CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL NATHAM RIBEIRO MARTINS PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – Minas Gerais) Belo Horizonte 2012 Natham Ribeiro Martins PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – Minas Gerais) Dissertação apresentada ao Mestrado Profissional de Gestão Social, Educação, Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Educação e Desenvolvimento Local. Sociais, Linha de pesquisa: Processos Político-Sociais: Articulações Institucionais e Desenvolvimento Local. Orientadora: Prof. Dra. Áurea Regina Guimarães Thomazi. Belo Horizonte 2012 Dedico esse trabalho a minha companheira Andréa, pela paciência e carinho. Aos meus filhos, Théo e Clara, razões da minha vida. Aos meus pais, Elam e Natália, pelo amor incondicional! AGRADECIMENTOS Muitas pessoas foram fundamentais para que eu pudesse concluir esse trabalho. Sem a paciência, carinho e atenção constante de minha orientadora, Áurea, não conseguiria desenvolver essa pesquisa. Muito obrigado por seus ensinamentos. Aos professores e colegas do mestrado. As ricas discussões ajudaram-me a perceber que o fazer do pesquisador só tem sentido se pensarmos nos menos favorecidos e no muito a fazer no nosso país. À professora Adilene por sua contribuição na minha qualificação. Ao professor Frederico. Pelo aprendizado quando fui seu aluno na disciplina sobre avaliação e a participação na minha qualificação e na defesa de dissertação. Obrigado a professora Lúcia Afonso por sua participação na defesa de minha dissertação. Agradeço muito a professora Therezinha Vieira. Sensível e solicita em toda construção de minha pesquisa. Obrigado a todos meus familiares e amigos, pela compreensão e incentivo. Obrigado a Andréa, Dioscele, Ricardo e todo pessoal da ABRADH pela ajuda durante toda a pesquisa. Agradeço, também, às crianças, às professoras, coordenadoras, supervisoras e diretores das escolas onde realizei a pesquisa. Minha gratidão às revisoras desse trabalho, Ana Paula e Semírames. Sou muito grato a todos! “Podemos ir longe, se começarmos de muito perto. Em geral começamos pelo mais distante, o “supremo princípio”, “o maior ideal”, e ficamos perdidos em algum sonho vago do pensamento imaginativo. Mas quando partimos de muito perto, do mais perto, que é nós, então o mundo inteiro está aberto — pois nós somos o mundo. Temos de começar pelo que é real, pelo que está a acontecer agora, e o agora é sem tempo”. Jiddu Krishnamurti RESUMO As discussões sobre os projetos sociais executados por Organizações do Terceiro Setor no Brasil são cada vez mais frequentes embora ainda não haja um marco regulatório que defina as ações dessas organizações. Mudanças na estrutura de funcionamento e gestão das ONGs ocorreram com intensidade a partir da década de 1990, como reflexo direto da constituição de 1988, que estabelece uma discussão sobre a gestão social como a gestão própria das Organizações do Terceiro Setor, diferenciando-a da gestão do Estado e da gestão privada. A presente pesquisa tem como objetivo fazer uma reflexão sobre a interação dessas gestões através da análise de um projeto social em educação, denominado “Projeto Crescer”, executado por uma ONG e financiado por uma empresa privada (Mecan) em parceria com a Secretaria Municipal de Educação do município de Vespasiano, em Minas Gerais. Esse projeto é desenvolvido com alunos encaminhados pela Escola Municipal Maria de Paula Santos, considerados com algum tipo de dificuldade de aprendizagem ou com problemas psicológicos. Com o objetivo maior desta pesquisa é refletir sobre a eficácia das ações do “Projeto Crescer”, foram adotados, principalmente, autores que tratam dos seguintes temas: Terceiro Setor, avaliação, gestão social. Exemplos de tais autores são: Albuquerque (2006), Tenório (2009) e Chianca, Marino e Schiesari (2001). Em se tratando de uma pesquisa quantiqualitativa com finalidade descritiva, foram realizadas entrevistas com professoras da Escola Municipal Maria de Paula Santos e psicólogas da ONG ABRADH (Associação Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano), além da aplicação de testes e análise de documentos escolares de dois grupos de alunos, um deles participante das atividades do “Projeto Crescer” e outro não participante dessas atividades. Os resultados dessa análise apontaram uma evolução das crianças participantes do projeto, em termos psicopedagógicos, e uma possibilidade de ação do projeto que inclui um trabalho específico com as professoras do ensino regular e as famílias das crianças. Em termos gerais, conclui-se que esta pesquisa, além de contribuir para o fluxo de ações e retomada de procedimentos do “Projeto Crescer”, também pode servir como parâmetro de avaliação para as práticas de gestão das ONGs. PALAVRAS CHAVE: Organizações do Terceiro Setor, ONG, Gestão Social, Avaliação de Projetos Sociais, Projetos Sociais em educação. ABSTRACT Discussions about social projects carried out by the Voluntary Sector in Brazil have occurred with greater frequency even though there is no regulatory framework to monitor the actions of these organizations. Significant changes in the management structure and operation of NGOs have occurred since the 1990’s due to the 1988 Brazilian Constitution, which initiated a discussion about social management pertaining to the Voluntary Sector Organization, there by differentiating it from both State and private management. This research project seeks to conduct an analysis of the interaction between these spheres of management. This analysisis carried out through an educational project known as the “Projeto Crescer”, which was developed by an NGO and supported by a private company (Mecan) in partnership with the Municipal Education Office of the municipality of Vespasiano in the state of Minas Gerais. Students diagnosed with a learning disability or psychological problem from the Escola Municipal Maria de Paula Santos [Maria de Paula Santos Municipal School] benefited from this project. As the main objective of this research project is to consider the effectiveness of “Projeto Crescer”, several authors were adopted who investigate the Voluntary Sector, evaluation, and social management. Examples of such authors include Albuquerque (2006), Tenório (2009) and Chianca, Marino and Schiesari (2001). Since this research projecth as a descriptive goal that is both qualitative and quantitative, interviews were carried out with psychologists from the NGO ABRADH [Brazilian Association of Integrated Actions for Human Development] (Associação Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano) and teachers from the Escola Municipal Maria de Paulo Santos. Additionally, psychological tests and school reports were analyzed from students from two groups: one that participated in the activities offered by “Projeto Crescer” and another that did not. The results of this research project show that students participating in the project showed significant psychological and pedagogical improvement. Regarding the project evaluation, the results suggest the possibility of carrying out specific activities with the elementary school teachers and the students’ families. Finally, in addition to contributing to the action sand procedures of “Projeto Crescer”, this research project can also serve as a basis to evaluate management practices adopted by NGOs. Keywords: Voluntary Sector Organizations, NGO, Social Management, Evaluation of Social Projects, Social Projects in Education. LISTA DE FIGURAS GRÁFICO 1 - Distribuição percentual dos resultados de aumento ou diminuição de escore total no ESI nos grupos ApC...................................................... 68 GRÁFICO 2 - Distribuição percentual dos resultados do grupo APC após segunda aplicação do TDE em relação aos níveis por categoria do teste .......... 78 GRÁFICO 3 - Distribuição percentual dos resultados do grupo ANPC após segunda aplicação do TDE em relação aos níveis por categoria do teste .......... 79 GRÁFICO 4 - Distribuição percentual dos alunos APC e ANPC com média em português e matemática na primeira etapa .......................................... 84 GRÁFICO 5 - Distribuição percentual dos alunos APC e ANPC com média em português e matemática na segunda etapa ......................................... 85 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 - Ações e contrapartidas nas parcerias OTS, empresas e Estado ........ 32 QUADRO 2 - Níveis de controle ................................................................................ 49 LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Principais áreas de atuação das ONGs na América Latina .................. 29 TABELA 2 - Distribuição dos estudantes nas oficinas oferecidas pelo Projeto Crescer .................................................................................................. 54 TABELA 3 - Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes participantes do Projeto Crescer................................................................................. 64 TABELA 4 - Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes não participantes do Projeto Crescer ........................................................... 66 TABELA 5 - Resultados do teste ESI dos estudantes totais que apresentam sinais de stress ................................................................................................ 68 TABELA 6 - Interpretação da capacidade cognitiva por faixa de percentil teste MPCR .................................................................................................... 69 TABELA 7 - Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes participantes do Projeto Crescer ........................................................... 70 TABELA 8 - Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes não participantes do Projeto Crescer........................................ .................... 71 TABELA 9 - Distribuição dos resultados percentuais do teste MPCR nos grupos APC e ANPC ......................................................................................... 73 TABELA 10 - Distribuição dos resultados do teste TDE para estudantes do 4º ano . 75 TABELA 11 - Distribuição dos resultados do teste TDE para estudantes do 5º ano . 75 TABELA 12 - Distribuição dos resultados do teste TDE em estudantes participantes do Projeto Crescer............................................................................... 76 TABELA 13 - Distribuição dos resultados do teste TDE em estudantes não participantes do Projeto Crescer ......................................................... 77 TABELA 14 - Percentual do número de estudantes que apresentaram crescimento nos escores de cada categoria ............................................................ 80 TABELA 15 - Distribuição dos resultados em Português e Matemática nos dois primeiros bimestres em estudantes participantes do Projeto Crescer.......................................................................... ...................... 82 TABELA 16 - Distribuição dos resultados em Português e Matemática nos dois primeiros bimestres em estudantes não participantes do Projeto Crescer ................................................................................................. 83 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABRADH Associação Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano APC Aluno Participante do Projeto Crescer ANPC Aluno Não Participante do Projeto Crescer CC Círculos Completos CFP Conselho Federal de Psicologia CRAS Comitê de Relações Ambientais e Sociais CMAS Conselho Municipal de Assistência Social CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Crianças e do Adolescente EPT Educação Para Todos ESI Escala de estresse Infantil MPCR Matrizes Progressivas Coloridas de Raven ONG Organização Não Governamental OTS Organização do Terceiro Setor P1 Professora do 4º ano P2 Professora do 5 º ano PP1 Psicóloga da ABRADH PP2 Psicóloga 2 da ABRADH RF Reações Físicas RP Reações Psicológicas RPCD Reações Psicológicas com componente depressivo RPSF Reações Psicofisiológicas TDE Teste de Desempenho Escolar UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................. 13 2 CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE OS PROJETOS SOCIAIS DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR ............................................................................................... 21 2.1 A Qualidade na Educação: um compromisso social ........................................... 21 2.2 As Organizações de Terceiro Setor (OTS) e as Organizações Não Governamentais ................................................................................................ 26 2.3 Responsabilidade Social e Missão das ONGs ................................................ 31 2.4 A gestão social .................................................................................................... 34 2.5 A gestão das ONGs: estruturas gerenciais e avaliação................................. 41 2.5.1 O planejamento ................................................................................................. 43 2.5.2 A organização .................................................................................................. 44 2.5.3 A direção ......................................................................................................... 45 2.5.4 O controle ....................................................................................................... 46 2.6 O Projeto Crescer ................................................................................................ 50 3 O CAMINHO METODOLÓGICO ........................................................ 57 4 O PROJETO CRESCER EM NÚMEROS: BUSCANDO REFERÊNCIAS ............................................................................... 62 4.1 Resultados ESI (Escala de Stress Infantil) .......................................................... 64 4.2 Resultados MPCR (Matrizes Progressivas Coloridas de Raven) .................. 69 4.3 Resultados do TDE ........................................................................................... 75 4.4 Notas dos alunos nas duas primeiras etapas letivas de 2012 ............................. 81 5 POR DETRÁS DOS NÚMEROS: AS CRIANÇAS DO PROJETO CRESCER .......................................................................................... 87 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................... 99 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 103 APÊNDICES ....................................................................................... 106 ANEXOS ............................................................................................. 122 13 1 INTRODUÇÃO As discussões sobre as ações de organizações não-governamentais (ONGs) em projetos sociais tornaram- se progressivamente maiores a partir da promulgação da constituição de 1988. Ao discutir a relação do Terceiro Setor com o Estado, Teixeira (2011) mostra que a própria Constituição Federal, em seus artigos 150, VI, c, 195, 199 e 204, prevê a participação dessas entidades em projetos sociais. Como justificativa para essa participação está a fragilidade do Estado em realizar seus objetivos no campo social, educacional, da saúde e em todos os outros em que há a participação efetiva de entidades do Terceiro Setor. Ainda segundo Teixeira (2011) o relacionamento jurídico entre o Terceiro Setor e o Estado acontece há décadas no Brasil como forma de operacionalização das ações não-estatais. Muitos documentos jurídicos buscam, além de registrar, regulamentar e limitar esta relação. Com o aumento das ações das entidades do Terceiro Setor, uma necessidade aparece cada vez mais forte: “conferir instrumentos mais efetivos de ação em parceria com o Estado e a sociedade civil na implementação de políticas públicas, especialmente em função da busca por resultados efetivos” (OLIVEIRA, 2007, p. 292). Para compor a tríade, Estado, sociedade civil organizada e empresas, Oliveira (2007) mostra o crescimento das leis de fomento e incentivos fiscais como uma forma de chamar as empresas à responsabilidade social. Ainda segundo esse autor: É para isto que serve a economia, para melhorar a qualidade de vida e, nesse sentido, uma Lei de responsabilidade Social é uma convocação para que voltemos a colocar a economia e as instituições públicas a serviço da qualidade de vida das pessoas, das famílias, das comunidades e não a serviço de uma lógica mundializada sobre a qual não temos nenhum controle e que acaba privilegiando unicamente os interesses da valorização dos fluxos de capital (OLIVEIRA, 2007, p. 50). O presente trabalho procurou identificar como as práticas de gestão e quais práticas de gestão interferem no que se pretende e como e até que ponto observamse mudanças possivelmente impactadas pelo projeto. São fatores determinantes e relevantes que estimularam esta pesquisa no sentido de, ressalta-se aqui, a produção acadêmica científica ainda ser incipiente sobre este assunto e as relações que foram estudadas. 14 Desde o ano de 1997 o pesquisador e autor desta dissertação trabalha com projetos sociais e atua em organizações não governamentais. Ao mesmo tempo em que as ações nessas instituições eram sempre muito intensas possibilitando uma articulação com profissionais de formações diferentes, gerando ações ricas devido a essas trocas, também observou-se uma estrutura falha tanto nos aspectos administrativos das ONGs quanto nas questões mais técnicas, relacionadas diretamente à execução dos projetos estabelecidos. Como desdobramento dessas observações, alguns movimentos foram feitos pelo pesquisador para ajudar a resolver esses e outros questionamentos. O primeiro passo nessa direção foi a participação em encontros do Terceiro Setor em que as discussões sobre estes assuntos eram, e são ainda, constantes. A realização de cursos com profissionais das mais diferentes áreas foram o segundo passo: elaboração de projetos para captação de recursos, gestão social do Terceiro Setor, projetos sociais e ações de participação popular, entre outros, foram temas constantes desses cursos. Essa situação levou, em 2002, à organização de um grupo de estudo formado por profissionais gestores de ONGs atuando em Belo Horizonte. A experiência neste grupo de gestores foi fundamental para a articulação de saberes e mudanças de algumas práticas de atuação que, efetivamente, contribuíram na qualidade do trabalho das instituições envolvidas. Ainda assim, muitas questões ficaram sem resposta, ou respondidas parcialmente. A participação nesses grupos de estudo e a ininterrupta ação nos projetos desenvolvidos por ONGs mostraram ao pesquisador que analisar os projetos sociais através da perspectiva da população atendida, identificando impactos desses projetos e a maneira como é realizada a gestão é ainda um ponto fundamental a ser entendido. A partir disso, tendo em vista uma melhoria tanto na gestão quanto na execução desses projetos, o presente estudo justifica-se no esforço e interesse do pesquisador focado no entendimento e análise desse fenômeno. Dessa maneira, analisar a atuação de ONGs em projetos sociais na área de educação, em que acontece uma parceria com o Estado e a iniciativa privada, fornece um indicativo de como hoje se estabelecem estas relações. Com base nesses pressupostos, o tema da presente dissertação, é um estudo sobre a eficácia dos projetos sociais executados por ONGs na área de educação. Para alcançar esse objetivo, o recorte é o “Projeto Crescer”, desenvolvido em uma escola pública municipal na cidade de Vespasiano/MG e executado pela ONG Associação 15 Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano (ABRADH). Esse projeto é financiado pela empresa Mecan, que atua na fabricação de componentes para a construção civil. Este trabalho mostra os resultados da pesquisa desenvolvida para o Mestrado em gestão social, Educação e Desenvolvimento Local na linha de pesquisa Processos Político-sociais: articulações institucionais e desenvolvimento local, no qual analisaram-se os resultados do “Projeto Crescer” junto aos alunos participantes de suas oficinas. Esta análise pretende contribuir para a discussão sobre as práticas de gestão das Organizações do Terceiro Setor (OTS), no que diz respeito aos processos avaliativos desses projetos. A análise dos projetos estabelecidos pela parceria entre as ONGs1, o Estado (através das escolas públicas municipais) e as empresas financiadoras dessas ONGs bem como a avaliação da interferência desses projetos no aprendizado, comportamento e emoção das crianças que participam do projeto determinaram as bases do problema proposto para esta pesquisa. Sobre a parceria entre as ONGs e as empresas, há duas maneiras de se estabelecer esta parceria. Primeiro, quando as empresas têm uma demanda já definida e “contratam” as ONGs para simplesmente executarem o que é determinado por essas empresas. Outra situação é quando as ONGs apresentam projetos às empresas e essas financiam estes projetos dentro de uma política de responsabilidade social. A presente pesquisa trata especificamente dos desdobramentos de um projeto que se estabeleceu a partir dessa segunda situação, junto aos alunos de escolas públicas municipais, no município de Vespasiano/MG. Quando uma ONG recebe um financiamento empresarial para a organização de um projeto social, não há uma prática estabelecida no sentido de que a empresa solicita uma análise do mesmo. Muitas vezes a isenção fiscal é a contrapartida única e satisfatória da empresa ao seu financiamento. Por outro lado, as ONGs determinam como atividade fim a captação deste recurso, constituindo-se esse o grande foco da gestão interna das organizações. A execução e gerenciamento do projeto passam a ser uma cópia do que outras instituições fazem sem uma preocupação em analisar e sistematizar práticas que apontem melhores resultados. 1 Esse conceito será melhor fundamentado no referencial teórico e no desenvolvimento da dissertação, mas, a título de um esclarecimento prévio, entende-se ONG a partir da definição de Albuquerque (2006) como instituições privadas sem fins lucrativos as quais dedicam-se a ações com características de serviço. 16 Muitas críticas são feitas a esses projetos, caracterizados, quando em parceria com escolas públicas, como atividades recreativas, de lazer ou de substituição aos professores suprindo um grave problema das escolas públicas: o absenteísmo. Em outra palavras, constata-se um problema que se caracteriza como um paradoxo, tendo em vista que, embora esses projetos sejam implantados visando a modificações na realidade cognitiva e afetiva dos alunos, não existe uma preocupação em se analisar a eficácia dessas ações. Há, portanto, uma necessidade fundamental em analisar esses projetos, identificando práticas a partir da parceria estabelecida que mostrem se ocorrem mudanças nos aspectos cognitivos, sociais e emocionais dos alunos participantes. O foco desta pesquisa é exatamente em relação a esses alunos e sobre como eles têm respondido às ações do projeto nos aspectos psicopedagógicos e como essas ações podem ajudar a estabelecer sistemas de gestão das ONGs no que diz respeito aos processos avaliativos de projetos sociais. Sendo assim, reforçando o que foi mencionado acima, esta pesquisa analisou um projeto social na área de educação desenvolvido por uma Organização do Terceiro Setor, financiada por uma empresa privada e em parceria com escolas públicas no município de Vespasiano/MG. Apesar do aumento dos projetos sociais executados por ONGs, “há uma crescente pressão sobre estes órgãos para que demonstrem resultados e o impacto de seu trabalho” (ROCHE, 2002, p. 14). Muitas críticas sobre os trabalhos das ONGs são feitas, principalmente, em relação à falta de clareza sobre os métodos utilizados e se os projetos realmente atingem os objetivos propostos (ROCHE, 2002). Sendo assim, a questão central da investigação pode ser descrita como: qual é a eficácia do projeto social, denominado CRESCER, que busca o desenvolvimento psicopedagógico de alunos de escolas públicas municipais, sendo executado por uma Organização não Governamental e financiado por uma empresa privada? A partir desse questionamento, o objetivo geral deste trabalho foi analisar a eficácia de um projeto social executado por uma organização não governamental, financiado por uma empresa e em parceria com escolas públicas. Para isso, estabeleceram-se os seguintes objetivos específicos: a) Identificar referências teóricas que possibilitassem a descrição de parâmetros de análise de projetos em educação que discutem aprendizagem, comportamento social e emocional e seus resultados; b) Descrever os métodos e procedimentos do “Projeto Crescer” utilizados 17 com os alunos no projeto social pesquisado; c) Identificar as mudanças ocorridas na aprendizagem, no comportamento social e emocional dos alunos participantes do projeto social. Muitos conceitos utilizados neste trabalho precisarão ser definidos para possibilitar uma maior clareza para o entendimento do problema. Sendo assim, para a compreensão do trabalho, é importante delinear os conceitos de Primeiro Setor, Segundo Setor, Terceiro Setor, organizações não-governamentais (ONGs), responsabilidade social, gestão social, missão das organizações sem fins lucrativos, interessados ou “Stakeholders”, eficácia e eficiência. Os conceitos de Primeiro Setor, Segundo Setor, Terceiro Setor e Organizações do Terceiro Setor (OTS) são apoiados em Fernandes (2002) e Teixeira (2011). Buscou-se também fundamentar os conceitos de organizações nãogovernamentais (ONGs), interessados ou Stakeholders e missão das organizações sem fins lucrativos, referenciados em Albuquerque (2006). Igualmente relevante é a definição de responsabilidade social e gestão Social com base em Barros e Boechat (2007) e França Filho (2007), respectivamente. Também são explicitados os conceitos de eficácia e eficiência a partir do referencial teórico de Cohen e Franco (2011). Desta maneira, o referencial teórico foi organizado para, inicialmente, apresentar uma discussão sobre a qualidade em educação, já que o projeto analisado apresenta a melhoria da educação como objetivo de suas ações. Em seguida faz-se uma discussão sobre as organizações do Terceiro Setor e as ONGs, identificando e caracterizando essas organizações. Como o “Projeto Crescer” é desenvolvido dentro da perspectiva da responsabilidade social, apresenta-se esse conceito e o de missão das ONGs. Posteriormente, discute-se a gestão social e, também, a gestão das ONGs dentro do modelo de estruturas gerenciais e avaliação. Finalizando o referencial teórico são mostradas, mais detalhadamente, informações sobre os envolvidos no projeto estudado: a ONG ABRADH, a empresa Mecan e a Escola Municipal Maria de Paula Santos, escola onde aconteceu a pesquisa, além de dados que apresentam o “Projeto Crescer”. Em seguida apresenta-se a metodologia utilizada na pesquisa que foi do tipo quantiqualitativa. A metodologia quantitativa configurou-se na aplicação de testes psicológicos para avaliação dos alunos participantes do “Projeto Crescer”. Tais testes foram aplicados em dois momentos: antes do início da participação dos 18 alunos no projeto e quatro meses depois. Foram organizados dois grupos para aplicação desses testes. Um grupo era composto por alunos participantes e outro grupo, controle, composto por alunos não participantes, mas pertencentes às mesmas séries e turmas dos alunos participantes do “Projeto Crescer”. Além dos resultados dos testes, também foram analisadas as notas obtidas em português e matemática pelos alunos, desses dois grupos, nos dois primeiros bimestres. A pesquisa qualitativa foi organizada a partir de entrevistas realizadas com as professoras e psicólogas coordenadoras do “Projeto Crescer”. Essas entrevistas também foram realizadas antes da entrada das crianças no projeto e quatro meses depois disso. Para a análise dessas entrevistas utilizou-se a análise de conteúdo. O último capítulo apresenta a análise de dados e os resultados dos testes e entrevistas realizados. Acredita-se que uma das justificativas para as ONGs, em geral, não analisarem a eficácia e/ou eficiência dos projetos que realizam é o fato de não possuírem parâmetros para realizarem essa avaliação. Logo, a análise do projeto estudado apresentou resultados de evolução no aprendizado e no comportamento social e psicológico dos estudantes o que mostra que há uma relação entre esses resultados e a metodologia utilizada no projeto. Assim, esta metodologia pode ser uma referência para outros trabalhos que possuem organizações semelhantes, ou seja, ONGs financiadas por empresas e trabalhando com estudantes de escolas públicas municipais que apresentem baixo rendimento escolar e inadequações psicológicas a partir de atendimentos psicopedagógicos e oficinas de esportes e cultura. O trabalho das organizações não-governamentais é cada vez mais presente no Brasil. Independentemente da forma como esse trabalho se estabelece, ou seja, em parcerias com o Estado, com a iniciativa privada, ou ambos, não há como discordar da importância de se discutir sobre esses projetos. Essa discussão passa, necessariamente, pela formação de referenciais que norteiem essas ações e pela identificação de como elas estão interferindo nas relações pessoais e institucionais. Dessa forma, a análise que se fez neste trabalho sobre o impacto desses projetos na população envolvida, ou seja, as crianças que participam do projeto, pretendeu contribuir para a discussão sobre o aprimoramento desses projetos e para o conhecimento de como eles interferem no desenvolvimento dessas crianças. Abrangendo essa situação, a análise de um projeto social em escolas públicas pretendeu, também, identificar em que medida a metodologia utilizada está sendo 19 eficaz em relação ao aumento do rendimento escolar, fato importante para compartilhar e contribuir no desenvolvimento do conceito de qualidade na educação e qualidade do sistema de gestão de ONGs para execução de projetos sociais. Sendo assim, a constante preocupação com o entendimento das práticas das ONGs em projetos sociais favorece não só o aprimoramento técnico dessas ações, mas também provoca a discussão sobre a interação entre o Terceiro Setor, empresas, Estado e a sociedade civil. A partir dessa interação e com o recente processo de democratização de nosso país, novos desafios se impõem: primeiro, como evitar o perigo de esses projetos tornarem-se unicamente um mecanismo de “propaganda” das empresas financiadoras sem uma preocupação sobre a verificação de sua eficácia; segundo, valorizar a divulgação a todos os interessados sobre os resultados obtidos e a busca pela participação dos envolvidos para que sejam fortalecidas as decisões democráticas e formulação de gestão, tanto públicas quanto das organizações não governamentais, que contribuam cada vez mais com a conscientização, qualificação, participação e melhoria dos processos de planejamento, execução, acompanhamento e avaliação dos projetos sociais. A maneira como o projeto foi organizado, a forma como as ONGs interagem com o local de execução do projeto e como os saberes são compartilhados proporciona um entendimento sobre as articulações interinstitucionais e como, a partir do momento em que se atingem os resultados pretendidos, esses resultados contribuem para o desenvolvimento local e o desenvolvimento dos alunos tornandoos mais atuantes, críticos e participativos, sendo estes capazes de intervir no meio em que vivem e de modificar suas realidades conforme os interesses locais. Como resultado desta pesquisa pretendeu-se ampliar o entendimento sobre a avaliação de projetos e as bases de gestão das ONGs. Essa análise permitirá estabelecer critérios que podem subsidiar novos trabalhos (projetos) que tenham como características a atuação com alunos de escolas públicas participantes de atividades psicopedagógicas visando à melhoria do rendimento escolar e também melhor adaptação psicossocial. Além disso, quando se organiza um procedimento de avaliação, há o interesse de se estabelecerem pontos de relevância consensuais a todos os atores desses projetos, levando a uma intervenção que provoque uma maior participação da comunidade escolar e gerando um processo que determine mudanças mais efetivas, pois, admite, como mencionado acima, uma participação maior e, também, uma nova formatação de um procedimento que visa a contribuir 20 para a melhoria no desenvolvimento cognitivo, psicológico e social das crianças atendidas pelo projeto. Analisar como este desenvolvimento foi influenciado pelo projeto estudado foi também um dos resultados esperados da pesquisa. Como um desdobramento da análise deste projeto foi apresentado a organização de um seminário sobre avaliação e impacto de projetos sociais bem como a formulação de um manual de sugestões que contribuam para análise de projetos sociais. Esse documento será publicado no site da ABRADH. O objetivo é que, tanto o seminário quanto o manual, contribuam para o desenvolvimento de novas ferramentas de gestão que busquem uma gestão social mais eficaz desses projetos sociais. 21 2 CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE OS PROJETOS SOCIAIS DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR 2.1 A Qualidade na Educação: um compromisso social No Relatório de Monitoramento Global da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), cujo tema foi “Educação para Todos: O Imperativo da Qualidade”, o entendimento do que é a Educação Para Todos (EPT) está estruturado na necessidade de que as pessoas ocupem seu papel na sociedade para que se construam sociedades de uma forma mais justa e mais pacífica (UNESCO, 2005, p. 5). Apesar disso, de acordo com a UNESCO, não basta oferecer educação. O princípio da qualidade é condição essencial para que se consigam estes objetivos (UNESCO, 2005). O encontro da UNESCO2 sobre educação realizado em 2000 estabeleceu seis metas “destinadas a permitir que todos os indivíduos realizem seu direito a aprender e cumpram sua responsabilidade de contribuir para o desenvolvimento de sua sociedade” (UNESCO, 2001, p. 18). Essas metas ajudariam a balizar a qualidade da educação através da definição de estratégias para se atingirem os objetivos da “Educação para Todos”. Mesmo assim, cada país deve também estabelecer seus próprios objetivos, metas específicas e prazos que se adequem às condições únicas das nações. Para atingir o que foi estabelecido por estas metas, citadas abaixo, faz-se necessário discutir o que seria uma educação de qualidade. As seis metas para o desenvolvimento de uma educação de qualidade: “expansão e aprimoramento da assistência e educação da primeira infância, especialmente para as crianças mais vulneráveis e desfavorecidas; garantir que em 2015 todas as crianças, especialmente meninas, crianças em situações difíceis, crianças pertencentes a minorias étnicas, tenham acesso a uma educação primária de boa qualidade, gratuita e obrigatória, e possibilidade de completá-la; assegurar que as necessidades de aprendizagem de todos os jovens e adultos sejam satisfeitas mediante o acesso equitativo à aprendizagem apropriada e a programas de capacitação para a vida; atingir em 2015, 50% de melhora nos níveis de alfabetização de adultos, especialmente para as mulheres, e igualdade de acesso à educação fundamental e permanente para todos os adultos; eliminar as disparidades existentes entre os gêneros na educação primária e secundária e atingir, até 2015, a igualdade entre os gêneros em educação, concentrando esforços para garantir que as meninas tenham pleno acesso, em igualdade de condições, à educação fundamental de boa qualidade e 2 Fórum Mundial da Educação realizado pela UNESCO em 2000, na cidade de Dakar, Senegal, intitulado “Educação Para Todos: O Compromisso de Dakar”. 22 que consigam completá-la; melhorar todos os aspectos da qualidade da educação e assegurar a excelência de todos, de modo que os resultados de aprendizagem sejam alcançados por todos, especialmente em alfabetização, cálculo e habilidades essenciais para a vida (UNESCO, 2001, p. 18). Pensar a qualidade da educação é, naturalmente, um fator fundamental tanto para estruturar e definir os procedimentos pedagógicos quanto para identificar o que seria ensinar e aprender. Ao mesmo tempo, saber sobre essa qualidade transforma a atuação de todos os agentes, educadores e educandos já que referenciais são obtidos através dessa análise e passam a nortear as atuações dos envolvidos nos processos educativos. Em qualquer projeto que estabeleça como meta a melhoria dos procedimentos isso só pode ser alcançado com eficácia se a definição de qualidade for precisa. Muito se discutiu e ainda se discute sobre o que é uma educação de qualidade. Alguns filósofos, em épocas diferentes da história, abordaram o conceito de qualidade na educação. Rousseau (1712-1778), por exemplo, ligava as suas ideias pedagógicas aos seus ideais políticos. Para ele, uma escola deveria permitir que as crianças se expressassem livremente e a prática “enciclopedista” seria secundária e não fundamental. A ação e o exemplo são mais importantes que a teoria e a família prioritária em relação à escola, pois, a família reforçaria a expressão da criança dentro de uma convivência pautada pelo amor e ternura, afastando-a da prisão civilizatória. O desenvolvimento das potencialidades naturais das crianças e a necessidade de que elas permaneçam longe dos problemas sociais podem ser considerados, segundo Rousseau, os princípios para uma educação de qualidade (ROUSSEAU, 1999). Outro filósofo, Krishnamurti (1895-1986), também escreveu sobre a importância da educação. Para ele, a educação de qualidade é aquela que transforma pelo autoconhecimento e que permite ao indivíduo entrar em relação com a vida como um todo, de uma maneira integral. A educação correta deve, segundo Krishnamurti, “ajudar o estudante não só a desenvolver suas aptidões, mas também a compreender aquilo que lhe desperta maior interesse” (KRISHNAMURTI, 1976). As escolas atuais, sejam elas públicas ou privadas, são reprodutoras do modelo social vigente, de normas e valores da sociedade contemporânea. E, se caracterizamos esse modelo social como um obstáculo às relações de afeição, de amor, de paz, de tolerância, de fraternidade, então, as escolas reproduzem isto 23 também. Não há, na visão de Krishnamurti, um interesse das escolas em provocar e buscar a integração e a inteligência. Na maioria dos casos, as instituições de ensino estão preocupadas com a simples transmissão de conhecimento. A educação de qualidade começa com o educador que, necessariamente, deve compreender-se e estar livre das convenções padronizadas de pensamento, pois, o que o educador é, ele transmite. Logo, a educação correta se relaciona diretamente com oferecer ao indivíduo ajuda para que este descubra todos os “empecilhos psicológicos” que o afastam da liberdade individual. A educação correta tem por escopo a liberdade individual, pois só esta pode promover a verdadeira cooperação com o todo, com a coletividade. Mas essa liberdade não se alcança quando o indivíduo só está interessado no próprio engrandecimento e bom êxito. A liberdade vem com o autoconhecimento, mediante o qual a mente se eleva acima dos empecilhos que para si própria criou ao ansiar por segurança. É função da educação ajudar cada indivíduo a descobrir todos esses empecilhos psicológicos, e não apenas impor-lhe novos modelos de conduta, novos modos de pensar (KRISHNAMURTI, 1976, p. 85). Ainda sobre a qualidade da educação, Morin (2003, p. 17) estabeleceu o que ele chamou dos “sete saberes necessários à educação do futuro”. Para Morin estes saberes constituem aspectos fundamentais para a educação de qualidade que se viabiliza na educação integral do ser humano. Nesta perspectiva, os saberes apontados por Morin são: 1) As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão. Este saber está diretamente ligado à definição do que é, realmente, o conhecimento. É necessário, para Morin, desenvolver o estudo sobre as diversas características dos processos e modalidades do conhecimento em todos os seus aspectos, ou seja, cerebrais, mentais, culturais e das disposições tanto psíquicas quanto culturais que podem conduzir ao erro e à ilusão (MORIN, 2003); 2) Os princípios do conhecimento pertinente: é fundamental a substituição do conhecimento parcial e fragmentado pelo conhecimento que permita estabelecer relações entre as partes e o todo (MORIN, 2003); 3) Ensinar a condição humana: é preciso restaurar a complexidade da natureza humana objetivando integrar a educação por meio de disciplinas que possibilitem a tomada de consciência sobre a identidade complexa e comum 24 a todos os outros humanos. A condição humana deve ser o foco essencial de todo processo de ensino (MORIN, 2003); 4) Ensinar a identidade terrena: ensinar a história da “era planetária” mostrando a solidariedade entre os povos sem ocultar opressões e dominações. O partilhamento, entre os seres humanos, de um destino comum (MORIN, 2003); 5) Enfrentar as incertezas: a educação deve ensinar a lidar com o incerto. É importante ter estratégias que nos possibilitem enfrentar os imprevistos e o inesperado, pois isso prepara a mente humana para esperar o inesperado e saber como enfrentá-lo (MORIN, 2003); 6) Ensinar a compreensão: a compreensão está ausente no ensino atual. Educar para compreender pede uma mudança das mentalidades. Mudar o estado e forma da compreensão mútua é vital para a reestruturação positiva das relações humanas (MORIN, 2003). Ainda sobre o ensino da compreensão, o autor acrescenta: Daí decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de suas raízes, suas modalidades e seus efeitos. Este é tanto mais necessário porque enfocaria não os sintomas, mas as causas do racismo, da xenofobia, do desprezo. Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da educação para a paz, à qual estamos ligados por essência e vocação (MORIN, 2003, p. 17). 7) A ética do gênero humano: a educação deve incluir a ética para o humano, que Morin chama de “antropo-ética” (MORIN, 2003). Levando em consideração que o ser humano é, ao mesmo tempo, indivíduo, sociedade e espécie, a ética fundamenta-se no controle da sociedade sobre o indivíduo e deste sobre a sociedade. Sendo assim: [...] esboçam-se duas grandes finalidades ético-políticas do novo milênio: estabelecer uma relação de controle mútuo entre a sociedade e os indivíduos pela democracia e conceber a Humanidade como comunidade planetária. A educação deve contribuir não somente para a tomada de consciência de nossa Terra-Pátria, mas também permitir que esta consciência se traduza em vontade de realizar a cidadania terrena (MORIN, 2003, p. 18). Apesar da grande amplitude de opiniões e do grande número de variáveis para compor a resposta do que seja qualidade na educação, alguns temas são recorrentes e podem ser notados entre os teóricos que escrevem sobre esse tópico. 25 No relatório de monitoramento global uma “base sólida comum” (UNESCO, 2005, p. 5) foi identificada e explicitada. Ela é composta, primeiro, pela flexibilidade, no sentido de que cada sociedade deve encontrar os determinantes da qualidade da educação que a levam a delimitar quais são os objetivos dessa educação levando em conta sua cultura, sua história, sua população. Dentre esses objetivos, a garantia ao desenvolvimento cognitivo, o desenvolvimento criativo e o desenvolvimento emocional são critérios diretos e fundamentais. Esse desenvolvimento composto pelo cognitivo, criativo e emocional assegura o processo de aquisição de “valores e atitudes para uma cidadania responsável” (UNESCO, 2005, p. 29). Se considerarmos esses objetivos para uma educação de qualidade, uma inferência direta disso seria a de priorizarmos atividades que proporcionassem a melhoria desses processos e o seu constante desenvolvimento. Outro ponto fundamental para uma educação de qualidade é o que o relatório chama de equidade. Com base nesse conceito um sistema educacional que discrimina, qualquer que seja esta discriminação, não é equânime, logo, deixa de ter qualidade. A boa qualidade da educação é fator decisivo para a aquisição de conhecimentos e formação de cidadãos conscientes e responsáveis, além proporcionar fortes evidências sobre o papel da educação no desenvolvimento econômico e social. Dessa forma, aprimorar a análise sobre a eficácia dos métodos utilizados na educação é, também, estabelecer que fatores contribuem mais diretamente sobre a qualidade da educação. Entende-se, aqui, eficácia como sendo “o grau em que se alcançam os objetivos e metas do projeto na população beneficiária, em um determinado período de tempo, independentemente dos custos aplicados” (COHEN; FRANCO, 2011, p. 102). Sobre o Brasil, especificamente, país que está entre os intermediários nas avaliações feitas pela UNESCO no que se refere aos dados gerais sobre educação, muitos dos problemas identificados a partir da década de 1970 e 1980, mas com mais força a partir da constituição de 1988 e da aprovação das Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - lei 9495/19996 -, foram discutidos em situações que incluíam escolas públicas e ONGs. Há uma recomendação da própria UNESCO para a realização de parcerias entre escolas, governo, comunidades, famílias e ONGs visando à prestação de boa assistência e educação de qualidade para crianças e adolescentes, principalmente aos mais desfavorecidos (UNESCO, 26 2001; 2005). Sendo assim, a análise do processo de gestão das ONGs bem como o entendimento sobre os processos de parcerias estabelecidas são importantes para o melhor entendimento da dinâmica de ação das OTS e sobre como esta dinâmica pode proporcionar uma educação de melhor qualidade. 2.2 As Organizações de Terceiro Setor (OTS) e as Organizações NãoGovernamentais Estabelecer alguns critérios sobre o que é uma educação de qualidade foi um fator importante já que a análise deste trabalho tem como referência um projeto em educação. Esta pesquisa propõe-se a verificar a interferência deste projeto no aprendizado, comportamento e emoção das crianças participantes, o que, de uma forma mais específica, relaciona-se à análise do sistema de gestão da ONG para a consecução dos objetivos definidos neste projeto. Como se trata de um assunto relativamente novo e dado ao restrito conhecimento sobre a relação entre as ONGs e as escolas públicas, especialmente quando as ONGs não são financiadas pelo Estado, além da proposta de análise do projeto executado, é necessário que se discuta sobre o Terceiro Setor e ONGs relacionados ao conceito de Gestão Social. De uma maneira geral, a associação de caráter privado desenvolvendo atividades públicas sem objetivarem o lucro caracteriza o Terceiro Setor. Este termo, Terceiro Setor, foi criado por pesquisadores norte-americanos nos anos 1970 e diferenciava as atividades desenvolvidas pelo Estado (Primeiro Setor) e também pelo setor privado (Segundo Setor). Assim, de uma forma geral, o Terceiro Setor pode ser definido como não sendo nem governamental, nem empresarial com funções principais lucrativas. Mas, apesar dessa diferenciação dos setores, não há uma definição jurídica clara sobre o que é o Terceiro Setor. Nos dizeres de Mânica (2007): [...] para a dogmática jurídica, a adoção de um conceito de Terceiro Setor correspondente à totalidade das entidades sem fins lucrativos é inútil, pois a tal categoria não corresponde um regime jurídico próprio, já que o universo das entidades constituídas sem fins lucrativos envolve uma multiplicidade de ações, objetivos e interesses, cada qual sujeito a determinado conjunto de normas jurídicas (MÂNICA, 2007, p. 167). 27 A expressão Terceiro Setor começou a ser popularizada no Brasil a partir da década de 1990, tardiamente se comparado ao surgimento do termo, na década de 1970 nos Estados Unidos, onde significava uma alternativa entre o mercado e a área governamental. A utilização do termo no Brasil foi desenvolvida a partir da constituição de 1988 (LEONARDO, 2007). A utilização da palavra Terceiro Setor foi contextualizada no cotidiano nacional durante a Reforma Administrativa do Estado, iniciada no governo do presidente Fernando Collor de Melo e consolidada – inclusive por alterações no direito positivo – no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (LEONARDO, 2007, p. 196). O Terceiro Setor pode, também, ser entendido como ações particulares, mas, com um sentido público (FERNANDES, 1994). Sendo assim, pode-se inferir que um amplo espectro de organizações forma o Terceiro Setor. A partir de uma análise sobre seus programas e projetos de atuação, observa-se que essas organizações possuem algumas características comuns, enumeradas a seguir: Fazem contraponto às ações do governo: os bens e serviços públicos resultam da atuação do Estado e também da multiplicação de várias iniciativas populares; fazem contraponto às ações do mercado: abrem o campo dos interesses coletivos para a iniciativa individual; dão maior dimensão aos elementos que as compõem: realçam o valor tanto político quanto econômico das ações voluntárias sem fins lucrativos; projetam uma visão integradora da vida pública: enfatizam a complementação entre ações públicas e privadas (ALBUQUERQUE, 2006, p. 19). Outros fatores comuns podem ser identificados nas diversas classificações das instituições formadoras do Terceiro Setor. Entre esses fatores, destacam-se: as organizações possuem uma estrutura e existência institucional; as instituições são separadas do Estado; não possuem fins lucrativos; são autogovernadas e possuem ações voluntárias (ALBUQUERQUE, 2006). As constantes discussões sobre o conceito de Terceiro Setor acontecem tanto na academia quanto fora dela. Para este trabalho considera-se o Terceiro Setor como “um conjunto de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que realizam atividades em prol do bem comum e auxiliam o Estado na solução de problemas sociais” (CF/88, artigos 3º, 6º e 203º; LOAS, art. 2º). Complementando, “estas pessoas jurídicas, sem fins lucrativos, também podem ser criadas para defender interesses de uma classe específica ou de um grupo de pessoas (físicas 28 ou jurídicas), ou, simplesmente, reunir e organizar um determinado segmento” (TEIXEIRA, 2011, p. 58). As ONGs, dessa forma, seriam organizações formadoras do Terceiro Setor em nosso país, mas não sinônimas deste. Historicamente, no Brasil, o que hoje é chamado de organização não-governamental – ONG, antes eram ações filantrópicas exercidas por vários grupos com características de voluntariado, muitos deles ligados a religiões e com caráter nitidamente assistencialista. Por outro lado, em alguns países, principalmente entre os europeus, a expressão “organizações não-governamentais” substitui o termo “Terceiro Setor” (ALBUQUERQUE, 2006). Sua origem remonta ao sistema de representação das Organizações das Nações Unidas, que denominava assim as organizações internacionais que, embora não representassem seus países, tinham atuação significativa para justificar sua presença oficial na ONU. Por extensão, com a formulação de programas de cooperação internacional para o desenvolvimento estimulados pela ONU nas décadas de 1960 e 1970, cresceram na Europa Ocidental ONGs destinadas a promover projetos de desenvolvimento nos países do Terceiro Mundo. Assim, as ONGs européias estabeleceram parcerias em vários países, levando ao surgimento de ONGs também no hemisfério sul (ALBUQUERQUE, 2006, p. 18). No Brasil e na América Latina, a transformação das ações voluntárias assistencialistas até a metade do século XX para as organizações estruturadas que culminaram, principalmente nas décadas de 1960 e 1970, com a estruturação jurídica do que hoje são as ONGs, definiu o Terceiro Setor no nosso país. Dessa forma, apesar de no Brasil e na América Latina as ONGs definirem o Terceiro Setor, elas não são o Terceiro Setor, mas, isto sim, fazem parte do Terceiro Setor. Essas ONGs podem ser definidas da seguinte forma: São instituições propriamente privadas, mas sem fins lucrativos. Lucros eventuais devem ser reinvestidos nas atividades-fim, não cabendo a sua distribuição, enquanto tais, entre os membros da organização. Para que este princípio seja resguardado, os responsáveis legais de uma ONG (seus diretores) não podem sequer receber remuneração através de salários. O capital acumulado por uma ONG não pode se converter no patrimônio de seus executivos. Não há herdeiros neste caso. Quando o criador (ou os criadores) de uma ONG desaparece, outra pessoa deve assumir o seu lugar. Quando uma ONG desaparece, seus bens devem ser transferidos para outra organização do mesmo gênero. Por outro lado, apesar de serem não-governamentais, seus fins têm as mesmas características do serviço público (FERNANDES, 2002, p. 65). 29 Sendo assim, resumidamente, com base na legislação brasileira, podemos dizer que uma ONG se caracteriza por ser privada, mas com ações públicas, não ter fins lucrativos, possuir diretoria não remunerada e nem distribuir lucros, quando houver, para seus sócios e, por último, em caso de dissolução, seus bens e capital serem doados a outra instituição que possua os mesmos fins estatutários. Dessa forma, pela legislação, o que chamamos de ONG só pode ser constituído por associações, fundações privadas (de alguns tipos) e organizações religiosas. Como exemplos de organizações pertencentes ao Terceiro Setor, mas que não se encaixam no conceito de ONG, podemos citar: as fundações da administração pública de economia mista, os clubes de futebol, as Oscips (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público), entre outras. Enfatizando a ideia de que as ONGs seriam um dos tipos de organizações que compõem o Terceiro Setor, Albuquerque afirma que: As ONGs são Instituições privadas sem fins lucrativos que, ao obter algum resultado econômico de suas atividades, devem reinvesti-lo na atividadealvo da organização. Apesar de não governamentais, os fins a que essas instituições se dedicam têm características de serviço público, ainda que em escala diferente do realizado pelo Estado (ALBUQUERQUE, 2006, p. 31). Quanto ao estabelecimento das ONGs no Brasil, a maioria surgiu a partir da década de 1970. Aproximadamente 68% surgiram depois de 1975 sendo que em torno de 15% delas surgiram a partir de 1980. Cerca de 17% surgiram nas décadas de 1950 e 1960 (FERNANDES, 2002). Em relação ao campo de atuação na América Latina, podemos enumerar 14 categorias temáticas que estabeleceram o foco de ação nos estatutos destas ONGs. O quadro abaixo apresenta, na coluna da esquerda, o campo de atuação das ONGs latino-americanas (conforme definido em seus estatutos) e, na coluna da direita, a porcentagem de ONGs que trabalham nessas temáticas específicas. Os dados referem-se ao início da década de 1990. Tabela 1 – Principais áreas de atuação das ONGs na América Latina Campo de atuação das ONGs (Continua) Percentual de ONGs que trabalham nesta temática Criminalidade/Violência/Drogas 1% Negros 5,5% (só no Brasil) Fonte: Fernandes (2002) 30 Tabela 1 – Principais áreas de atuação das ONGs na América Latina Campo de atuação das ONGs (Conclusão) Percentual de ONGs que trabalham nesta temática Índios 1,6% Formação Qualificada/Assessoria 40,6% Educação 36% Pesquisa 15,98% Desenvolvimento/Promoção Social 29,50% Desenvolvimento Rural 15,78% Saúde 20% Mulher 11,58% Meio Ambiente 18,12% Comunicação 18,58% Direitos Humanos 8,7% Projetos de Financiamentos 8,64% Fonte: Fernandes (2002) Outro fator importante para análise refere-se aos grupos beneficiários das ações praticadas pelas ONGs. Cerca de um terço de todas as ONGs declara trabalhar para a comunidade, como um todo. Sobre o conceito de comunidade, três idéias principais são associadas a este entendimento: 1-Olhar o todo, em vez de especializar-se num segmento; 2- valorizar interações face a face, em vez de uma abordagem formal e burocrática; 3concentrar-se no local de moradia, em vez de no local de trabalho. A ênfase no todo era próxima ao estilo de pensamento das esquerdas; a ênfase nas interações face a face implicou uma virada na tradição de esquerda, aproximando-a dos contextos católicos; a ênfase no local de moradia associava-se à emergência dos movimentos sociais urbanos (FERNANDES, 2002, p. 75). Sendo assim, a forma como uma ONG percebe a comunidade e associa-se a ela para a execução de seu projeto também pode ser entendida como um indicador sobre a caracterização do foco de ação previsto no estatuto dessas ONGs. Logo, não só a área de atuação e o fato de não ter fins lucrativos caracterizam o trabalho de uma ONG. De forma complementar e com igual importância, a forma de aproximação com a população beneficiária e a maneira como o processo será conduzido junto a essa comunidade são fatores fundamentais para o bom desenvolvimento dos projetos. 31 2.3 Responsabilidade Social e Missão das ONGs Identificando-se o histórico dessas instituições no Brasil, com o foco na relação dessas organizações com empresas dentro do que se convencionou chamar “responsabilidade social”, a necessidade de uma organização e análise dos projetos executados por ONGs em parceria com o Estado e empresas tomou um rumo diferente a partir da década de 1990. Para discutir esse tópico, faz-se necessário definir o conceito de responsabilidade social que se adota na presente análise: O conceito de responsabilidade social é realmente de operação complexa. O seu eixo norteador é estimular o setor privado a reconhecer um novo conjunto de atores e instituições a serem considerados na gestão de seus negócios. E a partir da extensão da sua rede de relacionamentos, as empresas devem atuar ativamente fundamentadas em uma ética de intenções, se comprometendo e se reconhecendo como responsáveis em interagir no desenvolvimento do país e região. A responsabilidade social empresarial tem a ver com o desafio de inaugurar uma atitude social, ambiental e politicamente responsável, que ajuste suas práticas gerenciais e os objetivos de lucratividade (BARROS; BOECHAT, 2007, p. 133). Houve, mais acentuadamente a partir da década de 1990, uma mudança na estratégia das ONGs, não só na relação com o Estado, mas também no estabelecimento de parcerias com o mercado (SOCZEK, 2007). Em face de um Estado ineficaz e ineficiente, pautado pela corrupção, o protagonismo das ONGs enquanto capacitação/assessoria dos atores da sociedade civil é importante na orientação/ aplicação de recursos que resultem em benefícios para o conjunto da população, permitindo maior visibilidade e transparência dos atos realizados nas esferas governamentais (SOCZEK, 2007, p. 218). Essas parcerias incluem, hoje, um fator que merece ser analisado: seu formato e suas possibilidades, já que estabelecem contrapartidas de todos envolvidos no processo. Se, por um lado, analisa-se esse processo de parceria das empresas como uma “responsabilidade social”, pautada pela “evolução e exigência da sociedade e dos consumidores” (TEIXEIRA, 2011, p. 71), no intuito de que a cultura e as ações empresariais beneficiem a comunidade em troca do lucro que conseguem com a venda de seus produtos, tem-se outra forma de perceber este processo que entende a “responsabilidade social” como uma transformação e adequação do sistema capitalista para continuar o processo de dominação e reprodução do capital: 32 Desta forma, o sistema capitalista de produção, na sua fase monopolista (madura e consolidada), transforma todas as relações sociais, instituições, indivíduos, valores, atos, em meios para a acumulação capitalista e a reprodução das relações sociais. Instrumentaliza todas as esferas da vida social para o seu primordial fim: a acumulação ampliada do capital. Desta forma, um objeto, sujeito, instituição, não representa necessariamente um meio ou instrumento “natural” para atingir finalidades. Ele deve ser adaptado, convertido em meio adequado, deve ser instrumentalizado. Assim, o ferro deve ser convertido em foice, o trabalhador em assalariado, os serviços sociais em instrumentos de controle e intervenção na vida cotidiana da população, o ensino em meio de treinamento de força de trabalho sem ônus para o capital (MONTAÑO, 2010, p. 231). Dentro dessas duas visões sobre a “responsabilidade social” é importante entender que, tanto o Estado quanto empresas e OTS, aderiram ao primeiro modelo. Hoje, a legislação e a prática da parceria entre os três entes citados organizam-se a partir da ideia de que projetos e ações de caráter sociais podem ter financiamento privado e este financiamento ser deduzido de impostos pagos pelas empresas. Mas, ao mesmo tempo, pode-se afirmar que há a necessidade de aprimorar essas práticas e que um cuidado maior tem que ser tomado para que não aconteça uma utilização desses projetos para, simplesmente, ser mais uma forma de acumulação de capital. Por isso, prever-se a participação coletiva, formas colegiadas de decisão e a reorganização destes projetos no sentido da comunidade beneficiária apropriarse deste fazer são situações importantes para este intuito (BARROS; BOECHAT, 2007). Atualmente, a responsabilidade social empresarial é crescente no Brasil. Nas situações em que a parceria ocorre entre os três entes, ou seja, empresa, Estado e OTS, esta parceria envolve algumas contrapartidas que podem ser assim resumidas: Quadro 1 – Ações e contrapartidas nas parcerias entre OTS, empresas e Estado Estado Empresa Financiar o projeto Financiar o projeto social, através de social com, parte em Ações e isenção fiscal e recurso próprio, parte contrapartidas na cessão de espaços. em isenção fiscal. parceria Deixa de arrecadar Utilizam o projeto parte de impostos social financiado diretamente. como estratégia de “Terceiriza” a “marketing” para execução dos aumento das vendas “projetos sociais” Fonte: Fernandes (2002); Albuquerque (2006); Teixeira (2011) OTS Executar o projeto social e realizar “prestação de contas pública” sobre a aplicação de recursos recebidos e qualidade do serviço executado 33 Se até a década de 1980 os movimentos sociais encontravam, no Brasil, forte ligação com a religião (por exemplo, os movimentos sociais das comissões pastorais), a partir da década de 1990 (GOHN, 2003), isso deixou de acontecer com tanta intensidade passando para uma relação mais estreita com o Estado e/ou empresas (COUTINHO, 2004). Esse procedimento envolveu mudanças na estrutura de funcionamento e gestão das ONGs. Segundo Albuquerque (2006), todos os órgãos, instâncias, setores e departamentos das organizações passaram a se envolver e os agentes dessas organizações, a partir de então, possuíam a responsabilidade de melhorar a organização e administração das instituições (ALBUQUERQUE, 2006). Entender a realidade desta nova possibilidade de ação das ONGs, a realidade social, econômica e política que interferiu na busca de uma sistematização da legislação que “incentive a participação dos diversos atores sociais que têm papel importante na busca de uma sociedade mais livre, justa e solidária” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 42) e, entender, também, como os modelos gerenciais de todos envolvidos no processo, seja eles, o Primeiro Setor, o Segundo Setor e as próprias ONGs, tornaram-se fatores primordiais para o sucesso dos projetos executados pelo Terceiro Setor (FERNANDES, 2002). Logo, além da meta de qualquer projeto que é “alcançar eficazmente os objetivos propostos” (COHEN; FRANCO, 2011, p. 73) a análise e avaliação interferem no processo de planejamento e entendimento, pelos participantes desses projetos, da visão e missão das organizações. Entende-se a missão como sendo composta por: definição do efeito pretendido do trabalho, a clareza sobre o problema a ser enfrentado e quem será o beneficiado pelo projeto (ALBUQUERQUE, 2006). Os interessados no projeto, ou os stakeholders, incluem não só os atendidos diretamente pelo projeto executado, mas “todos aqueles que sejam influenciados por ele e possam se envolver com a iniciativa” (ALBUQUERQUE, 2006). Na definição da missão das OTS, esse processo tem como foco principal “a priorização de parcerias, ações, recursos e estratégias, para a construção de um melhor planejamento” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 64). Ainda segundo Albuquerque, a definição da missão passa por uma construção coletiva, em que todos os envolvidos discutem sobre a seleção do problema, ou problemas, que serão o foco de ação das atividades da instituição. Para isso, neste primeiro instante, deve acontecer uma “confrontação entre as perspectivas operacionais com as 34 estratégicas e filosóficas” (ALBUQUERQUE, 2006, p. 64). A partir daí, documenta-se esse compromisso levando-se em consideração a capacidade técnica e financeira da instituição. O público-alvo é determinado a seguir, de acordo com as discussões anteriores, ou concomitantemente. Ao definir a missão, a organização e seus membros (conselho diretor, equipe, coordenação, etc.) devem responder às seguintes perguntas: quem são as pessoas a quem se deseja ajudar?; que tipo de problema sofrem?; que necessidades identificadas precisam ser atendidas?; que necessidades a entidade pode preencher?; ao final, que efeito se pretende obter sobre o público-alvo?; como essas idéias podem ser expressas em uma frase? (ALBUQUERQUE, 2006, p. 66). Logo, uma missão bem formulada é a via inicial que uma OTS tem para a possibilidade de parceria com a iniciativa privada e mesmo com o estado. Essa apresentação, através da missão, funciona como eixo articulador do projeto a ser executado e de todas as ações posteriores, de interesse das três instâncias envolvidas no processo. 2.4 A Gestão Social Nos últimos anos no Brasil o termo gestão social tem sido muito discutido devido, entre outros fatores, ao crescente trabalho realizado pelas organizações do Terceiro Setor. Mas, de uma forma geral, a gestão social também aparece para identificar práticas de diferentes sujeitos sociais incluindo além das OTS, o Estado, as fundações governamentais e o setor privado (FRANÇA FILHO, 2007). Como dito anteriormente, os conceitos de gestão social e Terceiro Setor chegaram ao Brasil na década de 1990 em meio à tensão entre dois processos: a globalização da economia e as discussões sobre a regulação social, por intermédio das conquistas da cidadania e do debate sobre o papel do Estado e da participação da sociedade civil (MAIA, 2005). As referências construídas a partir da discussão sobre esses dois conceitos são recentes e, na maioria das vezes, e sobre os principais aspectos, ainda sem consenso que determinem uma precisão conceitual aceita na comunidade acadêmica e pelos pesquisadores. Nesse contexto, para entender a gestão social e como esta acontece em parcerias nas quais as OTS estão presentes, permite-se alargar a discussão para questões vinculadas à forma como estas instituições trabalham a organização de 35 projetos. Dentro dessa organização de projetos salientamos a questão financeira e a forma como esse gerenciamento acontece na relação com a avaliação e os resultados, com a participação popular, a cidadania e a democracia. A ideia de gestão social encontra em muitos autores a opinião de que a relação entre estes termos, gestão e social, desenvolve um elemento novo que desperta muitas interpretações. Nessas interpretações encontram-se elementos que marcam uma profunda preocupação com a delimitação e identificação do que representa gestão social, visto que gestão organizacional, por exemplo, define a gestão privada (ou estratégica) e a gestão pública (FRANÇA FILHO, 2007). A gestão privada, como o próprio nome sugere, estende-se no espaço do mercado enquanto a gestão pública é aquela que acontece nas instituições públicas de Estado, em todas as suas instâncias (FRANÇA FILHO, 2007). A partir dessa distinção, pode-se definir, então, a gestão social, dentro dessa perspectiva organizacional, como uma ação que não pertence especificamente a nenhum dos campos anteriores, embora possa dialogar constantemente com eles. França Filho (2007) esclarece que esse espaço seria o campo próprio da sociedade civil, em que o econômico é um meio para a realização dos propósitos sociais, e não um fim em si mesmo. A gestão social é o modo de gestão próprio das organizações, atuando num circuito que não é originariamente aquele do mercado e do Estado, muito embora estas organizações entretenham, em grande parte dos casos, relações com instituições privadas e públicas, através de variadas formas de parcerias para consecução de projetos. Este é o espaço próprio da chamada sociedade civil, portanto, uma esfera pública de ação que não é estatal. As organizações atuando neste âmbito, que são, sobretudo, associações, não perseguem objetivos econômicos (FRANÇA FILHO, 2007, p. 5). Este autor observa, ainda, que a inversão de prioridades no sentido de que as OTS não têm o lucro como meta é o que condiciona a especificidade da gestão social. Dentro dessa perspectiva organizacional identifica-se o que muitos pesquisadores determinam como a utilização do Terceiro Setor para um mecanismo de manutenção político-ideológica da classe dominante, ou seja, para se fazer a gestão social é preciso uma captação de recursos para a manutenção dos projetos sociais executados pelas organizações do Terceiro Setor. Essa captação, quando acontece com recursos do orçamento público, ocorre por intermédio dos seguintes 36 instrumentos: auxílios, contribuições, subvenções, convênios, acordos, ajustes, contratos, termos de parceria - somente para a Organização da sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) - e contratos de gestão. O financiamento do Terceiro Setor com recursos privados acontece por meio de doações oriundas de pessoas físicas e doações de pessoas jurídicas (ambas com ou sem vantagens fiscais), sorteios e financiamentos de projetos culturais e artísticos (ALUQUERQUE, 2006) Para outros autores, a gestão social e a gestão do Terceiro Setor estão intimamente ligadas à gestão do segundo setor: “o que é chamado de terceiro setor refere-se na verdade a um fenômeno real inserido no produto da reestruturação do capital, pautado nos princípios neoliberais” (MONTAÑO, 2010, p.186). Ainda segundo Montaño, a captação de recursos do Terceiro Setor para a realização de seus objetivos estatutários não incorporam uma atividade geradora de lucro. Dessa forma, não gerando recursos para se manter em operação, a captação de recursos torna-se uma atividade fundamental, passando a orientar a filosofia da organização e condicionando sua missão (MONTAÑO, 2010). Relacionando a ideia de gestão social que se encontra uma inversão de prioridades sobre a lógica da iniciativa privada (FRANÇA FILHO, 2007) e a maneira como o Terceiro Setor se comporta para fazer a captação de recursos para a implantação e a manutenção dos seus projetos (MONTAÑO, 2010), pode-se observar uma dificuldade para se conciliar estas duas situações, ou seja, estabelecer um processo de captação de recursos que não seja a atividade fim e estabelecer um procedimento em que a gestão social passe a ser o “espaço próprio da sociedade civil” (FRANÇA FILHO, 2007, p. 5), sem perseguição de apenas objetivos econômicos. Nessa ótica, as questões sociais passam a ser pensadas de outra forma, na qual a construção de níveis de responsabilidade democrática e cidadã é substituída por um processo em que o econômico desvia a ação de uma gestão social comprometida para uma gestão que retira do Estado a responsabilidade pela intervenção nas questões sociais. Os valores de gestão no campo social que atribuem propósitos e fortalecem os atributos do capital são vistos como uma “gestão contra o social’ (MAIA, 2005, p. 2). “O homem é reconhecido como objeto e não sujeito deste processo, já que a centralidade fica na técnica e no capital” (MAIA, 2005, p. 5). 37 O objetivo de retirar o Estado (e o capital) da responsabilidade de intervenção na “questão social” e de transferi-los para a esfera do “terceiro setor” não ocorre por motivos de eficiência, nem apenas por razões financeiras: reduzir os custos necessários para sustentar esta função estatal. O motivo é fundamentalmente político-ideológico: retirar e esvaziar a dimensão de direito universal do cidadão quanto a políticas sociais (estatais) de qualidade; criar uma cultura de autoculpa pelas mazelas que afetam a população, e de auto-ajuda e ajuda mútua para seu enfrentamento; desonerar o capital de tais responsabilidades, criando, por um lado, uma imagem de transferência de responsabilidades e, por outro, a partir da precarização e focalização (não-universalização) da ação social estatal e do “terceiro setor”, uma nova e abundante demanda lucrativa para o setor empresarial (MONTAÑO, 2010, p. 241). Outra análise sobre a ação do Terceiro Setor e da gestão social, proposta por Tenório, estabelece que a gestão social seria: o conjunto de processos sociais no qual a ação gerencial se desenvolve por meio de uma ação negociada entre seus atores, perdendo o caráter burocrático em função da relação direta entre o processo administrativo e a 3 múltipla participação social e política (TENÓRIO , 1997, citado por CABRAL 2007, p. 129). Nessa ação de gestão social, a prioridade é o cidadão e, em consonância com o papel fundamental do Estado, o cidadão é o sujeito da demanda do Estado, e o trabalhador sujeito da interação com o capital (CABRAL, 2007). A forma como entender e, de certa maneira, conciliar a gestão privada, a gestão pública e a gestão social, parece ser o grande problema a ser solucionado. Quando a lógica do capital permanece, há uma situação em que não se podem desvincular as questões ideológicas neoliberais da atuação dos sujeitos sociais. Por outro lado, não há como negar que muitos trabalhos realizados e que possuem resultados no desenvolvimento local, na participação popular e na construção da cidadania, são financiados pela iniciativa privada, por mais paradoxal que isso possa parecer. A maneira como a gestão social acontece, estabelecendo a captação como meio, e não como fim, sem que haja uma recusa sobre as inovações vindas do segundo setor e nem sobre as práticas administrativas do setor público (TENÓRIO, 1998) é que pode favorecer a construção de um conceito que ajude a estabelecer uma prática que responda tanto às necessidades de eficácia dos projetos executados quanto de uma construção de democracia e participação popular. 3 TENÓRIO, Fernando (org.). Gestão de ONGs: principais funções gerenciais. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1997. 38 Tenório4 (1998) citado por Cabral (2007, p. 129), ainda destaca: “não desprezar ingenuamente [...] mas reconstruir criticamente a racionalidade de mercado [...] em prol de uma racionalidade que promova, politicamente, a intersubjetividade deliberativa das pessoas”. A partir das diferenças apresentadas em relação ao conceito de gestão social e de todos os paradoxos que poderão advir de qualquer discussão sobre esse tópico, cita-se um procedimento para o entendimento e visualização da possibilidade de junção de diferentes abordagens sobre a gestão social e as atividades das organizações do Terceiro Setor. Através da análise de categorias presentes nos conceitos de gestão social de diferentes pesquisadores, Maia (2005), utilizando a análise de conteúdo, mostrou algumas tendências conceituais que podem assim serem resumidas: 1) A democracia e a cidadania são os valores fundantes presentes nas elaborações sobre gestão social; 2) Os propósitos da gestão social aparecem em três grupos, sendo eles, as ações sociais, os processos sociais e o desenvolvimento social; 3) O espaço ou campo de viabilização da gestão social (locus) são o Estado, o mercado e a sociedade civil, e os agentes dessa gestão também se encontram nas diversas instâncias do Estado, do mercado e da sociedade civil e, em termos de metodologia, destaca-se o processo social. Dessa forma, uma nova definição de gestão social passa pela compreensão dos conteúdos apresentados anteriormente, ou seja: [...] a gestão social é um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes da esfera da sociedade civil, sociedade política, economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder (MAIA, 2005, p. 15). Além da dificuldade inerente ao próprio tema da gestão social, o estabelecimento de uma práxis ainda é o grande desafio. Podemos observar, pelos 4 TENÓRIO, Fernando. Gestão social: uma perspectiva conceitual. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 32, n. 35, p. 7-23, set./out. 1998. 39 conceitos anteriormente apresentados, que existem duas correntes principais: uma que identifica nas práticas atuais uma possibilidade de diferenciação da gestão estatal, da gestão empresarial e a gestão social, sendo a última um espaço típico para a ação da sociedade civil. Apesar da diferenciação dessas práticas não há um caráter de exclusão ou limitação. Espera-se um aproveitamento das ações efetivas e eficazes da gestão do primeiro e segundo setores de maneira a contribuir positivamente na gestão social, fortalecendo a democracia e a participação popular e contribuindo para o desenvolvimento local (TENÓRIO, 1998; FRANÇA FILHO, 2007). Por outro lado, uma segunda corrente de pensamento, estabelece que o modelo que hoje acontece de maneira mais constante, ou seja, no qual organizações do terceiro setor (OTS) executam projetos financiados pelo segundo setor e em parceria com o Estado, estes estabelecidos por isenções fiscais e/ou financiamentos diretos dos governos municipais, estaduais ou federal, acaba por fortalecer o capital estabelecendo uma política de responsabilidade social enfraquecedora dos processos democráticos e participativos e, ao mesmo tempo, de “terceirização” das ações sociais do Estado. Dentro desses modelos teóricos é importante destacar que, mesmo contraditórias, algumas similaridades são observadas. Dentre elas, a necessidade de a gestão social ser um espaço da sociedade civil e da importante característica que é a necessidade imperativa da eficácia dos projetos executados. Sendo assim, observa-se uma gestão social que, na prática atual, estabelece-se por uma parceria entre os três setores, mas que, não pode abdicar de seu caráter democrático e participativo, sendo esse fator algo fundamental que deve constar nas ações do Terceiro Setor, muitas vezes executor dos projetos e na “linha de frente” no contato com sociedade. Entre um modelo e outro, há um “continuum” que não pode ser desconsiderado e que necessita ser trabalhado para que a ação se torne sustentável. E isso, por sua vez, envolve a execução com qualidade dos projetos sociais, a participação popular e a importância do Estado em não abdicar de suas funções sociais, contribuindo, assim, para o desenvolvimento local e para a construção da democracia. A ação dos diferentes sujeitos sociais, seja no âmbito do Estado, das empresas ou da sociedade civil, determina visões e ações que não possuem, ainda, 40 configurações que permitam explicitar e delinear uma mesma linha nas práticas sociais. Devido a essas diferenças, e por ser o Terceiro Setor fundamental nesta discussão, como dito anteriormente, é imprescindível entender como a gestão social é realizada nestas organizações. Mesmo em atividades em que os modelos são muito distintos, não há um caminho que, imediatamente, transforme as práticas assistencialistas ou antidemocráticas em ações participativas, construídas pela cidadania e participativas. Sendo assim, as parcerias estabelecidas entre os três setores devem ser melhor estudadas para que as práticas sociais sejam realmente transformadoras. Uma leitura apenas ideológica, sem o entendimento de como se formaram estas parcerias, do motivo da adoção, em alguns casos, da chamada gestão contra o social, ou da forma como o Estado se abstém das ações sociais, corre o risco de não obter a compreensão do processo como um todo, mas de apenas parte dele. Evidentemente que algumas análises já se fazem notar no sentido de estabelecer alguns pontos de interseção, como os discutidos acima. Além dos já citados, a ética e a transparência das ações, a democratização e a facilitação de participação popular, principalmente daqueles sempre excluídos, bem como o chamamento do Estado para a ação, de uma forma ou de outra, são também situações sempre presentes na concepção da práxis da gestão social. Outro ponto importante é a constante ênfase dada na inversão da lógica do chamado Segundo Setor no processo de atuação do Terceiro Setor. Mesmo sem um consenso sobre a relação entre esses dois setores e a maneira como são estabelecidas essas parcerias, percebe-se que o fundamento desta ação de captação de recursos deve ser na sua inteireza, um procedimento meio, e não final. A lógica do mercado presente em projetos de responsabilidade social empresarial deve ser rediscutida e envolvida por uma ideia mais ampla que inclua necessariamente, elementos da democracia e da cidadania participativa. A sociedade civil que requer e precisa de ações transformadoras não fará a passagem para o “empoderamento” a partir do modelo de gestão social que hoje existe. Mas, ao mesmo tempo, um modelo pronto, mesmo que diferente, corre o risco de também ser alienador. Ele precisa ser construído. E essa construção não se faz somente por dizer o que não funciona ou o que não está alcançando resultados, 41 mas sim criando arenas de discussão, de aceitação das diferenças e de proposições. 2.5 A Gestão das ONGs: Estruturas Gerenciais e Avaliação A gestão social das ONGs tem, em seu escopo, um procedimento de entendimento conceitual que pode ser determinado, inicialmente, pela separação dos termos, ou seja, o que é a gestão e o que é o social. No que se refere à gestão, em um sentido lato, esta designa gerenciamento, administração e organização. Organização que nas ações das ONGs está vinculada à prestação de serviços e busca de resolução dos “problemas sociais de natureza pública que dizem respeito a interesses sociais e concepções do desenvolvimento de grupos diversos de indivíduos” (CABRAL, 2007, p. 122). Sendo assim, entender o processo de gestão das ONGs é entender a correlação de forças presentes quando de uma execução de projeto social, apreender os fatores que interferem nas ações estabelecidas e avaliar como os impactos para o estabelecimento antes, durante e após estes projetos são dimensionados e priorizados. A gestão, como fenômeno organizativo e diretivo das instituições, do capital e do trabalho, caracteriza-se em primeiro lugar por sua difusão sistemática e independência formal, como conjunto de métodos, técnicas e reflexões, responsável pelo ordenamento e pela implantação de sua estrutura, na burocracia moderna, de acordo com finalidades pretendidas por seus agentes. Em segundo lugar, como modo de sintonia de todo o processo operativo, peculiar a uma organização, ela apresenta-se como instrumento interlocutor das especificidades da demanda, em relação à generalidade dos propósitos, recolocando no espaço determinado pelos objetivos públicos da organização seus públicos constituintes – instituidores, funcionários, voluntários, doadores e público-alvo (CABRAL, 2007, p. 123). Dentro dessa visão da ordenação gerencial das ONGs, incorpora-se com ênfase, a “administração como uma disciplina social” (CABRAL, 2007, p. 124). A gestão é entendida como uma relação estabelecida entre a técnica gerencial, as instituições humanas e a ação dos indivíduos (CABRAL, 2007). Além de lidar com dados técnicos específicos, a gestão nas ONGs: Desenvolve uma função social importante, o que requer que as organizações trabalhem em cooperação, sincronização, comunicação e tendo por finalidade contemplar e realizar anseios, perspectivas e expectativas de indivíduos, representados nas organizações (CABRAL, 2007, p. 124). 42 A preocupação que os agentes envolvidos nas ações das ONGs devem ter com a gestão está, de uma forma sintética, relacionada ao processo social vinculado a ela. Legitimar a gestão e entendê-la como um procedimento responsável pela otimização de recursos e eficácia para atingirem-se os resultados significa dimensionar a gestão dentro de uma concepção política (CABRAL, 2007). Quando se indaga sobre a legitimidade da gestão, o fundamento da resposta não reside nos atributos empresariais, econômicos ou financeiros. Reporta-se a eles como vínculos, mas sua essência é política, pois a gestão responsabiliza-se não só pelo desempenho dos processos internos, mas também pela produção social da organização. Isso confere ao processo de gestão uma função social que possibilita à organização aparecer perante a sociedade pela contribuição que presta, e não somente por aquilo que faz nem apenas pela forma que faz (CABRAL, 2007, p. 125). A organização dos procedimentos gerenciais dentro de uma ONG pressupõe uma vinculação desses processos com a “capacidade de uma organização cumprir sua missão” (CABRAL, 2007, p. 126). Sendo assim, as características e a organização da missão das diferentes ONGs interferem no processo gerencial. Como exemplo do que foi citado, a partir da entrevista de dirigentes de algumas ONGs que atuam no Rio de Janeiro, Tenório (2009) constata sobre o seguinte gerenciamento dessas entidades: O trabalho nas ONGs pesquisadas é motivado por um ideal compartilhado pelos membros que as compõem, principalmente sua equipe de técnicos e direção; o planejamento de suas atividades está sujeito às fontes de financiamento. Esse processo de planejamento, embora nem sempre formalizado num plano, caracteriza-se pela participação dos membros das ONGs e de consultores externos, bem como pela freqüente análise do contexto; nem sempre as ONGs têm uma idéia clara de sua missão, de forma a delimitar suas ações, fixar objetivos e metas e avaliar seus resultados; na ânsia de atender à comunidade, o que basicamente determina a inclusão de um novo projeto ou atividade aos já em andamento é a disponibilidade de agenda e o interesse de cada membro do corpo técnico, provocando um desgaste muito grande, devido ao excesso de horas de trabalho, sem possibilidade de avaliar o retorno para a entidade; [...] sua organização prima pela informalidade, praticamente sem normas e procedimentos escritos, o que as torna ágeis, mas dificulta sua gestão, porque as funções e as responsabilidades de seu pessoal não são claramente definidas; o tipo de trabalho que realizam apresenta dificuldades para ser avaliado, seja por seu efeito de longo prazo, seja por seu caráter mais qualitativo; o produto de seu trabalho, em geral, não é vendido, o que torna sua produção dependente ora de doações, ora de financiamentos por meio de projetos (TENÓRIO, 2009, p. 13). As conjunturas políticas e econômicas atuais modificaram a ação das ONGs. Os problemas sociais, foco presente na missão da maioria dessas organizações, 43 precisam ser enfrentados a partir de uma forma de atuação na qual esta missão e o desenvolvimento dos projetos sejam organizados e acompanhados para que a própria ONG entenda se a sua ação está ou não sendo efetiva, compreendendo aqui a efetividade como sendo a “capacidade que uma ONG tem em atender às expectativas da sociedade” (TENÓRIO, 2009, p. 20). Logo, as funções de um processo gerencial aceitas universalmente, ou seja, o planejamento, a organização, a direção e o controle, são fundamentais para que uma ONG consiga os resultados sociais dos projetos que executa. 2.5.1 O Planejamento Para gerir uma organização ou mesmo um projeto, o planejamento é a etapa inicial e estabelece a orientação para as outras atividades da gestão. Ela estabelece-se pela organização prévia, da antecipação sobre o que será realizado e da definição dos objetivos gerais e específicos que determinarão as ações durante o procedimento. "A função do planejamento é o processo de estabelecer antecipadamente a finalidade da organização, escolher objetivos e prever as atividades e os recursos necessários para atingi-los" (TENÓRIO, 2009, p. 27). Para o planejamento de uma organização, a missão de uma ONG é a referência constante para este planejamento. É a missão que estabelece o plano geral de ação, constituído, pelo planejamento operacional, de curto prazo, pelo planejamento tático, de médio prazo, e pelo planejamento estratégico, de longo prazo (ALBUQUERQUE, 2006). O planejamento estratégico é “voltado para a visão ampla, global e de longo alcance da organização” (TENÓRIO, 2009, p. 28). Ele estabelece ações que são sempre discutidas entre os gestores das ONGs, pois implica em uma análise constante das opções do momento e como estas podem, ou não, ser incorporadas pela ONG. O processo de planejamento estratégico é constituído das seguintes etapas: definição da missão, análise do contexto externo, análise do contexto interno, definição de objetivos, definição de estratégias e redação ou elaboração do plano. Apesar de as etapas serem apresentadas em ordem seqüencial, o processo só termina quando se faz uma avaliação do conjunto, de modo a garantir a coerência do plano (TENÓRIO, 2009, p. 29). 44 Definir a missão da ONG significa estipular sua finalidade, campo de atuação, abrangência e público-alvo. A partir daí, é necessário entender o contexto externo, ou seja, que aspectos fora da organização exercem algum impacto na e para a realização de seu trabalho, contribuem para o estabelecimento de toda a linha de ação e condições de adaptação e evidência de riscos e oportunidades. Além disso, aspectos internos à ONG também precisam ser considerados. Tais fatores podem, dependendo da situação, contribuir positiva ou negativamente para que a ONG alcance sucesso em suas investidas. Como próximo passo, a organização define seus objetivos e determina indicadores para acompanhar se esses estão sendo alcançados. Para a realização dos objetivos a organização precisa definir estratégicas que fechem a composição de um plano de ação (TENÓRIO, 2009). Definindo-se o planejamento estratégico, ou seja, o planejamento de longo prazo, estabelece-se o planejamento tático, ou de médio prazo, que irá especificar alguns pontos do planejamento estratégico, como, por exemplo, material utilizado, ações de marketing, finanças, produção, recursos humanos, entre outros. No planejamento operacional, que é um planejamento de curto prazo, acontece o detalhamento do planejamento tático, estabelecendo e especificando os objetivos que serão cumpridos (TENÓRIO, 2009). 2.5.2 A Organização A função organização acontece imediatamente após o planejamento. É nesse momento que se estabelecem atribuições e responsabilidades entre os componentes da ONG. Os objetivos precisam ser, nesse momento, visualizados em torno de recursos disponíveis, responsáveis pelas ações e orientações de trabalho. A função organização é a função gerencial que compreende a capacidade ou a ação de agrupar pessoas e recursos, definindo atribuições, responsabilidades e relações entre indivíduos e grupos, de modo a possibilitar o atingimento dos objetivos da organização (TENÓRIO, 2009, p. 55). Na organização a figura do gestor aparece com mais propriedade no sentido de identificar o andamento do planejamento estabelecido. Apesar da capilarização das tomadas de decisões, ou seja, do fato de que cada integrante do grupo precisa ter certa autonomia para conduzir o processo para o qual foi responsabilizado, é o 45 gestor que “indica as relações entre os seus diferentes membros” (TENÓRIO, 2009, p. 56) na execução do plano de ação. Para a estruturação e encaminhamento das ações executadas, as ONGs têm como referência da função organização o estatuto aprovado em assembléia e registrado em cartório. Nesse documento são estabelecidos, além da missão da ONG, quem são seus dirigentes e as competências de cada um deles. No estatuto, define-se, também, a forma de eleição e duração do mandato, as atribuições de cada instância, como diretoria e assembléia geral, além do funcionamento da diretoria executiva (TENÓRIO, 2009). 2.5.3 A Direção Na função direção a atuação e a prática do gestor consolida-se ainda mais. Apesar do fluxo de ações em ONGs ser determinado, muitas vezes, por um procedimento mais fluido, relacionado ao voluntariado e à própria característica dos projetos sociais (ALBUQUERQUE, 2006), é fundamental a garantia de que o plano de ação estabelecido seja executado e que os objetivos sejam atingidos. Dessa forma, a comunicação do que cada um deve fazer e como o trabalho individual afeta o trabalho do grupo está vinculada ao papel do gestor. "A função direção é a ação de conduzir e motivar pessoas a executarem suas tarefas a fim de alcançar os objetivos organizacionais" (TENÓRIO, 2009, p. 79). Além do processo de comunicação e visão geral do que está articulado pelo planejamento e organização, o gestor precisa ter a facilidade de motivar o grupo, coordenar e supervisionar as atividades executadas, além de assumir decisões durante todo o desenvolvimento dos projetos. Em muitas ONGs a direção é exercida de uma maneira mais desenvolvida que as outras funções administrativas. A explicação para isso é a forma como essas ONGs foram criadas e ao número reduzido de associados. Os projetos sociais executados por essas instituições seguem, em muitos casos, uma dinâmica vinda de associações informais que estabeleceram uma dinâmica própria, caracterizada por decisões colegiadas e gerenciamento de recursos materiais e financeiros escassos (TENÓRIO, 2009). Nessa perspectiva, a motivação, a tomada de decisões e a coordenação geral podem assumir um viés informal, que não contribui para a otimização dos recursos e 46 sucesso dos projetos executados. Para a reversão desse quadro, espera-se que as ONGs, “tomem as decisões mais compatíveis com os objetivos organizacionais, no prazo mais curto possível e sem perder de vista os elementos políticos que integram o processo” (TENÓRIO, 2009, p. 92). Em relação à motivação, a dificuldade acontece quando as pessoas não conhecem ou não são mobilizadas pela missão de uma ONG. Portanto, a motivação é um desafio que se reverte a partir do momento em que a instituição “propicia a todos os seus membros a satisfação pessoal com o trabalho desenvolvido” (TENÓRIO, 2009, p. 92). Sendo assim, o trabalho que a ONG planeja e organiza efetiva-se na mobilização realizada pelo gestor. Um procedimento em que não haja uma vinculação dos membros da instituição com a missão da organização e em que não se estabeleça uma comunicação eficaz que gere segurança a todos em relação às decisões tomadas compromete todos os processos anteriores e pode determinar o insucesso do trabalho. 2.5.4 O Controle A função controle resume-se na análise dos resultados que estão sendo obtidos. Essa avaliação acontece após a organização e implantação das atividades definidas nas etapas anteriormente citadas, ou seja, planejamento, organização e direção. Segundo Tenório (2009, p. 95) "a função controle é a função que compara as ações planejadas com os resultados obtidos. A partir dessa análise é possível dar início a eventuais correções nos rumos definidos pela organização". A função controle referencia-se na busca dos resultados estabelecidos nas etapas anteriores à implantação do projeto. Logo, essa avaliação pode identificar possíveis erros ou inadequações e evidencia como a ONG pode refazer um ou mais processos que a impedem de atingir os resultados estabelecidos. O controle que a ONG realiza pode ser externo ou interno. O externo ocorre quando o acompanhamento é realizado por pessoas ou instituições externas à ONG, como por exemplo, entidades financiadoras ou conselhos como o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) ou Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS). Essas instituições avaliam se as ações e recursos mobilizados estão adequados aos resultados pretendidos. O controle 47 interno é aquele no qual a própria instituição busca mecanismos de se avaliar. Esse controle “relaciona-se estritamente à gestão organizacional, sendo os resultados obtidos analisados do ponto de vista da eficiência, eficácia e efetividade” (TENÓRIO, 2009, p. 96). Tal controle, seja ele externo ou interno, precisa ser definido e planejado dentro de uma visão de curto, médio e longo prazo. Por serem os projetos sociais, historicamente, decorrentes de ações filantrópicas e caritativas, a função controle foi e ainda é a menos fundamentada nas ações realizadas pelas ONGs. Isso causou uma gestão que utiliza os recursos de maneira, muitas vezes, inadequada e que não é eficaz na consecução de seus objetivos. É preciso se preocupar em aumentar a eficiência na utilização dos recursos disponíveis e incrementar a eficácia na consecução dos objetivos dos projetos que são com eles financiados. É um dado, resultado da experiência, que os programas sociais costumam gastar de maneira não ótima os recursos de que dispõem. Isso se deve à ausência de adequados controles e a não utilização das metodologias de avaliação que, por um lado, poderiam permitir optar pelas alternativas mais econômicas para alcançar os objetivos procurados e, por outro lado, efetuar um acompanhamento que permita reorientar o projeto quando se julgar que os objetivos não estão sendo alcançados “(COHEN; FRANCO, 2011, p.31). O controle, segundo a característica do momento em que é empregado, pode ser definido como: a) controle ex ante, ou seja, é o controle anterior à colocação em prática do programa, projeto ou atividade. A avaliação ex ante estabelece parâmetros para definir-se a viabilidade de se implantar ou não um projeto. A análise do custo-benefício e do custo-efetividade são metodologias utilizadas no controle ex ante e “também permitem ordenar os projetos segundo sua eficiência para alcançar os objetivos perseguidos” (COHEN; FRANCO, 2011, p. 108); b) controle de acompanhamento ou de monitoração que é o controle realizado durante a execução do projeto. “[...]sua principal virtude é a capacidade de promover correções no decorrer do processo, muitas vezes no momento em que os desvios são detectados” (TENÓRIO, 2009, p. 97). A monitoração é uma função que acompanha o projeto, continuamente, informando a todos os envolvidos sobre os erros e acertos que organizam ações visando à consecução dos objetivos estabelecidos no planejamento; c) controle de avaliação ou ex post que acontece após a execução das atividades. “[...]ao contrário do acompanhamento, a avaliação não interfere no 48 desenrolar dos processos já iniciados. Seu compromisso é com os resultados alcançados” (TENÓRIO, 2009, p. 98). Como mencionado antes, a eficácia, eficiência e efetividade são atributos essenciais na função controle e referências para a organização dos projetos. A eficácia pode ser definida como a razão essencial do projeto e é o “grau em que se alcançam os objetivos e metas do projeto na população beneficiária, em um determinado período de tempo, independentemente dos custos aplicados” (COHEN; FRANCO, 2011, p. 102). A eficiência pode ser entendida como a otimização da relação entre insumos, custo e produtos. A partir daí há duas perspectivas de análise para esse conceito: Se a quantidade de produto está predeterminada, procura-se minimizar o custo total ou o meio que se requer para sua geração; se o gasto total está previamente fixado, procura-se otimizar a combinação de insumos para maximizar o produto (COHEN; FRANCO, 2011, p. 103). A efetividade seria a relação entre os resultados obtidos e os objetivos estabelecidos. Esse conceito relaciona-se ao impacto produzido na população beneficiária dos resultados do projeto executado (COHEN; FRANCO, 2011). Os níveis de controle em um processo avaliativo são importantes para o dimensionamento das ações avaliativas. Identificam-se três níveis organizacionais dos quais se originam três tipos de controle. O controle estratégico estabelece um controle geral que integra resultados e desempenhos. Todas as avaliações recebem informações dos contextos externo e do nível intermediário, para o controle do nível estratégico. “Estão incluídos nessa categoria os vários públicos da organização, mantenedores, clientes, governo, fornecedores, concorrentes e parceiros” (TENÓRIO, 2009, p.99). O controle tático tem “a função de concretizar as decisões tomadas no nível estratégico” (TENÓRIO, 2009, p. 99). Para isso estabelece níveis de ação que, diferentemente do nível estratégico, atuam em áreas específicas da ONG, que podem ser administrativas, organizacionais ou executivas. No controle tático são avaliadas as áreas a partir das ações por que essas ficaram responsáveis quando do planejamento e organização. No controle operacional o foco passa a ser as operações e tarefas e é estabelecido em um prazo curto de tempo para a análise processada. Há uma 49 preocupação com o desempenho e isso estabelece a ação visando ao controle de orçamentos, cronogramas, regras e regulamentos (TENÓRIO, 2009). Quadro 2 – Níveis de controle FOCO ONGs NÍVEIS PRAZO CONTROLE Estratégico Longo Organização Plano Global Tático Médio Setor Programas Setorial Operacional Curto Operação Projetos/Atividades Específico Fonte: TENÓRIO, 2009, p. 100. Nas ONGs, o controle estratégico é realizado nos encontros de avaliação externa, que têm caráter geral e abrangente. O controle tático tem como maior preocupação os aspectos financeiros, dando pouca ênfase ao controle de acompanhamento, destinado a analisar o desempenho de cada área ou unidade (TENÓRIO, 2009, p. 100). Em relação às fases do controle, Tenório (2009, p. 101) discorre sobre o estabelecimento de quatro fases: a) Estabelecimento de padrões de desempenho: a partir dos objetivos e determinação de indicadores, analisam-se os resultados alcançados comparando-os com os estabelecidos como metas, tendo os indicadores como referências para o estabelecimento dos padrões para checagem do desempenho. Os indicadores “são referências que ajudam a responder às perguntas avaliativas” (CHIANCA; MARINO; SCHIESARI, 2001, p. 37). O objetivo da análise dos indicadores para o estabelecimento do padrão de desempenho, além do citado anteriormente, seria fazer um “levantamento de informações sobre os indicadores para se ter uma ideia de quanto o programa está conseguindo produzir o efeito desejado junto ao público-alvo” (CHIANCA; MARINO; SCHIESARI, 2001, p. 37); b) Mensuração dos resultados: etapa fundamental no processo de efetuação do controle, mensurar os resultados significa facilitar o estabelecimento das relações entre o desempenho das atividades executadas e os objetivos previamente determinados. Para isso, essa mensuração deve ter as seguintes características: ser útil, estabelecendo critérios para, caso necessário, rever ações e reestruturar o projeto; ser precisa, representando a leitura da ação executada com o máximo de homogeneidade e exatidão; ser econômica, ou 50 seja, na relação custo-benefício, verificar se o controle a ser realizado é a melhor estratégia de ação e se os resultados esperados dessa ação justificam os gastos com as informações a serem obtidas e as despesas com material, pessoal, etc. Nessa etapa, podem-se empregar os seguintes métodos para a mensuração dos resultados: observação direta e contato pessoal, métodos automáticos, relatórios orais e escritos, gráficos, tabelas e testes com amostras; c) Comparação do desempenho real com o padrão estabelecido: nessa fase, realizando-se as comparações, tem-se informações que permitem à ONG intervenções corretivas e estabelecimento ou não de novos objetivos no projeto executado; d) Adoção de ações corretivas: como dito anteriormente, essas ações serão executadas a partir do desvio observado entre o desempenho real e o estabelecido. Sendo assim, podem-se tomar as seguintes decisões: nada a fazer, modificação no nível de desempenho esperado, atuação sobre a execução das atividades ou alteração no sistema de mensuração de resultados. Em última instância, a avaliação estipula e esclarece o desempenho da organização. Cada etapa estabelecida organiza e ajuda a responder, em face geral, se o projeto que dada ONG se propõe a executar está ou não atingindo os resultados esperados pela instituição, público-alvo, comunidade em geral e agentes financiadores. Estabelecer os mecanismos de controle das ONGs tornou-se um fundamento essencial para a qualidade no gerenciamento de recursos, eficácia do projeto, eficiência e efetividade. A busca pela melhoria contínua passou a ser condição de excelência para o trabalho das ONGs e, cada vez mais, exigida pelas instituições financiadoras e demais envolvidos nos respectivos projetos. 2.6 O Projeto Crescer Em julho de 2010 o Comitê de Relações Ambientais e Sociais (CRAS) da empresa Mecan, abriu um processo para selecionar um projeto social que o próprio CRAS financiaria. Como pré-requisitos, esse projeto deveria ser apresentado por uma ONG, ter como local de execução do projeto, escolas públicas municipais em 51 Vespasiano/MG e ter como público alvo os estudantes do ensino fundamental dessas escolas. A Mecan é uma empresa que atua na construção civil, fundada em 1978 e, atualmente, é a maior fabricante-locadora de andaimes, elevadores e escoramentos de obras do Brasil. A empresa faz parte do “Grupo Orguel” que é formado por dez empresas: Orguel, Locguel, Locbras, Bramex, Multiclean, Orguel Finanças, Orguel Plataformas, Construir, Mecanflex e Mecan. A empresa conta hoje com 1.900 funcionários e possui 70 filiais e representantes no Brasil e demais países da América Latina. Desde sua fundação o “Grupo Orguel” patrocina projetos sociais, educativos e ambientais. O CRAS surgiu em 2003 após a participação da Mecan no Prêmio Mineiro de Qualidade daquele ano. A efetivação dos trabalhos sociais aconteceu em decorrência dessa premiação, culminando com a destinação de 40% (quarenta por cento) dos valores arrecadados com a venda de sucata metálica para a criação e manutenção de projetos na área socioambiental. O CRAS foi criado para arrecadar e gerenciar esses recursos e acompanhar o desenvolvimento dos projetos aprovados. O CRAS estabelece como objetivos principais a consolidação da Mecan como empresa de responsabilidade social e determina como compromisso para suas ações a melhoria da qualidade de vida de seus funcionários, familiares e colaboradores, além das comunidades em seu entorno. Seus membros são funcionários da empresa, hoje em número de oito, que se reúnem semanalmente para decidir ações e acompanhar os projetos em andamento. Anualmente, o CRAS decide sobre os projetos que serão executados no ano subseqüente, a partir da avaliação de novas propostas enviadas e cadastradas pelo site da Mecan e, também, avaliação dos projetos em execução. Os projetos em andamento financiados hoje, são: a) Projeto Crescer: acompanhamento de crianças em escolas municipais de Vespasiano/MG com dificuldades psicopedagógicas; b) Programa Altere (alternativa de renda): são oferecidos cursos e oficinas profissionalizantes para mães, esposas e filhos(as) dos funcionários da Mecan; c) Projeto Sustentar: objetiva incentivar a reciclagem do lixo recolhido dentro das empresas do “Grupo Orguel”; d) Programa Percebendo o Amor: programa que incentiva ações de voluntariado pelos funcionários do “Grupo Orguel”, organizando visitas à instituições filantrópicas, famílias e comunidades carentes; e) Programa Do-Ré-Mecan: oferece educação musical para filhos(as) de funcionários da Mecan; f) Programa Mecangolé: 52 programa que oferece oficinas de futebol para filhos(as) dos funcionários da Mecan; g) Programa Parabéns com Amigos: realiza festas coletivas de aniversário, mensalmente, proporcionando um maior contato entre os funcionários de todos os departamentos da empresa. No final de julho de 2010 o CRAS selecionou a ONG ABRADH (Associação Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano) que é a executora do projeto que recebeu o nome de “Projeto Crescer”. A ABRADH é uma associação existente, informalmente, desde 1995. Em vinte de setembro de 1999 foi registrada formalmente sob o número 102.269 (cento e dois mil duzentos e sessenta e nove) no cartório de registro civil das pessoas jurídicas de Belo Horizonte/MG Na mais recente atualização de seu estatuto, a ABRADH especifica os critérios básicos para ser considerada uma ONG, conforme foi descrito anteriormente. Tais critérios são: a) A ABRADH é uma entidade de direito privado e de natureza filantrópica, sem finalidade lucrativa e de diretoria não remunerada; b) Todas as rendas da associação são aplicadas exclusivamente no Brasil e investidas total e obrigatoriamente na manutenção, expansão e qualificação de sua estrutura e serviços; c) Em caso de extinção e/ou dissolução e/ou reforma da ABRADH estas deverão ser feitas com a devida aprovação da totalidade dos membros da assembléia geral. No caso de extinção da ABRADH ou dissolução o patrimônio da mesma será revertido para uma entidade com os mesmos fins estatutários que a ABRADH. Um fator considerado pela Mecan como requisito fundamental para uma ONG ser escolhida como executora do “Projeto Crescer” é a previsão, em estatuto, das atividades requeridas para esse projeto. Sendo assim, a ABRADH estabelece em seu estatuto como finalidade principal a promoção de atividades nas áreas de educação, cultura, meio ambiente, esporte, jurídica, saúde, pesquisa, promoção de estudos para planificação global, regional, local ou setorial, criação de centros de estudo, empreender ações nas áreas de promoção social e do desenvolvimento econômico, proteção aos interesses da sociedade e atuação em todas as áreas que contribuam para o equilíbrio e desenvolvimento humano. Logo, os objetivos estatutários da ABRADH adequaram-se perfeitamente às ações previstas no escopo do “Projeto Crescer”. 53 Em agosto de 2010 o “Projeto Crescer” foi iniciado, primeiramente, com o estabelecimento de parceria entre a ABRADH e a Prefeitura Municipal de Vespasiano/MG. Essa parceria foi realizada através da Secretaria Municipal de Educação que estabelecia a execução do projeto na Escola Municipal José Paulo de Barros, no bairro Santa Clara, vizinho à Mecan. Inicialmente foi feito um contato com o diretor da escola que estudou e apresentou o projeto a coordenadores e supervisores da escola. Aprovado por todos, foi realizada uma reunião em agosto de 2010 com os professores da escola. O projeto teria como eixo principal o atendimento de crianças e adolescentes por psicólogos, professores de capoeira, Kung Fu, futebol, teatro, artes e música. Os alunos seriam encaminhados pelos professores e orientadores da escola. Um comunicado sobre o início do projeto foi feito pela escola e enviado aos pais e responsáveis. Em abril de 2011 o projeto foi ampliado para a Escola Municipal Maria de Paula Santos, localizada no bairro Morro Alto. Novamente foi feito um contato com a diretora da escola que procedeu da mesma forma que a direção da E.M. José Paulo de Barros, ou seja, foi feita uma reunião com os coordenadores e supervisores e, depois, uma reunião com os professores. Por último, foi realizada uma reunião com os pais comunicando sobre o “Projeto Crescer”. A escolha dessas duas escolas se justifica por dois fatores: a) são escolas que localizam-se próximas à Mecan, atendendo filhos e filhas de funcionários e colaboradores; b) são escolas que atendem crianças com baixo rendimento pedagógico e que possuem inúmeros problemas de ordem psicológica, como transtorno de atenção, hiperatividade, dificuldade de socialização, nível alto de agressividade, problemas afetivos e estresse generalizado. Segundo dados do mês de outubro de 2012, o “Projeto Crescer” atende, nas duas escolas, 444 (quatrocentos e quarenta e quatro alunos). São estudantes do 2º ano do ensino fundamental até o 9º ano do ensino fundamental, com faixa etária variando dos 7 aos 16 anos. Também segundo dados de outubro de 2012, atualmente são oferecidas as seguintes atividades: atendimento em psicologia, acompanhamento pedagógico, música, aulas de kung Fu, aulas de capoeira e aulas de futebol. A participação dos estudantes, conforme as atividades, pode ser visualizada abaixo: 54 Tabela 2 – Distribuição dos estudantes nas oficinas oferecidas pelo “Projeto Crescer” E. M. José P. de Barros E. M. Maria P. Santos Total Atendimento em Psicologia 120 50 170 Kung Fu 40 46 86 Capoeira 40 0 40 Futebol 70 0 70 Acompanhamento pedagógico 0 18 18 Música 60 0 60 Total 330 114 444 Fonte: Elaborado pelo autor O fluxo de ação do projeto é estabelecido através da relação entre a direção das escolas, as coordenadoras e supervisoras das séries escolares, professoras das turmas e psicólogos da ABRADH. A partir de uma reunião realizada no início de cada semestre, ou seja, fevereiro e agosto de cada ano, entre os psicólogos da ABRADH e a direção, é estabelecida a organização do projeto em relação a: espaços físicos que serão utilizados, número de crianças/adolescentes e turmas atendidas pelo projeto e reuniões e outras atividades a serem realizadas naquele semestre. Em uma segunda etapa, os psicólogos reúnem-se com as coordenadoras, supervisoras e professoras para determinar que alunos(as) serão encaminhados para a psicologia, sendo critérios para esse encaminhamento os(as) alunos(as) que apresentam: a) Problemas cognitivos: (atenção, concentração, percepção, memória, linguagem, raciocínio, lógica, estratégia de resolução de problemas, tomada de decisões, etc.). Todos esses interferem, diretamente, no rendimento escolar, averiguado pelo projeto, na evolução das notas de português e matemática; b) Problemas emocionais: tristeza, desânimo, apatia, alto nível de agressividade, fobias, eventos de pânico, insegurança, entre outros; c) Problemas de socialização: não se relacionam bem com colegas, professoras e demais funcionários da escola, ou, liderança exacerbada, gerando atritos e eventos de heteroagressividade e/ou autoagressividade. A partir do encaminhamento para a psicologia, os atendimentos passam a ser realizados semanalmente. São atendimentos em grupos, variando o número de 55 participantes de acordo com a idade e série. Em média são oito estudantes em cada sessão de atendimento. Os psicólogos são os responsáveis pelo encaminhamento dos estudantes para as outras atividades do projeto, de acordo com a demanda individual observada nos atendimentos. Sendo assim, os que apresentam defasagem cognitiva e baixo rendimento escolar passam a frequentar a oficina de acompanhamento pedagógico, na qual são realizadas atividades de complementação ao trabalho da professora em sala de aula, tais como prática de exercícios, acompanhamento de “para casa”, realização de exercícios extras e, em muitos casos, revisão de conteúdos das séries anteriores a que o(a) aluno(a) está matriculado(a). Os estudantes com problemas de socialização, sem interação com os colegas e/ou timidez excessiva, passam a frequentar as aulas de futebol e/ou capoeira. Para as aulas de música são encaminhados os alunos(as) que apresentam problemas emocionais ligados à dificuldade de expressão emocional e insegurança. Para as aulas de Kung Fu são encaminhados os alunos(as) heteroagressivos e/ou com questões de insegurança. Mensalmente, todos os coordenadores de oficinas e os psicólogos realizam relatórios de acompanhamento sobre todos(as) os(as) alunos(as). Nesses relatórios há um acompanhamento individual além de relatos sobre as atividades desenvolvidas e descrição sobre métodos utilizados e resultados esperados. Esses relatórios são discutidos e, a partir deles, são elaboradas novas estratégias de ação. Semestralmente todo o trabalho realizado é apresentado ao CRAS, que além das questões de ordem técnica do projeto, avalia a aplicação dos recursos e os resultados alcançados. Após essas reuniões o CRAS define sobre a continuidade do projeto para o semestre seguinte, o que acontece desde agosto de 2010. Diante do exposto, retoma-se o problema estabelecido para esta pesquisa, que é a análise da eficácia do “Projeto Crescer” o qual busca ampliar as possibilidades de desenvolvimento psicopedagógico dos alunos das escolas municipais. Para avaliar essa questão e estabelecer o objetivo geral desta pesquisa que aborda exatamente a análise da eficácia deste projeto, foi fundamental definir o conceito de educação de qualidade e entender os pressupostos conceituais básicos das ONG´s e das OTS. A partir daí, estabelecer os critérios de gestão social e a diferença desta em relação às gestões estatal e privada norteou o entendimento dos princípios de gestão das ONGs e como esta gestão interfere no resultado dos projetos executados. Por sua vez, a análise dos princípios da gestão das ONGs 56 favoreceu o estabelecimento de parâmetros para que os objetivos específicos fossem obtidos, ou seja, a descrição dos métodos e procedimentos utilizados com os alunos atendidos pelo “Projeto Crescer” e a identificação das mudanças ocorridas na aprendizagem, no comportamento social e emocional destes alunos, além de buscar-se referências teóricas que possibilitassem a descrição desses parâmetros de análise dos projetos em educação. Para isso, propôs-se um procedimento metodológico que será apresentado na subseção seguinte. 57 3 O CAMINHO METODOLÓGICO A abordagem da pesquisa fundamentou-se na análise do projeto social denominado “Projeto Crescer”, apresentado no capítulo precedente, e teve como objetivo principal a análise sobre a eficácia desse projeto a um número significativo de alunos em relação aos aspectos cognitivos e emocionais. Além dos dados obtidos foram investigadas as possíveis razões de algumas das constatações presentes na análise feitas a partir dos testes aplicados, entrevistas e notas das disciplinas de português e matemática. Dessa forma, o estudo foi orientado pela pesquisa qualitativa, mas os dados foram agrupados estatisticamente de acordo com critérios da pesquisa quantitativa, tendo em vista que o uso das metodologias quantiqualitativas encontram justificativas e benefícios dentre os quais destacamse: Possibilidade de congregar controle dos vieses (pelos métodos quantitativos) com compreensão da perspectiva dos agentes envolvidos no fenômeno (pelos métodos qualitativos); possibilidade de congregar identificação de variáveis especificas (pelos métodos quantitativos) com uma visão global do fenômeno (pelos métodos qualitativos) (DUFFY, 1987 citado por NEVES, 1996, p. 2 ). Ainda sobre os métodos quantiqualitativos: Por possuírem vantagens e limitações diferentes, os métodos quantitativos e qualitativos constituem alternativas complementares, não podendo ser considerados mutuamente excludentes. Atualmente, a grande maioria dos avaliadores concorda que o debate qualitativo x quantitativo está superado, uma vez que se chegou à conclusão de que não existe um único método que sirva sempre para todos os casos (CHIANCA; MARINO; SCHIESARI, 2001, p. 51). Quanto ao nível da pesquisa realizada, esta pode ser classificada como uma pesquisa descritiva, baseando-se nos objetivos gerais de descrever os resultados da ação do “Projeto Crescer”. A partir do momento em que se descrevem características de determinada população ou fenômeno através de técnicas padronizadas de coleta de dados, temos aí os princípios de uma pesquisa descritiva (Gil, 2002). Como preparação do trabalho foi realizada uma pesquisa bibliográfica que teve como objetivo fundamentar os conceitos mais importantes relacionados aos 58 problemas já expostos nos primeiros capítulos e oferecer dados sobre situações à presente investigação (GIL, 2002). A proposta central desta pesquisa, conforme exposto anteriormente, relacionou-se à análise de um projeto de intervenção em duas escolas públicas municipais de Vespasiano/M.G: Escola Municipal José Paulo de Barros e Escola Municipal Maria de Paula Santos. Os dados obtidos foram coletados junto a dois grupos de alunos(as) da E. M. Maria de Paula Santos: um grupo do 4º ano e outro grupo do 5º ano, ambos do ensino fundamental, totalizando 34 alunos, entre 9 e 11 anos. Foram investigados os pareceres dos professores e psicólogos além dos testes aplicados nos alunos e as notas de português e matemática das duas primeiras etapas de 2012. Foram estabelecidos dois grupos para essa investigação: alunos participantes do “Projeto Crescer” e freqüentadores das atividades do projeto e, outro grupo, não participante do projeto. Participaram da pesquisa crianças do 4º e 5º anos do ensino fundamental por já estarem, supostamente, alfabetizadas e, também, pelo fato de o projeto ter definido que estas séries seriam prioritárias para a realização das atividades. Logo, foram analisadas crianças que há mais tempo participam das oficinas. Para a composição da amostra foram escolhidas 17 crianças, já que esse é o número total de crianças do 4º e 5º anos que participam do Projeto Crescer na Escola Municipal Maria de Paula Santos, e 17 crianças não participantes do projeto. As crianças não participantes foram escolhidas em igual número e pertencentes às mesmas séries e turmas das crianças participantes, além de terem a mesma idade média. Seguindo estes critérios, houve uma escolha aleatória. Também fizeram parte da amostra para delineamento dos dados obtidos por entrevistas: uma professora do 4º ano, uma professora da turma do 5º ano, ambas professoras de todas as crianças do grupo experimental e grupo controle, além das duas psicólogas coordenadoras do “Projeto Crescer” que atuam na E. M. Maria de Paula Santos. A coleta de dados foi desenvolvida por meio dos seguintes instrumentos: 1) Levantamento dos documentos da escola para coletar notas dos alunos durante as duas primeiras etapas letivas de 2012; 2) Entrevistas com as professoras do 4º e 5º anos antes da entrada das crianças no projeto e após quatro meses de participação destas no projeto; 59 3) Entrevistas com as psicólogas do projeto no mesmo período de tempo em que as professoras foram entrevistadas; 4) Realização de testes psicológicos antes do início das atividades do projeto e após quatro meses da participação das crianças no mesmo. Os testes realizados foram: as Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR), o Teste de Desempenho Escolar (TDE) e a Escala de estresse infantil (ESI). No delineamento dos dados fornecidos por pessoas foi analisado um procedimento de “quase-experimento” (Gil, 2002) realizado com dois grupos: crianças participantes do “Projeto Crescer” e crianças não participantes do projeto. Para esses dois grupos foram aplicados os três testes psicológicos em dois momentos, com um intervalo de quatro meses. Esses testes foram escolhidos por ajudarem a identificar o desenvolvimento cognitivo, o desenvolvimento emocional, o nível de estresse e a agressividade além do grau de socialização destas crianças. É importante enfatizar que todos esses testes são considerados válidos pelo CFP Conselho Federal de Psicologia CFP (). O MPCR é um teste indicado para crianças e adolescentes de qualquer idade, sendo classificado como um teste de raciocínio lógico que avalia a capacidade cognitiva, o desenvolvimento intelectual e a capacidade de aprendizagem e deficiência mental (ALVES et al., 1999). O MPCR apresenta características de precisão e validade, e os fatores relacionados à idade, sexo, escolaridade e tipo de escola (pública ou privada) são considerados na análise final dos escores. Ressaltase, ainda, que o teste é padronizado para o Brasil. O TDE é um teste que mostra o desempenho escolar de alunos do 1º ano ao 7º ano do ensino fundamental. Esse teste pode, ainda, ser utilizado para alunos do 8º e 9º anos, mas com algumas reservas. O TDE “oferece de forma objetiva uma avaliação das capacidades fundamentais para o desempenho escolar, mais especificamente da escrita, aritmética e leitura” (STEIN, 2011, p. 1). Esse teste deve ser utilizado de maneira individual e mostra, de “forma abrangente, quais as áreas da aprendizagem escolar que estão preservadas ou prejudicadas no examinando” (STEIN, 2011, p. 2). O teste ESI foi utilizado na pesquisa com objetivo de identificar fatores específicos que mostrem o nível de estresse dos examinandos. Para tanto, o teste identifica sintomas e efeitos psicológicos e sintomas e efeitos físicos que indicam se 60 acriança está vivendo um momento de estresse. Esses sintomas foram classificados da seguinte maneira, segundo Lipp e Lucarelli (2005): Sintomas psicológicos: sensação de exaustão ou fadiga, associada a uma sensação geral de esgotamento, frustração, tensão, nervosismo, depressão, ansiedade, raiva, pânico, irritabilidade crônica, inquietação, preocupação com comida e bebida, atitudes negativas com relação ao trabalho ou escola, pesadelos e vontade de chorar; sintomas físicos: problemas gastrointestinais, dores de cabeça frequentes, flutuações de peso acentuadas, respiração ofegante, vertigem, náuseas, taquicardia, hipertensão, doenças coronarianas, olhos lacrimejantes e visão embaçada, zumbido nos ouvidos, transpiração fria, afonia, distúrbios dermatológicos e dor nas costas (LIPP; LUCARELLI, 2005, p. 13). Para a mensuração do estresse, o ESI leva em consideração aspectos ambientais, psicológicos e biológicos. O ESI pode ser aplicado em crianças de 6 a 15 anos, independentemente da série escolar que a criança/adolescente está cursando. Em relação aos documentos da escola, foram realizados levantamentos das duas primeiras etapas letivas. O objetivo foi observar as notas das crianças pesquisadas nestas etapas. Os documentos da escola utilizados foram os boletins bimestrais e os diários de classe. As professoras das escolas municipais foram entrevistadas em dois momentos: primeiramente logo após o encaminhamento dos alunos para o projeto e, posteriormente, foi realizada uma segunda entrevista quatro meses depois disso, quando os alunos já estavam participando das atividades do “Projeto Crescer”. As psicólogas das oficinas do projeto também foram entrevistadas no início das atividades dos alunos e, como as professoras da escola, quatro meses após a participação destes alunos nas respectivas oficinas. O tempo de quatro meses entre as entrevistas e testes iniciais e as entrevistas e testes finais foi determinado porque esse período coincide com o início e o fim das duas primeiras etapas de avaliação regular das escolas municipais. As entrevistas foram adotadas porque esse [...] é um procedimento utilizado na investigação social, para a coleta de dados ou para ajudar no diagnóstico ou no tratamento de um problema social. Alguns autores consideram a entrevista como o instrumento por excelência da investigação social (LAKATOS; MARCONI, 2010, p. 178). As entrevistas foram realizadas após autorização da ABRADH e da escola. Além disso, todos os participantes foram informados sobre o objetivo da pesquisa e 61 assinaram o Termo de consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Essas entrevistas foram semiestruturadas (roteiro no apêndice) e realizadas em março de 2012, as iniciais, e em agosto de 2012, as finais. Os testes foram realizados no mesmo período. As entrevistas foram realizadas com duas professoras e duas psicólogas, pois, apesar do reduzido número de entrevistas, a conversa direta e o registro obtido foram fundamentais devido à importância desses sujeitos em todo o processo. As professoras foram selecionadas por vivenciarem o cotidiano dos alunos na escola e, as psicólogas, por atuarem em todos os processos do “Projeto Crescer”, coordenando as oficinas, realizando os atendimentos e capacitando os professores das demais oficinas, além de serem as responsáveis pelo contato com a escola, famílias e comunidade. Dessa forma, através das entrevistas, obteve-se o conhecimento das razões para as professoras encaminharem as crianças para o projeto e da percepção das professoras em relação às intervenções feitas no “Projeto Crescer”. Em relação às psicólogas, as entrevistas mostraram procedimentos adotados quando do início das atividades e, quatro meses depois, a avaliação das próprias psicólogas sobre a evolução ou não das crianças nos aspectos pedagógicos e psicológicos. Sobre os dados obtidos através dos testes e dos documentos da escola e dos técnicos da ABRADH, foram organizados procedimentos quantitativos, estatísticos e comparativos. No caso das entrevistas, organizou-se um procedimento qualitativo baseado na análise de conteúdo. A análise de conteúdo adotada pode ser assim conceituada: A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1977, p. 34). Dentre as opções de análise de conteúdo, foi adotado o registro de unidades por tema e, em seguida, tais registros foram organizados por categorias, tendo como referência os itens do roteiro de entrevista (BARDIN, 1977). 62 4 O PROJETO CRESCER REFERÊNCIAS EM NÚMEROS: BUSCANDO Para atingir o objetivo geral estabelecido no início desta pesquisa, ou seja, analisar a eficácia de um projeto social executado por uma organização nãogovernamental, financiado por uma empresa e em parceria com escolas públicas, foi realizado o procedimento apresentado no item anterior. Os dados obtidos nesse levantamento serão apresentados em três partes: inicialmente, os resultados dos testes (ESI, MPCR e TDE). Em seguida, os dados levantados junto a documentos escolares, ou seja, as notas dos alunos nas disciplinas de português e matemática dos dois primeiros bimestres de 2012 e, por último, a análise de conteúdo das entrevistas realizadas. A importância da aplicação dos testes é justificada pelo fato de que esses instrumentos fornecem uma referência para a análise sobre a evolução, ou não, dos alunos que participam do projeto. Esta análise passa a ser mais criteriosa por ser comparada com um grupo controle não participante do “Projeto Crescer” e que foi submetido aos mesmos testes. Os testes escolhidos avaliam resultados em áreas apontadas por todos os envolvidos com as crianças do projeto (escola, professoras, família e psicólogas) como sendo as principais “dificultadoras” no processo de ensino/aprendizagem. Essas áreas são: o nível de estresse dos alunos, o desempenho escolar e o conteúdo em matemática e português adquirido pelos alunos, além do nível de raciocínio lógico e capacidade cognitiva. Enfatiza-se que esses testes foram aplicados em dois momentos: imediatamente antes do início da participação dos alunos no “Projeto Crescer” e quatro meses depois do início das atividades do projeto, culminando com o fim do segundo bimestre escolar. Como já mencionado inicialmente foram escolhidos 17 crianças participantes do projeto e 17 não participantes do projeto para fazerem os testes. Contudo, ao final de todas as aplicações, 15 crianças do projeto e 15 não participantes foram as que, efetivamente, fizeram todos os testes. Dessa forma, foram analisados os resultados de 30 alunos para cada teste realizado. As avaliações das notas de português e matemática foram importantes, pois, essas disciplinas foram o foco do trabalho do acompanhamento pedagógico. Como o TDE avalia o desempenho nessas duas matérias, optou-se pelo levantamento das notas apenas nessas disciplinas escolares, o que foi feito a partir dos boletins e 63 diários de classe. O ESI foi aplicado para análise das reações psicológicas e perfil emocional frente a eventos que exijam adaptação das crianças. Mudanças estas que incluam alterações psicológicas e comportamentais (LIPP; LUCARELLI, 2005). O MPCR foi aplicado para a análise do nível de inteligência e capacidade cognitiva gerais (ALVES et al., 1999). Por fim, as entrevistas realizadas foram a base para o entendimento dos resultados encontrados. Inicialmente, as professoras do ensino regular mostraram o motivo para o encaminhamento de determinados alunos para o projeto. Logo, os testes ajudaram a entender se essas razões apresentadas pelas professoras foram ou não procedentes. Ao final dos quatro meses, a nova rodada de entrevistas mostrou como as professoras perceberam os alunos após esse tempo em que foram submetidos às atividades do projeto. No caso das entrevistas com psicólogas da ABRADH, os relatos da primeira entrevista mostraram a percepção dessas em relação aos alunos no que se refere aos aspectos cognitivos, emocionais, nível de violência e socialização. Quatro meses depois a entrevista foi repetida e, dessa vez, o relato centrou-se na evolução dos alunos após esse tempo de participação no projeto. As categorias analisadas foram as mesmas, ou seja, cognição, emoção, nível de violência e socialização. Sobre as entrevistas, como explicitado anteriormente, procedeu-se uma análise de conteúdo. A técnica utilizada para análise das entrevistas foi a categorial. Dessa forma, no caso das professoras, as categorias para análise foram agrupadas a partir dos seguintes temas: motivos para o encaminhamento do aluno para o projeto; dificuldades que o aluno apresenta nas áreas cognitiva e psicológica, socialização, melhoras apresentadas pelo aluno. No caso das psicólogas da ABRADH, as categorias para análise foram agrupadas nos seguintes temas: características do aluno em relação ao desenvolvimento psicológico e emocional; nível de violência e socialização; desenvolvimento cognitivo. Assim, a partir das análises apresentadas, os objetivos específicos relacionados à descrição dos métodos e procedimentos utilizados com os alunos no projeto social pesquisado e a identificação de possíveis mudanças ocorridas na aprendizagem, no comportamento social e emocional dos alunos, foram tratados de maneira a evidenciar questões que possibilitassem atingir estes objetivos. 64 4.1 Resultados ESI (Escala de Stress Infantil) O ESI é um teste que avalia o nível de stress infantil e que permite identificar sintomas e efeitos psicológicos e sintomas e efeitos físicos que indiquem que a criança esteja vivendo um momento de estresse. Para avaliação dos resultados do ESI os principais critérios quantitativos utilizados para dizer se a criança possui sinais significativos de estresse são os seguintes: . Quando aparecem círculos completamente cheios, de resultado 4, em 7 ou mais itens da escala total; . A nota igual ou maior que 22 pontos for obtida em quaisquer dos dois fatores a seguir: reações físicas e reações psicológicas; . A nota igual ou maior que 21 pontos for obtida em quaisquer dos dois fatores a seguir: reações psicológicas com componente depressivo e reações psicofisiológicas; . A nota total da escala for maior que 86 pontos. Além desses fatores, considerou-se para análise do ESI a possibilidade de aumento de escala do estresse após os quatro meses entre as aplicações do teste, independentemente dos valores da escala. Os resultados do ESI estão organizados na TAB. 3 que apresenta dados de alunos participantes do Projeto Crescer (APC) e na TAB. 4, que apresenta dados de alunos não participantes do Projeto Crescer (ANPC). Tabela 3 – Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Alunos Meses de aplicação RF (reações físicas) RP (reações psicológicas) RPCD (reações psicológicas com componente depressivo) APC1 MARÇO AGOSTO 10 7 15 10 14 6 20 16 7 4 59 39 APC2 MARÇO AGOSTO 12 2 20 21 16 12 12 7 9 5 60 42 APC3 MARÇO 2 19 10 10 7 41 AGOSTO 2 3 0 3 0 8 Fonte: Dados da pesquisa RPSF (reações psicofisiológicas) CC (círculos completos) Total 65 Tabela 3 – Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Alunos Meses de aplicação RF (reações físicas) RP (reações psicológicas) RPCD (reações psicológicas com componente depressivo) APC4 MARÇO 16 12 16 13 6 57 AGOSTO 12 9 11 11 4 43 MARÇO 14 13 5 21 6 53 AGOSTO 10 16 5 12 8 43 MARÇO 5 15 5 13 3 38 AGOSTO 1 5 7 11 2 24 MARÇO 4 9 13 14 6 40 AGOSTO 8 5 6 10 1 29 MARÇO 2 14 2 19 4 37 AGOSTO 7 6 6 12 3 31 MARÇO 2 14 2 19 4 37 AGOSTO 7 6 6 12 3 31 MARÇO 18 25 10 22 12 75 AGOSTO 6 3 4 6 2 19 MARÇO 10 12 11 13 6 46 AGOSTO 3 6 10 12 4 31 MARÇO 10 10 11 15 5 46 AGOSTO 10 20 12 16 12 58 MARÇO 7 4 9 16 4 36 AGOSTO 3 7 5 13 1 31 MARÇO 2 8 6 14 3 30 AGOSTO 2 9 9 11 1 31 APC5 APC6 APC7 APC8 APC9 APC10 APC11 APC12 APC13 APC14 Fonte: Dados da pesquisa RPSF (reações psicofisiológicas) CC (círculos completos) Total 66 Tabela 3 – Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Conclusão) Alunos Meses de aplicação RF (reações físicas) RP (reações psicológicas) RPCD (reações psicológicas com componente depressivo) APC15 MARÇO 16 19 18 15 7 68 AGOSTO 8 17 13 15 6 53 RPSF (reações psicofisiológicas) CC (círculos completo s) Total Fonte: Dados da pesquisa Em relação aos alunos não participantes do Projeto Crescer (ANPC), os resultados são exibidos na tabela 4. Tabela 4 – Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes não participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Alunos Meses de aplicação RF (reações físicas) RP (reações psicológicas) RPCD (reações psicológicas com componente depressivo) ANPC1 MARÇO AGOSTO 4 3 14 4 6 7 8 8 6 2 32 22 ANPC2 MARÇO AGOSTO 0 4 0 5 0 6 4 13 1 3 4 28 ANPC3 MARÇO AGOSTO 5 8 7 10 8 4 13 15 3 2 33 37 ANPC4 MARÇO AGOSTO 10 14 8 1 11 8 8 13 2 4 37 36 ANPC5 MARÇO AGOSTO 5 4 8 16 11 6 13 9 6 1 37 35 ANPC6 MARÇO AGOSTO 4 10 4 4 0 5 7 10 0 1 15 29 ANPC7 MARÇO AGOSTO 8 10 12 8 7 3 9 18 2 5 36 39 ANPC8 MARÇO AGOSTO 6 6 5 3 11 4 15 8 4 3 37 21 Fonte: Dados da pesquisa RPSF (reações psicofisiológicas) CC (círculos completos) Total 67 Tabela 4 – Distribuição dos resultados do teste ESI em estudantes não participantes do “Projeto Crescer” (Conclusão) RPCD Alunos Meses de aplicação RF RP (reações (reações físicas) psicológicas) (reações psicológicas com componente RPSF CC (reações (círculos psicofisiológicas) completos) Total depressivo) ANPC7 ANPC8 ANPC9 ANPC10 ANPC11 ANPC12 MARÇO 8 12 7 9 2 36 AGOSTO 10 8 3 18 5 39 MARÇO 6 5 11 15 4 37 AGOSTO 6 3 4 8 3 21 MARÇO 6 26 15 14 7 61 AGOSTO 8 26 8 14 9 56 MARÇO 7 13 12 10 2 42 AGOSTO 10 13 9 6 1 38 MARÇO 4 17 3 7 3 31 AGOSTO 13 15 6 5 5 39 MARÇO 7 2 6 8 2 23 AGOSTO 6 4 11 3 1 24 Fonte: Dados da pesquisa Os resultados gerais do ESI mostrados nas tabelas acima permitem uma análise descritiva e comparativa entre os dois grupos pesquisados, ou seja, os alunos participantes do “Projeto Crescer” e os alunos não participantes do projeto. A partir dessa comparação, pode-se, inicialmente, analisar se há uma diferença entre os dois grupos em relação ao número de alunos que apresentam, segundo o ESI, sinais de estresse. O grupo APC apresenta no mês inicial de aplicação do teste, seis alunos com sintomas de estresse e, ao final da segunda aplicação, apenas um aluno com estes sintomas. O grupo ANPC, no mês da primeira aplicação, um aluno com estes sintomas. O mesmo número repete-se ao final da segunda aplicação. Percentualmente os resultados dessa análise são os mostrados na tabela a seguir. 68 Tabela 5 – Resultados do teste ESI dos estudantes totais que apresentam sinais de estresse Grupo Meses Alunos com sinais de estresse Percentual em relação ao grupo APC MARÇO 6 40% APC AGOSTO 1 6,7% ANPC MARÇO 1 6,7% ANPC AGOSTO 1 6,7% Fonte: Dados da pesquisa Em relação a esse aspecto, pode-se deduzir uma significativa redução dos sinais de estresse no grupo participante do “Projeto Crescer”, ou seja, dos 15 alunos do grupo pesquisado, cinco crianças que apresentaram sinais de estresse na primeira aplicação não apresentaram sintomas na segunda avaliação, o que representa 33,4% do total. Sobre o grupo não participante do projeto, o número de crianças com sinais de estresse manteve-se o mesmo. Salienta-se aqui outro dado importante. Como o projeto tem por objetivo atingir crianças com os sintomas apontados pelo teste, esperava-se que, no grupo dos alunos não participantes, houvesse um menor número de crianças sem as características de estresse. Sobre o resultado relacionado à escala total do teste (última coluna das TAB. 3 e TAB. 4), independentemente do resultado inicial ou final indicar ou não estresse, pode-se identificar que, do grupo APC, dois alunos aumentaram o escore total (13,3%) enquanto 13 diminuíram este escore (86,7%). No grupo ANPC, seis alunos aumentaram o escore total (40%) enquanto nove alunos (60%) diminuíram este escore. O gráfico abaixo mostra esta relação percentual dos dois grupos de alunos, sendo que, considera-se 100% o número total de alunos de cada série, ou seja, quinze alunos. Gráfico 1 – distribuição percentual dos resultados de aumento ou diminuição de escore total no ESI nos grupos APC e ANPC Fonte: Dados da pesquisa 69 Percebe-se que o grupo APC apresenta um resultado bem expressivo no que se refere à diminuição dos escores totais identificadores de situação de estresse. Apesar de o grupo ANPC também possuir um resultado de 60% de diminuição dos escores totais, é importante analisar qual foi a taxa média de escore total que apresentou diminuição em cada grupo. No grupo APC, essa média foi de 17,2 pontos por criança que apresentou redução e, no caso do grupo ANPC, esta média foi de 5,1 pontos. Logo, o grupo dos alunos acompanhados apresentou uma taxa de redução em pontos do escore três vezes maior que a do grupo dos alunos não acompanhados. 4.2 Resultados MPCR (Matrizes Progressivas Coloridas de Raven) Para a análise do teste MPCR considera-se uma interpretação por percentil, em que o valor atingido no teste é comparado com uma tabela de percentil que discrimina o nível de inteligência em cinco diferentes escalas: “intelectualmente superior” (grau 1) , “definidamente acima da média na capacidade intelectual” (grau 2s se for superior ou grau 2i se for inferior)), “intelectualmente médio” (grau 3s se for superior ou grau 3i se for inferior), “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” (grau 4s se for superior ou grau 4i se for inferior) e “intelectualmente deficiente” (grau 5). Para esta análise, consideramos a seguinte tabela: Grau 1 Tabela 6 – Interpretação da capacidade cognitiva por faixa de percentil do teste MPCR Interpretação Faixa de percentil “intelectualmente superior” 95 ou superior “definidamente acima da média na capacidade intelectual” 2s superior 90 a 94 2i “definidamente acima da média na capacidade intelectual” inferior 75 a 89 3s “intelectualmente médio” superior 50 a 74 3i “intelectualmente médio” inferior 26 a 49 4s “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” 11 a 25 superior 4i “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior 6 a 10 5 “intelectualmente deficiente” 5 ou inferior Fonte: Alves et al. (1999, p. 131) 70 Os resultados dos alunos acompanhados pelo “Projeto Crescer” são apresentados na TAB. 7, abaixo. Tabela 7 – Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Aluno Meses Interpretação Percentil APC1 MARÇO AGOSTO 30 25 “Intelectualmente médio” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior APC2 MARÇO AGOSTO 5 25 APC3 MARÇO AGOSTO 1 10 “intelectualmente deficiente” “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior “intelectualmente deficiente” “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior APC4 MARÇO 25 AGOSTO 50 MARÇO 10 AGOSTO 30 APC6 MARÇO AGOSTO 60 80 “intelectualmente médio” superior “definidamente acima da média na capacidade intelectual” inferior APC7 MARÇO 10 AGOSTO 50 “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “intelectualmente médio” superior APC8 MARÇO AGOSTO 40 25 “intelectualmente médio” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior APC9 MARÇO 10 AGOSTO 10 “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior MARÇO AGOSTO Fonte: Dados da pesquisa 5 5 APC5 APC10 “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior “intelectualmente médio” superior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “intelectualmente médio” inferior “intelectualmente deficiente” “intelectualmente deficiente” 71 Tabela 7 – Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Conclusão) Aluno Meses Interpretação Percentil APC11 MARÇO 5 “intelectualmente deficiente” AGOSTO 5 “intelectualmente deficiente” APC12 MARÇO AGOSTO 40 10 “intelectualmente médio” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior APC13 MARÇO AGOSTO 5 5 “intelectualmente deficiente” “intelectualmente deficiente” APC14 MARÇO AGOSTO 40 10 MARÇO AGOSTO Fonte: Dados da pesquisa 40 50 “intelectualmente médio” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “intelectualmente médio” inferior “intelectualmente médio” superior APC15 Os resultados dos alunos que fizeram os testes MPCR e não participam do “Projeto Crescer” são mostrados na tabela 8. Tabela 8 – Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes não participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Aluno Meses Interpretação Percentil ANPC1 MARÇO 70 “intelectualmente médio” superior AGOSTO 80 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” inferior ANPC2 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” inferior “intelectualmente médio” superior MARÇO 75 AGOSTO 50 MARÇO 10 AGOSTO 25 ANPC4 MARÇO AGOSTO 60 50 “intelectualmente médio” superior “intelectualmente médio” superior ANPC5 MARÇO 10 AGOSTO 25 “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior ANPC3 Fonte: Dados da pesquisa “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior 72 Tabela 8 – Distribuição dos resultados do teste MPCR em estudantes não participantes do “Projeto Crescer” (Conclusão) Aluno Meses Percentil Interpretação ANPC6 MARÇO 90 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” superior AGOSTO 90 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” superior ANPC7 MARÇO AGOSTO 50 40 “intelectualmente médio” superior “intelectualmente médio” inferior ANPC8 MARÇO 75 AGOSTO 50 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” inferior “intelectualmente médio” superior ANPC9 MARÇO AGOSTO 40 60 “intelectualmente médio” inferior “intelectualmente médio” superior ANPC10 MARÇO AGOSTO 50 20 “intelectualmente médio” superior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” superior ANPC11 MARÇO 90 AGOSTO 90 “definidamente acima da média na capacidade intelectual” superior “definidamente acima da média na capacidade intelectual” superior MARÇO 10 AGOSTO 10 ANPC13 MARÇO AGOSTO 95 75 ANPC14 MARÇO 70 “intelectualmente superior” “definidamente acima da média na capacidade intelectual” superior “intelectualmente médio” superior AGOSTO 80 “definidamente acima da média na capacidade ANPC12 “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual” inferior intelectual” superior ANPC15 MARÇO 50 “intelectualmente médio” superior AGOSTO 60 “intelectualmente médio” superior Fonte: Dados da pesquisa Fazendo-se um agrupamento dentro dos dois grupos, APC e ANPC, obtém-se os seguintes resultados mostrados na TAB. 9. Para análise e interpretação considera-se o grau relacionado à classificação por escores apresentado na TAB 6. 73 Tabela 9 – Distribuição dos resultados percentuais do teste MPCR nos grupos APC e ANPC Grau para % em APC Março % em APC % em ANPC % em ANPC interpretação Agosto Março Agosto 1 0 0 6,7 0 2s 0 0 20 33,3 2i 0 6,7 13,3 13,3 3s 6,7 13,3 33,3 26,7 3i 26,7 6,7 6,7 6,7 4s 6,7 26,7 0 13,3 4i 26,7 26,7 20 6,7 5 33,3 20 0 0 Fonte: Dados da pesquisa Na TAB. 9 acima, o grau para interpretação refere-se ao tipo de capacidade intelectual, conforme apresentado na TAB. 6. Na distribuição percentual dos resultados do MPCR pode-se observar que, em relação ao grupo APC, houve uma diminuição do grau 5 (intelectualmente deficiente) e um aumento de grau máximo da interpretação comparando-se os dois momentos de aplicação do teste. Enquanto na primeira aplicação o valor máximo de grau observado foi o 3s (Intelectualmente médio – superior), na segunda aplicação este grau subiu para 2i (definidamente acima da média na capacidade intelectual – inferior). Comparando-se os resultados, observa-se que, no grupo ANPC, aconteceu o contrário em relação ao grau máximo de capacidade intelectual observado no teste. Na segunda aplicação o grau máximo observado foi o 2s (definitivamente acima da média na capacidade intelectual – superior) e, na primeira aplicação, o grau máximo observado foi o 1 (intelectualmente superior). Outro fator importante é o que diz respeito ao grau dos alunos em números totais que estão nos últimos níveis de interpretação, ou seja, considerados como “definidamente abaixo da média na capacidade intelectual – inferior” ou “intelectualmente deficientes”. O teste avalia a capacidade cognitiva relacionada à capacidade do indivíduo em extrair um significado de uma situação confusa, à capacidade de desenvolvimento de novas compreensões e à capacidade de estabelecer conexões para lidar com problemas. Logo, ao se dizer que um aluno está em um determinado grau de interpretação, significa que as capacidades especificadas acima podem evoluir, passando para um grau acima, não apresentar evolução ou podem, ainda, involuir passando para um grau abaixo. No grupo APC, considerando-se os dois níveis de interpretação mais abaixo na escala (“definidamente abaixo da média na capacidade intelectual – inferior” ou 74 “intelectualmente deficientes”), observa-se que 60% dos alunos estavam aí alocados quando da primeira aplicação do teste. Esse número, na segunda aplicação, foi reduzido para 46,7 %. No grupo ANPC a primeira aplicação mostra que 20% dos alunos estavam neste nível de interpretação e, na segunda aplicação, esse número caiu para 6,7%. Sobre esses dados note-se que o grupo APC mostra representativo número de alunos pertencentes a esse nível de interpretação (“definidamente abaixo da média na capacidade intelectual – inferior” ou “intelectualmente deficientes”) na primeira aplicação do MPCR (60%), o que vai ao encontro à proposta do “Projeto Crescer” de atender alunos que apresentem dificuldades cognitivas e de baixo desempenho escolar. No grupo ANPC este número já é consideravelmente menor, 20%. Logo, mesmo havendo diminuição nos dois grupos de análise, essa diminuição no grupo APC atingiu alunos considerados “intelectualmente deficientes”, que sequer aparecem em ANPC. Analisando-se a melhoria de grau apresentada em cada grupo, pode-se deduzir que, em APC 46,7% apresentaram melhoria de nível, enquanto que, em ANPC 40% apresentaram melhoria de nível. Em APC 26,7% diminuíram o nível de interpretação e em ANPC 33,3% diminuíram este nível de interpretação. Nos dois grupos 26,7% dos alunos permaneceram no mesmo nível de interpretação. De uma forma geral, os dados do grupo APC comparados ao do grupo ANPC, relacionados à melhoria de grau, foram melhores. Mas, mesmo sendo melhores, as atividades do “Projeto Crescer” para o acompanhamento dos alunos com baixo desenvolvimento cognitivo e baixo rendimento escolar, precisam ser adaptados para cada grau que os alunos apresentam. Ter nas mesmas oficinas alunos interpretados como “intelectualmente deficientes” e também alunos interpretados como “intelectualmente médios – superior” pode interferir nestes dois grupos. Ou contribuindo para um grupo permanecer estagnado por falta de atividades mais estimulantes ou por dificuldade na resolução dessas, de acordo com o grupo. Também torna-se pertinente buscar respostas para o motivo, nos dois grupos, de que alguns alunos apresentaram diminuição no grau de interpretação. Fatores inerentes à aplicação do teste podem interferir nessas respostas. Mas, além disso, pode-se levantar como hipótese que as atividades escolares e do projeto não contribuíram para este desenvolvimento cognitivo. Outro fator seria que esses 75 resultados não apareceram devido ao tempo curto de aplicação dos testes (4 meses). 4.3 Resultados do TDE Para a análise do TDE é apresentado uma tabela de classificação dos escores brutos por série escolar. Os escores para os testes de escrita, aritmética e leitura são apresentados separadamente para melhor observação do desenvolvimento do aluno. Dessa forma, o teste é comparado com uma tabela que discrimina o escore atingido em três diferentes escalas: “superior”, “médio” e “inferior”. Considerem-se as seguintes tabelas mostradas abaixo, sendo a TAB. 10, para o 4º ano, e a TAB. 11, para alunos do 5º ano. Tabela 10 – Distribuição dos resultados do teste TDE para estudantes do 4º ano. Escore Bruto Escrita Aritmética Leitura Total 30 ou > 24 a 29 23 ou < 18 ou > 15 a 17 14 ou < 69 ou > 66 a 68 65 ou < 113 ou > 102 a 112 101 ou < Classificação Superior Médio Inferior Fonte: Dados da pesquisa Tabela 11 – Distribuição dos resultados do teste TDE para estudantes do 5º ano Escore Bruto Escrita Aritmética Leitura Total 32 ou > 27 a 31 26 ou < 24 ou > 19 a 23 18 ou < 69 ou > 66 a 68 65 ou < 122 ou > 112 a 121 111 ou < Classificação Superior Médio Inferior Fonte: Dados da pesquisa Os resultados das aplicações do TDE para os grupos APC e ANPC encontram-se nas TAB. 12 e TAB. 13. Os alunos destacados com asterisco ( * ) são do 5º ano. 76 Tabela 12 – Distribuição dos resultados do teste TDE em estudantes participantes do “Projeto Crescer” Resultado Resultado Resultado Escore Bruto Aluno Meses Escrita Aritmética Leitura Total APC1 MARÇO 6 3 46 55 AGOSTO 7 5 55 67 APC2 MARÇO AGOSTO 4 2 4 5 3 0 11 7 APC3 MARÇO AGOSTO 5 5 5 5 23 18 33 28 APC4 MARÇO AGOSTO 6 1 8 5 21 19 35 25 APC5 MARÇO AGOSTO 12 15 3 3 39 63 54 81 APC6 MARÇO AGOSTO 10 21 6 9 53 59 69 89 APC7* MARÇO AGOSTO 9 12 10 6 50 43 69 61 APC8* MARÇO AGOSTO 29 32 16 19 67 66 112 117 APC9* MARÇO AGOSTO 29 29 17 16 60 67 106 112 APC10* MARÇO AGOSTO 17 20 12 20 63 59 92 99 APC11* MARÇO AGOSTO 22 28 17 13 64 66 103 107 APC12* MARÇO AGOSTO MARÇO AGOSTO 15 17 21 24 11 19 8 11 60 57 55 63 86 93 84 98 MARÇO AGOSTO 27 27 13 11 61 64 101 102 15 19 14 17 47 45 76 81 APC13* APC14* APC15* MARÇO AGOSTO Fonte: Dados da pesquisa A seguir a tabela com resultados dos alunos não participantes do “Projeto Crescer” é apresentada. 77 Tabela 13 – Distribuição dos resultados do teste TDE em estudantes não participantes do “Projeto Crescer” Resultado Resultado Resultado Escore Bruto Aluno Meses Escrita Aritmética Leitura Total ANPC1 MARÇO AGOSTO 23 20 16 12 46 60 85 92 ANPC2 MARÇO AGOSTO 15 11 12 12 53 54 80 77 ANPC3 MARÇO AGOSTO 9 9 12 13 40 47 61 69 ANPC4 MARÇO AGOSTO 20 1 12 15 63 16 95 32 ANPC5 MARÇO AGOSTO 8 2 8 8 47 20 63 30 ANPC6 MARÇO AGOSTO 20 17 5 5 57 44 82 66 ANPC7* MARÇO AGOSTO 5 13 12 12 45 54 62 79 ANPC8* MARÇO AGOSTO 26 24 16 17 66 64 108 105 ANPC9* MARÇO AGOSTO 31 28 21 17 64 59 116 104 ANPC10* MARÇO AGOSTO 21 19 13 14 49 47 83 80 ANPC11* MARÇO AGOSTO 29 29 18 13 57 57 104 99 ANPC12* MARÇO AGOSTO 33 32 15 12 61 59 109 103 ANPC13* MARÇO AGOSTO 12 23 16 15 43 65 71 103 ANPC14* MARÇO AGOSTO 10 17 17 5 43 44 70 66 15 11 10 9 61 60 86 80 ANPC15* MARÇO AGOSTO Fonte: Dados da pesquisa 78 Os dados para análise do TED apresentam resultados vinculados a procedimentos específicos das disciplinas de português e matemática, sendo eles: habilidades em escrita, leitura e operações básicas de matemática. Esses resultados, em relação aos níveis de evolução dos alunos, apresentaram-se da seguinte maneira no grupo APC: os alunos do 4º ano iniciaram-se no nível inferior em relação a todas as categorias (escrita, leitura, aritmética e escore total) e, após a segunda aplicação do TDE, continuaram no nível inferior. Os alunos do 5º ano, em relação à categoria escrita, terminaram a segunda aplicação com a seguinte distribuição: 11,1% no nível superior; 44,4% no nível médio e 44,4% no nível inferior. Importante salientar que, do total, 22,2% dos alunos evoluíram em termos de mudança de nível já que 11,1% mudaram do nível médio para o superior e, no mesmo percentual, do nível inferior para o nível médio. Sobre a categoria aritmética, 33,3% dos estudantes, após a segunda aplicação do TDE, estavam no nível médio enquanto que 66,7% estavam no nível inferior. Desse total, 33,3% mudaram, entre a primeira e segunda aplicações, do nível inferior para o nível médio. Os mesmos dados repetiram-se na categoria leitura, inclusive em relação à mudança do nível inferior para o nível médio. Sobre os escores totais, 77,8% permaneceram no nível inferior e 22,2% no nível médio. Dentre os que subiram para o nível médio, 11,1% migraram do nível inferior e os outros 11,1% permaneceram nesse nível após a segunda aplicação do TDE. Para o grupo APC, o GRÁF. 2 mostra a distribuição dos alunos após a segunda aplicação do teste para cada nível de análise. Gráfico 2 – Distribuição percentual dos resultados do grupo APC após segunda aplicação do TDE em relação aos níveis por categoria do teste Fonte: Dados da pesquisa 79 No grupo ANPC, os alunos do 4º ano na categoria escrita iniciaram no nível inferior e, após a segunda aplicação, aí permaneceram. Na categoria aritmética houve em 16,6% uma diminuição do nível, de médio para inferior. Os outros 83,4% iniciaram e permaneceram no nível inferior. No nível leitura houve um aumento de nível, do inferior para o médio, em 16,6% dos estudantes. Os outros 83,4% permaneceram no nível inferior. No escore total, para os alunos do 4º ano, todos iniciaram e terminaram as aplicações no nível inferior. Os alunos do 5º ano do grupo ANPC, em relação à categoria escrita, iniciaram e permaneceram no mesmo nível, não havendo movimentação para níveis abaixo ou acima. Sendo assim, 11,1% permaneceram no nível superior, 22,2% no nível médio e 66,7% no nível inferior. Na categoria aritmética, todos terminaram a segunda aplicação no nível inferior, mas, 11,1% iniciaram no nível médio. Os mesmos resultados foram observados após a segunda aplicação nas categorias leitura e escore total, inclusive no que refere-se à mudança de nível médio para inferior (11,1% dos casos). O gráfico 3 mostra esta distribuição após a segunda aplicação. Gráfico 3 – Distribuição percentual dos resultados do grupo ANPC após segunda aplicação do TDE em relação aos níveis por categoria do teste Fonte: Dados da pesquisa Comparando-se os dois gráficos nota-se a grande predominância, independentemente da categoria e do grupo (APC ou ANPC), de alunos no nível inferior. Logo, constata-se que apesar de os alunos estarem frequentando 4º e 5º anos do ensino fundamental, não apresentam domínio de habilidades básicas em leitura, escrita e aritmética, segundo o TDE. Outro fator importante pode ser 80 observado em relação à mudança de nível entre os grupos APC e ANPC. Enquanto que no grupo APC, comparando-se todas as categorias, 60% dos estudantes mudaram para um nível imediatamente acima, apenas 6,7% dos estudantes do grupo ANPC passaram para um nível acima após a segunda aplicação do TDE. No entanto, analisando-se a diminuição de nível em todas as categorias, enquanto que no grupo APC não ocorreu esse movimento em nenhum instante, no grupo ANPC 26,7% dos estudantes passaram do nível médio para o nível inferior. Como o acompanhamento psicopedagógico do “Projeto Crescer” estabelece práticas para que os estudantes façam atividades de reforço escolar relacionadas à recuperação dos conteúdos dos anos anteriores, pode-se considerar esse fator como uma hipótese para explicar a diminuição de nível dos alunos que não participam do projeto. Apesar de observar-se uma melhora em alguns alunos do grupo APC, os resultados ainda não são significativos por apresentarem, no total, 86,7% dos estudantes no nível inferior. Levando-se em conta que são habilidades, supostamente, de que todos já deveriam ter domínio, é um resultado muito aquém do necessário. Entretanto, como mostrado antes, sabendo-se das características desses alunos, em relação ao grau cognitivo e de estresse, aliando-se a isso o tempo curto do projeto, alguns resultados podem ser relativizados. Como última análise do TDE é importante mostrar como os dados apresentam-se em relação ao aumento ou diminuição em cada categoria, independentemente do nível em que estavam na primeira aplicação ou passaram a estar após a segunda aplicação. Em todos as categorias e nos dois grupos, APC e ANPC, houve crescimento comparando-se os escores iniciais e finais. Os resultados são os seguintes, mostrados na TAB. 14. Tabela 14 – Percentual do número de estudantes que apresentaram crescimento nos escores de cada categoria Categorias Escrita Aritmética Leitura Escore total Grupos APC 73,3% 53,3% 46,7% 73,3% ANPC 20% 20% 40% 26,7% Fonte: Dados da pesquisa 81 Em todas as categorias há um aumento maior no grupo APC. Em algumas categorias esse aumento é significativo, como na escrita e escore total (mais de 70%). Estes resultados permitem estabelecer uma relação entre as atividades desenvolvidas pelo “Projeto Crescer” no intuito de melhorar o rendimento escolar em português e matemática e os resultados apresentados pelos estudantes participantes do projeto, já que houve um aumento desse rendimento muito superior neste grupo comparando-se com o grupo ANPC. A média simples desse aumento no grupo APC foi de 61,65% e no grupo ANPC foi de 26,68%. 4.4 Notas dos alunos nas duas primeiras etapas letivas de 2012 Para a análise das notas dos alunos em português e matemática nas duas primeiras de 2012, é apresentada uma tabela dessas notas dos alunos dos grupos APC e ANPC. O valor total de cada etapa é de 25 pontos, sendo que a média para aprovação na etapa é de 60%, ou seja, 15 pontos. Os resultados estão nas TAB. 15 e TAB. 16, abaixo. Tabela 15 – Distribuição dos resultados em Português e Matemática nos dois primeiros bimestres em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Continua) Aluno Etapas Resultado Português Resultado Matemática APC1 1ª 2ª 6 5 5 2 APC2 1ª 2ª 7 4 6 6 APC3 1ª 2ª 3 3 8 2 APC4 1ª 2ª 3 5 7 2 APC5 1ª 2ª 1ª 2ª 5 11 12 15 6 3 9 14 1ª 2ª 20 17 22 15 APC6 APC7 Fonte: Dados da pesquisa 82 Tabela 15 – Distribuição dos resultados em Português e Matemática nos dois primeiros bimestres em estudantes participantes do “Projeto Crescer” (Conclusão) Aluno Etapas Resultado Português Resultado Matemática APC8 1ª 15 9 2ª 11 16 1ª 18 19 2ª 19 22 1ª 9 9 2ª 10 7 1ª 10 10 2ª 15 15 1ª 16 14 2ª 19 18 1ª 11 5 2ª 15 15 1ª 5 13 2ª 15 19 1ª 11 9 2ª 15 15 APC9 APC10 APC11 APC12 APC13 APC14 APC15 Fonte: Dados da pesquisa Sobre os resultados dos alunos participantes do “Projeto Crescer”, observa-se que, em português, 26,7% dos alunos apresentavam notas dentro da média na primeira etapa. Ao final da segunda etapa, esse percentual subiu para 53,3%. Desse total, 33,3% não apresentavam média na primeira etapa e conseguiram, na segunda etapa, um rendimento dentro do mínimo de 15 pontos. Em matemática, apenas 13,3% apresentavam notas na média ao final da primeira etapa. Já na segunda etapa, esse número subiu significativamente, indo para 53,3% do total de alunos acompanhados pelo projeto com média em matemática. Desse total, 40% não obtiveram média na primeira etapa, mas, conseguiram a média na segunda etapa. 83 A TAB. 16 mostra os resultados do grupo de alunos não acompanhados pelo “Projeto Crescer”. Tabela 16 – Distribuição dos resultados em Português e Matemática nos dois primeiros bimestres em estudantes não participantes do “Projeto Crescer”. ALUNO ETAPAS RESULTADO: PORTUGUÊS RESULTADO:MATEMÁTICA ANPC1 1ª 2ª 15 17 17 16 ANPC2 1ª 2ª 17 15 24 22 ANPC3 1ª 2ª 14 16 16 13 ANPC4 1ª 2ª 10 6 9 8 ANPC5 1ª 2ª 7 4 5 4 ANPC6 1ª 2ª 16 17 22 18 ANPC7 1ª 2ª 16 18 17 10 ANPC8 1ª 2ª 18 17 18 21 ANPC9 1ª 2ª 9 15 9 14 ANPC10 1ª 2ª 17 15 18 16 ANPC11 1ª 2ª 1ª 2ª 14 18 10 14 13 20 14 10 ANPC13 1ª 2ª 20 16 19 20 ANPC14 1ª 2ª 14 18 12 18 ANPC15 1ª 2ª 16 15 10 16 ANPC12 Fonte: Dados da pesquisa Os resultados do grupo ANPC mostram que, em português, 53,3% dos alunos apresentavam notas dentro da média na primeira etapa. Ao final da segunda etapa, 84 esse percentual subiu para 66,7%. Desse total, 26,7% não apresentavam média na primeira etapa e conseguiram, na segunda etapa, um rendimento dentro do mínimo de 15 pontos. Em matemática, na primeira etapa, 53,3% apresentavam notas dentro da média. Ao final da segunda etapa esse número permaneceu em 53,3%. Do número total de alunos dentro do grupo ANPC, 26,7% não tinham notas dentro da média na primeira etapa e conseguiram média na segunda etapa. Na comparação entre os dois grupos, uma análise importante a ser feita, relaciona-se ao número de alunos com média ao final de cada uma das etapas. Agrupando-se os resultados por disciplina e por etapas, identifica-se que, tanto em português quanto em matemática, o número total de alunos com média na primeira etapa é muito maior no grupo ANPC do que no grupo APC. Uma das explicações para isso é exatamente o critério de seleção para a participação destes alunos no “Projeto Crescer”. Definiu-se que o baixo rendimento escolar seria um dos critérios para que os alunos iniciassem a participação no projeto. Por causa disso, esperavase que os dados da primeira etapa apresentassem um resultado no qual os alunos não participantes obtivessem notas melhores que o grupo de alunos participantes, como mostrado no GRÁF. 4. Gráfico 4 – Distribuição percentual dos alunos APC e ANPC com média em português e matemática na primeira etapa Fonte: Dados da pesquisa A partir da análise do GRÁF. 4, confirma-se o que foi mencionado anteriormente, ou seja, os resultados na primeira etapa dos alunos não participantes 85 do projeto são melhores, em relação à média, que os resultados dos alunos participantes do projeto. Salienta-se que ao final da primeira etapa, os alunos estavam no projeto há, apenas, 20 dias. Dificilmente poder-se-ia esperar algum impacto do projeto nas atividades escolares destes alunos. Em relação às notas dos dois grupos após o término da segunda etapa, os resultados são mostrados no GRÁF. 5. Gráfico 5 – Distribuição percentual dos alunos APC e ANPC com média em português e matemática na segunda etapa Fonte: Dados da pesquisa Ao final da segunda etapa, os alunos APC já tinham mais de três meses de participação no “Projeto Crescer”. Apesar dos resultados do grupo ANPC ainda serem maiores que o do grupo APC, essa diferença diminuiu significativamente. Em português, comparando-se as duas etapas, a diferença entre os dois grupos era, na primeira etapa, de 26,7% e, ao final da segunda etapa, de 13,3%. Em matemática essa diferença é ainda maior. Na primeira etapa foi de 40% e, na segunda etapa, de 6,7%. Para justificar a melhoria de notas dos alunos do grupo APC na segunda etapa, é importante avaliar o número total de alunos que não tinham média na primeira etapa e passaram a ter média na segunda etapa. Em português esse percentual foi de 33,3% e, em matemática, de 40%. Apenas 6,7% dos alunos do grupo APC tinham média na primeira etapa e não conseguiram média em português. 86 Esse fato não ocorreu em matemática, ou seja, todos os alunos com média na primeira etapa mantiveram-se com média na segunda etapa. No grupo ANPC, 26,7% dos alunos não tinham média na primeira etapa e passaram a ter na segunda etapa, em português. Nenhum aluno com média na primeira etapa perdeu média na segunda etapa. Em matemática, 20% dos alunos não tinham média na primeira etapa e passaram a ter na segunda etapa. No entanto, desse número, 13,3% perderam média nessa disciplina entre a primeira e segunda etapas. Sendo assim, um dos fatores que explica a melhoria de rendimento do grupo APC é o fato de que um maior número de alunos, descontando-se os que perderam média entre as duas etapas, conseguiu média na segunda etapa mesmo não tendo média na anterior. No grupo ANPC o número total de alunos sem média nas duas disciplinas na primeira etapa e que conseguiu média na segunda etapa foi menor se comparado com o grupo APC. Logo, o acompanhamento psicopedagógico, os atendimentos psicológicos bem como as outras atividades do projeto parecem ter ajudado na melhoria do rendimento escolar dos alunos participantes do projeto. Mesmo com pouco tempo, este rendimento melhorou em um grupo de alunos que apresentam dificuldades emocionais, como mostrado nos resultados do ESI, e dificuldades cognitivas, como visto nos resultados do teste MPCR. 87 5 POR DETRÁS DOS NÚMEROS: AS CRIANÇAS DO PROJETO CRESCER As entrevistas foram realizadas com as professoras regulares das crianças participantes do “Projeto Crescer”. Uma professora do 5º ano e uma do 4º ano. Também realizou-se entrevistas com as duas psicólogas do projeto. As entrevistas foram gravadas e ao mesmo tempo registradas em papel para melhor alcance na análise dessas. Os modelos utilizados foram dois, um para as professoras e um para as psicólogas, aplicados em dois momentos distintos: imediatamente antes da entrada dos alunos no projeto e quatro meses após essa entrada. Mas, nestes modelos diferentes, alguns dados comuns foram perguntados para uma tentativa de aproximação das respostas dadas. Para o relato das entrevistas utilizou-se os seguintes códigos: P1 (professora do 4º ano), P2 (professora do 5º ano), PP1 (psicóloga da ABRADH) e PP2 (segunda psicóloga da ABRADH). A análise de conteúdo foi utilizada visando compreender melhor a percepção que professoras e psicólogas têm sobre as crianças participantes do projeto. Esta percepção está relacionada a dois momentos específicos, como citados anteriormente: imediatamente antes da entrada das crianças no projeto e quatro meses após a entrada das crianças no projeto. Essas entrevistas foram realizadas de acordo com a análise de conteúdo, organizadas em temas e categorias. De acordo com Bardin (1977, p. 103), a unidade de registro por categoria “é a unidade designificação a codificar e corresponde ao segmento de conteúdo a considerar como unidade de base, visando a categorização e a contagem frequencial”. Sendo assim, a partir das entrevistas, organizaram-se temas específicos que geraram categorias para caracterização desses temas. Esta organização teve como objetivo, em relação às professoras, entender os motivos para encaminhamento dos alunos para o “Projeto Crescer” e apreender como as professoras, após quatro meses, perceberam a evolução dos alunos. Em relação às psicólogas, os objetivos principais foram identificar as principais características dos alunos, antes do início do projeto e após 4 meses de permanência no "Projeto Crescer", no que se refere à cognição, desenvolvimento emocional e socialização. No caso das professoras, os temas em que foram agrupadas as respostas são os seguintes: 88 . Motivos para encaminhamento do aluno para o “Projeto Crescer”; . Principais dificuldades cognitivas, de socialização, psicológicas e histórico de violência; . Principais melhoras apresentadas pelos alunos após a participação no “Projeto Crescer” por quatro meses. Em relação ao primeiro tema, percebe-se nas entrevistas das professoras que o motivo mais apontado refere-se à inadaptação dos alunos por questões cognitivas. Mas, também, questões psicológicas que não são muito detalhadas pelas professoras por desconhecimento do significado do que elas observam. Um exemplo desta situação no depoimento de uma professora: Ele não acompanha a turma e não realiza as atividades em tempo hábil. Tem dificuldade de leitura e escrita. Além disso, é muito triste. Parece que tem sofrimento interno, chora do nada, dificuldade de aprender. (P2) Outro exemplo desta mesma situação pode ser mostrado, desta vez, pela professora do 4º ano: Ele foi abandonado pela família. Depois foi adotado. Não realiza atividades. Não tem autonomia. Ri de tudo que a gente fala. Parece não entender as coisas. Abaixa a cabeça e brinca com imaginário, com coisas invisíveis. Os pais estão internados em hospital psiquiátrico. (P1) A partir da análise das entrevistas pode-se observar como a motivação para o encaminhamento dos alunos é, basicamente, de caráter psicopedagógico, ou seja, ora aparecendo como motivo principal, ora como “outros motivos”. As questões pedagógicas ou psicológicas acabam complementando-se para que as professoras justifiquem a escolha dos alunos para a entrada no projeto. Sendo assim, a metodologia do “Projeto Crescer”, necessariamente, teria que ser dentro desse modelo, ou seja, ter como base o acompanhamento escolar e os atendimentos psicológicos, como realmente ocorre. Sobre as principais dificuldades cognitivas, de socialização, psicológicas e histórico de violência apresentadas pelos alunos, os termos que mais aparecem nos depoimentos das professoras são: repetência, não é alfabetizado, leitura e escrita ruins, não consegue acompanhar a turma, não consegue falar, não se relaciona com os colegas. 89 De certa forma, estas dificuldades detalham os motivos pelos quais as professoras julgaram necessário o encaminhamento desses alunos para o projeto. No decorrer das entrevistas, as entrevistadas tenderam a separar as questões psicológicas justificando a razão delas não poderem interferir para contribuir com a melhora do rendimento escolar destes alunos. Como alguns desses alunos são repetentes, essa repetência pode ser justificada pelo fato de que as professoras não são psicólogas e que, para estes alunos serem aprovados, há uma necessidade do trabalho de outros profissionais para auxiliá-las em situações em que elas não conseguem resultados. Esta situação pode ser percebida no depoimento de uma delas, quando se questionou quais as dificuldades psicológicas deste aluno e como elas foram identificadas. A criança não fala nada. Não sei o som da voz dela. Tem muitas faltas e não é alfabetizada. Não consegue nem copiar. Também não se relaciona com ninguém. Não é cuidada em casa. Não sei o que fazer com ela. Vai ser reprovada com certeza. A escola precisa de psicólogos para estas crianças. Eu sou professora. Não sei como agir com casos assim. (P2) Os resultados apresentados nos testes e nas notas entre as duas etapas podem sinalizar para um trabalho integrado entre o que se realiza em sala e o que a escola pode oferecer, tanto em projetos quanto no trabalho que o pessoal de apoio a sala de aula, coordenação e orientação, realizam. Essa integração seria exatamente para oferecer algumas atividades que as professoras não conseguem organizar em sala e que elas já constataram ser de importância, como o acompanhamento psicológico, por exemplo. Como objetivo principal desta pesquisa, que é analisar o “Projeto Crescer”, é importante ressaltar que é fundamental para a eficácia do projeto estabelecer uma rede de comunicação entre os processos de planejamento, execução das atividades e a avaliação dos processos entre a escola e o projeto. O que se pode observar na escola é que as professoras não conseguem estabelecer, em sala de aula, uma metodologia que seja eficaz para um grupo tão heterogêneo de alunos. A necessidade de outros profissionais é visível, mas, como não há uma comunicação entre os procedimentos elencados anteriormente, a reprovação acaba por ser a maneira mais cômoda de resolver os problemas dos alunos “inadaptados”. Sobre o terceiro tema estabelecido para análise das entrevistas das professoras, ou seja, quais foram as principais melhoras apresentadas pelos alunos 90 participantes do projeto após quatro meses dessa participação, ambas as professoras identificaram melhoras nos alunos participantes do projeto. Em alguns alunos, todos os quesitos perguntados: cognitivos, socialização, psicológicas e envolvimento em situações de violência, foram citados como em evolução. Para outros alunos esta melhora ocorreu em um quesito ou outro, mas, como característica geral, as professoras sempre identificaram que os participantes do projeto apresentaram características que mostram que eles adquiriram conhecimentos e habilidades antes não observadas. Apesar do aspecto cognitivo ser o principal problema apontado quando aconteceu o encaminhamento do aluno, as melhoras foram percebidas em outros itens, nem sempre identificados como situações problemas. A resposta de uma das professoras sobre um aluno mostra isso: Entrevistador – O aluno APC4 apresentou melhoras cognitivas no aprendizado após a sua participação no “Projeto Crescer”? Ele melhorou muito. Em tudo mesmo: escrita, leitura, interpretação, operação...Era muito respondão, hoje ouve mais, fala menos em sala e responde menos também. (P2) Alguns termos aparecem constantemente nas respostas das professoras. Estes termos referem-se mais a comportamentos e atitudes de disciplina que o aluno passou a ter após a participação no projeto, como “fala menos”, “mais concentrado”, “melhorou na atenção”, entre outros. Entrevistador – O aluno APC6 apresentou melhoras cognitivas no aprendizado após a sua participação no “Projeto Crescer”? O aluno está mais concentrado. Já consegue ouvir e depois falar. (P2) Nesta outra situação a professora relata sobre um terceiro aluno: Entrevistador – O aluno APC3 apresentou melhoras cognitivas no aprendizado após a sua participação no “Projeto Crescer”? O aluno está mais concentrado e menos agressivo. Fala menos e melhorou a atenção. Demonstra mais interesse e respeita a professora. Melhorou em relação aos colegas. (P2) Em relação às entrevistas finais com as professoras, nota-se uma percepção geral de melhora dos alunos atendidos pelo projeto. Como dito anteriormente, essa melhora é identificada, inicialmente, na evolução de aprendizagem e, imediatamente, vinculada ao comportamento e disciplina dos alunos. Logo, podemos 91 inferir haver uma relação, para as professoras, entre o bom desempenho escolar e a melhoria de disciplina. Apesar de o projeto contribuir para essa melhora, segundo as professoras, uma pergunta a ser feita está ligada a seguinte situação: se a professora não mudar a dinâmica das aulas em sala, esse comportamento “melhor” dos alunos permanecerá? A mesma pergunta em outra perspectiva: o insucesso do aluno é só “culpa” do aluno? Essa análise leva a uma possibilidade que foi constatada nas reuniões gerais entre professoras, coordenação pedagógica, psicólogas da ABRADH e direção da escola: a necessidade do projeto também trabalhar com a capacitação das professoras. No caso das psicólogas, os temas em que foram agrupadas as respostas são os seguintes: . Principais características em relação à cognição, desenvolvimento psicológico, nível de violência e socialização observadas antes do aluno freqüentar as atividades do projeto; . Principais evoluções em relação à cognição, desenvolvimento psicológico, nível de violência e socialização observadas no aluno após 4 meses de freqüência às atividades do projeto. Em relação ao primeiro tema, apesar do contato entre os alunos e psicólogas ainda, até aquele momento, não ter acontecido, os relatos são mais detalhados do que os relatos das professoras. Os relatos das psicólogas, antes do início das atividades no projeto, foram baseados em encontros preparatórios, os quais tiveram como método algumas dinâmicas e entrevistas individuais e em grupos. Sobre a cognição, percebe-se nas respostas das psicólogas uma concordância com as professoras. A caracterização deste aspecto das crianças foi relatada como: comprometido, com dificuldade de aprendizagem, dificuldade para entender comandos, não alfabetizado ou, ainda, apresenta respostas lentas. Apesar da concordância entre as professoras e psicólogas em relação ao baixo desenvolvimento cognitivo, uma diferença observada entre os relatos destas profissionais é que, para as psicólogas, esta categoria de análise foi separada dos critérios psicológicos, o que não ocorreu, como citado anteriormente, entre as professoras. Alguns exemplos: 92 Entrevistador – Quais as principais características observadas sobre o aluno APC5 em relação à cognição? Tem dificuldade para entender os comandos para realização das tarefas. (PP1) Entrevistador – Quais as principais características observadas sobre o aluno APC6 em relação à cognição? Tem dificuldade para entender os comandos. Respostas lentas. (PP1) Entrevistador – Quais as principais características observadas sobre o aluno APC11 em relação à cognição? PP – comprometido, com dificuldade de aprendizagem. Muita dificuldade de entendimento e muita demora em responder questões simples. (PP2) Sobre o desenvolvimento psicológico, o nível de violência e socialização, pode-se inferir algumas características gerais das crianças a partir dos relatos das psicólogas. Primeiro, muitos alunos são colocados como “sem maiores problemas”. Mesmo sem detalhamentos, as psicólogas já estabelecem algumas relações de causalidade entre determinados significados dos comportamentos expressos em sala de aula e o baixo rendimento escolar, como se percebe no diálogo reproduzido abaixo: Entrevistador – Quais as principais características observadas sobre o aluno APC15 em relação ao desenvolvimento psicológico? Apresenta características de TDAH (Transtorno por Déficit de Atenção e Hiperatividade). Não conseguindo concentrar-se e realizar a tarefa pedida, devido ao TDAH, reage agressivamente e com rebeldia, tanto em relação à figura de autoridade quanto em relação aos colegas. (PP2) Dentro dessa perspectiva, as psicólogas descrevem que muito da metodologia dos atendimentos e, também, do encaminhamento para as outras oficinas, aconteceram a partir das observações das primeiras entrevistas. Na continuidade do projeto e, como citado anteriormente, no trabalho com as professoras, que será iniciado em 2013, as relações de causalidade entre os comportamentos expressos e os diagnósticos realizados por elas servirão de base para intervenções mais específicas. Sobre o segundo tema analisado nas entrevistas com as psicólogas, que é relacionado às principais evoluções em relação à cognição, desenvolvimento psicológico, nível de violência e socialização observadas no aluno após quatro meses de freqüência às atividades do projeto, os relatos mostram que as entrevistadas observaram uma evolução geral dos alunos. Sobre esse tema, as 93 psicólogas nas entrevistas utilizaram algumas categorias de análise, recorrentemente, para mostrar essa evolução nas quais se destacam os seguintes aspectos: a) melhoria nas atividades pedagógicas; b) melhoria na socialização e c) importância do diagnóstico. Alguns depoimentos ilustram essa situação: Entrevistador – Quais as principais evoluções observadas sobre o aluno APC7 em relação ao desenvolvimento psicológico, cognição, nível de violência e socialização depois destes quatro meses de projeto? O aluno apresentava muita dificuldade de entender e responder as questões propostas em sala de aula e nas atividades de acompanhamento escolar. Além disso, emocionalmente, tímido, baixa auto-estima e uma tristeza profunda. A socialização melhorou a partir das atividades em grupo e, sobre os problemas emocionais, o diagnóstico de depressão e encaminhamento para tratamento foi importante para que o aluno apresentasse mais confiança e evolução na escola. (PP1) Entrevistador – Quais as principais evoluções observadas sobre o aluno APC13 em relação ao desenvolvimento psicológico, cognição, nível de violência e socialização depois destes quatro meses de projeto? APC13 apresentava-se apático e com péssimo rendimento escolar. Sem relacionamento com colegas, sozinho. A partir dos atendimentos, sobre os problemas emocionais, o diagnóstico de TDA (Transtorno por Déficit de Atenção) foi importante para a organização dos atendimentos. Hoje, APC13 está medicado e com rendimento muito melhor na escola, melhorando o relacionamento e com mais auto-estima. (PP2) As entrevistas das psicólogas mostram como as observações iniciais foram importantes para a construção da metodologia dos atendimentos. Importante também foram os encaminhamentos para as outras oficinas do projeto. Logo, a partir das atividades em psicologia, os estudantes foram encaminhados para a música, aulas de Kung Fu, capoeira, futebol e o acompanhamento pedagógico. Esse encaminhamento foi organizado a partir da necessidade das crianças trabalharem questões específicas de uma forma mais enfática e complementar aos atendimentos psicológicos. Sendo assim, a socialização é o foco do trabalho na capoeira e futebol. A música organiza-se em oficinas que propiciam maior expressão emocional. O Kung Fu trabalha a disciplina e socialização e, obviamente, o acompanhamento pedagógico foca-se nos processos e questões cognitivas. Os relatos de todos os professores, de todas as oficinas, são repassados às psicólogas que acompanham a evolução de todos os atendidos no projeto. 94 Sobre as hipóteses diagnósticas realizadas no projeto, essas são repassadas à escola para que haja o comunicado às famílias. Em todas as situações que isto ocorreu, o diagnóstico foi confirmado e a criança iniciou o tratamento, o que ocasionou melhora tanto psicológica quanto pedagógica do aluno. As crianças estudadas são moradoras de uma região extremamente pobre, em bairros que pertencem ao município de Vespasiano/MG, no limite com Belo Horizonte/MG. A escola atende, principalmente, as famílias dos bairros Morro Alto. Nos relatos apresentados pela escola e, também, pelas psicólogas, muitas situações caracterizadas como quebra dos direitos fundamentais dessas crianças foram relatadas. Do grupo encaminhado para o “Projeto Crescer”, cinco crianças relataram serem vítimas de abuso sexual sistemático. Muitas relatam situações de violência física e psicológica. Três dos participantes são crianças adotadas e que possuem cognição comprometida com alto nível de retardo. Além das crianças participantes do projeto, muitas outras vivem situações semelhantes. Há um problema sério no bairro enfatizado por ONGs que trabalham na região, igrejas e outros grupos que realizam projetos: crianças, mulheres e idosos não têm seus direitos garantidos. Um ponto importante sobre esta situação é que, mesmo com tal nível de violação dos direitos, não há uma mobilização por parte da escola, no caso das crianças pesquisadas, e comunidade como um todo, no sentido de acionar a rede de proteção à criança e adolescente. A escola, mesmo ciente de algumas de muitas das situações expostas acima, não registra estes casos e não aciona, por exemplo, o conselho tutelar ou o juizado da infância e adolescência. Os fatos são conhecidos, mas, restringem-se a um repasse verbal, informal. A explicação para isso: medo. Segundo relatos de entrevistas realizadas pela ABRADH, antes da implantação do “Projeto Crescer”, com funcionários da Secretaria Municipal de Ação Social de Vespasiano e com o Padre Gílson, padre da paróquia Nossa Senhora Aparecida e uma das lideranças do bairro, o Morro Alto foi criado em 1983 para acolher os desabrigados das enchentes de Belo Horizonte, ocorridas no mesmo ano, e provenientes da favela Perrella. Portanto, uma grande parcela de seus habitantes é de migrantes de Belo Horizonte, além do norte de Minas. A prefeitura de Vespasiano não possui dados sobre o bairro. A maioria das construções são irregulares e sem registro cartorial. No bairro há um pequeno comércio local e, também, uma região industrial. Já existe na localidade equipes de Programa de 95 Saúde da Família (PSF). Para a educação existem escolas de educação infantil, ensino fundamental e médio, tanto da rede municipal quanto da rede estadual. O problema da violência doméstica é enorme e há um grande número de gravidez na adolescência. Aos vinte anos, as moças já possuem em média, três filhos. Parece haver uma crença de que tendo filhos poderão viver de pensão alimentícia a ser demandada aos pais das crianças. Neste sentido, há uma sobrecarga de pedidos no fórum da cidade. Esta situação de privação econômica decorrente de jovens mulheres com filhos e abandonadas pelos companheiros, muitas vezes leva a uma desestruturação familiar ocasionando uma ausência de valores que seriam repassadas às gerações mais jovens. As famílias desestruturadas numa localidade constituem uma desagregação social que questiona o viver em sociedade e cria problemas, principalmente, às crianças e adolescentes, perpetuadores do grupo que deixam de ter um referencial social saudável. O medo, relatado anteriormente como causa da não informação sobre os casos que a escola toma conhecimento, vincula-se ao tráfico de drogas que acontece no Morro Alto. Este poder paralelo apropria-se das lacunas sociais deixadas pela desestruturação familiar e faz crianças, a partir dos treze ou quatorze anos, viciarem-se em crack, maconha ou cocaína e, a partir daí, muitas entram na “equipe” de algum traficante favorecendo a construção de suas “novas famílias”. Na entrada do bairro podem-se observar pessoas com função de comunicar sobre quem entra e quem sai. A própria Polícia Militar aconselha a não entrar no bairro se você não conhece alguém. Quase que diariamente acontecem tiroteios e, frequentemente, assassinatos. Todos com ligação direta com o tráfico. Sendo assim, a escola sugerir a investigação mais pormenorizada sobre violação de direitos das crianças significa enfrentar este poder paralelo e expor uma instituição sem a mínima segurança para seus trabalhadores. Esta situação foi relatada nas entrevistas realizadas pela ABRADH antes do início de sua atuação no bairro Morro Alto. Justifica-se esta abordagem anterior da ABRADH no sentido de que todo projeto e seus diferentes interessados precisam ser conhecidos o mais que se puder, buscando informações de contexto que favoreçam o planejamento de um projeto social e sua posterior avaliação (CHIANCA, MARINO e SCHIESARI, 2001). Esta situação toda pode ser entendida como boa parte dos determinantes do baixo rendimento escolar das crianças. Além, claro, dos problemas psicológicos 96 enfrentados por elas. Neste caso, o “Projeto Crescer” se justifica e estabelece uma ação que passa pelo entendimento do que seria o sentido do viver em comunidade, trabalhando nos indivíduos não só o aspecto psicopedagógico, mas o senso de dignidade humana, repercutindo no envolvimento e engajamento para a resolução dos problemas que afetam o seu viver comunitário. Logo, a atuação em projetos sociais das OTS pode ser ilustrado pelo “Projeto Crescer”, vinculado à promoção do desenvolvimento local, já que qualifica e permite a participação cidadã e busca o fortalecimento da sociedade civil e empoderamento de grupos sociais (FISCHER, 2002), que, como os moradores do Morro Alto representados neste trabalho pelas crianças da E. M. Maria de Paula Santos, são marginalizados nas esferas de tomada de decisão. Percebe-se a partir desse estudo que a dimensão do desenvolvimento local precisa ser contemplada na articulação de atuação das ONGs em seus projetos de intervenção nas comunidades. Isto significa que a construção da missão das ONGs passa pela construção coletiva, incluindo, se possível, a comunidade beneficiária do projeto (ALBUQUERQUE, 2006). Este fator possibilita e enfatiza a gestão própria das OTS que, diferentemente da gestão do Estado e das empresas, precisa contemplar a participação social e mobilização popular, independente de como o projeto será viabilizado financeiramente. Logo, a responsabilidade social, criticada por muitos como um novo formato de manutenção das práticas capitalistas, o que efetivamente acontece, requer uma crítica anterior, que passa pelo formato de atuação das instituições executoras dos projetos. No caso do “Projeto Crescer”, a mobilização pela educação de qualidade, como discutido no início deste trabalho, “abrange tanto questões de conteúdo escolar quanto de gênero, etnia, nacionalidade, religiões, portadores de necessidades especiais, meio ambiente, qualidade de vida, paz, direitos humanos, direitos culturais, etc.” (GOHN, 1999). Sendo assim, o que ocorreu frente a algumas situações relatadas pelas crianças atendidas pelo projeto, situações estas vinculadas à perda e violação dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, foi acionar e iniciar a articulação da rede de proteção de garantias destes direitos, com o estabelecimento de parcerias e um trabalho que, ainda em curso e estruturação em formação, visa fortalecer e estabelecer um fluxo de procedimento que rompa, gradativamente, com o medo e sensação de impunidade. Desta forma, as informações obtidas através das crianças nos encontros com as 97 psicólogas e que significam a perda ou violação de direitos são, inicialmente, trabalhadas com as crianças vítimas destas situações, para que elas informem ao conselho tutelar sobre o que está acontecendo. Este processo envolve um acolhimento nos encontros para que a criança se sinta segura já que as consequências podem ser a retirada da criança da escola ou, até mesmo, a ameaça explícita pelos familiares às psicólogas e demais professores do projeto. Após este procedimento a ABRADH tem convidado o conselho tutelar e a secretaria de ação social, além do Ministério Público, para se fazerem presentes na escola, através de palestras, participação nas festividades da escola e reuniões do colegiado. Esta presença cumpre, ao mesmo tempo, dois objetivos. O primeiro que é mostrar à comunidade que a rede articulada pode significar uma proteção e apoio às pessoas que se sentem desprotegidas e desesperançadas frente ao domínio do tráfico. O segundo que é coibir os praticantes da violência contra a criança, pois, sabendo que a escola está articulada, com palestras e pessoas mais presentes no cotidiano da instituição, há uma hipótese, que até então não existia, de que eles podem ser “delatados”. Em um dos relatos da entrevista, uma das psicólogas descreveu que algumas crianças disseram que, depois da entrada no projeto, os abusos sexuais a que elas eram submetidas, cessaram. Isto pode demonstrar que, de alguma forma, a participação destas crianças no projeto ocasiona um “medo de exposição e de correr riscos em situações de mudança” que muitos responsáveis pelas situações relatadas anteriormente não estão interessados em correr este risco (CHIANCA; MARINO; SCHIESARI, 2001, p. 88). Também importante passa a ser o formato desenvolvido pelas ONGs no sentido de avaliar seus projetos de uma maneira mais abrangente. Isto implica que todos os processos gerenciais adotados pela ONG, ou seja, o planejamento, a organização e a direção precisam estabelecer vínculos com esta perspectiva maior do projeto, que é a promoção do desenvolvimento local e o estabelecimento de redes antes não apresentadas ou não utilizadas pela comunidade. No caso do “Projeto Crescer”, o planejamento precisa vincular-se ao plano estratégico que inclua a análise do contexto da escola, mas, também, da comunidade do Morro Alto. Estabelecer um projeto que sistematize apenas as práticas de “dentro do consultório” e não se faz uma “avaliação do conjunto, de modo a garantir a coerência do plano” (TENÓRIO, 2009, p. 29) pode significar uma prática que não 98 apresente diferenças e que corra o risco de não ser eficaz. Por isso a função dos gestores é fundamental. São eles que organizam as ações e estabelecem a condução do projeto bem como dão o estímulo necessário para que as pessoas realizem suas atividades. Sendo assim, o momento onde a comunicação sobre o projeto a todos os interessados e a entrada da comunidade e da escola na responsabilização do que acontece às crianças deve ser o foco natural da evolução das ações do “Projeto Crescer”. Desta forma, o processo de controle, ou avaliação, indicará, além da eficácia específica do projeto, a efetividade do projeto social, ou seja, quais foram os impactos do projeto e os alcances de seus objetivos (COHEN; FRANCO, 2011). Isto significa que o “Projeto Crescer”, ao avaliar-se, busca uma referência de como suas práticas são percebidas pela comunidade. De como a comunidade está disposta a se envolver com, o que até pouco antes, era de responsabilidade apenas da “professora do meu filho”. Uma avaliação não é apenas referendada para sua continuidade. É um processo de identificação de possíveis erros e a busca por processos que podem ser mais eficazes visando atingir os resultados esperados. No caso do “Projeto Crescer” a análise do projeto mostrou que há evidências de que o projeto está sendo eficaz no sentido de melhorar o rendimento pedagógico das crianças e propiciar a elas um espaço para que falem de sua vida e exponham situações que interferem emocionalmente no seu desempenho escolar. Muitas apresentaram melhoras nas notas das disciplinas avaliadas em média maior às crianças não participantes do projeto, além de uma melhora de socialização e psicológica, como mostrado antes. Mas, analisando a efetividade, talvez um projeto ampliado que envolva a participação maior dos pais das crianças e que defina uma metodologia específica para as professoras deva ser pensado. Algumas reuniões começaram a acontecer objetivando este trabalho para a continuidade do projeto. Logo, uma ampliação da avaliação, estendendo a análise para as professoras regulares da escola e, também, para a comunidade, pode oferecer dados que possibilitem ao “Projeto Crescer” definir melhor seus próximos passos. 99 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisar os projetos sociais em educação executados pelas OTS, entendese que a maneira que estes projetos são concebidos, formatados e executados demonstram que, atualmente, há uma preocupação grande para que se desenvolva uma gestão típica do Terceiro Setor. Esta gestão típica do Terceiro Setor não desconsidera algumas prerrogativas básicas do sistema de gestão do Estado e das empresas privadas. Mas, pretende ir além no sentido de que a gestão social é a gestão própria da sociedade civil, onde não se perseguem objetivos puramente econômicos e que o campo de ação é publico, porém não estatal. Dos desafios enfrentados pelas ONGs, vistos neste trabalho, a conciliação entre a busca de recursos para a execução de suas ações e a estruturação de uma administração eficiente foram das mais importantes discussões. Esta conciliação significa que, ao mesmo tempo em que uma ONG precisa de financiamento para seus projetos, uma dimensão ética é estabelecida quando seus membros referenciam-se na missão da organização para estabelecer as diretrizes do projeto a ser executado. A missão funciona como um eixo que articula toda a ação de uma ONG. Preferencialmente estabelecida coletivamente, é a missão que seleciona o problema, discute a capacidade técnica para enfrentamento destes problemas e estabelece o público-alvo. Articulando a gestão social e a missão das ONGs no estabelecimento de funções gerenciais no trabalho destas organizações, há um comprometimento com a eficiência, eficácia e efetividade dos projetos executados. Dentre estas funções gerenciais, ou seja, o planejamento, organização, direção e controle, esta pesquisa priorizou a análise de um projeto, denominado “Projeto Crescer”, a partir do processo avaliativo das ações executadas por este projeto. Esta análise foi estabelecida a partir de dados quantitativos e qualitativos. Os dados quantitativos mostraram nos dois grupos pesquisados de alunos da Escola Municipal Maria de Paula Santos os resultados em testes psicológicos que analisaram nível de estresse, raciocínio lógico e desempenho escolar em matemática (aritmética) e português (leitura e escrita). Além dos testes, realizou-se análise das notas em português e matemática relativas aos dois primeiros bimestres de 2012. 100 Em relação a estes dados pode-se notar que os alunos participantes do “Projeto Crescer” apresentaram resultados que enfatizam a diminuição dos identificadores de situação de estresse. Sabendo-se da estreita ligação entre estes identificadores de situação de estresse e as experiências vivenciadas pelas crianças em suas famílias relacionadas à violação de direitos, explica-se o motivo das crianças atendidas pelas psicólogas conseguirem uma diminuição do nível destes identificadores. Da mesma maneira, os melhores resultados nos testes de raciocínio lógico e de desempenho escolar apresentados pelos alunos participantes do projeto podem ser creditados ao acompanhamento psicológico, mas, também, às atividades do acompanhamento psicopedagógico. De toda forma, em alguns dados comparativos, os resultados não foram satisfatórios. Uma das explicações para isto relaciona-se ao fato do curto período de tempo entre as aplicações dos testes. Além deste fator, o nível de comprometimento neuropsicológico de algumas crianças não permitiu acontecer uma evolução significativa, ocasionando, inclusive, o encaminhamento de algumas delas para atendimento específico nos postos de saúde do município (psicologia, psiquiatria e neurologia). Em relação às notas de português e matemática, os alunos participantes do projeto melhoram o rendimento significativamente comparando-se a primeira e segunda etapas. Nas entrevistas realizadas com as professoras e psicólogas buscou-se, a partir destas entrevistas, informações com pessoas fundamentais no projeto. A partir delas um entendimento maior da situação das crianças atendidas foi adquirido. As dificuldades apontadas pelas professoras em sala de aula mostraram a necessidade do trabalho com as docentes. A desmotivação e desinteresse acabam por prejudicar a ação destas profissionais e a reprovação torna-se o caminho mais curto para resolver a situação de “crianças problemáticas”. Desta forma, é importante para o “Projeto Crescer” discutir com a escola e mesmo com a Secretaria Municipal de Educação, de Vespasiano, ações objetivando um trabalho específico com as professoras. Da mesma maneira em relação aos pais das crianças. Sempre que foram chamadas à escola para receberem informações das psicólogas, informações estas relacionadas à procura de profissionais que pudessem ajudar em algum diagnóstico, as famílias mostram-se solicitas e prontas a participar. Este fato enfatiza a necessidade de ampliação do projeto visando a mobilização destes pais e busca por maior participação deles no cotidiano da escola. Os entrevistados acreditam que estas duas ações, com as professoras e com as famílias, são 101 fundamentais para o crescimento e maior eficácia do projeto. Logo, algumas situações relacionadas ao trabalho das professoras, como o não estabelecimento de uma metodologia eficaz para um grupo tão heterogêneo de alunos, poderiam ser melhores trabalhadas quando as professoras conseguirem explicitar esta situação em momentos específicos onde elas seriam ouvidas e ajudadas. O mesmo pode-se dizer em relação aos pais. Observa-se que os aspectos apontados pelas entrevistadas estão vinculados aos processos de desenvolvimento local. Na entrevistas a participação da escola e da comunidade são colocados como fatores fundamentais para a maior participação e evolução das crianças. Quando analisa-se o bairro Morro Alto, a dinâmica da comunidade local e o poder paralelo estabelecido pelo tráfico de drogas, entende-se o motivo de tanta dificuldade da participação das pessoas nas instituições como a escola. A articulação com a rede de proteção e garantia dos direitos das crianças e adolescentes completam o quadro no sentido de favorecer a aproximação entre escola e comunidade. Sendo assim, a partir das entrevistas e do referencial teórico, alguns questionamentos aparecem que apontam para novas investigações. Primeiro no que diz respeito ao processo avaliativo. Uma vez que se estabelece uma avaliação do projeto executado, torna-se necessário desenvolver ações para implementar o que percebe-se não está apresentando resultados. Deste modo, o “Projeto Crescer” precisa organizar uma avaliação sistemática e estabelecer com a empresa financiadora condições de mudar o estabelecido quando a avaliação indicar tal fato. Segundo, a partir do momento que o projeto iniciar o trabalho com as professoras ou com as famílias, é importante estabelecer como este trabalho será avaliado. Em muitos momentos as ONGs planejam, organizam, mas, não se preocupam, nesta organização e planejamento, de elencarem processos avaliativos. É uma prática estabelecida e só quebrada quando a instituição financiadora vincula a liberação de recursos com a avaliação. Terceiro, para a ABRADH aprimorar seus projetos de intervenção, foram realizadas entrevistas com a comunidade e trabalhadores da escola. Após o início do projeto estes contatos não foram restabelecidos. Logo, identifica-se uma relação não participativa e com problemas na construção de arenas de discussão sobre o 102 “Projeto Crescer”. Entende-se que a aproximação com as professoras e rede de proteção aos direitos das crianças e adolescentes pode ser o caminho para isto. Por último, mas não menos importante, aprimorar as oficinas oferecidas pela ABRADH. É preciso discutir mais sobre o que cada uma das atividades: futebol, música, Kung Fu, capoeira, acompanhamento escolar e a própria psicologia, podem contribuir para o desenvolvimento fisco, emocional, cognitivo e social das crianças. Sendo assim, a contribuição para que essa pesquisa seja um estímulo para a prática de análise de projetos sociais desenvolvidos por OTS, o projeto de intervenção desenvolvido foi a realização de um seminário em 2013, apoiado pela Mecan, empresa que financia o “Projeto Crescer”, cujo tema será a “avaliação de projetos sociais executados por OTS”. Além disso, o modelo de análise proposto nesta pesquisa será apresentado à ABRADH e organizado em forma de manual e disponibilizado no site da ONG a partir da aprovação da primeira reunião da ABRADH em 2013. 103 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, A. C. C. Terceiro setor: história e gestão de organizações. São Paulo: Summus, 2006. ALVES, I. C. B. et al. Manual matrizes progressivas coloridas de raven: escala especial. 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A ação analisada refere-se a um projeto que atua junto aos alunos encaminhados pela Escola Municipal Maria de Paula Santos, considerados com algum tipo de dificuldade de aprendizagem ou com problemas psicológicos. Apoiou-se para a realização deste estudo principalmente em autores que tratam de Terceiro Setor e de avaliação em gestão social. Realizou-se uma pesquisa quantiqualitativa com finalidade descritiva com base em entrevistas realizadas com professoras da Escola Municipal Maria de Paula Santos e psicólogas da ABRADH (Associação Brasileira de Ações Integradas para o Desenvolvimento Humano), além da aplicação de testes e análise de documentos escolares de dois grupos de alunos, um grupo participante das atividades do “Projeto Crescer” e outro grupo não participante destas atividades. Os resultados dessa análise que são apresentados de forma detalhada na referida dissertação de mestrado apontaram para possibilidades de ação do projeto que inclui um trabalho específico com as professoras do ensino regular e as famílias das crianças. Além de contribuir para o fluxo de ações e retomada de procedimentos do “Projeto Crescer”, a avaliação empreendida pela pesquisa discutiu sobre as práticas de gestão da ONG. A discussão empreendida na pesquisa realizada buscou referenciais que norteassem as ações empreendidas nos projetos e na identificação de como estas ações interferem nas relações pessoais, institucionais e no desenvolvimento local. Logo, a análise e avaliação dos resultados e impactos dos projetos sociais sobre a população envolvida é fundamental para o aprimoramento desses projetos e para que a ONG perceba melhor suas práticas de gestão. Outro fator importante para o entendimento e avaliação dos projetos sociais refere-se ao fato de como é estabelecida a relação entre as ONGs, as empresas financiadoras e as instituições que recebem o projeto, além da relação com a 108 comunidade local. Nesse contexto, a proposta que é apresentada refere-se a organização de um seminário sobre avaliação e impacto de projetos Sociais. Esse seminário será patrocinado pela Mecan, empresa que atua na construção civil, fundada em 1978 e, atualmente, a maior fabricante-locadora de andaimes, elevadores e escoramentos de obras do Brasil. A empresa faz parte do “Grupo Orguel” que é formado por dez empresas: Orguel, Locguel, Locbras, Bramex, Multiclean, Orguel Finanças, Orguel Plataformas, construir, Mecanflex e Mecan. A empresa conta hoje com 1.900 funcionários e possui 70 filiais e representantes no Brasil e países da América Latina. Desde a fundação o “Grupo Orguel” patrocina projetos sociais, educativos e ambientais. Atualmente, a Mecan patrocina o “Projeto Crescer”. No decorrer desse trabalho de dissertação sobre a eficácia do “Projeto Crescer” e da reflexão sobre a ação de ONGs em projetos educativos, a realização de um seminário surgiu como desdobramento desse estudo. Essa proposta de realização de um seminário apresenta-se como uma possível contribuição mais diretamente para a ABRADH e para a Mecan, mas, também, para empresas e ONGs que desenvolvem ações semelhantes e e que atuam no campo social visando o desenvolvimento local. Foi feito, então, um contato da ABRADH com a Mecan e aceita, por essa última, a proposta da realização desse seminário . Os recursos para a organização do evento já foram confirmados e serão utilizados para pagamento de palestrantes, diárias em hotel, transporte, alimentação, material e convites gratuitos para um público total de cem (100) pessoas. O tema avaliação e impacto de projetos sociais, escolhido para o seminário, justifica-se por ser assunto discutido nessa dissertação e por ser de grande importância para o entendimento das práticas das ONGs em projetos sociais visando o aprimoramento técnico das ações dessas ONGs e, também, para discutir sobre a interação entre o Terceiro Setor, empresas e o Estado. A partir dos resultados do seminário, o pesquisador em conjunto com a ABRADH, organizará um manual de sugestões sobre processos avaliativos nas ONGs o qual será distribuído gratuitamente em número de 100 cópias e disponibilizado no site da ABRADH. 109 SEMINÁRIO: AVALIAÇÃO E IMPACTO DE PROJETOS SOCIAIS Objetivo do seminário: Promover a discussão sobre a avaliação de projetos sociais e como as ONGs trabalham, na gestão, a avaliação de resultados e dos impactos do projeto desenvolvido sobre a comunidade local. Metodologia: Palestras, debates e mini-cursos. Público alvo: Dirigentes e técnicos de ONGs. Organização do evento: Natham Ribeiro Martins. Palestrantes: pesquisadores, dirigentes de ONGs e professores universitários Local: auditório da Mecan. Rodovia MG 010 Km 26,5 Vespasiano/M.G. Cronograma: Contato com debatedores e palestrantes: Janeiro a Março de 2013 Divulgação e convites distribuídos gratuitamente para participação no evento: Junho de 2013 Divulgação na imprensa e sites especializados: Junho de 2012 Data do evento: Julho de 2013 Programa do Seminário 1º dia: 19:30 h. Abertura do seminário com palestra sobre o tema: Avaliação de Projetos Sociais. 21:30 h. Encerramento das atividades do dia. 2º dia: 110 8:30 h. Debate: O Terceiro Setor e a parceria com empresas e poder público. Mesa composta por um representante do poder público, um representante do Terceiro Setor e um representante de empresa. 12:00 h. Encerramento das discussões e intervalo para almoço. 14:00 h. Início dos mini-cursos. Temas: 1- Processos de Avaliação de Projetos. 2- A Gestão das ONGs e a Captação deRecursos. 3- Participação Popular e Desenvolvimento Local. 18:00 h. Encerramento dos mini-cursos. 3º dia: 8:30 h. – 9:30 h. Palestra sobre Objetivos, Natureza e Tipos de Avaliação. 9:30 h. – 10:30 h. Palestra sobre Responsabilidade Social. 11:30 h. Encerramento do seminário. 111 APÊNDICE B TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA PESQUISA EM: Documentos escolares: listas de freqüência, boletins e relatórios sobre os alunos. Eu, Sueli Félix Barbosa, responsável pela direção da Escola Municipal Maria de Paula Santos, autorizo a utilização de dados disponíveis para a pesquisa abaixo descrita nesta escola para a realização do trabalho científico intitulado PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – Minas Gerais) realizado sob orientação da Prof. Drª. Áurea Regina Guimarães Thomazi e Natham Ribeiro Martins como pesquisador principal, para fins de trabalho acadêmico. Informo que esta cessão de dados ou autorização está condicionada à realização da pesquisa conforme princípios de ética e responsabilidade. Vespasiano, de de 2012. ___________________________ Sueli Félix Barbosa – Diretora da Escola Municipal Maria de Paula Santos 112 APÊNDICE C TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA PESQUISA EM: Documentos escolares: listas de freqüência, boletins e relatórios sobre os alunos. Eu, Jânio Fernandes de Almeida, responsável pela direção da Escola Municipal José Paulo de Barros, autorizo a utilização de dados disponíveis para a pesquisa abaixo descrita nesta escola para a realização do trabalho científico intitulado PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – Minas Gerais) realizado sob orientação da Prof. Drª. Áurea Regina Guimarães Thomazi e Natham Ribeiro Martins como pesquisador principal, para fins de trabalho acadêmico. Informo que esta cessão de dados ou autorização está condicionada à realização da pesquisa conforme princípios de ética e responsabilidade. Vespasiano, de de 2012. ___________________________ Jânio Fernandes de Almeida – Diretor da Escola Municipal José Paulo de Barros 113 APÊNDICE D TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA PESQUISA EM: Documentos: testes psicológicos, relatórios e entrevistas. Eu, Eliane Durães de Carvalho, responsável pelo setor de documentação de projetos da ABRADH, autorizo a utilização de dados disponíveis para a pesquisa abaixo descrita na ABRADH para a realização do trabalho científico intitulado PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – Minas Gerais) realizado sob orientação da Prof. Drª. Áurea Regina Guimarães Thomazi e Natham Ribeiro Martins como pesquisador principal, para fins de trabalho acadêmico. Informo que esta cessão de dados ou autorização está condicionada à realização da pesquisa conforme princípios de ética e responsabilidade. Belo Horizonte, de de 2012. ___________________________ Eliane Durães de Carvalho – Vice presidente da ABRADH 114 APÊNDICE E TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Título da Pesquisa: PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO EXECUTADOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano – MG). Nome do Pesquisador: Natham Ribeiro Martins Nome da Orientadora: Prof. Drª. Áurea Regina Guimarães Thomazi 1. Natureza da pesquisa: o Sr. (a) está sendo convidado (a) a participar desta pesquisa que tem como finalidade analisar os resultados dos alunos que participam do Projeto Crescer. 2. Participantes da pesquisa: 34 alunos do 4º e 5º anos da educação básica. 3. Envolvimento na pesquisa: ao participar deste estudo a Sra. (Sr) permitirá que o (a) pesquisador realize entrevistas sobre os alunos participantes do projeto crescer. A Sra. (Sr.) tem liberdade de se recusar a participar e ainda se recusar a continuar participando em qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo para a Sra. (Sr.). Sempre que quiser poderá pedir mais informações sobre a pesquisa através do telefone do (a) pesquisador (a) do projeto e, se necessário através do telefone do Comitê de Ética em Pesquisa. 4. Sobre as entrevistas: as entrevistas serão realizadas individualmente com cada professor. 5. Riscos e desconforto: a participação nesta pesquisa não traz complicações legais. Os procedimentos adotados nesta pesquisa obedecem aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres Humanos conforme Resolução no. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos usados oferece riscos à sua dignidade. 6. Confidencialidade: todas as informações coletadas neste estudo são estritamente confidenciais. Somente o (a) pesquisador (a) e o (a) orientador (a) terão conhecimento dos dados. 7. Benefícios: ao participar desta pesquisa a Sra. (Sr.) não terá nenhum benefício direto. Entretanto, esperamos que este estudo traga informações importantes sobre 115 os projetos realizados em parceria entre escolas públicas e organizações do terceiro setor, de forma que o conhecimento que será construído a partir desta pesquisa possa contribuir para a melhoria da educação e dos projetos que visem a qualidade educacional. O pesquisador se compromete a divulgar os resultados obtidos. 8. Pagamento: a Sra. (Sr.) não terá nenhum tipo de despesa para participar desta pesquisa, bem como nada será pago por sua participação. Após estes esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre para participar desta pesquisa. Portanto preencha, por favor, os itens que se seguem. Obs: Não assine esse termo se ainda tiver dúvida a respeito. Consentimento Livre e Esclarecido Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, manifesto meu consentimento em participar da pesquisa. Declaro que recebi cópia deste termo de consentimento, e autorizo a realização da pesquisa e a divulgação dos dados obtidos neste estudo. ___________________________ Nome do Participante da Pesquisa ______________________________ Assinatura do Participante da Pesquisa ________________ ______________ Assinatura do Pesquisador ___________________________________ Assinatura do Orientador Pesquisador Principal : Natham Ribeiro Martins (96042640) Comitê de Ética em Pesquisa: Rua Guajajaras, 175, 4º andar – Belo Horizonte/MG Contato: email: [email protected] 116 APÊNDICE F Entrevista 1 – (esta entrevista será aplicada antes do encaminhamento do aluno e antes de sua participação no projeto). Professores do ensino regular – 4º e 5º anos do ensino fundamental. Data da entrevista: a) Professor: b) Série que leciona (2012): c) Motivo principal para encaminhamento do aluno __________________________ para participação no Projeto Crescer: d) Outros motivos para encaminhamento do aluno: e) O aluno acima identificado apresenta dificuldades cognitivas para o aprendizado? ( ) sim ( ) não f) Quais são estas dificuldades? g) Como foram identificadas estas dificuldades? h) O aluno acima identificado apresenta dificuldades de socialização? ( ) sim ( ) não i) Quais são estas dificuldades e como foram identificadas? j) O aluno acima identificado apresenta dificuldades psicológicas? ( ) sim ( ) não k) Quais são estas dificuldades e como foram identificadas? 117 l) O aluno acima identificado apresenta histórico de envolvimento em situações de violência? ( ) sim ( ) não m) Quais são estas situações e como foram reconhecidas? 118 APÊNDICE G Entrevista 2 - (esta entrevista será realizada após quatro meses de participação do aluno no projeto). Professores do ensino regular – 4º e 5º anos do ensino fundamental. Data da entrevista: 1. Professor: 2. Série que leciona (2012): 3. Motivo principal para encaminhamento do aluno __________________________________ para participação no Projeto Crescer: 4- Outros motivos para encaminhamento do aluno: O aluno acima identificado apresentou melhoras cognitivas no aprendizado? ( ) sim ( ) não Quais foram estas melhoras? O aluno acima identificado apresentou melhoras em relação a socialização? ( ) sim ( ) não Quais foram estas melhoras? O aluno acima identificado apresentou melhoras psicológicas? ( ) sim ( ) não Quais foram estas melhoras? 119 O aluno acima identificado apresentou melhoras em relação ao envolvimento em situações de violência? ( ) sim ( ) não Quais foram estas melhoras? 120 APÊNDICE H Entrevista 1 - (esta entrevista será aplicada na primeira semana de participação do aluno nas oficinas) Psicólogos Data da entrevista: Nome do psicólogo: Na oficina coordenada por você, quais foram as características principais observadas em relação ao aluno _______________________________________ ? Quais as principais características observadas sobre este aluno em relação a: 2.1 cognição: 2.2 desenvolvimento psicológico e emocional: 2.3 nível de violência: 2.4 socialização: 3- Outras observações: 121 APÊNDICE I Entrevista 2 - (esta entrevista será realizada após quatro meses de participação do aluno nas oficinas). Psicólogos Data da entrevista: Nome do psicólogo: Na oficina coordenada por você, quais são as principais características que apresentaram evolução no aluno ________________________________________? Quais as principais evoluções deste aluno em relação a: 2.1 cognição: 2.2 desenvolvimento psicológico e emocional: 2.3 nível de violência: 2.4 socialização: Outras observações: 122 ANEXOS ANEXO A - Autorização Conselho de Ética na Pesquisa ........................................ 123 123 ANEXO A Autorização Conselho de Ética na Pesquisa CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA/ MG PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP DADOS DO PROJETO DE PESQUISA Título da Pesquisa: PROJETOS SOCIAIS EM EDUCAÇÃO DESENVOLVIDOS POR ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR: análise e reflexões a partir do Projeto Crescer (Vespasiano/Minas Gerais) Pesquisador: Áurea Regina Guimarães Thomazi Área Temática: Área 9. A critério do CEP. Versão: 3 CAAE: 02250912.6.0000.5098 Instituição Proponente: Centro Universitário UNA DADOS DO PARECER Número do Parecer: 146.556 Data da Relatoria: 14/11/2012 APRESENTAÇÃO DO PROJETO O foco desse projeto de pesquisa é um projeto social na área de educação desenvolvido por uma Organização do Terceiro Setor, financiada por uma empresa e em parceria com escolas públicas no município de Vespasiano - MG .O recorte será o Projeto Crescer, executado em duas escolas públicas municipais na cidade de Vespasiano - MG pela ONG ABRADH- Associação Brasileira de Ações Rua dos Guajajaras, 175 - Centro - CEP: 30180.100 - UF: MG - Município: Belo Horizonte Telefone: (31)3508-9119 - Fax: (31) 3508-9112 e-mail: [email protected]; [email protected] 124 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA/ MG Integradas para o Desenvolvimento Humano) sendo este projeto financiado pela empresa Mecan, que atua na fabricação de componentes para a construção civil. A questão central da investigação pode ser descrita como: Qual é a eficácia do projeto social, denominado CRESCER, o qual busca o desenvolvimento psicopedagógico de alunos de escolas públicas municipais, sendo executado por uma Organização não Governamental e financiado por uma empresa privada? Acredita-se que uma das justificativas para as ONGs, em geral, não analisarem a eficácia e/ou eficiência dos projetos que realizam é o fato de não possuírem parâmetros para procederem esta análise. Logo, se a análise do projeto estudado apresentar resultados de evolução no aprendizado e no comportamento social e psicológico dos estudantes pode-se inferir que haja uma relação entre estes resultados e a metodologia utilizada no projeto. Desta forma, esta metodologia poderia ser uma referência para outros trabalhos que possuem organizações semelhantes, ou seja, ONGs financiadas por empresas e trabalhando com estudantes de escolas públicas municipais que apresentem baixo rendimento escolar e inadequações psicológicas a partir de atendimentos psicopedagógicos e oficinas de esportes e cultura Objetivo Primário: Analisar a eficácia de um projeto social executado por uma organização não governamental, financiado por uma empresa e em parceria com escolas públicas. Objetivo Secundário: Identificar referências teóricas que possibilitem a descrição de parâmetros de análise de projetos em educação que discutem sobre aprendizagem,comportamento social e emocional e de seus resultados. Descrever os métodos e procedimentos utilizados com os alunos no projeto social pesquisado. Identificar as mudanças ocorridas na aprendizagem, no comportamento social e emocional dos alunos participantes do projeto social. Rua dos Guajajaras, 175 - Centro - CEP: 30180.100 - UF: MG - Município: Belo Horizonte Telefone: (31)3508-9119 - Fax: (31) 3508-9112 e-mail: [email protected]; [email protected] 125 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA/ MG Avaliação dos Riscos e Benefícios: Como a pesquisa é de natureza qualitativa, e envolve a aplicação de instrumentos a 18 pessoas, os riscos aos sujeitos de pesquisa são mínimos e os benefícios são as possíveis melhorias na eficácia do projeto social para estes sujeitos e para os futuros participantes. Comentários e considerações sobre a pesquisa: Este projeto foi analisado anteriormente por duas vezes. Na primeira recebeu parecer de pendência. Na segunda vez, parte das pendências foram atendidas (O TCLE para autorização dos pais foi inserido no sistema), mas ainda faltavam duas pendências (o esclarecimento sobre data inicial da pesquisa e a assinatura no Termo de autorização das instituições onde seriam realizadas as coletas de dados). A abordagem da pesquisa proposta fundamenta-se na análise de um projeto social e deve possibilitar a verificação da eficácia deste projeto a um número significativo de alunos em relação aos aspectos cognitivos e emocionais. Desta forma, o estudo será orientado pela pesquisa qualitativa, mas os dados serão agrupados estatisticamente de acordo com critérios da pesquisa quantitativa. Sobre as entrevistas com os professores das oficinas e das séries regulares, será realizada uma análise de conteúdo a partir do material obtido nas entrevistas. Os testes que serão aplicados bem como a análise dos documentos da escola receberão um tratamento estatístico. As entrevistas realizadas serão analisadas segundo uma análise de conteúdo. Após as entrevistas e aplicações dos testes os resultados permitirão inferir relações entre os procedimentos do projeto estudado e o desenvolvimento cognitivo e emocional dos alunos participantes do projeto. Os dados sobre educação de qualidade que nortearam a ação do Projeto Crescer serão utilizados como referência a partir da descrição objetiva de ações Rua dos Guajajaras, 175 - Centro - CEP: 30180.100 - UF: MG - Município: Belo Horizonte Telefone: (31)3508-9119 - Fax: (31) 3508-9112 e-mail: [email protected]; [email protected] 126 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA/ MG sistematizadas, estruturadas em: atendimento psicológico, oficinas de futebol, Kung Fu, capoeira, música, arte e teatro. Serão investigados itens dessas atividades e relacionados a aspectos que permitam definir indicadores da eficácia das ações desenvolvidas pelo referido projeto junto aos alunos.Serão envolvidos dois grupos (um grupo de crianças participantes do projeto e outro grupo controle). Considerações sobre os Termos de Apresentação Obrigatória Nesta oportunidade já foi constatado que os temos de autorização para utilização de dados e para realização da coleta de dados na escola onde funciona o projeto estão devidamente assinados e com descrição adequada aos procedimentos metodológicos descritos no projeto de pesquisa.Os TCLEs,atualmente anexados atendem as especificidade dos professores envolvidos e das crianças participantes do projeto que terão sua participação autorizada pelos pais. O currículo do pesquisador encontra-se devidamente anexado ao processo. Recomendações: Não há recomendações a fazer. Todas as pendências anteriormente relatadas foram devidamente atendidas. Conclusões ou Pendências e Listas de Inadequações: O voto do relator deste parecer consubstanciado é pela aprovação do projeto. Situação do Parecer: Aprovado. Necessita apreciação da CONEP: Não. Rua dos Guajajaras, 175 - Centro - CEP: 30180.100 - UF: MG - Município: Belo Horizonte Telefone: (31)3508-9119 - Fax: (31) 3508-9112 e-mail: [email protected]; [email protected] 127 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA/ MG Considerações finais a critério do CEP: Os membros acompanham o voto do relator por unanimidade. Belo Horizonte, 14 de Novembro de 2012 __________________________ Elaine Linhares de Assis Guerra (Coordenador) Rua dos Guajajaras, 175 - Centro - CEP: 30180.100 - UF: MG - Município: Belo Horizonte Telefone: (31)3508-9119 - Fax: (31) 3508-9112 e-mail: [email protected]; [email protected] Martins, Natham Ribeiro M385p Projetos sociais em educação desenvolvidos por organizações do terceiro setor: análise e reflexões a partir do projeto crescer (Vespasiano – Minas Gerais)/Natham Ribeiro Martins– Belo Horizonte: Centro Universitário UNA - Instituto de Educação Continuada, Pesquisa e Extensão, 2013. 128 f.; il. Orientadora: Prof. Drª. Áurea Regina Guimarães Dissertação (Mestrado em Gestão Social, Desenvolvimento Local) Educação e 1. Organizações do Terceiro Setor. 2. Organização não governamental (ONG). 3. Gestão social.4. Avaliação de projetos sociais. 5. Projetos sociais em educação. I. Thomazi, Áurea Regina Guimarães (orient.). II. Título. CDD: 361 CDU: 347. 471 Normalização e catalocação: Vanuza Bastos Rodrigues. CRB6: 1.172