Bruna Nunes da Costa Triana
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social
Universidade de São Paulo
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EXPERIÊNCIA E MEMÓRIA DO COLONIALISMO EM MOÇAMBIQUE NA FOTOGRAFIA DE
RICARDO RANGEL
RESUMO: Esta comunicação apresenta uma análise sobre a produção
fotográfica de Ricardo Rangel (1924-2009) entre os anos de 1950 e 1975, no
contexto de luta de independência em Moçambique. Tendo atuado como
fotojornalista,
sobretudo,
em
Maputo,
Rangel
produziu
imagens
que
conseguiram entrelaçar denúncia social, engajamento político e composição
poética, o que o tornou referência no campo da fotografia moçambicana e
africana. Assim, o pano de fundo que une as imagens recortadas para este
exame é o sistema colonial português e a luta armada de libertação – bem
como a efervescência cultural, o processo de modernização urbana e as
rupturas políticas pelos quais passava a capital moçambicana. O objetivo é
compreender a especificidade de seu olhar e os recursos narrativos utilizados
por Rangel para tematizar a violência intrínseca ao colonialismo, o processo de
independência e as transformações da sociedade nesse período. A
metodologia de análise das imagens baseia-se, em especial, em Walter
Benjamin e Georges Didi-Huberman.
PALAVRAS-CHAVE: Análise fotográfica; História; Fotojornalismo; Colonialismo
Português; Memória.
1. Introdução
No período colonial em Moçambique, em especial quando os conflitos
pela independência mais se acirraram, é possível observar a constituição de
uma série de contranarrativas importantes para a memória social do país, que
questionou as narrativas hegemônicas e oficiais do império português alémmar. Um nome que ocupa posição de destaque nesse período é o de Ricardo
Rangel (1924-2009), fotógrafo moçambicano que quis problematizar em suas
obras os conflitos e paradoxos gerados pela colonização portuguesa tardia.
Este trabalho pretende analisar algumas das especificidades de seu olhar e
dos recursos narrativos utilizados por Rangel para tematizar a violência
intrínseca ao colonialismo, o processo conflituoso de libertação e as intensas
transformações por que passava aquele país.
Tendo atuado como fotojornalista, Rangel fotografou os mais variados
espaços urbanos de Maputo (até 1976, Lourenço Marques), capital de
Moçambique, descortinando suas desigualdades e dando vida a personagens
cotidianos da cidade, a maioria estigmatizada pela pele negra em meio ao
colonialismo branco. Ele conseguiu compor, assim, uma obra que entrelaçou
denúncia social, engajamento político e composição poética, o que o tornou
referência no universo fotográfico moçambicano, na medida em que alcançou
ângulos e perspectivas que iluminaram momentos ímpares da colonização.
Ricardo Rangel foi contemporâneo do processo de apropriação da
fotografia como instrumento de construção de um outro “real”, manejando a
câmera para (re)construir uma memória na contramão da inteligibilidade
colonial (FIRSTENBERG, 2001). Começou atuando como auxiliar num estúdio
fotográfico, em meados dos anos 1940, na então Lourenço Marques. Em 1952,
foi contratado pelo Notícias da Tarde, sendo o primeiro não branco a trabalhar
para um periódico do país. Sua consolidação profissional pode ser sintetizada
neste período (1950-1970), quando passou por jornais importantes, como A
Tribuna e Diário de Moçambique. Em 1970, juntou-se a amigos jornalistas e
fotógrafos (como Kok Nam, Mota Lopes e Armindo Afonso) para fundar o
semanário Tempo, que agiu como publicação de oposição ao governo colonial,
sendo alvo de constantes censuras. Na década de 1980, fundou o Centro de
Documentação e Formação Fotográfica (CDFF) e a Associação Fotográfica
Moçambicana (AFM), locais onde se encontra seu acervo. Faleceu em 2009,
em Maputo, tendo um funeral com honras de Estado e ao som de Charlie
Parker, tal qual desejara.
Com base nesse breve contexto, o objetivo central deste ensaio é refletir
sobre algumas imagens que compõem a produção fotográfica de Rangel, entre
1955 e 1975, tendo como eixos sua condição de militante anticolonial, seu
pioneirismo e inventividade na prática do fotojornalismo e os aspectos
memorialísticos – mormente, do sistema colonial, mas, também, do espaço
urbano que sofria intensas transformações sociais e culturais – presentes em
sua obra. O recorte temporal abarca a luta anticolonial e de libertação em
Moçambique, que culminou em sua independência, em 25 de junho de 1975,
período de maior produção de Rangel, devido à sua passagem pelos principais
jornais e periódicos do país. Nessa medida, gostaria de apreender, de um lado,
alguns dos mecanismos narrativos e poéticos usados por ele para compor uma
experiência fotográfica, um olhar acurado sobre os grupos sociais marginais e
desviantes da sociedade moçambicana; e, de outro, certos aspectos sociais e
políticos que suas fotografias revelam, em especial, sobre o panorama urbano
em mudança e o universo cultural e boêmio da capital em meio ao processo de
independência.
Pretende-se analisar, então, a produção de Rangel sob o prisma da
construção de uma experiência e de uma memória fotográfica. Para tanto, volto
o olhar para uma produção artística bastante singular do artista, a fim de
vislumbrar os cruzamentos e as relações entre a narrativa fotográfica e a
análise antropológica, pensando a mediação da produção de Rangel, suas
formas e potências, a partir das noções de experiência e memória.
Dialogando com vários eixos analíticos, como a antropologia visual, os
usos da fotografia, os estudos do colonialismo português além-mar e da
construção da memória, a seguir, exploro brevemente uma proposta de
referencial que, no limite, compõe o objeto, destacando leituras que discutiram
o uso da fotografia na antropologia e, logo depois, o sistema colonial em
Moçambique – sempre mediadas pela obra de Rangel.
2. Antropologia Visual: a fotografia
As aproximações entre antropologia e imagem – abarcando, aqui, a
fotografia, o cinema e as novas mídias – já foram pensadas por muitos autores
contemporâneos. Em relação à fotografia, podemos citar: Caiuby-Novaes
(2008; 2009), Frehse (2005), MacDougall (2006), Mendonça (2005), Mitchell
(2002), Moreira Leite (1998; 1999), Samain (2000; 2004), Tacca (2001; 2007),
entre outros. Dessas análises, cabe destacar que tanto a antropologia quanto a
fotografia e o cinema surgiram em fins do século XIX, auge do colonialismo; ou
seja, essas tecnologias se desenvolveram no campo antropológico por
intermédio de um olhar específico sobre o outro, tomado, quase sempre, como
exótico. No entanto, embora as imagens, inicialmente, tenham se configurado
como instrumentos acessórios ao trabalho etnográfico e, em seguida, como
campo estimulante para a reflexão antropológica, as relações entre
antropologia e imagens demoraram a consolidar-se. Paulatinamente, o olhar
antropológico foi se debruçando sobre as artes visuais, a fim de procurar novas
formas de pensar e expressar as experiências de campo, bem como refletir o
estatuto da imagem, sua construção e possibilidades epistemológicas
(MACDOUGALL, 2006).
A antropologia visual busca problematizar a imagem, e não fazer da foto
mera ilustração, como ela foi (e, em certa medida, ainda é) usada nas ciências
sociais e na imprensa. Por isso, focando na fotografia, é interessante restaurar
“a qualidade mágica, ou profética, que as torna sempre atuais, sempre
subversivas” (LÖWY, 2009: 19). Assim, a força da imagem está exatamente em
apresentar ao olhar cenas que não constam na historiografia: gestos,
expressões, atitudes, sentidos. Isso, porque a fotografia sugere movimentos,
sons, tensões presentes em eventos e memórias, fazendo ver o espantoso no
cotidiano – e também o inverso.
Como crê Rouillé (2009), a fotografia exprime situações sociais, e cada
momento imagético é duplo: conserva uma face no presente atual da matéria e
outra no passado virtual da memória. Martins (2011) ainda acrescenta a
importância da fotografia como objeto de representação de imaginários
socialmente partilhados. A partir das imagens, é possível compreender
alterações
socioculturais
e
urbanas,
perceber
aspectos
ímpares
da
sociabilidade de grupos e sujeitos fotografados (TACCA, 2011).
A fotorreportagem, gênero no qual Rangel mais trabalhou, guarda
particularidades dentro do que se convencionou chamar de “fotografia
documental”, que registra temas voltados para assuntos humanos ou situações
sociais e políticas, preocupando-se com eventos que afetam a vida cotidiana
das pessoas retratadas e suas condições de vida. E é precisamente dentro da
fotografia documental, segundo Rouillé (2009), que se pode observar, no início
do século XX, uma virada de tendência em direção à fotografia que dá mais
relevância ao aspecto expressivo. Ora, a fotografia possui valor documental,
que varia segundo seu uso; a fotografia-documento não se separa da
fotografia-expressão, pois inclui “a imagem, com suas formas e sua escrita; o
autor, com sua subjetividade; e o outro, enquanto dialogicamente implicado no
processo fotográfico” (ROUILLÉ, 2009: 19-20).
Dentro dessa concepção de fotografia, que alia valor documental e
expressividade poética, nasce, em meados dos anos 1930, a fotorreportagem
de caráter humanista – cujo tipo ideal seria Cartier-Bresson –, a partir da qual o
universo cotidiano popular e o elemento social passam a ser fundamentais. Na
fotorreportagem, domina, segundo Rouillé (2009), a exterioridade em relação
aos acontecimentos, a captação do “instante decisivo” – síntese de um evento
– e a transparência da imagem – distância focal normal, sem flash.
No entanto, no caso específico de Rangel, o que notamos, numa
primeira aproximação, é a subversão – pelo menos parcial – desse modelo, na
medida em que ele se coloca, muitas vezes, na situação fotografada (figura 1),
de modo a não posicionar-se alheio aos eventos e fatos; ele está ali, como
seus interlocutores, vivendo a mesma condição colonial, alvo, ele também, de
estigmas e segregações.
Figura 1 – “Bar Texas”, Ricardo Rangel, Lourenço Marques (Maputo), 1970. Fonte: Rangel
(2004b).
A obra de Rangel pode ser tomada, de início, como portadora de valor
documental e memorialístico, como expressão poética e narrativa, circunscrita
em certo momento histórico, o que permite analisar as referências e dinâmicas
socioculturais do período e entender a construção da memória e dos processos
de luta anticolonial. O intuito, ao voltar meus interesses para as fotografias de
Rangel, não é olhar e contar o passado “como ele, de fato, foi”, mas apropriar-
me “de uma reminiscência, tal como ela relampeja num momento de perigo”
(BENJAMIN, 1994: 224). A equação de Benjamin (2006: 473) sugere, aqui, que
a história está ligada à ideia de rememoração, de construir uma experiência
relevante com o passado, sendo que tal experiência viria do choque frontal do
presente contra o passado, o que colocaria o presente numa situação crítica.
Benjamin (1994: 94), em Pequena História da Fotografia, de 1931,
confere a certas imagens uma magia, uma aura: “depois de mergulharmos
suficientemente fundo em imagens assim, percebemos que também aqui os
extremos se tocam: a técnica mais exata pode dar às suas criações um valor
mágico que um quadro nunca terá para nós”. Nessas imagens, não obstante
toda técnica e perícia, procura-se “a pequena centelha do acaso, do aqui e
agora, com a qual a realidade chamuscou a imagem”. O que Benjamin (1994:
94) insinua está ligado à sua concepção de “atualização” da memória, tal qual
sua teoria da história, pois a “magia” da foto faz com que o observador busque
aquele “lugar imperceptível em que o futuro se aninha ainda hoje em minutos
únicos, há muito extintos, e com tanta eloquência que podemos descobri-lo,
olhando para trás”.
O que se procura no instantâneo fotográfico é a transmissão de
experiências, a possibilidade de salvar o que não pode ser esquecido e que
deve, portanto, construir uma memória de algo que, de outro modo, perde-se
por não ser testemunhável e que não encontra uma saída transmissível (DIDIHUBERMAN, 2003). Com as imagens, os sentidos não são dados e fixados a
priori; por isso, é preciso articular passado e presente, mediante uma dialética
de rememoração e atualização, tal qual a equação de Benjamin (1994), pois é
daí
que
irrompem
as
“imagens
dialéticas”,
“lampejos”,
“iluminações
momentâneas”, devido à ambiguidade e à abertura que as fotografias
carregam.
A ideia de trabalhar as fotografias de Rangel é rememorar e recuperar a
potência das imagens sobre o colonialismo e o processo de libertação de
Moçambique, estendendo seu alcance no presente. A tentativa de despertar
uma sensibilidade para as memórias imagéticas, a partir de Rangel, justifica-se
porque sua potência, sua magia, vai além do texto (CAIUBY NOVAES, 2008;
MACDOUGALL, 2006). Nesse sentido, o desafio de olhar para uma imagem
está no fato de que esse olhar não é uma rua de mão única. Segundo Mitchell
(2002: 118), as fotografias são dotadas “com a unidade independente que torna
possível que elas nos olhem de volta, ao mesmo tempo em que mantém seus
segredos”.
É exatamente esse retorno que constitui a potência da fotografia, na
medida em que ser afetado pelas imagens, para usar a corrente expressão de
Favret-Saada (2005), é reacender o passado no presente, rememorar a história
e atualizá-la no momento coevo. Todavia, para que isso se torne viável, é
necessário conferir um enquadramento contextual no interior do qual essas
imagens puderam ser produzidas. Isso pode permitir melhor localizar a obra de
Ricardo Rangel dentro do colonialismo português tardio.
3. Breve contextualização do colonialismo português em Moçambique
Foi no fim do século XV, segundo Cabaço (2009), que foram feitos os
primeiros contatos de europeus e os povos da costa que compreende o atual
Moçambique. Desde então, o litoral atlântico e oriental integrou-se ao comércio
internacional, sobretudo como fornecedor de escravizados. A partir do século
XIX, o imperialismo europeu deu novo passo no processo de mundialização do
capital. África e Ásia foram incorporadas à ordem europeia, que se utilizou,
inclusive, do discurso “civilizador” como justificativa a uma função econômica
precisa (FERRO, 2004). É interessante notar que, diferentemente do
colonialismo do século XVI, cuja meta era a obtenção de especiarias, metais
preciosos e escravos, o “neo” colonialismo buscou, além do fornecimento de
matéria-prima e mercados consumidores de manufaturas, uma “dimensão
imperial
moderna”
(RIBEIRO,
2004).
Todavia,
antes
dessa
fase
do
imperialismo, Portugal já havia implementado protetorados em Angola e
Moçambique, o que lhe daria subsídio para pleitear esses e outros territórios na
partilha do continente africano1.
Não se pode falar de uma expansão imperialista europeia de modo
genérico; ela se moveu pela mesma sede de prestígio e poder, mas “as
características da expansão ocidental foram variadas na medida em que eram
1
A definição das regras para a divisão da África ocorreu com a Conferência de Berlim, de
1884-1885, onde se reuniram, entre outros, Grã-Bretanha, França, Portugal e Bélgica. A partir
daí, as nações europeias construíram seus impérios coloniais em África. O complemento do
Congresso de Berlim ocorreu em Bruxelas, em 1890, quando se definiu a organização dos
serviços administrativos e militares, as bases do comércio e, ainda, a restrição da compra de
armas de fogo pelas populações autóctones dos territórios conquistados (SILVA, 2003).
diversos seus agentes”, no que se refere à cultura, visão de mundo e tradição
do colonizador, que configurou uma prática colonial com distintas formas
(THOMAZ, 2002: 20). Desse modo, o “terceiro império português” (RIBEIRO,
2004; THOMAZ, 2002) carrega uma história específica em sua configuração,
em sua justificativa e em seu projeto de incorporar populações nativas.
A ordem colonial funda-se e estrutura-se em múltiplos dualismos,
concebidos sobre a oposição colono/colonizado, que, de fato, estipula uma
relação de superioridade-inferioridade, pautada nas questões de raça e
civilização. É nesse sentido que Cabaço (2009: 22) vai afirmar: “não existe, até
fins do século XIX, uma política de identidade, já que a ‘assimilação
unificadora’ era fundamentalmente uma declaração de princípios, expressa em
textos legais e em pronunciamentos políticos, de inspiração liberal, mas sem
consequências práticas”.
No fim de século XIX, a consolidação da ocupação dos territórios
portugueses tratou de definir o lugar das populações e regularizar as formas de
trabalho, dado que o escravismo não era mais aceito nos círculos políticos
ocidentais. Tendo em conta o sucesso de ideias do evolucionismo social, o
projeto assimilacionista foi embasado por um racismo aberto, que não supunha
qualquer igualdade entre colonos e colonizados. O Ato Colonial, promulgado
em 1930, no Estado Novo de Salazar, é decisivo para a alteração da estratégia
colonial vigente, pois define o quadro jurídico-institucional da nova política para
os territórios além-mar, abrindo uma fase mais nacionalista e centralizadora,
fruto de uma nova conjuntura externa e interna, traduzida numa orientação
diversa de aproveitamento das colônias (ROSAS apud THOMAZ, 2002).
A teoria do lusotropicalismo, de Gilberto Freyre, surge, então, para
justificar e preservar o império além-mar, a nação portuguesa e o regime
ditatorial2. Segundo Castelo (2013), essa teoria não teve sucesso nas camadas
2
Vecchi (2010), Ribeiro (2004) e Castelo (2013) localizam as bases do lusotropicalismo em
Casa-Grande & Senzala ([1933] 2013), de Freyre, sendo que vestígios mais coesos surgem
nas Conferências na Europa (1938) e em sua versão revista, O mundo que o português criou
(1940). A nova formulação é explicitada, contudo, nas palestras que integram Um brasileiro em
terras portuguesas (1953). A Integração portuguesa nos trópicos (1958) e O luso e o trópico
(1961) teorizam e contribuem, por fim, para a sua difusão. Segundo os autores, o discurso
lusotropicalista postula a capacidade de adaptação dos portugueses aos trópicos, não só por
interesses econômicos, mas, sobretudo, por empatia inata e criadora. A aptidão do português
para se relacionar com terras e gentes tropicais, sua plasticidade intrínseca, resultaria de sua
própria origem étnica híbrida.
políticas do regime até a década de 1950, sendo conhecido, até aí, apenas nas
camadas intelectualizadas. O ponto de rejeição, por parte dos dirigentes
políticos, ao lusotropicalismo era o elogio à mestiçagem; já o aspecto do
pensamento de Freyre que era consensual, nos anos 1930-1940, era a
confirmação da capacidade portuguesa para a colonização, isto é, sua
adaptação aos trópicos e sua boa relação com os povos colonizados. É só no
segundo pós-guerra, frente às pressões das resistências nacionalistas
africanas e internacionais, sobretudo da ONU, que emergem os processos de
descolonização, fortemente marcados por lutas de independência. Com a
crescente pressão internacional, Portugal delineia uma nova argumentação
para legitimar a manutenção de suas colônias em África: Salazar revoga o Ato
Colonial, em 1951, para alterá-lo e integrá-lo à Constituição, com pequenos
ajustes de terminologia, essencialmente3.
A difusão do discurso lusotropical não se circunscreve aos circuitos
internacionais da diplomacia, mas se constrói pela propaganda – em Portugal,
nas “províncias ultramarinas” e internacionalmente – e, ainda, como
autorrepresentação no senso comum e na retórica política (ALMEIDA, 2000).
Essa propaganda, baseada na simplificação do lusotropicalismo, quis moldar
pensamento e ação de colonos e agentes coloniais. Assim, a censura às
denúncias de abusos, violências e segregações dentro de Portugal e suas
“províncias” coibia o desvelamento da realidade conturbada e racista, que,
todavia, era negada – no intuito de conservar sua viabilidade.
A “assimilação” – depois “integração” – não fazia do colonizado membro
da nação portuguesa. Primeiro, por fatores objetivos – isto é, ausência de
infraestrutura da administração colonial –, e, segundo, por fatores subjetivos –
ligados à falta de vontade e empenho dos colonos e da burocracia e pela
dinâmica de “autoproteção dos privilégios e mordomias, expressos nas
barreiras racistas que se erguiam [...], cerceando a mobilidade social que a
legislação anunciava” (CABAÇO, 2009: 118). Desde a década de 1950,
multiplicavam-se greves e manifestações contra a ordem colonial. Em
Oficialmente, Portugal “constitui uma comunidade multirracial, composta por parcelas
territoriais geograficamente distantes, habitadas por populações de origens étnicas diversas,
unidas pelo mesmo sentimento e pela mesma cultura. Como se comprova pela leitura [...] de
Freyre, o poder exercido nas ‘províncias ultramarinas’ portuguesas não é de natureza colonial,
ao contrário do que sucede em territórios sob soberania de outros países” (CASTELO, 2013,
s.p.).
3
contrapartida, o regime português acentuou, nos territórios ultramarinos,
mecanismos
administrativos
e
repressivos,
discriminações
raciais
e
intervencionismo direto.
Isso foi de encontro com a ideologia lusotropical propalada pelo governo.
E é tal contradição que Rangel apontou em suas fotografias: o discurso
lusotropical sobre a vocação portuguesa e sua boa índole com os colonizados
esbarrava nas barreiras raciais e segregacionistas (figura 2). Dessa forma, a
realidade em Moçambique estava distante da descrita por Freyre e pelo
governo português. A cidade e o campo eram palco de repressão constante, já
que uma miríade de práticas discriminatórias e de marginalização representava
a vida em Moçambique, expressão maior “de um sentimento de ‘casta
superior’, profundamente enraizado no subconsciente de cada colono e no
consciente colectivo da comunidade branca” (CABAÇO, 2009: 224).
Figura 2 – “Homens e Serventes”, Ricardo Rangel, Lourenço Marques (Maputo), 1957. Fonte:
Calado (2005).
É nesse contexto que, na década de 1950, emerge o trabalho de
Rangel, engajado na denúncia do sistema colonial. É o momento, também, em
que o governo português combate mais assiduamente as resistências
anticoloniais. A guerra de libertação nacional – para Portugal, “guerra
subversiva” –, iniciada em meados de 1960, acirrou ainda mais as contradições
dentro do regime administrativo português.
Refletindo a memória como experiência, Benjamin (1994) percebeu que
ela é uma das mais épicas das faculdades humanas, já que permite a
apropriação singular da história e das estórias e sua potencial transmissão.
Porém, no processo de construção da memória, corre-se o risco dela congelarse entre dois extremos: de um lado, de uma memória expressa na forma de
trauma – os “traumatismos da memória”, como se referiu Paul Ricoeur (2007) –
, não elaborada e sempre menos representável e transmissível quanto mais ela
se distancia do evento; de outro, de uma “memória como dever”, digamos
assim, própria das datas comemorativas, das celebrações, dos museus e
demais “lugares de memória” (Nora, 1993), sempre mais esquecida de sua
própria história justamente porque transformada em monumento estático e
celebrativo apenas.
Quem recorre ao passado por meio da memória pode se deparar,
eventualmente, com restos, traços, fragmentos de história. Quando os restos
são vertidos em fontes de testemunho, eles passam a carregar, então, um valor
documental. E os documentos, segundo Le Goff (2003), nunca são inócuos:
são, antes de tudo, coisas que ficam, que permanecem, traços que perduram
no tempo e no espaço; são o resultado de uma recoleção feita por quem volta
ao passado para contar a história a partir de vestígios muitas vezes esquecidos
ou silenciados (OLIVEIRA, 2013). Testemunha desse período, Rangel buscou
registrar e questionar o colonialismo, ocupando um lugar dentro desse
contexto, sendo, atualmente, considerado o maior fotógrafo moçambicano4.
Assim, esse é um período histórico conturbado e ainda disputado em sua
constituição enquanto memória. Sendo assim, a preocupação, aqui, é contar
essa história pelo visual, pelos detalhes, pelos gestos, atentando para a obra
de Rangel, sua trajetória e as condições de possibilidade de sua produção,
avaliando a construção de uma experiência e de uma memória fotográfica.
4. Memórias e histórias: a fotografia de Ricardo Rangel
A fotografia, sobretudo no que diz respeito às narrativas coloniais e póscoloniais em África, desempenhou papel importante na produção de memória.
4
A obra de Rangel alcançou, no final do século XX, certo reconhecimento internacional,
evidenciado pelas exposições organizadas em África, Europa e Estados Unidos – como no
Guggenheim Museum, de Nova York, em 1996. Algumas das exposições estão disponíveis em:
http://www.afronova.com/Ricardo-Rangel.html. Acesso em: 21/09/2014.
Em Moçambique, pode-se afirmar que, antes de Rangel, a população local era
quase ausente da representação imagética, parte de uma imagem etnográfica,
peça da paisagem e definida dentro do “exotismo” (SORRINI, 2013). Em
relação às imagens de Moçambique colonial, criadas por diversos agentes
(institucionais e individuais), nota-se uma continuidade: a população “originária”
está ausente ou aparece secundarizada nas imagens, estereotipada, objeto
“etnográfico”. Se a fotografia esteve, desde cedo, presente na região, era como
instrumento de retrato e identificação do colonizador (TEIXEIRA, 2012). É
nesse âmbito que a prática de Rangel surge como precursora da fotografia
moçambicana (SOPA, 2002).
A grandeza e a ruptura do projeto fotográfico de Rangel residem, no
limite, em sua postura ética e na prática metodológica, inventivas na
abordagem do complexo universo colonial. Pode-se perceber, em algumas de
suas obras, uma sensibilidade e uma capacidade de tornar visível o invisível. A
denúncia do colonialismo e de sua violência é um ingrediente chave no exame
de sua produção; mas não o único, pois suas imagens insistem mais na
censura que esse discurso produz, na ocultação da realidade que está diante
dos olhos de todos, mas que ninguém consegue ou quer “ver” (Teixeira, 2012).
Rangel busca capturar o que se esconde por trás das dobras do cotidiano – foi,
aliás, o que José Craveirinha (2008: 21-22) notou: “Deste-nos o verso e o
inverso da vida [...], dá-nos simultaneamente o explícito e o implícito”.
A fala de Craveirinha aponta para o movimento de levar o fotojornalista
às galerias, já nos anos 2000. A exposição “Iluminando vidas: fotografia
moçambicana (1950-2001)” levou 25 fotos de Rangel, além de outras 100
imagens de 14 fotógrafos, antigos alunos do CDFF, a lugares como Suíça,
África do Sul e Portugal, entre 2002 e 2005 – em Maputo, foi exposta em 2003,
no período de 26 de abril a 25 de maio, na AMF.
Além disso, ocorreram, em Maputo, as exposições “Ricardo Rangel: 50
anos de fotojornalismo em Moçambique”, em 2008, “Revisitar Ricardo Rangel”,
em 2010, e “Ricardo Rangel e o jazz”, em 20115. Com efeito, esse período
“Ricardo Rangel: 50 anos de fotojornalismo em Moçambique”, retrospectiva realizada no
Centro Cultural Franco-Moçambicano, de 21 de outubro a 22 de novembro de 2008, Maputo.
“Revisitar Ricardo Rangel”, exposição fotográfica ocorrida no Centro Cultural Kulungwana, de
10 de junho a 15 de julho de 2010, Maputo. “Ricardo Rangel e o jazz”, exposição realizada no
Centro Cultural Kulungwana, de 03 de novembro a 27 de novembro de 2011, Maputo.
5
congrega também as mais relevantes análises do trabalho de Rangel. Trata-se
de livros compostos por artigos de amigos (jornalistas, fotógrafos, escritores,
políticos), dedicados, sobretudo, a prestar homenagem à obra de Rangel e
localizá-la no panorama artístico e político moçambicano, como a organizada
por Couto (2008), “Ricardo Rangel: Homenagem de amigos”, Z’Graggen e
Neuenburg (2002), “Iluminando Vidas: Ricardo Rangel e a fotografia
moçambicana” e Honwana (2010), “Revisitar Ricardo Rangel”. Ainda a respeito,
e em homenagem, ao fotógrafo, em 2006, foi lançado o documentário “Ferro
em Brasa”, de Licinio de Azevedo6.
Rangel possui, ainda, três ensaios fotográficos publicados: “Ricardo
Rangel: Fotógrafo” (2004a), “Pão Nosso de Cada Noite” (2004b) e “História,
Histórias… 50 Anos de Fotojornalismo em Moçambique” (2008). Destes, o mais
notável é “Pão nosso de cada noite”, que reúne as imagens da Rua Araújo, das
décadas de 1960-1970, e sua vida noturna. Outra publicação dele, “Fotojornalismo ou Foto-confusionismo” (2002), traz um debate sobre os caminhos
do fotojornalismo, sua função, possibilidade e alcance.
Essa ida às galerias, bem como sua entrada no sistema artístico
mundial, de certa forma, demonstra a apropriação do trabalho de Rangel como
figurativo de um símbolo nacional, que, com sua fotografia, ajuda a construir a
ideia da nação, sua memória. Juntamente com outros intelectuais e artistas,
Rangel encabeça um processo de reflexão e legitimidade quanto à história do
país. Aliás, esse processo dá materialidade a uma memória difícil de ser
lembrada, mas também difícil de ser esquecida. Como narrar sem sufocar os
silêncios, as hesitações, as lacunas e as ambiguidades? Ora, as fotografias de
Ricardo Rangel configuram um olhar que procura o que o modelo estabelecido
tende a ocultar, “sua ‘estranheza’, seu ‘desbotamento’ e suas ‘elipses’,
‘incoerências’, ‘emendas suspeitas’ e ‘comentários tendenciosos’” (DAWSEY,
1999: 44).
“Ferro em Brasa”. Diretor: Licinio de Azevedo. Produtora: LxFilmes. França, Moçambique e
Portugal. 2006. 48 min.
6
Figura 3 – “Ferro em Brasa”, Ricardo Rangel, Lourenço Marques (Maputo), 1973. Fonte:
Rangel (2004a).
“Ferro em Brasa” (figura 3), de 1973, talvez umas das imagens mais
marcantes do fotógrafo moçambicano, revela um menino pastor, marcado por
seu patrão por haver perdido uma cabeça de gado. A imagem condena de
maneira contundente as escolas de pensamento que pregavam a humanização
do discurso colonial, como o lusotropicalismo, uma vez que desvela toda
arbitrariedade e crueldade do colonialismo português. O valor do pastor não é
superior ao do animal.
A imagem é uma denúncia da propaganda salazarista: evidencia a
violência física e torna palpável a violência simbólica, própria à cotidianidade
colonial. “Ferro em Brasa”, por isso, é uma das sínteses do trabalho de Rangel,
o que o torna único se considerarmos a aspereza do momento captado, bem
como a amargura na expressão do garoto. Mais que a violência explícita na
marca da testa, inquieta o espanto petrificado escondido nos olhos do menino,
neutro, impassível, perdido. O olhar encarna o horror que se faz normalidade, a
exceção que se faz regra (VECCHI, 2010).
A câmera de Rangel se volta para os oprimidos – não denuncia os
opressores, mas o sistema que os produz. Esse é um dos vetores de seu olhar:
a materialização da realidade social que o envolvia, da violência em que ela se
assentava. Tal dimensão da abordagem rangeliana à situação de Moçambique
tem, inclusive, um aspecto de manifesto. Sua obra enfrenta, com isso, a
autoimagem colonial que a metrópole buscava transmitir, já que a retórica do
lusotropicalismo não se restringia, apenas, a uma estratégia discursiva,
funcionando como autoconsciência, vivenciada por muitos de seus agentes.
Em Rangel, os sujeitos não são “etnográficos”, “paisagísticos”, mas também
não o são vitimizados. Como em “Ferro em Brasa”, suas imagens são
tentativas de romper com a história dos vencedores e trazer à tona “os ecos de
vozes que emudeceram”, para usar o léxico benjaminiano. Esse eco ressoa na
imagem do olhar mudo do menino pastor, bem como em outras fotos, que não
retratam seus interlocutores como vítimas, mas como subalternos do sistema
colonial.
Trazer a fotografia para rememorar e atualizar o período colonial
moçambicano deixa entrever a vontade de mostrar outras visibilidades e
memórias, outras histórias. O que a fotografia pode capturar é, justamente, a
potência dos oprimidos e emudecidos da história, na medida em que se volta
para eles num momento de “iluminação momentânea”, de modo a capturar
uma experiência. Ao recordar imageticamente esses eventos, atualizando-os,
as fotografias de Rangel tentam “escovar a história a contrapelo” (BENJAMIN,
1994: 225).
Em suas imagens explodem as contradições, num jogo de justaposições
e conjugações de situações tantas vezes ambivalentes (figura 4), apresentando
as agruras e vicissitudes que o país atravessava e exibindo a “beleza trágica”
de um país em crise e construção. Seus registros datam, com efeito, do
período colonial “tardio”, do processo de urbanização e independência e dos
desdobramentos da luta por emancipação. Por intermédio da fotografia de
Rangel, pode-se antever as emendas, incoerências, o esquecido da história,
apreender alguns importantes aspectos de denúncia e expressão, rastros de
violência e racismo que assinaram com sangue o período, deixando as
imagens falarem e revelarem os possíveis daqueles eventos.
Figura 4 – “Exposição de Arte”, Ricardo Rangel, Lourenço Marques (Maputo), 1961. Editada.
Fonte: Rangel (2004a).
5. Considerações finais
O estudo das imagens permite aprofundá-las, pensar com, através e
além delas, já que o trabalho antropológico deve envolver o modo fotográfico
de olhar para os agentes sociais, a rua, a cidade, e pensar a lógica que
abrange essa experiência, o que permite, ainda, manipular o material de
Rangel, retirando-o de seu silêncio próprio, da imagem isolada, recombinandoas e procurando semelhanças para criar séries, bem como novos arranjos, a
partir de padrões materiais, formais e temáticos. Segundo Ginzburg (2007), a
análise de imagens deve seguir rastros, traços, resquícios, elementos que,
somados, permitem montar conjuntos que (re)contam as histórias e narrativas
que daí emergem.
É preciso pensar até que ponto as fotografias de Rangel sinalizam
temporalidades e territórios outros, paradoxais e ocultos. É nessa medida que,
acredito, as imagens do fotojornalista moçambicano sobre o período colonial
em seu país oferecem elementos importantes para uma compreensão dessa
história. As questões sugeridas por Assmann (2002), nesse sentido, podem ser
importantes, visto que enquadram a memória coletiva de um país, adquirida e
elaborada a partir da transmissão de experiências, como construção simbólica,
perpetuada por textos, monumentos e imagens. Em especial, a fotografia seria
um mediador exemplar de suporte da memória social e de transmissão de
experiências.
Por sua vez, Samain (2012) propõe verificar a forma pela qual as
imagens nos fazem pensar, como veiculam conhecimento e como estabelecem
relações de sentidos ao combinar dados (traços, cores e relevos) e ao
associarem-se com outras imagens. Isso é possível porque as imagens
participam das histórias e memórias que as precederam, daquelas que fazem
face ao momento em que foram produzidas e, ainda, de um futuro possível, ao
reformular-se em outros usos e direções. Didi-Huberman (1998: 161), em
sentido semelhante, sugere perceber a imagem como vivência, experiência e
sobrevivência que atravessa e se nutre do tempo, impondo uma dupla
distância, que se configuraria a partir de “um jogo assimétrico do próximo e do
longínquo”.
Figura 5 – “Rua Araújo”, Ricardo Rangel, Lourenço Marques (Maputo), 1960. Fonte: Rangel
(2004b).
A obra de Rangel vai além do questionamento da retórica, e realidade,
colonial; ela marca e faz sensível e assimilável esse mundo. A figura 5
apresenta traços da efervescência da noite de Lourenço Marques e, também, a
marca colonial em seu registro. Tal imagem condensa e multiplica várias
interpretações, possibilita
ao “leitor”,
com uma
imagem singela,
um
desdobramento, um questionamento. Essa é uma de suas características
narrativas mais visíveis: justapor contradições, favorecer a ambiguidade,
revelar espaços, resquícios e ecos que sussurram abaixo de uma superfície
tomada dentro da aparência da normalidade.
A arte da narrativa está, justamente, em evitar explicações, pois o leitor
“é livre para interpretar a história como quiser, e com isso o episódio narrado
atinge uma amplitude que não existe na informação”, de tal modo que a
narrativa “conserva suas forças e depois de muito tempo ainda é capaz de se
desenvolver” (BENJAMIN, 1994: 203-204). Dessa forma, o material da imagem
tem de ser complexificado, transformando as fotografias, aparentemente
simples, em “iluminações profanas”. Nesse sentido, compreendemos que as
fotografias de Rangel logram provocar um impacto sensorial, um conhecimento
sensível
que
tomamos
como
campo,
como
experiência
fotográfica,
propriamente dita.
Restam muitas questões, obviamente. O que as imagens de Rangel
permitem
conhecer
e
compreender
sobre
o
colonialismo
tardio
em
Moçambique, e quais os mecanismos narrativos que ele mais utilizou para a
construção de uma memória desse período? Vale dizer: quais os limites e
possibilidades de seu trabalho fotográfico, primeiro, na construção de uma
memória de Moçambique, e, segundo, na transmissão de experiências? Afinal,
qual o potencial de suas imagens na geração de novos conhecimentos sobre o
evento traumático que foi o colonialismo? E, enfim, em que medida sua obra
pode ser tida como instrumento de transmissão de experiência sobre esse
passado? Estas são perguntas ainda por responder.
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