas abaixo mostram a quantidade de alunos que tiveram contato com os
livros nos dias do pré e pós- teste em cada escola:
Tabela I
Escola I (professora I)
Pré-teste: 16 alunos
Pós-teste: 10 alunos
Tiveram
contato
(de
imediato
ou
depois,
exclusivamente ou junto
com brinquedos)
Não tiveram contato
11
7
5
3
Tabela I: Quantidade de alunos da Escola I que tiveram contato com os livros nos pré e pós-teste.
Tabela II
Escola II (professora II)
Pré-teste: 15 alunos
Pós-teste: 10 alunos
Tiveram
contato
(de
imediato
ou
depois,
exclusivamente ou junto
com brinquedos)
Não tiveram contato
12
10
3
0
TABELA II: Quantidade de alunos da Escola II que tiveram contato com os livros nos pré e pós-teste
Tabela III
Porcentagem de alunos que
tiveram contato com o livro
Escola I (professora I)
Escola II (professora II)
Pré-teste
Pós-teste
68,8%
80%
70%
100%
TABELA III: Porcentagem de alunos das duas escolas que tiveram contato com os livros nos pré e pósteste.
Verificamos que em ambas as salas de aula na aplicação do pós- teste ocorreu um
aumento na quantidade de alunos que tiveram contato com o livro. Embora na primeira
escola o aumento tenha sido pequeno, na segunda, no entanto, observamos um aumento
significativo. Esses resultados nos indicam que o trabalho com a literatura infantil na
escola pode, de fato, influir de forma positiva no comportamento leitor das crianças,
despertando e intensificando o interesse das mesmas pelos livros.
5. Considerações Finais e/ou Conclusões
O presente estudo nos possibilitou uma grande reflexão sobre a importância da
literatura infantil no desenvolvimento da criança, tanto no aspecto cognitivo, emocional
e social.
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Pudemos perceber que os professores das pré-escolas pesquisadas desenvolvem
um trabalho que visa inserir seus alunos ao estímulo da literatura infantil, trazendo isso
através do lúdico, explorando a imaginação e a aprendizagem, favorecendo assim o
desenvolvimento dos mesmos. Além disso, as leituras realizadas nas salas de aula
estavam de acordo com o nível de desenvolvimento psicológico da criança.
No tocante ao reconhecimento da importância da literatura infantil para as
crianças, verificamos que ambas educadoras reconhecem e focam em suas praticas a
relevância de um trabalho que proporcione a criança um desenvolvimento no âmbito da
aprendizagem, da emoção e do social.
Ao término da pesquisa concluímos que o trabalho realizado pelas educadoras
contribui para a formação de futuros leitores quando as crianças estão envolvidas e
atenciosas com as contações de histórias e há o encanto pela maioria delas ao manusear
os livros. E isso ficou claro, no pré e pós-teste quando os alunos priorizam em suas
escolhas, os livros, mesmo estando à disponibilidade dos mesmos diversos brinquedos.
O estudo possibilita a percepção da importância da literatura infantil, pois de
fato quando trabalhado de maneira coerente e que atenda ao desenvolvimento infantil,
aumenta e melhora o comportamento leitor das crianças. A forma como os professores
conta história faz diferença também nesse comportamento em relação às leituras.
Pesquisas desse tipo, a partir de resultados positivos como este, podem ser
incluídas na formação de professores trazendo a contação de história como veiculo
propulsor de desenvolvimento das crianças em todos os sentidos abordados na pesquisa.
Um dos problemas encontrados em nossa pesquisa foi realizarmos o pós-teste
em uma sexta feira, pois nesse dia, nas duas escolas, o número de alunos foi reduzido e,
portanto se fizéssemos novamente o pós-teste faríamos em outro dia da semana. Outro
limite de nossa pesquisa foi o tempo, pois poderia ser bem mais proveitoso para
responder ao nosso quarto objetivo um estudo longitudinal, o que pode se constituir em
uma idéia para a continuação deste estudo em um momento futuro.
Pensamos que através deste trabalho sobre a literatura infantil na escola, possam
existir outros que visem como este entender e encontrar formas de trabalhar o interesse
da criança pela leitura e, portanto a valorização dos livros pelas mesmas. Trabalhos que
possibilitem que estas quando adultos mantenham essa valorização, por ter gostado e
gostar de ouvir leituras, por ter tido e ter a possibilidade de uma boa experiência com os
livros.
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Referências
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quantitativa e a utilização da pesquisa-ação nos estudos organizacionais.
Disponível em:<http://www.abepro.org.br/biblioteca/ENE GEP>.Acesso em: 5 de maio
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O trabalho com a literatura infantil: Um estudo de caso em duas pré