Produto: EST_SUPL1 - SABATICO - 2 - 13/03/10
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S2 sabático
O ESTADO DE S. PAULO
SÁBADO, 13 DE MARÇO DE 2010
Prosa de
Sábado
SÉRGIO
AUGUSTO
[email protected]
O
ano mal começou e já temos um
escândalo na bibliosfera. E na
mesma Alemanha onde há seis
anos um professor de literatura
acusou Nabokov de haver plagiado a Lolita
que um obscuro Von Lichberg inventara
quatro décadas antes. Na primeira semana
de fevereiro, um blogueiro berlinense dedurou a escritora Helene Hegemann como
plagiária de outro blogueiro. Para o seu romance de estreia, Axolotl Roadkill, sarabanda de sexo e drogas nos clubes noturnos de
Berlim, Hegemann contrabandeou trechos de Strobo, versão impressa de um diário criado na web por um internauta que se
assina Airen.
O diário de Airen encalhou nas livrarias; o
remix de Hegemann virou best seller e ainda
ficou entre os finalistas do prêmio literário
da Feira de Livros de Leipzig, cujos jurados
ne, para ela, nascida em 1993, o remix é um
direitonaturalesamplear,um verbotransitivo.“Nãoexiste originalidade,sóautenticidade”, eximiu-se, sem tampouco identificar a
fonte desse aforismo, que, apesar do timbre
sartriano, tem a assinatura de um cineasta,
Jim Jarmusch. E é outro remix.
Antes de ser reprocessada por Jarmusch,
a ideia de que a criação original não passa de
um devaneio viajou pelo menos 23
séculos. De Terêncio (“Não há nada a ser dito que não tenha sido
dito antes”) a David Shields, passando por Nietzsche, Picasso (“Arte é roubo”), Eliot (“Os poetas imaturos imitam, os maduros roubam”), Joyce (que se autoproclamou
mestre na arte de copiar & colar), Borges (para quem todos os escritores são
fiéis amanuenses do espírito, tradutores
e anotadores de arquétipos pré-existentes, daí sua tese de que cada autor cria os
seus próprios precursores) e outros descrentes da originalidade absoluta.
Por muitos séculos o que se dizia e escreviafoiconsideradopatrimônio público,palavras literalmente ao vento, barata-voa. Os
romanos reescreviam os gregos e vice-versa, sem remorso, sem ameaça de processo
judicial. No império romano, chamavam de
plagiarus o ladrão de escravos ou crianças,
não o de ideias ou textos. Virgilio gatunou
Homero, Aristófanes pegou em charco
alheio a trama de As Rãs, Shakespeare fez de
Plutarco o seu banco de dados biográficos,
Chaucer meteu a mão em Boccaccio.
O conceito atual de plágio tem apenas 500
anosdecirculação.Constatersidoinventado pelo dramaturgo inglês Ben Jonson, e
só se consolidou como delito depois que
DIVULGAÇÃO
DESCOBERTA
Borges e Vinicius em
diálogo sobre a beleza
português. É uma conversa organizada pela
jornalista argentina OdileBaron Supervielle
e que Vinicius trata de tornar descontraída.
Em meio a discussões sobre morte, amor e
bebida, o poetinha pergunta ao portenho (já
cego àquela altura) como ele percebe a beleza feminina. O escritor responde que pode
senti-la,mas que não aconsidera fundamental. “Há feias que são amadas”, diz, ao que
Vinicius reage: “Mas muito, muito feias,
não, Borges. Há feias que não têm remédio.”
Informal. Brasileiro tentou
descontrair o argentino
PARCERIA
lhe rendeu em 2002 o Booker Prize e uma
suspeita internacional de ter plagiado Max
e os Felinos (L&PM), do gaúcho Moacyr
Scliar. Complexa alegoria sobre o Holocausto, Beatriz e Virgílio começa com uma sátira
ao mercado editorial. A trama inclui um
escritor premiado que sofre bloqueio criativo após ser acusado de plágio.
tários de André Telles e Rodrigo Lacerda, a
Zahar acaba de fechar com a dupla um trabalho nos mesmos moldes para outra obra
de Alexandre Dumas, Os Três Mosqueteiros –
em geral, só encontrada em adaptações. A
mais recente edição integral, traduzida por
Fernando Py para a Ediouro, está fora de
catálogo. A da Zahar sai em novembro.
TRADUÇÃO 1
INTERNET
Como funciona a ficção
França x Google
A Cosac Naify comprou os direitos de
How Fiction Works, do celebrado crítico
literário da New Yorker James Wood. Lançado nos EUA em 2008, o livro, que busca
destrinchar os mecanismos da criação literária, foi considerado um dos melhores
títulos do ano pela Economist, mas teve
recepção negativa de veículos como o New
York Times. O jornal encerrou resenha sobre a obra com um ácido “há uma questão
que este volume responde de forma conclusiva: por que leitores cochilam”. Não
menos enfático em suas próprias opiniões, Wood analisa Tolstói, Henry James, Don DeLillo e outros.
A batalha entre a França e o Google em torno da digitalização de livros saiu dos gabinetes de Bruxelas e do Silicon Valley e ganhou
versão literária na França – e com duelo no
enredo. O presidente da Biblioteca Nacional da França, Bruno Racine, e seu antecessor no cargo, Jean-Noël Jeanneney, dois
nomes irrepreensíveis do mundo cultural
francês, trocam farpas em ensaios recentes.
Os primeiros títulos da Penguin Companhia Clássicos, parceria que as editoras brasileira e britânica fecharam no ano passado,
saem por aqui no próximo semestre. Um
deles será uma coletânea de textos de Joaquim Nabuco organizada e comentada por
Evaldo Cabral de Mello. Schwarcz também
sugeriu três clássicos brasileiros para a Penguin, que se interessou em editá-los nos
EUA: os nomes são segredo bem guardado.
RETORNO
O Holocausto, por Yann Martel
Previsto para sair em língua inglesa no mês
que vem, o romance Beatriz e Virgílio, do
canadense Yann Martel, já está em tradução pela Nova Fronteira. O autor não publicava nada desde A Vida de Pi (Rocco), que
TRADUÇÃO 2
Mosqueteiros na íntegra
Depois de pôr nas livrarias O Conde de Monte Cristo, com tradução na íntegra e comen-
FICÇÃO
NÃO FICÇÃO
1.
1.
2.
Com a serrote #4 saindo do forno por estes
dias, o Instituto Moreira Salles já tem uma
pepita garantida para a quinta edição da revista, que chega às livrarias apenas em julho.
Trata-se de um bate-papo entre Vinicius de
Moraes e Jorge Luis Borges, datado de 16 de
setembro de 1975 e quase nada conhecido
por aqui. A transcrição do diálogo foi localizada no anuário do La Vanguardia pelo poeta Eucanaã Ferraz, consultor literário do
IMS, e terá agora a primeira tradução para o
O editor Luiz Schwarcz, da Companhia das
Letras, acaba de voltar de uma espécie de
“estágio” de mais de um mês na Penguin
americana, com sala própria na empresa e
encontros com responsáveis por vários braços do grupo. No retorno ao País, deu palestra sobre a viagem aos editores sob seu comando – alguns deles também devem passar uma temporada em Nova York.
as criações artísticas passaram ser tratadas
como mercadorias. Não é crime, assegurou
um estudioso do assunto, Thomas Mallon,
em Stolen Words. Mas é coisa feia, acrescentou. Para em seguida perguntar: “Ou será
que não é?”
O grande crítico canadense Northrop
Frye tinha lá suas dúvidas. Ele ridicularizou
as noções de individualidade defendidas pelos românticos e as leis de direitos autorais
que as protegem e perpetuam. Não tem lógica considerar o indivíduo anterior, acima
ou à margem da sociedade, argumentou
Frye, na segunda metade dos anos 1950.
Para ele, a poesia só pode ser feita a partir de outra poesia e o romance a partir de
outro romance.
Nesse trem, como era esperado, muitos
pilantras também pegaram carona. Condenada ou relevada, quando não estimulada
(sob o disfarce de homenagem ou com o
fidalgo nome de bricolagem), a pirataria literária desafia nossas maneiras canônicas
de distinguir joias de ouropéis, impasse que
a universalização da cultura pelo Google e
outros demiurgos eletrônicos agravou tremendamente. Por falta de claque ela não irá
definhar.
Há duas semanas, saiu em Nova York um
manifesto em favor da “apropriação artística”, Reality Hunger, escrito por David Shields,oumelhor, compilado, poiso autorvaleuse quase que exclusivamente de centenas de
frases e teses alheias favoráveis à pilhagem.
Shields inventou a metapirataria. Enfunemos nossas velas.
(Na elaboraçãodeste artigoforam utilizadas
informações colhidas em textos de Randy
Kennedy, Laura Miller, Tobias Rapp,
Morris Friedman e do autor da coluna.)
Mais vendidos
Babel
Troca de experiências
CARLINHOS MÜLLER / AE
PIRATAS
DA PENA
DE PAU
se curvaram à racionalização da autora:
“Não me considero ladra. O que fiz foi pôr o
material extraído de outro contexto em nova perspectiva, estabelecer um diálogo.”
Se pretendia estabelecer um diálogo com
Airen, por que disfarçou tanto sua intenção
sob a forma de monólogo?, cobrou um comentarista alemão. Por que ela não divide
parte dos direitos autorais com o autor pirateado?, sugeriu outro. O que é mais grave,
pergunto eu, roubar ou enfeitar o furto com
um laçarote teórico?
Nos anos 1980, um repórter da área de
cultura de um jornal brasileiro de grande
circulação apropriou-se da resenha de um
livrosobre David Bowie, editado pela Rolling
Stone, e, flagrado o delito, amparou-se numa
presuntiva jurisprudênciapós-moderna: como nada é original, pois tudo deriva de criações anteriores, num processo de contaminação tautológicasem fim, o plágio não existe. Alguém sugeriu que o jornalista fosse demitido do jornal, não pelo plágio em si mas
por sua justificativa, de um cinismo comparávelao “chutzpah” (expressãoiídiche, sinônimo de caradurismo), tal como a definiu
Jerry Lewis: “Chutzpah é aquele sujeito que
mata os pais e pede clemência ao juiz por ter
ficado órfão.”
Por não se sentir culpada de nada, Hegemann não pediu clemência. Por considerar
normal o que fez, não se escudou na hipótese de criptomnésia ou qualquer outra modalidade de copiagem inconsciente. Foi-se o
tempo em que a cleptomania artística era a
forma mais elevada de elogio; agora, em certos círculos, é a forma mais elevada de originalidade, a criatividade em estado puro.
Deuma geraçãocatequizadapelorelativismo cultural e mimada pela gratuidade onli-
3.
Os livros são Google et le Nouveau Monde, de
Racine, e Quand Google Défie l'Europe, de
Jeanneney. O primeiro defende o diálogo
com a gigante americana, o segundo prega
resposta organizada da União Europeia,
uma espécie de declaração de independência digital. São ideias que se confrontam,
sem estocadas pessoais – ou quase sem.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
A CABANA
William P. Young
(ÚLTIMA 1º/80 SEMANAS)
O SÍMBOLO PERDIDO
Dan Brown
ÚLTIMA 3º/16 SEMANAS)
DIÁRIOS DO VAMPIRO A FÚRIA, VOL. 3
L.J. Smith
(ÚLTIMA 9º/2 SEMANAS)
2.
3.
4.
A BATALHA DO
LABIRINTO
Rick Riordan
(ÚLTIMA 2º/3 SEMANAS)
O MAR DE MONSTROS
Rick Riordan
(ÚLTIMA 6º/6 SEMANAS)
O LADRÃO DE RAIOS
- EDIÇÃO ESPECIAL
Rick Riordan
(ÚLTIMA 4º/4 SEMANAS)
5.
6.
A MALDIÇÃO DO TITÃ
Rick Riordan
(ÚLTIMA 8º/5 SEMANAS)
7.
ALICE NO PAÍS DAS
MARAVILHAS
Lewis Carroll
(ÚLTIMA –*–/1 SEMANA)
8.
AMANHECER - LIVRO 4
Stephenie Meyer
(ÚLTIMA 5º/ 37 SEMANAS)
9.
10. ECLIPSE - LIVRO 3
Stephenie Meyer
(ÚLTIMA –*–/58 SEMANAS)
COMER, REZAR, AMAR
Elizabeth Gilbert
(ÚLTIMA 2º/100 SEMANAS)
SE ABRINDO PRA VIDA
Zibia Gasparetto
(ÚLTIMA 1º/14 SEMANAS)
O MONGE E O EXECUTIVO
James C. Hunter
(ÚLTIMA 3º/248 SEMANAS)
POR QUE OS HOMENS
AMAM AS MULHERES PODEROSAS?
Sherry Argov
(ÚLTIMA 4º/29 SEMANAS)
GUIA POLITICAMENTE
INCORRETO DA
HISTÓRIA DO BRASIL
Leandro Narloch
(ÚLTIMA 5º/8 SEMANAS)
O VERDADEIRO PODER
Vicente Falconi
(ÚLTIMA 6º/12 SEMANAS)
MENTES PERIGOSAS
Ana Beatriz Barbosa Silva
(ÚLTIMA 9º/56 SEMANAS)
UMA BREVE HISTÓRIA DO
MUNDO
Geoffrey Blainey
(ÚLTIMA 8º/91 SEMANAS)
MAIS VOCÊ – 10 ANOS
Ana Maria Braga
(ÚLTIMA 10/15 SEMANAS)
10. O SEGREDO DE LUÍSA
Fernando Dolabela
(ÚLTIMA –*–/1 SEMANA)
FONTE: INFORMESTADO. DATA DO LEVANTAMENTO: 10/3/2010
PERÍODO DE VENDA: DE 1º A 7 DE MARÇO
LIVRARIAS PARTICIPANTES: CULTURA 4 LOJAS, DA VILA 4 LOJAS, FNAC 4 LOJAS, LA-
Raquel Cozer e Andrei Netto / PARIS
SELVA 8 LOJAS, MARTINS FONTES 2 LOJAS, NOBEL 48 LOJAS, SARAIVA 21 LOJAS
}
“Escrever é uma maldição, mas uma maldição que salva. Salva a alma presa, salva a pessoa que se
sente inútil, salva o dia que se vive. Escrever é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o
último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. É também abençoar uma vida”
CLARICE LISPECTOR
NASCIDA NA UCRÂNIA EM 1920, CHEGOU
AO BRASIL COM A FAMÍLIA NO ANO DE
1922. MORREU NO RIO DE JANEIRO EM 1977
EXPEDIENTE
EDITORA EXECUTIVA: LAURA
GREENHALGH. EDITOR: RINALDO
GAMA. EDITOR ASSISTENTE: JOÃO
LUIZ SAMPAIO. REPÓRTERES
ESPECIAIS: ANTONIO GONÇALVES
FILHO, LUIZ ZANIN ORICCHIO,
UBIRATAN BRASIL. REPÓRTER:
RAQUEL COZER. REDATORAS:
MARIA DA GLÓRIA LOPES,
REGINA CAVALCANTI. DIRETOR
DE ARTE: FÁBIO SALES. EDIÇÃO
DE ARTE: ANDREA PAHIM. DIAGRAMAÇÃO: GUSTAVO TORTELLI
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