Alcides Bezerra
A Filosofia na Fase Colonial [1]
(1936)
Prefácio
Na conferência A Filosofia na fase colonial, que proferi, no dia 24 de julho de
1930, na Sociedade Brasileira de Filosofia, dignamente presidida pelo general Moreira
Guimarães, nome que dispensa encômios, pela primeira vez foi feito um apanhado geral da filosofia no Brasil, no período de pouco mais de três séculos, entre 1500 e 1825.
O primeiro milésimo é do descobrimento, o segundo é do suplício de Frei Caneca, figura inolvidável de sociólogo.
Procurei nela contemplar quase todos os brasileiros que se ocuparam de filosofia no aludido período, deixando de lado apenas Rita de Souza, figura um tanto lendária, e um israelita [2], nascido em Pernambuco, ao tempo da ocupação holandesa e
expulso com os pais logo depois da restauração.
Entre os filósofos do século XVIII devia ter sido incluído o moralista Feliciano
Joaquim de Sousa Nunes, autor dos Discursos político-morais, publicados em 1758,
obra extremamente rara ao tempo em que fiz a conferência, mas hoje acessível devido à
nova edição da Academia Brasileira de Letras.
Haverá porventura lacunas involuntárias, que certamente outros preencherão.
O que fiz representa somente o primeiro passo para o restabelecimento da verdade.
Expliquemo-nos.
Em 1878, dizia Sílvio Romero, no livrinho A Filosofia no Brasil. "Pode-se afirmar, em virtude da inadequação histórica, que a filosofia nos três primeiros séculos de
nossa existência, nos foi totalmente estranha". E pouco mais adiante: "Nos três séculos
que nos precederam nem um só livro, dedicado às investigações filosóficas, saiu da
pena de um brasileiro".
Dir-se-ia que o ilustre crítico escrevia isto no começo da sua carreira literária.
Respondi com o Quadro sintético da evolução dos gêneros na literatura brasileira, saído
a lume, em 1911, três anos apenas anterior ao seu desaparecimento do número dos
vivos. Aí também não se fala na filosofia da época colonial.
Invoco, particularmente, Sílvio Romero, porque foi o mais notável historiador
da literatura brasileira, acrescendo a circunstâncias de que campava de filósofo.
Os que vieram depois (Etienne Brasil, padre Leonel Franca) também não dedicaram uma linha aos filósofos coloniais [3].
Preciso fazer tão somente uma exceção, citando o erudito padre Serafim Leite,
que no seu opúsculo As primeiras escolas no Brasil (Rio de Janeiro, 1934) alude ao
ensino da filosofia na Bahia, já no século XVI, no colégio dos jesuítas: "Na Bahia: colégio, com uma classe de instrução preliminar, duas classes de letras humanas, uma de
Artes (Filosofia), outra de casos (Teologia moral) para os de fora, e ainda outra de
Teologia para os de casa''.
São dados oficiais. Informa ainda — e isto é uma contribuição inteiramente inédita — que se chegaram a dar graus em Artes (Filosofia), no Colégio da Bahia, no sé-
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culo XVI, antes mesmo de 1583. "O caso", diz ele, "é digno de ser assinalado e merece
desenvolvimento particular, que faremos noutra oportunidade."
O reverendíssimo Serafim Leite pertence à Companhia de Jesus, dispõe dois opulentos arquivos da Ordem e está em ótimas condições de cumprir a promessa feita.
Precisamente desfazer a errônea opinião de que não houve filosofia na época
colonial brasileira. Possa a minha conferência abrir caminho no domínio dessas investigações, sem embargo do pequeno valor que sou o primeiro a lhe reconhecer.
É apenas uma contribuição honesta, e por ser a primeira de conjunto, naturalmente falha e incompleta.
Rio de Janeiro, 11 de dezembro de 1935.
Introdução
Foi grande a temeridade minha, de que me confesso desde já arrependido, o escolher a filosofia na fase colonial para objeto desta palestra despretenciosa, sob os auspícios da Sociedade Brasileira de Filosofia, núcleo de impenitentes idealistas que aspiram espalhar esse estudos no Brasil, certos de que as altas cogitações do pensamento
são úteis ao progresso coletivo.
Mas, houve mesmo filosofia na fase colonial? perguntarão surpresos os meus
ouvintes?
Tem razão de ser a pergunta. Se pegardes os compêndios do assunto, debalde
procurareis referências aos filósofos da época colonial. Há informações esparsas, mas
nenhum trabalho de conjunto.
Será possível, porém, que durante três séculos ninguém no Brasil se tenha preocupado com os problemas fundamentais da vida humana? Ninguém tenha meditado
sobre o valor das ações, sobre o bem e o mal, a origem das coisas, o destino da alma?
Veremos que não só a raça conquistadora, mas que até os próprios índios se impressionaram com esses problemas transcendentes do pensamento.
A filosofia, como as criações sociais, tem humildes origens, que cumpre serem
estudadas para bem se compreender certos fenômenos de fases posteriores de sua evolução.
Há uma filosofia dos Naturvölker, e os nossos indígenas tiveram também a sua,
cujos fragmentos chegaram até nós através dos cronistas que com eles estiveram em
contato.
Admitida a existência dessa filosofia dos povos naturais que habitavam o Brasil,
resta saber se teria influído, e como, na mentalidade nacional.
Somos povo mestiço, e, apesar das guerras devastadoras contra os naturais, está
hoje mais ou menos assente que o desaparecimento deles foi mais devido ao cruzamento
do que verdadeiramente ao extermínio. A essa conclusão chegou, no século passado,
Varnhagen, e, ainda recentemente, a tem por verdadeira o Sr. Manoel Bomfim, no seu
interessante livro O Brasil na América.
Ninguém jamais negou que o cruzamento tenha influído no físico, porque as
provas são palpáveis, materiais, saltam à vista dos mais desprevenidos e dos mais alheios aos estudos antropológicos. Negar essa influência seria negar toda a biologia moderna, e nós sabemos de ciência certíssima que as leis de Mendel, por exemplo, tanto se
aplicam às ervilhas como aos homens.
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É em virtude dessas leis de Mendel que quem viaja pelos sertões do Nordeste
depara, às vezes, tipos completamente diferentes da massa geral da população, e que
estariam no seu meio natural nos campos da França ou nos baixios da Holanda.
Antes dos portugueses se assenhorearem das costas do Norte a partir do porto
francês, em Pitimbu, na Paraíba, os indígenas mantinham relações comerciais e outras
mais íntimas com os franceses, de sorte que na época da conquista do Rio Grande do
Norte, o século XVI, muito curumim nos braços das cunhãs ostentava cabeleira loura. É
o que nos conta Capistrano de Abreu nos seus nunca assaz louvados Capítulos de história colonial.
Mais tarde, com a ocupação holandesa, que durou quase meio século, esse estoque de cabelos louros aumentou, porque não deixou de haver enxerto humano naquele
atribulado período de nossa história.
Falam os cronistas contemporâneos daqueles acontecimentos em casamentos,
em ligações irregulares, como também noutros fatos que são o doloroso tributo que as
mulheres pagam às guerras.
Se franceses e holandeses, em pequeno número, influíram na formação do povo,
ainda hoje se notando traços indeléveis dessa influência, revelada pelas leis do atavismo, como não influiriam os indígenas, em grande número, em contato permanente e
com os quais houve intenso mestiçamento?
Até aqui temos invocado leis de herança no domínio estrito da anatomia e da fisiologia, e provas que confirmam essas leis inelutáveis que dominam a matéria viva.
Resta-nos agora ver se leis semelhantes regem o domínio da vida psíquica. Se
leis de herança abarcam os penetrais da personalidade psicológica, nada justifica esse
nosso descaso pela vida e pelo pensar das tribos selvagens da época colonial, porque, se
renegarmos esse passado, nem por isso ele deixará de existir e influir, quer queiramos,
quer não, em nossa mentalidade.
A vida psíquica é de uma extrema complexidade; pode-se dizer mesmo que é
misteriosa. Ela se afirma em nós, está presente a cada momento, revela-se em volições,
sentimentos, paixões, atos de inteligência. Cada espécie desses atos psíquicos obedece a
leis que estão sendo descobertas ainda. A psicologia, como ensina Ebbinghaus, tem longo passado e pequena história. Fundada por Aristóteles mais de três séculos antes de
Cristo, perdurou sem progredir até o meado do século passado, quando as ciências do
espírito tomaram grande surto e começaram a se enfileirar nas ciências experimentais.
Hoje a psicologia é uma ciência experimental, combatida, negada, mas apesar
disso rica de ensinamentos, de observações curiosas, importantes para a vida prática,
porque dão diretrizes a disciplinas como a pedagogia, a psiquiatria, a criminologia. O
pedagogo, o psiquiatra ou criminólogo que não estiver ao par da psicologia moderna
acertará por acaso...
Pediremos à psicologia moderna o conceito de personalidade, mostrando que
sem as leis de herança psíquica o mesmo não se pode aprumar.
Para os psicólogos modernos, Wundt, Höffding, James, Freud, a personalidade é
um feixe muito complexo de atos psíquicos dominados pela síntese. A síntese, que é a
função mais alta do espírito, faz dos diversos conteúdos da consciência um todo, por
hipótese ligado estreitamente ao corpo. Essa teoria ao paralelismo físico-psíquico vem
de Epinosa.
Para o fundador da psicologia, Aristóteles, seguido pelos tomistas e neotomistas, a personalidade é simples e racional. Persona, diz Tilmannus Pesch, resumindo a
doutrina da escola, est naturae rationalis individua substantia. (Institutiones logicae et
ontologicae, Pars II, n. 465).
Esta teoria simplista não é mais aceita pelos homens de ciência acostumados a
lutar com a riqueza incalculável da vida psíquica. A personalidade tem fatores inatos,
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conteúdos que foram adquiridos na vista da espécie, dos quais o próprio indivíduo não
tem consciência. Aliás, a consciência não passa de pequena ilha no meio de grande e
profundo oceano da subconsciência e do inconsciente.
Assim como cada célula do organismo guarda um passado milenário, a personalidade psíquica é depositária de todos as vivências conservadas por uma lei semelhante
à lei de conservação da energia, a lei da herança.
Por meio de grosseiras imagens tomadas à vida objetiva, dar-vos-ei um símile da
formação da personalidade.
Não sei se já vistes fazer confeitos de castanha de caju. Tomam-se pequenos pedaços de castanha numa bacia de cobre, que se expõe a fogo lento. Imprime-se à vasilha
movimentos de balanço de sorte que os pedacinhos de castanha corram de um lado para
outro. Enquanto assim se procede, vai-se deitando mel de açúcar às colheradas. Daí a
pouco o açúcar se vai solidificando em torno das partículas de castanhas em delgadas
camadas concêntricas que branqueiam os primeiros confeitos.
Com a personalidade dá-se o mesmo: em torno de um núcleo, cuja origem se
perde nos abismos do tempo, vai a experiência lançando as camadas da vida psíquica,
sutis, invisíveis, mas tão reais como as delgadíssimas camadas geológicas dos confeitos.
Não vos exponho uma teoria arbitrária, sem base. Que a personalidade se compõe como
que de camadas superpostas no decorrer das gerações não resta a menor dúvida, porque
se pode ter a contraprova na desagregação da personalidade causada por certas moléstias mentais.
William James dedica um dos capítulos mais originais do seu livro Précis de
Psychologie ao estudo do “eu”, e fala-nos do “eu material”, ou o corpo, do “eu social” e
do “eu espiritual”, mostrando-nos a formidável complexidade da vida psíquica. Estuda a
hierarquia dos “eus”, o sentimento da identidade do “eu”, os casos de alteração e desdobramento da personalidade, as ilusões na loucura, as personalidades alternantes e até a
enigmática mediunidade.
Na desagregação da personalidade o doente perde primeiramente as últimas aquisições culturais, indo depois a moléstia atingindo camadas mais profundas do “eu”.
Ribot estudou esse fenômeno no tocante à memória e à vontade em livros hoje clássicos. Mas, é observação comum dos psiquiatras, ponto pacífico para os tratadistas das
moléstias mentais, entre os quais quero citar Júlio de Matos no seu interessante trabalho
sobre a paranóia, um pouco antigo, mas a verdade não envelhece:
"Cada personalidade é num dado momento a justaposição de sub-personalidades
relegadas para o inconsciente, mas tenazes, persistentes, suscetíveis de uma integral ou
parcial revivescência. Por trás do indivíduo, que representa as últimas aquisições de
uma civilização, está a espécie, que representa todas as sistematizações procedentes da
ação lenta do meio, capitalizadas pela herança". (A Paranóia, 1898, p. 167). Freud, o
psicólogo da moda, não o diria melhor.
Curioso será ouvir o testemunho de um doente de gênio, Auguste Comte, que,
devido a esgotamento por estudos continuados e exaustivos coincidindo com grandes
desgostos morais, sofreu em 1826 uma profunda crise nervosa, como ele chamou com
simplicidade, ou psicose, na técnica pedantesca hodierna.
Referindo-se a esse "terrível episódio" de sua vida mental, o fundador do positivismo diz, na Politique positive, 1853, volume III, página 75, o seguinte: "...1'ensemble
de cette oscillation exceptionelle me fit doublement vérifier ma recente découvert envers
la principale loi de 1'évolution humaine, dont je parcurus alors toutes les phases essentielles, d'abord en sens inverse, puis en sens direct, sans que leur ordre changeât jamais.
Le trimestre oú 1'influence médicale développa la maladie me fit graduellement
descendre du positivisme jusqu'au fétichisme, en m'arrêntant d'abord au monothéisme,
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puis davantage au polythéisme. Dans les cinq mois suivants, à mesure que, malgré les
remedes, ma spontanéité ramena 1'existence normale, je remontai lentement du fétichisme au polythéisme et de celui-ci au monothéisme, d'oú je revins promptement à ma
positivité préalable".
A observação é interessantíssima, justa e verdadeira, menos naquela parte em
que recrimina os médicos e os remédios, sem os quais a volta à normalidade seria talvez
mais penosa e demorada. Os médicos não podem ter culpa de ser moroso o restabelecimento da célula nervosa. No mais, Comte tem razão. Aí está depoimento valiosíssimo.
Precisasse a lei dos três estados de contraprova, não decorresse ela com síntese luminosa da história do Ocidente, teria no caso pessoal de Augusto Comte a mais brilhante das
confirmações.
O homem condensa o passado, traz dentro do próprio “eu” toda a vida vivida das
antigas gerações, todos os conceitos que lhe guiaram a evolução penosa através do
mundo, todas as imagens das paisagens naturais e culturais de outrora.
A personalidade, como as mônadas de Leibniz, é um microcosmo.
Se o homem é um resumo do passado — passado que ele pode esquecer mas que
traz sempre em si, na feliz expressão de Fustel de Coulanges; se dentro de nós vivem
em estado latente as gerações de antanho; se a personalidade não passa de uma síntese
de ideias e sentimentos, uns vivos e combatentes, outros adormecidos ou em estado de
reserva, espreitando oportunidade de se manifestarem; se a desagregação da personalidade pode revelar fases ultrapassadas de cultura; se tudo isto são verdades positivas,
adquiridas pela ciência do nosso tempo, como poderemos nós, no Brasil, fazer abstrações do homem primitivo, dos nossos antepassados silvícolas, cujos sentimentos jazem
dentro de nós, cujas ideias porventura serpenteiam dentro de nosso “eu” e perturbam as
camadas profundas da personalidade?
Eis porque o estudo da filosofia na fase colonial deve começar pelas concepções
dos índios que habitavam o país no tempo da conquista.
Não basta, porém, analisarmos a contribuição ameríndia. Outra raça entrou na
formação do povo brasileiro, trazendo-lhe os tesouros de sua afetividade transbordante.
Deve ser imensa a influência do negro nos destinos do Brasil, influência íntima, recôndita, diluída por todos os escaninhos da alma, porque grande foi a contribuição desse
elemento racial para a formação do nosso povo.
O branqueamento progressivo da população, que tanto impressiona a um dos
nossos sociólogos, o Sr. Oliveira Viana, não tem, do ponto de vista em que nos colocamos, nenhuma importância. Não importará um desafricanizamento psicológico. A pele
pode branquear, porque a pigmentação é um característico secundário, mas na célula
nervosa ficaram gravadas as qualidades íntimas e perduráveis que singularizam as raças.
O que o brasileiro deve ao negro é talvez difícil de dizer: afetividade desenvolvida, doçura de caráter, uma religiosidade acentuada, amante dos ritos e desprezadora da essência do fenômeno religioso, desinteresse pela riqueza, desambição de bens e de tudo.
Foi Martius quem primeiro chamou a atenção das influências raciais no caráter e
na história do povo brasileiro, na interessante memória — Como se deve escrever a história do Brasil.
Era agora oportunidade de estudarmos as crenças dos nossos aborígenes, crenças
ao mesmo tempo religiosas e filosóficas, porque no início filosofia e religião se confundem num todo indistinto.
Teríamos de examinar os seus mitos cósmicos e da criação, reviver Tupã, o demônio do trovão, estudar os gênios e os espíritos, consoante às informações dos primeiros cronistas, e, coroando essa entrada na alma dos primitivos, tratar da terra sem males
e das crenças que eles tinham em um mundo melhor do que o nosso, terra onde não se
morria, em busca dá qual fizeram longas migrações.
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Esses assuntos são de uma atordoadora complexidade e não se prestam, infelizmente, a serem resumidos num trecho de conferência. Faz dois anos, tratou-os o sábio
A. Métraux no seu livro La religion des Tupinamba com inexcedível competência. Para
este trabalho de grande erudição remetemos os curiosos de conhecer nos seus mínimos
pormenores a filosofia dos indígenas brasileiros. [4]
Quanto aos negros, falta-nos obra de conjunto, em que as suas crenças sejam
metodicamente estudadas. Mesmo as informações esparsas não são abundantes: nunca
despertaram o interesse que os indígenas provocaram.
O primeiro autor nosso que chamou a atenção para esse assunto foi Nuno Marques Pereira, no seu Peregrino da América, livro que escreveu para combater ''feitiçarias e calundus nos escravos e gente vagabunda''.
Nuno Marques fala-nos da quijila, que me parece fenômeno de origem religiosa,
uma reminiscência totêmica.
Bluteau define quijila — "maldição que os pais dos negros de Angola dão aos filhos, dizendo-lhes que se comerem veado, carneiro, etc, lhes dão a sua maldição, e dizem que comendo-lhes vem umas nódoas, ou outros sinais, e morrem. Aos negros,
quando os compram, se pergunta se tem quijila''.
Como nos faltam documentos, só poderemos penetrar na mentalidade dos africanos vindos para o Brasil através das superstições que deixaram entre nós, quando os
estudos de folclore estiverem mais adiantados.
Para o estudo das crenças do último século aos nossos dias desse elemento demográfico há os trabalhos seguintes:
1) Dr. Nina Rodrigues — L’animisme fétichiste des nègres de Bahia. Bahia,
1900.
2) Etienne Ignace Brasil — Os malês. (Revista do Instituto histórico e geográfico brasileiro, tomo LXXII, 1910).
3) Prof. Manoel Quirino — A raça africana e os seus costumes na Bahia. (Anais
do 5º Congresso Brasileiro de Geografia, 1917).
É uma contribuição valiosa a desses autores; infelizmente os fatos observados
não se passaram na época que nos preocupa agora, a época colonial.
A mentalidade dos negros coloniais constitui ainda campo virgem, que precisa
ser convenientemente explorado.
***
Descoberto na alvorada do século XVI, começando a ser colonizado eficazmente
três décadas depois, o Brasil no século XVII principiaria a apresentar os seus primeiros
teólogos, moralistas e filósofos.
No colégio jesuíta de Olinda, por volta de 1580 em diante, começou-se a ensinar
filosofia, conforme informações do venerando padre Cardim, a quem devemos as mais
curiosas notícias do Brasil quinhentista.
A não ser em Olinda, somente no Rio de Janeiro, na colônia francesa de Villegagnon, vieram à baila as questões filosóficas e religiosas, na era de quinhentos. Mas
nós, brasileiros, nada temos que ver com as disputas teológicas desses calvinistas que,
intrusos e logo depois expulsos a ferro e fogo, não influíram em nossa mentalidade.
Um deles pagou no patíbulo os seus pruridos de livre exame, e foi talvez o primeiro mártir na América da liberdade de pensamento. Anchieta teria auxiliado por piedade o inexperto carrasco a passar o homem desta para a melhor, versão que não merece
fé e é hoje contestada pelos que têm aprofundado a vida do grande apóstolo.
Antes de estudarmos as personalidades da época colonial para as quais reivindicaremos o título de filósofos, precisamos assentar bem o que se deve entender por filo6
sofia, conceito que tem variado no tempo e no espaço. Precisamos ver sobretudo a extensão do mesmo. Em vez de definir filosofia, peçamos a um autor notável, Guilherme
Wundt, a enumeração das matérias que enchem o quadro dos seus domínios.
Os nossos filósofos da época colonial se acantonaram no estudo da filosofia do
espírito, e nesse estudo nada trouxeram de novo. Limitaram-se a repetir as especulações
do seu tempo, com fim prático imediato religioso ou político. Não vai nisto uma censura
a esses belos espíritos. Que poderiam fazer eles num país em formação, senão isto: doutrinar, ensinar, propagar?
Mas quem foram esses brasileiros notáveis que merecem o título de filósofos,
apesar de seus nomes não figurarem nos manuais de filosofia?
No século XVII, o padre Antônio Vieira, talento polimórfico, teólogo e moralista, sobretudo; Manoel do Desterro, clássico esquecido, autor de um Tratado de philosophia escholastica; Diogo Gomes Carneiro, patriota e fino letrado; Frei Mateus da
Encarnação Pina, teólogo, professor de filosofia.
No século XVIII, os moralistas Nuno Marques Pereira e Matias Aires, autores, respectivamente, d' O Peregrino da América e das Reflexões sobre a vaidade dos
homens; Frei Gaspar da Madre de Deus, fidedigno cronista e professor de filosofia;
padre Francisco Luís Leal, também professor de filosofia e autor dos Contos philosophicos e da Historia dos philosophos.
No princípio do século XIX, o insigne Frei Caneca, discípulo de Montesquieu e
mártir do movimento republicano de 1824, conhecido pela designação de Confederação
do Equador.
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Século XVII
Padre Antônio Vieira
(1608-1697)
Em se tratando do padre Antônio Vieira, logo de início surge o problema: se devemos incluí-lo ou não entre os escritores brasileiros, sendo ele português de nascimento. Para aqui veio aos seis anos de idade, aqui educou-se, aqui batalhou e sofreu; em
benefício do Brasil, como pregador e político, desenvolveu onímoda atividade, passando aqui a maior parte da existência; não é, pois, fora de propósito que reivindiquemos a
sua glória, como teríamos o direito de reivindicar os seus ossos, se porventura não houvessem sido lançados ao solo pátrio.
Fez muito bem o Sr. Artur Mota em consagrar um dos mais eruditos capítulos da
História da literatura brasileira ao imortal pregador [5]. Antes tivera igual procedimento o Sr. Laudelino Freire, incluindo-o entre os Clássicos brasileiros. [6]
O padre Antônio Vieira nasceu em Lisboa, a 6 de fevereiro de 1608, à rua dos
Cônegos; foi batizado na freguesia da Sé a 15 daquele mês, dia de trasladação de Santo
Antônio, sendo-lhe padrinho D. Fernão Teles de Menezes, conde de Unhão. Faleceu na
Bahia com 89 anos de idade, a 18 de julho de 1697.
Meio século depois, tinha o seu primeiro biógrafo em André de Barros, que, em
1746, publicou a Vida do Padre Antônio Vieira [7]. No século passado ocupou-se do
mesmo assunto o limado estilista João Francisco Lisboa, em livro que se tornou clássico
em nossas escolas, e, faz poucos anos, retomou o tema, para ventilá-lo com fatos e documentos novos, o erudito historiador J. Lúcio de Azevedo, cuja obra se intitula História de Antônio Vieira. Eis os principais esmiuçadores da vida do grande varão. Seria
injustiça esquecer o livro de E. Carel — Vieira, sa vie et ses oeuvres, que estuda sobretudo o aspecto literário dessa grande vida.
Se a vida de Antônio Vieira é conhecida nos mínimos pormenores, tarefa facilitada pela sua vasta correspondência, o mesmo não se pode dizer da evolução de suas
ideias e das bases de sua erudição.
Em Vieira o erudito sobrepuja o filósofo, e mesmo aquela erudição vastíssima,
que foi embevecimento dos contemporâneos e ainda hoje causa espanto aos leitores
desprevenidos de seus sermões, não era uma erudição de primeira mão, bebida diretamente nas fontes eclesiásticas e profanas.
Conta-se de Eduardo Prado que tencionava levar a efeito um trabalho nesse sentido de apurar as origens do saber vieirano, quando tão cedo foi surpreendido pela morte. No Catálogo de sua biblioteca figuram alguns livros que demonstram essa preocupação espiritual, como, por exemplo, a obra do jesuíta Cornélius a Lapide — Commentaria in Scripturam Sacram.
A vida agitada de Vieira lhe não permitira estudos muito aprofundados, feitos diretamente nas fontes. Não era um erudito que fizesse pesquisas originais. Mas, tomando
dos grandes eruditos os materiais acumulados e concatenados, passava-os através do
crivo de sua dialética, dando-lhes formas novas, elegantes e raras, imprimindo-lhes o
cunho, o seu gênio, os imprevistos e as sutilezas de sua imaginação.
Outra questão que se levanta a respeito de Vieira como intelectual é se temos o
direito de capitulá-lo entre os filósofos. Custa a crer que ainda não tenha sido apreciado
sob este aspecto. Prova apenas o nosso descaso. Fosse alemão, havia uma biblioteca
inteira sobre qualquer feição de sua extraordinária personalidade.
Teólogo, moralista, exegeta das sagradas escrituras, esses títulos bastariam para
tal. Mas Vieira, além disso, era uma espécie de sociólogo, embora no seu tempo não
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estivesse ainda constituída a sociologia dinâmica. Preocupava-se com o futuro da sociedade e foi justamente aqui que as suas lucubrações aberraram no profetismo.
Vieira considerava-se filósofo, não só filósofo natural, mas filósofo cristão. Os
contemporâneos o tinham por tal. Professor foi de retórica no começo da vida. Já professor e ainda estudante, compôs para seu uso um curso de filosofia. Como filósofo
considerava os assuntos de seus admiráveis sermões, buscando sempre as causas gerais
e as razões últimas das coisas.
Pouco importa que nem sempre atingisse o alvo, e a sua bela máquina dialética
rodasse em seco, como moinho a que faltasse o trigo. Partir de premissas aéreas, indemonstráveis, vício foi do tempo e não dele. Tudo considerado, creio não errar reivindicando para o insigne pregador a láurea de filósofo.
Toda uma monografia seria pequena para considerar o que nos sermões de Vieira há de assuntos filosóficos. É preciso que alguém se aventure a isto. Limitar-me-ei,
por míngua de espaço, a analisar como certa vez Vieira esplanou um tema filosófico, o
da avaliação da vida, se o mundo era mais digno de riso ou de lágrimas, e qual dos dois
filósofos gregos andara mais prudente, se Demócrito, que ria sempre, ou Heráclito, que
sempre chorava.
Vivia em Roma a rainha resignatária da Suécia, Cristina Alexandra, em cujo salão, espécie de academia, os grandes letrados discutiam os problemas mais diversos e
faziam conferências para um círculo seleto da nobreza romana. Foi nessa academia que
Vieira esplanou aquele tema, na mesma ocasião tratado pelo padre Jerônimo Catâneo,
como ele da Companhia de Jesus. Escolhidos ambos para o torneio oratório, deu o padre
Vieira a eleição ao padre Catâneo, o qual tomou para si o riso de Demócrito. Ficou para
Vieira a causa das lágrimas de Heráclito. Isto ocorreu em 1674, estando Vieira no apogeu da glória e do talento.
O discurso do nosso filósofo é elegante peça literária, esmaltada de erudição
greco-latina, em que os conceitos de Ovídio, de Virgílio, Cícero, Plínio, Plutarco, Sêneca e Aristóteles são invocados a cada passo, mas sempre muito a propósito. Não houve
significativa referência a lágrimas que não viesse à baila.
Escapou-lhe apenas aquela passagem de Homero tocante ao riso entre lágrimas,
atribuído a Andrômaca, na sexta rapsódia da Ilíada, quando a esposa, sorrindo e chorando, recebe no seio perfumoso o filho muito amado dos braços de Heitor, que partia para
a luta.
Ouçamo-lo no exórdio de sua conferência filosófica:
"Que é este mundo, senão um mapa universal de misérias, de trabalho, de perigos, de desgraças, de mortes? E à vista de um teatro imenso, tão trágico, tão funesto, tão
lamentável, onde cada reino, cada cidade e cada casa continuamente mudam a cena,
onde cada sol que nasce é um cometa, cada dia que passa um estrago, cada hora e cada
instante mil infortúnios; que homem haverá (se acaso é homem) que não chore? Se não
chora, mostra que não é racional; e se ri, mostra que também são risíveis as feras" (Sermões, Porto, 1909, volume XV, página 399).
Passa, em seguida, Vieira a analisar as desgraças que acompanham o homem do
berço ao túmulo, neste "vale de lágrimas", seguindo de perto a lição judaico-cristã do
pessimismo. A filosofia das lágrimas é antiga, mas a forma em que ele a vasa, apesar da
pureza das suas linhas, é uma forma nova.
Depois sonda a psicologia do riso, e, como se fora um naturalista da nossa época, diz que ele nasce da novidade e da admiração. Entra a fundo na matéria. Com admirável habilidade, volta em favor de sua tese, como já o notou Carel, o riso contínuo de
Demócrito: distingue entre o chorar com lágrimas, o chorar com riso. Chorar com lágrimas, sinal de uma dor moderada; chorar sem lágrimas, sinal de uma dor maior; cho-
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rar com riso, sinal de dor excessiva. A psicologia moderna não foi além nas suas análises. Aí tendes a gama inteira do pranto, até o riso convulsivo da histeria.
É impossível resumir a bela lição do velho clássico, que deve ser lida na íntegra.
"Que esperança, que lugar pode ter neste mundo o riso, se todo o mundo chora e
ensina a chorar? Choram os homens como racionais e sensitivos, e ainda as coisas sem
razão e sem sentido choram; estas são as lágrimas que o príncipe dos poetas chamou
profundamente lágrimas de todas as coisas:
Sunt lacrymae rerum, et mentem mortalia tangunt". (Eneida, 1-462). (Op. cit.,
página 407).
Para Vieira, só no paraíso terreal não choraria o homem. "É certo", diz ele, "que
nunca chorariam os homens, se fossem conservados naquele estado, e as lágrimas que
agora há, não as haveria então; logo, se na felicidade daquele tempo estaria ociosa a
potência do chorar, na miséria deste tempo esteja ociosa a potência do rir."
Assim conclui ele a conferência, solucionando a dificuldade escolástica de que
ficaria ociosa a potência do riso contra o fim da mesma natureza, se sempre o mundo
oferecesse somente ocasião de chorar. Felizmente Vieira não conseguiu matar a potência do rir, e nós ainda a conservamos para rir das vãs filosofias.
Quis dar apenas pálida amostra de como Vieira filosofava. Deixemos agora o filósofo, voltemos ao homem. Ao homem físico. Vieira era mestiço. E quem sabe se a
mistura do sangue não explica algumas feições do seu talento?
André de Barros forja ascendência nobre para o padre Antônio Vieira, mas o
mais recente dos seus biógrafos põe por terra esses costados. O pai foi nobrificado depois dele nascido, e a mãe tinha nas veias sangue africano.
O avô e o pai tinham sido criados dos Condes de Unhão. A avó, uma mulata serviçal da mesma casa. "Foi despedida", diz J. Lúcio de Azevedo, "por não levarem os
amos a bem os amores, que o casamento em seguida consagrou. Não custa a crer tivesse
vindo a bisavó de África, trazida por escrava a Portugal. Em negros e mulatos abundava
a população do Reino nesse tempo".
Essas gotas de sangue negro teriam influxo na fértil imaginação de Vieira? Não
será lícito achar nesse filão o ouro de sua excessiva verbosidade?
Como quer que seja, a ascendência tropical deve ter influído algo na sua psique:
nada se perde, nada se cria na natureza, tudo se conserva e se transforma.
Não passaremos além, sem tomar ao padre André de Barros o retrato do caudaloso pregador: "Foi o padre Antônio Vieira de não pequena estatura, como se até no
corporal quisesse formar a natureza mais que ordinária habilitação àquele grande espírito; o rosto comprido e majestoso; nariz aquilino; boca proporcionada, muita barba; o
cabelo, na idade vigorosa, preto; todo branco na velhice; a cor morena; os olhos sobremaneira vivos, e que, parecia, cintilavam. O seu gênio era humaníssimo, urbano e cortês; o engenho quase sem igual; a memória, um real arquivo de erudição, tão feliz em
tomar como em reter o que lia. A discrição nadava-lhe tão formosa na boca, como é
admirada na pena; na conversação não era um só homem, era muitos homens, e por isso
dizemos que era um Vieira, porque é dizer tudo".
BIBLIOGRAFIA:
Barros, André de. Vida do apostólico padre Antônio Vieira. Lisboa, 1746.
Lisboa, João Francisco. Vida do padre Antônio Vieira. 1865.
Carel, E. Vieira, sa vie et ses oeuvres. Paris, sem data.
Azevedo, J. Lúcio de. História de Antônio Vieira, volume I. Lisboa, 1921.
Figueiredo, Fidelino de. História da Literatura clássica (2ª época: 1580-1756). Lisboa, 1922.
Betencourt, J. Barbosa de. História comparativa da Literatura Portuguesa. Lisboa, 1923.
Galvão, Ramiz. O púlpito no Brasil, in Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo 82,
volume 146, 1922.
10
Diogo Gomes Carneiro
(1618-1676)
O moralista Diogo Gomes Carneiro, entre os brasileiros, foi o primeiro que publicou livro de prosa; andou longamente esquecido, por serem raríssimas as suas obras.
Dele não se ocupou detidamente Varnhagen. O erudito Inocêncio traça-lhe a biografia
em quatro linhas: "Diogo Gomes Carneiro, que parece ter sido formado em Direito, secretário de Dom Afonso de Portugal, Marquês d'Aguiar, e nomeado depois Cronista
geral dos Estados do Brasil com 300$000 de ordenado. Foi natural do Rio de Janeiro e
faleceu em Lisboa a 26 de fevereiro de 1676".
A. C. Chichorro da Gama, honesto investigador recentemente falecido, não o incluiu no corpo do seu Breve dicionário de autores clássicos da literatura brasileira,
vindo a lume em 1921, apesar do mesmo ser considerado clássico por Bluteau e Moraes
e figurar no célebre Catálogo dos clássicos da Academia das Ciências de Lisboa.
Mas em nota da última página observa: "De Diogo Gomes Carneiro salva-se a
Oração apodíxica aos cismáticos da pátria — Lisboa, 1641.
O autor foi cronista geral do Brasil, com duzentos mil réis de ordenado. (E não
trezentos, como se lê, em Inocêncio). Vide Provedoria da Fazenda, Livro 8, folha 28
(Arquivo Nacional). Nada produziu nessa qualidade".
Sendo-me fácil consultar os livros da Provedoria da Fazenda guardados no Arquivo Nacional, fui ao Livro Oito, citado, e nada encontrei.
Como poderia ter sido um erro tipográfico, consultei o terceiro, o sexto e o nono
de algarismos parecidos, também nada encontrando referente ao cronista geral do Brasil.
Recorri em vão ao índice geral da coleção, que é o volume XXI das Publicações
do Arquivo Nacional.
Onde o arquivista teria deparado o informe, conjeturava eu, quando me lembrei
de consultar o Inocêncio, no exemplar da biblioteca do Arquivo, e lá deparei essa nota à
margem — "200$ e não 300$. Provedoria da Fazenda, Livro 8, folha 28" numa caligrafia muito minha conhecida, a do antigo diretor da repartição, Dr. Machado Portela.
O Dr. Chichorro da Gama aproveitara evidentemente aquela nota, como o denunciavam as abreviaturas e a própria estrutura da sua frase.
Errou; arrimando-se, aliás, a pessoa que merecia absoluta confiança.
Desço a esses pormenores para mostrar como todos devemos ser rigorosos no
cumprimento daquela regra de heurística que manda verificar todas as citações.
O Dr. Laudelino Freire, em 1923, nos Clássicos brasileiros, biografou Diogo
Gomes Carneiro, fundando-se em Barbosa Machado, Joaquim de Macedo e Inocêncio e
prometeu reeditar seus trabalhos na Estante clássica, promessa que foi cumprida no ano
seguinte no tocante à Oração apodíxica aos cismáticos da pátria. Bom serviço prestado
às nossas letras.
Recentemente o Sr. Artur Mota dedicou capítulo especial da sua História da Literatura brasileira a Diogo Gomes Carneiro, sob o título, que me parece bem justo, de
um moralista. Dá-o como doutor em leis, transformando em certeza o ''parece" do bibliógrafo português.
A biografia do autor carioca é página em branco, nem mesmo a data do seu nascimento é certa. O primeiro a precisá-la foi Baltazar da Silva Lisboa, 9 de fevereiro de
1628; outros a recuam de um decênio, com sério fundamento, porque, se Diogo Gomes
Carneiro tivesse nascido em 1628, não poderia aos treze anos publicar a Oração apodíxica, que saiu a lume em 1641, constando das licenças já ser doutor.
A naturalidade não padece dúvida, visto como o próprio publicista se declara
"brasiliense, natural do Rio de Janeiro''.
11
A Oração apodíxica foi um livro de ocasião, um livro oportuno.
Portugal, no ano anterior, havia jogado fora o jugo espanhol. Naturalmente, nem
todos aceitaram de bom grado a mudança radical da situação política.
Havia os descontentes, partidários da continuação do regime estrangeiro, mesmo
aqui no Brasil.
Haja visto o episódio da aclamação de Amador Bueno na Capitania de São Vicente, promovido pelo partido espanhol.
A Oração Apodíxica dirige-se aos maus portugueses, cismáticos da pátria, chamando-os com eloqüência ao bom caminho. É obra de um moralista político e esclarecido patriota.
Manoel do Desterro
(1652-1706)
Quase nada se sabe sobre o filósofo colonial Manoel do Desterro, filho da Bahia,
onde nasceu em 1652.
A sua biografia, de Barbosa Machado a Artur Motta, se enquadra em quatro linhas, em que os bibliógrafos citam as datas do nascimento e da morte, a ordem em que
professou, os dois manuscritos que resumem a sua atividade de lente e de pregador.
Eis que diz a seu respeito o erudito abade de Sever:
"Frei Manoel do Desterro, natural da Bahia, capital da América portuguesa, religioso professo da Província Seráfica da Imaculada Conceição do Rio de Janeiro, onde,
depois de ditar as ciências severas, em que foi muito perito, exercitou o lugar de Custódio, e muitos anos o de Pregador. Faleceu no Convento de S. Boaventura da Vila de
Antônio de Sá, chamado vulgarmente de Macaçu (Leia-se Macacú) no ano de 1706.
Dele se lembram Frei Apolinário da Conceição Primazia Seráfica na América, página
91, e Frei Joan, o D. Ant. Bib. Franc, tomo I, página 146, col. chamando-lhe Agostinho
por equivocação.
Deixou composto: Philosophia Scholastica, folha 2, tomo M. S. e Sermoens vários, folha 4, M. S.
Conservam-se estas obras na Livraria do Convento do Rio de Janeiro." (Diogo
Barbosa Machado — Biblioteca lusitana, 1752, tomo III, página 245).
Joaquim Manoel de Macedo, Anno biographico brasileiro, 2º volume, 1876, página 107, trouxe dois adminículos para a biografia do franciscano ilustre: o motivo porque morreu em Macacú e a data precisa da morte: "Tinham os franciscanos um convento na vila Macacú (uma das mais antigas do Rio de Janeiro então e até o século atual
muito florescente e hoje extinta): para esse convento foi Frei Manoel do Desterro adoentado e ali morreu aos 26 de maio de 1706".
Augusto Vitorino Alves Sacramento Blake, no Diccionário bibliographico brasileiro, 6º volume, 1900, página 59, ao tratar do filósofo baiano nada adianta, limitandose a aproveitar os dados de Barbosa Machado e de Macedo. Enumera também dois manuscritos, modificando o título do primeiro, porquanto Barbosa Machado o denomina de
Philosophia scholastica, e ele de Tratado de philosophia ecclesiastica.
O Sr. Artur Motta, na História da Literatura brasileira, confessa que se serviu
de Sacramento Blake para escrever a notícia biográfica do padre Manoel do Desterro.
Como Barbosa Machado se louva em frei Apolinário da Conceição, buscamos
no raríssimo livro deste, Primazia seráfica na região da América, Lisboa, 1773, página
91, o que dissera. É bem pouca coisa:
12
"O padre frei Manoel do Desterro, religioso mui douto, e Custódio que foi da
mesma província, deixou escritos dois tomos de filosofia, e vários sermões tão singulares, que ainda hoje admiram, e são muito estimados''.
Segundo informação que me foi dada pelo Revmo. Frei Pedro Sinzing, não se
encontram no arquivo do Convento de Santo Antônio os manuscritos de frei Manoel do
Desterro. Provavelmente levaram descaminho na época em que esteve sem religiosos.
Resta a esperança de que ainda apareçam um dia.
Frei Mateus da Encarnação Pina
(1687 - ?)
Nascido no último quartel do século XVII, floresceu na primeira metade do seguinte o teólogo carioca Mateus da Encarnação Pina. Oriundo do legítimo consórcio de
Domingos Alves Pina e Dona Francisca Fernandes, foi batizado com poucos dias de
nascido, a 23 de agosto de 1687, na freguesia de Nossa Senhora da Candelária, informação esta de Macedo, no "Anno Biográphico", 2º volume, página 501. Sacramento Blake
(Diccionário bibliographico, volume 6º, página 255), ao copiar Macedo, muda a data do
nascimento para 23 de agosto e o batizado para poucos dias depois''.
Contando apenas 16 anos de idade, entrou para a Ordem Beneditina. Ao receber
a cogula em 1703, Mateus em tão verdes anos já revelava grande inteligência e grandes
conhecimentos. Cedo se tornou uma das glórias de sua Ordem pela sabedoria e pela
piedade.
Da cátedra de professor de ciências passou para o cargo de abade. Mas no claustro nem sempre a sorte lhe sorriu.
Conta Macedo que "eleito abade e achando-se no exercício da sua prelazia, foi
de súbito mandado seguir para Portugal para responder por abuso, que aleivosa ou erradamente lhe imputaram''.
Em Lisboa não lhe foi difícil desmanchar o ardil e provar a sua inocência. Cercado depois de prestígio, e gozando fama de orador, frei Mateus foi chamado a pregar
na capela real pela quaresma de 1729, onde o ouviu el-rei D. João V. Na primeira frota
depois dessa quaresma, voltou para o Rio de Janeiro, restituído ao mosteiro de sua Ordem e ao exercício dos múnus de abade. Diz Blake que foi também eleito abade geral
do Brasil. Esse bibliógrafo enumera-lhe várias obras, inclusive um tratado de Theologia
dogmática e scholastica ainda inédito.
Não é conhecida a data em que faleceu o eminente varão que foi Dom Frei Mateus da Encarnação Pina.
Aí está um filósofo colonial quase esquecido, cuja vida merece ser analisada e
cuja obra, pelo menos nas partes significativas, deve ser dada a lume, porque retrata
uma fase de nossa mentalidade.
13
Século XVIII
Nuno Marques Pereira
(1652-1728)
De Nuno Marques Pereira muita gente fala de ouvir dizer, sem ter lido o cartaprefácio do Peregrino da America, livro que edificou os brasileiros do século XVIII,
mas que anda hoje muito raro.
Nuno Marques Pereira é um moralista católico, apostólico, romano. Por isso o
julgaram padre, o que não é verdade.
Da própria leitura do Peregrino verifica-se que era homem em extremo piedoso;
não era padre, porém.
Não era professor, pois diz, no prefácio do seu livro: "Bem é verdade que me dirão muitos que escrever em matérias espirituais só incumbe a seus professores e que eu
o não sou''.
Mais adiante ele explica que escreveu levado do zelo e amor de Deus e da caridade do próximo, escolhendo o processo de contar parábolas por causa dos tediosos de
lerem os livros espirituais.
O nosso autor finge a peregrinação de um velho, símbolo do tempo e da sabedoria, por diversas terras nossas, na direção das minas de ouro de São Paulo, hospedandose aqui, ali, acolá em casas de indivíduos das mais diversas profissões, e de caminho e
nessas hospedagens, aproveitando ensejos de doutrinar, entremeia a pregação de exemplos, casos, fábulas, histórias de folclore, ditos, provérbios, sentenças tradicionais, ou
tiradas das Sagradas Escrituras, dos Santos padres, mas também dos filósofos pagãos,
Aristóteles, Diógenes, Cícero e que tais, revelando uma grande leitura dos clássicos.
Não se pense que o livro é mal feito e que tudo isto está nele incoordenado. O
moralista baiano tem o seu método: arruma o material de sua erudição em torno de cada
mandamento da lei de Deus, tendo antes comentado quase todo o primeiro capítulo do
Gênese e tratado da redenção da humanidade por Maria e pelo Cristo.
A viagem às minas de ouro de São Paulo, não a fez movido de interesse, senão
do desejo de ver a causa de tantas perturbações do seu tempo, casas abandonadas, engenhos de fogo morto, retirada dos habitantes, guerra enfim. Nas entrelinhas está a condenação da guerra dos emboabas, a que faz expressa referência no prefácio, para louvar o
Mestre de Campo Manoel Nunes Viana, que considera um herói.
Manoel Nunes Viana, a pedido do autor, tornou-se o Mecenas da publicação do
Peregrino da América. A primeira edição saiu em 1728, seguindo-se logo, três anos
após, a segunda, e isto demonstra o extraordinário sucesso do livro.
Nuno Marques Pereira, que nascera na vila de Cairú em 1652, morreu em Lisboa
no ano em que se editara o livro, pouco depois da publicação, contando 76 anos de sua
idade. Aliás, só veio a lume a "primeira parte" do Peregrino; está ainda há dois séculos
aguardando publicidade a "segunda parte", de que possui o original a Biblioteca de Lisboa e cópia autêntica a Academia Brasileira de Letras.
O Peregrino, que teve tanta voga no século XVIII, como o demonstram as cinco
edições de 1728, 1731, 1752, 1760 e 1765, caiu em esquecimento, até que, no século
passado, o historiador Varnhagen chamou a atenção dos estudiosos para as suas curiosidades. É que no último quartel do século XVIII a atmosfera intelectual mudou completamente graças aos enciclopedistas e à Revolução Francesa. [8]
14
Matias Aires
(1705 – entre 1759 e 1770)
De Matias Aires, o mais profundo e interessante escritor clássico brasileiro, pouco se sabe. Nasceu na cidade de São Paulo a 27 de março de 1705. Foram seus pais José
Ramos da Silva, cavaleiro da Ordem de Cristo, provedor da Casa da Moeda de Lisboa, e
Dona Catarina de Horta. Mal contava onze anos quando viajou, em companhia dos progenitores, para Portugal, onde fez sua educação: o curso de humanidades no Colégio de
Santo Antão, dos padres jesuítas, o de mestre em artes na Universidade de Coimbra. De
posse desse diploma seguiu para a França, em viagem de estudo, graduando-se em Baiona em direito civil e canônico. Estudou também ali com singular proveito hebraico e
ciências físicas e matemáticas. Vê-se, tinha uma cultura aprimorada o paulistano.
Morreu em Lisboa em data não sabida entre 1759 e 1770.
Da pena de Matias Aires saíram as seguintes obras:
1) Reflexões sobre a vaidade dos homens, que logrou cinco edições, quatro publicadas em Lisboa, em 1752, 1761, 1778 e 1786, todas raras, e uma, facsimilar, vinda a
lume no Rio de Janeiro, graças aos editores J. Leite & C;
2) Philosophia rationalis;
3) Letres bohemiennes;
4) Discours panegyrique sur la vie et actions de Joseph Ramos da Silva;
5) Discurso congratulatório pela felicíssima convalescença e real vida d'El Rei
D. José;
6) Carta sobre a fortuna;
7) Problema de arquitetura civil demonstrada. (1777), volume in 4º, 391 páginas (Livro póstumo mandado editar pelo seu filho Manoel Inácio da Silva Eça).
Ignora-se o paradeiro das obras publicadas em francês e latim.
Deve-se ao erudito Dr. Solidônio Leite o ter tirado do olvido o nome de Matias
Aires, publicando sintética biografia e excertos nos Clássicos esquecidos, em 1914. No
mesmo ano, Nestor Victor, em artigos de jornal, depois insertos na Revista Americana
(1915, números II, III e IV), com percuciente crítica, dava o legítimo valor do moralista
brasileiro, colocando-o a par de La Rochefoucauld e "irmanando-o a todos os espíritos
verdadeiramente superiores, não importa de que era e de que país".
Passado um quinquênio, o mais autorizado crítico literário português, o Sr. Fidelino de Figueiredo, na História da Literatura Clássica, 2ª época: 1580-1756, endossava
o justo alvoroço dos aquilatadores indígenas:
"Em cerca de dois séculos de literatura, que neste volume historiamos, não encontramos escritor tão ricamente ditado do poder de intuspecção e do de expressão como este esquecido paulista, que é decerto das mais valiosas contribuições do Brasil colonial para o cabedal literário da metrópole.''
Sobe de peso esse julgamento do historiador lusitano, quando se considera que
englobou na referência espíritos como Rodrigues Lobo, D. Francisco Manoel de Melo,
frei Luís de Sousa, padre Antônio Vieira, Francisco Xavier de Oliveira, D. Antônio de
Sousa de Macedo, que viveram todos nas duas centúrias historiadas.
Matias Aires floresceu sob D. João V, o megalômano imitador de Luiz XIV, e
veio até a época pombalina; assistiu ao terremoto de Lisboa e ao processo dos Távoras e
da marquesa de Alorna, e um dos seus escritos conhecidos é justamente sobre o atentado que ia vitimando D. José, a quem ele havia anos antes oferecido as Reflexões sobre a
vaidade dos homens, numa carta-prefácio, modelo mais completo de sabugice que se
possa imaginar:
''Vossa Majestade, assim ele, não só nasceu para reinar, mas já sabia reinar
quando nasceu".
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"... Se é certa aquela memorável profecia, que promete a um rei de Portugal o
ser senhor de toda a terra, já podemos crer que chegou o tempo de cumprir-se, e esta fé
deve fundar-se nas virtudes de Vossa Majestade: e enquanto não chega a feliz hora de
vermos na mão de Vossa Majestade o cetro universal, já vemos que Vossa Majestade é
digno dele; sendo que é mais glorioso o merecer, do que o alcançar".
A lisonja é tanto mais de reparar em Matias Aires porque campa de moralista,
palmatória do mundo, e não diz bem a psicologia sutil, para quem os movimentos da
alma não têm segredos na sua formação.
Confrontai o que exprimiu no prólogo com o que pensa a respeito dos julgamentos humanos, que considera sempre eivados de incerteza e interesse:
"O nosso engenho todo se esforça em pôr as coisas em uma perspectiva tal que,
vistas de um certo modo, fiquem parecendo o que nós queremos que elas sejam, e não o
que elas são.
O discurso é como um instrumento lisonjeiro, por meio do qual vemos as coisas
grandes ou pequenas, falsas ou verdadeiras.
O nosso pensamento não se acomoda às coisas, acomoda-se ao nosso gosto. O
amor, a vaidade e o interesse são os moldes em que as coisas se formam, e configuram
para se apresentarem a nós'' (página 227).
Embora tenha vivido no século XVIII, Matias Aires é um homem do século
XVII, ou antes, mais do passado que do seu tempo. Contemporâneo de Voltaire e de
Montesquieu, tomou do primeiro o vago deísmo e do segundo aceita a teoria da influência do meio: "As mesmas nações se mostram diferentes por um aspecto, ou semblante
próprio, que a natureza afeta em cada uma delas. A cor é um sinal demonstrativo, regular, indelével, que a mesma natureza imprime nas gentes de cada clima, ou região''.
Como político, Matias Aires não passa de um homem do século anterior, quero
dizer, partidário do fortalecimento de realeza contra a nobreza.
Nisto o anacronismo é mais do seu país que de si próprio. Portugal só no século
XVIII refletiu as correntes de ideias políticas que açoitaram a França no século XVII.
As páginas que o psicólogo paulista escreveu contra a nobreza, consideramo-las
das mais penetrantes do seu livro. Um desabusado moderno não desarticularia com mais
perícia os nadas de que se forma o orgulho aristocrático. A esses nada chama ele de
acidentes na verdade exteriores, mas que servem de incrustação no homem, e a incrustação ainda que composta de fragmentos, sempre forma um ornato matizado ... Mas
não se pense que Matias Aires desconhece aquela nobreza natural — cultura antiga incorporada ao organismo. A ela faz referência quando diz que ''os homens quando vêm
ao mundo já trazem um sinal de distinção e que esta os faz distinguir e conhecer".
O forte de Matias Aires é a análise das paixões, que equivale a notar que o psicólogo e o moralista nele predominam. Pois bem, como psicólogo e moralista, é sobretudo
um autor do século XVII, notai bem, do século XVII francês.
Nestor Vítor foi quem primeiro, no tocante a este aspecto, o identificou, considerando-o um discípulo de La Rochefoucault: "Para La Rochefoucault, todas as ações humanas se derivam do amor próprio. Todas as ações humanas têm origem na vaidade,
segundo Matias Aires. É uma e a mesma coisa, afinal. O que, porém, irmana ainda melhor estes dois espíritos é que acima de tudo eles fazem obra de "implacável observação,
de cruel experiência: nada mais", como se diz tão exatamente falando do grão senhor
que ao mesmo tempo foi um príncipe das letras em França".
Outro mestre de Matias Aires foi Erasmo, do Elogio da loucura, e seria interessante aproximar certas passagens das Reflexões dessa fonte, que ainda não foi apontada.
É escusado lembrar que a inspiração geral do livro, essa confessada, é o salomônico
Vanitas vanitatum, ed omnia vanitas (Encl., cap. I, vers. 2).
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Frei Gaspar da Madre de Deus
(1715-1800)
Frei Gaspar da Madre de Deus conheciam-no todos, até há pouco tempo, apenas
como cronista dos fatos coloniais. Bom cronista, por bem informado e amigo dos documentos, muito mais do que certos autores que tratam a história com a sem-cerimônia
com que o oleiro amassa o barro, afeiçoando-se à sua fantasia.
Frei Gaspar da Madre de Deus Teixeira de Azevedo nasceu em São Vicente,
Capitania de São Paulo, a 9 de fevereiro de 1715 e faleceu em Santos a 28 de janeiro de
1800.
Como historiador, além de trabalhos menores postumamente editados na Revista
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e na Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, deixou as Memórias para a história da Capitania de São Vicente,
hoje chamada de São Paulo, do Estado do Brasil, mandadas publicar, em 1797, pela
Academia Real de Ciências de Lisboa, de que era sócio correspondente.
Por iniciativa de Varnhagen, a Província de São Paulo mandou fazer, em 1847,
segunda edição dessa obra já então rara. Em 1920, saiu a lume uma acurada terceira
edição da casa Weizflog, com um estudo biográfico do autor e notas pelo Dr. Afonso
d'Escragnole Taunay, que prestou assim extraordinário serviço às letras pátrias. A biografia do monge beneditino ficou meticulosamente apurada e para ela enviamos os desejosos de conhecer pormenores da vida laboriosa e edificante do grande varão. Posteriormente, o Dr. Afonso de Taunay reeditou aquele ensaio nos Esciptores coloniaes, livro
premiado pela Academia Brasileira de Letras.
Como filósofo, frei Gaspar deixou um tratado de filosofia, resumo das lições
professadas no convento beneditino do Rio de Janeiro, em 1748, dois volumes manuscritos existentes no Arquivo do Mosteiro de São Bento, em São Paulo, escritos em latim, os quais foram há poucos anos descobertos, ou, antes, identificados.
O Dr. Afonso de Taunay conta-nos como se deu o feliz achado:
''Pacientemente revistando os volumes truncados e deteriorados que existem na
biblioteca da Abadia de São Paulo, teve o jovem e dedicado sub-bibliotecário D. Wolfang Kretz a boa sorte de achar entre uns manuscritos, desde muito lançados a um canto,
numerosas laudas que, recompostas, lhe deram a agradável surpresa de reconstituir o
primeiro tomo de curso de filosofia no Rio de Janeiro professado por frei Gaspar da
Madre de Deus em 1748.
Verificou-se aí que outro manuscrito, até então inidentificável, encontrado pelo
zeloso bibliotecário da Abadia Dom Bonifácio Jansen — a cuja iniciativa se deve a ressurreição do velho e estragadíssimo arquivo do Mosteiro, seja dito de passagem — era a
continuação do tratado agora descoberto". [9]
O tratado filosófico de Frei Gaspar assim se intitula — Philosophia platonica
seu rationalem, naturalem et transnaturalem philosophiam sive logicam, phisicam et
metaphysicam complectens per F. Gaspar a Madre Dei in hoc benedictino monasterio
Fluviijanuariensis die 7 Martii Anno Domini 1748.
Desse tratado só foram dados a lume até agora o título, o proêmio e o índice. Pelo título se vê que Frei Gaspar dava grande importância a Platão, tanto que intitulou o
seu tratado de Filosofia platônica.
O proêmio é curto e nada elucida sobre a orientação filosófica do autor. Já não
se dá o mesmo com o índice. Analisando este, vi que o filósofo brasileiro mais se aproxima de Aristóteles que de Platão, sobretudo no segundo tomo, onde estuda a matéria e
as causas consoantes à concepção aristotélica do saber.
No primeiro tomo há referências a Scott e a Bacon, o que prova que Frei Gaspar
estava a par das críticas à escolástica. É temerário adiantar mais alguma coisa sobre a
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filosofia do monge beneditino. Aguardemos a publicação do seu tratado, que de certo se
fará, vindo provar que as grandes questões do pensamento eram discutidas e ensinadas
nos seminários do Brasil colonial.
Frei Gaspar, como filósofo, viveu dentro da atmosfera intelectual do século XIII,
era um contemporâneo de Tomás de Aquino e de Dante, um discípulo de Platão e de
Aristóteles, em suma um homem antigo modificado pela Igreja.
Quando ele morreu, septuagenário, em 1800, já contava 21 anos Frei Caneca,
que seria senão o iniciador ou pelo menos o maior vulto, da filosofia moderna brasileira
na fase colonial.
Antes, porém, de nos ocuparmos do insigne carmelita, precisamos recordar um
nome meio esquecido, de um brasileiro que foi professor de filosofia em Lisboa, e que,
como frei Gaspar, era de formação clássica e conservadora.
Francisco Luís Leal
(1740-1818 ou 20)
Merece referência entre os filósofos brasileiros o padre Francisco Luís Leal, ou
dos Santos Leal, como também é conhecido. Foi uma vida votada ao ensino da mocidade, que honrou o nome pátrio na metrópole portuguesa. Nasceu na cidade do Rio de
Janeiro pelos anos de 1740. Faleceu, consoante Inocêncio, entre os anos de 1818 e
1820, portanto em idade avançada. Sacramento Blake, não sei se com fundamento, precisa-lhe a data da morte em 1820, dando ainda que se jubilara no ano anterior.
Foi presbítero secular do hábito de São Pedro e bacharel em cânones pela Universidade de Coimbra.
O governo português, em 1771, confiou-lhe a cadeira de filosofia racional e moral de Lisboa, cargo que exerceu por bons quarenta e oito anos se é exata a informação
do bibliógrafo brasileiro do que fora jubilado em 1819.
Pedagogo e filósofo, o padre Francisco Luís Leal deixou as seguintes obras:
1) Contos philosóphicos para instrução e recreio da mocidade portuguesa. Lisboa, 1773 (Teve segunda edição em 1818, em dois tomos);
2) Historia dos philósophos antigos e modernos. Lisboa, 1788, dois tomos. In 8º;
3) Plano de estudos elementares traçado em maneira de carta, e dirigida ao Exmo. Sr. Conde de Ega, sobre a educação literária da mocidade (Lisboa, 1801, 75 páginas. In 8º);
4) Instrucção moral em differentes novellas. Lisboa, 1802. In 8º.
Deixou ainda um opúsculo intitulado "Sinceros votos apresentados no dia em
que completou um ano de idade o sereníssimo príncipe da Beira, Lisboa, 1796".
Trata-se de um discurso de dezessete páginas in 4º em que o filósofo pagou o
seu tributo de louvaminhas aos poderosos do dia.
O padre Santos Leal colaborou no Jornal enciclopédico que se publicou em Lisboa.
Essa informação de Inocêncio foi transformada por Blake no seguinte, que é um
contra-senso: foi um dos colaboradores da História dos filósofos antigos e modernos e
dos Contos filosóficos... A menos que tenha sido erro de composição tipográfica é formidável o cochilo do autor baiano, às vezes tão prestadio, mas também tão pouco seguro.
José Veríssimo, na História brasileira, não faz referência ao nosso patrício, considerando-o, talvez, desnaturalizado.
Não o esqueceram porém Sílvio Romero e João Ribeiro, no Compêndio de história da Literatura brasileira (Segunda edição, 1909, página 97).
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Afirmam dele que é menos ilustre do que frei José Pereira de Sant'Anna e que
Matias Aires; e de suas obras, que são hoje raras e só conhecidas dos bibliômanos.
Não temos tantos filósofos que possamos dispensar o padre Francisco Luís Leal,
apesar de sua formação coimbrã e dos seus serviços a Portugal.
Lá se educou e lá viveu, mas o sangue que corria em suas veias era brasileiro.
Arrolemo-lo, ao menos como uma prova de que os brasileiros não são de todo incapazes
de meditação filosófica.
Dele não se ocupa Lopes Praça na sua História da philosophia em Portugal (Coimbra, 1868).
Século XIX
Frei Caneca
(1779-1825)
Frei Caneca (1779-1825) foi sobretudo um sociólogo, discípulo de Montesquieu.
Com ele vamos encontrar uma concepção do mundo completamente nova, uma maneira
inteiramente diversa de compreender a sociedade e o papel do homem como ser racional
e cidadão.
A atmosfera social brasileira em que viveu já era muito diferente da dos tempos
coloniais propriamente ditos. Viveu numa época de transição, para a qual ele muito
concorreu. A morfologia de cultura ocidental iria arrastar o Brasil para a sua orbita mais
intensamente, imprimindo-lhe o seu cunho indelével. Os elementos mórficos das culturas são as idéias. Frei Caneca, espírito superior, iria embriagar-se com o vinho capitoso
das novas doutrinas.
Poucos escritores terão exercido sobre a posteridade influência tão poderosa como Montesquieu. O Esprit des lois — primeiro esboço cientifico da sociologia, da antropogeografia e da política indutiva — constituiu por muitos anos a bíblia dos liberais
na Europa, o celeiro inesgotável em que os espíritos iam buscar os fatos, os argumentos,
as doutrinas para melhorar a sociedade e o governo dos homens. Foi Montesquieu sobretudo um mestre, e por toda a parte fez discípulos. O nosso frei Caneca foi um deles.
A influencia de Montesquieu no Brasil foi geral, conquanto mais preponderante
no Norte, ou antes no Nordeste. Do Recife, a capital daquela região, onde primeiro brotou a civilização brasileira, ela irradiou triumfante nos escritos inflamados de Frei Caneca, glorioso mártir da revolução republicana de 1824.
As origens remotas desse movimento social prendem-se naturalmente a causas
complexas, cósmicas, antropológicas e sociais, que diferenciam o núcleo colonial do
Nordeste, sob a hegemonia de Pernambuco.
Euclides da Cunha [10] viu na efêmera Confederação do Equador "um caso franco de diferenciação étnica".
Ulysses Brandão [11], estudando percucientemente aquele movimento revolucionário, chama a atenção para a divergência entre o Norte e o Sul no terreno dos princípios e ideais políticos. "O norte era guiado pelos ideais do seu patriarca Arruda Câmara, o sul era dirigido pelos ideais do seu patriarca José Bonifácio.
O patriarca do norte era democrata, foi quem fez a propaganda da república e o
patriarca do sul era aristocrata, foi quem implantou a monarquia no Brasil. E Manoel de
Carvalho, com as suas convicções republicanas, pôs-se, pois, em antagonismo com as
ideias dominadoras do sul".
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Ha flagrante diferença entre a revolução do Norte e a do Sul para implantar o
constitucionalismo e o regime democrático, aquele foi mais impregnado de espírito da
revolução franceza, este transigiu mais com o passado.
O Norte era de mais longa data visivelmente republicano, e o Sul tinha a impecer
o seu progresso liberal a presença da casa reinante desde 1808, a qual agia como cristalizador monárquico.
Feita a independência do Brasil com o auxilio do Príncipe D. Pedro, aumentou o
prestígio da forma monárquica de governo, sobretudo no sul.
Para dar organização definitiva ao estado que vinha de nascer foi convocada a
Assembléia Geral Constituinte, que não chegou a elaborar a constituição por ter sido
ditatorialmente dissolvida pelo imperador.
Essa dissolução da Assembléia Geral Constituinte foi a causa principal do movimento revolucionário pernambucano, que teve em Frei Caneca um dos mais ardentes
promotores.
Dissolvida a Constituinte, D. Pedro I tratou de outorgar ao país uma constituição
que fosse digna dele. Sabe-se hoje que a Constituição do Império, jurada a 25 de Março
de 1824 foi, sobretudo, obra da Martim Francisco, aproveitada pela comissão dos dez
membros nomeados pelo imperador para elaborá-la.
Martim Francisco era, em política, discípulo de Benjamin Constant, e tinha por
livro de cabeceira a Politique Constitutionelle do romântico escritor.
"Em vários artigos do estatuto de 1824, observa o Sr. Carlos Maximiliano, as
próprias palavras são literalmente traduzidas da Politique Constitutionelle, do celebre
publicista europeu" (Comentários à Constituição Brasileira, 1918, p. 23).
"Gozou aquele livro do prestigio de bíblia no parlamento brasileiro durante cinqüenta anos; era invocado a cada passo nas grandes batalhas tribunícias; adquiriu entre
nós autoridade quase igual à do Federalista nos Estados Unidos". (Obra citada).
Quando foi outorgada a Constituição já se publicava, em Recife, o Typhis Pernambucano, jornal de Frei Caneca, cujo primeiro número é de 25 de Dezembro de 1823.
Foi desse baluarte que o frade republicano fez a mais penetrante crítica daquele pacto
social. A ideia lúcida, o pensamento bem pensado, tem uma força irradiante formidável.
Desperta ideias da mesma natureza, tende irresistivelmente à ação.
A crítica percuciente de Frei Caneca é feita estribada nas doutrinas de Montesquieu, cujo livro capital, o Esprit des Lois, muitas vezes cita, e mesmo quando não invoca a autoridade do grande mestre, sente-se no seu pensamento a influência avassaladora do pensador francês.
Assim como a Constituição do Império saiu da Politique Constitutionelle de
Benjamin Constant, da mesma forma a Confederação do Equador deriva em linha reta
do Esprit des lois de Montesquieu.
Ao tempo da revolução pernambucana, na própria Europa, era formidável a influência de Montesquieu, na política. A monarquia parlamentar francesa de 1815 a 1848
foi a realização da teoria de Montesquieu. (G. Lanson — Histoire de la litterature française, 1922, p. 724). O Esprit des lois constituía o programa do partido liberal, na Alemanha, segundo informa Jellinek. Frei Caneca estava, pois, com os partidos mais avançados da Europa.
Como Montesquieu queria a divisão dos poderes em legislativo, executivo e judiciário, para garantir o exercício das liberdades. Criticou fortemente o poder moderador achando que era a chave do despotismo. Pelo mesmo motivo foi contra o veto atribuído ao imperador. Queria que a direção do exército fosse entregue ao legislativo. Até
invocou a influência do clima para dar à Constituição do Brasil feição especial, seguindo de perto o seu mestre predileto.
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"O clima do Brasil, a sua posição geográfica, a extensão do seu território, o caráter moral de seus povos, seus costumes e todas as demais circunstâncias, que devem
influir, conforme os mais sábios publicistas na fatura da sua constituição, são as mesmas
que as das potências constitucionais da Europa, para que o espírito da constituição deste
seja o mesmo que o das constituições daquelas?" (Obra, II, p. 345).
Frei Caneca não escreveu nenhum tratado de filosofia. Lecionou essa matéria,
mas as apostilas do seu curso não chegaram até nós, como aconteceu com as suas lições
de gramática e de retórica. As idéias filosóficas que professava havêmo-las de colher
nos seus escritos políticos, notadamente nas Cartas a Damão e nos panfletos do Typhis
pernambucano.
Homem de ação, político, viveu as suas idéias e por elas sofreu as agruras do
cárcere e do martírio.
É um caso semelhante ao de Sócrates, agia como filosofo, preocupado com o
bem da pátria, e como o ateniense soube morrer com serenidade e confiante no futuro.
A filosofia tem isso de singular: às vezes não está nos escritos que se intitulam
de filosóficos, mas se esconde numa fábula, em parábolas, em contos e romances.
Poder-se-ia, por exemplo, pesquisar a filosofia de Machado de Assis nas suas ficções.
A filosofia de Frei Caneca às vezes está latente, às vezes misturada com a ganga
impura das descomposturas políticas.
Transcreverei ainda eloqüente trecho do Typhis pernambucano, que de certo não
sairia da pena do frade revolucionário se não conhecesse a fundo as doutrinas de Montesquieu:
"O poder soberano, isto é, aquele que não reconhece outro acima de si, existe na
nação. Este poder, que se dirige a procurar a conservação da nação e sua felicidade, se
exercita em formar as leis e executá-las; quando ele se emprega na fatura das leis, chama-se legislativo; e quando em fazê-las efetivas, executivo, o qual trata das coisas que
dependem do direito das gentes, isto é de fazer a paz ou a guerra, de enviar ou receber
embaixadores, de estabelecer a segurança ou prevenir as invasões; e chama-se judiciário, quando trata de coisas, que dependem do direito civil, isto é, poder, que pune os
crimes ou julga das diferenças dos particulares, ao que também alguns dão o nome de
poder executivo do estado.
A vista dessa distribuição do poder soberano de uma nação, se diz um povo
constituído em forma representativa, quando o poder de fazer as leis está nos representantes da nação, o poder de executar as leis, que tem relação com o direito das gentes,
nas mãos de um homem, a quem se dá o nome de imperante, e o tratar das diferenças
dos particulares nas mãos de outros, que formam o corpo judiciário.
Pelo que o governo em que a lei é dada ou oferecida pelo imperante, é monárquico absoluto; pois é a forma de governo, em que se acham depositadas nas mesmas
mãos o poder de fazer as leis, e o de executá-las como foi antigamente, e agora é em
Portugal, Espanha, e Rússia, etc.; forma de governo esta uma das mais prejudiciais e
opostas à liberdade política dos povos; pois que o imperador faz as leis, que quer, e as
executa, como lhe parece, sem o cidadão poder contar com a segurança de sua pessoa,
de seus bens, de sua honra, etc., como nos atesta a história das nações, e nós o experimentamos por três séculos". (Obras, II, p. 497).
Não nos interessa aqui a vida agitada de Frei Caneca, pois o consideramos apenas como filósofo. Procuramos atingir, analisando os seus escritos, que tanta impressão
fizeram sobre os contemporâneos, as ideias capitais que os animavam. Pensamos ter
descoberto a fonte principal, donde deriva a corrente de suas doutrinas, no formidável
livro de Montesquieu.
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Uma lei provincial pernambucana de 1869 mandou reunir e publicar as obras de
Frei Caneca. Disso foi encarregado o erudito Comendador Antonio de Melo, que se saiu
airosamente da empresa. Aqueles escritos, afinal, vieram a lume em 1875, sendo presidente da província o notável brasileiro que depois foi o Barão de Lucena.
Poderia relatar-vos agora os últimos dias de Frei Caneca, mostrando-vos como
soube morrer heroicamente.
É uma pagina sem brilho de nossa historia. Voltêmo-la comovidos...
Nele perdeu o Brasil, no dia 13 de Janeiro de 1825, um dos seus maiores homens
de todos os tempos.
Notas:
[1] Transcrito de Achegas à história da philosophia. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional,
1936, páginas 67 a 97
[2] Jacob de Andrade Vellosino
[3] Etiene Brasil — Philosophia no Brazil. (1917); Leonel Franca, S. J. — Filosofia no
Brasil (1921); Figueiredo, Fidelino de — Para a historia da filosofia em Portugal (Subsídio bibliográfico). Porto, 1922.
[4] A. Métraux— La religion des Tupinamba et ses rapports avec celle des autres tribus
Tupi-guarani. Paris, 1928.
[5] Artur Mota. História da Literatura Brasileira, I, 1930, páginas 405 a431.
[6] Laudelino Freire. Clássicos brasileiros, 1933, páginas 19 a 25.
[7] André de Barros. Vida do apostólico padre Antônio Vieira. 1746, página 661.
[8] O exemplar do Compêndio narrativo do Peregrino da América, que consultei, é da
edição de 1731, e faz parte da biblioteca do Arquivo Nacional. Foi adquirido, em 1928,
a J. Leite & C, por 300$000. Pertencera ao grande poeta Alberto de Oliveira, que lhe
pôs a lápis a seguinte nota:
... "Edição não conhecida de Inocêncio da Silva. No Catálogo (Biblioteca Americana, I).
Maggs Bross, n. 423 (1922) vem anunciado (n. 706) um exemplar da edição de 1760,
por 21 libras. J.Leite & C. (Rio de Janeiro), dizem em nota do catálogo de algumas obras de Lúcio de Azevedo (outubro de 1923) que o exemplar do Compêndio narrativo
Samodães — Azevedo deu em leilão 690$ brasileiros. Os mesmos J. Leite & C. anunciam no O Jornal àe 28-8-1925, um exemplar da edição de 1765, declarando-o raríssimo
por 250$000."
[9] Frei Gaspar da Madre de Deus — Memórias para a história da Capitania de São
Vicente. ed., 1920, p. 94.
[10] À Margem da História, 1919, p. 296
[11] A Confederação do Equador, Recife, 1924, p. 185
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Alcides Bezerra