FACULDADE DE DIREITO DE CAMPOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – MESTRADO A SEGURANÇA JURÍDICA DO REGISTRO PÚBLICO FACE A PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA URBANA BRASIL 1988 – 2005 Rosinete Cavalcante da Costa Campos dos Goytacazes – RJ 2006 ROSINETE CAVALCANTE DA COSTA A SEGURANÇA JURÍDICA DO REGISTRO PÚBLICO FACE A PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA URBANA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado, da Faculdade de Direito de Campos, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito, na área de concentração de Relações Privadas e constituição. Sob a orientação do Prof. Dr. Ricardo Pereira Lira. CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ 2006 ROSINETE CAVALCANTE DA COSTA A SEGURANÇA JURÍDICA DO REGISTRO PÚBLICO FACE A PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA URBANA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito – Mestrado, da Faculdade de Direito de Campos, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito, na área de concentração de Relações Privadas e constituição. Aprovada em 12 de Maio de 2006. COMISSÃO EXAMINADORA ______________________________________________ Prof. Dr. Ricardo Pereira Lira FDC – Faculdade de Direito de Campos Orientador ______________________________________________ Prof. Dr. Auner Pereira Carneiro FDC – Faculdade de Direito Campos ______________________________________________ Profª. Drª. Rosângela Lunardelli cavallazzi PUC – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro A Deus pela sua insofismável misericórdia. Aos meus mestres e amigos, pelo apoio, pelas críticas, e por tudo que fui capaz de aprender com eles. E, especialmente aos meus pais e irmãos, pelo apoio nesta trajetória e pela inabalável confiança. Enquanto exista um par de olhos chorando as lágrimas da irresignação, enquanto mentes e corações busquem o igual acesso de todos aos bens essenciais a uma vida digna, sistemas políticos podem ser extintos, estátuas derrubadas, mitos varridos, mas o socialismo democrático não perecerá. Lira, Ricardo Pereira. Elementos de Direito Urbanístico, Rio de Janeiro: Renovar, 1997. RESUMO Esta dissertação buscou analisar a co-relação entre a situação das propriedades imobiliárias e os cartórios de registro público, analisando e verificando se as normas as quais ambos estão adstritos, estão sendo cumpridas; e se as práticas cartorárias dos notários e registradores, têm influenciado o processo de urbanização das cidades, na proliferação dos loteamentos clandestinos e irregulares, inclusive na proliferação das favelas. Os notários e registradores têm as suas atividades normatizadas, não podendo realizar atividades que não estejam previstas em leis; analisando quais são os motivos que levam os Cartórios Públicos, mais especificamente os Cartórios imobiliários a não efetuar o seu dever. Verificando que as atividades cartorárias repercutem no espaço sócioambiental na sociedade. Analisar também o posicionamento da Administração Pública no cumprimento de seu dever junto à sociedade, fiscalizando os serviços realizados pelos notários e registradores, que exercem suas atividades após delegação da Administração Pública. Identificar a responsabilidade da Administração Pública no processo de proliferação de favelas, loteamentos clandestinos e irregulares, e inclusive, na degradação do meio ambiente. Palavras chaves: Registro. Imóveis. Administração Pública. Cartório. Impacto. Urbanização. Função social. ABSTRACT This dissertation aims to analyze the co-relation between real estate and registry offices. It investigates and verifies if the regulation standards, to which both are subject, are being met, and if the attitudes taken by notaries and registrars have influenced the urbanization of cities concerning the spread of illegal and irregular lotting, as well as the spread of slums. Since the notaries and registrars have their activities under regulation, and they cannot take attitudes not fixed by law, this research analyzes what reasons make the public offices, more exactly real estate registry offices, fail to do their duty. It verifies that the public offices’ activities do interfere in the socio-environmental space of society. It investigates the position taken by the Public Administration, while fulfilling its duty to society, by supervising the services performed by notaries and registrars, since their activities are delegated by the Public Administration. It identifies the Public Administration’s responsibility for the spread of slums, the illegal and irregular lotting and also for the degradation of the environment. Key-words: Register. Real estate. Public administration. Notary office. Registry office. Impact. Urbanization. Social function. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 09 CAPITULO I – A PROPRIEDADE IMÓVEL ............................................................ 10 1.1 CONCEITO ......................................................................................................... 10 1.2 A PROPRIEDADE IMÓVEL NO BRASIL ........................................................... 13 1.2.1 Evolução ......................................................................................................... 13 1.2.2 Formas de propriedade imóvel .................................................................... 16 1.2.2.1 Propriedade rural .......................................................................................... 17 1.2.2.1.1 Módulo Rural ............................................................................................. 22 1.2.2.1.2 Minifúndio .................................................................................................. 26 1.2.2.1.3 Latifúndio ................................................................................................... 27 1.2.2.1.4 Empresa rural ............................................................................................ 29 1.2.2.1.5 Pequena e média propriedade .................................................................. 31 1.2.2.1.6 Propriedade produtiva ............................................................................... 32 1.2.2.2 Propriedade urbana ...................................................................................... 33 1.2.3 Atos constitutivos de direitos da propriedade imóvel ............................... 42 1.2.3.1 Loteamentos ................................................................................................. 42 1.2.3.2 Condomínio e suas modalidades ................................................................. 51 1.2.3.3 Multipropriedade ........................................................................................... 63 1.2.4 Limitação e restrição ao direito de propriedade ........................................ 66 1.2.4.1 Função social da propriedade ...................................................................... 71 1.2.5 O registro da propriedade imóvel ................................................................ 77 1.2.5.1 Evolução ....................................................................................................... 77 1.2.5.2 Conceito ....................................................................................................... 79 1.2.5.3 Princípios e funções ..................................................................................... 92 1.2.5.4 Procedimentos para o registro ..................................................................... 90 CAPÍTULO II – A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ..................................................... 98 2.1 EVOLUÇÃO ........................................................................................................ 98 2.2 CONCEITO ....................................................................................................... . 98 2.3 FUNÇÃO .......................................................................................................... 102 2.4 COMPETÊNCIA ............................................................................................... 104 2.5 SERVIÇO NOTARIAL E DE REGISTRO ......................................................... 108 2.5.1 Responsabilidade ........................................................................................ 115 2.6 DOCUMENTOS ................................................................................................ 122 2.6.1 Autenticidade e reconhecimento ............................................................... 124 2.7 O USUÁRIO ..................................................................................................... 128 2.8 MINISTÉRIO PÚBLICO .................................................................................... 132 CAPITULO III – REPERCUSSÕES DO ESTUDO ................................................. 138 3.1 A LEGALIDADE E EXERCÍCIO DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA................. 138 3.1.1 Simulação de registro de loteamento urbano e rural .............................. 140 3.2 RISCOS DA URBANIZAÇÃO ........................................................................... 143 3.2.1 Impacto sócio-ambiental ............................................................................ 146 3.3 SITUAÇÃO HABITACIONAL ............................................................................ 152 CONCLUSOES ...................................................................................................... 154 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 160 9 INTRODUÇÃO De início, cumpre-nos salientar que o serviço de registro público que é de grande utilidade para os operadores do direito, deveria realmente demonstrar a sua praticidade como instrumento de segurança jurídica, atendendo aos requisitos legais para o seu adimplemento, para que as fraudes e inseguranças jurídicas não viessem a ter origem em seus atos. Devendo todos os atos jurídicos que se iniciam com Registro Público, atender não somente a forma legal, mas terem uma real efetividade jurídica, conseguindo impedir os abusos daqueles que premeditam as suas ações ilegais por anos, esperando o melhor momento para utilizar-se de um título sem valor legal, porém, com cunho de verdadeiro, pois, até então, uma vez fraudado o registro, os seus efeitos serão os mesmos de um registro plenamente válido. E esses efeitos podem ser vistos em vários ramos do direito, principalmente naqueles que tenham em sua a essência o patrimônio, inclusive o ramo imobiliário e urbanístico, gerando resultados que afetam não somente o interessado, mas indiretamente a própria cidade em decorrência dos loteamentos irregulares, de empresas paralisadas. Ambos os casos, passa-se à responsabilidade originária dos proprietários para o governo, lesando os cofres públicos e beneficiando os proprietários com um enriquecimento sem causa, tendo em vista que, em prol da coletividade, o governo tenta amenizar os problemas sociais surgidos pelas irregularidades. O registro público face a propriedade imobiliária foi tratada pelo Código Civil de 1916, por lei específica que sofreu várias modificações, pela Constituição da República Federativa do Brasil e pelo atual Código Civil, que acompanhando a evolução dos fatos sociais, introduziu alterações da maior importância no campo do direito civil e, em particular, no âmbito dos registros públicos, entre os quais se inclui o Registro de Imóveis. 10 CAPITULO I – A PROPRIEDADE IMÓVEL 1.1 CONCEITO Para falar-se sobre a propriedade imóvel faz-se mister antes uma breve discussão sobre os bens imóveis, considerados como tal todos os bens que não podem ser transportados sem perda ou deteriorização de sua substância1, divididos anteriormente pelo código de 1916 em bens imóveis por natureza, considerados por si mesmos; bens imóveis por acessão física artificial, incorporados permanentemente pelo homem ao solo, de modo que não possam ser retirados sem serem destruídos ou danificados; bens imóveis por acessão intelectual, considerados desta forma os bens móveis imobilizados por destinação do proprietário que os emprega com a finalidade precípua de explorar, embelezar ou por qualquer outro modo aumentar a utilidade do imóvel ou tirar proveito; e bens imóveis por determinação legal, considerados como tal certos bens ou direitos reais sobre imóveis pela lei2. Mesmo tendo sido mantida essa classificação, o Código Civil restringiu-a a análise do caso concreto ao determinar que serão bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente, contudo, a propriedade do solo que antes pertencia integralmente ao seu proprietário, incluindo nela o espaço aéreo e o subsolo, com todos os seus potenciais, passou pelo art. 1.229 do Código Civil, a abrangê-los somente em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas por terceiros, a uma altura ou profundidades tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las3. Estatuindo o art. 176 da Constituição da República Federativa do Brasil de 19884, que as jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta do solo, para efeito de exploração 1 VENOSA , Silvio. de S. Direito civil: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v. 1. p. 316. JUNQUEIRA, Gabriel J. P. Teoria e prática do direito imobiliário: aquisição – perda – defesa – ações. 2. ed. São Paulo: Edipro, 1997. p. 31. 3 BRASIL. Código civil e legislação civil em vigor. Organização: Theotônio Negrão. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 221. 4 BULOS, Uadi L. Constituição anotada. 5. ed. Rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.234. 2 11 ou aproveitamento, e pertencem a União, a qual pode outorgá-la mediante autorização ou concessão, no interesse nacional, na forma da lei, a brasileiros natos ou naturalizados ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País5. Quanto aos bens por acessão intelectual houve a supressão desta classificação dos objetos mantidos intencionalmente no imóvel para sua exploração industrial e a dos objetos empregados para o aformoseamento do imóvel, devido ao fato de nem sempre ser possível definir a imobilização ou a utilização do objeto para o aformoseamento do imóvel; enquanto que a dos objetos destinados à comodidade do imóvel, para que atualmente sejam considerados como imóveis têm que ser devidamente discriminados ou ser analisada a vontade dos interessados6. Tendo também sido modificado o posicionamento dos bens imóveis por determinação legal, pois o art. 80 do Código Civil passou a classificar como tais somente os direitos reais sobre bens imóveis, suas respectivas ações e o direito a sucessão aberta7, enquanto que o código de 1916, em seu art. 44, incluía o penhor agrícola e as apólices da dívida pública oneradas com a cláusula de inalienabilidade8. Assim pode-se dizer que a propriedade imóvel, considerada em si mesma, é um bem imóvel por natureza ou por acessão, pois, o Código Civil em seu art. 79, admitiu os imóveis por acessão ao definir como imóvel tudo que ao solo se incorporar natural ou artificialmente9, independente se estar referindo-se a propriedade imóvel como solo ou a construção efetuada nele. Passando, desta forma, a propriedade em um sentido amplo, a ser um dos institutos jurídicos fundamentais e o mais importante do Direito Privado10, o que levou o legislador brasileiro a separar um título inteiro no Código Civil para a sua regulação e garanti-la no art. 5º, XXII e XXIII da CF/88, como um direito fundamental e individual, 5 SILVA, José A. da. Curso de direito constitucional positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 795. 6 VENOSA, 2003, p. 321. 7 NEGRÃO, 2003, p. 54. 8 BRASIL. Código civil e legislação civil em vigor. Organização: Theotônio Negrão. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 57. 9 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1. p. 123. 10 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 139. 12 dispondo que ela deverá atender a sua função social11, e ainda, pelo art. 170 da CF/88, fundar-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa12, com o fim de assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social, que busca a harmonização social, almejando uma ordem de justiça contraposta ao simples arbítrio individual ou coletivo13. Impondo-se, desta forma, ao direito de propriedade uma limitação com o reconhecimento de sua função social em benefício de toda a sociedade14, diferentemente do que ocorria no período feudal em que eram deliberados privilégios que permitiam ao indivíduo isolar-se da sociedade no uso, gozo e fruição dos seus bens, de modo absoluto e exclusivo15. Características estas que foram restringidas pelo princípio da função social da propriedade, ficando o direito de propriedade vinculado a sua executoriedade, mesmo que tenha permanecido como um direito individual e continuado, e ainda, a ser considerado pelo art. 524 do Código Civil de 1916, no poder do proprietário de usar, gozar, dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua16, independentemente dos limites normativos que impõem que a propriedade seja utilizada para o bem-estar da coletividade, Podendo e devendo o Poder Público, na defesa dos interesses coletivos, condicionar o uso da propriedade privada, regulamentando as atividades particulares que afetem a comunidade. 11 BULOS, 2003, p.187-194 passim. Ibid., p. 219. 13 ZIMMERMANN, Augusto. Curso de direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002. p. 45. 14 MARSHALL, Carla C. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. p. 107. 15 AMARAL, 2002, p. 140. 16 BRASIL, Código Civil, 2001, p. 148. 12 13 1.2 A PROPRIEDADE IMÓVEL NO BRASIL 1.2.1 Evolução O território brasileiro ao se descoberto pelos portugueses passou para o domínio de Portugal, pertencendo conseqüentemente toda a propriedade e posse do Brasil ao Rei de Portugal desde a data de seu descobrimento até a sua independência, ficando o mesmo por muito tempo despovoado, tendo sido considerado como um simples ponto de pousada para a navegação portuguesa17. Devendo-se entender esse domínio português não somente no sentido políticoestatal, da autoridade e poder dos portugueses sobre a terra descoberta submissa, sem soberania, mas, identicamente, no que contém como sinônimo de propriedade, assim, todo o território brasileiro, como objeto de relação jurídico-real, passa a ser integralmente de propriedade do reino18. Decidindo o Estado Português, através do Rei, somente em 1534, a iniciar o povoamento do território brasileiro mediante a concessão de grandes áreas a quem pudesse explorá-las, diretamente ou com a cooperação de terceiros19, dividindo o Brasil em capitanias hereditárias, no total de 15 extensas faixas de terra, que por sua dimensão contribuíram para a origem dos latifúndios brasileiros20. Cindindo-se com isso o início do domínio original do Estado e do domínio privado sobre as terras, contudo, continuando o patrimônio do Estado a pertencer à nação, encarnada no Soberano, empenhado em promover o povoamento e a colonização da conquista21. Permitindo este sistema que os donatários doassem pedaços da terra recebida, formando as sesmarias, administrá-las e explorá-las, além de poder transmiti-las como herança ao filho mais velho, permanecendo este regime até 17 de julho de 1822, quando foi extinto, havendo, contudo, da independência do Brasil até 17 MAIA, José M. As influências do direito português no direito agrário brasileiro. In: LAARANJA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. p. 23 18 NASCIMENTO, Tupinambá M. C. do. Introdução ao direito fundiário. Porto Alegre: Fabris, 1985. p. 07. 19 MAIA, 1999, p. 25. 20 Ibid., p. 26. 21 LIRA, Ricardo P. Elementos de direito urbanístico. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 316. 14 o ano de 1850, a ocupação do solo pela tomada da posse sem título pelos povoadores. Estas ocupações realizadas pelos povoadores de forma mansa e pacífica, fizeram com que a Coroa expedisse em 5 de outubro de 1875, um alvará com vistas a regularizar a situação destes posseiros sem título hábil de posse22, e, antes, em 18 de setembro de 1850, estando a estrutura fundiária agrária no Brasil problemática, foi elaborada a primeira legislação agrária de longo alcance da nossa história, a Lei nº. 601, conhecida como a Lei das Terras23, que foi regulamentada pelo Decreto nº 1.318, de 30 de janeiro de 185424, dispondo sobre as terras devolutas do império e acerca das que eram possuídas por título de sesmaria sem preenchimento das condições legais, bem como aquelas possuídas por simples título de posse mansa e pacífica, determinando que medidas e demarcadas as terras devolutas, fossem elas cedidas a título oneroso para empresas particulares, bem como para o estabelecimento de colônias de nacionais e de estrangeiros, autorizando o governo a promover a colonização estrangeira. Essa intervenção do Estado na questão da terra, através da Lei das terras, foi o embrião do registro imobiliário no Brasil, pois, instituiu as normas para a criação de uma Repartição Geral de Terras Púbicas25, visando promover o ordenamento jurídico da propriedade da terra, conferindo aos posseiros o domínio, tornando públicos os atos que tinham por objeto a declaração de transferência de terras, passando a ser de responsabilidade do Vigário da Igreja Católica o seu reconhecimento, tendo tal reconhecimento somente o aspecto de tornar público o ato, salientando-se que apesar da importância de tal registro, ele não tinha por efeito a transmissão da propriedade da forma como hoje conhecemos, por ser a natureza de sua inscrição meramente declaratória, visando diferenciar o domínio exercido pelo particular do domínio público. 22 LIRA, 1997, p. 318. BRASIL. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõe sobre as terras devolutas do império. Registrada á fl. 57 do livro 1 dos actos legislativos. Secretária d’Estado do Negócios do Império. 02 out. 1850. Disponível em: <http://www.presidenciadarepublica.gov.br>. Acesso em: 04 de abr de 2005. 24 BRASIL. Decreto nº 1.318, de 30 de janeiro de 1854. Manda executar a Lei, nº 601, de 18 de setembro de 1850. Coleção das Leis Império do Brasil, 31 dez 1854. Disponível em: <http://www.presidenciadarepublica.gov.br>. Acesso em: 04 de abr de 2005. 25 LIRA, op. cit., p. 319, nota 22. 23 15 Transfigurando-se com o tempo à posse em direito de propriedade, pela vontade do homem, expressa no direito então vigente e particularmente na Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864, que reforma a legislação hipotecária26, regulamentada pelo Decreto nº 3.453, de 26 de abril de 1.86527, podendo esta vontade se entendida como a vontade dos donos da política e seus amigos, que desde a descoberta se apropriaram dos terrenos e de todos os tesouros do país, fazendo uma série de leis que sempre os protegia, havendo, portanto, um conjunto de leis imobiliárias feitas pelos mais fortes em benefício próprio28. Com isso, a posse acabou sendo banida do registro imobiliário, e a única maneira de hoje um posseiro adquirir o domínio de um imóvel é através da ação de usucapião. Situação esta que auxiliou no Brasil a formação de movimentos em prol da reforma agrária, como o caso do Movimento dos Sem Terra (MST), pois, predominou no Brasil desde o início um sistema de grandes propriedades rurais nas mãos de uma minoria29, que ainda na atualidade é um dos graves problemas do Brasil, o que motiva os grupos reformistas a decidirem ocupar propriedades particulares encontradas vazias ou semi-vazias, pois, em um país imenso, com imensos espaços vazios e inaproveitados, com uma longa história de apropriações indevidas de terras, a legitimidade da posse de uma terra por parte de pessoas que não ganham a vida trabalhando-a pessoalmente, é muito suspeita e injusta30. Tendo sido a Lei de terras no século XIX um verdadeiro marco na história da terra no Brasil, e, conseqüentemente, da propriedade imóvel, que perdeu o seu caráter absolutista com o advento da Constituição Federal Brasileira de 1934, que trouxe o princípio da função social da propriedade, princípio este seguindo pelas demais constituições e que previu pela primeira vez no país, a necessidade de a 26 BRASIL. Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864. Reforma legislativa hypothecaria, e estabelece as base da sociedade de crédito real. Coleção das Leis Império do Brasil, 24 set. 1864. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 19 de abr de 2005. 27 BRASIL. Lei nº 3.453, de 26 de abril de 1865. Manda observar o regulamento para execução da Lei nº 1.237 de 24 de setembro de 1864, que reformou a legislação hipotecária. Coleção das Leis Império do Brasil, 31 dez. 1865. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 26 de abr de 2005. 28 SCHMIDT, Mario F. Nova história crítica. São Paulo: Nova Geração, 1999. v. 4. p.191. 29 LIRA, 1997, p. 191. 30 MILPACHER, Pio. O governo dos povos. São Paulo: LTR, 1998. p. 283. 16 propriedade atender a outros interesses para além dos do seu dono31. Ocorrendo outro marco na história da terra no Brasil com os governos militares, através da promulgação do Estatuto da Terra, Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, que apesar de instituir várias mudanças no sistema agrário, não resolveu o problema dos latifúndios. Desta forma, no decorrer da história, a concepção da posse no Brasil foi modificada e o próprio conceito de propriedade sido influenciado pelo pensamento moderno de que o proprietário não mais detenha o poder absoluto sobre ela, vetando-se o desvio de sua função, restrição esta que na atualidade fica patente no art. 5º, XXIII, da CF/88, constituindo-se, com isso, a Constituição Federal atualmente em verdadeiro dogma jurídico ao determinar que a propriedade deverá atender a sua função social32, sendo ela um dos instrumentos da justiça social, pois, o direito de propriedade, protegido por ela atualmente, é um direito cujo conteúdo pode variar como verdadeira função social nos termos e limites fixados pela lei, como expressão da vontade coletiva, desde que não seja ele esvaziado no seu conteúdo essencial mínimo33. 1.2.2 Formas de propriedade imóvel O Código Civil estabelece em seu art. 1.227, que os direitos reais sobre imóveis constituídos ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos34, salvo algumas exceções expressas nele, e estando a propriedade inserida nestes direitos é vista como o mais amplo direito de utilização econômica das coisas, direta e indiretamente35, tanto que o art. 170 da CF/88 assegura a sua função social36, que pode ser vista como uma das formas de limitação ao direito de propriedade no que concerne ao poder do proprietário de dar a destinação que bem pretender a propriedade, atingindo esta 31 MATTOS, Liana P. A efetividade da função social da propriedade urbana à luz do Estatuto da cidade. Rio de Janeiro: Temas & idéia, 2003. p. 38. 32 LOPES, Miguel M. de Serpa. Curso de direito civil. São Paulo: Freitas Bastos, 2003. p. 298. 33 LIRA, 1997, p. 160. 34 BRASIL, Código Civil, 2003, p. 2.219. 35 GOMES, Orlando. Direito reais. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 98. 36 BULOS, 2003, p. 1.219. 17 limitação à propriedade imóvel principalmente no que compete à utilização do solo privado, que passou a ficar subordinado as diretrizes traçadas pelo poder público37; estando estes limites na fronteira entre o privado e o público38. No que infere aos direitos reais, nos interessa verificar a situação da propriedade, suas formas, regularização e limitação, sendo que no Brasil a propriedade imóvel aparece sob diversas formas, tanto individual como coletiva, sendo ela um dos direitos fundamentais do cidadão, garantida no art. 5º, XXII da CF/88, constatandose com isso, que o poder sobre as coisas é tão necessário à vida social que o mais miserável dos entes sempre tem propriedade sobre alguma coisa39, mesmo que não tenha conseguido a tão almejada propriedade imóvel, que pode ser vista como urbana ou rural, e tanto uma quanta outra sofre limitações na sua utilização nos tempos atuais que atingem o direito de propriedade e que se inspiram em sua nova conceituação influenciada pelo primado do interesse coletivo ou público, em decorrência das medidas restritivas ao seu exercício impostas pelo Estado em prol da supremacia do interesse público40. 1.2.2.1 A propriedade rural A propriedade rural, mais comumente chamada de imóvel rural, é um bem com características próprias, estudada sob a ótica tanto do Direito civil e Administrativo, quanto do Direito Agrário, tendo em cada um deles uma conceituação impar. Sendo que a distinção que o Direito Civil faz em relação aos imóveis, já foi explanada. E quanto ao Direito Administrativo o mesmo estuda-os sob a ótica dos bens públicos, pertencentes ao domínio do Estado e destinados ao aproveitamento social e comunitário, reservados à administração para o exercício e prática dos serviços públicos41, podendo ser de domínio público federal, estadual, municipal, compondo37 GOMES, 2001, p. 102. FACHIN, Luiz E. Comentários ao Código Civil: parte especial: direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 15. p. 05. 39 GOMES, op. cit., p. 98, nota 31. 40 DINIZ, Maria H. Curso de direito civil brasileiro. 20. ed. Rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 4. p. 251. 41 JUNQUEIRA, 1997, p. 41. 38 18 se de terras devolutas, terras ocupadas pelos silvícolas, terrenos de marinha, terrenos acrescidos, ilhas dos rios públicos e oceânicos, áreas ocupadas com as fortificações e edifícios públicos42, entre outras que estão descritas atualmente no art. 20 da CF/8843, e, anteriormente, na Lei das Terras, tendo sido consideradas como terras públicas todas as terras que por esta lei não foram incorporadas ao domínio particular44. E, atualmente, estas áreas públicas, ainda que não submetidas ao regime da inscrição, são conhecidas por um serviço público que as arrola, chamado de Serviço de Patrimônio da União (SPU), e ocorrendo dúvida se uma área é de domínio público ou privado, ela será solvida através de procedimentos específicos previstos na Lei nº 5.972, de 11 de dezembro de 1973, que regula os procedimentos para o registro da propriedade de imóveis discriminados administrativamente ou possuídos pela União45, e na Lei nº 6.383, de 07 de dezembro de 1976, prevendo esta última a ação discriminatória de terras devolutas da União, aplicável também aos Estados por força do art. 27, embora não aos Municipios por omissão da lei46. Enquanto que para o Direito Agrário a Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, em seu art. 4º, I, definiu o imóvel rural como sendo o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agro-industrial47, vigorando, para o Direito agrário o conceito da destinação que se dá ao imóvel. Assim onde houver a atividade explorativa que se configure como agrária haverá terra rural, de forma contrária onde for encontrada atividade considerada urbanística, haverá solo urbano48, considerando, para tanto, a atividade exercida no imóvel, pouco importando onde esteja localizado, baseando-se, atualmente, a definição do 42 MELLO, Celso A. B. de. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 524. 43 BULOS, 2003, p. 519. 44 NASCIMENTO, Tupinambá M. C. do. Introdução ao direito fundiário. Porto Alegre: Fabris, 1985. p. 21. 45 BRASIL. Leis, etc. Constituição federal, coleção de leis de direito administrativo: mini. São Paulo: Manole, 2005. p. 492. 46 Ibid., p. 494. 47 BRASIL. Constituição federal, coleção de leis de direito administrativo, 2005 p. 531. 48 NASCIMENTO, op. cit., p. 63, nota 44. 19 imóvel como rural ou urbano, na Teoria da Destinação que havia sido adotada pelo Estatuto da Terra49, que em seu art. 4º, I, instituiu o imóvel rural como sendo o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização, que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agro-industrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada50. Tendo o imóvel rural, já sido considerado tão somente pelo fato de estar localizado fora do perímetro urbano, não importando a atividade que nele era desenvolvida, baseando-se para isso na Teoria da Localização, que considerava como imóvel urbano àquele que as leis municipais apontassem como tal, e o que estivesse fora desta fixação era tido com área rural, sendo esta distinção feita através da situação topográfica da área51. Posicionamento este, que foi trazido para o nosso sistema legal pelo Código Tributário Nacional (CTN), Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, que em seu art. 32, §§ 1º e 2º, determinou que o imposto de competência dos Municípios que incida sobre a propriedade predial e territorial urbana, tenha como fato gerador à propriedade, o domínio útil ou a posse do bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido em lei civil, localizado na zona urbana do Município, entendendo-se como zona urbana para efeito deste imposto a definida em lei municipal52. Assim, com o advento da Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que criou o Sistema Nacional de Cadastro Rural53, regulamentado pela Lei nº 72.106, de 18 de abril de 197354, houve divergências sobre as teorias a serem adotadas, ou seja, a teoria da destinação inserida pelo Estatuto da Terra ou a Teoria da Localização 49 BORGES, Paulo T. Institutos básicos do direito agrário. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 30. BRASIL. Estatuto da Terra. Colaboração: PINTO, Antônio L. de T.; WINDT, Márcia C. V. S.; SIQUEIRA, Luiz E. 15. ed. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 4. 51 NASCIMENTO, 1985, p. 64. 52 BRASIL. Código Tributário Nacional. Organização: PINTO, Antônio L. de T. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 38. 53 BRASIL. Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972. Cria o Sistema Nacional de Cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 dez 1972. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 54 BRASIL. Lei 72.106, de 18 de abril de 1973. Regulamenta a Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que institui o sistema nacional de cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr 1973. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 50 20 elaborada pelo Código Tributário Nacional. Divergência que foi solucionada pelo acórdão de 20 de maio de 1982, prolatado no Recurso Extraordinário nº 93.850-MG, que declarou a inconstitucionalidade do art. 6º e seu parágrafo único, da Lei Federal nº 5.868/72, nos seguintes termos: RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 93.850 – 8 – MINAS GERAIS RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES RECORRENTE: JAIR RODRIGUES PEREIRA RECORRIDA: PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE EMENTA: Imposto predial – critério para a caracterização do imóvel como rural ou como urbano. - A fixação desse critério, para fins tributários, é o princípio geral de direito tributário, e, portanto, só pode ser estabelecido por lei complementar. E o C.T.N. , segundo a jurisprudência do S.T.F., é lei complementar. - Inconstitucionalidade do artigo 6º, e seu parágrafo único da Lei Federal Nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, uma vez que, não sendo lei complementar, não poderia ter estabelecido critério, para fins tributários, de caracterização de imóvel como rural ou urbano diverso dos artigos 29 e 32 55 do C.T.N. Incidindo, portanto, o conceito do Código Tributário Nacional por força do que consta o art. 29, da Lei nº 5.868/72, no imposto rural territorial56, vendo-se desde então a propriedade rural sob o prisma da sua destinação, não importando se o imóvel situase em centro urbano ou no meio rural, importando tão somente o fim, a destinação que se dá ao mesmo57. Assim, quanto à sua exploração ela pode ser vista como uma propriedade familiar ou empresarial, ocorrendo esta quando a propriedade é visualizada na perspectiva dinâmica do empreendimento, promovendo o seu possuidor com a sua exploração econômica58, e aquela quando ocorrer à exploração do imóvel de forma direta pelo agricultor e sua família59, com dimensões semelhante a do módulo rural que é uma unidade de medida que corresponde ao mínimo, necessário e suficiente, para uma família desenvolver sua força de trabalho, garantir seu sustento e buscar algum progresso social e econômico60. 55 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imposto predial – critério para a caracterização do imóvel como rural ou como urbano. Recurso Extraordinário nº 93850-8. Jair Rodrigues Pereira e Prefeitura de Belo Horizonte. Relator: Moreira Alves. Minas Gerais, Tribunal Pleno, 20 mar 1982. Diário de Justiça, Minas gerais, p. 8.180, 27 ago 1982. Disponível em : <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/05/2005. 56 BRASIL. Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972. Cria o Sistema Nacional de Cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 dez 1972. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 57 VARELLA, Marcelo D. Introdução ao direito à reforma agrária: o direito face aos novos conflitos sociais. São Paulo: LED, 1998. p. 273. 58 GOMES, 2001, p. 106. 59 Idem. 60 PROENÇA, Alencar M. Direito agrário. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 49. 21 Enquanto que em relação a sua dimensão, a propriedade pode ser vista como latifúndio, módulo rural e minifúndio, todos previstos no Estatuto da Terra61, e ainda, como pequena e média propriedade, ambas aludidas pela Constituição Federal de 1988, que também faz alusão à propriedade produtiva, no art. 185, I e II, declarando serem ambas insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária62. Portando, a forma de exploração econômica da propriedade rural é definida pelo seu proprietário ou ao arrendatário, pois o art. 170 da CF/88 assegura a livre iniciativa a todas as pessoas, condiciona-a a obediência ao princípio da função social da propriedade63, devendo o uso do imóvel rural, em conformidade com o art. 12 do Estatuto da Terra, ser compatível com o bem-estar coletivo64. Assim, a regulamentação do imóvel rural é feita principalmente pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Terra e de leis complementares, tendo-se tornado pelo § 2º do art. 184 da CF/88, passível de desapropriação para fins de Reforma Agrária caso não cumpra com a função social a ele atinente65, e que pelo o art. 186 da CF/88 ocorre quando simultaneamente é feito o seu aproveitamento racional e adequado, utilizando adequadamente os recursos naturais disponíveis e preservando o meio ambiente, além de observar as disposições que regulam as relações de trabalho, favorecendo a sua exploração o bem estar dos proprietários e trabalhadores, seguindo os critérios e graus de exigência estabelecidos em lei66, deixando a propriedade imóvel de ser somente um bem patrimonial e para ser considerada também como um bem de produção, e por isso, quem detém a sua posse tem a obrigação de fazê-la produzir de acordo com as suas características peculiares e incentivos dados pelo Poder Público. 61 BRASIL. Estatuto da terra, 2000, p. 3. BULOS, 2003, p. 1.259. 63 Ibid., p. 1.219. 64 BRASIL. Estatuto da Terra, op. cit., p. 6, nota 61. 65 BULOS, op. cit., p. 1.258, nota 62. 66 Ibid., p. 1.260. 62 22 1.2.2.1.1 Módulo rural A palavra “modulo” significa quantidade equivalente a uma unidade de qualquer medida67, enquanto que o módulo rural segundo a legislação agrária brasileira, é a quantidade mínima de terras admitidas no imóvel rural, para que ele não caia no vício do minifúndio68, tão combatidos pela política de reforma agrária quanto os latifúndios, este por ser anti-social e outro por ser anti-econômico. Tendo sido o módulo rural inserido no contexto de propriedade familiar pelo Estatuto da Terra, em seu art. art. 4º, III, ao delimitar no inciso II, a área fixada para ela como sendo a do imóvel rural que direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso sócio-econômico, podendo, eventualmente efetivar o trabalho com a ajuda de terceiros69. Constituindo, portanto, o módulo rural em uma unidade de medida, expressa em hectare, que busca refletir a interdependência entre a dimensão, a situação geográfica do imóvel rural e a forma e condições do seu aproveitamento econômico. Assim, é considerado módulo rural o imóvel com extensão mínima onde uma família possa garantir a sua subsistência e o seu progresso social com uma vida digna, sendo a área necessária para a configuração mínima da propriedade familiar70, podendo ser definido de forma diferente por cada região do país e para cada tipo de atividade a ser nele praticada. Em termos práticos, é uma unidade de medida agrária, variável de região para região, de acordo com o tipo de exploração, sendo empregado para definir o tamanho da propriedade familiar e, por conseguinte, definir latifúndio e minifúndio, determinado uma dimensão mínima necessária à manutenção e ao desenvolvimento do proprietário, permitindo o seu progresso e o de sua família, sendo este um dos motivos para que o módulo rural seja diferente em cada região, podendo segundo o tipo de exploração ou atividade rural exercida ser denominado de exploração 67 68 69 70 FERREIRA, Pinto. Curso de direito agrário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 213. BORGES, 1998, p. 133. BRASIL. Estatuto da terra, 2000, p. 4. VARELLA, 1998, p. 274. 23 hortigranjeira, lavoura permanente, lavoura temporária, exploração pecuária, exploração florestal, e ainda, de médio porte ou de grande porte71. Não consentindo o art. 65 do Estatuto da Terra, a divisão do Imóvel rural em área de dimensão inferior à do módulo da propriedade rural, a fim de impedir a fragmentação dos imóveis rurais e a constituição de novos minifúndios, não podendo isso ocorrer mesmo havendo sucessão causa mortis e partilhas judiciais ou amigáveis, se a dimensão da propriedade ao ser divida tornar-se inferior ao módulo da propriedade rural72, seja por qualquer uma de suas modalidades, loteamento, desmembramento, tentando com isso evitar que venham a se formadas propriedades menores do que o módulo definido para cada região, pois, se tal ocorrer, pode surgir imóveis com áreas tão pequenas que não permitiriam a manutenção e o desenvolvimento do proprietário e do trabalhador rural através do seu trabalho, elementos fundamentais da função social da propriedade, estando esta indivisibilidade fundamentada no art. 88 do Código Civil, que determina que os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação legal ou por vontade das partes73. Consignando o art. 11 do Decreto-Lei nº 57, de 18 de novembro de 1966, que nenhum imóvel rural poderia ser desmembrado ou dividido em áreas de tamanho inferior ao quociente da área total pelo número de módulos constantes do Certificado de Cadastro74, sucedendo-o a Lei n.º 5.868/72, que instituiu em seu art. 6º, a fração mínima de parcelamento, estipulada na área de um hectare independentemente da sua localização75. Tendo o legislador imposto estes limites ao módulo rural para que um determinado espaço tenha condições de comportar um empreendimento 71 BRASIL. Decreto 55.891, de 31 de março de 1965. Regulamenta o capítulo 1 do título 1 e a seção 3 do capítulo 4 do título 2 da Lei 4.504 de 30 de novembro de 1964 – Estatuto da Terra. diário Oficial da União. Brasília, 8 abr 1965. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 18 de maio 2005. 72 FERREIRA, 1999, 213. 73 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 55. 74 BRASIL. Decreto-Lei nº 57, de 18 de novembro de 1966. Altera dispositivos sobre lançamento e cobrança do imposto sobre propriedade territorial rural, institui normas sobre arrecadação da dívida ativa correspondente, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1966. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 maio 2005. 75 BRASIL. Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972. Cria o Sistema Nacional de Cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 dez 1972. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 24 agropecuário, pois, este para a sua implantação necessita de dimensões que sejam adequadas economicamente. Contudo, o Estatuto da Terra prevê a possibilidade de alienação de área desmembrada de dimensões inferiores ao módulo rural quando destinada à anexação a outro imóvel rural confrontante, desde que tal subtração não represente a redução da área do imóvel originário a um território inferior ao módulo. Admitindose exceção a regra da indivisibilidade do módulo rural, mediante prévia aprovação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), somente quando se pretender transformá-lo em urbano, pela mudança de sua destinação76, como no caso de desmembramentos decorrentes de desapropriação, nas hipóteses legais de utilidade pública ou de interesse social, ou motivados por interesse público, em diversas circunstâncias elencadas no art. 2º, II, do Decreto nº 62.504, de 8 de abril de 196877. Justificando-se, portanto, a definição legal do instituto do módulo rural e o motivo da sua indivisibilidade jurídica, em razão dos interesses econômicos e sociais que advêm da utilização adequada dos imóveis rurais, tendo em vista a função social da propriedade assegurada constitucionalmente. Quanto à propriedade familiar a qual foi comparada o módulo rural, o art. 4º, II, do Estatuto da Terra, definiu-a como sendo o imóvel rural que direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantido-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e, eventualmente, trabalhando com a ajuda de terceiros78, não havendo, desta forma, na propriedade familiar o emprego permanente de mão-de-obra de terceiros, devendo a sua área ter o tamanho do módulo, porém, variável conforme determinados fatores, como a situação geográfica, o clima, as condições de aproveitamento da terra. Sendo ela considerada como um instrumento hábil para evitar a exploração do homem pelo homem79, e uma fonte concreta de oportunidade se não para todos, pelo menos 76 BORGES, 1998, p. 139. BRASIL. Decreto nº 62.504, de 08 de abril de 1968. Regula o art. 65 da Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964, o art. 11 e parágrafo do Decreto-Lei 57, de 18 de novembro de 1966, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 09 abr 1968. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. 78 BRASIL. Estatuto da Terra, 2000, p. 3. 79 BORGES, op. cit., p. 31, nota 76. 77 25 para um grande número de rurícolas80, pois, assim como no módulo rural, é vedada a sua divisão. E dentro dos moldes adotados pelo Direito Agrário, somente o imóvel rural pode ter a condição de propriedade familiar, se for ele trabalhado direta e pessoalmente pelo agricultor e sua família, com auxílio de terceiro somente de forma eventual. E quanto ao módulo fiscal, criado pela Lei nº 6.746, de 10 de dezembro de 1979, que trata do Imposto sobre Propriedade Rural (ITR), dando nova redação aos arts. 49 e 50, do Estatuto da Terra81, e que foi regulamentado pela Lei nº 84.685, de 06 de maio de 1980, foi uma unidade usada até o advento da Lei nº 9.393, de 19 de dezembro de 199682, principalmente para servir de base para o cálculo do ITR, que foi criado com o fim de tributar a propriedade rural visando contribuir para a melhor distribuição da renda no campo e para o aumento da receita pública83. Não podendo o módulo fiscal ser confundido com o módulo rural, mesmo que ele o tenha como base teórica para fins de tributação84, e também seja diferente para cada Município, pois ele é expresso em hectares fixado pelo INCRA, que para isso analisa o tipo de exploração predominante no Município, se ela é hortifrutigranjeira, pecuária ou florestal, de cultura permanente ou temporária; a renda obtida no tipo de exploração predominante; outras explorações existentes no Município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; e se a mesma preenche os requisitos inerentes à propriedade familiar; devendo conforme o § 1º do art. 4º do Decreto nº 84.685/80, no momento da determinação do módulo fiscal de cada Município, aplicar a metodologia aprovada pelo Ministro da Agricultura, utilizando-se dos dados constantes do Sistema Nacional de Cadastro Rural, instituído pela Lei 5.868/72, compreendido basicamente, do Cadastro de imóveis Rurais, do Cadastro de Proprietários e Detentores de Imóveis Rurais, Cadastro de Arrendatários e Parceiros Rurais, Cadastro de Terras Públicas, 80 BORGES, 1998, p. 101. BRASIL. Lei nº 6.746, de 10 de dezembro de 1979. Altera o disposto nos artigos 49 e 50 da Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964 (ESTATUTO DA TERRA), e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 11 dez 1979. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. 82 BRASIL. Código Tributário Nacional, 1999, p. 653. 83 VARELLA, 1998, p. 289. 84 Ibid., 274. 81 26 revendo-se o módulo fiscal, de acordo com o § 2º do art. 84.685/80, sempre que ocorrer mudanças em sua estrutura produtiva85. Portanto, o módulo fiscal é estabelecido de forma diferente por cada Município, refletindo a área mediana dos Módulos Rurais dos imóveis rurais do mesmo, servindo de parâmetro para classificação do imóvel rural quanto ao seu tamanho, nos termos do art. 4º, da Lei nº 8.629/93, que estipula que a pequena propriedade rural é a que tem área compreendida entre um e quatro módulos fiscais, enquanto que a média propriedade rural é a que tem área superior a quatro e até quinze módulos fiscais86. 1.2.2.1.2 Minifúndio O minifúndio pelo Estatuto da Terra em seu art. 4º, IV, é o imóvel rural de área e possibilidades inferiores às da propriedade familiar87, considerado como tal o imóvel rural com dimensão inferior a um módulo rural, que por definição é a área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, assim, toda área de terra agricultável inferior ao módulo rural é um minifúndio, mesmo que proporcione renda superior à de uma propriedade familiar, a menos que funcione como uma empresa altamente rentável88. E, mesmo havendo a proibição do minifúndio pelo Estatuto da Terra, por não ser ele uma área suficiente para realizar o sustento e o progresso social e econômico do minifundiário e de sua família, ele continua a ser implantado; pois há a ilusão por parte do minifundiário, que luta para ter o seu pedaço de terra, de que contribui com o seu esforço para a economia e para o desenvolvimento do setor e da região, significando para ele a aquisição da propriedade a sua independência, não admitindo que a terra sob a forma de minifúndio economicamente não ofereça com a 85 BRASIL. Lei 84.685, de 06 de maio de 1980. Regulamenta a Lei 6.746, de 10 de dezembro de 1979, que trata do imposto sobre a propriedade territorial rural – ITR e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 07 maio 1980. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. 86 BRASIL. Constituição federal, coleção de leis de direito administrativo, 2005, p. 1.531. 87 BRASIL. Estatuto da Terra, 2000, p. 3. 88 GOMES, 2001, p. 106. 27 sua exploração, condição suficiente para o seu sustento e o de sua família, e, paralelamente, para progresso do conjunto familiar89. Estando toda a propriedade inserida no contexto do minifúndio sujeita a ser desapropriada para fins da reforma agrária, uma vez que não corrobora para o cumprimento da função social da terra, por não ser viável a exploração agrícola ou pecuária em extensões muito pequenas90. Fazendo-se necessário que os minifúndios não se proliferem, cabendo ao Poder Público, em caso de sua ocorrência, realizar a sua desapropriação e aglutiná-los a outro terreno limítrofe, formando uma propriedade maior passível de produção91. Assim, a improdutividade do minifúndio deve-se mais à inviabilidade técnica da exploração econômica em face de inadequação do espaço para a atividade desempenhada. 1.2.2.1.3 Latifúndio O latifúndio não é novo na história, tendo sido um dos fatores da queda de Roma92, não sendo também novo no seio nacional, pois, a história da propriedade brasileira inicia-se com a doação pela Coroa Portuguesa de grande extensão de terras a fidalgos portugueses, implantando ela no Brasil o regime sesmarialista, que teve sucesso nas pequenas ilhas portuguesas do Atlântico, com criação de capitanias hereditárias na nova colônia, com grandes poderes conferidos aos donatários93, que por sua vez, também realizavam doações de pedaços de terras a correligionários seus. E, diferentemente do que aconteceu com as outras colônias portuguesas, essa forma de colonização com traços de feudalismo encaminhou o Brasil para uma estrutura fundiária baseada na grande propriedade rural, contrariando ao que historicamente aconteceu em Portugal, e outras colônias, onde o sistema originou a 89 90 91 92 93 BORGES, 1998, p. 33. VARELLA, 1998, p. 280. Ibid., p. 280. FERREIRA, 1999, p. 49. Ibid., 1999, p. 111. 28 pequena propriedade agrícola94, permanecendo o Brasil até hoje com grandes propriedades de terras em todas a regiões do país, e muitas delas sem serem amplamente utilizadas, dando ensejo aos conflitos no campo que não foram até hoje resolvidos, mesmo com as políticas públicas intentadas, como a elaboração do Estatuto da Terra que teve como finalidade principal o incremento das atividades referentes ao uso regular e produtivo do solo, visando, como salienta o seu art. 1º, a execução da Reforma Agrária e promoção da Política Agrícola95. Reclamando-se, com isso, a limitação natural dos espaços territoriais, com a implementação de uma sistemática que repila por não atender às necessidades sociais e econômicas, a existência de latifúndios improdutivos que ficam neste estado na maioria das vezes por simples desinteresse de seus proprietários, considerando-se desta forma pelo art. 4º, V, do Estatuto da Terra, latifúndio como todo o imóvel rural que exceda à dimensão máxima fixada pelo seu art. 46, § 1°, “b”, tendo-se em vista as condições ecológicas, sistemas agrícolas regionais e o fim a que se destine, não excedendo o limite referido na alínea “a” deste artigo, e tendo área igual ou superior à dimensão do módulo de propriedade rural, sendo mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e sociais do meio, com fins especulativos, ou seja, que esteja deficiente ou inadequadamente explorado, de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito de empresa rural.96 Havendo duas modalidades de latifúndio, por extensão territorial que é a propriedade rural cuja área máxima excede a 600 vezes o módulo do imóvel rural ou 600 vezes a área média dos imóveis rurais na respectiva zona, cumprindo ou não a sua função social, e por exploração ou desamparo que é o imóvel rural que é inexplorado com fins especulativos ou que é inadequadamente explorado97, bastando, portanto, para a configuração do latifúndio, que a terra não seja produtiva e tenha área superior à do módulo rural98, apurando-se a inércia do proprietário ao verificar se na propriedade foram utilizadas as possibilidades físicas, econômicas e 94 95 96 97 98 FERREIRA, 1999, p. 112. BRASIL. Estatuto da Terra, 2000, p. 03. Idem, p. 03. GOMES, 2001, p. 106. VARELLA, 1998, p. 274. 29 sociais do meio, enquanto a deficiência e a inadequação se apreciam em relação ao conceito legal de empresa rural. E, caso estes fatos sejam constatados deve o Poder Público utiliza-se do poder a ele conferido pela legislação e compelir o proprietário a exercer o seu direito como uma função social99, e mesmo havendo a necessidade da imposição de uma imediata redistribuição de terras por interesse social através da desapropriação, deve-se atentar para o fato de que o verdadeiro combate ao latifúndio se faz fundamentalmente pela tributação, mediante o coeficiente de progressividade do imposto para a propriedade que não cumpra sua função100. Considerando, ainda, quanto ao latifúndio, que mesmo que a propriedade em seu todo ultrapasse o tamanho de 600 módulos rurais, a mesma não será denominada como tal, desde que suas características recomendem a exploração florestal racionalmente utilizada, mediante planejamento adequado, não se considerando também como latifúndios os imóveis tombados pelo Poder Público, cujo objetivo seja a preservação dos recursos genéticos101. Devendo, portanto, todos os imóveis que estiverem cumprindo com a sua finalidade social, dentro dos parâmetros legais, serem garantidas pelo ordenamento jurídico positivo, não devendo ser combatidos os incentivos a tais propriedades. 1.2.2.1.4 Empresa rural O Estatuto da Terra, em seu art. 4º, VI, define empresa rural como sendo o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro de condição de rendimento econômico da região em que se situe e que explore área mínima agricultável do imóvel segundo padrões fixados, pública e previamente, pelo Poder Executivo.102 99 GOMES, 2001, p. 106. BORGES, 1998, p. 37. 101 VARELLA, 1998, p. 274. 102 BRASIL. Estatuto da Terra, 2000, p. 3. 100 30 Devendo para isso preencher alguns requisitos que estão descritos no art. 25, do Decreto nº 55.891, de 31 de março de 1965, para ser considerado como empresa rural, tais como, a área utilizada nas várias explorações representar uma porcentagem igual ou superior a 50% da sua área agricultável, equiparando-se, para esse fim, às áreas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e artificiais e as áreas ocupadas com benfeitorias, obtendo em uma ou várias atividades de exploração um rendimento médio que seja igual ou superior aos mínimos fixados em tabela própria periodicamente revista e amplamente divulgada, adotando práticas conservacionistas e que empregue no mínimo a tecnologia de uso corrente nas zonas em que se situe, mantendo as condições de administração e as formas de exploração social estabelecidas como mínimas para cada região103. Tendo estes requisitos sidos inovados pelo Decreto nº 72.106/73, que exigiu em seu art. 44, que para o imóvel ser classificado como empresa rural, na forma do art. 4º, VI, do Estatuto da Terra, e do seu art. 50, § 7º, que a área utilizada na atividade explorada ou nas várias atividades exploradas deveriam representar uma percentagem superior a 70% de sua área agricultável, equiparando-se, para esse fim, às áreas cultivadas as pastagens, as matas naturais e artificiais e as áreas ocupadas com benfeitorias, devendo ainda, obter um coeficiente de condições sociais e de produtividade igual ou inferior a um hectare.104 Considerando o art. 22 do Decreto nº 84.685/80, empresa rural para efeito do disposto no art. 4º, IV e V, e do art. 46, § 1º, “b”, da Lei nº 4.504/64, como o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que explore economicamente e racionalmente imóvel rural, dentro das condições de cumprimento da função social da terra, devendo para tanto, o grau de utilização do imóvel rural ser igual ou superior a 80%105, e o seu grau de eficiência na exploração 103 BRASIL. Decreto 55.891, de 31 de março de 1965. Regulamenta o capítulo 1 do título 1 e a seção 3 do capítulo 4 do título 2 da Lei 4.504 de 30 de novembro de 1964 – Estatuto da Terra. diário Oficial da União. Brasília, 8 abr 1965. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 18 de maio 2005. 104 BRASIL. Lei 72.106, de 18 de abril de 1973. Regulamenta a Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que institui o sistema nacional de cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr 1973. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 105 BRASIL. Lei 84.685, de 06 de maio de 1980. Regulamenta a Lei 6.746, de 10 de dezembro de 1979, que trata do imposto sobre a propriedade territorial rural – ITR e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 07 maio 1980. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. 31 ser igual ou superior a 100% (cem por cento) de sua área, cumprindo integralmente a legislação que rege as relações de trabalho e os contratos de uso temporário da terra106, devendo todos este requisitos serem cumpridos de forma simultânea. Portanto, enquanto a empresa familiar é uma unidade de produção para conjunto familiar107, a empresa rural é unidade de produção para uma comunidade mais ampla, onde se associam terra, trabalho, capital e técnica, tudo dirigido organicamente a um fim econômico108, podendo ser definida como: o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada que explore economicamente e racionalmente imóvel rural, com o objetivo de produzir bens destinados ao consumo público, desde que a respectiva terra não tenha área inferior ao módulo, sem seja 600 vezes superior ao módulo da correspondente propriedade rural ou 600 vezes superior à área média dos imóveis rurais na respectiva zona, salvo, nesta duas últimas hipóteses, quando, embora de área maior, o imóvel, com prévia aprovação do INCRA, 109 seja destinado à exploração florestal planejada . (Grifo do autor). 1.2.2.1.5 Pequena e média propriedade O art. 185, I, da CF/88, dispõe que a pequena e média propriedade são insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária se o seu proprietário não possuir outra110, tendo este artigo também sido regulamentado pela Lei nº 8.629/93, que de forma expressa em seu art. 4º, II e IIII, conceitua a pequena propriedade como o imóvel rural de área compreendida entre 1 e 4 módulos fiscais, e a média propriedade como o imóvel rural de área superior a 4 e até 15 módulos fiscais111. E além desta proteção, a pequena propriedade foi beneficiada com a da impenhorabilidade, pelo art. 649, X, do CPC, que estipula que é absolutamente impenhorável o imóvel rural até um módulo, desde que este seja o único de que disponha 106 o devedor, ressalvada a hipoteca para fins de financiamento BORGES, 1998, p. 40. Ibid., 42. 108 Idem. 109 Ibid., p. 41. 110 BULOS, 2003, p. 1.259. 111 BRASIL. Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos a reforma agrária, previstos no capítulo III, título VII, da Constituição Federal. Diário Oficial da União, Brasília, 26 dez 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 03 maio de 2005. 107 32 agropecuário112. Decidindo-se sobre este assunto o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial nº 149.363/PR, de 04 de fevereiro de 1999, que a Lei nº 8.629/93, aplica-se considerando impenhorável o imóvel rural com até um módulo fiscal, desde que seja trabalhado pela família do devedor e que a dívida seja oriunda de sua atividade produtiva, da seguinte forma: RECURSO ESPECIAL N° 149.363 – PARANÁ – (97/66847-9) – ( 4.0009) RELATOR: MIN. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO REQUERENTE: BENTO ZAZULA ADVOGADO: DIVONSIR GRAF REQUERIDA: COOPERATIVA AGROPECUÁRIA UNIÃO LTDA – COAGRU ADVOGADA: FÁBIO DE OLIVEIRA D. ALÉCIO E OUTRO EMENTA: Execução de título extrajudial. Módulo rural. Penhora. Precedentes da Corte. 1. Na linha de precedentes da Corte não vulnera lei federal a “decisão que se utiliza do conceito de pequena propriedade, assim como definido na Lei nº 8.629/93, para considerar impenhorável área rural com 19 hectares”, nem que afasta o imóvel rural a que se refere o art. 649, X, do Código de Processo Civil, do conceito de fração mínima de parcelamento. No caso, 113 sendo a área menor de 13 hectares, impõe-se a impenhorabilidade. 1.2.2.1.6 Propriedade produtiva A Lei nº 8.629/93, em seu art. 4º, II, conceitua propriedade produtiva como aquela que explorada de forma econômica e racional atinja simultaneamente graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente, devendo este grau de utilização ser igual ou superior a oitenta por cento e o de eficiência na exploração ser igual ou superior a cem por cento da área do imóvel. Considerando como propriedade produtiva efetivamente utilizada, as áreas plantadas com produtos vegetais, as áreas de pastagens nativas e plantadas, observando o índice de lotação por zona pecuária, fixado pelo Poder Executivo; as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada 112 BRASIL. Leis, etc. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. São Paulo: Manole, 2003, p. 898. 113 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Execução de título extrajudicial. Módulo rural. Penhora. Precedentes da Corte. RESP 149363/PR. Bento Zazula e Cooperativa agropecuária união ltda – GOAGRU. Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, 04/02/1999.Diário de Justiça, Paraná, p. 144, 12/04/1999. Disponível em <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. 33 microrregião homogênea, e a legislação ambiental; as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente; e, as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes114. Vindo a Lei nº 8.629/93 na esteira do texto constitucional, que anteriormente traçou alguns requisitos em seu art. 186, I e II, para que a propriedade rural cumprisse a sua função social, como o seu aproveitamento racional e adequado, utilizando adequadamente os recursos naturais disponíveis com preservação do meio ambiente, favorecendo a exploração do bem-estar de seus proprietários e de seus trabalhadores115. E, em decorrência desta função social, a Constituição Federal, garante e incentiva a produção quando torna a propriedade produtiva insuscetível de desapropriação, mesmo que os institutos jurídicos exijam que os órgãos competentes definam periodicamente os níveis satisfatórios de produtividade para que propriedade realmente exerça a sua função social. 1.2.2.2 Propriedade urbana Com as divisões da propriedade e com os avanços da agricultura, os feudos deixaram de necessitar de tantas pessoas a sua disposição, sendo os camponeses conseqüentemente expulsos de suas terras, ficando eles sem alternativas a não ser irem para as aldeias em busca de uma nova forma de subsistência, contribuindo com a ocorrência da aglomeração humana e com ela o surgimento das cidades, cujas terras em que foram formadas continuavam a pertencer aos senhores feudais.116 Todavia, as pessoas que passaram a residir nas aldeias transformadas em cidade, à medida que esta cresceu, passaram a reivindicar a sua autonomia em relação aos seus senhores, pois, como elas surgiram no interior dos feudos, estavam sujeitas a uma série de obrigações, estando a eles subordinados e lhes devendo obediência, 114 115 116 BRASIL. Constituição federal, coleção de leis de direito administrativo, 2004, p. 1.531. BULOS, 2003, p. 1.260-1.261. HUMBERMAN, Léo. História da riqueza do homem. 21. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1986. p. 28. 34 desejando, portanto, muitas delas a liberdade de não mais estarem presas aos senhores feudais, como muitos servos não mais desejavam estarem presos a terra. E, nesta luta as cidades contaram em muitos casos com o apoio do rei que interessava enfraquecer os senhores feudais para centralizar o seu poder, pois, o Estado na concepção de seus governantes era o possuidor último e herdeiro residual da terra, com aquele poder de comandar e tributar que é, em última análise, o poder de possuir e destruir.117 Sofrendo, portanto, o conceito de propriedade, com o tempo, mudanças que diferiram de um povo para outro, em alguns a noção de propriedade permaneceu bastante incompleta, enquanto que em outros como o povo romano, em cuja raiz histórica da propriedade118 é encontrada, acabou tendo uma abrangência maior, tendo inicialmente tido um caráter estritamente privado, e posteriormente, com a sua ascensão social ao passar a esfera pública, os seus proprietários ao invés de arrogarem acesso à esfera pública em virtude de sua riqueza, exigiram dela proteção para o acumulo de mais riqueza119. Tendo o campo existido desde a origem do homem, que sempre extraiu dele as substâncias que satisfizessem as suas necessidades120, enquanto a cidade foi visualizada somente quando passou a ser um modo de organização espacial que permitiu à classe dominante maximizar a transformação do excedente alimentar, não diretamente consumido por ele, em poder militar e este em dominação política121, assumindo a cidade, com isso, a posição de sede do poder e, portanto, da classe dominante122. E por mais definições que existam a respeito da cidade, nenhuma delas pode negar que a cidade, atualmente, trata-se de uma aglomeração humana, de um conjunto de pessoas vivendo próximas uma das outras123, e se ela não for planejada ou tiver o 117 MUMFORD, Lewis. A cidade na história: suas origens, transformações e perspectivas, 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 123. 118 DINIZ, 2004, p. 109. 119 ARENT, Hannah. A condição humana. Tradução de: RAPOSO, Roberto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense universitária, 1999. p. 78. 120 SINGER, Paul. Economia política da urbanização. São Paulo: Brasiliense, 1993. p. 12. 121 Ibid, p. 15. 122 SINGER, loc. cit. 123 Ibid, p. 137. 35 mínimo de organização desde a sua origem, pode criar problemas de difíceis soluções, problemas estes que não admitem improvisações, que exigem integração e racionalidade de decisões124, isso é, um planejamento urbano. Desta forma os representantes do Brasil, deveriam atentar-se para o fato de que as cidades brasileiras também deveriam ser planejadas, já que, a sua população, de forma paulatina deslocou-se do campo para a cidade, passando do trabalho agrícola para o trabalho industrial, provocando o fenômeno da mobilidade social, com massificação e todos os problemas conseqüentes125, tornando-se uma sociedade urbana independentemente de sua extensão territorial. Tendo o planejamento urbano sempre sido debatido pelos estudiosos do assunto antes mesmo que surgisse qualquer debate a respeito do direito urbanístico, que atualmente abrange todas as regras jurídicas que cuidem do planejamento urbanístico126, regulando as suas normas e a relação jurídica entre a Administração e os particulares referentes à disciplina da propriedade imóvel127, passando a ser responsável pela organização dos centros urbanos, discutindo a sua logística e os direitos a eles inerentes, principalmente no que concerne ao direito de propriedade, que no início da formação das cidades, adquiriram uma santidade especial, tornando-se mais importante à medida que a diferenciação de classes aumentava, acabando, muitas vezes, a propriedade por ser mais sagrada do que a própria vida humana128. Porquanto, no início da formação do direito de propriedade, teve o proprietário um poder absoluto sobre a mesma, que sob o prisma do direito civil consistia na fruição plena e exclusiva, por uma pessoa, de um determinado bem corpóreo129, tendo em vista, que a propriedade como um direito subjetivo consiste em assegurar a uma 124 MOREIRA NETO, Diogo de F. Introdução ao direito ecológico e ao direito urbanístico: instrumentos jurídicos para um futuro melhor. Rio de Janeiro: Forense, 1975. p. 83. 125 MILPACHER, 1998, p. 49. 126 COSTA, Regina H. Princípios de Direito Urbanístico na constituição de 1988. In: DALLARI, Adilson A.; FIGUEIREDO, Lúcia V. Temas de Direito Urbanístico, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 110. 127 Ibid, p. 112. 128 LEAL, Rogério G. Direito urbanístico: condições e possibilidades da constituição do espaço urbano, Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 11. 129 BASTOS, Celso R. Curso de Direito Constitucional, 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 215. 36 pessoa o monopólio da exploração de um bem e de fazer valer esta faculdade contra todos que eventualmente queiram a ela se oporem130, filosofia esta que foi transplantada para a propriedade imóvel, tanto rural quanto urbana, que em regra geral, também pertencia de forma absoluta ao proprietário para poder usar, gozar e dispor da forma que lhe conviesse. Mantendo a propriedade brasileira estas características durante muitos anos, tendo ficado tanto a propriedade urbana quanto a propriedade rural por muitos anos sem serem regulamentadas, haja vista que, a conquista do território brasileiro foi realizada aos poucos, prejudicando a sua regulamentação, bem como o planejamento das formas de aquisição de suas terras até 1850, época em que foi elaborada a Lei das Terras considerada um marco importante na definição da propriedade territorial, cujo objetivo central era o de demarcar a terra que estava no domínio ou na posse de particulares, a fim de fazer a exclusão para aferir o que era de domínio público131. Tendo o Estatuto da Terra em seu art. 4º, adotado para a definição de propriedade rural a linha da finalidade e utilização econômica, que, posteriormente, foi colocada em discursão pelo CTN que a definiu em seu art. 29, adotando o critério topográfico no que concerne à cobrança de imposto; assim, se para o CTN o imóvel territorial rural era todo aquele localizado fora da zona urbana do Município para fins de cobrança do imposto132, a propriedade urbana em contrapartida seria toda aquela localizada dentro do perímetro definido pelo Município como urbano. Com isso, para se ter uma definição do CTN do que seja uma propriedade urbana é essencial saber os limites da zona urbana dos Municípios, e como e por quem ela é fixada133, pois, a área de terras situada na zona urbana municipal não é tributariamente rural e sim urbana, não importando a sua destinação134, conceituação esta que a Lei nº 5.868/72, em seu art. 6º, procurou alterar tornando-a 130 131 132 133 134 CELSO, 2001, p. 215. FERREIRA, 1999, p. 107. BRASIL, Código Tributário Nacional, 1999. p. 37. NASCIMENTO, 1985, p. 66. Idem. 37 técnica e unificando as definições135, afastando o critério topográfico e aceitando critério da finalidade e utilização econômica, não tendo a definição nela exposta, sofrido modificação com a sua regulamentação pelo Decreto nº. 72.106/73, que ao ser analisado permite a aferição do que seria imóvel urbano através da exclusão das situações ali inseridas, sendo o mesmo todo o imóvel situado no perímetro urbano136. Demorando-se a legislação pátria a se posicionar sobre a propriedade urbana e seus problemas, tendo sido o Decreto nº. 58, de 10 de dezembro de 1937, que dispôs sobre o loteamento e venda de terrenos para pagamentos em prestação, tanto rurais quanto urbanos, uma das primeiras legislações que tratou de algo relacionado com a propriedade urbana, auxiliando os compradores de loteamentos, que até então não tinham o domínio dos imóveis até a sua quitação, ficando a mercê da seriedade e boa fé do vendedor, pois, era permitido até a sua implantação que qualquer das partes arrepender-se antes de assinada a escritura de compra e venda, conforme disposto no art. 1.088 do Código Civil de 1916137. Elaborando-se, posteriormente, o Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, que dispôs sobre desapropriações por utilidade pública138, que teve os seus casos e aplicação definida posteriormente pela Lei nº 4.132, de 10 de setembro de 1962, decretada com o fito de promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu uso ao bem estar social139. Implantando também, posteriormente, a Lei nº 4.380, de 21 de junho de 1964, que tratou da correção monetária nos contratos imobiliários de interesse social, do sistema financeiro para aquisição da casa própria, criando o Banco Nacional da Habitação (BNH), visando facilitar e promover a construção e a aquisição da casa própria ou moradia140. 135 NASCIMENTO, 1985, p. 65. BRASIL. Lei 72.106, de 18 de abril de 1973. Regulamenta a Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que institui o sistema nacional de cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr 1973. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 137 BRASIL. Código civil, 2001, p. 224. 138 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 661. 139 Ibid., p. 673. 140 Ibid., p. 543. 136 38 E, ainda, a Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, que legislou sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias141, alterada pela Lei nº 4.864, de 29 de novembro de 1965142, e por último pela Lei nº 10.931, de agosto de 2004143. Contudo, nenhuma delas previu soluções para os demais problemas relacionados à propriedade urbana, e conseqüentemente, dos problemas das cidades, pois, todo o proprietário até então, pelo seu poder discricionário, continuava a tomar a atitude que lhe aprouvesse em relação a sua propriedade. E com o aumento das aglomerações humanas na zona urbana de forma aleatória, auxiliada pelo número de pessoas vindas da zona rural sem condições de adquirirem um imóvel urbanizado, a venda de lotes na periferia da cidade aumentou, trazendo problemas que a cidade não estava preparada para suportar, tais como, a falta de infra-estrutura mínima, como o saneamento básico, tornando-os verdadeiros cortiços ou favelas, fato este que ensejou a elaboração da Lei nº. 6.766, de 19 de dezembro de 1979, alterada pela Lei nº. 9.785, de 19 de janeiro de 1999, dispondo sobre o parcelamento do solo urbano, que pode ser feito mediante desmembramento ou zoneamento, obrigando os vendedores de lotes a efetuar o seu registro, tornado-os responsáveis pela implantação de toda a infra-estrutura, inclusive, pelo saneamento básico, devendo os loteadores por esta Lei seguir diversos procedimentos para a consecução do loteamento.144 Não tendo a Lei nº 6.766/79, sido recebida em todo o seu teor, pois os loteadores não obedeceram a todos os procedimentos que deveriam seguir, continuando, por isso, a surgir lotes sem infra-estrutura, que se analisados constatar-se que não foram registrados ou se registrados, seria por um pseudo-registro, pois, em seu registro não teriam sido seguidos todos os procedimentos devidos, não conseguindo também esta lei impedir a proliferação dos loteamentos clandestinos, que continuam sendo canais de proliferação de favelas. 141 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 449. Ibid., p. 570. 143 BRASIL. Lei nº 10.934, de 02 de agosto de 2004. Dispõe sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, letra de crédito imobiliário, cédula de crédito bancário, altera o decreto-lei 911, de 1 de outubro de 1969, as leis 4.591, de 16 de dezembro de 1964, 4.728, de 14 de julho de 1965, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 03 ago 2004. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 24 maio 2005. 144 BRASIL. Código Civil, op. cit., p. 905-922 passim, nota 141. 142 39 Visando o legislador com a sua elaboração, regulamentar a utilização de loteamentos urbanos, bem como a sua comercialização, seja na forma de terreno ou na forma de imóvel edificável, procurando tratar dos problemas da urbanização dos grandes centros e de seus bairros periféricos, principalmente no que condiz com a habitação, pois, é inegável que o incontrolável crescimento da população urbana nos grandes centros, tem gerado a explosão demográfica trazendo consigo irremediáveis problemas econômicos, políticos e jurídicos.145 Podendo a propriedade urbana dependendo da forma como é instituída, aparecer sob diversos prismas, contudo, se dependente de um terreno, o mesmo deve ser desmembramento ou parcelado, considerando-se o parcelamento do solo urbano como um processo de urbanização de uma gleba mediante sua divisão ou redivisão em parcelas destinadas ao exercício das funções elementares urbanísticas146, e gleba como a área de terra ainda intocada, ou seja, aquela que ainda não foi objeto de arruamento147; e mesmo que a maioria das propriedades imóveis sujeita ao parcelamento sejam de propriedade privada, ele é antes de tudo uma tarefa que cabe ao Poder Público, que deve de zelar por melhores condições habitacionais do povo148. E constituindo o parcelamento tarefa governamental, deve ser devidamente regulamentado e sua implantação fiscalizada, pois, ele tem sido até então, uma atividade urbanística de iniciativa de particulares, que elaboram e executam planos urbanísticos, com base no que determinam as Prefeituras Municipais. [...] exercendo a atividade que, originariamente, pertence ao Poder Público, qual seja a de oferecer condições de habitabilidade à 149 população urbana . Tendo havido, portanto, alguma previsão legal em torno da propriedade urbana e da questão urbanística antes do advento da Constituição Federal de 1988, que trouxe dispositivos a respeito da propriedade urbana e da função social da propriedade, sendo tal a relevância e extensão deste princípio, que ele se irradiou por todo o campo de incidência das normas urbanísticas150, inclusive no Estatuto da Cidade, 145 GRUPENMACHER, Betina T.; BUSQUETS, Cristina D. P. Favelas, invasões e modalidades de Loteamentos. In: DALLARI, Adilson A.; Figueiredo, Lúcia V. Temas de direito urbanístico. São Paulo: RT, 1991. p. 53. 146 Ibid., p. 54.. 147 Idem. 148 Idem. 149 Idem. 150 COSTA, 1991, p. 121. 40 Lei nº 10.257, de 10 de junho de 2001, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelecendo diretrizes gerais da política pública urbana, regulando o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental151, visando o desenvolvimento populacional e o crescimento demográfico nas zonas urbanas, o que se não observado pelos municípios acarreta o surgimento de inúmeras favelas152. E, conforme o art. 182 da CF/88, a política de desenvolvimento urbano instituída por ela e regulamentada pelo Estatuto da Cidade, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes, e para isso, torna o plano diretor urbano obrigatório para as cidades com mais de vinte mil habitantes, inserindo as desapropriações urbanas e facultando ao Poder Público Municipal, exigir dos proprietários do solo urbano de área incluída no plano diretor que não esteja sendo edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova o seu adequado aproveitamento; possibilitando ao Poder Público, caso estas exigências não sejam atendidas, penalizar o proprietário de forma sucessiva com o parcelamento ou edificação compulsória, imposto progressivo no tempo sobre a propriedade predial e territorial urbana, e desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.153 Dispondo as normas constitucionais, no que tange a propriedade urbana, sobre a sua proteção e o seu condicionamento a função social, no art. 5º, XXII, XXIII e XXIV, garantindo o direito de propriedade, contudo, condicionando-o ao atendimento a função social da propriedade, e definindo que a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro154, enquanto que o art. 170, II e III, determina que a ordem econômica tem por fim assegurar a todos a existência digna, 151 SANTOS, Maurício B. Estatuto das Cidades: Uma arma contra os inimigos. São Paulo: Mizuno, 2004. p. 13. 152 Idem. 153 BULOS, 2003, p. 1.240-1.243 passim. 154 Ibid., p. 187-194 passim. 41 conforme os ditames da justiça social, devendo observar entre outros, os princípios da propriedade privada e da função social155. Quanto ao planejamento urbanístico, ao uso e à ocupação do solo urbano, foi estipulado no art. 21, IX e XX, da CF/88, que a elaboração e execução dos planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social, bem como a instituição de diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos, é a de competência da União, determinando no ser art. 23, IX, que a promoção de programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico são de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Competindo a todos menos aos Municípios, legislar sobre o direito urbanístico, podendo os Estados, mediante lei complementar, conforme o art. 25, § 3º, da CF/88, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum, cabendo aos Municípios, no que couber promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, tendo a sua política de desenvolvimento urbano, por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, sendo o plano diretor urbano instrumento básico desta política156. Devendo o Estado, conforme o art. 174 da CF/88, como agente normativo e regulador da atividade econômica, exercer na forma da lei as funções de fiscalização, incentivo e planejamento157, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. Influenciando, portanto, o poder de propriedade, com todas as suas variações, bastante a evolução da cidade, sendo ela um importante fator indicativo do estágio de desenvolvimento de uma sociedade, medido pelo seu grau de urbanização158, constituindo soluções para a ocupação do solo, destinadas a maximizar a economia, 155 156 157 158 BULOS, 2003, p. 1.219. Ibid., p. 528-576 passim. Ibid., p. 1.231-1232. LEAL, 2003, p. 77. 42 e as soluções para a ocupação do espaço, sendo os pilares do desenvolvimento continuado na sociedade capitalista organizada, devendo a mesma ser cuidada, tendo em vista que, ninguém hoje sabe qual será a cidade de amanhã159, já que incertezas existem e são reais, contudo, com todas estas incertezas, podemos ainda afirmar que o progresso econômico, o bem-estar social e a integração cultural dos povos determinar-se-ão, em grande parte, nas cidades160. E, por isso, faz-se necessário o seu cuidado, para que tanto agora quanto no futuro, a mesma funcione perfeitamente, adaptando-se as mudanças sociais e culturais da sociedade e atendendo as necessidades de seus habitantes, para que estes vivam condignamente em seu seio. E este cuidado deve-se em grande parte aos Poderes Públicos que devem antes de tudo, promover a sua construção, pois o problema urbanístico assume uma dimensão fundamental da necessidade de incrementar a oferta imobiliária, daí a razão de ser do § 4º do art. 182, voltado à instrumentação dos Poderes Públicos, de meios adequados para compelir a propriedade urbana, em desconformidade com a sua função social, a moldar-se a esta161. 1.2.3 Atos constitutivos de direito da propriedade imóvel 1.2.3.1 Loteamento Antes de falarmos sobre loteamento é mister fazer referência ao desmembramento do solo urbano que importa em uma simples divisão do imóvel em outro ou outros de menor dimensão162, podendo ocorrer por iniciativa do proprietário ou do Poder Público; e o loteamento, que é o fracionamento da área primitiva em vários lotes ou parcelas163, diferenciando-se do desmembramento por ter este que realizar o aproveitamento de sistema viário existente, não podendo efetuar a abertura de 159 CHOAY, Françoise. O urbanismo: utopias e utilidades: uma antologia. 5. ed. São Paulo: Perspectiva, 2002. p. 55. 160 Ibid., p. 79 161 BASTOS, 2001, p. 476. 162 SANTOS NETO, Arthur P. dos. O imóvel rural e seu parcelamento. In: LAARANJA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. p. 239. 163 Idem. 43 novas ruas ou vias e logradouros públicos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes164. Enquanto que o parcelamento do solo é segundo o art. 2º, § 1º, da Lei 6.766/79, a subdivisão de gleba, em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes165; e, que se efetiva através de desmembramento, de loteamentos e da sua divisão, nos termos da legislação civil. Tendo anteriormente o assunto em torno dos loteamentos sido disciplinado pelo Decreto-Lei nº 58/37, que regulamentou a questão do parcelamento do solo, dispondo, principalmente, sobre o loteamento e a venda de terrenos para pagamentos em prestação, considerando como tal, toda a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação ou exploração de qualquer natureza com abertura de novas ruas ou vias de circulação, de logradouros públicos, ou com modificação ou ampliação de vias existentes166. Não alcançando ele totalmente os seus objetivos e deixando lacunas, principalmente, em relação a possibilidade de resolução do contrato de compra e venda, pois a compra de lotes com pagamento em prestação não transferia o domínio ao comprador, comprometendo-se o locador somente a assinar a escritura de compra e venda após a quitação do contrato, permitindo o art. 1.088 do Código Civil de 1916, o direito de arrepender-se do negócio, por disciplinar que quando o instrumento público fosse exigido como prova do contrato, qualquer das partes poderia arrepender-se antes de assiná-lo, ressarcindo à outra as perdas e danos resultantes do arrependimento167, permissão esta amplamente utilizada pelo empreendedor, por preferir pagar as perdas e danos e lucrar com a valorização do imóvel através do preço de revenda a terceiro168. Não alcançando também os seus objetivos por não imputar nenhuma penalização àqueles que descumprissem suas exigências, não alinhando os compromissos que o 164 165 166 167 168 JUNQUEIRA, 1997, p. 93. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 905. JUNQUEIRA, op. cit., p. 82, nota 164. BRASIL. Código Civil, 2001, p. 224. LIRA, 1997, p. 348. 44 loteador deveria ter com a infra-estrutura e espaços públicos, e também não obtendo êxito em solucionar os problemas decorrentes da proliferação de favelas, habitações sem a mínima salubridade e segurança169, que ferem a dignidade humana dos cidadãos que não têm como fugir desta sujeição social. Buscando-se, portanto, com a promulgação da Lei nº 6.766/79, que disciplinou sobre o parcelamento do solo urbano, suprir algumas lacunas do Decreto-Lei nº 58/37, como o caso das áreas públicas, que com a sua vigência, passaram a integrar ao patrimônio público desde o registro, bem como os equipamentos urbanos constantes da planta e do memorial descritivo de loteamentos170, passando ele a vigorar somente para as ares rurais171. Sendo o loteamento a partir de então considerado quando regularmente constituído como a forma mais completa de como o parcelamento do solo pode apresentar-se, podendo ele ser formando somente mediante autorização do Município, por ser de seu peculiar interesse tudo que diga respeito à cidade e seu parcelamento172. Pois mesmo a União tendo competência para editar normas gerais conforme estipulado pelo § 1º à 4º do art. 24 da CF/88, pode os Estados e Municípios estabelecerem suas regras, desde que não conflitem com as disposições gerais de lei federal173, haja vista tratar-se de competência concorrente sobre direito urbanístico, com isso o Poder Público Municipal deve pautar a gestão territorial de ocupação do solo urbano consoante as particularidades e demandas notadamente locais, desde que, por óbvio, não viole disposições hierarquicamente superiores174. Configurando-se o parcelamento do solo urbano ou rural como uma questão urbanística alçada em nível constitucional, estando o uso do solo urbano, subordinado às normas de direito urbanístico175, sendo matéria de fundamental relevância para o bem-estar de toda a coletividade, determinando o art. 30, VIII, da CF/88, que é de competência dos Municípios dentro das características e 169 LEAL, 2003, p. 187-188. NASCIMENTO, 1985, p. 25. 171 Ibid., p. 24 172 GRUPENMACHER, 1991, p. 55-56. 173 BULOS, 2003, p. 561-567 passim. 174 LEAL, 2003, p. 209. 175 SOUZA, Junia V. F. de. Temas de direito urbanístico – Solo criado: Um caminho para minorar os problemas urbanos. São Paulo: RT, 1991. p. 167. 170 45 possibilidades de cada um, efetuar o adequado ordenamento territorial mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano176. Apresentando-se o loteamento de diversas formas, dependendo de sua formação e origem, sendo chamado na sua forma perfeita e acabada de legal ou de regular, estando desta forma legalmente constituído, obedecendo a todas as exigências administrativas de exame pelo Poder Público, que depois de deferido e aprovado pelo Município é executado como reza a lei e registrado no Cartório de Imóveis da Circunscrição177; e de outra forma, chamado de ilegal, quando não obedece às regras técnico-jurídicas exigidas178, podendo ser tipificado como irregular ou clandestino, decorrendo este pela falta de titularidade da propriedade, e por ter sido implantado sem aprovação da Prefeitura e anuência do Estado, ocorrendo ao arrepio da lei179, enquanto que o loteamento irregular decorre daquele que apesar de aprovado pela Prefeitura, não foi inscrito ou se o foi, a inscrição ocorreu em desconformidade com o plano e as plantas aprovadas180, havendo em ambos os casos necessariamente a compra de um lote e a atuação de um agente imobiliário181, ocasionando ambos com a sua implantação prejuízos a comunidade, por transformarem-se em sua maioria em favelas e em verdadeiros bolsões de miséria, mesmo que não seja esta a intenção de quem os adquire. Sendo dever do Poder Público ordenar a ocupação, o uso e o parcelamento do solo urbano do seu território, utilizando-se para isso, do seu legítimo e legal poder de polícia, que faz parte da atividade administrativa do Estado, tendo por fim limitar e condicionar o exercício das liberdades individuais e dos direitos individuais, visando assegurar, em nível capaz de preservar a ordem pública, o atendimento de valores mínimos da convivência social, notadamente a segurança, a salubridade, o decoro e a estética182, a fim de compatibilizá-las com o bem-estar social183. 176 BULOS, 2003, p. 597. GRUPENMACHER, 1991, p. 57. 178 Idem. 179 JUNQUEIRA, 1997, p. 87. 180 GRUPENMACHER, loc. cit. 181 RIBEIRO, Luiz de Q. R.; AZEVEDO, Sérgio de. A crise da moradia nas grandes cidades: da questão da habitação à reforma urbana. 1. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. p. 44 182 MOREIRA NETO, 1975, p. 73. 183 MELLO, 2004, p. 604. 177 46 Devendo, porquanto, o Poder Público verificar se a propriedade imóvel urbana preenche os ditames da Lei nº 6.766/79, alterada pela Lei nº 9.785/99, que visa dar tratamento jurídico atualizado a problemas que a urbanização dos grandes centros do país vem suscitando, ligados fundamentalmente à habitação184, interessando, portanto, o loteamento e a sua formação mais ao direito público do que ao direito privado, devido ao impacto que a sua formação pode trazer ao meio social onde é implantado. Devendo as exigências legais para a permissão do fracionamento do solo urbano, como a elaboração e aprovação do projeto, a observância da mínima permitida para o fracionamento de lotes, bem como a elaboração do seu registro com todos os documentos pertinentes, serem seguidos, pois incide sobre o parcelamento do solo todas as normas da Lei nº 6.766/79, conforme convencionado pelo STJ, no Recurso Especial nº 126372, de 03 de setembro de 1998, julgado pela Primeira Turma nos seguintes termos: RECURSO ESPECIAL Nº 126372 / SP RELATOR: MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO RECORRIDO: CONPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO – C D H U ADVOGADOS: DRS. JOÃO FRANCISCO MOREIRA E OUTROS E ISRAEL SIMÕES E OUTROS EMENTA: ADMINISTRATIVO – PARCELAMENTO DO SOLO – CASAS POPULARES – EMPRESA PÚBLICA – INCIDÊNCIA DA LEI 6.766/79. I – A Lei 6.766/79 não exclui de sua regência os parcelamentos (tanto loteamentos quanto desmembramentos) efetuados para construção de casas populares. Tampouco, deixa a largo aqueles executados por empresas públicas (nem o poderia fazer face ao preceito constitucional do art. 173, § 1º). II – É que a disciplina dos Parcelamentos foi concebida em homenagem valores urbanísticos e ecológicos (art. 2º a 17). O respeito a tais é fundamental – nada importa que o parcelamento se destine a indústria, comércio, residência de luxo ou bairros populares. III – Outro interesse tutelado através da lei 6.766/79 é a segurança dos registros públicos (Art. 18). A disciplina do registro imobiliário homenageia, sobretudo as pessoas que adquirirão os lotes resultantes do parcelamento. É necessário que as pessoas – sobretudo aqueles mais pobres – tenham 185 em perpétua segurança a propriedade que adquiriram . 184 GOMES, 2001, p. 103. BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Administrativo – Parcelamento do solo – Casas populares – Empresa pública – Incidência da Lei 6.766/79. RESP 126.372/SP. Ministério Público do Estado de São Paulo e Companhia de desenvolvimento habitacional e urbano do Estado de São Paulo – C D H U. Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, 03/09/1998. Diário de Justiça, São Paulo, p. 17, 13 out 1998. Disponível em <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005. 185 47 E, entre as alterações sofridas pela Lei nº 6.766/79, em decorrência da Lei nº 9.785/99, estão a inclusão dos §§ 4º e 5º, no art. 18, a inclusão dos §§ 3º, 4º, 5º e 6º, no art. 26, que teve como conseqüência a dispensa do título de propriedade quando se tratar de parcelamento popular, destinado às classes de menor renda, em imóvel declarado de utilidade pública, passando o pedido de registro do parcelamento, além dos documentos mencionados no art. 18, V e VI, desta Lei, ser instruído com cópias autênticas da decisão que concedeu a imissão provisória de posse, do decreto de desapropriação, do comprovante de sua publicação na imprensa oficial; posse esta que com o registro da sentença que no processo de desapropriação fixar o valor da indenização, converter-se-á em propriedade e a sua cessão em compromisso de compra e venda; podendo o Poder Público em ação de desapropriação de áreas que pretenda destinar a parcelamentos populares, requerer a imissão provisória de posse e apresentar ao registrador certidão contendo os elementos necessários para o seu imediato registro, solicitando com base nele a inscrição do parcelamento referido, para efeito de eventuais cessões a terceiros.186 Tendo os novos espaços urbanos como destinação específica o fim habitacional187, cabendo ao Poder público a sua regularização e fiscalização, devendo os seus loteadores obedecer a todas as exigências administrativas de exame pelo Poder Público, com o fito de trazer segurança jurídica ao cidadão que, ao adquirir o imóvel almejado, confia que o Poder Público tem exercido as suas prerrogativas, não havendo a possibilidade de vir a ser lesado se o loteamento foi devidamente registrado, porque este publiciza o ato, protege o interesse de futuros adquirentes dos lotes e ratifica a boa-fé do empreendimento188. Fato este que em muitas ocasiões não tem ocorrido, falhando os cartórios ao exercerem as suas atividades e o Poder Público na fiscalização de seus serviços, pois continua a surgir loteamentos ilegais sem o devido registro; e a tendência é que estes loteamentos permaneçam sem a infra-estrutura básica, como a iluminação pública, redes de esgoto sanitário e abastecimento de água potável e de energia 186 187 188 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 910-915. LEAL, 2003, p. 191. GRUPENMACHER, 1991, p. 56. 48 elétrica, o que favorece a sua transformação em favela, lesando o cidadão na sua esperança de habitar em um ambiente saudável, com qualidade de vida e dignidade. Sendo os loteamentos irregulares e os loteamentos clandestinos, uns dos problemas mais graves estudados no Direito Urbanístico e enfrentados pelos Municípios, especialmente nas grandes cidades, muitas vezes com reflexo no Direito Ambiental, tendo ambos se proliferado nos grandes centros urbanos à conta da especulação e da carência de oferta imobiliária e, lamentavelmente, também por força da grilagem de terras públicas, que não é fato novo em nosso direito, pois, alguns parcelamentos remontam a época em que inexistia legislação adequada que regulamentasse a matéria, o que implicou na proliferação significativa de núcleos urbanos desprovidos de infra-estrutura e condições de habitabilidade mínimas189, portanto, contribuindo eles, para a proliferação das favelas, que têm como uma de suas características a inexistência de condições mínimas sanitárias, o que incentiva o lançamento de detritos sólidos e esgotos nos rios e lagos naturais, sem mencionar a falta de rede de coleta de águas pluviais e o correlato risco de enchentes e desabamentos nesses locais, ocasionando prejuízos ao meio ambiente. Ensejando os loteamentos irregulares e clandestinos, portanto, diversos problemas à sociedade com conseqüências danosas, não de forma isolada, e sim, como um organismo que sofre em conjunto de um mesmo malefício. Configurando a constituição destes loteamentos e a sua eventual ocupação, um mau exercício do direito de propriedade privada, que ocasiona ao se descumprir as exigências da Lei nº 6.766/79, inevitável impacto ao meio ambiente e a sociedade, determinando condições dilacerantes para toda a cidade, no que concerne à qualidade de vida, registrada inclusive pela intensa violência urbana190. E, mesmo a Lei 6.766/79 sendo uma forte combatente a propagação destes fatores, ela depende para a sua real efetividade que o Poder Público assuma a sua parte, traçando os Municípios as diretrizes que devem ser seguidas na sua região, além daquelas estipuladas em lei federal, e realmente cobrar dos loteadores o seu cumprimento. 189 190 LEAL, 2003, p. 197. LIRA, 1997, p. 343. 49 Pois, a municipalidade, em meio esse torvelinho de irregularidades provocadas pelos proprietários, normalmente é a primeira a ser acionada pelos adquirentes dos lotes dos parcelamentos irregulares, que lhe exigem a regularização do empreendimento ilícito, haja vista que, eles em vez de buscarem o ressarcimento dos prejuízos junto aos loteadores que lhes venderam os lotes e que não têm nenhum interesse em urbanizá-los, mas sim em especular e explorar os menos afortunados e desavisados191, pressionam o Poder Público e o demandam em juízo para resolver situações de fato tormentosas; e mesmo assim, o Poder Público continua a não cumprir com as suas funções, fazendo pouco caso destes problemas, não tomando as providências necessárias e cabíveis para a solução dos mesmos. Determinando a Lei 6.799/79, em seu art. 37, que é proibido vender ou prometer vender lotes ou desmembramentos não registrados, e ainda, no art. 50, I, e 52, como forma de coibir a proliferação de loteamentos irregulares, que a desobediência destes dispositivos é crime contra a Administração Pública192, qualificado-o em caso de venda de lote com contrato de promessa com reserva, ou ainda, se ela for baseada em título de propriedade ilegítimo, entre outras, com sanção de pena de reclusão, além de multa, para os seus responsáveis e para os oficiais dos cartorários, visando com isso a proteção da sociedade. Facultando-se ao loteador antes que qualquer processo seja instaurado, a possibilidade de regularizar o loteamento, contudo, somente se o loteador for proprietário legítimo dos lotes, porque se não o for, será inviável a sua regularização, por não ter o loteador título hábil para efetuar o registro. Sendo a regularização destes loteamentos, um meio de minimizar os problemas decorrentes de sua implantação, devendo o loteador buscar satisfazer os requisitos exigidos pelo Município e as exigências legais da Lei nº 6.766/79 da mesma forma como se estivesse por iniciar o loteamento, tais como o estipulado no art. 12 desta lei, submetendo o projeto do parcelamento à prévia aprovação do Município, obtendo o licenciamento ambiental, se o caso exigir, e, depois de aprovado, conforme o art. 180, promover o registro do loteamento no Cartório do Registro de Imóveis no prazo de cento e oitenta dias, quando, e somente a partir desse momento, poderão ser 191 192 GRUPENMACHER, 1991, p. 58. JUNQUEIRA, 1997, p. 85. 50 alienados os lotes a terceiros, providenciando todos os documentos disciplinados no art. 18193. Entretanto, se o loteador não se dispuser a cumprir com a sua obrigação, o art. 40 da Lei 6.766/79 possibilita a municipalidade, através de sua Prefeitura, em decorrência do interesse público, na hipótese de já ter tentado forçar o particular a terminar a obra e restar infrutífera a providência, executar regularização do parcelamento e ocupação do solo194, pois, este é um dever da municipalidade, já discutido pelo STJ, no Recurso Especial de 14 de outubro de 2003, julgado pela Primeira Turma, nos seguintes termos: RECURSO ESPECIAL Nº 448216 S/P RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO RECORRIDO: MUNICÍPIO DE SÃO PAULO PROCURADOR: LUÍS ANTÔNIO GIAMPAULO SARRO E OUTROS EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO URBANÍSTICO. LOTEAMENTO IRREGULAR. MUNICÍPIO. PODER-DEVER DE REGULARIZAÇÃO. 1. O art. 40 da lei 6.766/79 deve ser aplicado e interpretado à luz da Constituição Federal e da Carta Estadual. 2. A municipalidade tem o dever e não a faculdade de regularizar o uso, no parcelamento e na ocupação do solo, para assegurar o respeito aos padrões urbanísticos e o bem-estar da população. 3. As administrações municipais possuem mecanismos de autotutela, podendo obstar a implantação imoderada de loteamentos clandestinos e irregulares, sem necessitarem recorrer a ordens judiciais pra coibir os abusos decorrentes da especulação imobiliária por todo o País, encerrando uma verdadeira contraditio in terminis a Municipalidade opor-se a regularizar situações de fato já consolidadas. 4. A ressalva do § 5º do art. 4º da Lei 6.766/79, introduzida pela Lei 9.785/99, possibilitou a regularização de loteamento pelo Município sem atenção aos parâmetros urbanísticos para a zona, originariamente estabelecidos. [...] a lei municipal pode dispensar algumas exigências quando a regularização for feita pelo município. [...] Dita exceção não se aplica ao regularizador particular. Esse, para regularizar o loteamento, há de atender a legislação vigente. 5. O Município tem o dever-dever de agir para que o loteamento urbano irregular passe a atender o regulamento específico pra a sua constituição. 6. Se o Município é imposta, es lege, a obrigação de fazer, procede a pretensão deduzida na ação civil pública, cujo escopo é exatamente a imputação do facere, às expensas do violador da norma urbanístico195 ambiental . 193 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 910. Ibid., p. 919. 195 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Direito urbanístico. Loteamento irregular. Município. Poderdever de regularização. RESP 448.216/SP. Ministério Público do Estado de São Paulo e Município de São Paulo. Relator: Ministro Luiz Fux. Primeira Turma, 14/10/2003. Diário de Justiça, São Paulo, p. 204, 17 nov 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005. 194 51 E, sendo a regularização dos loteamentos um direito de todos os cidadãos, todos os interessados têm legitimidade para pleitearem na justiça a regularização dos lotes196, em benefício de toda a comunidade, principalmente os adquirentes, aos quais é permitido que suspendam o pagamento das prestações restantes, notificando loteador a suprir a falta197, depositando-as no registro de imóveis responsável, que as depositará em estabelecimento de crédito, que poderão ser levantadas pelo loteador somente com a notificação dos adquirentes dos lotes, após o reconhecimento da sua regularização, passando após isso, os pagamentos a serem feitos diretamente ao loteador. E, caso o Poder Público, através da Prefeitura, tenha despendido valores dos cofres públicos para efetivar a regularização do empreendimento de particular, tem o direito de ser ressarcido, podendo conforme o § 4º, do art. 40, da Lei nº 6.766/79, obter judicialmente o direito de levantar as prestações depositadas, e ainda, adentrar ao patrimônio do loteador, caso as prestações depositadas não supram com as despesas efetuadas198. Portanto, juridicamente só se presta para fins edilícios e habitacionais o parcelamento que ocorre nos limites da lei, ou seja, que observa as disposições normativas e públicas pertinentes à matéria de todas as entidades federativas199, com a aprovação do projeto e seu efetivo registro no Cartório de Registro de Imóveis, caso contrário, o parcelamento do solo será considerado irregular. 1.2.3.2 Condomínio e suas modalidades A designação de condomínio foi dada ao imóvel que pertencia exclusivamente a um só titular e que passa a pertencer a diversos titulares, sendo o direito de propriedade de duas ou mais pessoas sobre o mesmo imóvel ou coisa200. Surgido como 196 197 198 199 200 GRUPENMACHER, 1991, p. 71. LIRA, 1997, p. 349. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 919. LEAL, 2003, p. 210. JUNQUEIRA, 1997, p. 73. 52 modalidade de moradia pela necessidade dos homens de aproveitarem melhor os espaços urbanos, em face da explosão demográfica ocorrido nos centros urbanos. Contribuindo a economia também para implantação do condomínio, pois, buscou-se um melhor aproveitamento do espaço e do terreno edificável, mesmo que tenha havido divergências no início da sua implantação sobre a sua eficácia e utilidade, pois, para algumas pessoas, desde o princípio ele foi visto como fator de segurança, possibilitando-as isolar-se de um ambiente violento, ficando por trás de seus muros, enquanto para outras, tornou-se uma prisão, por terem tido a sua liberdade pessoal limitada e a sua privacidade diminuída. Com a implantação do condomínio houve necessidade de uma regulamentação que discriminasse os direitos e deveres de cada partícipe, bem como a determinação de sua administração, que obedece atualmente a normas próprias, podendo ficar a cargo de um consorte ou de terceiros a critério da vontade da maioria, devendo este obedecer às normas legais atinentes ao condomínio, bem como as definidas por vontade das partes em convenção. Sendo ele atualmente disciplinado pelo Código Civil, que regula o condomínio de forma geral do art. 1.314 a 1.330, e o condomínio edilício do art. 1.331 a 1.358201; e ainda, pela Lei nº 4.591/64, que cuida do condomínio em edificações e das incorporações imobiliárias. Assim, apesar do princípio da exclusividade da propriedade que impede que a mesma pertença ao mesmo tempo a duas ou mais pessoas, ela pode aparecer sob a forma de condomínio, onde o direito ao bem indiviso é fracionado em partes ideais pertencentes a vários indivíduos ao mesmo tempo, configurando-se desta forma uma situação jurídica em que vários proprietários exercem a um só tempo o domínio sobre uma coisa, que se torna indivisa do ponto de vista técnico ou jurídico, assegurando a cada condômino uma quota ou fração ideal que constitui uma porção do todo que, abstratamente, é atribuída ao co-proprietário202, portanto, no condomínio a propriedade de uma coisa corpórea pertence a uma pluralidade de pessoas por quotas-partes qualitativas iguais203. 201 202 203 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 234-241. FACHIN, 2003, p. 168-170 passim. RIZZARDO, Arnaldo. Direito das coisas. Rio de Janeiro: Aide, 1991. v. 3. p. 555. 53 Podendo o condomínio ser instituído de forma voluntária se incidir para a sua formação à vontade de todos os consortes204, ou convencional se as partes contratantes estabelecerem a propriedade comum sobre a propriedade adquirida205. Dizendo-se, ainda, que o condomínio é incidente ou eventual quando constituído por causas estranhas ou independentes à vontade dos condôminos206, provindo diretamente de um fato. Formando-se de forma legal ou forçada, que surge por uma imposição da ordem jurídica que impede a divisão da propriedade207, como ocorre com os módulos rurais. E, ainda, pro diviso em que a sua indivisibilidade é de direito e de fato208, ou pro indiviso em que existe somente aparência de condomínio209. Assim, no condomínio voluntário não havendo mais interesse na comunhão, realizarse a sua divisão com a justa atribuição de cada condômino da respectiva participação, em espécie ou em numerário, conforme o caso, podendo para tanto, a todo o tempo, qualquer interessado requerer a sua dissolução, pois, a princípio, as causas de cessação do condomínio relacionam-se com o próprio sistema legal específico, e com a vontade dos titulares de direitos sobre o bem, podendo o seu desfazimento ocorrer de modos distintos, prevalecendo as operações de venda ou de partilha, amigável ou judicial210. Portanto, o condomínio pode ser extinto tanto pela alienação quanto pela divisão, sendo que em caso de alienação a primeira oferta deve ser feita a um dos condôminos, que se adjudicar o bem pagará aos demais o valor equivalente à fração ideal de cada um211, e caso não haja entre os consortes interessados, pode a oferta de ser feita ao público, sendo que em ambas as hipóteses ocorrerão em conformidade com a vontade das partes, de forma amigável ou judicial, em que cada condômino fará jus ao valor correspondente a sua quota da propriedade. 204 205 206 207 208 209 210 211 RIZZARDO, 1991, p. 559. JUNQUEIRA, 1997, p. 73. RIZZARDO, op. cit., p. 560, nota 204. Idem. VENOSA, 2003, p. 346. Ibid., p. 312. BITTAR, Carlos A. Os direitos reais. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 144-145. FACHIN, 2003, p. 203. 54 Desta forma, caso a venda não seja ofertada primeiramente ao condômino, ele pode apresentar-se para a aquisição, perante o terceiro pretendente212, e concorrer com ele utilizando-se do seu direito de preferência, independente da vontade dos demais, pois esta é uma prerrogativa legal e sua desobediência pode afetar a própria validade do ato jurídico, posto que consumaria, então, infração à norma cogente213, não podendo, portanto, o bem ser alienado a terceiro caso o condômino cubra a sua oferta. Não devendo o condomínio ser confundido em nenhuma de suas modalidades com a composse, que de acordo com o art. 1.199 do Código civil, é uma situação pela quais duas ou mais pessoas exercem, simultaneamente, poderes possessórios sobre a mesma coisa214, concorrendo como adquirentes de coisa comum, como no advento da concorrência de posse, que se dá face ao desdobramento da posse em direta e indireta, ocorrendo o fenômeno da existência de posses de natureza diversa sobre a mesma coisa, tendo cada possuidor o exercício limitado ao âmbito específico da sua. Enquanto que no condomínio, os titulares do direito de propriedade, o exercem perante terceiros de forma exclusiva e plena, com todos os partícipes da comunhão gozando dos mesmos poderes de proprietários215. Contudo, entre os comproprietários, o direito de propriedade é exercido de forma limitada, embora cada condômino possua os atributos inerentes a este direito de forma qualitativamente idêntica sobre toda a coisa, pois sofre limitação na proporção quantitativa que concorre como os outros consortes na titularidade da mesma, devendo respeitar os direitos dos outros, para a necessária coexistência, repartindo proporcionalmente ônus e vantagens216, podendo valer-se dos remédios possessórios contra terceiros e até mesmo contra outro consorte para reivindicar a coisa de quem injustamente a possua, independentemente da intervenção dos demais condôminos217. 212 RIZZARDO, 1991, p. 575. Ibid., p. 206. 214 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 215. 215 BITTAR, 1991, p. 139. 216 Ibid., p. 139. 217 FACHIN, 2003, p. 170. 213 55 Detendo os condôminos como proprietários conjuntos da mesma coisa, todos os direitos e deveres entre si e com terceiros, desta forma, cada condômino pode usar livremente a coisa conforme o seu destino, podendo alienar e gravar de ônus a sua parte ideal, contudo, no que se refere à coisa comum, esses direitos devem harmonizar-se com os dos demais, sujeitando-se ao interesse da maioria, e, prevalecendo vontade desta, tendo em vista, que o condomínio pode dar ensejo a divergências, o que deve ser evitada, devendo-se obedecer ao estipulado no art. 1.314 do Código Civil, que determina que o condômino não pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a pessoa estranha, sem o assentimento dos outros218, respondendo a estes pelos frutos que percebeu da coisa comum, e pelos danos que lhes causar. Arcando cada condômino, conforme o art. 1.315 do Código Civil, na proporção de sua parte ideal, com as despesas de conservação ou divisão da coisa, suportando os ônus, a que estiver sujeita a coisa, comprometendo-se o condômino somente com valor proporcional a fração ideal da qual é titular, podendo eximir-se dos pagamentos destas despesas somente se renunciar à sua parte ideal do condomínio, pois a sua obrigação resolve-se por não ter mais a titularidade comum da coisa, ao deixar de ser proprietário do bem que foi repassado, contudo, embora renuncie à sua parte ideal, se nenhum dos condôminos assumirem o débito, retorna o renunciante ao domínio e à titularidade sobre o bem, para que se proceda a sua divisão219, assim, não há direitos atribuíveis a um condômino que também não assistam aos demais220. Este sistema vigorou de tal forma que, nos últimos tempos, com o aumento da explosão demográfica cumulada com o déficit habitacional e a conseqüente valorização dos imóveis urbanos, apoiada no desenvolvimento da técnica construtiva, fizeram com que os edifícios em planos superpostos desenhassem um novo perfil nas cidades em todo o mundo221. 218 219 220 221 FACHIN, 2003, p. 174. Ibid., p. 185-186. Ibid., p. 175. VENOSA, 2005, p. 361. 56 Caracterizando-se eles pela justaposição de propriedades distintas, perfeitamente individualizadas, ao lado de partes do edifício comuns a todos, mais comumente conhecida no país, anteriormente, e no estrangeiro, como propriedade horizontal que tem por objeto a reunião de habitações, salas ou lojas, formando uma unidade estrutural sujeita a um único regulamento jurídico, para atendimento das necessidades e fins comuns222, o que permite que o solo seja a um só tempo melhor e mais intensamente aproveitado, havendo um custo menor na sua ocupação e construção. Não tendo sido a propriedade horizontal disciplinada pelo Código Civil de 1916, e com a necessidade haver uma normatização foi elaborado o Decreto nº 5.481, de 25 de julho de 1928, que condicionou a propriedade horizontal ao número de pavimentos, exigindo para a sua constituição, que a edificação tivesse mais de cinco andares223, e com a sua modificação pelo Decreto-lei nº 5.234, de 8 de fevereiro de 1943, esta exigência foi reduzida para três andares, sendo este número reduzido para dois andares, posteriormente, pela Lei nº 285, de 5 de junho de 1948. Ficando a Lei nº 285/48 ultrapassada e não alcançando mais os objetivos para a qual foi proposta, foi substituída pela Lei nº 4.591/64, alterada pela Lei nº 4.864/65, consignando ela a teoria da propriedade horizontal sob a forma de unidade autônoma, exigindo que cada unidade esteja separada das demais unidades integrantes do condomínio, que tenha direta ou indiretamente, saída própria para as vias públicas, que corresponda à sua fração ideal do terreno e das coisas comuns, possuindo designação especial, numérica ou alfabética, constituindo de uma propriedade comum e de propriedade exclusiva, formando um todo incindível, somente podendo existir as frações ideais e as unidades autônomas quando conjugadas às partes comuns a todos os condôminos e vice-versa224. Estabelecendo a Lei nº 4.591/64, com a propriedade horizontal, uma nova modalidade de condomínio que diferia do condomínio anteriormente conhecido, pelo 222 LOPES, João Batista. Condomínio. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 57. BRASIL. Lei nº 4.581, de 25 de junho de 1928. Dispõe sobre a alienação parcial dos edifícios com mais de cinco andares e dá outras providências. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1928. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 04 junho 2005. 224 CAMBLER, Everaldo A. Responsabilidade civil na incorporação imobiliária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 31. 223 57 fato de na propriedade horizontal as suas unidades autônomas serem unipessoais, não havendo comunhão de bens, e com isso, cada condômino é titular de uma unidade autônoma e, ao mesmo tempo, utiliza áreas em comum com outros condôminos225, enquanto que na modalidade anterior elas pertenciam a todos e a cada um dos condôminos na sua totalidade. E, por isso, se no condomínio tradicional há o direito de preferência como prerrogativa legal do condômino em adquirir a fração ideal do consorte que a esteja colocando à venda, na propriedade horizontal não existe, não necessitando o condômino de autorização dos demais para ceder a sua parte a terceiros interessados na aquisição. Contudo, permanecem insuscetíveis de alienação as partes comuns em separado da unidade autônoma, por serem consideradas indivisíveis, não se destacando do direito exclusivo sobre a unidade226 havendo ainda diferença nos institutos por ser o condomínio tradicional transitório, sujeito à extinção227, podendo ser dividido a qualquer tempo, por interesse de qualquer condômino, e ainda ser considerado indiviso por prazo limitado de cinco anos, prorrogáveis por mais cinco. Não havendo consenso sobre a natureza jurídica da propriedade horizontal por haver nítida e distinta duplicidade de direitos reais, uma individual que tem por base o direito de propriedade da unidade autônoma228 e outra coletiva que é dirigida às partes comuns do edifício, predominando o sistema corresponde ao condomínio tradicional, em que os titulares de unidades condominiais são comproprietários de fração ideal de terreno e das partes de uso comum, tendo que se submeterem às normas da legislação especial e às ditadas pelo condomínio, em conformidade com a vontade da maioria229. Portanto, o proprietário de unidade autônoma, em propriedade horizontal, é ao mesmo tempo proprietário singular e comproprietário, devendo essa modalidade ser tratada como condomínio, utilizando-se a lei especifica no que não conflitar com a 225 226 227 228 229 CAMBLER, 1997, p. 50. RIZZARDO, 1991, p. 608. LOPES, 1997, p. 56. VENOSA, 2005, p. 363. BITTAR, 1991, p. 147. 58 sua finalidade, recorrendo-se às normas do condomínio em geral instituído no Código Civil caso haja omissão da lei condominial. E, como o condomínio, a propriedade horizontal não é considerada pela legislação como uma pessoa jurídica, embora represente um conjunto de interesses característicos e autônomos, com administração e realização de atos independentes, pois lhe falta à autonomia230, sendo considerada juridicamente pela justaposição de propriedades distintas e exclusivas ao lado do condomínio de partes do edifício, forçosamente comuns231, em que cada um exerce o seu próprio direito, enquanto que o zelo pelos interesses gerais compete à administração do condomínio, através de seu representante legal, que pode ser o administrador ou o sindico eleito pela assembléia geral que o representa ativa e passivamente, sendo reconhecida a sua capacidade processual e a sua personalidade jurídica no art. 12, IX, do Código de Processo Civil232, que conduz o condomínio a poder suportar quaisquer demandas judiciais e a responsabilizar-se por atos prejudiciais causados por terceiros233. E, se o Código anterior não contemplou a propriedade horizontal, o Código Civil de 2002, em seu art. 1.331 a 1.358, contemplou-a sob a denominação de condomínio edilício234, podendo, portanto, continuar a ser disciplinada pelo Código Civil, pela Lei de condomínios e incorporações, além da Convenção do condomínio, que é um documento inscrito no qual são estipulados os direitos e deveres recíprocos dos condôminos, inscrita no Registro Imobiliário por força do art. 9º, da Lei 4.591/64, complementada pelo regimento interno, representando ele a manifestação da vontade da maioria dos condôminos, determinada por um padrão legal, com força sobre as partes e terceiros, em suas relações jurídicas com o condomínio235. Tendo a convenção poder para regular as relações entre as partes, não podendo o condômino recusar-se ao seu cumprimento, mesmo que não esteja registrada no Registro Geral de Imóveis, pois o seu registro presta somente para conhecimento de 230 SOUZA, Agnaldo C. de. Condomínios em edifícios: manual do condomínio: Lei nº 4.591, de 1612-1964: convenção, administração: modelos de atas e editais. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 23. 231 DINIZ, 2004, p. 224. 232 BRASIL. Constituição federal, Código de Processo Civil, 2003, p. 771. 233 RIZZARDO, 1991, p. 611. 234 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 236-241. 235 RIZZARDO, op. cit., p. 620, nota 233. 59 terceiros, fato este debatido pelo STJ, no Recurso Especial do dia 23 de fevereiro de 1999, julgado pela Terceira Turma, nos seguintes termos: RECURSO ESPECIAL Nº 139.952 / RJ RELATOR: MINISTRO WALDEMAR ZVEITER RECORRENTE: CONDOMÍNIO VILAREJO ADVOGADO: MARIA HELENA LOPES FIGUEIREDO RECORRIDO: RICARDO DIAS MICELI ADVOGADO: ADILSON HENRIQUE NOVAES EMENTA: CIVIL – AÇÃO DE COBRANÇA – COTAS CONDOMINIAIS – CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO NÃO REGISTRADA – LOTEAMENTO – CONDOMÍNIO HORIZONTAL. I – O Registro da Convenção de Condomínio tem por finalidade precípua imprimir-lhe validade contra terceiros, não sendo requisito “inter partes”. Por isso não pode o condômino sob esse fundamento recusar-se a cumprir com os seus termos ou a pagar as taxas para sua manutenção. II – Um condomínio, ainda que atípico, caracteriza uma comunhão e não se afigura justo, nem jurídico, em tal circunstância que um participante, aproveitando-se do “esforço” dessa comunhão e beneficiando-se dos serviços e das benfeitorias realizadas e suportadas pelos outros 236 condôminos, dela não participe contributivamente . Tendo o âmbito de atuação da propriedade horizontal sido delimitado pelo o § 2º do art. 1º, da Lei nº 4.591/64, alterada pela Lei nº 10.931, de 02 de agosto de 2004, que estabelece que cabe a unidade autônoma, de forma inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária, que deve ser identificada no instrumento de instituição do condomínio que obrigatoriamente deve ser registrado no Registro Imobiliário como garantia fundamental do direito do adquirente237, contendo a individualização de cada unidade, sua identificação e discriminação, constando no ato de sua instituição, conforme o art. 1.332 do Código Civil, o fim para que se destinam as unidades autônomas, devendo, ainda, cada uma delas ter acesso direto ou indireto à via pública238. Estando os condôminos sujeitos às regras da convenção de condomínio, observando as restrições nela contidas e obedecer às normas do regimento interno do edifício, que disciplina o seu relacionamento interno e o uso das partes comuns, com projeções inclusive sobre terceiros. Sendo as despesas de condomínio uma das transgressões mais comuns efetuadas pelos condôminos, devendo as mesmas ser 236 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Civil – Ação de cobrança – Cotas condominias – Convenção de condomínio não registrada – Loteamento – Condomínio horizontal. RESP 139.952/RJ. Condomínio Vilarejo e Ricardo Dias Miceli. Relator: Ministro Waldemar Zveiter. Terceira Turma, 23/02/1999. Diário de justiça, Rio de janeiro, p. 134, 19 abr 1999. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005. 237 VENOSA, 2005, p. 370. 238 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 237. 60 rateadas conforme a fração ideal do terreno, salvo disposição em contrário em convenção, sendo suportadas, exclusivamente, por seu titulares, ou ocupantes, conforme caso239. ]Devendo as convenções condominiais também processar penas e multas que coíbam as atitudes dos condôminos inconvenientes, para que os mesmos não criem atritos, devendo abster-se de praticar atos que incomodem aos demais moradores, para que a convivência em comum não se torne insuportável, pois, legalmente o condômino inconveniente não pode ser retirado da comunhão, não podendo o mesmo ser expulso, mas, tanto o proprietário, quanto o inquilino, conforme o art. 275, II, do Código de Processo Civil, pode promover ação para impedir que o inquilino ou proprietário do prédio vizinho, faça dele uso nocivo à segurança, sossego ou saúde dos que habitam naquele espaço, admitindo-se ação tendente a sustar os atos que causem tumulto ou ruído intolerável240. Podendo, estes problemas serem evitados se todos os interessados tiverem em vista que, a instituição do condomínio de apartamentos visa regular as relações jurídicas entre os diversos proprietários considerando uns em relação aos outros e todos em relação ao edifício241, respeitando as normatizações da convenção. Existindo ainda, atualmente, manifestações condominiais que não podem ser regidas simplesmente pela Lei 4.591/64 e pelos artigos 1.331 a 1.358 do Código Civil, pois, diferem do condomínio tradicional e do condomínio edilício, sendo a mais comum a dos loteamentos fechados, que mesmo assemelhados ao loteamento comum, não podem ser entendidos como forma de parcelamento do solo urbano242, considerando-se como tal, todo o loteamento que tenha área regularmente parcelada, com suas vias públicas de comunicação, realizada no interior de muro ou cerca243. Tendo o loteamento fechado surgido por razões de segurança individual e familiar, não se vinculando eles a propriedade horizontal, ficam excluídos da incidência da lei 239 240 241 242 243 BITTAR, 1991, p. 150. RIZZARDO, 1991, p. 628. Ibid., 1991, p. 617. GRUPENMACHER, 1991, p. 53. Ibid., p. 85. 61 4.591/64, salvo quando vinculados expressamente a construções244, não havendo vinculação com construções, podem os loteamentos fechados serem regidos, por falta de regulamentação especifica, pelas normas da Lei 6.766/79, em face de sua semelhança com os loteamentos comuns, distinguindo-se ambos pelo fato dos loteamentos fechados serem isolados por muro ou cerca, impossibilitando o ingresso de qualquer do povo a área reservada aos condomínios ou proprietários de lotes245. E, enquanto na propriedade horizontal há obrigatoriedade de edificações, no loteamento fechado o mesmo não ocorre, podendo haver o parcelamento do solo como em todo o loteamento, com a alienação dos lotes, sem que haja qualquer vinculação com a edificação, com isso, ficavam os proprietários dos loteamentos fechados, antes do advento da Lei 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada Estatuto da Cidade, livres de qualquer sanção por não realizar o aproveitamento dos lotes, mesmo sendo determinado pelo art. 5º, XXIII, da CF/88, que a propriedade deve atender a sua função social246. Ocorrendo a função social da propriedade somente, conforme o art. 183 da CF/88, quando ela atende às exigências fundamentais da cidade expressas no plano 247 diretor ; assim, enquanto havia omissão em relação a estas exigências, nada se podia fazer contra as atitudes destes proprietários, que desconsideravam que uma das funções da propriedade é a sua utilização para habitação, visando, com as suas atitudes, obterem o maior lucro possível com a comercialização dos lotes no futuro, na expectativa de uma futura valorização imobiliária. Sendo esta atitude especulativa dos proprietários facilitada antes da vigência do Estatuto da Cidade, pelo fato de toda a área existente no perímetro do loteamento ser de propriedade privada, de utilização exclusiva dos proprietários de unidades condominiais248, sem que o Poder Público tivesse algum tipo de acesso, pois diferentemente do loteamento comum em que ocorre a transferência para a municipalidade das áreas comuns, como praças e ruas, no loteamento fechado elas 244 LOPES, 1997, p. 58-59. GRUPENMACHER, 1991, p. 88. 246 BULOS, 2003, p. 189-194 passim. 247 Ibid., p. 1.243-1.245 passim. 248 GRUPENMACHER, op. cit., p. 87, nota 245. 245 62 são consideradas de domínio particular, inexistindo disposição expressa em texto de lei federal acerca da obrigatoriedade da transferência das vias de circulação, praças e demais espaços livres dentro do loteamento fechado ao Município249. Mas, mesmo com a utilização dos loteamentos fechados para fins especulativos, feitos por alguns proprietários, não se pode negar que em muitos aspectos da vida urbanística ele apresenta condições favoráveis para a solução de problemas que a municipalidade tem tido dificuldade de solucionar, tais como, saneamento básico e segurança, permitindo ele, bem como a propriedade horizontal, que o ideal de morar com dignidade possa ser realizado, porque a sua estrutura jurídica impede a ação do Poder Público Municipal, que não poderá alterar-lhe o perfil, nem permite densidade populacional acima de suas possibilidades, pertencendo aos proprietários o poder de decisão250. Devendo o Poder Público atentar-se para o fato de que a adequação do espaço físico às necessidades e à dignidade do homem só se consegue quando o ser humano é respeitado e não havido como mais um voto251, cumprindo com as suas obrigações, que entre muitas, é o de fiscalizar a implantação dos loteamentos e condomínios, em qualquer de suas modalidades. E, para isso, deve-se iniciar com a fiscalização da incorporação imobiliária, que é uma atividade humana exercida no sentido de incluir, unir, introduzir ou ligar uma coisa ao corpo de outra, a que ficará pertencendo, geralmente com a finalidade de obtenção de ganho econômico252, formando edificações no imóvel compostas de unidades autônomas, regulada pela Lei nº 4.591/64, competindo ao incorporador como pessoa física ou jurídica, que toma as iniciativas de forma geral, levando a termo a incorporação e por ela se responsabilizando253, planejar e dar a forma legal por meio de processo de incorporação no registro imobiliário competente, estando as 249 250 251 252 253 GRUPENMACHER, 1991, p. 88. VIANA, Marco Aurélio da Silva. Loteamento. 1. ed. Rio de Janeiro: Aide, 1991. p. 13. Idem. CAMBLER, 1997, p. 04. Ibid., p. 81 63 condições para que a pessoa física ou jurídica passa ser incorporador no sistema brasileiro, definido no art. 31, da Lei nº 4.591/64254. 1.2.3.2.1 Multipropriedade A multipropriedade é um tipo de modalidade condominial surgida na atualidade, genericamente designada por um aproveitamento econômico de uma coisa móvel ou imóvel repartida em unidades fixas de tempo, de modo que diversos titulares possam cada qual a seu turno, utilizar-se da coisa com exclusividade e de maneira perpétua255, não existindo no Brasil ainda legislação especifica que a regule e discipline, podendo, portanto, também neste caso ser utilizada a Lei 4.591/64, pela sua proximidade analógica256, devendo o seu incorporador observar, como no caso das propriedades horizontais, as normas do art. 32 desta lei, antes de efetivar a venda das unidades do empreendimento, e as determinações do seu art. 7º, quanto a sua instituição, arquivando no registro de imóveis os documentos ali relacionados257. Necessitando-se, portanto, para que o interessado adquira uma quota-parte ideal fixada pelo tempo da multipropriedade, a exigência de instrumentalização pública, pois, enquanto a lei não regulamenta a possibilidade de registro da multipropriedade em nome de cada condômino fracionário, deve-se contornar o problema estabelecendo um multicondomínio, com relações pessoais entre os condôminos e o administrador. Assim, para fins de registro, estabelece-se a propriedade somente do administrador ou a propriedade em condomínio pro indiviso entre os vários multiproprietários258. Tendo a multipropriedade as férias e o lazer como fatores determinantes para o seu surgimento, e ainda, as influências dos fatores econômicos, que faz com que as pessoas optem por ela em detrimento a hospedagem em hotéis e pousadas; 254 255 256 257 258 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 465-466. TEPPEDINO, Gustavo. Multipropriedade Imobiliária. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 01. VENOSA, 2005, p. 405. BRASIL. Código Civil, op. cit., p. 450, nota 254. VENOSA, op. cit., p. 405, nota 256. 64 buscando para desfrutar os seus momentos de descanso da melhor forma possível, e que mediante preço razoável lhes proporcionem condições de desfrutar do merecido lazer259, mesmo que para isso, tenham que procurar uma propriedade conjugada com outros, o que os possibilita a cada ano usufruírem o imóvel para o seu descanso, sem terem que suportar os gastos normais decorrentes de um imóvel próprio, como manutenção e pagamento de impostos. Não conflitando o conceito da multipropriedade com o do condomínio tradicional, pois a ela é inserido as conotações de direito absoluto, ilimitado, exclusivo, perpétuo, como suas características definidoras260, podendo, todos os multiproprietários utilizarem de forma idêntica a propriedade, respeitando-se o estipulado em contrato a respeito de seu uso quanto ao tempo de seu exercício, que será fracionado, chegando-se a cota-parte ideal de cada um. Consistindo a cota-parte de cada condômino em um espaço de tempo em que cada multiproprietário poderá exercer os direitos inerentes a propriedade, considerando apenas o limite quanto ao tempo reservado, verificando-se que a distinção desta nova forma de propriedade, em relação as condominiais, está em expressar um direito cujo exercício é temporário e cuja duração é perpétua261, assim, enquanto no condomínio especial o elemento aferidor é a cota ideal no terreno, na multipropriedade a cota-parte ideal será medida por um período de tempo. Não devendo também a multipropriedade ser confundida com o usufruto, que é um direito de gozo real e vitalício que recaí sobre coisa alheia disciplinado pelo art. 1.390 a 1.411 do Código Civil, e que pode recair sobre um ou mais bens, móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte, os frutos e utilidades, tendo o usufrutuário direito à posse, uso e percepção dos frutos262; não sendo, portanto, o usufrutuário proprietário da coisa, como sucede na multipropriedade, em que ocorre fracionamento da coisa em cotas-parte do tempo de exercício, podendo o titular exercer todos os poderes inerentes ao direito 259 260 261 262 SOUZA, 1991, p. 160. BITTAR, 1991, p. 67. SOUZA, op. cit., p. 162, nota 259. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 247. 65 de propriedade, parecer este dado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), na Apelação Cível nº 70002204675, nos seguintes termos: APELAÇÃO CÍVEL Nº 70002204675 RELATOR: LUIZ AUGUSTO COELHO BRAGA APELANTE: ESPÓLIO DE MÁRIO GUSTAVO DREYER APELADA: EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS GAROPABA LTDA EMENTA: Apelação Cível. Rescisão de contrato com devolução de parcelas por ser ilegal o objeto do mesmo por se tratar de usufruto vitalício e por ser o objeto de entrega impossível, face a contratação de dias maiores que o existente em um ano. Afastadas as ilegalidades, pois apesar do “nomen júris” estar equivocado, tratar-se de contrato de multipropriedade, comumente chamado de “time sharing”. Apelo Negado. 263 Data de julgamento: 19/08/2003 . Assim, a multipropriedade tem como caráter essencial à periodicidade no aproveitamento ou no exercício das faculdades dominiais, pois, através da multipropriedade imobiliária, diversos proprietários repartem o aproveitamento econômico de certo imóvel em turnos intercorrentes, normalmente semanais, anuais, destinando-os discriminadamente a cada um dos titulares, com exclusividade e em caráter perpétuo, de tal sorte que cada multiproprietário corresponda o direito de aproveitamento econômico de uma fração espaço-temporal, incidente sobre determinada unidade 264 imobiliária em período certo do ano, sem o concurso dos detentores . Assim, o direito de propriedade na multipropriedade pode está com uma única pessoa ou com várias, recaindo o mesmo sobre o prédio horizontal ou não, desde que a sua utilização permaneça delimitada ao tempo, havendo unidade de objeto e identidade quantitativa de cada titularidade, cujos direitos recaem sobre a totalidade do objeto. Fazendo-se necessário, portanto, que antes de qualquer regulamentação a respeito da multipropriedade, que se delimite o seu posicionamento no direito, inserindo-a como uma relação obrigacional ou real, devendo ela, enquanto isso, ser regulamentada pela Lei 6.766/79 e as normas do Código Civil pertinentes ao condomínio comum, principalmente no que concerne às regras de convivência, tentando-se dentro do possível, manter a segurança jurídica dos adquirentes, sendo para isso primordial a atuação dos notários ao efetuar o seu registro. 263 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Rescisão de contrato com devolução de parcelas por ser ilegal o objeto do mesmo, por se tratar de usufruto vitalício e por ser objeto de entrega impossível face a existência de dias maiores que o existente em um ano. Apelação Cível/RS. Espólio de Mário Gustavo Dreyer e Empreendimentos imobiliários garopaba Ltda. Relator: Desembargador Luiz Augusto Coelho Braga, Décima Nona Câmara Cível. Diário de justiça, Rio Grande do Sul, 19 ago 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. 264 TEPPEDINO, 1993, p. 3. 66 1.2.4 Limitação e restrição ao direito de propriedade Os limites e restrições ao direito de propriedade são formas de intervenções do Estado na propriedade, considerando-se como tal, toda e qualquer atividade estatal que amparada por lei, tenha por fim ajustá-la aos inúmeros fatores exigidos pela função social a que está condicionada265, intervenções estas em que se impõem deveres aos titulares de direitos reais e se cominam sanções pelo não cumprimento266, utilizadas em meados do século XX por vigorar a doutrina do Estado-bem-estar, em que toda propriedade deve cumprir com o conteúdo de sua função social, enquanto que no Século XIX vigorava a doutrina do ao laissez faire, que assegurava ampla liberdade ao proprietário, considerando os seus direitos intangíveis267, cooperando para o aumento das desigualdades sociais de sua época. Posicionando-se, portanto, o Estado contemporâneo de forma a assegurar a prestação dos serviços fundamentais, procurando proteger a sociedade vista como um todo e não mais como um somatório de individualidades268, considerando a supremacia do interesse público sobre o particular, visando ao atendimento de situações de interesse da coletividade. Podendo a intervenção estatal assumir a forma restritiva, cujas modalidades são o tombamento, a ocupação temporária, a requisição, a servidão administrativa e a limitação administrativa, ou supressiva, que tem por modalidade a desapropriação, que é um instituto jurídico assegurado pela Constituição Federal, em seu capitulo III, que trata da política agrícola e fundiária e da reforma agrária, do título VIII, que trata da Ordem Econômica e Financeira, principalmente em seus arts. 184 e 185269, e ainda, no § 3º do art. 1.228 do Código Civil270, visando ela a entrega real das garantias sociais, que refulgem ao interesse exclusivamente estatal, integrando o interesse público ao possibilitar condições mínimas de convivência, quer nas cidades quer no ambiente rural271. 265 CARVALHO FILHO, José dos S. Manual de direito administrativo. 10. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 599. 266 ASCENSÃO, José de O. Direito reais. 5. ed. Coimbra: Coimbra, 1993. p. 202. 267 CARVALHO FILHO, op. cit., p. 597, nota 265. 268 Ibid., 598. 269 BULOS, 2003, p. 1.247-1.260 passim. 270 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 220. 271 FACHIN, 2003, p. 61. 67 Podendo, desta forma, o proprietário ser privado da propriedade, com aval constitucional, em caso de necessidade, quando a Administração Pública defrontase com situações de emergência que para serem resolvidas satisfatoriamente exigem a transferência urgente de bens de terceiros para o seu domínio e uso imediato; em caso de utilidade pública, quando a transferência de bens de terceiros a Administração é conveniente, embora não seja imprescindível; ou em caso de interesse social, quando as circunstâncias impõem à distribuição ou o condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividade em benefício da coletividade ou de categorias sociais merecedoras de amparo específico do Poder Público272, não podendo ser vistas estas medidas como interesse da Administração, mas sim, da coletividade administrada, mesmo que os bens desapropriados por interesse sociais se destinem normalmente a particulares que irão explorá-los segundo as exigências da coletividade, embora em atividade de iniciativa privada, ou usá-los na solução de problemas sociais de habitação, trabalho e outros mais273. Ocorrendo, ainda, a privação da propriedade, conforme o § 4º do art. 1.228 do Código Civil, se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo Juiz de interesse social e econômico relevante, fixando o juiz uma justa indenização ao proprietário274, que deve cobrir não só o valor real e atual dos bens expropriados, à data do pagamento, como também, os danos emergentes e os lucros cessantes do proprietário, decorrentes do despojamento do seu patrimônio275, valendo a sentença do Juiz como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores, após pagarem a indenização determinada. Contudo, das formas de intervenção do Estado na propriedade, deve ser enfocada a restritiva que condiciona o uso da propriedade, sem, no entanto, retirá-la do seu dono, que deve subordinar-se a imposição emanada pelo Poder Público276, e de 272 273 274 275 276 MELLO, 2004, p. 584. Ibid., p. 583. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 220. MELLO, op. cit., p. 592, nota 272. CARVALHO FILHO, 2003, p. 603. 68 suas modalidades deve-se enfocar as limitações administrativas que são imposições gerais, gratuitas, unilaterais e de ordem púbica condicionadora do exercício de direitos ou atividades particulares às exigências do bem-estar social277, que ocorre de forma positiva, em que a administração impõe ao proprietário uma obrigação de fazer, de forma negativa, em que se impõem ao proprietário uma obrigação de não fazer, em que deve abster-se do que lhe foi vedado por lei, e da forma permissiva, ficando o proprietário obrigado a permitir que algo seja realizado em sua propriedade. Tendo todas elas o intuito de fazer com que a propriedade atenda a sua função social, pois, mesmo que estas limitações possam atingir quaisquer direitos ou atividades, incidem preferencialmente sobre a propriedade imóvel para condicionar seu uso ao bem-estar da coletividade278, havendo uma maior incidência de restrições à propriedade privada, o que faz com que haja um dilema entre o Estado e o particular, pois as intervenções estatais incidem diretamente sobre o direito de propriedade. Tendo sido estas limitações previstas pelo Código Civil de 1916 e corroboradas pela Constituição Federal de 1988, que mesmo instituindo o direito de propriedade como um direito individual, condicionou-o ao exercício da função social em seu art. 5º, XXII e XXIII279, visando o bem-estar da comunidade. Posicionamento também adotado pelo atual Código Civil, que diferentemente do anterior, institui o direito de propriedade como uma faculdade e não mais como um direito absoluto, determinando limitações a este direito em seu art. 1.228, que em seu § 1º, determina que ele deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados de conformidade com o estabelecido em lei especial, à flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas280; ocorrendo estas limitações, tanto por interesse público ou utilidade pública, quanto por interesse privado ou utilidade privada281. 277 278 279 280 281 MELLO, 2004, p. 607. Ibid., p. 609. BULOS, 2003, p. 187-194 passim. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 220. ASCENSÃO, 1993, p. 207. 69 E para que a propriedade seja utilizada conforme a norma constitucional, o Estado pode utilizar-se de outros instrumentos a sua disposição para compelir o proprietário a cumprir com o seu dever, como a utilização do imposto progressivo, intervindo, desta forma, na propriedade privada e na ordem econômica através de atos de império tendentes a satisfazer as exigências coletivas e a reprimir a conduta antisocial da iniciativa particular282. Podendo, ainda, serem citadas várias limitações e restrições da propriedade, tais como, as da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, Lei do Inquilinato, que em seu art. 51, veda nos contratos de aluguel para fins comerciais à retomada do imóvel antes do prazo legal, e mesmo finda este, pois, o locatário nos contratos celebrados por escrito e com prazo determinado, cujo prazo mínimo ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos sejam de cinco anos e com exploração do comércio no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos, tem o direito de renová-lo, por igual prazo, salvo na ocorrência das hipóteses previstas no art. 52283, bem como a as limitações urbanísticas relativas à altura das edificações e das formalidades para se construir, que devem obedecer a certos critérios que não comprometam a segurança, independência ou tranqüilidade do prédio vizinho284, como é o caso dos proprietários vizinhos a aeródromos que estão sujeitos a limitações relativas a edificações, instalações ou culturas agrícolas, que possam embaraçar o pouso ou a decolagem de aeronaves285. Há, portanto, vários tipos de limitações, sendo elas impostas ao proprietário em função do bem-estar coletivo por determinação legal, visando assegurar a coexistência pacífica dos indivíduos numa comunidade286. Mas, mesmo com todas as limitações e restrições impostas à propriedade, presume ser o direito do proprietário, ainda, pleno e exclusivo, até prova em contrário, de acordo com o art. 1.231 do Código Civil287. Continuando o Estado a assegurar o direito de propriedade criando mecanismos que permitam ao proprietário manter sua posição, contudo, 282 MELLO, 2004, p. 571. BRASIL. Código Civil, 20003, p. 839-840. 284 JUNQUEIRA, 1997, p. 61. 285 CAMPOS, Jr. Aluísio Santiago. Direito de propriedade: aspectos didáticos, doutrina e jurisprudência. Belo Horizonte: Inédita, 1997. p. 22. 286 JUNQUEIRA, 1997, p. 61. 287 BRASIL. Código Civil, op. cit., p. 220, nota 283. 283 70 limitando-o a atender a função social da propriedade como forma encontrada para delinear a propriedade em obediência ao princípio da prevalência do interesse público sobre o interesse particular288. Assim, faz-se necessário à intercalação entre o interesse privado e coletivo, não sendo, com isso, permitido pelo § 2º do art. 1.288 do Código Civil, que o proprietário cometa atos na propriedade que não lhe tragam qualquer comodidade ou utilidade, e que sejam animados pela intenção de prejudicar outra pessoa289, pois o proprietário é responsável pelas atividades da esfera de seu direito, bem como pelos atos que se propagam para outros objetos de apropriação290, sendo-lhe vedado o mau uso da propriedade, considerando-se como tal todo o ato que excede a esfera de direitos do possuidor ou proprietário, vindo a prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos habitantes vizinhos291. Constatando-se, portanto, que os limites jurídicos expressam-se na fronteira entre o privado e o público, ficando claro que, independente de quem realmente interessa a limitação da propriedade imposta, haverá sempre um interesse público a justificar a intervenção da lei. Podendo este interesse público ser considerado em si ou através da mediação de um beneficiário particular292, pois, independente de quem for, sempre ocorre que o cidadão ao proteger a propriedade e utilizá-la, busca impor a suas necessidades e pretensões diante da ordem pública que com seu poder de polícia, instrumento pelo qual o Estado assegura o bem-estar da coletividade293, e a legislação competente, deixa claro que seu interesse é prioritário e deverá ser respeitado, sob as penas da lei294; contudo, ele não tem como garantir de forma exaustiva de que os bens serão explorados no interesse da coletividade, pois existem certas categorias de bens em que a modelagem das intervenções tendentes a assegurar o preenchimento da função social se revela praticamente impossível295. 288 289 290 291 292 293 294 295 VARELLA, 1998, p. 217. BRASIL. Código Civil, op. cit., p. 203, nota 287. FACHIN, 2003, p. 05. Ibid., p. 02. ASCENSÃO, 1993, p. 208. PIETRO, Maria S. Z. di. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.120. LEAL, 2003, p. 147. ASCENSÃO, op. cit., p. 203, nota 292. 71 1.2.4.1 Função social da propriedade A partir do momento em que o ordenamento jurídico reconheceu que o exercício dos poderes do proprietário não deveria ser protegido tão somente para satisfação do seu interesse, a função social da propriedade tornou-se social296, relacionando-se com o uso da propriedade, alterando, por conseguinte, alguns aspectos pertinentes à exteriorização de seu exercício, apreendendo-se por uso o modo como são exercitadas as faculdades ou os poderes inerentes ao direito de propriedade297. Formando atualmente as restrições e limitações formais impostas à propriedade o conteúdo de sua função social, que foi regulamentado pelo Estatuto da Cidade, que corroborou com a Constituição Federal, determinando sanções as quais os proprietários passaram a ficar sujeitos, caso não atendam ao conteúdo da função social da propriedade, que no caso da propriedade urbana está definida no § 1º da CF/88, vinculado ao plano diretor aprovado pela Câmara Municipal, por ser ele o instrumento pelo qual os Municípios definem os objetivos a serem atingidos, assim como as regras básicas, as diretrizes, as normas do desenvolvimento urbano298, obrigatório paras as cidades acima de 20.000 habitantes. E quanto à propriedade rural, o art. 186, I, da CF/88, fornece o seu conteúdo impondo o aproveitamento racional e adequado do imóvel299, com isso, os proprietários são obrigados a utilizarem a propriedade de forma que atenda a sua função social, não deixando que a mesma venha a ser considerada subutilizada, conforme a definição do § 1º, do art. 5ª, da Lei 10.257/01, ou caso isso ocorra, deixar de atender as determinações da municipalidade para resolver o problema dentro do prazo legal previsto no § 4º, desta Lei300, podendo neste caso o Poder Público Municipal impor as sanções previstas no § 4º, I, II e III, do art. 182 da CF/88.301 296 GOMES, 2001, p. 107. FACHIN, Luiz E. A função social da propriedade contemporânea (uma perspectiva da usucapião imobiliária rural). Porto Alegre: Fabris, 1998. p. 17. 298 BASTOS, 2001, p. 477. 299 Ibid., p. 219. 300 SANTOS, 2004, 70-71. 301 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.242-1.243. 297 72 Contudo, não é próprio falar de função social como sinônimo de limites para a atuação proprietária, pois isso seria o mesmo que se admitir que a noção de função social da propriedade teria cunho meramente negativo302, tendo em vista que, ela somente corresponde a limitações, em sentido largo, impostas ao conteúdo do direito de propriedade303, tanto que somente ela foi assegurada pela Constituição Federal como um direito fundamental, anunciando-a como um princípio da ordem econômica, portanto, como uma obrigatoriedade e não como uma opção do proprietário. Devendo estas intervenções do Estado na propriedade em nome da função social serem prudentes, prevendo casos em que os titulares se desviem flagrantemente das necessidades gerais, ou em que estas se apresentem de modo premente304, pois a função social da propriedade somente é atingida mediante exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores, sendo o núcleo fundamental do seu conceito dado pela sua eficácia atual quanto à geração de riqueza305, tendo em vista que, Neste caso, a riqueza social aumenta, a distribuição da riqueza se faz mais justamente, na medida em que, visando ao bem de todos, o interesse protegido do dominus (grifo do autor) definha diante do interesse subordinado (grifo do autor) da comunidade. [...] O direito de propriedade [...] não chega a desaparecer – por força dessa razão o regime político persiste capitalista – mas, em nome de uma distribuição mais equânime da riqueza social, a soma de poderes remanescentes na titularidade dominial constitui um mínimo essencial. A senhoria se comprime, o conteúdo mesmo da propriedade perde em extensão e faculdade por isso que assim 306 determina a justiça social, pela vontade de todos . E, se antes a propriedade tinha um sentido nitidamente individual, exclusivo, hoje, ela tem um sentido social307, justificando-se a sua função social pelos seus fins, seus serviços308, podendo sua função social ser estudada relacionando o fim que se pretende dar a propriedade, como, as que têm fins culturais, de segurança e defesa 302 MATTOS, 2003, p. 49. FACHIN, 1998, p. 19. 304 ASCENSÃO, 1993, p. 201. 305 BASTOS, 2001, p. 220. 306 LIRA, 1997, p. 313. 307 CRETELLA Jr, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Forense universitária, 1997. v. 1. p. 86. 308 GRAUS, Eros R. A ordem econômica na Constituição de 1998 (Interpretação e crítica). 6. ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 268. 303 73 nacionais, de ordenamento do território e de ambiente, de circulação, de saúde e higiene, fiscais e econômicos, entre outros. Destarte, o principio da função social da propriedade é tão extenso e relevante, que se irradia por todo o campo de incidência das normas urbanísticas, que podemos afirmar, com segurança, ser este um dos princípios fundamentais, típico de Direito Urbanístico, verdadeira diretriz a nortear toda a ordenação do território309, que privilegia atualmente o interesse social sobre o interesse individual, havendo uma socialização da propriedade, que pode ser reivindicada ou desapropriada. Contudo, estas possibilidades de intervenção estatal, somente poderão ocorrer quando o proprietário negligenciar o bem que lhe pertence, abandonando-o e não o aproveitando, mantendo-o improdutivo e inexplorado, ou explorando-o abaixo das suas possibilidades, pois a função social da propriedade relaciona-se com o seu uso, que deve estar em consonância com o estipulado em lei, já que as intervenções Estatais na propriedade somente terão validade àquelas fundadas na própria Constituição Federal, não podendo a lei colocar fora do domínio apropriável pelos particulares certos tipos ou classes de bens, o que só é dado a Constituição fazer310, sendo ela, portanto, um conjunto de normas da Constituição Federal que, visa, por vezes até com medidas de grande gravidade jurídica, a recolocar a propriedade na sua trilha normal311. Assim, no caso da propriedade urbana, a sua função social está vinculada a Lei 10.297/01, que regulamentou os arts. 182 e 183 da CF/88, estabelecendo normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental312. Podendo o Poder Público impor aos proprietários em caso de desrespeito as normas disciplinadas na Constituição Federal e na Lei, quanto à função social da propriedade, o parcelamento ou edificação compulsória, depois de devidamente, notificado o proprietário e expirado o prazo imposto no § 4º, do art. 5º, 309 COSTA, 1991, p. 121. BASTOS, 2001, p. 216. 311 BASTOS, Celso R. Comentários à Constituição do Brasil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 2. p. 136. 312 MELLO, 2004, p. 572. 310 74 do Estatuto da Cidade; a desapropriação em caso de uso inadequado da propriedade, com pagamento mediante títulos da dívida pública; o imposto progressivo no tempo, que somente pode ser utilizado para assegurar o cumprimento da função social da propriedade313, posicionamento este reiterado pelo STF, conforme julgado do dia 28 de outubro de 2003, emitido pela Primeira Turma, nos seguintes termos: EMBARGO DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 456.513-6 SP RELATOR: MINISTRO SEPÚLVEDA PERTENCE EMBARGANTE (S): MUNICÍPIO DE DIADEMA ADVOGADO (A / S): SILVIA PEREIRA BUENO FORMICOLA E OUTRA EMBARGADO (A / S): ÀLUSUISSE LONZA DO BRASIL LTDA ADVOGADO (A / S): LÊDO CORRAL E OUTRO (A/S) EMENTA: IPTU: progressividade. 1. O STF firmou o entendimento – a partir do julgamento do RE 153.771, Pleno, 20.11.96, Moreira Alves – de que a única hipótese na qual a Constituição admite a progressividade das alíquotas de IPTU é a do art. 182, § 4º, II, destinada a assegurar o cumprimento da função social 314 da propriedade urbana . Cumprindo a propriedade urbana a função social pela sua utilização econômica plena, o que pode ocorrer com edificação ou mesmo sem315; não bastando para que a propriedade urbana cumpra a sua função social que haja a edificação e sim que ela cumpra com todas às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no plano diretor, conforme estipulado no § 2º do art. 182 da CF/88316, estando assim, a função social da propriedade urbana diretamente relacionada com a função social da cidade, que é um tema, pródigo em fornecer subsídios propiciadores de uma nova realidade social, condizente com os princípios norteadores de um Estado Democrático de Direito, pois inegável que a escassez de recursos públicos destinados às cidades ao longo de décadas vem acumulando um brutal déficit na oferta de infra-estrutura e de serviços urbanos. [...] é preciso, portanto, que se perquira uma maior atenção destas questões por parte dos órgãos governamentais, e mesmo da sociedade civil, no sentido de se revisarem as políticas públicas destinadas à cidade, a fim que sejam propiciadas 317 condições de vida digna a todos os cidadãos . 313 SANTOS, 2004, p. 13. BRASIL, Supremo Tribunal Federal. IPTU: progressividade. Embargo de declaração no agravo de instrumento/SP. Município de Diadema e Àlusuisse Lonza do Brasil Ltda. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma. Diário Oficial da União. Brasília, 28 out 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 315 BASTOS, 2001, p. 219. 316 BULOS, 2003, p. 1.241. 317 LEAL, 2003, p. 144. 314 75 Podendo o princípio da função social da propriedade, ser um poderoso instrumento dos Municípios para promoção do desenvolvimento urbano, utilizado-a para evitar a ocupação de áreas não suficientemente equipadas, evitando a retenção especulativa de imóveis vagos ou subutilizados; preservar o patrimônio cultural ou ambiental; exigir a urbanização ou ocupação compulsória de imóveis ociosos, para captar recursos financeiros destinados ao desenvolvimento urbano, entre tantas outras formas de utilização, contudo, os Municípios que pretendam utilizá-la, sob qualquer pretexto, precisam ter um plano diretor aprovado por lei municipal que configure a função social da propriedade urbana em sua localidade. Quanto à propriedade rural, sua função social é bem diversa da propriedade urbana, mas, semelhantemente a ela pode ser desapropriada por não cumprir as suas funções sociais, estando ela diretamente relacionada ao aproveitamento racional e adequado do imóvel, de forma que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores, devendo estes requisitos serem atendidos de forma simultânea, de maneira que traga o desenvolvimento do homem, frente à preservação natural, com boas relações de trabalho, enfim, buscando a vinculação da propriedade aos interesses sociais318. Não estando as propriedades com mais de seiscentos módulos rurais onde não se pratiquem relevantes atividades agrícolas, projetos de desenvolvimento, geração de emprego, conservação florestal, cumprindo com a sua função social, caso em que não se deveria garanti-la aos seus proprietários, haja vista que, o caráter limitador da propriedade, previsto pelo art. 5º, XXIII, da CF/88, inibe a ponto de anulá-la319, não sendo permitindo que o direito de propriedade privado assegurado e estimulado pela Constituição se efetive ao arrepio da função social, que lhe é inerente320. Tendo todo o proprietário de terra a obrigação de fazer com que a mesma alcance os seus fins sociais, pois recai sobre ele todos os deveres sociais a ela imposta, como a responsabilidade de fazê-la produtiva, zelando pelo bem-estar da daqueles que dependem dela para trabalhar, devendo fazer a terra produzir como mãe 318 319 320 VARELLA, 1998, p. 21. Ibid., p. 224. BORGES, 1998, p. 06. 76 dadivosa e fértil, mas sem a exaurir, sem a esgotar, porque as gerações futuras também querem tê-la produtiva321. Com isso, o poder absoluto de usar, gozar e dispor da propriedade como bem aprouvesse dado ao proprietário no Estado Democrático de Direito, já não vigora, tendo o proprietário perdido este poder pela limitação imposta atualmente a propriedade, estando ela adstrita ao cumprimento de sua função social, ocorrendo, desta forma, abuso em sua utilização sempre que houver o desvio de sua função e o seu não atendimento. Devendo a intervenção do Poder Público na propriedade, mesmo na fiscalização de sua função social, estar adstrita aos limites impostos pela norma Constitucional, não sendo igualitário entre as entidades estatais o seu poder de atuação nesta intervenção, regulando materialmente o Poder Federal o direito de propriedade e dispondo sobre a intervenção no domínio econômico322, enquanto que o Poder Estadual e Municipal apenas exercem o policiamento administrativo do uso da propriedade e da atividade econômica dos particulares, segundo as normas substantivas editadas pela União323. Não se confundindo o poder de intervenção estatal na propriedade com a regulamentação a respeito do Direito Urbanístico, em que os entes estatais têm competência concorrente para legislar a respeito, mesmo que nem todos possuam competência para disciplinar sobre o conteúdo, processo de elaboração e implementação do Plano Diretor324, constituindo ele para todos, elemento fundamental para se pensar e realizar a idéia de função social da cidade, e mesmo da propriedade, uma vez que é atribuída a ele a implementação das políticas públicas determinantes dos rumos a serem tomados por cada cidade, de acordo com seus interesses e necessidades 325 especificas . Os Municípios para legislarem sobre matéria urbanística devem observar as normas estaduais, gerais ou específicas, desde que estejam em consonância com a Constituição Federal326, e conseqüentemente com as normas federais, como é o 321 322 323 324 325 326 BORGES, 1998, p. 08. MELLO, 2004, p. 574-575 passim. Ibid., p. 575. LEAL, 2003, p. 157. Ibid., p. 168. LEAL, loc, cit. 77 caso do Estatuto da Cidade, que fez com que a função social da propriedade deixasse de ser tão somente um princípio constitucional para transformar-se em uma norma jurídica ordinária327. Podendo o Poder Público utilizar o seu poder de polícia para fazer com que realmente a propriedade, tanto a urbana quanto a rural, cumpra com a sua função social, evitando-se com isso, que ocorra a proliferação de favelas e a conseqüente construção de casebres e ruelas, que sem sombra de dúvida fogem das normas de urbanização determinada em qualquer plano diretor urbano implantado pelos Municípios, isso se as mesmas também não forem construídas em loteamentos que estão em dissonância com a legislação especifica. Evitando-se o Poder Público com uma atitude assertiva, que a sociedade se sinta desprotegida e marginalizada e decida resolver por si só, parte dos problemas decorrentes da propriedade, principalmente, se este problema estiver relacionado ao não atendimento de sua função social, tomando providencias que acham justas e que em sua maioria serão feitas por mecanismos antijurídicos, como os efetuados pelo movimento dos sem terra e pelo movimento dos sem teto, em que há uma inversão de valores, onde o principio da função social é deturpado e utilizado de forma indevida, por não verem ou sentirem que o Poder Público esteja providenciando meios para a solução dos conflitos inerentes ao assunto. 1.2.5 O registro da propriedade imóvel 1.2.5.1 Evolução O primeiro instituto brasileiro que se referiu a alguma forma de Registro Público foi a Lei Orçamentária nº 317, de 21 de outubro de 1843, regulamentada pelo Decreto nº 482, de 14 de novembro de 1846, que criou o primeiro Registro Geral de Hipoteca 327 MATTOS, 2003, p. 91. 78 que não visava resguardar o domínio privado, e sim, o crédito328. Tendo o domínio privado das terras e a sua separação do domínio público sido discutido, primeiramente, pelo chamado registro do vigário ou paroquial, inserido no art. 13 da Lei 601/50, Lei das Terras, regulamentado pelo Decreto nº 1.318/54, não conferindo ele publicidade nas transações dos imóveis e não contendo eficácia constitutiva329, que somente veio a ocorrer no Sistema do Registro de Imóveis implantado no Brasil pela Lei nº 1.237/64, Lei Hipotecária, que criou o Registro Geral, elaborada com o fito de atender a uma necessidade do mercado financeiro emergente330, visando a total publicidade das hipotecas e concessão de uma maior segurança aos negócios imobiliários, considerando a transcrição como modo de transferência do domínio e ordenando a escrituração, em seus livros, de todos os direitos imobiliários331. Limitando-se o Registro de Imóveis no Brasil até então a ser mero instrumento de publicidade de transmissão imobiliária inter vivos, que se tornou obrigatória, já que no instituto anterior em vigor, que eram as Ordenações Filipinas, a transmissão dos direitos reais sobre imóveis era irregistrável332, contudo, ela não incorporou integralmente o princípio da publicidade, pois somente com a Lei nº 3.272, de 5 de outubro de 1885, a inscrição de todas as hipotecas legais tornou-se obrigatória333, porém, sem atender ao princípio da especialização334, que somente ocorreu com o advento do Decreto nº 169-A, de 19 de janeiro de 1890. Com as várias transformações e evoluções no Registro de Imóveis ocorridas, o registro passou a ser dirigido à própria eficácia constitutiva de direitos reais e a transmissão da propriedade imóvel por ato inter vivos, as quais culminaram no atual sistema registrário, instituído inicialmente com a promulgação do Código Civil de 1916, que pelo disposto em seu art. 530, I, a aquisição da propriedade imóvel 328 BRASIL. Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843. Fixando a despesa e orçando a receita para os exercícios de 1843-1844 – 1845. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 de dez 1843. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 15/01/2006. 329 NASCIMENTO, 1985, p. 98. 330 BRASIL. Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864. Reforma legislativa hypothecaria, e estabelece as base da sociedade de crédito real. Coleção das Leis Império do Brasil, 24 set. 1864. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 19 de abr de 2005. 331 DINIZ, 2004, p. 18. 332 NASCIMENTO, 1985, p. 97. 333 BRASIL. Lei nº 3.272, de 05 de outubro de 1885. Altera diversas disposições referentes às execuções civis e comerciais. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1885. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. 334 DINIZ, op. cit., p. 19, nota 331. 79 passou a se concretizar somente no momento em que o título aquisitivo fosse registrado em nome do adquirente junto ao Cartório de Registro de Imóveis335, fortalecendo ele o sistema de Registro Público ao introduzir a transcrição como forma de aquisição da propriedade imobiliária, permanecendo esta determinação no art. 1.227 do Código Civil de 2002336, e vigorando até hoje o sistema de Registro de Imóveis, regulado pela Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, alterada pela Lei nº 6.216, de 30 de junho de 1975, e mais recentemente pela Lei 10.931/04, que dispõe sobre os Registros Públicos no Brasil, pois o Código Civil apenas traça delineamentos gerais do registro imobiliário337. E a partir da vigência da Lei nº 6.015/76, foi introduzida no sistema a figura da matrícula e inserido nela toda a vida jurídica do bem338, em substituição ao antigo sistema da transcrição dos títulos. Assim, com esta legislação, todos os atos de registro referente a imóveis, passaram a ser lançado na matrícula específica de cada um, visando permanecer indefinidamente, enquanto não desintegrado o imóvel matriculado em virtude de desmembramentos ou alienações parciais, passando ele a ser individualizado e caracterizado através do novo instituto. 1.2.5.2 Conceito Com as transformações ocorridas no conceito da propriedade imobiliária, em que a princípio era considerada como patrimônio de toda a humanidade, não sendo vendida e nem comprada, tendo a mesma ficado escassa para o número de pessoas interessadas, passou a não mais ser conveniente àquele que estava na terra abandoná-la para encontrar novas pastagens, pois a terra que dantes era considerado como seu titular quem a detinha de forma pacífica e com testemunho de vizinho339, passou com o aumento das legislações a ter a necessidade de ser inscrita nos registros públicos, com o intuito de verificar quem era o dono de uma terra, que 335 336 337 338 339 BRASIL. Código Civil, 2001, p. 149. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 219. VENOSA, 2004, p. 199. Ibid., p. 219 MILPACHER, 1998, p. 31. 80 passou a ser determinado não mais olhando quem nela vivia e a cultivava, mas qual nome estava escrito nos livros340. Assim, o registro de forma ampla visa dar ao fato maior publicidade e conferir disponibilidade ao interessado341 das informações arquivadas, podendo ser obrigatório ou facultativo, derivando o registro obrigatório da própria lei, como ocorre com a aquisição de direito reais sobre imóveis constituídos ou transmitidos por ato entre vivos, que por determinação do art. 1.227 do Código Civil, necessita do registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos, para que a mesma tenha eficácia342, com o fito de dar publicidade ao título; ao passo que o registro facultativo depende somente do próprio interessado, como é o caso da hipoteca prevista no art. 127, VII, da Lei nº 6.015/73, que forma direito pessoal e de crédito, comprovando-se a realização de um negócio jurídico, e juridicamente os efeitos obrigacionais que gerais, independente de registro343. Objetivando o registro o efeito de conservação, tendo em vista que, em nosso ordenamento jurídico atual o Registro Público tem efeitos ora simplesmente conservatórios, ora meramente objetivando a publicidade e, às vezes, com o amplo efeito constitutivo344, desempenhando ele várias funções, e entre elas o Registro Imobiliário destinado ao assentamento de bens imóveis, que serve conforme os arts. 1º e 172 da Lei n. 6.015/73, como garantia de autenticidade, segurança e eficácia dos assentos de atos jurídicos inter vivos ou causa mortis, constitutivos, declaratórios, translativos e extintivos de direitos reais sobre imóveis, preservandolhes a confiabilidade345. Constituindo o registro no repositório de informações, contendo todos os dados alusivos à propriedade imobiliária, por acompanhar a vida dos direitos reais sobre bens de raiz, especificando o imóvel registrado e os demais direitos reais que sobre eles recaírem346, formando-se por diversos princípios que garantem a sua eficácia e 340 341 342 343 344 345 346 MILPACHER, 1998, p. 45. NASCIMENTO, 1985, p. 97. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 219. NASCIMENTO, op.cit., p. 95, nota 341. Idem. DINIZ, 2004, p. 23. Ibid., 24. 81 proporcionam a aqueles que o buscam, uma maior segurança aos negócios imobiliários. Incluindo-se nos atos de registro, também a inscrição, transcrição, arquivamento e averbação, denominando o termo registro também a própria instituição dos Registros Públicos ou serviços destinados à autenticação, publicidade e perpetuidade de atos jurídicos e documentos. E, visto como o poder legal de agentes do ofício público para efetuar todas as operações relativas a bens imóveis e a direitos a eles condizentes, assegurando aos requerentes a aquisição e exercício do direito de propriedade e a constituição de ônus reais347. Mas, mesmo que em nosso sistema registrário, o registro seja revestido de relativa presunção, o registro de imóveis faz prova do direito inscrito e de sua titularidade, assim, para provar em juízo o direito real, ao titular inscrito nele, basta à mera apresentação da certidão do registro, mesmo que o registro de imóveis não ofereça ao adquirente uma garantia plena, pois, admite-se contestação, cabendo a quem contesta o ônus da prova, pois, ele é considerado um dos fatos geradores da constituição do direito348, tendo como efeito básico o constitutivo de direitos, que fundamenta o disposto no Código Civil em seu art. 1.227, e anteriormente, pelo art. 530, I, do Código Civil de 1916, estabelecendo a transcrição de título de transferência no registro imobiliário competente, como um dos meios aquisitivos da propriedade imóvel, hoje tão somente denominada de registro, declarando o art. 1.245 do Código Civil, que a propriedade transfere-se entre vivos mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis349. Devendo-se observar a ligação estabelecida pelo legislador entre título e registro, reforçando-se, assim, a tese de que a alienação é um ato complexo, que se inicia com a lavratura do título e se encerra com o registro, ficando claro que o título sem registro gera apenas obrigação pessoal, não se opondo a terceiros; pois o § 1º do art. 1.245 do Código Civil, afirma que o alienante, enquanto não for feito o registro do título, continua a ser visto como dono do imóvel, e o § 2º esclarece que enquanto não cancelado o registro, o adquirente continua a ser havido como seu dono350, em consonância com o estabelecido no art. 252 da Lei 6.015/73, segundo o qual, o 347 348 349 350 DINIZ, 2004, p. 13. NASCIMENTO, 1985, p. 101. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 223. Idem. 82 registro, enquanto não cancelado, produz todos os seus efeitos legais, ainda que, por outra maneira, se prove que o título está com defeito, anulado, extinto ou rescindido351. Portanto, obrigatoriamente devem ser registrados, todos os títulos que versem sobre propriedade imóvel, como o caso da compra e venda, troca, dação em pagamento, doação, existindo nestes casos, antes do registro somente mero direito pessoal, pois no direito brasileiro prevalece o entendimento de que os negócios jurídicos obrigacionais não são hábeis para transferir o domínio de um bem imóvel, porquanto, além do acordo de vontades entre o adquirente e o transmitente, é imprescindível o registro, a transcrição do título de aquisição na matrícula do imóvel junto ao cartório de registro de imóveis competente, conforme circunscrição imobiliária da sua localização352. Sendo, desta forma, o Registro Imobiliário importante não somente pela publicidade, mas também pelo serviço de cadastro da propriedade, especificamente através da matrícula, que contém, além dos dados descritivos do imóvel como a localização, área e metragens, a definição da titularidade do direito de propriedade353. 1.2.5.3 Princípios e funções A eficácia jurídica do registro, principalmente do registro de imóveis, está condicionada a alguns efeitos ou princípios, como o princípio da publicidade que tem especial relevância no âmbito dos direitos reais e das relações jurídicas obrigacionais com eficácia diante de terceiros354. Podendo, pelo art. 17 da Lei 6.015/73, qualquer pessoa requerer Certidão de Registro Imobiliário sem ter que informar o motivo ou o interesse do pedido, pois, os direitos reais somente podem ser exercidos contra todos se ostentados publicamente355. Sem a publicidade não há registro, e sem ela, o direito real não se caracteriza, não há oponibilidade erga 351 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.013. DOMANSKI, Marcelo. Posse: da segurança jurídica a questão social: (na perspectiva dos limites da tutela do promitente comprador através dos embargos de terceiro. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 99. 353 Ibid., p. 94. 354 Ibid., p. 98. 355 DINIZ, 2004, p. 04. 352 83 omnes, há simples direito pessoal que se circunscreve a uma relação obrigacional entre duas pessoas356. Sendo, com isso, curial a participação do Estado por meio do serventuário, que labora tal registro público no Cartório de Registro de Imovéis, que presta um serviço público, por ser o órgão incumbido pelo Estado de acolher, conferir, transferir, transpor para seus livros e guardar declarações e negócios imobiliários, dando-lhes a necessária publicidade, comprovando-os357; pois sem o registro não existe eficácia na transferência de propriedade, tendo em vista que, o objetivo da publicidade registral é não somente atribuir notoriedade ao compromisso, mas principalmente imprimir-lhe eficácia contra terceiros, de modo a se evitarem fraudes358. Vigorando entre nós o princípio da força probante, fundamentada na fé-pública do registro que é levado a efeito por serventuário provido de autoridade legal, gerando presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registro o define359, presumindo-se, portanto, que a propriedade pertence à pessoa em cujo nome se registrou, e por isso, este princípio também é considerado como princípio da presunção; e em decorrência dele, não é acarretado qualquer erro, falha ou deficiência, relacionada ao funcionamento do registro imobiliário, a responsabilidade do poder público. Presunção esta também estabelecida pelos arts. 167 a 276 da Lei nº 6.015/73360, não dando o registro, portanto, a certeza do direito real, e sim, sua presunção e potencialidade de certeza361, permitindo o art. 250, I, desta lei, que o registro seja cancelado por decisão judicial com trânsito em julgado, que tenha a ação provado a irregularidade formal do registro ou a invalidade substancial do título. Considerando-se até então o adquirente como o titular do direito registrado até que o contrário se demonstre, assegurando a fé pública dos direitos registrados perante o Cartório de Registro de Imóveis que a inscrição foi promovida pelo interessado adquirente do direito real, mas não garantindo que o direito ao qual ela se refere 356 357 358 359 360 361 NASCIMENTO, 1985, p. 101. DINIZ, 2004, p. 13. DOMANSKI, 1998, p. 98. ASCENSÃO, 1993, p. 351. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 995-1.015 passim. NASCIMENTO, op. cit., p. 102. 84 pertença efetivamente ao disponente362, fazendo somente prova do direito inscrito e de sua titularidade. Por isso, que basta ao titular inscrito para provar em juízo o direito real, à mera apresentação da certidão do registro, mesmo que o teor do registro efetivado admita a contestação, ficando quem a alega incumbido do ônus da prova. E, pelo princípio da legalidade, verifica-se a legitimidade do direito do proprietário ou titular do direito real, e em decorrência dele, cabe ao oficial do cartório registral, por dever de ofício, examinar a legalidade e a validade dos títulos que lhe são apresentados para registro, nos seus aspectos intrínsecos e extrínsecos, uma vez que o oficial somente pode efetuar o registro quando não encontrar quaisquer irregularidades nos documentos apresentados, não dando acesso aos títulos que não preencherem os requisitos exigidos legalmente363, exarando parecer sobre se o título é registrável ou não. Desta forma, logo que o título seja protocolizado, faz-se a prenotação, ocasião do exame do oficial, se tudo estiver em ordem com o título, ele será registrado, do contrário, caindo, em exigência a ser satisfeita, o oficial fará sua indicação por escrito, tendo o interessado o prazo de trinta dias para a referida regularização, e caso, não concorde com a exigência feita, será o título por seu requerimento e com a declaração de dúvida, que é um pedido de natureza administrativa, formulado pelo oficial a requerimento do apresentante do título imobiliário, como condição do registro pretendido, remetido ao juízo competente para dirimi-la, quando o referido prazo de trinta dias será suspenso até final solução judicial, ouvindo-se Ministério Público e a dúvida julgada por sentença. Se procedente a ação, de acordo com o art. 202 da Lei 6.015/73, juntamente com os arts. 162, § 1º, 499 e 513 do Código de Processo Civil, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado poderão interpor apelação com efeito devolutivo e suspensivo364, caso contrário, não poderá o oficial apelar por falta de legítimo interesse, suscitado-a apenas por dever de ofício, obedecendo aos princípios 362 363 364 DOMANSKI, 1998, p. 102. DINIZ, 2004, p. 28. Idem. 85 norteadores do Registro Público, como dispõe o STJ, no Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, do dia 19 de maio de 2005, julgado pela Terceira Turma nos seguintes termos: RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 9372 / SP RELATOR: MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO RECORRENTE: HAJINE ANTÔNIO SATO E OUTROS ADVOGADO: HEITOR GAYER E OUTRO T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO IMPETRADO: CONSELHO SUPERIOR DE MAGISTRATURA DO ESTADO DE SÃO PAULO EMENTA: Recurso em mandato de segurança. Registro de imóvel. Ação de divisão. Suscitação de dúvida. Cabimento. I. Tendo em vista os princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade que norteiam os registros públicos, assegurando-lhes a confiabilidade dos mesmos, pode o Oficial do Registro suscitar dúvida, 365 independentemente de ser título judicial ou extrajudicial . Ocorrendo o expediente chamado de dúvida inversa quando o próprio interessado peticiona diretamente ao juiz requerendo a instauração de procedimento de dúvida, quando o oficial não atender ao seu pedido, e que embora não previsto na Lei de Registro Público, está sendo admitido pelos juízes em atenção ao princípio de economia processual, conforme posicionamento do STJ, na Apelação Cível, do dia 20 de junho de 2000, julgado pela Décima Nona Câmara Cível, nos seguintes termos: APELAÇÃO CÍVEL Nº 700003296813 / RS RELATOR: DESEMBARGADOR GUINTHER SPODE APELANTE: MUNICÍPIO DE SANTO ANTÔNIO DE PATRULHA ADVOGADO: MARIA DO CARMO PASSOS AZAMBUJA RAMOS APRESENTANTE: EXMA SRA. DRA. JUÍZA DE DIREIDO 1 V DE SANTO ANTÔNIO DE PATRULHA EMENTA: Dúvida inversa. Registros públicos. Legitimidade ativa “ad causam” para o procedimento. Terceiro prejudicado. E do proprietário a legitimidade ativa “ad causam’ para intentar a dúvida inversa. O terceiro prejudicado, para que detenha legitimidade, deve demonstrar o efetivo prejuízo que lhe advirá 366 do deferimento, ou não, do registro . 365 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso em mandado de segurança. Registro de imóvel. Ação de divisão. Suscitação de Dúvida. cabimento. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança Nº 9372/SP. Hajime Sato e outros e Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo. Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, 19/05/2005. Diário Oficial da União. Brasília, p. 285, 13 jun 2005. Disponível em: <htrp://www.stJ.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 366 BRASIL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Dúvida inversa. Registros públicos. Apelação Cível nº 70000329813/RS. Município de Santo Antônio de Patrulha e Exma. Sra. Dra. de Direito 1 V de Santo Antônio de Patrulha. Relator: Desembargador Guinther Spode, Décima Nona Câmara Cível. Diário Oficial da União. Brasília, p. 05, 20 jun 2000. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 86 Estando Inserido em nosso sistema registrário também o princípio da territorialidade, sentido pela exigência do registro ser procedido na circunscrição imobiliária da situação do imóvel, devendo o registro ser feito somente no foro situacional do imóvel, mesmo que a escritura possa ser lavrada no Cartório de Notas de qualquer localidade, facilitando desta forma a pesquisa em torno do imóvel, assim, se o imóvel situar-se em várias comarcas ou circunscrições limítrofes, o registro deve ser feito em todas elas, devendo os Registros de Imóveis fazer constar dos assentos tal ocorrência. Obedecendo também ao princípio da continuidade, introduzido em nosso sistema pelo Decreto nº 18.542, de 12 de dezembro de 1928, que determina o imprescindível encadeamento entre assentos pertinentes a um dado imóvel e às pessoas nele interessadas367, por isso, somente a pessoa nominalmente referida no registro como titular do domínio de um imóvel pode transmitir a outrem seu direito ou onerá-lo de qualquer modo, constituindo o registro um dos modos derivados de aquisição de domínio de coisa imóvel, prendendo-se ao anterior. Assim, se o imóvel não estiver registrado no nome do alienante, este não poderá fazer o seu assento em nome do adquirente368, estando tal princípio inserido nos arts. 195, 236 e 237 da Lei nº 6.015/73, desta forma, nenhum assento poderá ser feito sem que o imóvel esteja antes matriculado, e nem se fará assentamento que dependa da apresentação de título anterior369. Quanto o princípio da prioridade inserido no art. 1.246 do Código Civil, determina que o registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao Oficial e este o prenotar no protocolo, estando este dispositivo em conformidade com o art. 182 da Lei 6.015/73, que estipula que todos os títulos tomarão, no protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da seqüência rigorosa de sua apresentação, determinando este número de ordem à prioridade do título e a preferência do direito real, assegurando a prenotação a prioridade do registro, pois, 367 BRASIL. Lei nº 18.542, de 24 de dezembro de 1928. Aprova o regulamento para execução dos serviços concernentes aos registros públicos estabelecidos pelo Código Civil. Coleção de leis do Brasil. Brasília, 31 dez 1928. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. 368 DINIZ, 2004, p. 29. 369 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.005-1.010 passim. 87 ela consistirá no prévio assentamento do título, que garantirá a prioridade e esta a preferência do direito real sobre o imóvel370. Protegendo o sistema, destarte, quem primeiro registra o título, devendo o serventuário entregar no ato do protocolo recibo datado e com o número de ordem que determinará a prioridade do título independentemente da legalidade do mesmo. Inferindo-se, com isso, que a finalidade da prenotação não é apenas determinar a preferência de um título em relação a outro, mas, também, garantir a eficácia dele a partir do seu ingresso; cessando os seus efeitos assecuratórios se, em trinta dias, a parte interessada não atender às exigências formuladas pelo escrivão, podendo neste caso, ser examinado e registrado, se estiver em ordem, outro título apresentado em segundo lugar. Estendendo-se também esta obrigatoriedade de transcrição aos atos judiciais, como julgados nas ações divisórias, sentenças de inventários, partilhas de adjudicação e de extinção de condomínio, a fim de permitir a disponibilidade do imóvel aos interessados e aos herdeiros. Assim, a transcrição somente tem caráter declaratório de disponibilidade dominial, embora não funcione como ato transmissor de domínio; datando-se ela, no dia em que se apresentar o título ao oficial do registro e, este prenotar o protocolo, que constitui, ainda, a chave do registro geral. E, o art. 225 da Lei nº 6.015/73 aponta o princípio da especialidade, que exige a minuciosa individualização do título e do bem a ser registrado, consistindo no fato de assentar uma perfeita e minuciosa identificação do imóvel registrado, com o escopo de impedir que sua transmissão seja feita irregularmente371. Tratando este princípio dos dados geográficos e métricos do imóvel principalmente no que tange às confrontações, visando elidir os erros que possam confundir as propriedades e causar prejuízos aos seus respectivos titulares. Enquanto que o princípio da instância, não permite que o oficial proceda a registros de ofício, mas somente a requerimento do interessado, ainda que verbal, pois, o serventuário depende para efetivar o registro imobiliário, de provocação do titular do 370 371 DINIZ, 2004, p. 30. Ibid., p. 31. 88 direito, não podendo fazer o assentamento por iniciativa própria372, conferindo o registro na relação jurídica o cunho de direito real, pois, o que existia antes entre as partes era mero direito pessoal. Prevendo o art. 1.247 do Código Civil, que tem correspondência com o art. 213 da Lei 6.015/73, que se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule, podendo isso ser levado a cabo pelo próprio oficial, se o erro for evidente e não houver potencialidade danosa a terceiros, dando ao proprietário o direito de cancelado o registro reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título do terceiro adquirente, podendo a requerimento do interessado ser retificado o erro constante do registro, desde que tal retificação não acarrete prejuízo a terceiros373. Retificando-se também administrativamente se ocorrer simples engano na tomada das indicações constantes do título, como divergência em nome das partes, erros de metragens ou de localização, lapsos de referências, todos através de requerimento do interessado, e também desde que não haja a possibilidade de prejuízos a terceiros, haja vista que, a possibilidade de retificação é um dos efeitos do registro, já que ele não é imutável, e, se não exprimir a realidade jurídica ou a verdade dos fatos, pode ser modificado ante o pedido do prejudicado e com audiência da parte interessada374. Contudo, se o equívoco ocorrido, erro ou ato a ser retificado, estiver inserido em escritura pública, os oficiais de Registro de Imóveis e os juízes não poderão corrigi-lo mediante simples retificação do registro, devendo o interessado providenciar primeiro a realização de outra escritura na qual compareçam as mesmas partes da escritura retificada, para, depois, retificar-se o registro375, enunciando-se desta forma o princípio da inscrição. Laborando em equívoco, entretanto, quem pensar que a aquisição ou oneração se operam unicamente com o registro. Na verdade, elas se compõem de dois atos interligados: o título, que expressa a vontade das partes e o registro, que cria o 372 373 374 375 DINIZ, 2004, p. 32. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 224. DINIZ, op. cit., p. 29, nota 372. Ibid., p. 286. 89 direito real. Constituem, portanto, um ato complexo, que se inicia com a lavratura da escritura e se concretiza com o registro. Podemos dizer, com isso, que o registro depende, para sua realização, da apresentação do título, mas este não sobrevive sem aquele, simplesmente porque a transferência inter-vivos do domínio da propriedade imóvel não se completa sem o registro. Fincado claro no parágrafo único, do art. 1.275 do Código Civil, a complexidade da alienação como ato gerador da transmissão inter-vivos da propriedade imóvel, ao reconhecer o legislador que os seus efeitos é que estão subordinados ao registro376, daí resultando a certeza de que a causa dos registros reside no título. Sendo inseparáveis o título e o registro, pois, o título não vale por si só e nem o registro, cada um dependendo do outro para a sua eficácia. Portanto, com o advento do Código Civil e com as alterações efetuadas pela Lei de Registros Públicos, o Registro de Imóveis passou a ter função essencial para o direito brasileiro, de maneira que a maioria das relações patrimoniais envolvendo imóveis passaram a ser controladas por ele, criando e aperfeiçoando o cadastro da propriedade imobiliária, que foi garantida pelo art. 5º, XXII, da CF/88, a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país377. Ressaltando que o Registro de Imóveis não passou a ser simplesmente um repositório de títulos, pelo contrário, transformou-se em verdadeiro órgão controlador de seus aspectos formais, aplicando-se os princípios registrais sem, contudo, interferir na vontade das partes, devendo garantir a segurança jurídica, a confiabilidade do sistema e a ampla publicidade de seus atos. Exercendo, ainda, o Registro de Imóveis, outra função, mesmo que vez atípica e acessória, qual seja, a de fiscalizador de recolhimento de tributos e cooperador do Fisco. Com efeito, várias leis especiais conferem ao Registro de Imóveis o papel de fiscalizar o recolhimento de tributos referentes a imóveis, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), o Imposto de Transmissão de bens Imóveis (ITBI) etc., bem como a de cooperar com vários órgãos públicos, como, por exemplo, a 376 377 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 228. BULOS, 2003, p. 187-189 passim. 90 Declaração de Operações Imobiliárias (DOI), que deverá ser prestada à Secretaria da Receita Federal mensalmente pelos oficiais e tabeliães. Desenvolve-se, destarte, a idéia da utilização do Registro de Imóveis como meio para se combater e evitar burla as leis de parcelamento do solo e condomínio horizontal, bem como ao código de defesa do consumidor, quando do arquivamento de contrato padrão em loteamentos ou incorporações imobiliárias, observando se o seu registro não desrespeita as normas cogentes relativas ao Código de Defesa do Consumidor. Assim, não obstante seu caráter didático, a não observância dos princípios fundamentais do registro de imóveis pode causar sérias conseqüências para o ato praticado, principalmente sua nulidade, como se observa no art. 214 da Lei 6.015/73, que dispõe que as nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no independente de ação direta378. Dessa forma, uma vez constatada a violação a princípio registrário, poderá o ato maculado com vício ser cancelado administrativamente pelo Juiz corregedor, independentemente de ajuizamento de ação contenciosa. 1.2.5.4 Procedimentos para o registro Se o registro de imóveis no Brasil não oferece garantia plena ao adquirente, a este incumbe buscar essa segurança, tomando algumas precauções antes de efetivar um negócio imobiliário, especificamente quando se tratar de sua aquisição, como requerer junto ao Cartório de Registro de Imóveis onde se assenta o registro do imóvel objeto da transação, certidão vintenária do mesmo, observando de posse da referida certidão, o encadeamento sucessivo, ou seja, visualizando se consta como outorgante ou transmitente a pessoa cujo nome figura no registro como titular do direito negociado ou transmitido, verificando se o princípio da continuidade foi seguido corretamente. 378 BRASIL. Código Civil, 2003, p 1.007. 91 Procedendo na investigação do imóvel, se o mesmo existe e se a descrição contida na matrícula que se refere à vida jurídica do bem corresponde a sua realidade física, pois, as características que constam dela pelo princípio da especialidade não podem ser modificadas unilateralmente, tendo em vista que, as suas regras impedem que sejam registrados títulos cujo objeto não seja exatamente aquele que consta do registro anterior, devendo obedecer aos requisitos do princípio da continuidade, verificando-se a capacidade dos contratantes, requerendo o adquirente informações dos serviços de protesto, certidões junto aos cartórios cíveis, instrumentos de mandato mencionado nos títulos, sucessões causa mortis, além da certidão negativa de débitos referente ao imóvel, junto as repartições públicas,; analisando toda a gama de fatores que possam influir na negociação379. E no que tange o registro dos loteamentos no registro de imóveis, chamado de registro especial, deve-se observar se o loteamento está de acordo com a Lei nº 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento e loteamento do solo urbano, verificando se o mesmo foi aprovado pela prefeitura municipal, bem como se foram satisfeitas as exigências urbanísticas e administrativas do Poder Público estatal da região, sendo imprescindível ao adquirente verificar conforme disposto no art. 18 da Lei nº 6.766/79, se o loteamento foi registrado junto ao Cartório de Registro de Imóveis do local. Considerando-se a existência do loteamento legalmente constituído depois de constatado com sucesso todas estas verificações, inclusive, a anexação dos documentos arrolados no art. 18, desta lei, que visa verificar a liquidez do parcelador380. Sendo os procedimentos arrolados nesta legislação de suma importância, para verificar-se a colimação da segurança jurídica, expressa no binômio liquedez de domínio do parcelador e proteção aos futuros adquirentes de lotes, orientando-se a legislação no sentido de dotar o adquirente de todas as garantias que coloquem a salvo o bem imóvel adquirido381. 379 JUNQUEIRA, 1997, p. 141. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 910. 381 JACOMINO, Sérgio. Parcelamento do solo urbano, o consumidor e o registro imobiliário. In: Ministério Público do Estado de São Paulo: Procuradoria de Justiça. Temas de direito urbanístico. São Paulo: Imprensa Oficial, 2002. v. 2. p. 259. 380 92 E, de acordo com o art. 168 da Lei nº 6.015/73, no Registro de Imóveis além da matrícula dos imóveis, é feito o registro de outros bens que têm por base os direitos reais, sendo todos os atos nele enumerados obrigatórios, devendo ser efetuados no cartório da situação do imóvel, salvo conforme a alteração dada pela Lei nº 6.216/75, as averbações, que serão efetuadas na matrícula ou à margem do registro a que se referirem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer à outra circunscrição, e pela alteração da Lei nº 10.257/01, os registros relativos a imóveis situados em comarcas ou circunscrições limítrofes, serão feitos em todas elas, devendo os Registros de Imóveis fazer constar dos registros tal ocorrência382. Devendo haver no registro de imóveis, de acordo com o art. 171 da Lei nº 6.015/73, o Livro de Protocolo que servirá para apontamento de todos os títulos apresentados no cartório diariamente383, ressalvado pelo parágrafo único do art. 12, desta lei, o número de ordem, que seguirá indefinidamente nos livros da mesma espécie, tendo como requisitos para a sua escrituração, a inscrição da data da apresentação, o nome do apresentante, a natureza formal do título, e os atos que o formalizem, resumidamente mencionados384. Sendo destinado o Livro de Registro Geral à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relativos ou relacionados no art. 167 da Lei nº 6.015/73, e não atribuídos ao Livro de Registro Auxiliar, devendo nele cada imóvel ter matrícula própria que será aberta por ocasião do primeiro registro a ser feito, devendo esta matricula ter o número de ordem que seguirá ao infinito; a data; a identificação do imóvel, feita mediante indicação de suas características e confrontações; localização, área e denominação, se rural, ou logradouro e número, se urbano; e sua designação cadastral, se houver; a identificação do imóvel, que será feita com indicação; o nome, domicílio e nacionalidade do proprietário, bem como, tratando-se de pessoa física, o estado civil, a profissão, o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda ou do Registro Geral da Cédula de Identidade, ou à falta deste, sua filiação; e, tratando-se de pessoa jurídica, a sede 382 383 384 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.000. JACOMINO, 2002, p. 161. BRASIL. Código Civil. op. cit., p. 957, nota 382. 93 social e o número de inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do Ministério da Fazenda.385 Enquanto que o Livro de Registro Auxiliar será destinado ao registro dos atos que, sendo atribuídos ao Registro de Imóveis por disposição legal, não digam respeito diretamente ao imóvel matriculado, registrando-se nele a emissão de debêntures, sem prejuízo do registro eventual e definitivo, na matrícula do imóvel, da hipoteca, anticrese ou penhor que abonarem especialmente tais emissões, firmando-se pela ordem do registro a prioridade entre as séries de obrigações emitidas pela mesma sociedade; as cédulas de crédito rural e de crédito industrial, sem prejuízo do registro da hipoteca cedular; as convenções de condomínio; o penhor de máquinas e de aparelhos utilizados na indústria, instalados e em funcionamento, com os respectivos pertences ou sem eles; as convenções antenupciais; os contratos de penhor rural; os títulos que, a requerimento do interessado, forem registrados no seu inteiro teor, sem prejuízo do ato praticado no Livro de Registro Geral. E, o Livro Indicador Real será o repositório de todos imóveis que figurarem nos demais livros, devendo conter sua identificação, referência aos números de ordem dos outros livros e anotações necessárias. Enquanto que o Livro Indicador Pessoal será o repositório dos nomes de todas as pessoas que, individual ou coletivamente, ativa ou passivamente, direta ou indiretamente, figurarem nos demais livros, fazendo-se referência aos respectivos números de ordem386. Podendo os instrumentos ou meios para a retificação do registro imobiliário serem feitos voluntariamente pelas partes, de forma administrativa, e por iniciativa do próprio Oficial do Registro, de ofício; com ou sem notificação de terceiros, com ou sem decisão judicial; e, conforme o art. 216 da Lei nº 6.015/73, não alterado pela Lei nº 10.931/04, judicialmente, em processo contencioso, a requerimento de qualquer interessado, tendo o legislador ampliado os poderes do Oficial do Registro de Imóveis para a simplificação do procedimento de retificação do registro, elencado as hipóteses em que o ele poderá atuar de ofício, e retirando tanto quanto possível à 385 386 JUNQUEIRA, 1997, p. 161-162 passim. Idem . 94 intervenção do Juiz no processo retificatório387. Procedimento que vêm sendo definido pelos tribunais, conforme decisão prolatada pelo TJRS, na Apelação Cível, de 29 de abril de 2003, julgado pela Décima Sétima Câmara Cível, nos seguintes termos: APELAÇÃO CÍVEL Nº 70006005797 RELATOR: DESEMBARGADORA ELAINE HARZHEIM MACEDO APELANTE: CLOTILDE MENESTRINO DIONELLO APELADOS: BEATRIZ KOTEC SELISTRE E ROMEU SELISTRE SOBRINHO EMENTA: RETIFICAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. VIA OU MEIO INADEQUADO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ INOCORRENTE. A retificação é pretensão que pode ser deduzida em sede meramente administrativa, com em sede jurisdicional, dependendo da extensão e conteúdo da retificação pretendida. Em sendo jurisdicional pode, ainda, ser de natureza voluntária ou contenciosa, conforme haja ou não conflito presente. Nesse sentido, o art. 213 da LRP prevê retificação pelo próprio registrador, em casos de erro evidente, que é ato administrativo, e retificação judicial – ou, em outras palavras, jurisdicional – sendo jurisdição voluntária as hipóteses dos §§ 1º, primeira parte, e 2º do predito dispositivo, e contenciosa 388 no caso de seu § 4º . Devendo as alterações de ofício serem feitas mediante averbação, que é a anotação pela qual se efetua sob a matrícula ou registro de fatos ou atos que, de qualquer modo, alteram, modificam ou ampliam conteúdo dos mesmos389, estando os casos de averbação enumerados no art. 167, II, da Lei 6.015/73, devendo haver justificativa dos fatos e se necessário dar-se ciência ao interessado para eventual recurso390. Podendo, ainda, o procedimento administrativo retificatório simplificado ser processado de ofício, determinando o oficial que seja feita à retificação; ou a requerimento do interessado, mediante simples petição com a prova do alegado. Passando, portanto, o oficial do Registro de Imóvel a ter uma função mais atuante na retificação, ao presidir o procedimento administrativo simplificado, podendo mandar processá-lo, indeferi-lo, exigir diligências, e notificar os interessados, acolhendo ou não o pedido. 387 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.007. BRASIL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Retificação de registro imobiliário. Via ou meio inadequado. Extinção do processo. Litigância de má-fé inocorrente. Apelação Cível nº 70006005797/RS. Clotilde Menestrino Dionello e Beatriz Kotec Selistre e outro. Relator: Desembargadora Elaine Harzheim Macedo, Décima Sétima Câmara Cível. Diário de Justiça. Brasília, 29 abr 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 389 JUNQUEIRA, 1997, p. 157. 390 BRASIL. Código Civil, op. cit, p. 995, nota 387. 388 95 Permanecendo intangíveis o procedimento de dúvida, bem como o procedimento de dúvida inversa, admitido pela doutrina e jurisprudência, e que é processado da mesma forma que o de dúvida, assim, ao procedimento de dúvida, bem como o de dúvida inversa, estão reservadas às hipóteses em que a dissensão entre o oficial de Registro de Imóveis e o interessado diga respeito a ato de registro em sentido estrito, assim considerado as elencadas no art. 167, I, da Lei nº 1.615/73391. Desta forma não se conformando o apresentante com a exigência do Oficial Registrador poderá requerer a declaração ou suscitação de dúvida a ele; que a remeterá ao Juízo competente para dirimi-la, acompanhada de suas razões, procedendo-se a notificação e intimação do suscitado para impugná-la no prazo de quinze dias, observando-se que é dever do Oficial encaminhar ao juízo competente as dúvidas levantadas pelos interessados, nos termos do art. 30, XIII, da Lei 8.935/94392. E, decorrido o prazo, apresentada ou não a impugnação, os autos serão remetidos ao representante do Ministério Público que atuará como fiscal da lei emitindo parecer no prazo de dez dias, sendo a sua intervenção obrigatória, pelo art. 200 da Lei 6.018/73, sob pena de nulidade; e, após isso, retornará os autos ao Juízo competente para prolação de sentença, ficando a prenotação suspensa até final solução, conforme o art. 198 e seguintes, da Lei 6.015/73; e se o suscitado ficar irresignado com a decisão de primeiro grau, poderá recorrer no prazo de quinze dias para o órgão competente através de apelação, que será recebida nos efeitos devolutivo e suspensivo, exigindo o art. 199, desta lei, a condição de interessado para que a dúvida seja impugnada, diversamente do art. 198, que menciona a condição de apresentante para requerer sua declaração393. Ressalte-se que o procedimento de dúvida tem natureza puramente administrativa, dessa forma, não há contraditório entre partes interessadas, mas apenas dissenso entre o requerente e o serventuário; não configura causa no sentido constitucional; não enseja coisa julgada material, e sim, mera preclusão administrativa; não se aplicam totalmente as formas e institutos do Código de Processo Civil, que somente 391 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 995. BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União. Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 393 BRASIL. Código Civil, op. cit, p. 1.005, nota 391. 392 96 é utilizado subsidiariamente. Sendo necessário tanto para a impugnação da dúvida, como para se interpor recurso, à constituição de advogado, nos termos do art. 1º da Lei 8.906/94394 e do art. 36 do Código de Processo Civil395. Admitindo-se a reiteração da dúvida desde que se supere o motivo anteriormente reconhecido ou que se tenha alterado a jurisprudência a respeito das questões tratadas. Determinando a norma ao dispor sobre o requerimento de retificação por meio de procedimento judicial, em prestação jurisdicional, ou a sua remessa pelo interessado para as vias ordinárias, que a questão seja solucionada na Justiça Comum Estadual, por um Juiz de Direito competente para a julgar o processo, segundo as normas do Processo Civil e da Lei de Organização Judiciária do foro onde está localizado o imóvel questionado, conforme julgado do STJ, do dia 11 de junho de 2003, julgado pela Segunda Seção, nos seguintes termos: CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 31046 RELATOR: MINISTRO FERNANDO GONÇALVES AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA – INCRA PROCURADOR: REGINA MARIA CALHAU MARTINS E OUTROS RÉU: CARLOS DIAS GUIMARÃES E OUTROS SUSCITANTE: JUÍZO FEDERAL DA 7ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADADO DA BAHIA SUSCITADO: JUÍZO DA VARA DE FEITOS CRIMINAIS JURI MENORES FAZENDA PÚBLICA E REGISTROS PÚBLICOS DE BOM JEUS DA LAPA – BA EMENTA: CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO. NATUREZA ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1 – Consoante entendimento pacífico desta Corte não existindo lide, compete ao Juízo de Direito corregedor processar e julgar o pedido de cancelamento de registros imobiliários, não importando se este foi formulado por ente 396 federal, porquanto a questão é de natureza meramente administrativa . Quanto ao procedimento relacionado aos imóveis rurais, ficam todos os proprietários, titulares de domínio útil ou possuidores a qualquer título de imóveis rurais, considerados como tal, os definidos no art. 4º, I, do Estatuto da Terra, 394 BRASIL. Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o estatuto da advocacia e a ordem dos advogados do Brasil - OAB. Diário Oficial da União. Brasília, 05 jul 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 17 de junho de 2005. 395 BRASIL. Constituição federal, Código de Processo Civil, 2003, p. 777. 396 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de competência. Cancelamento de registro imobiliário. Natureza administrativa. Competência da Justiça Estadual. Conflito de Competência nº 31046/BA. Juízo Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Estadado da Bahia e Juízo da Vara de feitos criminais Juri Menores e outro. Relator: Ministro Fernando Gonçalves, Segunda Seção, 11/06/2003. Diário de Justiça. Bahia, p. 126, 30 jun 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 97 obrigados conforme estabelecido no art. 2º da Lei nº 5.868/72, a apresentar declarações cadastrais397, que têm consoante o disposto no art. 2º do Decreto 72.106/73, a finalidade de fazer o levantamento sistemático dos imóveis rurais, para conhecimento das condições vigentes na estrutura fundiária das várias regiões do País. E ainda, o levantamento sistemático dos proprietários e detentores de imóveis rurais, para conhecimento das condições de efetiva distribuição e concentração da terra e do regime de domínio e posse vigentes nas várias regiões do País; dos arrendatários e parceiros rurais, para conhecimento das condições de uso temporário da terra, vigentes nas várias regiões do País; das terras públicas federais, estaduais e municipais, visando ao conhecimento das disponibilidades de áreas apropriadas aos programas de Reforma Agrária e Colonização e da situação dos posseiros e ocupantes de terras públicas; a obtenção de dados e elementos necessários às análises microeconômicas e às amostragens nas várias regiões do País, para fixação dos índices previstos nas alíneas do § 1º do art. 46 da Lei nº 4.504/64; e a obtenção de dados e elementos, que orientem os órgãos de assistência técnica e creditícia nas tarefas de formulação de seus respectivos planos de assistência ao produtor rural398. Expedindo o INCRA, para tanto, a Portaria nº 180, datada de 15 de julho de 1978, aprovando a Instrução Especial INCRA nº 45, da mesma data, a qual traçou os procedimentos para coleta de dados, a serem utilizados daí em diante, criando-se os formulários de Declaração para Cadastro de Imóvel Rural – FC, conforme modelos anexados à Instrução Especial, e que devem ser preenchidos de modo individualizado para cada imóvel rural399. 397 BRASIL. Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972. Cria o Sistema Nacional de Cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 dez 1972. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 398 BRASIL. Lei 72.106, de 18 de abril de 1973. Regulamenta a Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que institui o sistema nacional de cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr 1973. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. 399 PROENÇA, 1999, p. 87. 98 CAPITULO II – A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 2.1 EVOLUÇÃO O Direito Administrativo como ramo autônomo, teve início no período do Estado Moderno, desenvolvendo-se juntamente com o conceito de Estado de Direito, estruturado sobre o princípio da legalidade e sobre o princípio da separação dos poderes, que tem por objetivo assegurar a proteção dos direitos individuais, não apenas nas relações particulares, mas também entre estes e o Estado400. Não nascendo ele no Brasil como ramo autônomo à semelhança do que ocorreu na Europa, mesmo que já no império existisse uma administração pública organizada, mas que era regida praticamente pelo direito privado, e que o conselho de Estado se limitava a aplicar401. Criando o Brasil neste período, pelo Decreto nº 608, de 16 de agosto de 1851, a sua primeira cadeira de Direito Administrativo nos cursos jurídicos existentes, tendo sofrido neste período o Direito Administrativo no Brasil influência do Direito Público Norte-Americano, que forneceu-nos dados para a nossa primeira Constituição Republicana, em 1891402. 2.2 CONCEITO A Administração Pública está diretamente ligada ao bem comum, não podendo por sua conceituação ser desvinculada da conceituação de política, por ser esta a forma de atuação do homem público quando visa a conduzir a administração a realizar o bem comum, regendo-se por motivos de conveniência e oportunidade do interesse público, que há de ser o seu supremo objetivo403, enquanto aquela, em uma visão global é todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de serviços, 400 401 402 403 PIETRO, 2003, p. 24. Ibid., p. 42. MELLO, 2004, p. 51-52 passim. Ibid., p. 45. 99 visando à satisfação das necessidades coletivas404, o que faz com que a Administração Pública também esteja correlacionada com a conceituação do Estado sobre o qual repousa toda concepção moderna de organização e funcionamento dos serviços públicos a serem prestados aos administrados405. Sendo a Administração pública, portanto, o conjunto de meios institucionais, materiais e financeiros preordenados à execução das decisões políticas406, que deve assim como esta, obedecer aos princípios da impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e legalidade que é um dos sustentáculos fundamentais do Estado de direito407, todos relacionados no art. 37 da CF/88, que emprega o termo Administração Pública em dois sentidos; como um conjunto orgânico, quando fala em Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e como atividade administrativa, quando determina sua submissão aos princípios nele expostos408, sendo esta Administração Pública a ser enfocada seqüencialmente. Podendo, ainda, a Administração Pública ser definida objetivamente com a atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve para a consecução dos interesses coletivos e subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas as quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado409. Desta forma, está a atividade administrativa submetida ao princípio da legalidade, que explícita a subordinação da atividade administrativa à lei, surgindo em decorrência natural da indisponibilidade do interesse público. Dispondo o art. 5º, II, da CF/88, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei410, assim, o fim legal é sempre o termo a ser atingido pela lei, que ocorre somente quando se atende à sua finalidade411, assentando-se também este princípio no art. 84, IV, da CF/88, não podendo a Administração Pública proibir ou impor 404 405 406 407 408 409 410 411 MELLO, 2004, p. 65. Ibid., p. 59. SILVA, 2003, p. 636. BASTOS, 2001, p. 334. SILVA, op. cti., p. 636, nota 406. MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 313 BULOS, 2003, p. 124. MELLO, op. cit., p. 38, nota 404. 100 comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja. Devendo a Administração Pública pelo princípio da razoabilidade ao exercer a suas atividades obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas, enquanto que pelo principio da proporcionalidade, a lei outorga-lhe competências em vista a certo fim, configurando todo excesso desnecessário ao seu atendimento uma superação do escopo normativo412, enunciando este princípio a idéia de que as competências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidade proporcionais ao que seja realmente demandado para cumprimento da finalidade do interesse público a que estão atreladas. Enquanto que o princípio da motivação impõe à Administração Pública o dever de expor as razões de direito e de fato pelas quais tomou a providência adotada, implicando-lhe o dever de justificar seus atos, apontando os fundamentos de direito e de fato, e a sua correlação com a providência tomada. Traduzindo a obrigatoriedade do desempenho de atividade pública, o princípio da continuidade do serviço público a situação de dever em que se encontra a Administração em face da lei, pois o interesse público que à Administração incumbe zelar encontra-se acima de quaisquer outros, não podendo por isso as pessoas administrativas deixar de cumprir o próprio escopo, sendo obrigadas a desenvolver atividade contínua, compelidas a perseguir suas finalidades públicas413. Conformando o Estado, desta forma, o comportamento das pessoas que o auxiliam, aos fins que lhe foram legalmente atribuídos, que compreende o poder de se manter a Administração informada sobre o comportamento dos sujeitos, autorizando investigações através do poder que dispõe de controle administrativo ou tutela, exercitável através dos seus órgãos. Impondo-se a Administração Pública de forma expressa pelo caput, do art. 37 da CF/88, o princípio da publicidade, visando à transparência na atividade administrativa exatamente para que os administrados possam conferir se está sendo 412 413 MELLO, 2004, p. 65. Ibid., p. 40-41 passim. 101 bem ou mal conduzida414. Admitindo-se o sigilo na esfera administrativa, a teor do art. 5º, XXXIII, da CF/88415, somente quando imprescindível à segurança da Sociedade e do Estado. E sendo a administração atividade serviente, desenvolvida em nível sublegal, não pode a Administração Pública alienar ou ser despojada dos direitos que a lei consagrou como internos ao setor público, em conformidade com o princípio da inalienabilidade dos direitos concernentes aos interesses públicos. E pelo princípio do controle jurisdicional dos atos administrativos, todo e qualquer comportamento da Administração Pública que se faça gravoso a direito pode ser fulminado pelo Poder Judiciário, sem prejuízos das reparações patrimoniais cabíveis416. Ocorrendo na Administração Pública a supremacia do interesse público sobre o interesse privado, tratando-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito Público, que proclama a superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o do particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento deste último417. Sendo esta supremacia considerada como um pressuposto para que todos os cidadãos possam sentir-se garantidos e resguardados em seus direitos individuais e coletivos. Encarnando esta posição privilegiada, os benefícios que a ordem jurídica confere a fim de assegurar conveniente proteção aos interesses públicos, que são indisponíveis pela Administração Pública, por serem inapropriáveis, não tendo o próprio órgão administrativo, que os representa, disponibilidade sobre eles, devendo o administrador cumprir com a finalidade da Administração Pública, pois, ela esta, por lei, adstrita ao cumprimento de certas finalidades, sendo-lhe obrigatório objetiválas para colimar interesse da coletividade, exercendo função, instituto que se traduz na idéia de indeclinável atrelamento a um fim preestabelecido e que deve ser atendido para o benefício de um terceiro. 414 415 416 417 MELLO, 2004, p. 46. BULOS, 2003, p. 212. MELLO, op. cit., p. 47, nota 414. Ibid., p. 30. 102 Situação esta oposta à autonomia da vontade, típica do Direito Privado, que em regra, busca, em proveito próprio, os interesses que lhe apetecem, fazendo-o, pois, com plena liberdade, contanto que não viole a lei, e ao contrário, onde há função, não há autonomia da vontade, nem a liberdade em que se expressa, nem a autodeterminação da finalidade a ser buscada, nem a procura de interesses próprios, pessoais, havendo adscrição a uma finalidade previamente estabelecida, e, no caso de função pública, há a submissão da vontade ao escopo pré-traçado na Constituição ou na lei e há o dever de bem curar um interesse alheio, que, no caso, é o interesse público418. 2.3 FUNÇÃO O Estado dentro da concepção adotada pelo art. 29 da CF/88 tem os seus poderes independentes e harmônicos entre si, e destinados à execução de determinadas funções, assim, ao Poder Legislativo foi cometida a função normativa, ao Executivo, a função administrativa, e, ao Judiciário, a função jurisdicional, contudo, sem haver exclusividade no exercício destas funções pelos poderes, e sim, preponderância.419 Incumbido ao Poder Executivo precipuamente a função administrativa que não pode ser confundida com a Administração Pública e sua função, pois, ela está embutida em todos os entes que compõem a federação brasileira, por ser todos eles dotados de autonomia, e com ela a capacidade de auto-administração, desta forma, as entidades administrativas têm as suas próprias administrações, ou seja, sua própria organização e seus próprios serviços inconfundíveis com o de outras entidades420. Assim, a Administração Pública incumbe ao Estado que a exerce através de seus órgãos públicos que são compartimentos na estrutura estatal a que são cometidas funções determinadas, sendo integradas por agentes que quando as executam, manifestam a própria vontade do Estado421, manifestando o Estado desta forma a sua vontade através de seus agentes, que são todos aqueles que, a qualquer título, executa uma função pública como pressuposto do Estado, sendo integrantes dos 418 419 420 421 MELLO, 2004, p. 69. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 583-592 passim. CARVALHO, 2003, p. 06. Ibid., p. 10. 103 órgãos públicos, cuja vontade é impetrada à pessoa jurídica422, devendo ao exercer sua função buscar o atendimento do interesse da coletividade, e não o interesse de seu próprio organismo, e muito menos o dos agentes estatais, visto que, na idéia de função, o dever é que deve ser predominante, existindo ela quando alguém está investido no dever de satisfazer dadas finalidades em prol do interesse de outrem, necessitando, para tanto, manejar os poderes requeridos para supri-las. Estando quem exerce estas funções, portanto, adstrito a satisfazer os interesses públicos, por isso, o uso das prerrogativas da Administração é legitimo se, quando e na medida indispensável ao atendimento dos interesses públicos423, entendendo-se como tal, o interesse do todo, do próprio corpo social, para precatar-se contra o erro de atribuir-lhe o status de algo que existe por si mesmo, dotado de consistência autônoma, ou seja, como realidade independente e estranha a qualquer interesse das partes424. Assim, tem-se função apenas quando alguém está assujeitado ao dever de buscar, no interesse de outrem, o atendimento de certa finalidade. E por está a Administração Pública vinculada ao princípio da legalidade imposto nos arts. 37425 e 5º, II, da CF/88426, a função do seu ato administrativo só poderá ser a de agregar à Lei nível de concreção, não lhe assistindo instaurar originariamente qualquer cerceio a direito de terceiros427. Sendo a Administração Pública pelo art. 37, divida em direta e indireta, ocorrendo esta quando a administração confia à outra pessoa jurídica a realização de tais misteres, enquanto que a administração direta é a que íntegra os próprios poderes que compõem as pessoas jurídicas428. Podendo, com isso, a Administração Pública ser realizada por diversas entidades, que podem ser tanto pessoa jurídica pública quanto pessoa jurídica privada, sendo exercida através de seus órgãos mediante intervenção de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertence. 422 423 424 425 426 427 428 CARVALHO FILHO, 2003, p. 13. MELLO, 2004, p. 32. Ibid., p. 57. BULOS, 2003, p. 623. Ibid., 124. BASTOS, 2001, p. 74. MELLO, op. cit., p. 322, nota 423. 104 Não havendo entre a entidade e seus órgãos relação de representação ou de mandato, porque a atividade dos órgãos identifica-se e confunde-se com a pessoa jurídica, daí porque os atos dos órgãos são havidos como da própria entidade que eles compõem, desta forma, quando o agente ultrapassa a competência do órgão, surge a sua responsabilidade pessoal perante a entidade, como também, quando esta desconsidera direitos do titular do órgão, pode ser compelida juridicamente a respeitá-los429. Instaurando-se o princípio de que todo o poder emana do povo, de tal sorte que os cidadãos, é que são proclamados como os detentores do poder, estando este princípio disposto no parágrafo único do art. 1º da CF/88430. 2.4 COMPETÊNCIA A Constituição é a lei regulamentadora da atividade estatal, que através de seus órgãos, estabelece a distribuição das respectivas competências, atribuições e os princípios que devem nortear sua atuação, estando na competência executiva inserida a função de instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação e saneamento básico, que estão inseridas no Poder de Planejamento e Desenvolvimento, que faz parte do Poder de Administração do Estado, que estar estipulado no art. 21 e incisos, da CF/88431; enquanto que na competência legislativa da União, descrita no art. 22 e incisos, pode ser citada a competência para legislar privativamente sobre normas gerais, incluindo-se neste caso a competência para legislar sobre o registro público432. E, mesmo sendo todos os procedimentos dos arts. 21 e 22, da CF/88, privativos da União, pelo parágrafo único do art. 22, poderá a lei complementar autorizar os Estados a legislarem sobre questões específicas relacionadas na competência privativa, contudo, a transferência da competência de legislar da União para os Estados será submetida à especificação do conteúdo da legislação transferida e à estipulação dos termos de seu exercício, aplicando-se à transferência de 429 430 431 432 MELLO, 2004, p. 69. BULOS, 2003, p. 72. Ibid., p. 539. BULOS, op. cit., p. 550, nota 430. 105 competência legislativa inter-estatal as regras que condicionam a delegação legislativa do Congresso ao Presidente da República.433 Enquanto que o art. 23 e seus incisos, da CF/88, estipula a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que entre eles está a competência de promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento. E o art. 24 da CF/88 e seus incisos e parágrafos, versa sobre a competência concorrente para legislar da União, dos Estados e do Distrito Federal, e entre eles está a de legislar sobre Direito Urbanístico. Competindo aos Municípios pelo disposto no art. 30, V, da CF/88, organizar e prestar, diretamente sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, não podendo, contudo, a competência para tratar de assuntos de interesse local ser considerado como único e exclusivo do Município.434 Exercendo a Administração Pública a sua função administrativa, por seus agentes administrativos, ou seja, por servidores públicos, mediante a ocupação de um cargo, emprego, função pública ou por contratação435, dividindo-se eles em algumas espécies e categorias bem diferenciadas, entre elas a dos agentes delegados que são particulares que, recebem a incumbência da execução de determinada atividade, obra ou serviço público e o realizam em nome próprio, por sua conta e risco, porém, segundo as normas do Estado e sob permanente fiscalização do delegante436, incluindo-se entre eles os notários e registradores, que têm os seus poderes transmitidos pelo próprio Estado. Assim, os servidores públicos enquadrados na categoria de agentes delegados, exercem uma atividade para a Administração Pública que é uma gestão de bens e interesses qualificados da comunidade no âmbito federal, estadual ou municipal, segundo os preceitos do Direito e da moral, visando ao bem comum437, pois, a Administração Pública é considerada um munus público para quem a exerce, visando o bem comum da coletividade, a que ela está sujeita em conformidade com 433 434 435 436 437 MELLO, 2004, p. 353-354 passim, nota 449. Idem. SILVA, 2003, p. 659. MELLO, op. cit., p. 80, nota 433. Ibid., p. 84. 106 o art. 37 da CF/88. Em suma, à vontade e ação do Estado, manifestada por seus órgãos, são constituídas na e pela vontade e ação dos seus agentes; ou seja, o Estado e os órgãos que o compõem se exprimem através dos seus agentes, na medida em que ditas pessoas físicas atuam nesta posição de veículos de expressão Estado438. Desta forma, se os agentes administrativos manifestam a vontade do Estado através de seus atos, os mesmos também estão adstritos ao princípio da finalidade, que lhes impõem ao manejarem as competências postas a seu cargo, que atuem com rigorosa obediência à finalidade de cada qual, isto é, cumpre-lhes cingir-se não apenas à finalidade própria de todas as leis, que é o interesse público, mas também à finalidade específica abrigada na lei a que esteja dando execução439. E, por visar a um interesse público, os serviços públicos se incluem como um dos objetivos do Estado, e por isso, que são eles criados e regulamentados pelo Poder Público, a quem incumbe a sua fiscalização440, sendo esta fiscalização uma das inúmeras normas de direito público aplicáveis aos serviços públicos, que devem ter os seus serviços fiscalizados. Devendo haver, ainda, a fiscalização por parte dos Poderes Judiciário e Legislativo junto ao Poder Executivo, pois apesar de este ser o responsável pela Administração Pública, não pode extrapolar os créditos institucionalmente concedidos ou simplesmente se omitir na execução de seus deveres, sob pena de agredir o princípio da Separação de Poderes. Estando a responsabilidade do Estado, contemplada no § 6º do art. 37 da CF/88, que estabelece que as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado, prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa; aplicando-se esta responsabilidade a quaisquer das funções públicas indistintamente, independentemente de danos 438 439 440 MELLO, 2004, p. 106. Ibid., p. 786. CARVALHO FILHO, 2003, p. 260. 107 provenientes dos atos administrativos de seus agentes, posto que existe o direito de regresso contra o agente responsável nos casos de dolo ou culpa.441 Tendo o Estado responsabilidade objetiva que está consagrada somente para os atos comissivos cometidos por ele, havendo de forma excepcional a responsabilidade subjetiva, quando ele através de seus agentes administrativos, devendo legalmente agir para evitar um dano e podendo fazê-lo não o faz, ou não o faz tempestivamente ou eficientemente, concernido estes mesmos critérios às pessoas de Direito Privado prestadoras de serviço público, pois o Estado tanto pode desenvolver por si mesmo as atividades administrativas que tem constitucionalmente a seu encargo, como pode prestá-la através de outros sujeitos, neste caso, ou transfere a particular o exercício de certas atividades que lhe são próprias ou, então cria outras pessoas, como entidades concebidas para desempenhar cometimentos de sua alçada. E quando esses agentes atuam no exercício da delegação ou a pretexto de exercêla lesam os direitos alheios, devem responder civil e criminalmente sob as mesmas normas da Administração Pública de que são delegados, ou seja, com responsabilidade objetiva pelos danos, e por crime funcional, se for o caso, pois não é justo e jurídico que a só transferência da execução de uma obra ou de um serviço originariamente público a particular descaracterize a sua intrínseca natureza estatal e libere o executor privado das responsabilidades que teria o Poder Público se o executasse diretamente442. Com isso, os titulares de serviços notarias ou de registro, conquanto conservem a sua qualidade de particulares conforme disposto no art. 236 da CF/88, a responsabilidade do Estado, mesmo que algumas vezes de forma subsidiária, é suscetível por atos desses agentes, já que a entidade estatal não pode ser alheia a danos causados por quem atuou munido de atribuições ou poderes oriundos da esfera pública, posto que agem como delegados de função pública443. 441 442 443 BULOS, 2003, p. 644. CARVALHO FILHO, 2003, p. 81. BULOS, op. cit, p. 1.138-1.139, nota 441. 108 Sendo descabido, portanto, contestar que os indivíduos têm direito subjetivo à defesa de interesses consagrados em normas expedidas para a instauração de interesses propriamente públicos, naqueles casos em que seu descumprimento pelo Estado acarreta ônus ou gravames suportados individualmente por cada qual. O mesmo dizendo-se em relação às correspondentes hipóteses em que o descumprimento pelo Estado, freqüentemente por omissão, de norma de Direito Público desta mesma tipologia não acarreta ônus, mas priva da obtenção de vantagens, de proveitos, que o lesado pessoalmente, em sua individualidade, desfrutaria se a norma de Direito Público fosse cumprida444. 2.5 SERVIÇO NOTARIAL E DE REGISTRO Com o desenvolvimento da sociedade, os serviços de registros públicos, pouco a pouco, foram especializando-se em razão de suas finalidades específicas, criandose na cidade do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 02 de janeiro de 1903, com a Lei nº 973, o serviço público correspondente ao primeiro ofício privativo e vitalício do registro facultativo de títulos, documentos e outros papéis, para autenticidade, conservação e perpetuidade dos mesmos e para os efeitos previstos no art. 3º do Decreto nº 79, de 23 de agosto de 1892445. E, com a sanção da Lei nº 3.071, de 01 de Janeiro de 1916, foi revogada as Ordenações, Alvarás, e várias Leis e Normas, consolidando o Código Civil brasileiro anterior, que, em seu Livro III, Título I, Capítulo IV, arts. 129 e seguintes, disciplinou os meios de prova dos atos jurídicos, regulando os institutos446, até que foi sancionada a Lei nº 6.015/73, que sofreu até os dias de hoje várias alterações, sendo a última efetuada pela Lei nº 10.931/04, continuando, portanto, mesmo com 444 MELLO, 2004, p. 60. BRASIL. Lei nº 973, de 02 de janeiro de 1903. Cria o ofício privativo e vitalício do registro facultativo de títulos, documentos e outros papéis, para autenticidade, conservação e perpetuidade dos mesmos, como para efeitos do artigo 3 da Lei 79, de 23 de agosto de de 1892, e dá outras providências. Coleção de leis do Brasil. Brasília, 31 dez 1903. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 18 jun 2005. 446 BRASIL, Código Civil, 2001, p. 68-72. 445 109 as alterações, em vigor até o momento, disciplinando em seu Título IV, no art. 128 e seguintes, o registro de títulos e documentos447. Contudo, ocorre que, em razão de originalmente acometidos estes serviços aos Tabelionatos de Notas, posteriormente, aos Ofícios de Registro de Imóveis e, somente depois aos registros especiais de títulos e documentos, os usos e costumes inerentes àqueles serviços nortearam a tônica da prática cartorária, muita vez olvidando a própria razão de ser do registro de títulos e documentos e outros papéis, sendo-lhes exigidos rigor e solenidades não prescritas em lei; isso, porque os bens da vida importantes para a sociedade não têm o mesmo fundamento. Assim, o bem da vida juridicamente protegido pelo Registro de Imóveis, são diversos dos protegidos nos Registros de Títulos e Documentos; visando o primeiro proteger um fim, o direito de propriedade, direito real, que exige forma solene, enquanto que o segundo visa proteger o próprio meio, ou seja, o título ou documento, o meio de prova que dará ensejo à proteção de eventual direito ou obrigação, quer dizer, neste a solenidade pode não ser da essência do ato ou fato que se pretende provar e que, para tanto, necessita registro, seja quanto ao seu conteúdo, o qual não deverá ficar ao arbítrio do registrador examinar, para alcançar efeitos decorrentes de sua publicidade, seja para adquirir autenticidade, seja, enfim, para mera conservação ou prova de data. Sendo o Serviço Notarial e de Registro conforme disposto no art. 236, da CF/88, aquele exercido em caráter privado, por delegação do Poder Público, entendendo como tal, aqueles que, por sua natureza ou pelo fato de assim dispor o ordenamento jurídico, comportam ser executados pelo Estado ou por particulares colaboradores448, sendo uma delegação de competência autorizada por lei, em que um agente pode transferir a outro, funções que originariamente lhe são atribuídas, tendo em vista que os serviços públicos só podem ser executados se houver uma disciplina normativa que os regulamente, vale dizer, que trace as regras através das quais se possa verificar como vão ser prestados449. 447 448 449 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 988-1.041 passim.. CARVALHO, 2003, p. 262. Ibid., p. 264. 110 Assim, em detrimento do Estado poder desenvolver diretamente as atividades administrativas que constitucionalmente estão sob seu encargo ou prestá-las através de outras pessoas, descentralizando o seu poder, foi que surgiram os agentes delegados, os quais estão inseridos os Serviços dos Notários e dos Registradores. Essa possibilidade de delegação dos serviços públicos é autorizada também na esfera federal pelo art. 12 do Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967, intitulado Estatuto da Reforma Administrativa, determinando em seu parágrafo único, que o ato de delegação deve indicar com precisão a autoridade delegante, a autoridade delegada e as atribuições objeto de delegação450. Portanto, o Serviço Notarial e de Registro, por ser concedido mediante delegação, deve a sua execução atender a normatização legal, executando as atribuições para o qual foi autorizado, satisfazendo de forma plena a todos que necessitam de seus serviços, não sendo, portanto, descaracterizado como público, vez que o Estado sempre se reserva o poder jurídico de regulamentar, alterar e controlar o serviço451. E, posteriormente, com a regulamentação do art. 236 da CF/88, pela Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, os Serviços Notariais e de Registro foram conceituados em seu art. 1º, como sendo os serviços de organização técnica e administrativa, destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficiência dos atos jurídicos452. Assim, o Serviço Notarial por ser um serviço público, também deve reger-se pelo princípio da generalidade, que traz a incumbência de beneficiar o maior número possível de indivíduos; o da permanência ou continuidade, que indica que os serviços públicos não devem sofrer interrupção, ou seja, sua prestação deve ser contínua para evitar que a paralisação provoque como às vezes ocorre, colapso nas múltiplas atividades particulares453; o da eficiência, pois, deve o Estado prestar seus serviços com a maior eficiência possível, reclamando ela que o Poder Público se 450 BRASIL. Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a reforma administrativa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 27 fev 1967. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 06 de jul de 2005. 451 CARVALHO FILHO, 2003, p. 260. 452 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 453 CARVALHO, op. cit., p. 266, nota 451. 111 atualize com os novos processos tecnológicos, de modo que a execução seja mais proveitosa com menor dispêndio. E ainda, o da modicidade, tendo em vista que, os serviços públicos devem ser remunerados a preços módicos, devendo o Poder Público avaliar o poder aquisitivo do usuário para que, por dificuldade financeiras, não seja ele alijado do universo de beneficiários do serviço454; entre outros, que podem ser resumidos pela expressão serviço adequado, utilizada pelo art. 4º da Lei nº 8.935/94, que dispõe que os serviços notariais e de registro serão prestados, de modo eficiente e adequado, em dias e horários estabelecidos pelo juízo competente, devendo atender as peculiaridades, em local de fácil acesso ao público e que ofereça segurança para o arquivamento de livros e documentos.455 Podendo o Poder Público realizar centralizadamente seus próprios serviços por meio dos órgãos da Administração direta, ou prestá-los descentralizadamente através das entidades autárquicas, ou ainda, por entes paraestatais de cooperação e finalmente, por empresas privadas e particulares individualmente, na posição de concessionários, permissionários e autorizados, conforme disposto no art. 21, XII, da CF/88456 e do seu art. 175457. Sendo o Serviço Notarial e de Registro um serviço delegado pelo Poder Público mediante concessão, que é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço, em conformidade com o art. 175, da CF/88458. 454 CARVALHO FILHO, 2003, p. 260. BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 456 BULOS, 2003, p. 534. 457 Ibid., p. 1.233. 458 Idem. 455 112 Desta forma, ambos são serviços concedidos, em que o particular ou mais exatamente o oficial titular do cartório, executa o serviço, em seu nome, por sua conta e risco, remunerado por tarifa, na forma regulamentar, mediante delegação constitucional, conforme o art. 236 da CF/88 e art. 14 e 47 da Lei nº 8.935/94459. Portanto, a atividade notarial e de registro é uma atividade exercida em caráter privado, entendimento que tem sido reiterado nos Tribunais, como o disposto pelo TJRS, no Recurso Ordinário em Mandado de Segurança, de 26 de novembro de 2002, julgado pela Quinta Turma, nos seguintes termos: RECURSO ORDINÁRIO EM MS Nº 15.323 / RS RELATOR: MINISTRO FELIX FISCHER RECORRENTE: LUIZ AMARO BAPTISTA ADVOGADO: LUCIANO KINDEL T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL IMPETRADO: DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL RECORRIDO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADOR: ADRIANA KRIEGER DE MELLO E OUTROS EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO EM SEGURANÇA. OFICIAL DE REGISTROS PÚBLICOS. ATIVIDADE EXERCIDA EM CARÁTER PRIVADO. ART. 236 DA CF. REGIME REMUNERATÓRIO. LEI Nº 8.935/94. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, os serviços notariais e de registros passaram a ser exercidos em caráter privado, por delegação do poder público (art. 236), pelo que os seus titulares não têm direito à 460 percepção de vencimentos e vantagens dos cofres públicos . Contudo, o serviço, apesar de concedido, continua sendo público, tanto que a lei prevê as hipóteses de perda da delegação no art. 35 da Lei nº 8.935/94; não descaracteriza, portanto, a natureza de serviço público ou de utilidade pública, o fato do serviço ser prestado em caráter privado, pelo contrário, é uma técnica administrativa idealizada para custear o serviço. Pressupondo a admissão na atividade notarial o preenchimento de condições e a realização do concurso público, conforme disposto no § 3º do art. 236, da CF/88461, assim vê-se que as normas de direito público regem o serviço notarial. 459 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 460 BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Oficial de registros públicos. Atividade exercida em caráter privado. Art. 236 da CF, Regime remuneratório. Lei nº 8.935/94. ausência de direito líquido e certo. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 15.323/RS. Luiz Amaro Baptista e Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Desembargador Felix Fischer, Quinta Turma, 26/11/2002. Diário de Justiça. Rio Grande do Sul, p. 309, 17 fev 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 461 BULOS, 2003, p. 389. 113 Em suma, o serviço notarial é um serviço de utilidade pública ou de relevância pública, que é aquele que a Administração, reconhecendo sua conveniência, não essencialidade e nem necessidade, para os membros da coletividade, presta-os diretamente ou aquiesce em que sejam prestados por terceiros, na forma de concessão, permissão ou autorização, nas condições regulamentadas e sob seu controle, mas por conta e risco dos prestadores, mediante remuneração dos usuários. Consistindo, assim, os notários e registradores em particulares que colaboram com a Administração, sendo sujeitos que, sem perderem sua qualidade de particulares, destarte, de pessoas alheias à intimidade do aparelho estatal, exercem função pública, ainda que às vezes apenas em caráter episódico462. Portanto, apesar de exercidos em caráter privado, os serviços delegados dos notários e registradores, são públicos e estão sujeitos ao regramento do direito público, sujeitando cada delegado aos limites de atribuições que lhes foram legitimados por lei, atribuindo os seus serviços garantia as pessoas naturais ou jurídicas, o que é próprio do serviço público, gerando responsabilidade para o Estado e para os titulares dos respectivos serviços, como julgado pelo STJ, no Recurso Especial nº 481339, de 03 de março de 2005, julgado pela Primeira Turma, nos seguintes termos: RECURSO ESPECIAL Nº 481.939 / GO RELATOR: TEORI ALBINO ZAVASCKI RECORRENTE: FRANCISCO DA NOBREGA BASTOS ADVOGADOR: ISMAR ESTULANO GARCIA E OUTROS RECORRIDO:ESTADO DE GÓIAS ADVOGADo: MARCELO DE SOUZA E OUTROS EMENTA: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO PELOS DANOS CAUSADOS PELOS TITULARES DE SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS NÃO-OFICIALIZADAS. [...] 2. No caso concreto, portanto, deve ser reconhecida a legitimidade do Estado de Goiás para figurar no pólo passivo da ação de indenização por 463 danos causados por titular de serventia extrajudicial não-oficializada . Desempenhando, desta forma, os notários e registradores, função tipicamente pública, sem serem servidores públicos, pois, não ocupam cargos públicos na 462 MELLO, 2004, p. 232. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Administrativo. Responsabilidade objetiva do Estado pelos danos causados pelos titulares de serventia extrajudiciais não-oficializadas. Recurso Especial nº 481.939/GO. Francisco Nóbrega Bastos e Estado de Goiás. Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, 03/03/2005. Diário de Justiça. Goiás, p. 218, 21 mar 2005. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 463 114 administração, mesmo que a sua função tenha sido investida mediante concurso público, não sendo os mesmos funcionários do Estado e não participando dos quadros de pessoal dos serviços públicos, posicionamento reiterado pelos tribunais, conforme disposto pelo STJ, no Recurso ordinário em Mandado de Segurança, de 03 de fevereiro de 2005, julgado pela Sexta Turma, nos seguintes termos: RECURSO ORDINÁRIO EM MS Nº 15.769 / SC RELATOR: MINISTRO PAULO MEDINA RECORRENTE: VICTOR OSWALDO KONDER REIS ADVOGADO: ALEXANDRE WALTRICK RATES T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA IMPETRADO: GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA IMPETRADO: DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA RECORRIDO: ESTADO DE SANTA CATARINA PROCURADOR: FRANCISCO GUILHERME LASKE E OUTROS EMENTA: OFICIAL DE SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. REGIME JURÍDICO DISTINTO DO SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. INAPLICALIDADE. ENTENDIMENTO DO PLENO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ADIN N 2602/MG. - Os notários e cartórios, na condição de agentes delegados, subordinamse a legislação própria – Lei nº 8.935/94 – editada em obediência ao art. 236, da CF/88. O fato de se sujeitarem a concurso público para ingresso 464 cargo não os torna servidores públicos de qualquer espécie . Como acontece com o regime das concessões de serviço público, o poder concedente reservou-se o poder de fiscalizar a regular prestação do serviço público concedido à iniciativa privada. Tendo a Constituição Federal, no entanto, o cuidado de explicitar que a fiscalização dos tabelionatos e registros públicos, atribuídos ao Poder Judiciário, far-se-á como é próprio ao regime de todos os serviços públicos concedidos, não sobre o serviço enquanto estrutura organizacional, como empreendimento empresarial privado, e sim sobre seu produto destinado ao público, seguindo-se a normatização da legislação da categoria, consubstanciada na Constituição Federal de 1988. Estando evidenciado que o serviço notarial e de registro são atividades públicas, sujeitas às regras do Direito Público, principalmente quanto à legitimação dos seus agentes, sendo, única e tão somente, exercida em caráter privado. 464 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Oficial de serviços notariais e de registro. Regime jurídico distinto do servidor público. Aposentadoria compulsória. Inaplicabilidade. Entendimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal na ADIN nº 2.602/MG. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 15.769/SC. Victor Oswaldo Konder Reis e Estado de Santa Catarina. Relator: Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, 03/02/2005. Diário de Justiça. Santa Catarina, p. 330, 03 out 2005. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 115 E ao exercer função delegada, originalmente de competência do Estado, notários e registradores estão legitimados a praticar, apenas e tão somente, os serviços que lhes foram atribuídos, quer dizer, só possuem legitimidade para realizar os atos que são da competência das funções delegadas; e prestando eles um serviço para o público, deve cumprir em primeiro lugar a sua tarefa, que é a de realizar o bem comum, e somente de maneira secundária busca-se o lucro, pois, o princípio da modicidade é característica destes serviços. 2.5.1 Responsabilidades Por responsabilidade na Administração Pública, pode-se entender a sanção imposta pelo direito ao autor de um ato lesivo à ordem pública465, podendo, tanto o concedente quanto o delegatário serem responsabilizados por tais atos. E, sendo a concessão um instituto oriundo da necessidade de satisfazer pelo melhor modo possível o interesse público, dispõe o concedente de todos os meios necessários para adequá-la ao alcance deste propósito, podendo ser responsabilizado caso não os utilize de forma satisfatória, pois, ele não se despoja e nem poderia fazê-lo, dos poderes requeridos para impor a realização mais conveniente do interesse coletivo466. Com isso, a responsabilidade do Estado é suscetível por atos praticados pelos notários e registradores, não podendo o Estado ficar alheio aos danos causados a coletividade por eles, tendo em vista que os mesmos atuam munidos de atribuições ou poderes a eles concedidos pelo Estado. Revelando a decomposição da responsabilidade do delegatário registral, dimensões civis, administrativas, tributárias e penais; assim, o dano causado pela conduta do registrador, ou preposto, conforme disposto no art. 22 da Lei nº 8.935/94, gera a responsabilidade civil objetiva, que consiste, sinteticamente, no dever de reparação, independentemente de culpa, sendo tal responsabilidade pessoal do registrador já que o ofício registral, isto é, o cartório, não configura pessoa jurídica, não tendo a serventia legitimidade para ser parte no processo. Já na seara criminal a responsabilidade é pessoal do agente, ensejando, em face da dimensão social do 465 466 BASTOS, 2001, p. 345. MELLO, 2004, p. 645. 116 ilícito, a reprimenda do infrator por meio de penas. Registrando-se que a responsabilidade civil, em regra independe da criminal, como dispõe o art. 23 da Lei nº 8.935/94.467 E, em se tratando de responsabilidade tributária é preciso consignar, nos termos do art. 30, XI, da Lei nº 8.935/94, o dever, atribuído ao registrador, de fiscalizar o recolhimento dos impostos incidentes sobre os atos que devem ser praticados na serventia468, entendo-se que fiscalizar, não corresponde a entrar no mérito do encargo tributário, ao qual o ato se refere, mas apenas a exigir o documento expedido pelo órgão federal, estadual ou municipal que tenha competência para tanto. Saliente-se que a inobservância deste dever legal acarreta, de conformidade com o art. 134, VI, do Código Tributário Nacional, a responsabilização tributária do delegatário469. E no que tange à responsabilidade administrativa, ao Poder Judiciário compete em conformidade com o art. 37 da CF/88, a fiscalização dos atos registrais sujeitando-se o registrador as infrações disciplinares com penas que podem chegar, inclusive, a perda da delegação. Aliás, sobre a competência para aplicação pelo Judiciário da pena de perda de delegação, bem ressalta o excerto de ementa advinda do STJ, no Recurso especial, de 10 de maio de 1999, julgado pela Sexta Turma, nos seguintes termos: EMENTA: RESP – ADMINISTRATIVO – SERVENTUÁRIO DE CARTÓRIO EXTRA-JUDICIAL – DEMISSÃO – A atual específica estabelece que a relação entre o titular do cartório e o serventuário é definida pelo CLT. De outro lado, a Constituição da República (art. 236) comanda: “Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, para delegação do Poder Público”. Há, assim, duplo vínculo jurídico. Conseqüentemente, dois conteúdos. Logo, possibilidade de o Poder Judiciário exercer fiscalização (Const. Art. 236, parágrafo 1). Não faz sentido o Judiciário disciplinar e não poder aplicar normas disciplinadoras. A Corregedoria não é mera espectadora do comportamento dos serventuários. O Judiciário pode demitir, como o titular da serventia pode rescindir o contrato de trabalho. (STJ, 6ª Turma, RESP 187.140/SP. Relator: Ministro Luiz Vicente 470 Cernicchiaro, DJ de 10/05/1999, p. 314). 467 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 468 Idem. 469 BRASIL, Código Tributário Nacional, 1999, p. 68. 470 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Resp – Administrativo – Serventuário de Cartório ExtraJudicial – Demissão. Recurso Especial nº 187.140/SP. Alvino Silva Filho e Fazenda do Estado de São Paulo. Relator: Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Sexta Turma, 15/12/1998. Diário de Justiça. São Paulo, p. 314, 10 mai 1999. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. 117 Portanto, podem os servidores públicos no desempenho de suas funções cometerem infrações de ordem administrativa, criminal e civil, conforme a Lei nº 8.027, de 12 de abril de 1990, que trata das normas de conduta dos servidores públicos civis da União, autarquias e fundações públicas471, sendo a sua responsabilização dever genérico da Administração e específico de todo chefe, em relação aos seus subordinados. Resultando, conseqüentemente, a responsabilidade administrativa da violação de normas interna da Administração pelo servidor sujeito ao estatuto e disposições complementares estabelecidas em lei, decreto ou qualquer outro provimento regulamentar da função pública; e que na hipótese do serviço notarial é a própria lei que fixa as disposições que devem ser obedecidas pelo agente delegado. Estando elencadas no art. 30 da Lei nº 8.935/94, os deveres dos notários e oficiais na prestação do serviço, como os deveres de afixar em local visível, de fácil leitura e acesso ao público, as tabelas de emolumentos em vigor; e observar os emolumentos fixados para a prática dos atos do seu ofício, e dar recibo dos emolumentos percebidos472; sendo que estes emolumentos são fixados por lei estadual, corrigindo-se os valores anualmente ou semestralmente por índices de inflação; havendo, portanto, a priori uma tabela de preços, a qual o agente delegado deve obedecer sob pena de cometer crime e infração disciplinar, mesmo que estes emolumentos representem a forma de remuneração dos notários e registradores pelos atos por eles praticados, e cuja regulamentação e regimento são de competência do Estado, conforme a Lei nº 10.169, de 29 de dezembro de 2000.473 E, uma vez cobrado emolumentos acima da tabela vigente, presente estará a tipicidade do fato, e o fato do usuário concordar em pagar emolumento acima do legalmente estabelecido, não afasta a tipicidade da conduta do prestador do serviço, 471 BRASIL. Lei nº 8.027, de 12 de abril de 1990. Dispõe sobre as normas de conduta dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 13 abr 1990. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 11 julho 2005. 472 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 473 BRASIL. Lei nº 10.169, de 29 de dezembro de 2000. Regula o parágrafo 2º do artigo 236 da Constituição Federal, mediante o estabelecimento de normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. Diário Oficial – Seção extra, Brasília, 30 dez 2000. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 118 encontrando-se o usuário em uma situação legal e regulamentar, vale dizer, que os direitos, deveres, vantagens e benefícios dos usuários estando previstos e regulados por normas legais e regulamentares, não podem ser criados ou modificados por acordo entre usuário e prestador do serviço, havendo na hipótese manifesta indisponibilidade de direito. Pois, a cobrança de emolumentos acima da tabela é considerada crime previsto na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que define Crimes Contra a Ordem Tributária, dispondo em seu art. 6º, que constitui crime da mesma natureza vender ou oferecer à venda mercadoria, ou contratar ou oferecer serviço, por preço superior ao oficialmente tabelado, ao fixado por órgão ou entidade governamental, e ao estabelecido em regime legal de controle, sob pena de dois a cinco anos de detenção ou multa474. Com isso, pode e deve o Ministério Público utilizar-se do arsenal penal, para responsabilizar criminalmente os notários e oficiais que cobrarem emolumentos acima da tabela, devendo zelar e intervir pelo respeito dos Serviços Notariais aos direitos inseridos na Constituição Federal e Estadual, diante da relevância pública do serviço. Acarretando, ainda, a inobservância dos deveres funcionais infração disciplinar prevista em lei, sujeitando o infrator às penas disciplinares previstas no art. 32 e 33 da Lei 8.935/94, que podem ser de repreensão, multa, suspensão por noventa dias, prorrogável por mais trinta e a perda da delegação, que serão aplicadas pelo órgão competente que conforme o art. 34, desta lei, é o juiz. Estando o Ministério Público legitimado pelo art.129, II, da CF/88 e pelo art. 37 da lei nº 8.935/94, a receber reclamações dos usuários do serviço e oferecer representação ao juiz competente contra o oficial ou notário que pratica infração disciplinar475. Assim, a responsabilidade civil impõe-se ao servidor de reparar dano causado à Administração por culpa ou dolo no desempenho de suas funções; sendo os notários e oficiais de registro responsáveis pelos danos que eles ou seus prepostos causarem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, estando assegurado 474 BRASIL, Código Tributário Nacional, 1999, p. 369. BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 475 119 o direito de regresso pela Administração Pública contra eles na hipótese de dolo ou culpa dos prepostos, portanto, os notários e oficiais serão os responsáveis em relação aos usuários do serviço pelos eventuais danos causados durante a prestação do serviço e não a serventia, podendo o Estado também ser acionado pelos atos praticados pelos mesmos. Enquanto que a responsabilidade criminal será individualizada conforme preceitua o art. 24 da Lei nº 8.935/94, aplicando-se, no que couber, a legislação relativa aos crimes contra a Administração Pública previstos nos arts. 312 a 359 do Código Penal. E mesmo estando a fiscalização dos serviços notariais e de registro atribuído ao Poder Público, a Lei nº 8.935/94 em seu art. 37, também prevê a sua fiscalização pelos juízes competentes dos atos previstos nos art. 6º a 13, assegurando-se direito de representação aos interessados, tratando-se de uma fiscalização interna do serviço, mais precisamente, dos atos praticados no interior do cartório. Atribuindo a lei privativamente ao Poder Judiciário a tarefa de fiscalização dos atos praticados pelos agentes delegados, contudo, assegurando a qualquer interessado o direito de representar e provocar a fiscalização do Poder Judiciário que é o responsável pela fiscalização do serviço em seu aspecto interno476. Possuindo os serviços extrajudiciais atribuições e competências restritas ao disciplinado em lei, porque, sendo públicos os serviços outorgados ao agente tabelião ou registrador, este somente estará legitimado a proceder nos limites da lei que criou seu serviço e o delegou, sendo por isso, os crimes praticados pelo oficial do Registro de imóveis e por funcionários que estão sob suas ordens, também considerados crimes contra a Administração Pública, prevendo, por exemplo, a Lei nº 6.766/79, que registrar loteamento ou desmenbramento não aprovado por pelos órgãos competentes; registrar o compromisso de compra e venda, a cessão ou promessa de cessão direitos; efetuar registro de contrato de compra e venda de loteamento ou desmembramento não registrado, são figuras delituosas que podem ser praticadas pelo oficial do Registro de imóveis ou seus funcionários consideradas 476 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 120 crimes contra a Administração477, e como tais, devem ser combatidas, evitando-se a sua proliferação. Desta forma no que concerne à responsabilidade dos oficiais de registros, destacase na atual Lei de Registros Públicos o art. 28, que dispõe que além dos casos expressamente consignados, os oficiais são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem, pessoalmente ou pelos prepostos ou substitutos que indicarem, por culpa ou dolo, aos interessados no registro478, independendo a responsabilidade civil da criminal pelos delitos que cometerem. Fixando, atualmente, a Constituição Federal o critério da responsabilidade civil na prestação de serviço público, deixando claro que a responsabilidade do Estado sempre subsistirá, ainda que se trate de ato praticado por servidor contratado, funcionário de fato ou temporário, qualquer que seja a forma de sua escolha ou investidura, pelo disposto em seu § 6º do art. 37, que determina que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado, prestadores de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o funcionário responsável nos casos de dolo ou culpa479. Considerando-se, portanto, pela posição jurídica que ocupam no serviço público, os atos do notário e do oficial de registro, atos do Estado, precisamente por exercerem esses agentes, poderes e atividades inerentes ao próprio Estado, no atendimento dos interesses da comunidade; sendo esses atos normatizados pelo Poder Público e fiscalizados pelo Poder Judiciário, e nestes casos, sujeita-se o notário ou registrador a pratica de ato mesmo que por sua convicção jurídica entenda não ser o ato acessível a seu ofício, ou contrário às normas jurídicas vigentes, como no caso do procedimento da dúvida descrito no art. 198 da Lei nº 6.015/73, ao ser julgada improcedente480. Atentando-se ainda, que tanto a serventia quanto a delegação podem ser extintas por diversos motivos, e que ambas se diferenciam. Podendo a delegação se extinguir nos termos da Lei nº 8935/94, pela morte do delegatário, renúncia e perda, 477 478 479 480 JUNQUEIRA, 1997, p. 86. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 959. BULLOS, 2003, p. 665. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 1.005. 121 bem como pela aposentadoria, seja facultativa ou por invalidez481. E, no que toca à aposentadoria compulsória, o STF vem entendendo, reiteradamente, que é aplicável ao registrador o art. 40, II, da CF/88, nos seguintes termos: EMENTA: Aposentadoria dos titulares das serventias de notas e registros. Aplicação a eles da aposentadoria compulsória prevista no artigo 40, II, da Constituição Federal. - Há pouco, o Plenário desta Corte, por maioria de votos, ao julgar o RE 178.236, relator o Sr. Ministro Octavio Gallotti, decidiu que os titulares das serventias de notas e registros estão sujeitos à aposentadoria compulsória prevista no artigo 40, II, da Constituição Federal. Entendeu a maioria deste Tribunal, em síntese, que o sentido do artigo 236 da Carta Magna foi o de tolher, sem mesmo reverter, a oficialização dos cartórios de notas e registros, em contraste com a estatização estabelecida para as serventias do foro judicial pelo art. 31 do ADCT; ademais, pelas características desses serviços (inclusive pelo pagamento por emolumentos que são taxas) e pelas exigências feitas pelo artigo 236 da Carta Magna (assim, o concurso público de provas e títulos para provimento e o concurso de remoção), os titulares dessas serventias são servidores públicos em sentido amplo, aplicando-se-lhes o preceito constitucional relativo à aposentadoria compulsória determinada pelo citado artigo 40, II, da Constituição Federal. (STF,1ª Turma, RE-189736 / SP, Relator Ministro MOREIRA ALVES, DJ de 482 27-09-96, p.36168) . Por outro lado, a extinção da serventia requer, a teor do art. 44 da Lei dos Notários e Registradores, absoluta impossibilidade de provimento em face de desinteresse ou inexistência de candidatos. Neste caso, suas atribuições serão anexadas à serventia de mesma natureza mais próxima ou àquela localizada na sede do Município, podendo a lei extinguir a serventia registrária, nos exatos termos do art. 48, XI, da CF/88.483 Não se podendo, portanto, negar a responsabilidade objetiva do Estado com relação aos atos praticados pelos notários e registradores, cujos atos, praticam eles não em seus próprios nomes, mas no do Estado, por força da delegação que lhes é conferida na forma da lei. 481 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 julho 2005. 482 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Aposentadoria dos titulares das serventias de notas e registros. Aplicação a eles da aposentadoria compulsória prevista no artigo 40, II, da Constituição Federal. RE 189.736-8/SP. Antônio Rubião Silva Junior e Estado de São Paulo. Relator: Ministro Moreira Alves, 1ª Turma, 26/03/1996. Diário de Justiça. São Paulo, p. 357, 27 set 1996. htrp://www.stf.gov.br>. Acesso em 18/04/2005 483 BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 julho 2005. 122 2.6 DOCUMENTOS Inicialmente o sistema previsto no século XX pelo legislador pátrio para conferir autenticidade, perpetuidade e publicidade dos documentos particulares, fixou-se na outorga da atribuição a oficiais de registros públicos para a trasladação, por transcrição, nos livros cartorários, da forma e conteúdo daqueles documentos, de modo que, registrados no cartório competente, passava a contar com verdadeira autenticidade, ou seja, valor de prova e presunção de veracidade de seu conteúdo, oponível a terceiros e, em razão de sua prenotação, em livro de protocolo, cronológico, também de prova de sua existência e de sua data. Tendo, posteriormente, ainda no século XX, com o surgimento do microfilme, capaz de preservar, integralmente, em fotogramas, a forma e o conteúdo dos documentos, garantindo, inclusive, maior segurança à cronologia dos registros, porque impossível deixar-lhes espaços em branco, para preenchimento posterior, conferiu a Lei nº 5.433, de 08 de maio de 1968, regulamentada pelo Decreto nº 64.398, de 24 de abril de 1969, aos cartórios de registro de títulos e documentos a faculdade de efetuar seus registros através desse novo meio, de modo a conferir, não só mais segurança e irretorquível fidelidade ao original, como, também, maior agilidade ao serviço.484 Havendo no sistema cartorário, nítida distinção entre os termos instrumento, papel e documento, considerando-se instrumento como uma forma especial dotada de força orgânica para realizar ou tornar exigível um ato jurídico, tendo sentido mais restrito do que o documento, sendo uma das espécies de documento, pela quais duas ou mais pessoas estabelecem uma relação jurídica, mediante forma escrita485, como no caso da procuração, dando forma a ato jurídico, gerador de direitos e/ou obrigações das partes. Enquanto que papel é o meio material de prova de menor relevância no mundo jurídico, por não conter direitos ou obrigações, mas que, por qualquer motivo, pode igualmente ser objeto de registro para mera conservação, publicidade e prova de data da existência de um escrito particular. 484 BRASIL. Lei nº 5.433, de 08 de maio de 1968. Regula a microfilmagem de documentos oficiais e dá outras providências. Diário Oficial de Justiça. Brasília, 10 mai 1968. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 16 julho 2005. 485 JUNQUEIRA, 1997, p. 144. 123 Enfoque importante dessa distinção está em que, se nos registros imobiliários, são fundamentais, conteúdo e forma; no registro de títulos e documentos essa importância é relativa, porque, às vezes, o objeto da proteção jurídica, o interesse juridicamente tutelado é a proteção ao meio, ao início de prova por escrito contido em uma declaração ou escrito particular. Considerado para efeito registral o documento como a forma escrita apenas dotada de relativa força probante, contribuindo para verificação dos fatos, podendo abranger qualquer espécie de reprodução escrita, como uma certidão ou translado, enfim, é qualquer meio de prova material. Assumindo o seu termo na terminologia jurídica uma infinidade de denominações, segundo a forma por que se apresenta, ou relativa à espécie em que se constitui. Assim, em relação à maneira por que o documento se produz, diz-se público ou particular, este é todo aquele que não exige solenidade e pode ser elaborado pela própria pessoa que o escreveu e palas partes, sem a intervenção do oficial público486, pois pelo art. 221 do Código Civil, o instrumento particular feito e assinado ou somente assinado por quem esteja na livre disposição de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor487; e aquele é todo o documento elaborado por serventuários públicos, como notários tabeliões, oficiais públicos, entre outros, segundo certas formalidades legais exigidas para a sua autenticidade e legalidade; sendo ato solene que tem presunção total, fé pública e deve ser inscrito em livros próprios que são conservados e guardados ad perpetuam488. Depreendendo-se que, tendo o nosso sistema legal atribuído aos registradores de títulos e documentos a legitimidade para, através da transcrição em seus livros de registro ou perpetuação em sistema de microfilmagem conferir autenticidade aos documentos particulares, a eles compete registrar e, com esse procedimento, conferir autenticidade aos documentos particulares em meio papel ou digital, pois semelhante não é igual, cópia ou reprodução não, são originais, mas, os atos praticados por tabeliões sob fé pública, fazem prova plena para todos os efeitos 486 487 488 JUNQUEIRA, 1997, p. 144. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 77. JUNQUEIRA, op. cit., p. 145, nota 486. 124 legais, tendo a mesma validade que os documentos originais489, desta forma, documentos públicos são os que procedem de autoridades públicas, ou de pessoas com fé pública, dentro dos limites das respectivas competências e atribuições, e documentos particulares são aqueles que não têm tal procedência. Sabendo-se que os atos jurídicos provam-se por qualquer meio material de provar um direito ou uma obrigação nele inserida, seu conteúdo e sua forma têm relevância reduzida, não sendo razoável obstar o registro do meio de prova, o qual será objeto de apreciação judicial competente; poderá uma parte ter legitimo interesse de registrar esse início de prova por escrito, esse documento, para lhe dar publicidade ou autenticidade, fazendo prova de sua data; nada mais razoável, que abrir as portas do serviço extrajudicial, para assim fazê-lo. Não sendo o sistema de registros um fim em si mesmo, mas um meio de atender às necessidades das partes, da sociedade, do povo, seu usuário. Ademais, é certo que a valoração da prova é da competência do Poder Judiciário, no caso concreto, que pelo princípio da razoabilidade, não é razoável obstar registro de meio de prova, cujo efeito merecerá apreciação judicial, futura. Visando o registro a segurança jurídica das partes, mesmo que não apresente segurança total, isto é, prova absoluta do domínio. Garantido, todavia, a publicidade e a prova da data, na qual foi exarado, pois, uma das principais funções do Registro de Imóveis, além de registrar e cadastrar o imóvel é dar publicidade dos atos e fatos que envolvem os imóveis registrados490, em face da necessidade de uma maior transparência aos atos de registro, em garantia do princípio da segurança jurídica necessária, entregando-a aos operadores do direito, em especial, e ao povo, em geral. 2.6.1 Autenticidade e reconhecimento O art. 1º da Lei nº 6.015/73, com redação dada pela Lei nº 6.216/75, dispõe que os serviços concernentes aos Registros Públicos, isto é, ao registro civil de pessoas naturais, o registro civil de pessoas jurídicas, o registro de títulos e documentos e o 489 490 JUNQUEIRA, 1997, p. 145. Ibid., p. 155. 125 registro de imóveis, o registro de propriedade literária e artística, serão estabelecidos pela legislação civil para autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficando a ela sujeitos491. Não tendo a autenticidade de um ato ou documento nada a ver com a verdade das declarações nele contidas; estas podem ser simuladas, viciadas por erro, dolo ou fraude, mas nem por isto o documento deixará de ser autêntico, desde que ele provenha realmente da pessoa nele indicada como autor. Daí dizer-se que a certeza da providência do documento do autor indicado chama-se autenticidade, não visando à certeza legal provar uma verdade, mas proporcionar uma utilidade que possa ser aceita, enquanto plausível de corresponder à realidade. E no âmbito da publicidade registral, portanto, a autenticidade de um ato ou documento, decorre de sua prática ou feitura por funcionário ou agente público competente observada as formalidades legais. Conferindo o registro autenticidade ao instrumento, assegurando a validade do conteúdo e da data, pelo menos até prova em contrário, de sua falsidade material. Não confundindo a autenticidade, desta forma, com a fé pública, pois, esta é a qualidade inerente a atos efetivados ou a documentos expedidos por servidor ou agente público competente; e, aquela é a certeza da autoria e da assinatura de determinado ato jurídico ou documento. A fé pública representa a verdade, ou melhor, uma verdade presumida, júris tamtum, porquanto admite prova em contrário. Ligando-se a autenticidade à autoria de um ato ou documento; enquanto a fé pública resulta do cargo ou função que exerce o agente público. Sendo a autenticidade mais abrangente do que a fé pública, pois, é sobre a autenticidade que repousa a fé pública492. Há documento original autêntico que possui a autoridade de prova; e há a mera cópia autenticada de documento, que é sua mera reprodução, que com ele não se confundem e tem diversos efeitos. Assim, uma coisa é dar autoridade e efeito de prova a um documento particular original, ao arquivá-lo em registro público, com presunção de veracidade e efeitos perante terceiros; outra, completamente diferente, 491 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 953. BONA, Avelino de. Loteamentos irregulares face aos procedimentos cartorários, Porto Alegre: Sagra – DC Luzzatto, 1996. p. 25-26. 492 126 é atestar a conferência desse documento com seu original. Considerando-se, portanto, autêntico o documento que faz autoridade de prova ou de solenidade, por expressar, só por si, a observância das formalidades a que estava sujeito. A autenticidade, portanto, é a qualidade do documento autêntico, isto é, o documento original, com o qual terá de ser confrontado obrigatoriamente, a cópia dele extraída, e apresentada para conferência por Tabelião de Notas, e que será autenticada; não sendo a cópia, portanto, documento autêntico, e sim, cópia autenticada. Não sendo o documento autêntico em sua essência, é autenticado. Desta forma, a cópia não é o documento autêntico, porque esse será sempre o original; ela foi especialmente autenticada para os fins aos quais assim se admite seja exibida. Não afirmando o registro, portanto, a autenticidade dos negócios imobiliários, ante o fato do oficial, ou preposto seu, efetuar um exame meramente formal dos documentos apresentados pelo requerente, e, conseqüentemente, não obsta que, às vezes venha a efetuar assentos 493 imobiliários baseados em escrituras falsas. Assim, a autenticação de documentos originais, para gerar autoridade documental semelhante, em se tratando de instrumentos ou escritos particulares, somente se adquire através de sua transcrição em registro de títulos e documentos, como está expresso no nosso ordenamento jurídico no art. 127, I e VII, da Lei nº 6.015/73494 e na Lei nº 5.433/68 que rege a microfilmagem. Não ocorrendo à autenticação de fotocópias por certificação, mas por atestado, e tanto os atos de autenticação de cópias como os de reconhecimento de firmas possuem natureza de mera atestação e não de certificação como pretendem alguns notários, porque somente têm natureza de certificação os atos que notários e registradores praticam por meio de extração de seus arquivos, de seus livros, onde constam perpetuados os registros, os conteúdos dos documentos por eles lavrados ou registrados. Podendo os Tabeliões de Notas somente extrair certidões dos atos por eles lavrados e que, portanto, constam arquivados em seus livros de notas, pois, os atos praticados por eles sob fé pública, fazem prova plena para todos os efeitos legais, tendo a mesma validade que os documentos originais segundo estipula os art. 215 à 493 494 DINIZ, 2004, p. 23. BRASIL. Código Civil, 2003, p. 987-988. 127 218 do Código Civil495. Desta forma, o documento, instrumento ou título particulares, apresentados em meio papel, apresentados aos tabeliões para mera conferência, ou atestação, jamais darão ensejo à criação de um novo original. Sabendo disso, o legislador pátrio criou o serviço de registro público de títulos, documentos e outros papéis, onde o interessado deverá fazer transcrever os instrumentos particulares, para valer como prova das obrigações convencionais de qualquer valor e, facultativamente, de quaisquer documentos, para sua conservação, de modo a conferir, a esses, a necessária autenticidade, autoridade de prova, com presunção de veracidade, que nada mais é que autorizar, legalizar juridicamente, comprovar legalmente a veracidade de alguma coisa. Indicando a autenticidade do documento ou do ato que ele é verdadeiro, exato e está legal, pois, autêntico, significa todo ato que se faz revestido das formalidades legais ou das solenidades exigidas para que possa surtir sua eficácia jurídica.496 Portanto, havendo lei especial, atribuindo somente aos registradores de títulos e documentos a legitimidade para conferir autenticidade aos documentos particulares, não se pode extrapolar da atribuição notarial, com utilização das atas notariais, que servem, apenas, para autenticar fatos presenciados pelo Tabelião de Notas, portanto, não escritos pré-existentes, não documentos, com os quais não se confundem, para mera conferência dos originais com cópias, em qualquer meio, porque essas sempre serão cópias e, como tal, não poderão gerar novas cópias autenticadas, eis que, para nova extração dessas, far-se-á necessário o novo confronto com os originais. Ficando evidente que nos serviços notariais e de registro, tal como sucede em relação ao agente na Administração Pública, ao delegado do serviço somente é permitido fazer o que a lei autoriza, pois, na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a 495 JUNQUEIRA, 1997, p. 145. BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 julho 2005. 496 128 lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza497. Sendo inegável que o serviço notarial e de registros se subordinam rigorosamente ao princípio constitucional da legalidade, sendo distintas no quadro das atribuições legais, e da competência normativa, as atividades de cada categoria, cumprindo exigir-se a rígida obediência aos limites da atuação dos agentes delegados, que, embora não sejam servidores públicos, pertencem ao quadro de colaboradores do Poder Público498. 2.7 O USUÁRIO O serviço notarial e de registro é atividade bem presente na vida de pessoas e empresas. E do nascimento à morte, passando pelos diversos atos e fatos jurídicos sujeitos a registro, tem o indivíduo necessidade de lançar mão desta espécie de serviços que o Estado, por delegação, outorga a determinadas pessoas para prestar à sociedade, o que torna o serviço notarial uma espécie de atividade inerente à Administração Pública, embora seja delegada e exercida em caráter privado. E como toda relação intersubjetiva, o serviço notarial e de registro também suscitam conflitos que, vez por outra, podem acabar nas barras dos tribunais, como órgão último na resolução de disputas, sendo eles atualmente regulado por legislação sobre registros público federal e estadual própria. Devendo, contudo, que se considerar a categorização do serviço notarial e de registro também como modalidade de relação de consumo para efeitos de aplicação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, devendo-se fundamentar a tese de que o Notário, o Oficial de Registro, o Tabelião, são prestadores do serviço notarial e registrário, podendo e devendo ser enquadrados como fornecedores de cartoriais, nos precisos termos do seu art. 3º da Lei 8.078/90, que enquadra como tal toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, criação, construção, transformação, 497 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 26. ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2001. p. 82. 498 MEIRELLES, 2001, p. 75. 129 importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços499; sendo os seus consumidores os usuários, indivíduos que arcarão com o pagamento das tarifas a fim de serem servidos500. E estando a atividade cartorial particularizada como de caráter privado, não restam dúvidas de que consiste num serviço sujeito à remuneração de quem o presta notadamente um ente particular, o que o cerca de uma das características essenciais da atividade de fornecimento de serviços. E por consistir a atividade cartorial no registro de nascimentos, casamentos, óbitos, registro de documentos diversos, de bens imóveis e/ou móveis, entre outros, bem como a expedição de certidões diversas referentes aos seus assentamentos, assim como a abertura e o reconhecimento de firma, entre outros; para caracterizar o prestador de serviço notarial e de registro como fornecedor de serviços nos termos do art. 3º do CDC, é mister aplicar os elementos do conceito legal à atividade. Primeiramente, a lei protetora dos hipossuficientes estendeu a todas as pessoas de direito público ou privado a possibilidade de serem enquadradas como fornecedores, pois o próprio enunciado da lei expurga qualquer possibilidade de exclusão dessa caracterização ao prestador de serviço notarial pelo argumento de ser a atividade parte da Administração Pública e regulada por leis específicas. Tendo o serviço notarial as suas regras estabelecidas pela Constituição Federal, aplicando-se a Lei dos Registros Públicos e a Lei nº 8.935/94, o que não exclui, de modo algum, o alcance concomitante da Lei nº 8.078/90, desta forma, pode-se dizer que o prestador de serviço notarial constitui-se em fornecedor de serviços sujeito a toda regulamentação apresentada pela referida lei501. Não podendo a lei pelo art. 5º, XXXV, da CF/88, excluir da apreciação do Poder judiciário lesão ou ameaça a direito a quem quer que seja502, assim o interessado de ação judicial pode fazer valer os seus direitos, quando relegados, pelo prestador de serviço público ou utilidade pública, podendo demandar inclusive o próprio 499 BRASIL, Leis etc. Constituição federal, Código de defesa do consumidor. Organizador: Marques, Fernando de O. 6. ed. Rev. Atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 274. 500 MELLO, 2004, p. 660. 501 BRASIL, Constituição federal, Código de defesa do consumidor, 2005, p. 274. 502 BULOS, 2003, p. 219. 130 Estado503, por ser o responsável pela concessão dos serviços, do qual o usuário é legítimo destinatário, assim, dispõe ele da via cominatória contra o concessionário para exigir-lhe a prestação pessoal a que se comprometeu perante a Administração Pública504, sendo ela com base no art. 287 do Código de Processo Civil, a via adequada para o usuário exigir o serviço que lhe for negado pelo Poder Publico ou por seus delegados, sob qualquer modalidade. Contudo, não é somente a obtenção do serviço que constitui direito do usuário, mas também a sua regular prestação505. Efetivando-se a tutela dos interesses do usuário, em caráter individual, coletivo ou difuso, em juízo, após o advento da Lei nº 8.078/90, além da via cominatória, através de outros mecanismos dispostos em seus arts. 81 a 104, que tratam da defesa do consumidor em juízo, instituindo as ações coletivas para a defesa de interesses individuais e homogêneos e das ações de responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços, tratando inclusive da legitimação ordinária e extraordinária para a propositura de ação506. Tendo estes direitos sido ampliados ainda mais com a Emenda Constitucional nº 19/98 que deu nova redação ao § 3º do art. 37 da CF/88, para determinar que a lei discipline as formas de participação do usuário na Administração Pública direta e indireta, regulando especialmente as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, o acesso a informações sobre atos de governo e a disciplina da representação contra a negligência ou abuso no exercício de cargo, emprego ou função na administração pública507. Não olvidando o consumidor de também lançar mão da legislação específica para proteger os seus direitos em face do prestador de serviços notariais, de acordo com o disposto no art. 7º da Lei 8.078/90, revolucionando ele não somente a relação do consumidor com o fornecedor, mas também do cidadão com o Estado, na medida em que entre eles ocorra relação classificada como de consumo. Com isso, algumas teses tentam explicar a situação do usuário do serviço público, sendo a mais adequada a que considera a situação legal e regulamentar do usuário potencial e do efetivo, que mostra que todos os direitos, deveres, vantagens e benefícios dos 503 504 505 506 507 MELLO, 2004, p. 660. Ibid., p. 325. Ibid., p. 326. BRASIL, Constituição federal, Código de defesa do consumidor, 2005, p. 290-294 passim. MELLO, op. cit., p. 327, nota 503. 131 usuários estão previstos e regulados por normas legais e regulamentares, nada podendo ser criado ou modificado por acordo entre usuário e prestador do serviço, constituindo direito público subjetivo do usuário o de exigir não só a simples prestação do serviço, mas também o de exigir prestação adequada, seja da Administração Pública, seja de seu delegado.508 Assim pelo art. 7º, I, da Lei nº 8.935/94, pode aquele a quem for negado o serviço adequado ou que sofrer a interrupção, judicialmente, exigir em seu favor o cumprimento da obrigação do concessionário inadimplente, exercitando um direito subjetivo próprio; devendo em conformidade com esta lei, haver representação dos usuários nos sistema de fiscalização dos serviços concedidos; e, conforme o inciso, III, deste artigo, atendidas as condições relativas à prestação do serviço e dentro das possibilidades normais dele, os usuários têm direito ao serviço e, inclusive, de escolhê-lo dentre o de distintos prestadores, quando for o caso, não podendo negarlhes o concessionário o serviço ou interromper a prestação, salvo, nas hipóteses previstas nas próprias cláusulas regulamentares, desta forma, cumpridas pelo usuário as exigências estatuídas, o concessionário está constituído na obrigação de oferecer o serviço de modo contínuo e regular509. Reconhecendo-se hoje os direitos dos usuários em qualquer serviço público ou utilidade pública como fundamento para a exigibilidade de sua prestação nas condições regulamentares e em igualdade com os demais utentes510. Tendo a proteção a esses direitos sido consagrada no art. 175, parágrafo único, II, da CF/88, os quais foram contemplados no art. 7º da Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que regula o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos511, enquanto que o Decreto nº 3.507, 13 de junho de 2000, dispôs sobre o estabelecimento de padrões de qualidade do atendimento prestado aos cidadãos pelos seus órgãos e entidades, definindo as diretrizes normativas para o 508 MELLO, 2004,p. 326. Ibid., p. 660. 510 Ibid., p. 325. 511 BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previstos no artigo 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 fev 1995. Brasília, 11 set 1990. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 julho 2005. 509 132 estabelecimento de tais padrões, instituindo o Sistema Nacional de Avaliação da Satisfação do Usuário dos Serviços Públicos.512 2.8 MINISTÉRIO PÚBLICO Atualmente pelo art. 127 da CF/88 e o art. 1º da Lei nº 8.625/93 pode-se dizer que o Ministério Público é uma instituição permanente essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis513. Tendo por princípios institucionais, a unicidade, significando que os seus membros integram um só órgão sob a direção única de um só Procurador-geral, contudo, havendo-a somente dentro de cada Ministério Público; a indivisibilidade, sendo o Ministério Público uno, pois, seus membros não se vinculam aos processos nos quais atuam, podendo ser substituídos uns pelos outros de acordo com as normas legais; o princípio da independência ou autonomia funcional, haja vista que, ele é independente no exercício de suas funções, não ficando sujeito às ordens de quem quer que seja, somente devendo prestar contas de seus atos à Constituição, às leis e à sua consciência; e o princípio do promotor natural, sendo ele quem deve atuar no processo, intervindo de acordo com o seu entendimento pelo zelo do interesse público, garantia esta destinada a proteger, principalmente, a imparcialidade da atuação do órgão, tanto em sua defesa quanto essencialmente em defesa da sociedade, que verá a Instituição atuando técnica e juridicamente514. Tendo ele a sua razão de ser na necessidade de ativar o Poder Judiciário, em pontos em que este renasceria inerte porque o interesse agredido não diz respeito às pessoas determinadas, mas a toda a coletividade. Mesmo com relação aos indivíduos, é notório o fato de que a ordem jurídica por vezes lhes confere direitos sobre os quais não podem dispor. Surge daí a clara necessidade de um órgão que 512 BRASIL. Lei nº 3.507, de 13 de junho de 2000. Dispõe sobre o estabelecimento de padrões de qualidade do atendimento prestado aos cidadãos pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta, indireta e fundacional e dá outras previdências. Diário Oficial da União. Brasília, 14 jun 2000. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 julho 2005. 513 BULOS, 2003, p. 1.086. 514 MORAES, 2004, p. 518-519 passim. 133 zele tanto pelos interesses da coletividade quanto pelos dos indivíduos, estes apenas quando indisponíveis. Trata-se, portanto, de instituição voltada ao patrocínio desinteressado de interesses públicos, assim como de privados, quando merecerem um especial tratamento do ordenamento jurídico515. Ampliando o art. 127 a 130 da CF/88 as funções do Ministério Público, sempre em defesa dos direitos, garantias e prerrogativas da sociedade, transformado-o em defensor da sociedade, tanto no campo penal com a titularidade exclusiva da ação penal, quanto no campo cível como fiscal dos demais Poderes Públicos e defensor da legalidade e da moralidade administrativa, inclusive, com a titularidade do inquérito civil e da ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, sendo o rol constitucional exemplificativo, o que possibilita ao Ministério Público exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade constitucional, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas516. Desta forma, a Constituição Federal em seu art. 127 atribuiu ao Ministério Público dentre outras tarefas a de promover a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais517, e no art. 129 e incisos, as funções institucionais, como zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nela, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; prosseguindo a norma indicando o instrumental jurídico, já existente na legislação, particularizando as hipóteses de ação, e assim, podendo o Ministério público promover, como já dito, o inquérito civil e a ação civil pública518, sendo ele comparado a um guardião dos direitos constitucionais diante do funcionamento do serviço de relevância pública. Em suma, o Ministério Público cuida para que os serviços de relevância pública não violem, durante o seu funcionamento, os direitos constitucionais dos usuários desses serviços. 515 516 517 518 BASTOS, 2001, p. 428. MORAES, 2004, p. 520-521 passim. BULOS, 2003, p. 1.086. Ibid., p.1.097-1.104. 134 Sendo esta legitimidade do Ministério Público prevista na Constituição Federal sido repetida em leis federais, pormenorizando assim a ação ministerial, como o caso da Lei de Registros Públicos, que em artigos esparsos consagra um tipo de fiscalização interna e concorrente com o Poder Judiciário, como nas hipóteses de habilitação de casamento, consagrada no art. 67 e parágrafos; na dispensa de proclamas no § 2º do art. 69; na fiscalização da averbação do regime de separação de bens nos casamentos no art. 245, e em outros dispositivos da mesma lei; e da Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, que instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispondo sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados, e a Lei Complementar Federal nº 75, de 26 de novembro de 1993, que dispôs sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União519, ficando cada Estado liberado para instituir a sua Lei Orgânica do Ministério Público. Atribuindo a Lei nº 8.628/93 ao Ministério Público em seu art. 25, semelhantemente a Constituição Federal, a incumbência de promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos; e, em seu art. 27, a tarefa de exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhe o respeito; pelos poderes estaduais ou municipais; pelos órgãos da Administração Pública Estadual ou Municipal, direta ou indireta; pelos concessionários e permissionários de serviço público estadual ou municipal; por entidades que exerçam outra função delegada do Estado ou do Município ou executem serviço de relevância pública.520 Cabendo ao Ministério Público no exercício destas atribuições, entre outras providências, receber notícias de irregularidades, petições ou reclamações de qualquer natureza, promover as apurações cabíveis que lhes sejam próprias e dar519 MORAES, 2004, p. 516. BRASIL. Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 15 fev 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. 520 135 lhes as soluções adequadas; zelar pela celeridade e racionalidade dos procedimentos administrativos; dar andamento, no prazo de trinta dias, às notícias de irregularidades, petições ou reclamações; promover audiências públicas e emitir relatórios, anual ou especiais, e recomendações dirigidas aos órgãos e entidades mencionadas do art. 27 da Lei 8.625/93, requisitando ao destinatário sua divulgação adequada e imediata, assim como resposta por escrito. E, ainda, pelo art. 81 e art. 110, desta lei, a defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas, protegendo os interesses individuais, desde que homogêneos e tratados coletivamente521, pois, ele deve zelar para que direitos constitucionais sejam respeitados pelos prestadores de serviços de relevância pública. Assim, além de garantidor e fiscalizador da separação dos Poderes, o legislador constituinte conferiu ao membro do Ministério Público funções de resguardo ao status constitucional dos indivíduos, armando-o de garantias que possibilitassem o exercício daquelas e a defesa destes522, devendo ele preservar este status. Sendo os direitos dos usuários, direitos cívicos, consistentes no poder de exigir da Administração Pública ou de seu delegado, o serviço que um ou outro se obrigou a prestar individualmente, desta forma, os usuários do serviço notarial também são detentores de direitos públicos subjetivos de exercício pessoal quando se tratar de serviço uti singuli, tratando do direito de poder exigir em juízo a prestação do serviço ou a reparação de dano sofrido523. Formando estes usuários uma categoria, uma classe, e passando a serem visualizados como um grupo, como uma coletividade enquanto usuários em potencial e efetivo do serviço notarial, atingindo uma categoria determinada ou pelo menos determinável de indivíduos, como a dos associados de uma entidade de classe, a dos consumidores lesados no uso de algum produto. Estando o Ministério Público legitimado a defender tal grupo, sob o argumento dos usuários dos serviços serem titulares de um direito coletivo. Pois, podemos, exemplificativamente, dizer que os usuários do serviço notarial em um determinado 521 BRASIL. Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 15 fev 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. 522 MORAES, 2004, p. 522. 523 MELLO, 2004, p. 325. 136 período são identificáveis, pois pelos atos praticados será perfeitamente possível identificar quem foram as pessoas que faleceram, nasceram ou casaram; enquanto no que diz respeito a uma propaganda enganosa veiculada pela televisão impossível será identificar-se os telespectadores da emissão. Assim, existe uma categoria de pessoas que são os usuários em potenciais e os efetivos, posto que o serviço notarial esta a disposição dos mesmos, existindo-se assim a categoria dos usuários do serviço público notarial, incumbindo ao Ministério Público defender o direito de classe, de toda categoria de usuários ou consumidores efetivos e potenciais do serviço notarial contra os abusos cometidos pelo agente delegado. Surgindo o Ministério Público, naturalmente, como instituição eleita pelo constituinte para defender o cidadão de violações às regras normativas vigentes sendo até encarregado de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos constitucionalmente assegurados, estando pelo art. 127 da CF/88 legitimado a agir em função da presença do interesse social que existe na atividade notaria, que em sentido amplo, é o interesse que consulta à maioria da sociedade civil; o interesse que reflete o que esta sociedade entende por bem comum; o anseio de proteção a res pública; a tutela daqueles valores e bens mais elevados, os quais essa sociedade, espontaneamente, escolheu, como sendo os mais relevantes. E, por excelência a Ação Civil Pública, Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, em interação com os arts. 90 e 110 do Código de Defesa do Consumidor, é o meio adequado de atuação do Ministério Público face ao serviço notarial. Estando conforme o art. 83 da Lei 8.078/90, o Ministério Público autorizado a utilizar todos os tipos de ações, para propiciar o efetivo respeito dos serviços notariais face aos direitos constitucionais assegurados aos usuários do serviço524, tais como, gratuidade do registro civil prevista no art. 5º, LXXVI, da CF/88525. Podendo ajuizar ação civil, fundada no art. 129, III, da CF/88, com preceito cominatório, contra o oficial ou notário titular da serventia que se recusa a cumprir as normas regulamentares do serviço previstas na lei. Sendo possível em nosso sistema, a defesa dos cidadãos contra as investidas do Poder Público com a introdução do mandado de segurança e do Código de Defesa do Consumidor ao 524 525 BRASIL, Constituição federal, Código de defesa do consumidor, 2005, p. 291. BULOS, 2003, p. 385. 137 falar que poderão ser utilizados todas as ações necessárias a tutelar os direitos nele assegurados e o art. 32 da Lei nº 8.625/93 determinar que compete aos promotores de justiça, impetrar mandado de segurança.526 Detendo, portanto, o Ministério Público um vasto arsenal administrativo que lhe permite atuar com eficiência, como o inquérito civil e o procedimento investigatório, pois, o órgão ministerial muitas vezes não tem elementos suficientes para instauração do inquérito civil, podendo, então, instaurar um procedimento investigatório valendo-se dos dispositivos constitucionais previstos no art 129, VI e VIII, da CF/88, e art. 26, I, letra "a", IV e V da Lei nº 8.625/93. Podendo o procedimento investigatório ser de natureza criminal, ambiental, do consumidor, do patrimônio público, enfim de qualquer tipo, importando, para isso, tão somente que o objeto da investigação esteja no rol das atribuições do Ministério Público, que apesar de deficiências materiais, deve agir, buscar provas dos fatos, na defesa judicial dos interesses considerados relevantes da sociedade através de procedimento administrativo-investigatório, mostrando-se ativo, diligente e dinâmico. Agindo com rigor e cautela quando ocorrerem denúncias de irregularidades a fim de colher com rapidez e precisão as provas necessárias para a adoção de providências. Desta forma, o Ministério Público tomando conhecimento de irregularidades seja através de reclamações de pessoas do povo, seja através de jornais, seja através de representação, tais como cobrança de emolumentos pelos notários ou oficiais acima da tabela deve investigar os fatos para adoção de providências, conforme o parágrafo único, I, do art. 27 da Lei nº 8.625/93527. E, exercendo o Ministério Público um munus preventivo de fiscal da lei, pode e deve requerer ao juiz de direito competente a instauração de procedimento administrativo ou sindicância para apuração de irregularidades ou infrações disciplinares cometidas pelos notários ou oficiais, na prestação do serviço de cartório, achando-se esta faculdade prevista no art. 26, III, da Lei nº 8.625/93528. 526 BRASIL. Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 15 fev 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. 527 Idem. 528 Idem. 138 CAPÍTULO III – REPERCUSSÕES DO ESTUDO 3.1 A LEGALIDADE E EXERCÍCIO DO DIREITO DE PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA Estuda-se a legalidade e exercício do direito de propriedade, principalmente da propriedade imobiliária e urbana, atualmente, propriamente no plano do Direito Urbanístico; buscando a Constituição Federal de 1988, ao dedicar um capítulo inteiro à propriedade urbana corrigir as distorções quanto à ocupação do solo urbano, que ocorriam numa verdadeira afronta ao princípio da função social da propriedade, estipulando ela em seu art. 182 que a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.529 Havendo, previsão de obrigatoriedade da implantação do Plano Diretor, pelos Municípios com mais de vinte mil habitantes, cuja validade depende de aprovação legislativa, o qual definirá as exigências fundamentais de ordenação da cidade a que a propriedade urbana ficará sujeita, pois, estará tipificada a sua função social530. Sendo perfeitamente absorvíveis dentro da finalidade do plano, as preocupações com o lazer, com a cultura e com o esporte; devendo o planejamento do plano diretor também se reportar a promoção do melhor atendimento do público pelos serviços prestados pelo Município531. Surgindo ele, portanto, em substituição às tradicionais leis de zoneamento, voltadas exclusivamente à ordenação do solo urbano, com regras relativas às edificações, e com a definição da destinação das diversas áreas urbanas, moradias, indústria, comércio; devendo ele manter-se fiel ao princípio da política do desenvolvimento urbano, que tem por objetivo o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da garantia do bem-estar dos seus habitantes. 529 530 531 BULLOS, 2003, p. 1.241. SOUZA, 2001, p. 154. BASTOS, 2001, p. 475-476 passim. 139 Portanto, a Constituição Federal institucionalizou o planejamento urbano consagrando-o em vários dispositivos, constando o direito urbanístico como matéria específica da competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, conforme disposto em seu art. 24, I. Estabelecendo o art. 21, XX, ser da competência da União a elaboração e execução dos planos nacionais e regionais de ordenação do território; à instituição de diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; tendo a competência não exclusiva de proteger obras e bens de valor histórico e cultural, de natureza artística, se imóveis, e entre outras o meio ambiente532. Assim, compete a União baixar normas gerais de urbanização para todo o território nacional e impor o plano nacional de urbanismo, de forma que se concretizem em soluções viárias, sanitárias, ecológicas e de segurança; e aos Estados-membros as normas estaduais de urbanismo e impor os planos estaduais, fiéis às normas e aos planos nacional e regional, adequando-os às peculiaridades de seus respectivos territórios, coordenar os planos locais e permitir a intercomunicabilidade; e finalmente, aos Municípios cabe a normatividade edilícia e a imposição do plano diretor local533. Facilitando esta divisão a regulação de diversos atos, como por exemplo, a dos atos jurídicos relacionados aos imóveis que, de acordo com a Lei 4.591/64, devem ser registrados e averbados no registro imobiliário, sempre no intuito de salvaguardar os adquirentes de boa-fé dos incorporadores inescrupulosos, pois, o direito de propriedade privada representa a garantia econômica da liberdade e da manifestação externa da responsabilidade íntima; e, de igual modo, a condição básica para que o indivíduo possa exercer plenamente os seus direitos e a sociedade venha a se tornar mais justa, desenvolvida e próspera. Pois, realmente o direito de propriedade trata-se de um direito fundamental da pessoa humana, porque assegura a cada um a necessária esfera de autonomia pessoal e familiar. 532 533 SILVA, 2003, p. 497. MOREIRA NETO, 1975, p. 80-82 passim. 140 E antes que a sociedade passa-se a ter inserida em seu meio a propriedade como algo concreto, visualizando-a tanto da forma coletiva quanto da forma individual, sentiu o indivíduo a necessidade de tornar conhecida a situação jurídica das coisas; revestindo-se para isso, atualmente, de especial importância os registros públicos534, que cria a presunção da verdade, e mesmo que não haja esta presunção da verdade dos fatos registrados, decorrente do princípio da legalidade, a razão última da aquisição estará na fé pública outorgada ao registro535. Pois, via de regra, é através do registro que se torna possível obterem-se informações sobre a posição jurídica do imóvel, amparando concessão de créditos e prevenindo fraudes, o que nem sempre se exaure no próprio registro de imobiliário, que atualmente é confrontado com o fenômeno da industrialização e urbanização cada vez mais crescente, vocacionando-o à ampla tutela preventiva de conflitos, ocupando um amplo aspecto na galáxia da segurança jurídica, conformando o Registro Imobiliário como um serviço voltado à cidadania. Procurando-se com ele, garantir a publicidade e, através desta, uma segurança jurídica relativa, tendo em vista interesses outros ligados ao imóvel, justamente porque o teor da certidão do registro deve revelar, em tese, a verdadeira posição jurídica do bem de raiz em relação à titularidade do direito real e à existência de eventuais ônus reais ou gravames que sobre o mesmo recaiam, tendo em vista que, a circulação do direito de propriedade necessita de manifestação visível, de modo que lhe seja possível chegar ao conhecimento de todos536. 3.1.1 Simulação de registro de loteamento urbano e rural Interessante ponderar o equívoco que normalmente é cometido e lesa os interesses dos consumidores adquirentes dos lotes. O loteador ou um terceiro comprador das frações apresenta a escritura do registro de imóveis em que figura a gleba ou área 534 535 536 ASCENSÃO, 2001, p. 333. Ibid., p. 368 CAMBLER, 1997, p. 49. 141 original, objeto de parcelamento. Assim, o terreno que foi loteado é apresentado como regular. Contudo, para a celebração da compra e venda dos lotes, o loteador lavra escritura pública junto a Cartório de Ofícios e Notas, declarando transferir os direitos de lote da gleba original, assim, neste momento o comprador desavisado é enganado, pois o que o loteador está a vender, de regra, são frações de loteamento sem registro no cartório de imóveis, ainda não aprovado pelo Distrito Federal ou Município, às vezes mesmo área pública, a conhecida e criminosa grilagem de terras. Havendo no plano jurídico antes de o projeto de loteamento aprovado ser registrado no cartório de imóveis, somente a própria gleba original não parcelada, já que quando registrado o loteamento, a área originária loteada deixa de existir para, em seu lugar, no registro de imóveis, constarem o parcelamento e os seus respectivos lotes. Assim, se se cuidasse de um loteamento regular, com registro no cartório de imóveis, o loteador venderia os lotes junto ao cartório imobiliário competente e não o de ofício de notas. A prova da propriedade do lote não poderá ser feita por meio de instrumento particular de contrato de compra e venda ou mesmo escritura lavrada no Cartório do Registro de Notas, porque insuscetíveis de transferir o domínio, pois a aquisição da propriedade imóvel somente se aperfeiçoa com o registro no cartório de imóveis.537 Portanto, a titularidade do domínio sobre imóvel depende de escritura pública e mesmo assim registrada em Cartório do Registro de Imóveis, único competente para a transferência da propriedade imóvel segundo o Direito Brasileiro, haja vista que, atualmente ele abrange não só os atos translativos da propriedade imóvel, como praticamente os demais atos que venham, de algum modo, modificar qualquer dos elementos essenciais à propriedade, ou ainda que lhe imponham uma condição ou ônus538. E, considerando-se isso, a Lei nº 6.766/79, em seu art. 37 proíbe a venda de lotes de loteamento sem registro no Cartório de Registro de Imóveis, prescrevendo ela 537 538 JUNQUEIRA, 1997, p. 34. Idem. 142 forma especial para isso, determinando que o contrato deve ser mediante instrumento público539, enquanto que o Código Civil determina que a propriedade imóvel somente se transmite por meio de transcrição do título de transferência no cartório de registro de imóveis540, desta forma, se os contratos forem celebrados por instrumento particular e se não operada a transcrição do título no cartório de registro de imóveis competente, os atos jurídicos são considerados nulos por não se revestirem da forma prescrita em lei. Assim, todo loteamento, seja com finalidade urbana ou rural, somente passa a existir no mundo jurídico depois de registrado e inscrito no Cartório de Registro de Imóveis competente, porquanto o registro imobiliário é condição sine qua non da própria existência legal de qualquer loteamento, não sendo o mesmo reconhecido na ordem jurídica, antes de seu registro no Cartório de Imóveis. Com isso, se principal que é o loteamento não existe no plano jurídico, os lotes dele resultantes, considerados como acessórios, ipso facto, também não gozam de existência legal, assim, não podendo ser objeto de compra e venda, já que a propriedade imóvel somente se transfere por meio da transcrição do título no cartório imobiliário. Sendo pacífico, que não se podem vender lotes de um loteamento não registrado no Cartório de Registro de Imóveis, justamente porque, in casu, como é a inscrição que dá existência no mundo jurídico ao loteamento, este por não estar registrado no Cartório de Registro de Imóveis, não existe no plano jurídico. Conseqüentemente, se ele não tem existência legal, os seus lotes também não existem para o universo jurídico, por serem dependentes dele. Destarte, não pode ser vendida uma parcela ou parte de um empreendimento que não existe, pois, o loteamento, só tem existência perante o direito a partir do registro do seu projeto no Cartório de Registro de Imóveis. Portanto, um lote que integre um loteamento não registrado no Cartório de Registro de Imóveis não pode ser alienado porque inexistente para o direito. Daí o motivo de a regra da proibição de venda de lotes de loteamento urbano não registrado no cartório imobiliário, embutido no art. 37 da Lei nº 6.766/79541, e da venda de unidades de incorporação imobiliária também 539 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 918. Ibid., p. 223. 541 Ibid., p. 918. 540 143 sem registro imobiliário, embutido no art. 32 da Lei nº 4.591/64542, aplicando-se, por igual fundamento, no tocante à venda de lotes de loteamento rural não registrado no Cartório de Imóveis, o art. art. 167, I, e o art. 19, da Lei nº 6.015/73; o art. 89 do Decreto nº 59.428/1966; o art. 61, caput, da Lei nº 4.504/64. Assim, a tese individualista de interpretação do direito de propriedade, segundo a qual se defendia ao proprietário as faculdades de usar, gozar e dispor da coisa como lhe aprouvesse, atualmente, se mostra de todo repelida pelo ordenamento jurídico das nações civilizadas, que elegeram a propriedade em função social. Considerando-se, por isso, o loteamento uma delegação atípica para a urbanização e tanto é assim, atividade substitutiva, que parte da propriedade privada se transfere, pelo simples fato do loteamento, licenciado ou não, para o domínio público543. 3.2 RISCOS DA URBANIZAÇÃO Por risco pode-se entender qualquer possibilidade de perigo, assim, várias situações podem colocar a cidade neste estado, principalmente no que infere a sua urbanização diretamente relacionada à propriedade imóvel, pois toda a cidade em que não ocorre planejamento corre risco em sua urbanização, devendo o Poder Público prevenir-se, e para que isso não ocorra utilizar-se das limitações urbanística, espécie do gênero limitações administrativas, que são as imposições legais destinadas, especificamente, a organizar os espaços habitáveis, através da regulação do uso do solo e das construções, normatizadas pelo art. 23, IX, da CF/88, e pela Lei nº 7.347/85, que disciplina a ação pública de responsabilidade por danos causados a vários assuntos de interesse coletivo, como os causados ao meio ambiente, ao consumidor, e aos bens e direitos de valor paisagístico; e que teve a sua redação determinada pelo art. 111 da Lei nº 8.078/90, tendo por objetivo executar planos que interferem no exercício do direito de construção544. 542 543 544 BRASIL. Código Civil, 2003, p. 918. MOREIRA NETO, 1975, p. 89. DINIZ, 2004, p. 258. 144 Traduzindo-se a urbanização em normas de salubridade, conforto, segurança, funcionalidade e estética para a cidade, ordenando o traçado urbano, as obras públicas e as edificações particulares. Normas estas que se não seguidas podem trazer um grande prejuízo à coletividade, uma vez que projetos em descompasso com as prescrições edilícias e urbanísticas passam a ser aprovado. Atingindo essas limitações urbanísticas as propriedades, seja em função da natureza ou localização, seja da nacionalidade de seu titular ou da pessoa jurídica que a controla, seja em razão de ditames de ordem jurídica, social, política, econômica e outras. Valores juridicamente diversos compõem, assim, a gama dos motivos determinantes em todas as esferas referidas, tomados sempre em orientação de equilíbrio com os interesses individuais e os diferentes outros elementos envolvidos no relacionamento fático, como a segurança nacional, a saúde e a higiene, a cultura, a economia a empresa nacional, a estética e outras545. Desse modo, restritos os limites de maior alcance, têm-se, na propriedade urbana, como razões determinantes básicas, os interesses da comunidade quanto à estrutura, à estética, à saúde e à higiene, ao fornecimento de serviços; sendo proibidas, por exemplo, construções de palhoças, de taipa, e de materiais outros incompatíveis; devendo os terrenos ser mantidos limpos e cercados; vedadas culturas nocivas; habitações em lugares insalubres, interferindo, desta forma, essas restrições concentradas no Plano Diretor, destinadas a permitir o desenvolvimento harmônico dos centros urbanos, nos direitos dos titulares quando das realizações de obras públicas; quando da divisão da terra em loteamentos, que deve ser aprovado pela municipalidade; nos arruamentos, alinhamentos e arborização, na distribuição da cidade em zonas, para conciliação dos vários fins residenciais, comerciais e industriais; nas edificações, que se sujeitam a 546 regras próprias do Código de Obras do Município . Estando, portanto, a propriedade imóvel e tudo que diga respeito a sua normatização, sujeita ao Direito Urbanístico que pode ser traduzido como um conjunto de medidas destinadas a organizar os espaços habitáveis, exercendo uma função pública, por está voltado para o atendimento do interesse coletivo e cujo exercício consubstancia-se num dever jurídico547; preocupando-se, principalmente, nas terras efetivamente ocupadas e naquelas outras que, por sua adjacência e 545 546 547 BITTAR, 1991, p. 102. Ibid., p. 103 COSTA, 1991, p. 123. 145 iminência de ocupação, devam ficar sujeitas a uma disciplina que permita ao homem aperfeiçoá-las, da melhor maneira possível, às suas necessidades e à sua dignidade548, devendo o Poder Público utilizá-lo na tentativa de evitar os risco de uma urbanização desorganizada. Tendo a ocupação do planeta e a exploração de seus recursos, obedecido até hoje, praticamente, ao acaso, às injunções da política ou ao desejo de obter lucro, não se pautando por um disciplinamento científico, para proteger da deteriorização suicida o habitat natural do homem, sendo que a sociedade somente será sadia e segura na medida em que não agrida seu meio social e o meio ambiente549, sendo para ela fundamental a segurança. Sendo a segurança para a sociedade, a necessidade vital que abre o mais antigo e o mais amplo campo de atuação do Poder de Polícia, por ser o atendimento de tudo aquilo que é essencial não só à própria convivência como também à própria existência do grupo social; traduzindo este Poder como atividade administrativa do Estado que tem por fim limitar e condicionar o exercício das liberdades e dos direitos individuais, visando a assegurar, em nível capaz de preservar a ordem pública, o atendimento de valores mínimos da convivência social, notadamente a segurança, a salubridade, o decoro e a estética; sendo que destes a salubridade é o valor que ascende mais em importância, principalmente em razão do adensamento das populações, que pela pressão demográfica e a urbanização crescente obrigam o Estado a medidas de salubridade mais e mais rigorosas550. E, assim, exercendo a Administração Pública o seu Poder de Polícia através da imposição de restrições e condicionamentos ao uso da propriedade fundiária e das atividades humanas como habitar, trabalhar, recrear-se e circular, notadamente quanto ao uso do solo e à ereção de construções551. 548 MOREIRA NETO, 1975, p. 55. Ibid., 1975, p. 57 550 Ibid., p. 72-73 passim. 551 Ibid., p. 75 549 146 3.2.1 Impacto sócio-ambiental Entre os riscos que a urbanização não planejada traz a sociedade podemos destacar o impacto social e ambiental, traduzindo-se este em todos os meios e formas que danificam o meio ambiente, e aquele em todos os mecanismos que perturbam a sociedade em sua paz. Podendo para ambas as situações, o Poder Público utilizar-se de instrumentos diversos para a prevenção destes fatos, através do seu poder de polícia. E dentre os vários instrumentos que podem ser utilizados pelo Poder Público para a prevenção dos riscos de impacto ambiental ocasionado por uma urbanização mal planejada, podemos destacar o licenciamento, previsto em inúmeras normas de direito ambiental e urbanístico, pela sua enorme importância no controle preventivo das atividades de particulares que possam resultar conseqüências danosas ao meio ambiente Salientando-se que esse controle preventivo de obras ou atividades potencialmente causadora de degradação do meio ambiente, mediante estudo de impacto ambiental, tem hoje previsão no art. 225, IV, da CF/88, tratando-se este estudo de um poderoso instrumento de política ambiental voltado à análise prévia de projetos de desenvolvimento econômico que potencialmente possam causar danos ao meio ambiente552, podendo e devendo Administração Pública, através de seu Poder de polícia, aplicar sanções administrativas e penais ao autor de qualquer ação lesiva ao equilíbrio ecológico, evitando que interesses particulares se sobreponham ao interesse público. E, no título da Ordem Econômica e Financeira, instituído como fonte das normas e decisões que permitiriam à República garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza, a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, ração, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de requisitos estipulados pelo Direito Constitucional Administrativo553, o art. 170 da CF/88 insere a propriedade privada e a função social da propriedade como um dos seus princípios, fundando a função social da propriedade na valorização do 552 MAGALHÃES, Juraci Perez. Reforma agrária e proteção ambiental. In: LARANJEIRAS, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 2002. p. 711. 553 HORTA, Raul Machado. Direito Constitucional. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 261. 147 trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social554. E quanto ao meio ambiente, são recentes as preocupações da política econômica voltada a sua proteção em função de uma sadia qualidade de vida. A tutela da natureza fazia-se por meio de normas de direito privado, estas protegendo as relações de vizinhança, e por vezes de direito penal ou administrativo, sempre visando sancionar o mau uso dos recursos naturais em moldes a causar danos a terceiros. Contendo, atualmente, a Constituição Federal, inumeráveis referências implícitas e explícitas ao meio ambiente, encontrando-se, todavia, o núcleo do tratamento temático, no Capítulo VI, do título VIII, sobre a ordem social, o que revela ser o meio ambiente um direito social do homem, pois, conforme a norma do art. 225 da CF/88, que proclama que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e que o meio ambiente é bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida555, impõe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para a presente e futuras gerações; prescrevendo normas obrigatórias de atuação da Administração Pública e dos particulares, uma vez que as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, as sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados556. Sendo, por isso, atualmente, o direito ao meio ambiente, um campo que integra na sua complexidade a disciplina urbanística, mas revelando-se como social na medida em que sua concreção importa em prestação do Poder Público557. Assim, a inserção do meio ambiente como princípio da ordem econômica, como se vê no art. 170 da CF/88, significa a opção por um modelo de desenvolvimento sustentável, pretendendo conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação dos recursos ambientais. 554 555 556 557 BULOS, 2003, p. 1.219. Ibid., p. 1.353. MORAES, 2004, p. 704. SILVA, 2003, p. 315. 148 Percebendo-se, portanto, que o comando constitucional tem o sentido de exigir a conciliação de dois valores fundamentais aparentemente conflitantes, o desenvolvimento e preservação do meio ambiente. E sendo o meio ambiente um bem de uso comum do povo, e considerando que o bem comum se concentra nas ingentes necessidades básicas ligadas à sobrevivência do grupo, como alimentação e defesa558, é fácil vislumbra-se a potencialidade de conflitos a reclamarem interferência do Estado, envolventes da fruição da propriedade privada e da fruição do bem ambiental que é do interesse de todos. Sendo de grande importância a interferência do Estado neste assunto, de forma a limitar as liberdades individuais, que se efetivam através de expressa normatização sobre atividades potencialmente lesivas, bem como sobre a utilização de recursos ambientais. Inobstante isso, não houve ainda a devida apreensão da efetividade do princípio da função social da propriedade e sua repercussão no tocante à preservação do meio ambiente. Importando destacar, portanto, que não pode o titular do direito de propriedade, ao seu critério e ao seu talante destruir a vegetação para a formação de pastagens para a sua criação. Não pode o proprietário, para o seu deleite e satisfação de sua vaidade, erguer construção em dunas destruindo a vegetação fixadora ou em praia marítima ou de rio, sem observância dos limites espaciais fixados em lei. Concretizando-se a função social da propriedade pelo atendimento simultâneo de requisitos fixados no art. 186 CF/88, entre os quais se inclui a utilização adequada dos recursos naturais e preservação do meio ambiente.559 E, se a função social significa o exercício do direito em benefício de outrem, se visa comprometer a propriedade com as complexas relações sociais e com o progresso humano, isto se efetiva com muito mais razão quando o exercício da propriedade atende à preservação do meio ambiente, que é bem de uso comum do povo, garantido a presente e futura geração, constituindo a sua preservação imposição decorrente da inserção da dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado brasileiro e dos objetivos fundamentais da República fixados no art. 3º da CF/88.560 558 559 560 MOREIRA NETO, 1975, p. 67. BULOS, 2003, p. 1.260. Ibid., p. 89. 149 Constituindo, portanto, a função social da propriedade e a defesa do meio ambiente, princípios da ordem econômica que têm por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Interferindo o princípio da função social diversamente sobre cada tipo de propriedade, e incidindo o princípio da função social sobre o conteúdo do direito de propriedade, compondo a estrutura ou limites internos do direito. Significando dizer que o cumprimento da função social é condição da legitimidade da propriedade imóvel, não se tratando de simples limitação decorrente de intervenções atinentes com o poder de polícia, pois a propriedade deve ser garantida enquanto cumpre a sua função social, e ela é cumprida quando a propriedade entre outros requisitos, atende o da preservação do meio ambiente. Desta forma, deve o Poder Público utilizar os instrumentos de controle ambiental dos quais está autorizado, como o licenciamento que é uma exigência da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio ambiente. Estabelecendo o art. 10, do referido diploma legal, que a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidoras, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis561. Destarte, tratando-se de ato de controle preventivo de atividades de particulares, destinado a verificar o atendimento das condições legalmente fixadas para o exercício de direito subjetivo. Devendo-se atentar para os processos de expansão urbana, determinados na grande maioria das cidades brasileiras pelo parcelamento do solo sob a forma de loteamento, e que estão relacionados com muitos aspectos da degradação ambiental urbana, sendo que, os destinados à população de baixa renda são os mais atingidos. Localizados muitas vezes em áreas desfavoráveis a este tipo de uso, como áreas de proteção ambiental, encostas íngremes, solos frágeis, estes loteamentos são responsáveis por diversos danos causados ao morador, ao Poder 561 BRASIL. Leis, etc. Constituição federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. 4. ed. Atual. e Ampl. São Paulo: Revista dos tribunais, 2005. p. 771. 150 Público e ao meio ambiente, ocasionando também impacto social como o relacionado com a violência, tanto no campo quanto na cidade, cuja solução a longo prazo impõe a necessidade de implementação tanto de uma reforma agrária quanto urbana562. Assim, o dever de atender a uma função social imposta a propriedade, foi instituído entre tantos objetivos, para ser evitar tensões e lutas de desagregação social, seja no campo ou na cidade, tendo os órgãos competentes pela organização, registro, e fiscalização destas propriedades, portanto, responsabilidade no que ocorrer na esfera social por omissão de seus titulares. Fatos que provocam atualmente como sempre provocaram na sociedade, o problema das lutas de classes, que se reflete não na práxis política, mas alcança ainda a esfera mais elevada da filosofia e da literatura, onde a especulação e a sátira substituem a violência e a luta, que teve como um dos maoiores garabaritos Aristófones, que zombou da democracia e da filosofia, mofou da religião, e traçou Hermes com um comilão, pintou Posseidon como um jogador, e retratou o próprio deus principal dos gregos, Zeus, como ladrão 563 e truão . Sendo diversos os motivos que ocasionam estas tensões sociais na sociedade urbana quanto rural, nesta pode ser citada a elevada concentração demográfica rural, que se constitui em um dos caracteres de subdesenvolvimento; os altos contingentes de subempregos, de marginalizados e de ociosos disfarçados, movimentando-se nos campos; as populações flutuantes, ou fixadas, cuja presença decorre de empregos temporários, em fases de operações agrícolas, entre outras, enquanto naquela, pode ser citada o grande número de propriedades nas mãos de uma minoria, enquanto a grande parte da população paga aluguel, vive com parentes, nos morros ou embaixo das pontes e viadutos; os loteamentos irregulares, implantados com o intuito de lesar o consumidor de boa-fé e inculto, e liberados com auxilio de serventuários desonestos que efetuam a matricula dos lotes, sem que o mesmo tenha sido registrado, não havendo a fiscalização do Ministério Público e dos demais órgãos competentes, sem que eles sejam provocados; o alto índice de desemprego, que provoca desânimo e desespero nos pais de família e nos jovens esperançosos pelo primeiro emprego, entre outras. 562 563 LEAL, 2003, p. 293. FERREIRA, 1999, p. 45. 151 Sendo o processo de expansão das cidades brasileiras realizado através do parcelamento do solo, marcado notadamente pela implantação de empreendimentos habitacionais periféricos promovidos tanto pelo setor privado, os loteamentos, quanto pelo poder público, os conjuntos habitacionais. Este fenômeno, que na maioria das vezes ocorre de forma desordenada, ocupando áreas desfavoráveis a este tipo de uso, é uma das atividades de grande impacto sobre o ambiente, além de gerar pesado ônus ao poder público e riscos à população, gerando a favelização daqueles que não possuem recursos suficientes para obter a casa própria. Para os especuladores imobiliários esta forma é extremamente lucrativa, uma vez que ocorre um aumento da demanda de lotes vazios e uma intensa transformação de glebas rurais e urbanas. Assim, nas parcelas da cidade produzida informalmente, onde predominam os assentamentos populares e a ocupação desordenada, a combinação dos processos de construção do espaço com as condições precárias de vida urbana gera problemas sócio-ambientais e situações de risco, que afetam tanto o espaço físico quanto à saúde pública, havendo a insegurança do cidadão, o tempo consumido na movimentação cotidiana, a degradação dos espaços públicos e, em geral, do meio ambiente urbano também custos econômicos, ficam patentes os riscos urbanitários a que uma cidade está sujeita impedido-a de tornar-se competitiva, pois uma cidade competitiva deve ter capacidade de integrar, em termos sócio-culturais, a grande maioria da população. E, hoje, as grandes medidas de caráter urbano-social são vistas como necessárias e urgentes e, portanto, suscetíveis de contar com apoios políticos e econômicos, aos quais, até a alguns anos, não tinham acesso564. Servindo a ordenação dos espaços urbanos, como instrumento da política do meio ambiente, de forma que os textos legais, que regulamentam a promoção do desenvolvimento urbano e a aprovação dos projetos de construção das unidades edilícias, precisam conter disposições adequadas a respeito da altura dos edifícios, a taxa de ocupação do solo, coeficiente de aproveitamento, afastamentos ou recuos de frente, de fundo e dos lados, entre 564 BORJA, Jordi. As cidades e o planejamento estratégico: uma reflexão Européia e Latinoamericana. In: FISCHER, Tânia. Gestão contemporânea: cidades e estratégicas e organizações locais. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1997.p. 85. 152 outros, permitindo uma ordenação adequada de espaços citadinos565. Dispondo, portanto, a sociedade de elementos para penalizar os que provocam prejuízos ao meio ambiente, tratando de minorar os efeitos da agressão sofrida com a reparação do prejuízo, na medida do possível, e com a aplicação de sanções que desestimulem o comportamento punível566. 3.3 SITUAÇÃO HABITACIONAL A situação habitacional de determinado ente da Federação, envolve a análise das condições de moradia da população, a qual contrapõe as tendências de crescimento demográfico às características da situação existente naqueles aspectos considerados relevantes em um processo de avaliação dessa natureza, como o estoque e o percentual de ocupação dos domicílios existentes, a qualidade das construções, as condições de ocupação dos imóveis e o acesso aos serviços de infra-estrutura urbana. Consistindo em um problema habitacional que merece atenção especial, principalmente no que tange a qualidade das habitações, são as favelas, considerando-se como tal, a tomada gradativa, mansa e pacífica da terra alheia567; e cujo crescimento nas últimas décadas tem sido significativo, e que dentre tantos motivos para isso, pode-se destacar o aumento da pobreza, agravado pela desigualdade de renda, pois, o Brasil a partir da década de 60, assistiu a uma a uma rápida expansão industrial que, em vez de distribuir riqueza, concentrou cada vez mais a renda e acentuou a exclusão urbana, com a proliferação de periferias pobres, marcadas pela informalidade. Em escala crescente, as favelas, os loteamentos clandestinos e irregulares, os cortiços e até mesmo as ruas e os viadutos passaram a ser a linguagem de moradia de uma parcela impactante da população brasileira. Podendo as favelas serem distinguidas de outras formas de ocupação precária do solo comuns no Brasil por não terem nenhuma forma de título de posse ou propriedade. 565 566 567 CAMBLER, 1997, p. 293. Ibid., p. 284. GRUPEMMACHER, 1991, p. 60. 153 Sendo o solo brasileiro ocupado por um número excessivo de grandes propriedades e por propriedades irregulares, em que os seus proprietários burlam o sistema de registro para se beneficiarem, sem considerarem o impacto social que ocasionarão com as suas atitudes, auxiliado estes fatos com o aumento do abismo entre a minoria proprietária e a grande maioria da população que está vivendo cada vez mais na miséria, e em verdadeiras favelas. Não tendo os proprietários de terra em sua maioria, nenhum sentimento de nacionalidade que os inflija a darem suporte ao governo, mesmo que este suporte atenha-se somente a acatar as normas públicas. Devendo o Poder Público intervir na base do problema da proliferação de favelas, por meio de sua urbanização e dos loteamentos clandestinos e irregulares, da regularização fundiária, na qualificação de conjuntos habitacionais já existentes, na melhoria de moradias autoconstruídas, na construção de novas moradias, tanto por meios convencionais como pelos programas de mutirões, na instalação de infraestrutura urbana, melhoria do acesso aos serviços e equipamentos públicos. Integrando os cidadãos que estiverem inseridos neste contexto, à vida da cidade com dignidade, levando a eles os benefícios da infra-estrutura urbana que a maioria não usufrui. Assim, a urbanização das favelas deve nascer com o propósito de transformar a favela em um bairro integrado a seu entorno, fornecendo aos moradores qualidade de vida. Desta forma um programa de urbanização de favelas deve consistir na melhoria das condições de moradia e salubridade, pelo acesso à infra-estrutura, serviços, equipamentos urbanos e comunitários. Pois, não se pode dissociar o impacto de tais medidas na percepção que os cidadãos têm de si mesmos e de seus vizinhos. Com isso, as regras constitucionais da Política Urbana confiaram ao Poder Público Municipal poderosos instrumentos de ação para modelar o desenvolvimento das cidades, como o Plano Diretor, a função social da propriedade urbana e a desapropriação, nos critérios fixados pela Constituição Federal, abrindo aos Municípios a perspectiva da reforma urbana. Destinando-se o planejamento físicocogente a propiciar harmonia à comunidade, conforto e segurança a seus membros568. 568 MOREIRA NETO, 1975, p. 85. 154 CONCLUSÕES Por tudo o que foi exposto, conclui-se que a propriedade imobiliária urbana, quanto ao uso e ocupação do solo, tinha um caráter absoluto. E, atualmente no século XXI, a propriedade, principalmente a propriedade imobiliária, não mais pode ser considerada por este ângulo em decorrência das mudanças da sociedade e do direito brasileiro, pois cada vez mais se impõe uma série de limitações ao seu exercício, que se perfaz em razão de sua natureza, em consonância com os interesses do titular e na satisfação de objetivos compatíveis da coletividade, de que se destaca o uso para moradia própria. Conformando-se essa orientação com a própria estruturação da vida humana em sociedade, podendo o homem com o seu trabalho, uso da terra e edificação dos imóveis, forjar e construir ambiente propício para a vida urbana. Ajustando-se o exercício do direito de propriedade ao fim econômico e aos preceitos da boa fé e dos bons costumes, pautando-se seu titular em consonância com a conduta do homem médio na sociedade, com isso, podendo evitar excessos que possam prejudicar seus vizinhos, ou outras pessoas sob pena de responder por eventuais danos. Assim, nesse terreno, que se inspira nos princípios de lealdade e de boa fé no relacionamento humano, são traçadas regras, que submetem o uso da propriedade à viabilização da convivência em sociedade. Visando, portanto, as limitações ao direito de propriedade, soluções para a problemática urbanística que somente pode ser analisada como parte de um processo mais amplo de mudança estrutural da sociedade, pois afeta tanto a cidade quanto o campo, não se esgota em seus aspectos ecológicos e demográficos. Assim, o Poder Público, principalmente o Municipal como responsável pelas políticas locais, pode adotar medidas que auxiliem o desenvolvimento da comunidade, buscando garantir o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o bemestar de seus habitantes, podendo ser auxiliado quanto a isso, pelo cumprimento do conteúdo da função social da propriedade por seus responsáveis. Haja vista que, todos indistintamente têm direito à justiça, a tratamento igualitário frente ao Poder Público, direito à educação, à saúde, ao emprego, ao lazer, à 155 moradia e à igualdade de acesso aos meios de tutela de seus direitos fundamentais. Podendo esses direitos serem concretizados com a realização de políticas públicas de reforma rural e urbana justa, com respeito às propriedades que cumprem sua função social e combate às propriedades que não a cumprem, mediante processo de desapropriação com indenização prévia e justa. Entendendo-se que a função social é um princípio determinado pelo legislador para delinear a propriedade, em obediência ao princípio da prevalência do interesse público sobre o interesse particular, princípio este que determina que sempre que houver um interesse público em conflito com um interesse particular, aquele deve prevalecer porque representa a vontade da coletividade, que não pode ser submetida à vontade de um indivíduo apenas. Reconhecendo todos a utilização da propriedade em benefício do bem comum. Assim, nas estruturas administrativas do Estado, mais claramente nas esferas de planejamento do desenvolvimento urbano, define-se comumente qualidade de vida como capacidade de um grupo humano de satisfazer suas necessidades com os recursos disponíveis em um espaço urbano compatível com o crescimento econômico e equilíbrio ambiental. E para isso faz-se mister que o Poder Público torne efetivo o seu poder de polícia, e realmente realize a fiscalização devida nos setores que influem na regularização da urbanização da cidade, que dentre eles se destaca o Registro Cartorário, por ser obrigatório o registro de todos os imóveis no Cartório de Registro de Imóveis, principalmente no que diz respeito a sua aquisição, venda ou modificação, como ocorre na implantação de loteamentos. Devendo o Poder Público fiscalizar fazendo com que as normatizações referentes aos atos específicos relacionados à propriedade imobiliária sejam cumpridas, pois o Estado mesmo delegando estes poderes continua a ter responsabilidade por danos causados aos usuários pela conduta do registrador ou preposto, por falha nos procedimentos cartorários, o que consiste no dever de reparação independente de culpa. E, em decorrência disso, deve o potencial consumidor de um serviço notarial ou registral, cercar-se de cautelas em relação ao tabelião ou oficial de registro, averiguando quais os procedimentos que devem ser adotados pelos responsáveis 156 cartorários para a concretização do fato a ser registrado e quais efetivamente foram realizados. Pois, mesmo que ao usuário seja dado o direito de escolher um tabelião de notas de sua confiança, quanto aos demais atos notariais e registrais, como atos de protestos e de registros públicos, por serem atos privativos de determinadas serventias, visto que as leis de organização judiciária de cada unidade da federação e do Distrito Federal delimitam a competência e a zona territorial de cada serventia, não resta alternativa ao interessado, senão solicitá-los perante o cartório competente. Atendo-se o oficial dos Cartorários de registro somente a sua função, não podendo a fé pública a ele dada por exercício de função se confundida com o seu ato de reconhecimento de autenticidade do documento, pois mesmo que este seja eivado de erros que possibilitem a sua contestação futura, o que será anulado é o ato de autenticação do documento e não a fé pública, já que esta é inerente ao exercício da função. Desta forma é perfeitamente possível que uma pessoa que leve um determinado negócio jurídico imobiliário adiante, confirmando o seu ato em clima de total amparo em virtude de um registro cartorário anterior, quando da publicidade, especificidade e continuidade, depois de verificada a situação anterior estar perfeita e inatacável, considerando que a disposição contida na ação de registro constitui a boa-fé do trafego jurídico, vindo, pois, representar a verdadeira realidade jurídica, tendo em vista que, a fé pública registral para a maioria dos cidadãos representa a verdade e não uma verdade presumida como o é de fato, e portanto, admitindo prova em contrário, vir a ser lesado em seu direito por irregularidades ocorridas no cartório competente. Desta forma, para não sair totalmente lesado desta situação vir a ser obrigado por falha do sistema que deveria protegê-lo, a comprovar judicialmente a irregularidade ocorrida e ter que acionar o cartório, o oficial cartorário, bem como ao Poder Público pelos danos que vier a ter com a ocorrência. Situação esta que tem ocorrido em grande quantidade em nosso sistema, em que no caso específico da propriedade imóvel, quando não cumpridas todas as formalidades legais e havendo o registro com a anuência de funcionários do cartório, 157 ocorrendo uma suposta regularização de um imóvel, contribui para que haja proliferação de imóveis irregulares, surgindo favelas em área públicas e privadas, cortiços, casas sem habite-se, e loteamentos clandestinos e irregulares que são abertos sem a infra-estrutura determinada pela legislação, e que após isso, o loteador não assume totalmente a sua responsabilidade. Devendo quanto a isso, o Estado assumir a sua responsabilidade como fiscal dos serviços delegados e o Ministério Público a sua responsabilidade como defensor da coletividade, para evitar que fatos desta natureza ocorram e atenuem os transtornos já feitos para aqueles cidadãos que acreditaram na lisura do negócio efetivado, e que para eles tinha o aval do próprio Estado, e que, portanto, estaria em conformidade com a lei, uma vez que o mesmo somente pode atuar dentro dos liames da legalidade. Devendo, portanto, o Poder Público através de seus agentes, desmontar o algarítimo que transforma as desigualdades habitacionais em oportunidades de moradias condignas, sendo que atualmente este ciclo se inicia com as políticas públicas e deveriam encerrar-se com o registro dos imóveis no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição. Não sendo justo que o cidadão tendo cumprido com todas as obrigações legais a ele exigidas, ao final fique a residir de forma irregular, vivendo em uma cidade informal, que nasce e cresce a margem da lei, contudo, de forma legítima. Devendo, portanto, os registros dos imóveis serem feitos com tal lisura, que possam ser o braço do Poder Público na fiscalização do desrespeito as normas procedimentais para a implantação de atos referentes à urbanização que tenham que passar pelo seu crivo, de forma a impedir que haja o aumento da favelização das cidades, pois esta deve ser construída de modo a proporcionar aos seus habitantes, segurança, dignidade e tutela de direitos. Devendo ser enfrentado de forma clara os abusos fundamentais que ocorrem no sistema, para poder evitá-los ou saneá-los, pois o direito a moradia e habitação dignas é um direito humano fundamental, constitucionalmente garantido, devendo o sistema de Registro de Imóveis atuar de forma a auxiliar o Poder Público na árdua tarefa de evitar que as desigualdades sociais e econômicas da sociedade interfiram na regularização da cidade e na sua urbanização, de maneira que independente da 158 classe social, todos venha a ser tratados de forma igualitária pelos oficiais de cartório, e este exija no ato do registro do imóvel que o interessado apresente todos os requisitos exigidos para a ocorrência. Sendo de suma importância a observância dessas normas, pois os títulos judiciais, via de regra, serão levados a registro e, não constando a adequação à referida lei, deverão, por via de conseqüência, serem devolvidos pelo Oficial do Registro para adequação. Sendo que esse tipo de incidente, o da não recepção de um título judicial no álbum imobiliário, por falta de observância de requisitos legais formais, em não raras vezes tem gerado divergências entre o Magistrado que expediu a ordem e o Registrador. Devendo aqueles, com o auxílio dos escrivães judiciários, darem efetiva aplicação aos textos normativos, ou, que entendam que os Registradores têm a obrigação de cumprir estritamente o que determina a lei, sob pena de responsabilidade civil, penal e administrativa; informando-se aos Oficiais de Registro que eles estarão sujeitos a responder, inclusive, pelo crime de prevaricação, se registrarem títulos sem a observância das formalidades legais A Administração Pública tem responsabilidade frente a toda a problemática referente à urbanização da cidade e seus reflexos sobre a sociedade, não devendo ela posicionar-se de forma omissa frente aos problemas que se apresentam e sim de forma assertiva, tendo em vista, que somente adotando-se atitudes positivas no presente é que se poderão ver resultados que beneficiem a geração atual e futura que tem direito a um meio sócio-ecológico saudável para viver, haja vista que o problema relacionado à urbanização da cidade é de difícil solução a curto prazo, mas totalmente sanável a longo prazo. E, para tanto deve ser possível à cooperação entre o Cadastro dos imóveis, que fica a cargo das Prefeituras Municipais para os imóveis urbanos e o Cadastro do parcelamento rural sob a responsabilidade do INCRA, e o Registro Imobiliário, os quais devem operar como sistemas coordenativos, mas nunca de forma excludente, pois cada um tem sua finalidade específica, o Registro afirmando quem é o titular de um direito e como este foi adquirido e o Cadastro dizendo o quanto foi adquirido e onde se situa a coisa. 159 E, embora, ambos tenham finalidades e objetivos específicos, com áreas de interesse comum, qual seja, a perfeita identificação e localização dos imóveis, elas diferem no sentido de que o Registro visa dar autenticidade, segurança, publicidade e eficácia real à aquisição do imóvel, ao passo que o Cadastro tem a finalidade de arrecadar imposto, e, ainda, especialmente, o Cadastro Rural se presta para obter a determinação física do imóvel com a constante da matrícula, em substituição às descrições precárias. Podendo-se perceber diante do exposto que o Sistema Registral Imobiliário Brasileiro está, paulatinamente adotando certos cuidados e responsabilidades e fins a que se destina, de construir, declarar, modificar e extinguir direitos, gerando publicidade, autenticidade, segurança jurídica e eficácia. Prestando, ainda, como fonte de informações e de controle para o Estado. Esperando-se, assim, que fatores políticos, os quais diretamente afetam o controle, a implantação e a modernização dos sistemas referentes aos bens imóveis, não sejam obstáculos para a aplicação e efetivação das leis a eles relacionadas, e sim, que haja cada vez mais mudanças na estratégia da política urbana e habitacional do governo que ocasionem mudanças políticas de forma a transformar o Poder Público em verdadeiro indutor da produção da cidade e da fiscalização de seus agentes delegados que agem diretamente nos Cartórios de Registros de Imóveis, atendendo ao consumidor que para eles são todos os adquirentes dos imóveis cadastrados no Registro Imobiliário, e que como tal têm direitos e garantias a serem consideradas. Sendo que a consideração mínima que se espera dos Oficiais de Cartórios é que os mesmos através do poder a eles concedido façam com que todas as normas referentes ao registro de qualquer bem de raiz seja efetivamente cumpridas, de forma que sejam minimizadas as fraudes imobiliárias tão comumente utilizadas em nossos dias, e que na maioria das vezes ocorrem com o conluio dos próprios agentes delegados, que deveriam zelar pelo cumprimento da lei. 160 Referências: BRASIL. Leis, etc. Constituição Federal, coleção administrativo. São Paulo: Manole, 2004. 1951 p. de leis de direito BRASIL. Leis, etc. Constituição Federal, Código Civil, Código de Processo Civil. São Paulo: Manole, 2003. 1.780 p. BRASIL. Leis, etc. Constituição Federal, Coletânea de legislação de direito ambiental. Organização: MEDAUAR, Odete. 4. ed. Rev. Atual. e Ampl. São Paulo: Revista dos tribunais, 2005. 1.117 p. BRASIL. Leis, etc. Constituição Federal, Código de defesa do consumidor. Organização: Marques, Fernando de O. 6. ed. Rev. Atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. 1.150 p. BRASIL. Código Tributário Nacional. Colaboração: PINTO, Antônio L. de T. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. 862 p. BRASIL. Código e legislação civil em vigor. Organização: NEGRÃO, Theotônio. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003. 1.606 p. BRASIL. Código e legislação civil em vigor. Organização: NEGRÃO, Theotônio. 20. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. 1.360 p. BRASIL. Estatuto da Terra. 15. ed. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2000. 529 p. ASCENSÃO, José de O. Direito reais. 5. ed. Coimbra: Coimbra, 1993. AMARAL, Francisco. Direito civil: Introdução. 4. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. 640 p. ARENT, Hannah. A condição humana. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense universitária, 1999. 352 p. BASTOS, Celso R. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. 515 p. ______________ . Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1. BITTAR, Carlos A. Os direitos reais. Rio de Janeiro: Forense universitária, 1991. 225 p. BONA, Avelino de. Loteamentos irregulares face aos procedimentos cartorários. Porto Alegre: Sagra – DC Luzatto, 1996. 161 BORGES, Paulo T. Institutos básicos do direito agrário. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. 272 p. BORJA, Jordi. As cidades e o planejamento estratégico: uma reflexão Européia e Latino-americana. In: FISCHER, Tânia. Gestão contemporânea: cidades estratégicas e organizações locais. 2. ed. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 1997. BULOS, Uadi L. Constituição anotada. 5. ed. Rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003. 1.542 p. CAMBLER, Everaldo A. Responsabilidade civil na incorporação imobiliária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. 368 p. CAMPOS JR, Aluísio S. Direito de propriedade: aspectos didáticos, doutrina e jurisprudência. Belo Horizonte: Inédita, 1997. 240 p. CARVALHO FILHO, José dos S. Manual de direito administrativo. 10. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. 915 p. CRETELLA JR, José. Comentários à constituição brasileira de 1998. Rio de Janeiro: Forense universitária, 1997. v. 1. 608 p. CHOAY, Françoise. O urbanismo: utopias e utilidades: uma antologia. 5. ed., São Paulo: Perspectiva, 2002. 350 p. COSTA, Regina H. Princípios de Direito Urbanístico na constituição de 1988. In: DALLARI, Adilson Abreu; FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Temas de Direito Urbanístico, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. v. 1. DINIZ, Maria H. Sistema de registro de imóveis. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 642 p. ___________ . Curso de direito civil brasileiro: Direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 4. 612 p. DOMANSKI, Marcelo. Posse: da segurança jurídica a questão social: (na perspectiva dos limites da tutela do promitente comprador através dos embargos de terceiro). Rio de Janeiro: Renovar, 1998. 350 p. FACHIN, Luiz E. A função social da posse e a propriedade contemporânea: uma perspectiva da usucapião imobiliária rural. Porto Alegre: Fabris, 1988. 102 p. ____________ . Comentários ao Código Civil: parte especial: direito das coisas. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 5. FERREIRA, Pinto. Curso de direito agrário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. 482 p. 162 GRAUS, Eros R. A ordem econômica na Constituição de 1988: Interpretação e crítica. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. 392 p. GOMES, Orlando. Direito reais. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. 436 p. GRUPENMACHER, Betina T.; BUSQUETS, Cristina D. P. Favelas, invasões e modalidades de Loteamentos. In: DALLARI, Adilson A.; Figueiredo, Lúcia V. Temas de direito urbanístico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. v. 1. HORTA, Raul M. Direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Del Rey, 2003. HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. Tradução: DUTRA, Waltensir, 21. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1986. 313 p. JACOMINO, Sérgio. Parcelamento do solo urbano, o consumidor e o registro imobiliário. In: Ministério Publico do Estado de São Paulo: Procuradoria de Justiça. Temas de Direito urbanístico. São Paulo: Imprensa oficial, 2002. v. 2. JUNQUEIRA, Gabriel J. P. Teoria e prática do direito imobiliário: aquisição – perda – defesa – ações. 2. ed. São Paulo: Edipro, 1997. 239 p. LEAL, Rogério G. Direito urbanístico: condições e possibilidades da constituição do espaço urbano. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. 333 p. LIRA, Ricardo P. Elementos de direito urbanístico. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. 391 p. LOPES, Miguel M. de S. Curso de direito civil: Direito das coisas: princípios gerais, posse, domínio e propriedade imóvel. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001. v. 6. LOPES, João B. Condomínio. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. 269 p. MAGALHÃES, Juraci P. Reforma agrária e proteção ambiental. In: LARANJA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. 830 p. MAIA, José M. As influências do direito português no direito agrário brasileiro. In: LARANJA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. 830 p. MARSHALL, Carla C. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000. 136 p. MATTOS, Liana Portilho. A efetividade da função social da propriedade urbana à luz do Estatuto da cidade. Rio de Janeiro: Temas & Idéias, 2003. 120 p. MEIRELLES, Herly L. Direito Administrativo Brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. 782 p. MELLO, Celso A. B. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 870 p. 163 MILPACHER, Pio. O governo dos povos. São Paulo: LTR, 1998. 384 p. MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2004. 863 p. MOREIRA NETO, Diogo de F. Introdução ao direito ecológico e ao direito urbanístico: Instrumentos jurídicos para um futuro melhor. Rio de Janeiro: Forense, 1975. MUNFORD, Lewis. A cidade na história: suas origens, transformações e perspectivas. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. 741 p. NASCIMENTO, Tupinambá M. de C. Introdução ao direito fundiário (estudos). Porto Alegre: Fabris, 1985. 120 p. PIETRO, Maria S. Z. di. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2003. 727 p. PINTO, Ferreira. Curso de direito agrário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. PROENÇA, Alencar M. Direito agrário. Porto Alegre: Síntese, 1999. RIBEIRO, Luiz de Q. R.; AZEVEDO, Sérgio de. A crise da moradia nas grandes cidades: da questão da habitação à reforma urbana. 1. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. RIZZARDO, Arnaldo. Direito das coisas. Rio de Janeiro: Aide, 1991. v. 3. 1.300 p. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1. SANTOS NETO, Arthur P. dos. O imóvel rural e seu parcelamento. In: LARANJA, Raymundo. Direito agrário brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. 830 p. SANTOS, Maurício B. Estatuto das Cidades: Uma arma contra os inimigos. São Paulo: Mizuno, 2004. 492 p. SCHIMIDT, Mario F. Nova história crítica. São Paulo: Nova Geração, 1999. v. 4. SILVA, José A. Curso de direito constitucional positivo. 23. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. 924 p. SINGER, Paul. Economia política da urbanização. São Paulo: Brasiliense, 1993. SOUZA, Agnaldo C. de. Condomínio em edifícios: manual do condômino: Lei nº 4.591, de 16-12-1964: convenção, administração: modelos de atas e editais. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2001. 219 p. SOUZA, Junia V. F. de. Temas de direito urbanístico – solo criado: um caminho para minorar os problemas urbanos. São Paulo: RT, 1991. 164 TEPPEDINO, Gustavo. Multipropriedade Imobiliária. São Paulo: Saraiva, 1993. 137 p. VARELLA, Marcelo D. Introdução ao direito à reforma agrária: o direito face aos novos conflitos sociais. São Paulo: LED, 1998. 486 p. VENOSA , Silvio de S. Direito civil: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. v. 1. 663 p. VIANA, Marco A. da S. Loteamento, Rio de Janeiro: Aide, 1991. 134 p. ZIMMERMANN, Augusto. Curso de direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen júris, 2002. 779 p. BRASIL. Lei nº 317, de 21 de outubro de 1843. Fixando a despesa e orçando a receita para os exercícios de 1843-1844 – 1845. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 de dez 1843. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 15/01/2006. BRASIL. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõe sobre as terras devolutas do império. Registrada á fl. 57 do livro 1 dos actos legislativos. Secretária d’Estado do Negócios do Império, 02 out. 1850. Disponível em: <http://www.presidenciadarepublica.gov.br>. Acesso em: 04 de abr de 2005. BRASIL. Decreto nº 1.318, de 30 de janeiro de 1854. Manda executar a Lei, nº 601, de 18 de setembro de 1850. Coleção das Leis Império do Brasil, 31 dez 1854. Disponível em: <http://www.presidenciadarepublica.gov.br>. Acesso em: 04 de abr de 2005. BRASIL. Lei nº 1.237, de 24 de setembro de 1864. Reforma legislativa hypothecaria, e estabelece as base da sociedade de crédito real. Coleção das Leis Império do Brasil, 24 set. 1864. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 19 de abr de 2005. BRASIL. Lei nº 3.453, de 26 de abril de 1865. Manda observar o regulamento para execução da Lei nº 1.237 de 24 de setembro de 1864, que reformou a legislação hipotecária. Coleção das Leis Império do Brasil, 31 dez. 1865. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 26 de abr de 2005. BRASIL. Lei nº 3.272, de 05 de outubro de 1885. Altera diversas disposições referentes às execuções civis e comerciais. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1885. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. BRASIL. Lei nº 973, de 02 de janeiro de 1903. Cria o ofício privativo e vitalício do registro facultativo de títulos, documentos e outros papéis, para autenticidade, conservação e perpetuidade dos mesmos, como para efeitos do artigo 3 da Lei 79, de 23 de agosto de de 1892, e dá outras providências. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1903. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 18 jun 2005. 165 BRASIL. Lei nº 4.581, de 25 de junho de 1928. Dispõe sobre a alienação parcial dos edifícios com mais de cinco andares e dá outras providências. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1928. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 04 junho 2005. BRASIL. Lei nº 18.542, de 24 de dezembro de 1928. Aprova o regulamento para execução dos serviços concernentes aos registros públicos estabelecidos pelo Código Civil. Coleção de leis do Brasil, Brasília, 31 dez 1928. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. BRASIL. Decreto 55.891, de 31 de março de 1965. Regulamenta o capítulo 1 do título 1 e a seção 3 do capítulo 4 do título 2 da Lei 4.504 de 30 de novembro de 1964 – Estatuto da Terra. diário Oficial da União, Brasília, 8 abr 1965. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 18 de maio 2005. BRASIL. Decreto-Lei nº 57, de 18 de novembro de 1966. Altera dispositivos sobre lançamento e cobrança do imposto sobre propriedade territorial rural, institui normas sobre arrecadação da dívida ativa correspondente, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1966. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 maio 2005. BRASIL. Decreto-Lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece diretrizes para a reforma administrativa e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 27 fev 1967. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 06 de jul de 2005. BRASIL. Decreto nº 62.504, de 08 de abril de 1968. Regula o art. 65 da Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964, o art. 11 e parágrafo do Decreto-Lei 57, de 18 de novembro de 1966, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 09 abr 1968. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. BRASIL. Lei nº 5.433, de 08 de maio de 1968. Regula a microfilmagem de documentos oficiais e dá outras providências. Diário Oficial de Justiça, Brasília, 10 mai 1968. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 16 julho 2005. BRASIL. Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972. Cria o Sistema Nacional de Cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 dez 1972. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. BRASIL. Lei 72.106, de 18 de abril de 1973. Regulamenta a Lei nº 5.868, de 12 de dezembro de 1972, que institui o sistema nacional de cadastro rural e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 24 abr 1973. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 08 maio 2005. BRASIL. Lei nº 6.746, de 10 de dezembro de 1979. Altera o disposto nos artigos 49 e 50 da Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964 (ESTATUTO DA TERRA), e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 11 dez 1979. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. 166 BRASIL. Lei 84.685, de 06 de maio de 1980. Regulamenta a Lei 6.746, de 10 de dezembro de 1979, que trata do imposto sobre a propriedade territorial rural – ITR e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 07 maio 1980. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 14 maio 2005. BRASIL. Lei nº 8.027, de 12 de abril de 1990. Dispõe sobre as normas de conduta dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 13 abr 1990. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 11 jul 2005. BRASIL. Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993. Instituiu a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, dispõe sobre normas gerais para a organização do Ministério Público dos Estados e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 15 fev 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 29 de junho de 2005. BRASIL. Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos a reforma agrária, previstos no capítulo III, título VII, da Constituição Federal. Diário Oficial da União, Brasília, 26 dez 1993. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 03 maio de 2005. BRASIL. Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994. Dispõe sobre o estatuto da advocacia e a ordem dos advogados do Brasil - OAB. Diário Oficial da União, Brasília, 05 jul 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 17 de junho de 2005. BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 21 nov 1994. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previstos no artigo 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 fev 1995. Brasília, 11 set 1990. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 julho 2005. BRASIL. Lei nº 3.507, de 13 de junho de 2000. Dispõe sobre o estabelecimento de padrões de qualidade do atendimento prestado aos cidadãos pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta, indireta e fundacional e dá outras previdências. Diário Oficial da União, Brasília, 14 jun 2000. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 13 julho 2005. BRASIL. Lei nº 10.169, de 29 de dezembro de 2000. Regula o parágrafo 2º do artigo 236 da Constituição Federal, mediante o estabelecimento de normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. Diário Oficial – Seção extra, Brasília, 30 dez 2000. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 7 de julho de 2005. 167 BRASIL. Lei nº 10.934, de 02 de agosto de 2004. Dispõe sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, letra de crédito imobiliário, cédula de crédito bancário, altera o decreto-lei 911, de 1 de outubro de 1969, as leis 4.591, de 16 de dezembro de 1964, 4.728, de 14 de julho de 1965, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 03 ago 2004. Disponível em: <http://www.senado.gov.br>. Acesso em: 24 maio 2005. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Imposto predial – critério para a caracterização do imóvel como rural ou como urbano. Recurso Extraordinário nº 93850-8. Jair Rodrigues Pereira e Prefeitura de Belo Horizonte. Relator: Moreira Alves. Minas Gerais, Tribunal Pleno, 20 mar 1982. Diário de Justiça, Minas gerais, p. 8.180, 27 ago 1982. Disponível em : <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/05/2005. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Execução de título extrajudicial. Módulo rural. Penhora. Precedentes da Corte. RESP 149363/PR. Bento Zazula e Cooperativa agropecuária união ltda – GOAGRU. Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, 04/02/1999.Diário de Justiça, Paraná, p. 144, 12/04/1999. Disponível em <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Administrativo – Parcelamento do solo – Casas populares – Empresa pública – Incidência da Lei 6.766/79. RESP 126.372/SP. Ministério Público do Estado de São Paulo e Companhia de desenvolvimento habitacional e urbano do Estado de São Paulo – C D H U. Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, 03/09/1998. Diário de Justiça, São Paulo, p. 17, 13 out 1998. Disponível em <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005 BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Direito urbanístico. Loteamento irregular. Município. Poder-dever de regularização. RESP 448.216/SP. Ministério Público do Estado de São Paulo e Município de São Paulo. Relator: Ministro Luiz Fux. Primeira Turma, 14/10/2003. Diário de Justiça, São Paulo, p. 204, 17 nov 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Civil – Ação de cobrança – Cotas condominias – Convenção de condomínio não registrada – Loteamento – Condomínio horizontal. RESP 139.952/RJ. Condomínio Vilarejo e Ricardo Dias Miceli. Relator: Ministro Waldemar Zveiter. Terceira Turma, 23/02/1999. Diário de justiça, Rio de janeiro, p. 134, 19 abr 1999. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/01/2005. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Rescisão de contrato com devolução de parcelas por ser ilegal o objeto do mesmo, por se tratar de usufruto vitalício e por ser objeto de entrega impossível face a existência de dias maiores que o existente em um ano. Apelação Cível/RS. Espólio de Mário Gustavo Dreyer e Empreendimentos imobiliários garopaba Ltda. Relator: Desembargador Luiz Augusto Coelho Braga, Décima Nona Câmara Cível. Diário de justiça, Rio Grande do Sul, 19 ago 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. 168 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. IPTU: progressividade. Embargo de declaração no agravo de instrumento/SP. Município de Diadema e Àlusuisse Lonza do Brasil Ltda. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma. Diário Oficial da União. Brasília, 28 out 2003. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Recurso em mandado de segurança. Registro de imóvel. Ação de divisão. Suscitação de Dúvida. cabimento. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança Nº 9372/SP. Hajime Sato e outros e Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo. Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Terceira Turma, 19/05/2005. Diário Oficial da União. Brasília, p. 285, 13 jun 2005. Disponível em: <htrp://www.stJ.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Dúvida inversa. Registros públicos. Apelação Cível nº 70000329813/RS. Município de Santo Antônio de Patrulha e Exma. Sra. Dra. de Direito 1 V de Santo Antônio de Patrulha. Relator: Desembargador Guinther Spode, Décima Nona Câmara Cível. Diário Oficial da União. Brasília, p. 05, 20 jun 2000. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Retificação de registro imobiliário. Via ou meio inadequado. Extinção do processo. Litigância de má-fé inocorrente. Apelação Cível nº 70006005797/RS. Clotilde Menestrino Dionello e Beatriz Kotec Selistre e outro. Relator: Desembargadora Elaine Harzheim Macedo, Décima Sétima Câmara Cível. Diário de Justiça. Brasília, 29 abr 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Conflito de competência. Cancelamento de registro imobiliário. Natureza administrativa. Competência da Justiça Estadual. Conflito de Competência nº 31046/BA. Juízo Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Estadado da Bahia e Juízo da Vara de feitos criminais Juri Menores e outro. Relator: Ministro Fernando Gonçalves, Segunda Seção, 11/06/2003. Diário de Justiça. Bahia, p. 126, 30 jun 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Oficial de registros públicos. Atividade exercida em caráter privado. Art. 236 da CF, Regime remuneratório. Lei nº 8.935/94. ausência de direito líquido e certo. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 15.323/RS. Luiz Amaro Baptista e Estado do Rio Grande do Sul. Relator: Desembargador Felix Fischer, Quinta Turma, 26/11/2002. Diário de Justiça. Rio Grande do Sul, p. 309, 17 fev 2003. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Administrativo. Responsabilidade objetiva do Estado pelos danos causados pelos titulares de serventia extrajudiciais nãooficializadas. Recurso Especial nº 481.939/GO. Francisco Nóbrega Bastos e Estado de Goiás. Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, 03/03/2005. Diário de Justiça. Goiás, p. 218, 21 mar 2005. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. 169 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Oficial de serviços notariais e de registro. Regime jurídico distinto do servidor público. Aposentadoria compulsória. Inaplicabilidade. Entendimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal na ADIN nº 2.602/MG. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 15.769/SC. Victor Oswaldo Konder Reis e Estado de Santa Catarina. Relator: Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, 03/02/2005. Diário de Justiça. Santa Catarina, p. 330, 03 out 2005. Disponível em: <htrp://www.tj.rs.gov.br>. acesso em 13/01/2006. BRASIL, Supremo Tribunal de Justiça. Resp – Administrativo – Serventuário de Cartório Extra-Judicial – Demissão. Recurso Especial nº 187.140/SP. Alvino Silva Filho e Fazenda do Estado de São Paulo. Relator: Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Sexta Turma, 15/12/1998. Diário de Justiça. São Paulo, p. 314, 10 mai 1999. Disponível em: <htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005. BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Aposentadoria dos titulares das serventias de notas e registros. Aplicação a eles da aposentadoria compulsória prevista no artigo 40, II, da Constituição Federal. RE 189.736-8/SP. Antônio Rubião Silva Junior e Estado de São Paulo. Relator: Ministro Moreira Alves, 1ª Turma, 26/03/1996. Diário de Justiça. São Paulo, p. 357, 27 set 1996. htrp://www.stf.gov.br>. acesso em 18/04/2005.