Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.75-79, 1999 ISSN: 1517-8595 DESENVOLVIMENTO EXPERIMENTAL DE UMA BOMBA DE CALOR: SIMULAÇÃO DE SECAGEM DE SEMENTES DE FEIJÃO (Phaseolus vulgaris L.), variedade ‘carioca’ José Rildo de Oliveira1, Mário Eduardo Rangel Moreira Cavalcanti Mata2 RESUMO A bomba de calor ou bomba térmica é um sistema que por meio de um ciclo termodinâmico, troca calor de uma fonte à baixa temperatura e torna essa energia disponível a uma temperatura mais alta. Baseado nesse princípio, o presente trabalho teve como objetivo a desenvolvimento de uma bomba de calor para produzir ar a baixas umidades relativas e temperaturas, para secagem de sementes de feijão (Phaseulus vulgaris L.), variedade “carioca”. O sistema proposto consistiu em aproveitar parte da energia dissipada pelo condensador para aquecer o ar proveniente do evaporador. O fluxo do ar de secagem utilizado neste trabalho foi de 95 m3.min-1.m-2. Da variação das condições de ar produzidas pela bomba de calor, que foram de 32 e 38°C e umidade relativas de 35 e 30%, respectivamente , simulou-se a secagem de feijão em secador de camada estacionária, de acordo com o Modelo de Thompson, Os resultados permitem concluir que é possível secar sementes de feijão com bomba de calor de um teor de umidade inicial de 21% até 15% base seca num período de tempo correspondente a 7 e 5 horas, respectivamente. Palavras chave: bomba de calor, secagem, simulação, feijão EXPERIMENTAL DEVELOPMENT OF HEAT PUMP: DRYING SIMULATION OF BEAN SEEDS (Phaseolus vulgaris L.), variety ‘carioca’ ABSTRACT A heat pump or thermic pump is a system that energy of a low temperature source through a thermodynamic cycle and it transforms this available energy at a high temperature. Based on this principle this work had the objective of developing a heat pump to produce air at both low relative humidity and temperatures, for drying of bean seeds (Phaseolus vulgaris L.), variety “carioca”. The system consisted in to utilize part of the dissipated energy by the condenser to heat the air that coming from the evaporator. The flow drying air used in this work was about 95 m3.min-1.m-2. To simulate the drying of the bean in a stationary layer dryer from the variation of the air conditions produced the heat pump – 32 and 38ºC – and humidity relative of 35 and 30%, respectively according to Thompson Model. The results show it is possible drying bean seeds using a heat pump of a initial moisture content from 21% to 15% dry basis, in a period of 7 and 5 hours, respectively. Keywords: heat pump, drying, simulation, beans _________________________________ Trabalho Revisado pelo Professor Vivaldo Silveira Júnior da UNICAMP, Doutor pela Universidade Estadual de Campinas 1 Mestrando em Engenharia Agrícola/CCT/UFPB Tel. (083) 333-1040 e-mail: [email protected] 2 Prof. Adjunto, Dr., Departamento de Engenharia Agrícola, UFPB, Caixa Postal 10.087, CEP: 58109-970. Campina Grande – PB Tel. (083) 310-1287 e-mail: [email protected]. 75 76 Desenvolvimento experimental de uma bomba de calor: Simulação de secagem de sementes de feijão INTRODUÇÃO Considerável quantidade de energia é utilizada na secagem de alimentos, estejam eles na forma in natura ou processados. No Brasil, os secadores utilizam, na grande maioria dos casos, fontes de energia convencionais, tais como óleos combustíveis, GLP, lenha, ou eletricidade (Rossi, 1993). A secagem é responsável por cerca de 12% da energia total gasta nos sistemas de beneficiamento de produtos, quer sejam alimentares ou de matérias primas como grãos e sementes (Cavalcanti Mata, 1996). Algumas unidades beneficiadoras de sementes usam sistemas alimentados por resistências elétricas para aquecer o ar de secagem. Do ponto de vista técnico, as resistências são eficientes, confiáveis e de fácil manuseio. No que diz respeito aos custos, em virtude dos programas de subsídios à eletrificação rural, tanto o investimento inicial como a manutenção são baixos. No entanto, com a privatização do setor energético, é provável que estes custos não se mantenham nos mesmos patamares. Além do mais, o uso indiscriminado dos secadores de resistência pode causar sobrecarga nas linhas de alimentação e distribuição de energia. Assim sendo, nos processos de secagem com temperaturas do ar de secagem próximas à temperatura ambiente, pode-se, perfeitamente, utilizar um ciclo aberto simples, com a bomba de calor, fazendo a recuperação do calor latente. Neste caso, o calor é trocado com o ar úmido de exaustão e é utilizado para aquecer o ar que se introduz no secador. O uso de bomba de calor no condicionamento de ar para secadores apresenta todas as vantagens dos sistemas de secagem a baixas temperaturas e manifesta as mesmas características desejáveis das fontes de calor resistivas. Do ponto de vista termodinâmico, é consideravelmente mais eficiente. O consumo de eletricidade é 52% menor que as cargas resistivas e viabiliza a obtenção de um produto de qualidade mais homogênea (Hogan et al., 1983). Segundo Hogan et al. (1983) as primeiras pesquisas realizadas com bombas de calor na secagem de produtos agrícolas foram feitas por Davis em 1949, Shove em 1953 e Fliker et al. em 1957. Segundo o mesmo autor, anos depois foram realizadas pesquisas no Japão por Kato e Matsuda em 1976 e na Alemanha por Kutzback em 1978. Hogan (1976) desenvolveu uma bomba de calor, especificamente para secagem de grãos e efetuou Oliveira & Cavalcanti Mata testes nas mais diversas condições. Hodgett (1976) usou-a como desumidificador para secar madeira e cerâmica, (Hogan et al., 1983). Comprovada a eficiência da bomba de calor na secagem de produtos agrícolas, e considerando a importância, assumida pelo feijão, no Brasil e na região Nordeste, tanto por ser um dos produtos mais cultivados (terceiro em área plantada) quanto por constituir item básico na dieta alimentar da população brasileira, decidiu-se utilizar esse produto nesta pesquisa. Assim, os objetivos deste trabalho foram: a) construir uma bomba de calor para secagem de produtos termosensíveis (sementes de feijão); b) correlacionar os dados experimentais com os simulados pelo modelo de Thompson, utilizando o software aplicado à secagem de grãos – SASG 5.0 – desenvolvido para o feijão carioca por Cavalcanti Mata et al. (1995). MATERIAIS E MÉTODOS Este trabalho foi realizado no Laboratório de Processamento e Armazenamento de Produtos Agrícolas do Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal da Paraíba. Para realização deste trabalho, foram obtidas sementes de feijão junto a Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária da Paraíba – EMEPA, proveniente do seu campo de produção de sementes no município de Lagoa Seca – PB, safra 1999. Bomba de calor A bomba de calor para secagem de sementes, Figura 1, foi construída a partir de um condicionador de ar doméstico, com capacidade de 18.000 BTU/h, tendo como fluido de trabalho o R-22 (CHClF2 Monoclorodifluorometano). Duas modificações foram feitas no equipamento: A primeira consistiu na adição de um trocador de calor, “condensador”, de dimensões menores (520mm x 180mm), interligado em série ao circuito frigorífico com o já existente, sendo que este ficou localizado na parte frontal superior do equipamento, fazendo com que o ar ambiente atravesse as superfícies do evaporador e do condensador e troque as energias neles contidas; a segunda modificação foi a substituição da hélice original, cujo diâmetro era de 380mm, por outra de Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.75-79, 1999 Desenvolvimento experimental de uma bomba de calor: Simulação de secagem de sementes de feijão diâmetro inferior, 340mm. Os demais componentes foram mantidos. As modificações efetuadas no condicionador de ar têm por objetivo o aproveitamento simultâneo dos fluxos energéticos gerados no condensador e no evaporador. O sistema proposto consiste em fazer com que o ar ambiente troque calor com o evaporador, resfriando este ar abaixo do seu ponto de orvalho. O ar saturado que sai do evaporador passa em seguida por parte da energia dissipada pelo condensador (condensador 2), fazendo com que saia, deste engenho, um ar a baixa temperatura (próximo a temperatura ambiente) e com baixa umidade relativa. Ventilador axial evaporador Oliveira & Cavalcanti Mata 77 A formulas utilizadas para determinação do coeficiente de performance e do fator de performanace foram: COP FP h2 h4 h2 h1 (1) h1 h5 h2 h1 (2) em que h1 = entalpia na entrada do compressor, kJ/kg h2 = entalpia na saída do compressor, kJ/kg h4 = entalpia na saída do condensador 2, kJ/kg h5 = entalpia na entrada do evaporador, kJ/kg condensador 2 condensador 1 Condendador 2 Secador de sementes Condendador 1 a r compressor Ventilador centrífugo Pressão (MPa) secador válvula 2 3 4 W 5 1 Evaporador ar ambiente Figura 1 – Esquema de produção de ar para secagem de sementes, com baixa temperatura e baixa umidade relativa, utilizando uma bomba de calor. A secagem das sementes de feijão foi realizada com as condições do ar de saída da bomba de calor, em um secador com capacidade de 25 kg de sementes, a uma altura da camada de 25 cm e fluxo do ar de secagem de 95 m3.min-1.m-2. Coeficiente e fator de performance da bomba de calor O coeficiente de performance da bomba de calor foi avaliado para as condições médias do ar durante a secagem. Foi determinado também o fator de performance. Para essas determinações foram conectados termopares, na linha do refrigerante nas posições: entrada do compressor (1), na saída do compressor (2), na entrada do condensador 1 (3), na saída do condensador 2 (4) e na entrada do evaporador (5), conforme indicado na Figura 2. Entalpia (kJ.kg-1) Figura 2 - Esquema de um diagrama Pressão – Entalpia para determinação do coeficiente de performance (COP) do sistema. Os dados experimentais obtidos da secagem de sementes de feijão foram comparados com os simulados através do Programa computacional denominado SASG 5.0 (Software Aplicado à Secagem de Grãos), desenvolvido por Cavalcanti Mata et al. (1995). RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 1 encontram-se as condições do ar ambiente e as condições do ar de secagem obtidos pela bomba de calor, para secagem de sementes feijão em secador de camada estacionária. Observase, nesta tabela, que para as duas condições de secagem os dados simulados e os dados Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.75-79, 1999 Desenvolvimento experimental de uma bomba de calor: Simulação de secagem de sementes de feijão Tabela 1 - Dados experimentais e simulados das secagens, em camada estacionaria, de sementes de feijão, realizadas com o ar aquecido proveniente de uma bomba de calor Condições iniciais de secagem Temperatura ambiente (°C) Umidade relativa ambiente (%) Vazão do ar de secagem (m3.min-1.m-2) Altura da camada (m) Condições do ar, da bomba de calor e do tempo de simulação durante o processo de secagem Temperatura (°C) Umidade Relativa (%) Tempo de secagem Tempo simulado Teor de umidade inicial Teor de umidade final Teor de umidade final simulado Coeficiente de performance COP Fator de performance FP 1a 2a Secagem Secagem 21 70 95 0,25 32 35 7 7 21 15 14,8 6,1 5,1 22 75 95 0,25 38 30 5 5 21 15 14,9 6,7 5,7 Na concepção desta bomba de calor, para secagem de sementes de feijão, utilizou-se neste trabalho, apenas parte da energia térmica disponível (condensador 2) uma vez que as sementes de feijão são produtos termosensiveis, contudo deixa-se como sugestão a possibilidade de se utilizar a outra parte da energia térmica disponível proveniente do Oliveira & Cavalcanti Mata primeiro condensador para outras finalidades do processo pós-colheita, entre elas, pode-se citar a présecagem das sementes ainda na vagem. Neste contexto, a energia térmica disponível poderia ser melhor aproveitada dando um rendimento melhor ao sistema. Dados experimentais 1a. camada 2a. camada 22 20 Dados simulados 1a. camada 2a. camada 18 16 14 12 10 0 2 4 6 8 Tempo, horas Figura 3 - Simulação de secagem de feijão a uma altura da camada de 0,25 m e condições do ar de secagem de 32°C e 35% de umidade relativa Teor de umidade, % base seca experimentais, emtermos de média, estão muito próximos, ou seja um erro de 1,3% para a secagem realizada a temperatura de 32°C e 35% de umidade relativa e de 0,6% para as condições de secagem de 38°C e 30% de umidade realtiva do ar, indicando que o programa computacional atende às expectativas da simulação, no entanto é possível observar nas Figuras 3 e 4 que em ambas condições de secagem, os valores experimentais da camada inferior e superior, subestimam e superestimam, respectivamente, os valores simulados, no entanto os valores médios são semelhantes. Nessa tabela, observa-se também que coeficiente de performance e o fator de performance aumentaram à medida que foram obtidas temperaturas mais altas do ar de secagem. Teor de umidade, % base seca 78 Dados simulados 1a. camada 2a. camada Dados 1a. camada experimentais 2a. camada 20 18 16 14 12 10 0 1 2 3 4 5 6 Tempo, horas Figura 4 - Simulação de secagem de feijão a uma altura da camada de 0,25 m e condições do ar de secagem de 38°C e 30% de umidade relativa CONCLUSOES Diante concluir que: dos resultados obtidos pode-se Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.75-79, 1999 Desenvolvimento experimental de uma bomba de calor: Simulação de secagem de sementes de feijão 1. As condições de temperatura e umidade relativa do ar de secagem produzidas pela bomba que foram de: 32°C; UR-35% e 38°C; UR-30% permitem secar 25 kg de sementes de feijão em 5 e 7 horas, respectivamente; 2. programa computacional atendeu parcialmente as expectativas, pois só em termos de média é que os dados de secagem experimentais e calculadas são semelhantes com erros estimados em 1,3% e 0,7%, para as condições da primeira e da segunda secagem, respectivamente; 3. coeficiente de performance (COP) da bomba de calor variou entre 5,1 e 5,7 e o fator de performance entre 6,1 e 6,7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Cavalcanti Mata, M.E.R.M. Secagem de sementes a baixas temperaturas através de uma bomba de calor. In: Congesso Brasileiro de Sistemas ParticuladoS, 24, 1996, Uber-lândia. Anais... Uber- Oliveira & Cavalcanti Mata 79 lândia : Universidade Federal de Uberlândia: v.1, p.345-349, 1996. Cavalcanti Mata, M.E.R.M.; Dantas, L.A., Braga, M.E.D. Software aplicado a secagem de grãos. In: Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola, 24, 1995. Viçosa – MG. Anais... UFV : SBEA, Artigo N.º 95-5- 429, 1995. 29p. Hodgett, D.L. Efficient drying using heat pump. The Chemical Engineer n.311, p.510-512, July/ Aug. 1976 Hogan, M.R.; Okos, M.R.; Williams, E.E.; Ayres, D.L.; Peart, R.M. Low temperature heat pump grain drying design, performance, and operational experience. ASAE-Paper No. 763519, ASAE, St. Joseph, MI49085, 1976. Hogan, M. R., Ayres, D. L., Muller, R. E. et al. Heat pump for low-temperature grain drying. Transaction of the ASAE, St. Joseph, v.26, n.4, p.1234-1238, 1983. Rossi, S. J. Desenvolvimento e avaliação de uma bomba de calor usada no condicionamento de ar para secagem de alimentos. Campinas, FEA/UNICAMP. 1993. 214p. (Tese de Doutorado). Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.75-79, 1999 80 Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.1, n.1, p.80, 1999