“VIA SUBCUTÂNEA: UMA NOVA ALTERNATIVA” 1º Prémio de Comunicação Livre das Iª Jornadas de Enfermagem Médico-Cirúrgica do CHBA Autores: Viegas, Marlene (Enfermeira, Serviço de Medicina III do CHBA) Email: [email protected] Lagos, 16 de Agosto de 2011 Resumo Abstract O envelhecimento da população mundial, o desenvolvimento das doenças crónicas e progressivas, assim como, as alterações na rede familiar, têm tido impacto crescente na organização dos sistemas de saúde e nos recursos especificamente destinados aos doentes crónicos. Perante esta situação torna-se pertinente abordar alternativas com menos custos associados e com os mesmos benefícios que as actuais. A via subcutânea, através das suas vantagens, benefícios, indicações e as possíveis complicações, pode contribuir para aumentar o leque de opções terapêuticas bem como a qualidade de vida dos doentes em fim de vida e suas famílias. Esta, deverá ser divulgada pelos profissionais de saúde, que na sua maioria a desconhecem. No entanto, em Portugal esta é utilizada em doentes crónicos e em fim de vida, quer seja pela administração de fármacos (bólus ou infusão contínua) ou administração de fluidos (hipodermoclise). Este artigo é uma revisão teórica acerca desta temática, e tem como principal objectivo dar a conhecer e uniformizar a técnica da via subcutânea, promovendo a melhoria dos cuidados de enfermagem prestados e consequentemente melhorando a qualidade de vida do doente e sua família. With the ageing of the world's population, the development of chronic and progressive diseases, as well as change in the family network, there has been a growing impact in the health systems organization and in the resources specifically for chronic patients. Because of this situation, it's important to approach alternatives with fewer costs and with the same benefits as the current ones. The subcutaneous route, through its advantages, benefits, indications and possible complications, may contribute to increase therapeutic options and the quality of life of the terminal patients' and their families. This method should be disclosed to the health care professionals that are mostly unaware of it. However, in Portugal this route is used in chronic and terminal patients, either by administering drugs (bolus or continuous infusion) or administering fluids (hypodermoclysis). This article is a theoretical review about this subject and has as the main aim to divulge this technique, as well as to standardize the practice of, promoting the improvement of the nursing care given and improving patients and their families quality of life. Palavras Chave: Via subcutânea, hipodermoclise, conforto Keywords: Subcutaneous, hipodermoclysis, comfort INTRODUÇÃO A população mundial cada vez mais envelhecida, o desenvolvimento das doenças crónicas e progressivas, assim como, as alterações na rede familiar, têm tido impacto crescente na organização dos sistemas de saúde e nos recursos especificamente destinados aos doentes crónicos. Perante este cenário, Junior et al. (2000), referem que a procura de alternativas e ou técnicas com menos custos associados e com os mesmos benefícios que as actuais é imprescindível. “(…) em Portugal, 60% da mortalidade deve-se a doenças crónicas evolutivas como o cancro (20-25%), as insuficiências orgânicas (respiratória, cardíaca, hepática, renal, etc.) ou as doenças neurológicas progressivas (demências, Parkinson, ELA, EM, etc.). Em múltiplas ocasiões, também existem co-morbilidades (síndromes geriátricas) que se desenvolvem de uma forma progressiva em semanas ou meses, com frequentes crises de necessidades.” (Ministério da Saúde, 2010, p.3) Tendo em conta esses factores, é altura de modificar a visão e o paradigma de actuação (Lima & Simões, 2007) e o uso de novas técnicas que vão de encontro com as reais necessidades da pessoa, de acordo com os seus padrões de qualidade de vida, são uma prioridade face ao contexto que se vive na actualidade (Pereira, Piedade & Coelho, 2005). A via subcutânea é desconhecida para muitos profissionais de saúde, daí ser raramente utilizada, apesar das suas vantagens (Barbosa & Neto, 2006). A autora, Silva (2011), refere que muitos profissionais de saúde apenas conhecem a via subcutânea para a administração de vacinas, insulinas e/ ou anticoagulantes. Por sua vez, indica que o desconhecimento por parte dos profissionais de saúde se deve à falta de estudos e publicações, e da escassa discussão desta temática nas escolas de medicina e enfermagem. As autoras Takaki & Klein (2010) realizaram um estudo acerca deste tema, e de acordo com o mesmo, a maior parte dos enfermeiros inquiridos desconhece esta técnica de administração de fluidos. Para Barbosa & Neto (2006) a rentabilização desta técnica de hidratação e a sua divulgação junto dos profissionais de saúde, através das suas vantagens, benefícios, indicações e as possíveis complicações, pode contribuir para aumentar o leque de 1 opções terapêuticas bem como a qualidade de vida dos doentes em fim de vida e suas famílias. Neto (2008) afirma que nos cuidados aos doentes crónicos e em fim de vida existe já a tradição de se recorrer à via subcutânea, quer seja administração de fármacos (bólus ou infusão contínua) ou administração de fluidos (hipodermoclise). No nosso país, a utilização desta via acontece mais em doentes que se encontram internados em serviços especializados, como as unidades de cuidados paliativos, porém, noutros contextos ainda existe um grande desconhecimento. A temática apresentada neste artigo: A Via Subcutânea: Uma Alternativa? vai de encontro com essa realidade, pois é uma técnica subutilizada pelos profissionais de saúde, que tem inúmeras vantagens e indicações quer para os doentes, quer para as instituições. O objectivo principal é dar a conhecer e uniformizar a prática para a administração de fármacos (em bólus ou perfusão contínua), e administração de fluidos (hipodermoclise) por via subcutânea, melhorando a qualidade de vida do doente e sua família. VIA SUBCUTÂNEA: UMA ALTERNATIVA Num contexto de doentes em fim de vida a via oral é a preferida, pois, existe uma eficácia garantida, facilidade na administração, boa tolerabilidade, mínimo desconforto, melhor adesão ao tratamento, menor custo e a família e o doente participam activamente no processo. No entanto, existem factores que não permitem que esta seja a via de eleição, pelo que terá que se adoptar uma via alternativa, ou ainda, porque se necessite um fármaco que actue rapidamente para controlo das crises. Desse modo, há que considerar outras vias, nomeadamente a transdérmica, intravenosa, intramuscular, rectal e subcutânea. No que respeita à via intravenosa e intramuscular reconhece-se que estas são vias mais invasivas e que provocam mais sofrimento e ansiedade ao doente e família, assim como os custos que acarretam e as complicações que poderão advir, tais como infecção e hemorragia local, e a nível sistémico a sépsis, levando a um maior período de internamento, para além de que, em domicílio a via 2 intravenosa não está indicada. Por sua vez a via rectal é uma via alternativa, no entanto, desconfortável para os adultos, para além de que nem toda a medicação existente para o controlo sintomático existe nessa forma de apresentação. Relativamente à medicação transdérmica, não tem um início de actuação rápido, e em Portugal só existem opióides (Fentanil e Buprenorfina) o que fica muito aquém do controlo de sintomas que não a dor (Neto, 2008). Assim, na maioria das vezes, para um controlo sintomático eficiente, nomeadamente de náuseas/vómitos, dispneia, entre outros, uma via parenteral é indispensável, surge então a via subcutânea, sendo utilizada de forma contínua (hipodermoclise) ou intermitente (bólus) (SFAF, 2000). O tecido subcutâneo, por ser dotado de inúmeros capilares sanguíneos, torna-se uma via de eleição à administração de fluidos e/ou fármacos, uma vez que serão absorvidos e transportados pelos mesmos à macrocirculação. Os fármacos administrados por via subcutânea têm o comportamento farmacocinético semelhante àqueles administrados por via intramuscular, atingindo no entanto, uma concentração sérica menor, mas com tempo de acção prolongado. Deste modo, evita a clearance présistémica pelo fígado originando uma concentração sérica estável do medicamento, evitando picos plasmáticos que levariam a efeitos colaterais indesejáveis (Instituto Nacional de Câncer, 2009 e Silva, 2011). (Anexo Ia) Breve Abordagem Histórica Em 1909 existem relatos de Starling ter descrito forças osmóticas e hidrostáticas que causam “difusão” (Grencho, 2008). De facto, é através dessas forças que os fluidos/fármacos atingem o espaço intravascular (Lima & Simões, 2007). A autora Silva (2011) refere que a sua utilização remonta a 1913, no entanto, de acordo com Junior et al. (2000) foi em 1940 que esta técnica foi introduzida por Gaisford e Evans para a hidratação de crianças, sendo que, durante vários anos a técnica se tornou popular. Por outro lado, de acordo com as autoras Lima & Simões (2007) e Pedreira (2009) o mau uso desta via em casos de choque hipovolémico (o incorrecto volume administrado, quer por excesso quer por rapidez) e a administração de soluções 3 hipertónicas que conduziam ao colapso circulatório e consequentemente morte, a administração de soluções irritantes e de fármacos vesicantes que lesionavam a pele, e o desenvolvimento da via endovenosa, levou ao abandono desta técnica. Otto (2000) relata que a partir do momento em que a via endovenosa se tornou comum, a via subcutânea converteu-se numa via subestimada. Silva (2011) refere que com o desenvolvimento dos cuidados paliativos nos Hospices em Inglaterra, na década de 60, esta técnica foi reavaliada e começou a utilizar-se novamente com inúmeros benefícios em doentes em fim de vida. Assim, Grencho (2008) descreve que foram-se realizando estudos, sendo que na década de noventa, a hidratação subcutânea começa a ser novamente utilizada em doentes geriátricos e em contexto de cuidados paliativos. Material Utilizado e Técnica de Colocação SFAF (2000) defende que esta é uma via pouco traumática e que requer uma técnica simples, e assim, como em todos os procedimentos é necessária a explicação da mesma ao doente, informá-lo acerca da mesma, assim como as suas vantagens e benefícios esperados. De acordo com Neto (2008), os primeiros cuidados inerentes à execução da técnica é sempre efectuada pelo médico ou enfermeira, mas a administração de medicação e em contexto de cuidados domiciliários, poderá ser praticada pela família. Para isso, e em concordância com Luz (2008), deve pedir-se sempre a colaboração do doente e incluir a família neste processo, orientando o doente que será administrada medicação por esta via e colaborar com a equipa de saúde na execução da técnica. Os autores Menahem & Pesach (2001), defendem que esta técnica pode ser praticada no domicílio por familiares ou enfermeiros, e a técnica deverá ser conhecida pelos membros da família, aos quais dever-se-á realizar o ensino. Para Neto (2008), esta técnica é uma mais-valia para o doente, pois o número de vezes que é puncionado é reduzido, uma vez que as agulhas epicraneanas - Buterffly (que deverão ter um calibre entre 21º-25º Gauge) na administração de fármacos podem permanecer de 5-8 dias no mesmo local, e no uso das Teflon podem chegar a ultrapassar 4 esse número, essas, tem-se revelado mais vantajosas comparativamente com as típicas agulhas epicraneanas. No entanto, apesar de poderem permanecer mais tempo no local, são mais dispendiosas e têm que se validar as vantagens globais para o doente e sua família. Menahem & Pesach (2001) perante um estudo, revelam que os doentes com a Teflon podem permanecer até cerca de 11 dias comparativamente à média de dias que pode permanecer a Buterffly. Os autores Porta, Batiste & Tuca (2008) alertam que ao puncionar deverá fazê-lo de acordo com as linhas da pele, para não ser mais doloroso ao doente o acto da punção. Neste contexto, também dever-se-á realizar uma prega para estimular os nociceptores e diminuir a dor. Segundo as autoras, Takaki & Klein (2010), após puncionar a pele num ângulo de 45º a 60º, numa prega cutânea, deve-se fazer uma rotação de 180º com o bisel da agulha para baixo para proporcionar uma melhor difusão, e evitar a obstrução da agulha causada pela gordura do tecido subcutâneo. Contudo, é necessário ter uma especial atenção para não puncionar o tecido intradérmico, por conduzir a extravasamento de líquido. Neto (2008) alerta para que a colocação da agulha deva ser tão proximal quanto possível, de modo a permitir uma difusão medicamentosa mais rápida e aumentada pela gravidade. A mesma autora afirma que se deve considerar sempre a mudança de local quando existe a presença de sinais inflamatórios locais e a existência de sangue na tubuladura. Caso ao puncionar reflua sangue, dever-se-á comprimir a zona de punção durante 2 a 3 minutos e puncionar a zona adjacente. Igualmente, os autores Porta, Batiste & Tuca (2008) explicam que o novo local de punção deve localizar-se a uma distância mínima de 5cm da antiga punção. (Anexo Ib) Após fixação do sistema epicraneano (com opsite ou adesivo) pode iniciar-se a administração de fármacos e/ ou fluidos. O sistema epicraneo deverá estar preenchido com soro fisiológico, e após administração de medicação dever-se-á injectar cerca de 2ml de soro fisiológico, de modo que não fique medicação na tubuladura (Neto, 2008). 5 Locais de Punção Neto (2008) defende que sempre que possível deverá ser o doente a escolher o local de punção, sendo de preferência em locais que não interferem com os movimentos do doente. Porém, as autoras Pereira, Piedade & Coelho (2005) afirmam que a mobilidade do doente muitas vezes condiciona a escolha do local de punção. Reforçando esta ideia Caballero (2006), salienta que ao se escolher a zona para puncionar é necessário considerar alguns aspectos como, a solução/ fármaco a infundir, as actividades de vida diárias e o estado físico e psicológico do doente. A referir, doentes confusos e/ ou agitados, esta técnica assume extrema importância, pois proporciona maior conforto e maior mobilidade ao doente sem que seja necessário a imobilização do membro, sendo o risco de infecção e flebite praticamente inexistente. Relativamente aos locais de punção a utilizar, SFAF (2000) orienta: a região sub-clavicular (evitando sempre o tecido mamário e zonas adjacentes); a região escapular (quando o doente se encontra com agitação e com tendência para arrancar as perfusões, com delirium); a região abdominal (considerando uma circunferência em torno do umbigo com cerca de quatro dedos à volta do mesmo); a região externa das coxas e as regiões externas dos braços (em último recurso). As autoras Pereira, Piedade & Coelho (2005), complementam que a região peitoral no género masculino, e a região inframamária no caso do género feminino sobre o espaço intercostal poderá ser utilizado. Nos doentes com caquexia o espaço intercostal deve ser evitado por risco elevado de pneumotórax. Já as autoras, Takaki & Klein (2010), defendem que quando o doente apresenta incontinência urinária e/ ou insuficiência vascular periférica a face interna da coxa deve ser evitada. Neto (2008) explica que o espaço subcutâneo permite a administração de volumes de 1000 a 1500cc em 24h, sendo as áreas de maior absorção: a região torácica e abdominal. Por isso torna-se nas regiões eleitas para hipodermoclise e a administração prolongada de fármacos. No caso de hipodermoclise, deve-se evitar a punção nas regiões deltóides. 6 É importante considerar outros factores na escolha do local de punção, nomeadamente a integridade cutânea, pois os tecidos junto a cicatrizes operatórias e/ou já sujeitos a irradiação são contra-indicados, pois, a incisão cirúrgica destrói a circulação linfática e a radioterapia compromete a absorção dos fármacos e fluidos (Neto, 2008). Os autores Porta, Batiste & Tuca (2008) reforçam que será de evitar zonas de pele com sinais inflamatórios, presença de edemas e regiões com infiltração tumoral ou ulceradas. Indicações e Vantagens Segundo Neto (2008) a principal indicação para o uso desta via é a agonia, a inviabilidade da via oral, o controlo da dor, vómitos e sedação. Relativamente às indicações apresentadas por Caballero (2006) são: a impossibilidade da via oral, a necessidade de efeito rápido da medicação, vómitos e náuseas incoercíveis, disfagia, obstrução intestinal, confusão, doses elevadas por via oral, necessidade de sedação terminal, intolerância a opióides por via oral, efeitos secundários acentuados por via oral, marcada redução da absorção gastrointestinal, prostração extrema, inconsciência e agonia. O mesmo autor aponta como vantagens: menos traumática/ invasiva e mais cómoda, facilidade nos locais de punção, técnica simples, não requer hospitalização, menos efeitos secundários que a via endovenosa, mantém a autonomia do doente, menor custo, menor risco de complicações/ infecções, índice de absorção semelhante ao da via intramuscular, biodisponibilidade sobreponível à da via intravenosa. Neto (2008) afirma que esta técnica pode ser utilizada simultaneamente com a via oral e transdérmica, para além de que o doente, usufrui de todos os benefícios de uma via parentérica sem ter as desvantagens das vias intravenosa e intramuscular. Contra-indicações e Desvantagens Ainda segundo esta autora, existem poucas contra-indicações para a escolha desta via, como a anasarca, hemorragia aguda profusa, entre outras. Para além da anasarca como contra-indicação, Caballero (2006) alerta para outras: vasoconstrição periférica acentuada (choque), alterações generalizadas da integridade cutânea, farfalheira (evidência de falência 7 cardíaca), situações em que é necessário a administração de soros em grandes quantidades e rapidamente, infecção de repetição nos locais de punção, coagulopatias, doentes em programa de hemodiálise, tecidos junto de cicatrizes operatórias e/ ou já irradiadas. No que respeita às desvantagens, de acordo com o mesmo autor, pode apontar-se a introdução de pequenos volumes e limitação na administração de electrólitos e alguns fármacos. Por outro lado as complicações associadas a esta via são: eritema, edema local, hemorragia ligeira e hematoma local, prurido, défice de absorção, abcessos, inflamação, dor, fugas, infecção local (1%). Neto (2008) adverte para as complicações sistémicas, que estão sempre dependentes do estado geral do doente, sendo que, pode surgir farfalheira, aparecimento e/ou agravamento dos edemas periféricos, sendo importante ponderar o benefício/malefício da manutenção de soro em hipodermoclise. Os autores, Menahem & Pesach (2001) defendem que aquando do aparecimento do edema, pode-se implementar uma massagem local ou introdução de diuréticos. Fármacos e Soros Segundo Neto (2008) o balão de soro deve ser colocado a cerca de 1,5m de altura em relação ao doente, o soro deve conter electrólitos, como o Cloreto de Sódio a 0,9%, Dextrose a 4% (preferencial), Dextrose a 5% (é bem tolerada, mas poderá surgir uma maior tumefacção local, por acumulação de fluidos no espaço intersticial) + 20ml de Cloreto de Sódio a 20%, de modo a evitar-se a formação de um terceiro espaço. Com os soros poder-se-ão administrar fármacos compatíveis com esta via e também potássio até 40mEq/L. Ainda a salientar, está contra-indicado a administração de soros hipotónicos. A absorção dos soros pela via subcutânea pode ser muito irregular, a velocidade de perfusão pode ser controlada com o sistema de conta-gotas, podem ser administrados 25-100ml de soro/hora, pelo que se deve ter em conta que 20 gotas = 1ml, deverá ser este o cálculo do gotejo para as diferentes quantidades de soro a administrar: 500ml/24h – 7gotas/minuto; 1000ml/24h – 14gotas/minuto; 1500ml/24h – 21gotas/minuto. A administração pode ser interrompida e reiniciada sem risco de hemorragia ou formação 8 de coágulos. Esta técnica pode ser utilizada em doentes a fazer anticoagulação, pois não existe o risco de hemorragia grave associado e/ou de embolia (Neto, 2008). Os autores Menahem & Pesach (2001) admitem que a administração de fluidos hipodermoclise, é sustentável para a correcção de uma desidratação leve a moderada em doentes adultos, podendo ser administrados 3000ml de soro nas 24h em dois locais separados. De acordo com Neto (2008), na administração de fármacos pela via subcutânea é necessário ter em conta alguns factores, os fármacos deverão ter baixa viscosidade, não serem irritantes e/ ou citotóxicos, e que sejam bem absorvidos pelo tecido conjuntivo e adiposo. Logo, caso não se verifiquem essas propriedades nos fármacos o risco de necrose e dor local pode surgir. Deste modo, é conhecido que o Diazepam e a Cloropromazina não podem ser administrados por esta via. Normalmente, e segundo a mesma autora, os fármacos mais comummente utilizados para o controlo sintomático, em doentes crónicos e em fim de vida no contexto de cuidados paliativos são: opióides (morfina, tramadol, fentanil), neurolépticos (haloperidol e levomepromazina), antieméticos (metoclopramida, ciclizina, haloperidol, levomepromazina) e a butilescopolamina como anticolinérgico. Outros fármacos como o midazolam, octreotido, furosemida, clodronato, ceftriaxona e cefipima são administráveis por esta via. (Anexo II) Segundo Neto (2008) e Caballero (2006), existem factores que condicionam a absorção e difusão dos fármacos como a lipossolubilidade, concentração do fármaco, volume administrado, o estado do tecido subcutâneo (fibrose, edema), o nível de obesidade do doente, a superfície corporal (maior superfície, maior absorção), a sua função cardiovascular (fluxo sanguíneo) e a perícia do profissional de saúde. Barbosa & Neto (2006) e Caballero (2006) referem que as complicações mais comuns são o edema por um excesso de líquido administrado que poderá ser controlado com a administração de hialuronidase no soro infundido, 150 a 170 unidades por litro, assim como, uma massagem com movimentos circulares no local de punção, e aplicação de calor aumentam o fluxo sanguíneo. Esta enzima facilita a difusão e absorção rápida dos líquidos injectados pela destruição temporária da barreira intersticial do tecido 9 conjuntivo. Rochon et al. (1997) revela que o uso de hialuronidase facilita a absorção, aumenta a rapidez da solução/medicação, no entanto, não altera os níveis de conforto dos pacientes. No entanto, de acordo com Menahem & Pesach (2001) alguns estudos sugerem que a adição desta enzima não é necessária para a prevenção do edema. Por outro lado e baseando-se na evidencia científica, Neto (2008) confirma ser uma substância dispensável. A autora Neto (2008) alerta para o facto de não se poder injectar mais de 3 fármacos no mesmo local, por comprometer a absorção dos mesmos e a consequentemente influenciar a eficácia terapêutica. Por isto, poderá ser necessário outro acesso quando é necessário administrar mais de 3 fármacos. A confirmar, SFAF (2000) refere que nunca se deve administrar no mesmo local uma medicação superior a 3ml. Se estão prescritos vários fármacos são necessários diferentes acessos. No caso de ser uma administração contínua, o profissional de saúde deve considerar sempre a compatibilidade entre fármacos e calcular o ritmo de perfusão. (Anexo III e IV) Barbosa & Neto (2006) referem que as infusões podem ser administradas por gravidade, sem necessidade de aparelhos de infusão contínua como as bombas infusoras. Porém se se utilizar bomba infusora, evita-se que a concentração plasmática baixe para níveis que conduzam ao aparecimento de sintomas (Silva, 2011). Segundo os autores, Porta, Batiste & Tuca (2008) a administração de soroterapia – hipodermoclise, durante as horas de sono é melhor tolerada pelos doentes, pelo facto de diminuir a limitação física. Remington & Hultman (2007) afirmam que a perfusão pode ser interrompida sem que possa haver o risco do acesso ficar não funcionante. 10 CONCLUSÃO Para os doentes com doença crónica e de evolução progressiva pretende-se uma qualidade de cuidados baseada nas suas necessidades, esses cuidados devem ser discutidos com o doente e sua família, com o objectivo de causar o menor sofrimento possível ao doente (Neto, 2008). Assim, Lima & Simões (2007) defendem que apesar da via oral, ser a via de excelência, muitas vezes, encontra-se comprometida, sendo a via de eleição alternativa a via subcutânea. Pedreira (2009) revela que a hipodermoclise pode ser a solução para a hidratação em idosos, pois a desidratação nestes leva a morbilidade e consequentemente mortalidade. Menahem & Pesach (2001) complementam que esta administração de fluidos permite manter a hidratação adequada, em doentes que não consigam manter a via oral disponível. Pois, de acordo com alguns estudos, Salgado (2008), afirma que os internamentos recorrentes de idosos seriam evitados se os programas de cuidados domiciliários incluíssem a hidratação por hipodermoclise. Outros autores, Remington & Hultman (2007) esclarecem que muitas vezes o tratamento da desidratação é corrigido pela administração de fluidos endovenosos, o que requer hospitalização e um maior custo, com risco de aparecimento de infecções nosocomiais. Perante isto, a via subcutânea comparativamente à via endovenosa reduz a frequência das hospitalizações sendo tão eficaz como a segunda. Os autores Yap, Tan & Koo (2001) asseguram que a hipodermoclise é a forma mais fácil e conveniente para promover a hidratação, defendendo que para não surgirem complicações e uma maior aceitação da técnica, é necessário realizar um protocolo com directrizes claras, pois quando as normas são respeitadas os riscos desta técnica são mínimos. A hidratação em fim de vida é uma temática controversa, que levanta alguns dilemas éticos, apesar de apresentar vantagens e desvantagens, a hidratação de doentes em fim de vida, tem que ser ponderada pela equipa multidisciplinar incluindo sempre o doente e família nessa decisão (Grencho, 2008). 11 Para Takaki & Klein (2010) o enfermeiro deve ter consciência da aplicação desta técnica para prestar cuidados holísticos, de forma a promover o conforto e a qualidade de vida do doente e sua família. Concordando com Lima & Simões (2007), esta técnica deverá deixar de ser uma técnica exclusivamente utilizada em doentes geriátricos e em contexto de cuidados paliativos, para ser difundida para as diferentes áreas de actuação, sendo, uma prática que promove o conforto e consequentemente a qualidade de vida do doente e sua família, assim como a melhoria dos cuidados de enfermagem. Para tal, existe o Protocolo de Actuação N.º64/CHBA de 2009 que corrobora toda a informação disponibilizada neste artigo de revisão literária, promovendo o esclarecimento acerca da utilização da via subcutânea. 12 BIBLIOGRAFIA Barbosa, A. & Neto, I. G. (2006). Manual de cuidados paliativos. Lisboa: Faculdade de Medicina de Lisboa. Caballero, M. (2006). Tratado de administracíon parenteral. Madrid: Difución avances de enfermería. Coelho, D. (2011, Fevereiro). Via subcutânea. Comunicação apresentada no Curso de Enfermagem em Cuidados Paliativos, Portimão. Grencho, L. (2008). A via subcutânea: uma alternativa para a administração terapêutica. Nursing, 229, pp. 14-18. Instituto Nacional de Câncer (2009). Terapêutica subcutânea no câncer avançado: série cuidados paliativos. Rio de Janeiro: CEDC. Junior, A. et al (2000). Subcutaneous hydration by hypodermoclysis: a pratical and low cost treatment for elderly patients. Drugs & Aging, 16, pp. 313-319. Lima, P. & Simões, S. (2007). 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Acedido a 15 de Abril, 2011, em http://www.sma.org.sg/smj/4211/4211a6.pdf. 14 ANEXOS ANEXO I Anexo Ia - Figura nº1 - Variação da concentração do fármaco na corrente sanguínea com o tempo Fonte: Adaptação de Lüllmann, Color Atlas of Pharmacology, 2000, In Instituto Nacional de Câncer, 2009 Anexo Ib - Figura nº2 – Material utilizado e execução da técnica Fonte: Portero, C. & Viegas, M., 2011 ANEXO II - Tabela nº1 – Fármacos de uso comum e fármacos utilizados em Cuidados Paliativos por via subcutânea Fonte: Adaptado de Caballero, 2006 e Neto, 2008 In Coelho, D., 2011 ANEXO III - Tabela nº 2 – Fármacos que se podem utilizar misturados em infusão contínua Fonte: Adaptado de Caballero, 2006 In Coelho, D., 2011 ANEXO IV - Tabela nº 3 – Compatibilidade de fármacos na via subcutânea Fonte: Adaptado de Dickman (2002) In Neto, 2008 cit por Coelho, D., 2011 15 ANEXO I Anexo Ia Figura nº1 - Variação da concentração do fármaco na corrente sanguínea com o tempo Fonte: Adaptação de Lüllmann, Color Atlas of Pharmacology, 2000, In Instituto Nacional de Câncer, 2009 Anexo Ib Figura nº2 – Material utilizado e execução da técnica Fonte: Portero, C. & Viegas, M., 2011 16 ANEXO II Fármacos de uso comum Fármacos utilizados em Cuidados Paliativos Adrenalina Ambroxol; Anestésicos locais; Atropina; Bifosfonatos (clodronato); Bromexina; Cefipima; Cianocobalamina; Clonidina; Desmopressina; Dexpantenol; Eritropoietina Glucagom; Heparina de baixo peso molecular; Hidrocortisona; Insulina; Interferons; Naloxona; Salbutamol; Sumatriptano; Tenoxicanm; Tetracosactido; Vacinas. Butilescopolamina; Calcitonina; Ceftriaxona; Cefipima; Cetorolac; Ciclizina; Cloreto de potássio; Cloreto de Sódio; Dexametasona; Diclofenac; Fentanil; Fenobarbital; Furosemida; Haloperidol; Hialuronidase; Hidroxizina; Ketamina; Levomepromazina; Metadona; Metoclopramida; Midazolam; Morfina; Neostigmina; Octreotido; Omeprazol; Ondansetrom; Tramadol. Tabela nº1 – Fármacos de uso comum e fármacos utilizados em Cuidados Paliativos por via subcutânea Fonte: Adaptado de Caballero, 2006 e Neto, 2008 In Coelho, D., 2011 17 ANEXO III Fármacos que se podem utilizar misturados em infusão contínua Combinação de 2 fármacos Combinação de 3 fármacos Escopolamina – Midazolam Midazolam – Escopolamina – Metoclopramida Metoclopramida – Haloperidol Midazolam – Tramadol – Metoclopramida Tramadol – Haloperidol Midazolam – Tramadol – Escopolamina Metoclopramida – Escopolamina Haloperidol – Midazolam – Escopolamina Metoclopramida – Midazolam Haloperidol – Escopolamina – Metoclopramida Escopolamina – Haloperidol Escopolamina – Dexametasona - Metoclopramida Haloperidol – Midazolam Tabela nº 2 – Fármacos que se podem utilizar misturados em infusão contínua Fonte: Adaptado de Caballero, 2006 In Coelho, D., 2011 18 ANEXO IV Fármacos Compatibilidade Farmacológica Butilescopolamina Morfina, Haloperidol, Midazolam, Octreotido, Levomepromazina Dexametasona Não deve ser misturada com outros fármacos em perfusão, excepto se for em doses muito baixas (1mg/24h) Diclofenac Não é compatível com outros fármacos em perfusão: administrar isoladamente Haloperidol Morfina. Tramadol, Butilescopolamina, Metoclopramida, Levomepromazina; Midazolam, Octreotido Levomepromazina Morfina, Butilescopolamina, Metoclopramida, Haloperidol, Midazolam, Octreotido Metoclopramida Morfina, Tramadol, Haloperidol, Midazolam, Octreotido Metadona Midazolam Midazolam Morfina, Butilescopolamina, Metoclopramida, Haloperidol, Levomepromazina, Octreotido Morfina Butilescopolamina, Metoclopramida, Haloperidol, Levomepromazina, Midazolam, Octreotido Octreotido Morfina, Butilescopolamina, Metoclopramida, Haloperidol, Levomepromazina, Midazolam Tramadol Haloperidol, Metoclopramida Tabela nº 3 – Compatibilidade de fármacos na via subcutânea Fonte: Adaptado de Dickman (2002) In Neto, 2008 cit por Coelho, D., 2011 19