EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE ADULTOS EM PORTUGAL: A
HISTÓRIA DE UMA ALTERNÂNCIA DE POLÍTICAS SEM
ALTERNATIVA SOCIAL
Antónia TÁVORA I [email protected]
FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO PORTO
Henrique VAZ I [email protected]
FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO PORTO
Joaquim COIMBRA I [email protected]
FACULDADE DE PSICOLOGIA E DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DO PORTO
RESUMO
Esta comunicação assenta na análise contextualizada da Aprendizagem ao Longo da Vida e da Educação e
Formação de Adultos em Portugal, de modo a perceber e identificar as suas formas de concretização e as
diferentes prioridades governamentais por detrás das formulações iniciais de tais políticas educativas. Com um
historial de alternância entre valorização e desvalorização, muito marcada ideologicamente e determinando
orientações politicas que não parecem suscetíveis de conciliação, a Educação de Adultos em Portugal tem-se
afastado da sua raiz humanista passando a ser encarada, na centro da discussão política, como medida
compensatória, resumida a programas de qualificação escolar e/ou profissional.
PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem ao Longo da Vida; Adultos, Qualificação Escolar e Profissional.
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INTRODUÇÃO
Numa sociedade que muitos adjetivam como “sociedade do conhecimento” (eg. Castells,
1996), a persistência de elevados níveis de abandono escolar precoce e a baixa qualificação da
maioria da população ativa portuguesa são factos que têm preocupado o governo e as
instâncias europeias. Ao longo dos anos, foram surgindo medidas estratégicas de qualificação
nacional, consagrando, nos últimos anos, o reforço na generalização das ofertas formativas.
Segundo o Ministério do Trabalho e da Segurança Social,
A aposta estratégica na qualificação da população portuguesa é opção central para o crescimento
económico e para a promoção da coesão social e territorial, assegurando o aumento da
competitividade e modernização das empresas, da qualidade e produtividade do trabalho, a par
da promoção da empregabilidade, do desenvolvimento pessoal e de uma cidadania plena
(Ministério do Trabalho e da Segurança Social, 2007:2).
Esta questão da articulação entre a formação e os contextos de trabalho representa uma
problemática central na formação de adultos. Tendo em conta as constantes reconfigurações
do mercado de trabalho (Magalhães & Stoer, 2002), associada a novas maneiras de organizar
os processos de trabalho, temos vindo a assistir à construção de novas maneiras de pensar e
agir no campo da formação.
A forte mobilidade profissional, os discursos de promoção da flexibilidade e estímulos ao
empreendedorismo e à criatividade, “acaba[m] por se reflectir nas constantes necessidades
das estruturas económicas e conduzir a flutuações permanentes nas características do
mercado de trabalho” (Parada & Coimbra, 1999/2000: 47). Assim, associadas a uma
multiplicação da procura incessante e dos tempos de formação ao longo de toda a vida
profissional, “propiciam o encadeamento interativo das situações de trabalho e de formação,
associadas a processos de enriquecimento ou de reconversão profissional” (Canário, 1997: 10).
Deste modo, assistimos nas últimas décadas a uma expansão quantitativa e a uma difusão das
práticas de formação cujo objetivo essencial é o de concentrar os recursos nas formações
direcionadas para a competitividade, necessidades das empresas e para a adaptabilidade e
desenvolvimento de competências que promovam a empregabilidade dos trabalhadores
(Ministério do Trabalho e da Segurança Social, 2007: 2). São discursos políticos como este, com
a adoção de uma “linguagem” em que as referências à modernização, ao reforço das ligações
entre escola/formação e trabalho, e ao desenvolvimento das novas tecnologias da informação
e comunicação, que pouco dizem além do princípio de que o trabalhador tem que estar
“sempre alerta” numa lógica de responsabilização individual.
Torna-se assim indispensável analisar cronologicamente os pressupostos da ALV e da EFA sob
uma visão política, de modo a perceber e identificar os propósitos que estão subjacentes às
formulações iniciais das políticas educativas e os objetivos com que surgem.
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1.CONTEXTUALIZAÇÃO
O conceito de ALV é interpretado em Portugal num duplo sentido: como um processo
educativo e formativo cuja duração se confunde com o tempo de vida dos sujeitos (desde que
nascem até que morrem) e como um quadro global de referência para o desenvolvimento do
sistema educativo, associado a uma certa visão estratégica de evolução da economia e da
sociedade portuguesa projetada no próximo século (Comissão Nacional para o Ano da
Educação e Formação ao Longo da Vida, 1998).
Enquanto processo educativo, quando falamos em ALV, esta vai desde os ensinos préobrigatório, básico, secundário e superior (ou terciário), formação inicial inserida no mercado
de emprego, à educação e formação de adultos e outras atividades de formação,
Facilitadoras de uma permanente actualização dos saberes e competências e do
desenvolvimento de um espírito crítico e empreendedor potenciadores de uma melhor
empregabilidade, do reforço da inserção e coesão social, e da afirmação de valores de um novo
conceito de cidadania activa e civilidade (EURYDICE, 2000: 114).
Em meados da década de 1980, um exame temático da OCDE relativo à aprendizagem dos
adultos em Portugal salientou a debilidade da formação de base da maioria da população em
que a média nacional de analfabetismo literal seria de 9% (Lima, 2005: 34). Deste modo, “seria
necessário que as políticas públicas de educação assumissem que o problema crucial a atacar
(…) é muito mais complexo e difícil de superar: é o problema de políticas educativas para o
controlo social” (Lima, 2005: 35).
Durante o período pós-revolucionário emergiram iniciativas populares e de associações que
incidiram sobre ações de alfabetização e atividades de educação de base de adultos, numa
lógica de utilizar o saber da comunidade como matéria-prima para o ensino, ocorrendo à
margem da política pública estatal ou da ação organizativa da administração pública (Lima,
2005).
A Lei nº3/79 simboliza assim uma tentativa de transição da educação de adultos para um
sistema e organização governamental,
Procurando lançar as bases de uma política pública de desenvolvimento do sector, já de
características mais «social-democratas» em termos de modelos de políticas sociais, isto é,
atribuindo relevo ao conceito e ao papel de «Estado-Providência» na educação (Lima, 2005: 39).
Neste sentido, e com a progressiva responsabilidade do governo na alfabetização dos adultos,
a lógica da educação popular de adultos e do associativismo tendem a ser objeto de
desvalorização e marginalização por parte das orientações políticas dominantes, como é o caso
dos governos PSD entre 1986 e 1995 (Lima, 2005).
Em 1996, face ao progressivo apagamento da educação e formação de adultos, o programa
eleitoral do Partido Socialista parte
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De um diagnóstico que, do ponto de vista académico, se encontrava realizado e consensualizado,
isto é, da constatação genérica da «ausência de um sistema de educação de adultos»,
prometendo uma política de apoio para o desenvolvimento, o apoio ao movimento associativo
(Lima, 2005: 46).
A educação de adultos passa assim a ser da responsabilidade do Estado, numa retoma da
educação popular e de base de adultos, sendo que, em 1998, o governo decide lançar um
Programa para o Desenvolvimento da Educação e Formação de Adultos, promovendo, assim, a
articulação entre educação e formação (Lima, 2005). Assumindo o seu trabalho nesse campo, a
Setembro de 1999, com o Decreto-Lei nº 387/99, o governo cria a Agência Nacional de
Educação e Formação de Adultos (ANEFA) que,
Com a natureza de instituto público, sujeito à tutela e superintendência dos Ministérios
Educação e do Trabalho e da Solidariedade Social [é] concebida como uma estrutura
competência ao nível da concepção, de metodologias de intervenção, da promoção
programas e projectos e do apoio a iniciativas da sociedade civil, no domínio da educação
adultos (Lima, 2005: 47).
da
de
de
de
No entanto, verificou-se que a ANEFA, enquanto estrutura de mediação, não intervinha no
terreno e na multiplicidade de áreas inicialmente pensadas, como não demonstrou
capacidades de assegurar o “relançamento da educação e formação de adultos em Portugal”
(Lima, 2005: 48), conforme tinha sido proposto no programa eleitoral de 1995.
Deste modo, outras lógicas subordinadas à empregabilidade e à aquisição de competências
para competir imperaram com o colapso do PS e a consequente extinção da ANEFA, em
virtude da dominância de um governo PSD e CDS/PP.
O interregno da revalorização da educação de adultos termina, de novo, com a sua evacuação
dos discursos de política educativa, optando-se antes pela «qualificação dos recursos», pela
«formação vocacional» e pela «qualificação ao longo da vida» [voltando] a sucumbir enquanto
política educativa pública (Lima, 2005: 49).
A integração de Portugal na União Europeia (UE), a retoma de poder do Partido Socialista, e os
desafios que constantemente se colocam ao país resultantes da ação das novas tecnologias de
informação e comunicação e da globalização dos mercados, exigiram a adoção de medidas
estratégicas que potenciassem o desenvolvimento e a integração de jovens e adultos,
atenuando as vulnerabilidades estruturais do País.
A política educativa, sobretudo na última década, tem vindo assim a assumir, como objetivo de
fundamental concretização, a igualdade de oportunidades na sociedade portuguesa, quer pelo
alargamento dos anos de escolaridade do ensino básico e da sua obrigatoriedade quer ainda
pelo recurso a modalidades diversificadas ao nível do ensino secundário, pela expansão do
ensino superior e pelo recurso sistemático a modalidades específicas de educação e formação
dirigidas aos adultos (Despacho Conjunto n.º 24/2005).
A estratégia da ALV em Portugal desenvolve-se segundo dois grandes eixos de intervenção,
convergentes e complementares, definidos em função de populações-alvo específicas:
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implementação de uma nova estratégia de educação e formação de adultos, “considerada
como um direito à educação básica para todos e ao longo de toda a vida, como um dever e
uma responsabilidade, e como uma exigência da sociedade e da vida profissional de renovação
permanente dos conhecimentos e das competências” (EURYDICE, 2000: 116) e consolidar o
processo de expansão e melhorar a qualidade da educação escolar para todos, englobando o
ensino pré-obrigatório e o sistema de ensino como alicerces importantes da construção da
aprendizagem ao longo da vida (EURYDICE, 2000).
No que respeita especificamente à educação e formação de adultos, o Estado português, com
base na Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro (Lei de Bases do Sistema Educativo), tem possibilitado,
através do ensino recorrente e da educação extraescolar, a organização de ofertas formativas,
específicas e adequadas, que permitem, simultaneamente, a obtenção de uma certificação
escolar e a preparação para o emprego. Este esforço ao nível da educação de adultos foi
também complementado por um reforço de financiamento realizado no âmbito dos I e II
Quadros Comunitários de Apoio (Despacho conjunto n.º 24/2005).
Contudo, a distância que separa as qualificações certificadas da população adulta portuguesa,
em matéria de conhecimentos e habilitações escolares, do padrão de qualificações académicas
da generalidade dos países europeus era ainda grande, estimando-se que, em 4.700.000
ativos, cerca de 2.400.000 não possuem a escolaridade de nove anos (Portaria nº. 1082A/2001).
Esta situação e a constatação de um problema semi-realizado de subcertificação da população
adulta justificou que, a par do reforço da oferta de educação e formação de adultos e,
consequentemente, das oportunidades de obtenção de certificações escolares e profissionais
por via formal, devesse também alargar-se a oportunidade a todos os cidadãos, em particular
aos adultos menos escolarizados e aos ativos empregados e desempregados, de verem
reconhecidas, validadas e certificadas as competências e conhecimentos que, nos mais
variados contextos, foram adquirindo ao longo do seu percurso de vida. Trata-se de um novo
serviço, que utiliza a sigla RVCC, cuja conceção, organização, monitorização e avaliação é da
responsabilidade da Agência Nacional para a Qualificação (ANQ), delegada pelo Ministério da
Educação (ME), através da Direcção-Geral de Formação Vocacional (DGFV), serviço central do
ME criado pelo Decreto-Lei n.º 208/2002, de 17 de Outubro.
A utilidade deste serviço (prestado por entidades públicas ou privadas) - os Centros de
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (CRVCC) - inscreve-se,
nomeadamente, na Estratégia Europeia para o Emprego e no Plano Nacional de Emprego,
constituindo-se como a medida que serve de estímulo e apoio efetivos à procura de formação
por parte de ativos, empregados e desempregados, homens e mulheres, e permitindo a
valorização, por parte dos parceiros sociais, das qualificações adquiridas pelo adulto ao longo
do seu percurso pessoal e profissional, numa perspetiva de aprendizagem ao longo da vida
(Despacho conjunto n.º 24/2005).
Com um historial de alternância entre valorização e desvalorização da Educação de Adultos em
Portugal, surge em 2005, a Iniciativa Novas Oportunidades (INO), enquanto programa de ação
governativa, com implicações sobretudo no âmbito das políticas de educação e formação
profissional, o qual traduz as assunções do XVII Governo Constitucional no domínio da
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qualificação da população portuguesa. Segundo o primeiro-ministro em exercício, num
comunicado para o Portal da Educação do Ministério da Educação,
A importância central da qualificação para o crescimento económico e para a promoção da
coesão social está hoje amplamente demonstrada por diversos indicadores publicados por várias
organizações internacionais. O atraso que nos separa dos países mais desenvolvidos radica, em
grande medida, no insuficiente nível de qualificação da população portuguesa (Sócrates, s/d).
Esta é a questão central do surgimento desta iniciativa (INO). Enquanto país que ambiciona a
modernização e o crescimento, a aposta de Portugal na qualificação deseja-se como um forte
e ambicioso impulso nesse sentido.
Estatísticas e estudos convergem para fazer de Portugal um país, não da União Europeia, mas
antes do Terceiro Mundo. No mesmo momento em que o país cumpria todas as condições
económicas e financeiras para aceder à «Zona Euro», mais gritante e injustificável se torna o
forte desnível entre indicadores macroeconómicos e indicadores socioculturais (Melo, 2003).
O site da Comissão Europeia (Comissão Europeia, 2007a), ao nível das políticas, identifica
quatro áreas prioritárias de intervenção: i) Investir mais no conhecimento e na inovação, ii)
Criar um ambiente empresarial mais dinâmico destravando o potencial empresarial, iii)
Caminhar para uma eficiente e integrada política energética da União, e iv) Investir nas
pessoas. Segundo o mesmo, é dentro desta última área que podemos localizar a ALV, e
consequentemente, o surgimento da INO (Comissão Europeia, 2007b). Apesar deste
enquadramento em termos de discurso, são evidentes as contradições entre os discursos e as
práticas. De facto, apesar de discursivamente indicarem uma dimensão de investimento nas
pessoas, na prática, o investimento no capital humano parece ser então encarado como a
chave para as oportunidades dos indivíduos e para o combate à exclusão social, numa lógica
de concretizar a aspiração da Estratégia de Lisboa de tornar a Europa, no que respeita à
educação e à formação, uma líder mundial.
Segundo a teoria do investimento em capital humano, resultado de uma grande pesquisa
desenvolvida pela UNESCO à escala mundial, e através das contribuições de Becker, Schultz e
Schiller nos anos 60 e 70 (Lopes, 1995), quanto maior a riqueza de um país, mais elevado é o
nível de instrução da população e melhor é a sua situação de ensino. De acordo com esta
teoria e o seu surgimento nas ciências económicas, a formação é então considerada um
investimento, a partir do momento que implica um gasto e que a partir dela se pretende obter
benefício. Segundo a mesma, os níveis de produtividade dos trabalhadores “resultam de
diferenças de investimento em capital humano através da formação (…) assim, o papel do
capital humano tem sido referido como fonte de crescimento económico (Lopes & Picado,
2010: 77).
Ora, a INO, surgindo como forma de concretizar em Portugal os objetivos discutidos a nível
europeu sobre a valorização e certificação de competências adquiridas fora de contextos
formais de aprendizagem, tem como objetivo expresso alargar o referencial mínimo de
formação até ao 12º ano de escolaridade para jovens e adultos, no reforço desta ideia de que
investir na formação e qualificação, e portanto no capital humano, é fundamental para o
processo de crescimento da economia portuguesa.
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Evoluindo a partir da rede de CRVCC (que existiram de 2000 a 2005), os Centros de Novas
Oportunidades (CNO), promovidos por entidades formadoras públicas ou privadas, escolas
públicas e profissionais, centros de formação de gestão direta e participada do IEFP, I.P,
associações empresariais, associações de desenvolvimento local e regional, empresas,
autarquias, entre outras, são as entidades responsáveis pelo cumprimento desse objetivo,
constituindo-se como uma “porta de entrada” para que jovens e adultos com idade igual ou
superior a 18 anos, sem ou com uma qualificação desajustada ou insuficiente face às
necessidades dos indivíduos e do mercado de trabalho (Portaria nº 370/2008), sejam acolhidos
e encaminhados para a oferta formativa que mais se adequa ao seu perfil e expectativas.
Os CNO representam um dos operadores do Sistema Nacional de Qualificações (Decreto-Lei nº
396/2007, de 31 de Dezembro) que se articulam e complementam, no atual sistema de
educação e formação de adultos, com entidades formadoras públicas e privadas para o
desenvolvimento de Cursos de Educação e Formação de Adultos (Cursos EFA), Formações
Modulares Certificadas, ou outras possibilidades de conclusão do ensino secundário para
quem frequentou, sem completar, planos de estudo que já não se encontram em vigor (ver
Portaria 230/2008, para os primeiros e o Decreto-Lei nº 357/2007, para estes últimos).
De forma a melhorar a capacidade de resposta das estruturas do sistema de educação e
formação, assistiu-se a um forte alargamento da rede de CNO a nível nacional, cabendo à ANQ,
enquanto entidade competente para o desenvolvimento e gestão desta rede de centros,
autorizar a sua criação, promovendo uma distribuição adequada às necessidades de
qualificação dos ativos, designadamente em termos territoriais e sectoriais (Portaria nº
370/2008). Em 2007, contavam-se, em todo o país, 269 CNO, o que representa mais 171 em
relação ao ano anterior (Ministério da Educação, 2007a: 8), ou seja, um aumento de 64%. Em
2008, dando cumprimento aos objetivos traçados para a INO procedeu-se a uma nova fase de
alargamento da rede nacional de CNO estimando-se que, já em 2008, a rede de Centros se
tenha aproximado da meta fixada para 2010, ou seja, 500 Centros (idem: 10). Em 2010 a rede
é composta por 448 CNO em Portugal Continental e 6 na Região Autónoma da Madeira (ANQ,
2010) e, no ano anterior, após abertura e publicação em Diário da República foi encerrado o
concurso público para a criação de mais 44 Centros Novas Oportunidades, de modo a perfazer
os 500 centros em funcionamento em 2010.
A certificação de competências em Portugal atingira o seu auge, no que respeita tanto ao
alargamento e aproximação das ofertas ao público, como também da crescente adesão por
parte do mesmo e consequente aumento dos níveis de qualificação.
No entanto, as repetidas fases de alargamento da rede dos CNO, que, aquando da
implementação da INO, foram necessárias para dar resposta à procura do público-alvo, e a
questão das metas ambiciosas que os CNO tinham para cumprir, parecem gerar efeitos na
própria qualidade do processo. Segundo um estudo sobre o impacto das metas no processo
RVCC (Távora, 2009), “os profissionais entrevistados (…) salientam casos de CNO que, devido à
pressão para o seu cumprimento, trabalham para e em função delas, desvirtuando os
procedimentos com os adultos” (Távora, 2009: 96).
Em 2011, decorrente da demissão do primeiro ministro do PS, e das consequentes eleições
antecipadas, subiu ao poder o PSD. Com a aproximação do final do biénio 2010-2011 e das
iminentes candidaturas necessárias à continuação do funcionamento dos CNO, surgiram
23
rumores na comunicação social, com acusações de facilitismo na obtenção dos certificados, a
massificação do programa e utilização do mesmo como propaganda política ao longo dos anos
de governação do PS, que colocaram a ANQ e a INO no centro de uma batalha política.
Com a lei orgânica do XIX Governo, a ANQ e a INO ficaram na dependência dos Ministérios da
Economia, do Emprego e da Educação e Ciência, estando em gestação um processo de
avaliação e reestruturação das mesmas com o anunciado objetivo de obter ganhos de
credibilidade e eficiência, garantindo uma maior exigência e rigor nos processos de
certificação, verificação e reconhecimento de competências. Resultante deste processo, até ao
final de 2011 foram encerrados 20 dos 450 da rede de CNO tendo sido abertas a 15 de
novembro de 2011 as candidaturas a financiamento para abranger o período de Janeiro a
Agosto de 2012, com as regras e critérios que tinham sido utilizados em anos anteriores. A
ANQ deu lugar à ANQEP (Agência Nacional Para a Qualificação e o Ensino Profissional),
anunciando que iriam ser mantidos 70% CNO até agosto de 2012, embora o Governo
considerasse que a dimensão da atual rede ainda era excessiva face às necessidades e à
procura.
Perante o sobredimensionamento atual da rede, a escassez de recursos financeiros disponíveis e
as necessidades de financiamento de outras medidas, o Governo decidiu reduzir o número de
Centros de Novas Oportunidades financiados. Assim, num esforço financeiro mesmo assim
considerável, o concurso garantirá neste período transitório o funcionamento de cerca de 70 por
cento dos atuais centros, refere a ANQ em comunicado (JN, 2012).
O Governo manteve, assim, até agosto de 2012, 301 dos 430 CNO existentes. Durante este
período transitório, adianta que concluirá os estudos de avaliação da INO, nomeadamente nas
vertentes de impactos na via profissional das pessoas e do rigor e exigência dos processos de
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) (JN, 2012).
Desde Dezembro de 2012 que se esperava o anúncio das alterações mais profundas na
estrutura e objetivos do programa Novas Oportunidades. No entanto, aos CNO, a única diretriz
oficial enviada foi no sentido de continuarem a trabalhar para poderem cumprir as metas para
os meses aprovados. Em 2013 muitos CNO viram-se obrigados a encerrar por não haver
qualquer diretriz ou candidatura que sustentassem o seu funcionamento pedagógico e
financeiro. Quanto ao futuro, de acordo com dados do Ministério da Economia, a que a Lusa
teve acesso, o executivo pretende transformar estes Centros de Novas Oportunidades (CNO)
em Centros para a Qualificação e Ensino Profissional (CQEP), no âmbito do Programa “Vida
Ativa” que tem um plano mais vasto de aposta no ensino profissional, que elege como "uma
nova prioridade" em Portugal (JN, 2011).
Esta mudança de discurso, na nova valorização do ensino profissional em detrimento da
educação e formação de adultos, segue a linha que acompanha a história de educação de
adultos em Portugal.
É de crer, por isso, que os cursos EFA transitem progressivamente para os CQEP e sofram
alterações que reforcem a articulação com as empresas, com a realização de programas de
estágio e a utilização das metodologias de tutorado. As ordens dadas pelo MEC às escolas no
sentido de não criarem mais turmas de cursos EFA, e a indicação do despedimento coletivo a
24
partir de Agosto de 2012 dos profissionais que trabalham em CNO com sede em escolas, vão
nesse sentido.
Depois de meses de silêncio, a Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional
(ANQEP) definiu o período de abertura de candidaturas à promoção de Centros para a
Qualificação e o Ensino Profissional (CQEP), no âmbito do artigo 5.º da portaria n.º 135A/2013, de 28 de março, o diploma que regula a criação dos CQEP (estruturas que irão suceder
os extintos Centros Novas Oportunidades). Nos termos da referida portaria e de acordo com
esta decisão, as candidaturas decorrerão entre 28 de junho e 19 de Julho de 2013. Até à data
ainda não saíram os resultados.
2. REFLEXÃO
Esta contextualização histórica que acompanha a educação de adultos deixa transparecer que,
a categorização “Educação de Adultos” (EA), evoluiu e evolui a par dos discursos políticos e de
disputas de interesses, em que a alteração dos discursos altera a realidade e a condução da
mesma.
Expostas a várias contradições resultantes de cada momento histórico-politico e social, a EA
tem-se afastado da sua original raiz humanista, em que as lógicas da educação popular e
cívica, da educação comunitária e para o desenvolvimento local, numa valorização da
emancipação e da criatividade, tendem, progressivamente, “a ser recusadas ou, sendo
toleradas, a atribuir-[se]-lhes um estatuto periférico em termos de políticas públicas e um mais
baixo status em termos socioeducativos” (Lima, 2007:9).
De facto, numa adaptação à estrutura social, à economia e à produtividade e competitividade,
a EA tem-se vindo a afirmar como formação e aprendizagem, em programas de qualificação e
de capacitação, ao serviço da adaptação aos imperativos da economia e da sociedade (Lima,
2007).
A prioridade do investimento na capacitação individual dos “recursos humanos”, orientado
para a adaptabilidade, empregabilidade e competição no mercado global, sugerem
simplificações como a de que o desemprego estrutural está associado à falta de qualificações
ou de competências da mão-de-obra.
É neste raciocínio funcionalista, que a orientação da EA para uma forte articulação com
questões do trabalho, numa lógica de conversão da EA em qualificação profissional, é,
inicialmente e atualmente, a interpretação que dela fazem os governos PSD.
No entanto, o discurso “socialista”, que caracterizou a INO, distancia-se também bastante, das
iniciativas que estiveram na origem de uma EA em Portugal. Dependente de apoios europeus,
as iniciativas de educação e formação de adultos em Portugal têm seguido nos últimos anos a
mesma definição de ALV concebida pela União Europeia, como “a solução para a
competitividade da sua economia no mercado global” (Hake, 1998: 40).
É neste cenário de (re)investimento que, principalmente desde 2005, o Estado assumiu
protagonismo no sentido de dar à Educação e Formação de Adultos, um lugar de destaque
enquanto política pública. A criação da INO permitiu recolocar a EA na agenda das políticas
educativas, e criar espaços de discussão e de debate públicos, esclarecer os sentidos da sua
relevância na realização do direito à educação e à (re)valorização das (novas) aprendizagens
25
dos adultos. No entanto, apesar desta centralidade necessária de colocação da EFA no seio da
discussão política, os objetivos com que surge são claramente economicistas, acabando por
desvirtuar o processo. No sentido de superar os défices de escolaridade da população a um
ritmo acelerado, a INO representou um novo impulso no caminho da qualificação, onde o
objetivo foi o da escolarização geral da população ao nível do ensino secundário.
No entanto, também no anunciado programa “Vida Ativa”, a ser desenvolvido pelo Governo,
ao ser dada prioridade à oferta de cursos de dupla certificação (escolar e profissional), face ao
seu maior impacto na empregabilidade; promovidas as formações focadas na aquisição de
capacidades específicas optimizadoras da empregabilidade; e ao se retomar o Ensino
Recorrente (oferta extinta ou em algumas escolas em vias de extinção pelo anterior governo)
para conclusão do ensino secundário e/ou prosseguimento de estudos, se reconhecem as
lógicas de uma nova aproximação ao modelo escolar para o ensino secundário, e o espirito
mercantilista conferido à EA, confundida com qualificação profissional. No entanto, o alerta vai
no sentido de assinalar que a EA não se esgota em programas de formação de recursos
humanos, de formação profissional e de produção de capital humano (Lima, 1994), pelo que a
formação para a democracia, para o ambiente e a saúde, para a participação cívica e a
autonomia, não devem ser subjugados a critérios de eficiência e eficácia económicas (Jarvis,
1993).
Em qualquer um dos casos, INO ou Vida Ativa, “a formação e a aprendizagem ao longo da vida
chegam a ser objeto de um tão profundo processo de instrumentalização com vista à eficácia
económica e à performatividade competitiva, que parecem frequentemente reduzidas a
estratégias vocacionalistas e a técnicas de gestão de recursos humanos, [que em] pouco ou
nada se assemelham a formas e processos de educação”. (Lima, 2007: 22).
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– educação e formação ao longo da vida. Lisboa: Ministério da Educação e Ministério do
Trabalho e da Solidariedade.
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