Factsheet Agenda de Desenvolvimento Global PÓS-2015: UMA AGENDA DE DIREITOS HUMANOS 002-003 Os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), que marcaram a última década e meia do Desenvolvimento, seja na definição das prioridades, seja na mobilização de recursos e de atenção para temas específicos, expiram em 2015. Está já em curso uma ampla reflexão sobre o futuro do Desenvolvimento a nível global, ao mesmo tempo que se faz uma análise crítica do real contributo dos ODM. O horizonte temporal de 2015 apresenta-se assim como um grande desafio, mas também uma renovada oportunidade para promover uma agenda baseada na promoção e na realização dos Direitos Humanos para todos. AS LIÇÕES DOS ODM É inegável o contributo dos oito objectivos enquanto ferramenta de sensibilização, de advocacy e de recentramento sobre questões consideradas prioritárias, numa perspectiva de luta contra a pobreza e assente em princípios de dignidade e de igualdade. Porém, em época de balanços, existe igualmente um consenso generalizado do seu factor de distorção e de marginalização, ao constatar-se pouco ou nenhum progresso em determinadas questões-chave que não estão directamente cobertas pelos ODM, como as desigualdades, o desemprego, a governação ou a questão da segurança humana e da fragilidade dos Estados. A menos de dois anos da meta temporal estipulada, reconhece-se que alguns dos ODM não serão atingidos até 2015, enquanto outros foram desenhados para fazer face a uma parte do problema1. Além da visão reducionista, de acordo com os mais críticos, a sua génese não responde aos actuais desafios globais. O mundo mudou desde 2000 e a nova Agenda de Desenvolvimento terá de procurar responder e corresponder a diversas ques- tões como os múltiplos atropelos aos Direitos Humanos, a segurança alimentar, a segurança humana nos Estados em situação de fragilidade, o desemprego, as crises económica e financeira, as alterações climáticas, entre muitos outros desafios. Outra crítica recorrente aos actuais ODM tem a ver com o próprio processo de definição, altamente centralizado, delineado por um pequeno grupo de especialistas2 com base na Declaração do Milénio (2000) e, consequentemente, com um nível muito baixo de participação. Este facto fez com que a ONU enfatizasse desta vez o carácter participativo da nova Agenda de Desenvolvimento, ao procurar formas de incluir no processo de discussão aqueles que vivem em situação de vulnerabilidade, pobreza ou exclusão. Exemplo disso é a campanha The World We Want que desencadeou uma série de consultas nacionais e temáticas para recolher as prioridades das pessoas à escala planetária. Apesar do esforço de inclusão de todos neste debate, existe o risco da participação se diluir naquelas que são as prioridades do sistema global e seja utilizada como mera bandeira nos corredores de poder para legitimar as decisões que integram o documento final. De qualquer forma, multiplicam-se por todo o mundo documentos de posição e relatórios com as prioridades dos mais diversos stakeholders, desde movimentos e organizações da sociedade civil, academia, Estados, organizações regionais e internacionais. Em Portugal, o Camões – Instituto da Cooperação e da Língua criou um Grupo de Trabalho sobre a Agenda Pós-2015, no âmbito do Fórum da Cooperação para o Desenvolvimento, que é composto por organizações da sociedade civil que manifestaram o seu interesse em integrar o grupo de discussão. Apenas foi convocada uma reunião, sem repercussão, e pedidos contributos por via electrónica na preparação da participação portuguesa no evento paralelo dedicado aos ODM, na 68.ª Assembleia Geral da ONU. 1 É o caso, por exemplo, do ODM 1 – Erradicar a pobreza extrema e a fome, cujo compromisso passa pela redução para metade da percentagem de pessoas com rendimento inferior a 1 dólar por dia e da população que sofre de fome. 2 Recentemente, Mark Malloch-Brown, então director do PNUD, disse que o grupo de peritos das Nações Unidas desenhou os 8 ODM no escritório da ONU em Nova Iorque com “relativa descontracção”, quase se esquecendo de incluir um objectivo específico para a questão do ambiente [Objectivo 7. Garantir a Sustentabilidade Ambiental] 004-005 UMA AGENDA DE DIREITOS PARA TODOS, EM TODO O LADO O relatório divulgado em Maio pelo Painel de Alto Nível da ONU sobre a Agenda de Desenvolvimento Pós-2015 é entendido como o documento preliminar e a base para discussão da nova agenda, assente em três pilares para o Desenvolvimento sustentável: a inclusão social, o crescimento económico e a sustentabilidade ambiental, que requerem uma mudança profunda no actual paradigma de Desenvolvimento (ver caixa 2). Perante a constatação de que o mundo está em crise – uma crise financeira, económica, de valores – existe a necessidade de encontrar novas formas de organização da sociedade, de relacionamento com o ambiente e de uma nova lógica de economia. Neste contexto, o novo enquadramento Pós-2015 tenciona responder às necessidades do mundo actual, alinhando a agenda de Desenvolvimento humano e a agenda de sustentabilidade ambiental, numa lógica de interdependência e de reconhecimento de que o bem-estar das pessoas depende do respeito pelo meio ambiente. A integração de objectivos de Desenvolvimento humano, os sucessores dos actuais ODM, e de objectivos de Desenvolvimento sustentável, já identificados e discutidos na Conferência das Nações Unidas Rio+203, numa mesma agenda acarreta o risco de sobrevalorização de uma das agendas em detrimento da outra. Neste contexto, é importante identificar as diversas prioridades e adoptar uma base comum de entendimento assente no respeito e promoção efectiva dos Direitos Humanos. Em termos gerais, é urgente transitar de um modelo “paliativo”, baseado numa abordagem caritativa e na satisfação de necessidades e direitos mínimos, para uma nova abordagem de Desenvolvimento, ancorada na promoção e na realização dos Direitos Humanos, cuja centralidade são as pessoas e o respeito pela sua dignidade. Reconhece-se que a defesa do compromisso de todos os países do mundo pela realização dos Direitos Humanos é uma agenda ambiciosa, porém reconhece-se igualmente que apenas desta forma será possível garantir um modelo de Desenvolvimento sustentável, igualitário e justo à escala planetária. 3 20-22 Junho 2012, mais informação em sustainabledevelopment.un.org CAIXA 1. A POBREZA ENQUANTO SINTOMA O indicador econométrico para medir o limiar da pobreza é manifestamente redutor, consideram os especialistas. Existem pessoas que vivem com mais de 1,25 dólares por dia, ou seja, tecnicamente acima do limiar de pobreza, porém privadas de recursos, de escolha, de segurança ou de poder, o que as coloca numa situação de pobreza, exclusão e marginalização. Num exercício simples de associação, Gonzalo Hernández, director da Coneval (agência mexicana de Desenvolvimento), equipara a pobreza à febre. Assim como a subida da temperatura corporal indica que algo está errado e são necessários diagnósticos complementares para detectar a doença, a pobreza deve ser entendida como sintoma, que requer um diagnóstico multidimensional com recurso a outros indicadores para além dos económicos. 006-007 Deste modo, a nova agenda deve ser norteada sobretudo por instrumentos internacionais de Direitos Humanos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, o Direito Internacional e outros mecanismos que promovam, respeitem e protejam todos os direitos e garantias fundamentais das pessoas, sem qualquer tipo de descriminação (incluindo grupos mais vulneráveis como mulheres e raparigas, grupos minoritários, indígenas, migrantes, deslocados, deficientes, entre outros). Assim, o documento final deverá incluir uma referência clara e específica a direitos fundamentais como o direito a padrões de vida adequados, o direito à alimentação, o direito à água e ao saneamento, o direito à saúde, o direito à educação, o direito ao Desenvolvimento, o direito à saúde sexual e reprodutiva, o direito à sexualidade, o direito ao trabalho, o direito à igualdade de género, os direitos cívicos e políticos e o direito à autodeterminação. Para isso, deve integrar os elementos fundamentais de uma abordagem de Direitos Humanos, nomeadamente uma atenção redobrada às causas endémicas dos problemas, à participação, à inclusão, à responsabilização e à prestação de contas, à não-descriminação, ao empoderamento dos mais vulneráveis, ao Estado de Direito, à democracia, à boa governação, ao acesso à justiça, ao acesso à informação, à vitalidade da sociedade civil (organizada e não-organizada), à protecção social, protagonizada por uma verdadeira parceria global em prol do Desenvolvimento. A crise financeira vivida em muitos países, sobretudo entre os membros da OCDE, não pode servir de argumento para a adopção de compromissos redutores que limitam, à partida, as ambições da nova agenda, no que diz respeito à sua universalidade. ADOPÇÃO DE MECANISMOS NACIONAIS DE RESPONSABILIZAÇÃO E PRESTAÇÃO DE CONTAS Para adoptar uma nova abordagem, com carácter vinculativo, não negociável e não arbitrário, é imprescindível incluir mecanismos concretos de implementação e de responsabilização, sobretudo dos Estados, a fim de evitar retrocessos e de assegurar que todos os direitos são respeitados e protegidos em todo o lado. Sem uma delimitação clara das responsabilidades e sem os mecanismos necessários à sua monitoria não será possível progredir. A Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos, por exemplo, poderá ver ampliado o seu mandato, de forma a incluir os sucessores dos ODM enquanto compromissos que os Estados membros, e outros actores, entre os quais se encontram o sector privado e a sociedade civil, devem ter em conta e respeitar. Outros mecanismos internacionais poderão ser adoptados, de forma a apoiar e reforçar instrumentos nacionais de monitoria e de prestação de contas, tais como as instâncias judiciais e os parlamentos nacionais. O acesso à informação é, neste contexto, elemento vital para a prestação de contas em matéria de Desenvolvimento e para a luta contra a corrupção e a invasão fiscal. Os Governos, o sector privado, a sociedade civil, entre outros actores de Desenvolvimento devem adoptar instrumentos que possibilitem a transparência da informação e que assegurem que todas as pessoas têm acesso, compreendem e podem utilizar e partilhar essa mesma informação de forma a responsabilizar a sua acção. 008-009 ____________________________________________________________________________________ DEPOIMENTO. TENDO EM CONTA A EXPERIÊNCIA DA LIGA NA ÁREA DOS DI____________________________________________________________________________________ REITOS HUMANOS, COMO É QUE AVALIA A IMPORTÂNCIA DA COOPERAÇÃO, ____________________________________________________________________________________ NOMEADAMENTE COM ONG NACIONAIS, PARA A REALIZAÇÃO DOS DIREITOS ____________________________________________________________________________________ HUMANOS NUM PAÍS COMO A GUINÉ-BISSAU? NUMA PERSPECTIVA FUTURA, ____________________________________________________________________________________ COMBATER AS DESIGUALDADES PARA ERRADICAR A POBREZA QUAIS AS ÁREAS OU AS METODOLOGIAS QUE CONSIDERA MAIS URGENTES ____________________________________________________________________________________ E CONSEQUENTES NA COOPERAÇÃO COM A GUINÉ-BISSAU? ____________________________________________________________________________________ que visam prejudicar a realização plena de direitos). O combate das desigualdades deve ser explicitamente integrado na nova agenda enquanto Objectivo específico, porém deve também ser prevista a sua transversalidade aos outros objectivos. LUÍS VAZ MARTINS ____________________________________________________________________________________ PRESIDENTE DA LIGA GUINEENSE DOS DIREITOS HUMANOS, GUINÉ-BISSAU ____________________________________________________________________________________ A avaliação da importância da cooperação, na perspectiva da realização dos Direitos humanos, em parceria com as ONG locais, é sem sombra de dúvidas duma utilidade e necessidade irrefutáveis, sobretudo nos contextos em que o Estado não se afirma como principal investidor na criação de condições de bem-estar geral, e muito menos se assume como o guardião da segurança humana e da realização de justiça. Parece-nos inquestionável uma abordagem dos Direitos Humanos no domínio da Cooperação internacional, e ela é particularmente importante nos países onde estão em risco ou tendem a degradar-se. Esta afirmação, porém é válida não apenas para os direitos económicos e sociais, mas também para os direi- tos cívicos e políticos. Ultrapassando as limitações dos ODM, qualquer intervenção precisa, por isso, de ter em conta a pluralidade, multidisciplinaridade e transversalidades dos Direitos Humanos. Ao tentar no curto prazo responder às demandas de acesso aos direitos básicos para uma parte significativa da população, sobretudo nos sectores da educação e da saúde, não pode deixar de se procurar respostas de médio prazo, para a criação consequente de capacidade institucional e uma devida apropriação pelas entidades públicas, evitando assim o risco do Estado acabar por se eximir das suas reais responsabilidades ou ficar incapacitado de as assumir. Actualmente, uma parte significativa da pobreza está também centrada em países de rendimento médio e as desigualdades estão a aumentar significativamente4 a nível global – entre e dentro dos países –, o que significa que uma agenda centrada sobretudo na erradicação da pobreza e na sua equação de “menos de um dólar por dia”, como os actuais ODM, é manifestamente obsoleta. Combater as desigualdades é condição imperativa para acelerar o progresso de uma agenda de Desenvolvimento de erradicação da pobreza nas próximas décadas. O novo enquadramento Pós-2015 deve assim contemplar três conceitos-chave distintos, embora complementares, para fazer face às desigualdades: a equidade (a justiça na distribuição dos benefícios e das oportunidades), a igualdade (englobando questões de género, mas também de igualdade perante a justiça, dentro do quadro normativo do Estado de Direito) e a não-descriminação (proibição de distinção com base em argumentos infundados 4 Dados recentes indicam que 1% da população detém a riqueza equivalente a quase metade da população mundial mais pobre 010-011 ____________________________________________________________________________________ A UNIVERSALIDADE E A APROPRIAÇÃO DA NOVA AGENDA A recorrente distinção entre Norte e Sul e entre países desenvolvidos ou em Desenvolvimento tende a ser abandonada na nova Agenda de Desenvolvimento, na medida em que um conjunto de factores, como a emergência de novos poderes, o número crescente de países de rendimento médio e o surgimento de novas bolsas de pobreza nos países ditos desenvolvidos, vieram alterar os equilíbrios de poder na geografia mundial. Também a cooperação sul-sul e a cooperação triangular, cada vez mais expressivas na Cooperação para o Desenvolvimento, vêm diluindo a tradicional distinção entre países financiadores e países beneficiários (a China é o caso mais paradigmático de país simultaneamente financiador e receptor de Ajuda Pública ao Desenvolvimento, sobretudo através de linhas de crédito e empréstimos concessionais). Enquanto os ODM foram desenhados com o intuito de fazer face a problemas específicos dos Países em Desenvolvimento, a Agenda Pós-2015 deve ser universalmente aplicável, dentro de um quadro normativo de Direitos Humanos, sem porém ter a pretensão de ser uma fórmula one size fits all, aplicável aos diferentes contextos. A apropriação local da nova Agenda de Desenvolvimento é a chave para o sucesso. A experiência dos ODM demonstra que algumas das metas foram alcançadas nos países e nas comunidades onde os Objectivos foram totalmente apropriados ou incorporados na agenda nacional de Desenvolvimento. Pouco progresso foi alcançado nos casos em que os Objectivos permaneceram fora dos esforços de Desenvolvimento a nível nacional e local. É, portanto, importante que, ancorados a um esforço internacional e ao envolvimento de todos os stakeholders, se garanta que os novos Objectivos de Desenvolvimento sejam apropriados aos níveis nacional e local, com as prioridades definidas e implementadas localmente, procurando envolver sempre os grupos ou comunidades onde o programa de Desenvolvimento é protagonizado. Ainda no que diz respeito à dicotomia entre o esforço de universalidade da nova agenda e da sua apropriação local, é igualmente importante ter em CAIXA 2. AS CINCO MUDANÇAS TRANSFORMADORAS PROPOSTAS PELO RELA____________________________________________________________________________________ TÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS ____________________________________________________________________________________ O Painel de Alto Nível das Nações Unidas sobre a Agenda Pós-2015 divulgou em Maio de 2013 um relatório, no qual faz um balanço “optimista” dos ODM e identifica as prioridades e os desafios globais no Pós2015. Para que a nova Agenda de Desenvolvimento seja bem sucedida, é necessária uma alteração no paradigma de Desenvolvimento. O painel propõe cinco mudanças transformadoras para uma agenda simultaneamente centrada nas pessoas e sensível aos problemas do planeta: 1. Não deixar ninguém para trás. A Agenda Pós-2015 promete ser mais ambiciosa e inclusiva, ao abranger todas as pessoas do planeta, como contraponto a uma das principais bandeiras dos ODM de reduzir para metade a pobreza extrema e a fome (o que exclui, à partida, a outra metade da população na mesma situação de pobreza). 2. A centralidade do Desenvolvimento Sustentável. A dimensão social deve associar-se às dimensões económicas e ambientais na nova agenda de Desenvolvimento. Apenas deste modo é possível erradicar a pobreza de forma irreversível e ir ao encontro das aspirações de oito mil milhões de pessoas em 2030. 3. Transformar as economias para criar emprego e promover o crescimento inclusivo. Propõe-se um salto significativo nas oportunidades económicas e uma profunda transformação da economia para erradicar a pobreza extrema e melhorar os meios de subsistência. Isso requer uma alteração rápida dos padrões de consumo e de produção e uma aposta na inovação, na tecnologia e no potencial da iniciativa privada. 4. Construir a paz e instituições eficazes, abertas e responsáveis para todos. O direito a viver livre do medo, dos conflitos ou da violência é um dos direitos humanos fundamentais e constitui-se como pilar central para a construção de sociedades pacíficas e prósperas. O reconhecimento da 012-013 paz e da boa governação são elementos centrais de bem-estar das populações e não podem ser entendidos como critérios opcionais. 5. Renovar a parceria global. Um renovado espírito de solidariedade, cooperação e responsabilização mútua é talvez uma das mais importantes transformações esperadas desta nova agenda. A nova parceria global para o Desenvolvimento deve basear-se num entendimento comum de partilha, sustentada no respeito e benefício mútuo, num mundo cada vez mais interligado. Todos os actores devem ser envolvidos num conceito renovado de parceria. Ler mais sobre as 5 mudanças transformadoras em http:// report.post2015hlp.org/five -transformative-shifts.html. atenção a critérios e a indicadores adoptados localmente, no processo de levantamento de dados e de avaliação dos progressos de Desenvolvimento. Os dados, quando analisados a nível global, ocultam grandes desigualdades e disparidades a nível regional e nacional. De forma a ultrapassar esta questão, a Agenda Pós-2015 deve utilizar dados desagregados, de forma a abranger os diferentes grupos sociais, mesmo dentro do próprio país. A título de exemplo, para avaliar o progresso de um país no que diz respeito às desigualdades sociais, devem ser postos em relação grupos como os mais ricos / mais pobres, a população urbana / rural, a população com habitação formal / informal, e ainda os grupos mais marginalizados / a população em geral. A PAZ, A ESTABILIDADE E A SEGURANÇA HUMANA NA NOVA AGENDA Pelo menos um quinto da população mundial vive em países que atravessam actualmente momentos de instabilidade política, violência ou conflito armado. Há um crescente reconhecimento do impacto da instabilidade e da insegurança no progresso do Desenvolvimento, o que torna incontornável a integração de um objectivo específico relacionado com a segurança humana, a paz e a estabilidade dos Estados. A sua inclusão na nova Agenda acarreta riscos acrescidos, nomeadamente uma tendência de securitização do próprio processo de Desenvolvimento (respondendo à questão, segurança para quem?). Por essa razão, é importante assegurar que a nova Agenda se centra nas pessoas e na segurança humana, de forma a alcançar direitos tão fundamentais como o direito a viver sem medo e sem privações (freedom from fear / freedom from want), para as populações que vivem em países que atravessam momentos de instabilidade ou conflito. 014-015 O Novo Acordo para o Envolvimento com os Estados Frágeis (New Deal), delineado pelo G7+ que integra 18 países em situação de fragilidade, deve ser articulado com a nova Agenda Pós-2015 na promoção da paz, da estabilidade e da segurança das populações. Assim, a integração dos cinco Objectivos de Peacebuilding e de Statebuilding, identificados pelo G7+, num objectivo específico referente à paz e à estabilidade, poderá orientar as intervenções, alinhando-as com os planos e as prioridades nacionais. Neste ponto é importante referir que a nova agenda deve evitar uma visão determinista de catalogação de países, colocando-os à margem e provocando assim novos factores de exclusão. Deve, porém, servir de roteiro na abordagem a países em situação de fragilidade ou pós-conflito, orientando a acção. CONCEITO RENOVADO CAIXA 3. AS REACÇÕES AO RELATÓRIO DIVULGADO PELA ONU DE PARCERIA GLOBAL DE DESENVOLVIMENTO De todos os actuais ODM, o mais difícil de concretizar e de monitorizar é provavelmente o Objectivo 8 sobre a parceria global de Desenvolvimento. Ao longo da última década, tem também sido o mais negligenciado, com custos elevados no que diz respeito à eficácia, à coerência e à coordenação das iniciativas de Desenvolvimento à escala global. Neste contexto, a Agenda Pós-2015 deve enfatizar a importância de fortalecer mecanismos de cooperação internacional, com base numa reforma significativa dos processos e das políticas de governação das instituições internacionais e dos mecanismos de coordenação entre Estados, nos mais diversos domínios (político, social, ambiental, comercial). O debate da nova Agenda de Desenvolvimento deve também integrar o debate sobre o Financiamento do Desenvolvimento. Neste contexto, deve ser definida uma abordagem abrangente e integrada de financiamento para As reacções de diversas organizações da sociedade civil ao relatório divulgado pelo Painel de Alto Nível das Nações Unidas sobre a Agenda Pós-2015 foram quase imediatas e consensuais nas críticas. O Center for Economic and Social Rights, especializado em questões relacionadas com Direitos Humanos e justiça social, congratulou-se com a referência aos Direitos Humanos na nova Agenda de Desenvolvimento. Critica, porém, a sua incorporação de forma fragmentada e inconsistente e a particular proeminência dada ao Desenvolvimento orientado por uma visão de mercado e de negócio. Também a BOND, plataforma britânica de ONG, reagiu ao documento, sublinhando que este não reconhece, de forma efectiva, a questão da responsabilização e da prestação de contas. A responsabilização de actores como os Governos (dos países financiadores e parceiros), o sector privado e a sociedade civil, perante os mais pobres e marginalizados, deve ser a questão central no Pós-2015. 016-017 erradicar a pobreza e promover o Desenvolvimento Sustentável, na qual a Ajuda Pública ao Desenvolvimento – genuína e desligada – é entendida como catalisadora de outros recursos, incluindo os do sector privado. Deve ser reconhecida e acautelada a natureza muito diversa do financiamento público e do privado, promovendo porém possíveis sinergias assentes na responsabilidade social e no respeito pelos Direitos Humanos. 2013 31 MAIO 2013. RELATÓRIO Divulgado Relatório do HLP A New Global Partnership: Eradicate Poverty and Transform Economies Through Sustainable Development SETEMBRO 2013. CIMEIRA Cimeira de Revisão dos ODM, no âmbito da Assembleia Geral da ONU 10 SETEMBRO 2013. RELATÓRIO CRONOLOGIA. MOMENTOS-CHAVE NA DISCUS- SÃO DA NOVA AGENDA DE DESENVOLVIMENTO – Janeiro 2012 / Setembro 2015 Divulgado relatório da consulta pública sem precedente à escala A discussão para a definição de uma nova mundial agenda de Desenvolvimento teve início A Million Voices: The World We Want oficial em Janeiro de 2012, num processo liderado sobretudo pelas Nações Unidas. Desde então que se vêm multipli- 2014 FEVEREIRO – JUNHO 2014. REUNIÕES Reuniões temáticas e Negociações entre Estados membros cando reuniões, encontros de alto nível, relatórios, debates dos mais diversos 18-19 FEVEREIRO 2014. REUNIÃO stakeholders sobre as prioridades da nova Debate temático da Assembleia Geral da ONU sobre Água, Saneamento e Agenda de Desenvolvimento. 2014 será um Energia Sustentável ano marcado pelas negociações intergovernamentais para se chegar a acordo até 6-7 MARÇO 2014. REUNIÃO Setembro de 2015. Encontro de Alto Nível da Assembleia Geral da ONU sobre o contributo das Mulheres, da Juventude e da Sociedade Civil 2012 JANEIRO 2012 Criação de equipa de trabalho das Nações Unidas sobre a Agenda de 9-10 ABRIL 2014. REUNIÃO Desenvolvimento Pós-2015 Encontro Conjunto da Assembleia Geral da ONU e do Conselho Económico e Social sobre o papel das Parcerias MAIO 2012 – ABRIL 2013. CONSULTAS 24-25 ABRIL 2014. REUNIÃO Realizadas 88 consultas nacionais e 11 consultas temáticas Debate temático da Assembleia Geral da ONU sobre Estabilidade e Paz 20-22 JUNHO 2012. CIMEIRA 20-21 MAIO 2014. REUNIÃO Cimeira das Nações Unidas Rio +20 sobre Desenvolvimento Sustentável Encontro de Alto Nível da Assembleia Geral da ONU sobre Cooperação Norte-Sul, Sul-Sul e Triangular; e o contributo das TIC JULHO 2012. RELATÓRIO Divulgado relatório da equipa de trabalho das Nações Unidas sobre Pós-2015 17-18 JUNHO 2014. REUNIÃO Realizing the Future We Want for All Encontro de Alto Nível da Assembleia Geral da ONU sobre Direitos Humanos e Estado de Direito AGOSTO 2012 Nomeação de Painel de Alto Nível (HLP, na sigla em inglês) para definição da Agenda 2015 JULHO / SETEMBRO 2015. CIMEIRA Acordo final sobre o futuro da Agenda de Desenvolvimento 018-019 RECOMENDAÇÕES locais e às metas e prioridades definidas localmente, procurando envolver sempre actores locais na intervenção; É necessário que a nova Agenda Pós-2015: _ incorpore mecanismos de responsabilização política e de prestação de contas por parte dos vários stakeholders de Desenvolvimento; _ reconheça que a situação mundial se alterou substancialmente na última década e que o actual modelo de Desenvolvimento não corresponde às exigências e desafios globais. A nova Agenda de Desenvolvimento deve assim articular coerentemente a agenda de Desenvolvimento Humano e a agenda de Desenvolvimento Sustentável; _ coloque as instituições, os mecanismos e os processos existentes na ONU para monitorização, avaliação, recomendação e responsabilização dos vários países sobre a sua situação de Direitos Humanos ao serviço da monitorização, avaliação, recomendação e responsabilização sobre os objectivos pós-2015; _ assimile e incorpore as lições aprendidas com os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, passando de uma abordagem essencialmente assistencialista para uma nova abordagem cuja centralidade são as pessoas e o respeito pela sua dignididade; _ promova a transparência e o acesso à informação para que possam ser activados os mecanismos de responsabilização; _ crie um novo quadro normativo, assente na realização dos Direitos Humanos de forma holística e integrada e no Direito ao Desenvolvimento. Para isso, os novos objectivos e metas de Desenvolvimento devem estar alinhados e ser coerentes com os instrumentos internacionais de Direitos Humanos para todos; _ seja universal, embora atenta e adaptada aos contextos _ defina metas mensuráveis qualitativamente, analisando o progresso dos diversos objectivos com recurso a indicadores multidimensionais (equilíbrio entre indicadores qualitativos e quantitativos); _ reconheça e assegure o papel central da sociedade civil na promoção do Desenvolvimento inclusivo e estimule a criação de alianças mais amplas e abrangentes de organizações da sociedade civil, de forma a fazer pressão e responsabilizar os seus Governos pelos compromissos assumidos. GRUPO DE TRABALHO AID WATCH DA PLATAFORMA PORTUGUESA DAS ONGD MONITORIZA A AJUDA PÚBLICA AO DESENVOLVIMENTO E O ESTADO ACTUAL DA COOPERAÇÃO PORTUGUESA TÍTULO Pós-2015: Uma Agenda de Direitos Humanos AUTORIA Ana Filipa Oliveira / ACEP COMENTÁRIOS Grupo de Trabalho Aid Watch da Plataforma Portuguesa das ONGD EDIÇÃO Plataforma Portuguesa das ONGD DATA Dezembro 2013 APOIO CONCORD - Confederação Europeia das ONG DESIGN GRÁFICO Ana Grave PRÉ-IMPRESSÃO, IMPRESSÃO E ACABAMENTO Agora Lx - Agência de Produção LIGAÇÕES ÚTEIS A discussão em torno da agenda Pós-2015 é tema dominante em praticamente todos os sites dedicados à Cooperação Internacional. Destacamos aqueles inteiramente dedicados ao tema: BEYOND 2015 www.beyond2015.org HIGH LEVEL PANEL REPORT ON POST-2015 SUSTAINABLE DEVELOPMENT GOALS POST-2015 report.post2015hlp.org sustainabledevelopment.un.org post2015.org THE GUARDIAN (POST-2015 TIMELINE) www.theguardian.com/global-development/ interactive/2013/mar/26/future-of-development-timeline WIKIPROGRESS POST 2015 COM O APOIO DE www.wikiprogress.org/index.php/Post_2015