Discurso realizado pelo Dr. Manoel Teixeira, Ouvidor da ANAJUR no XV
CONPPREV E IX CONGRESSO ANAJUR.
DIREITO E MEIO AMBIENTE
NO RUMO DA TERCEIRA VIA
Manoel Teixeira de Carvalho Neto
Advogado
Alguns anos atrás, quando trabalhava no Congresso – lugar inteiramente inadequado para se
pensar – comecei a anotar fatos e idéias relacionadas com a questão do meio ambiente. Deparei-me então
com o problema do aquecimento global e seu agravamento, devido, dentre outros fatores, ao crescimento da
população e consequente aumento do consumo de bens.
Pude constatar, em inúmeras informações sobre a matéria, distorções sobre as reais causas e
efeitos do fenômeno, a fim de reduzir a sua importância.
Daí em diante passei a ler sobre o assunto com espírito mais crítico, à medida em que buscava
maiores esclarecimentos sobre sucessivas indagações que povoavam meu espírito.
Pouco a pouco, fui avançando nessa floresta de perplexidades, com razoáveis progressos em trilhas
dirigidas a circunstancias sociais do cenário ecológico, seguindo assim as inclinações de minha formação
humanística.
Prossegui na jornada em meu pequeno mundo, enquanto acompanhava o movimento das nuvens
que se adensavam no cenário econômico internacional, resultando, por fim, na tempestade financeira que não
poupou até mesmo nações consideradas inatingíveis por temporais como esse.
A instabilidade decorrente do episódio disseminou um clima de medo, incerteza e ansiedade,
propício a grandes mutações, como já ocorreu diversas vezes ao longo da história.
No calor desses fatos ainda recentes, novas perspectivas foram agregadas ao quadro ainda
incompleto de antigas perquirições.
** ** **
A cultura de uma sociedade, embora revele padrões regulares e repetitivos em seus costumes,
tradições, instituições, ocupações e outros aspectos, não está imune a mudanças, originárias de uma evolução
natural ou de novas idéias.
Não raro, surgem em algumas comunidades tendências, grupos ou movimentos que, contrariando
os valores estabelecidos, disseminam e estimulam novos procedimentos e atitudes como alternativas à cultura
dominante.
Brotam assim contraculturas, provenientes de modos de pensar ou comportamentos diferenciados,
capazes de provocar mudanças importantes na sociedade.
O cristianismo, nos séculos iniciais de nossa era, foi, na verdade, o mais expressivo movimento de
contracultura vitorioso no mundo ocidental. E, após as invasões bárbaras - que levaram à destruição o Império
Romano - e a Renascença – que pretendeu restaurar os valores da Antiguidade – veio a Reforma, cisão do
catolicismo no século XVI, deflagrando uma série de protestos dos que, desde o século XIII, vinham se opondo
aos abusos e distorções da vida eclesiástica.
Esse marcante movimento sócioreligioso de contracultura foi sucedido por outro não menos notável,
em fins do século XVII, ao se afirmar a Idade da Razão, época em que se implantou uma visão do mundo
vinculada a métodos de caráter estritamente científicos.
Fortes agitações ocorreram, então, do outro lado do oceano, quando os colonizadores do Novo
Mundo – tanto no Norte como no Sul – tentavam libertar-se do jugo europeu. Em uma e outra parte eclodiram
resistências no seio do povo, acicatado por situações econômicas adversas. E enquanto lá em cima, em 1776,
proclamava-se a independência, aqui embaixo, em nosso rincão, fermentava a conspiração que resultou na
Inconfidência Mineira.
No mesmo contexto, vicejaram idéias determinantes da grande reação contra o absolutismo, a
Revolução Francesa, marco decisivo da humanidade, cujos fundamentos repercutem até hoje na Declaração
Universal dos Direitos do Homem.
Esses históricos acontecimentos decorreram de mutações no modo de pensar e agir que
contrariaram os padrões de comportamento estabelecidos. Tais abalos na vida dos povos, como se percebe,
resultaram, sempre, do questionamento e rejeição dos valores e práticas da cultura dominante.
Em tempos mais recentes, movimentos diversos, de maior ou menor intensidade pontuaram nossos
dias com inúmeras contribuições à formação de novos conceitos, comportamentos e maneiras de sentir e
viver.
Neste nosso país, rebeldes – com ou sem causa – têm marchado na contramão, contestando
valores estabelecidos e implantando novas idéias e maneiras de encarar a vida.
O movimento modernista, a teologia da libertação, a tropicália, o terceiromundismo e o Fórum Social
Mundial – criado para se opor ao modelo desenvolvimentista vigente – são exemplos frisantes do variado
potencial de objeção existente entre nós.
Inclua-se ainda o recente “terceiro setor” que em levantamento realizado em 2002 pelo IPEA
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) tinha mais
de 275 mil organizações da sociedade civil em funcionamento no Brasil, empregando 1,5 milhão de pessoas e
movimentando cerca de R$ 12 bilhões por ano.
Essas entidades – ONGs e OSCIPs – cresceram 157% em seis anos, sendo o segmento econômico
mais ativo no período de 1966 a 2002, em ações de âmbito público fora do domínio estatal. Mas, em seu
nascedouro, ambos os tipos de instituição tiveram de vencer preconceitos arraigados, para se impor e dar
resposta eficiente e segura aos detratores do sistema.
Foi difícil, porem vitoriosa, a criação e regulação de ONGs e OSCIPs, em face dos obstáculos
opostos à sua efetivação, devido, evidentemente, ao caráter contracultural dessas novas modalidades de
pessoa jurídica.
Ontem e hoje, como não podia deixar de ser, forças poderosas, ocultas ou ostensivas, sempre
procuraram desqualificar e mesmo combater essas e outras correntes de pensamento capazes de abalar
interesses de grupo nem sempre legítimos.
Em nossos dias, em contraposição, surge e se expande uma cultura oposta ao uso abusivo dos
bens naturais da Terra, devido à devastação de florestas, à poluição atmosférica, ao desmedido consumo de
bens, à concentração de riquezas, ao desequilíbrio econômico, e à má utilização de recursos públicos, fatores
que prenunciam tempos cada vez mais difíceis.
A crise global por que passa o mundo desencadeia reações prestes a crescer como oposição aos
inumeráveis erros cometidos pelos senhores do poder. E na contramão de duas forças expressivas – o Capital
e o Trabalho – aparece um caminho diferente capaz de reverter ou pelo menos arrefecer a intensidade
daqueles graves impactos sociais.
Essa Terceira Via vai surgindo devagar, no vácuo provocado pelas ideologias – políticas, religiosas,
econômicas, morais, etc. – estruturadas como elementos de aglutinação de grupos, mas pouco a pouco
convertidas em fontes de discórdia capazes de justificar e propiciar intervenções na sociedade.
As ideologias nutrem-se de problemas, mas não os resolvem. Desse modo, quando se revelam
ineficazes, são logo substituídas por outras – muitas vezes as antigas com roupagem nova – e assim
sucessivamente, deixando um rastro de desencanto e desolação.
Evidencia-se ainda uma sutil conspiração contra a verdade e a liberdade de decidir do cidadão,
assediado a todo o momento – e pelos mais diversos meios – por mensagens, informações ou sugestões de
origem difusa. E numa época em que seria recomendável austeridade e poupança, o destinatário é instado a
consumir cada vez mais.
Como fator de agravamento, disseminou-se, ainda, em todo o mundo a idéia de progresso material
a qualquer custo, atropelando valores humanos, com força e eficácia de dogma intransponível. E a cada nova
conquista tecnológica a idéia se robustece mais e mais, ditando regras e estilos de vida padronizados ao
imenso rebanho internetizado em que se converteu a humanidade.
Nessa triste conjuntura, a doença é a mesma, mas o remédio, como sempre, é de novo prescrito,
para favorecer a continuidade de um estado de coisas impossível de ser enfrentado com as costumeiras
drogas paliativas
** ** **
Até algumas décadas atrás, o homem comportava-se como um Adão, em pleno paraíso,
apropriando-se indiscriminadamente dos bens à sua volta como se a natureza fosse inesgotável.
Essa atitude começou a mudar quando, por fim, o meio circundante revelou-se insuficiente, em face
das crescentes necessidades dos indivíduos e do número cada vez maior de seres em busca de satisfação.
Nesse ponto, em abril de 1968, reuniu-se em Roma um grupo de pessoas provenientes de dez
países, para discutir esse e outros dilemas de modo informal e descomprometido, convictas de que as
instituições e os planos de ação existentes seriam incapazes de enfrentar os problemas e as adversidades da
nova conjuntura.
Sob a inspiração do economista e industrialAurélio Peccei, nasceu então o Clube de Roma,
entidade cujos estudos resultaram na produção do documento denominado “Limites do Crescimento” – “The
Limits to Growth”, no título em inglês – à época amplamente divulgado, mas hoje quase esquecido, devido à
onda de consumismo que sufocou os esforços e as boas intenções daqueles abnegados estudiosos.
A esta altura, quando o mundo debate-se em crise econômica de caráter global, conviria recordar as
conclusões dessa associação de cientistas de nível internacional, resumidas em três pontos principais:
“1. Se as atuais tendências de crescimento da população
mundial – industrialização, poluição, produção de alimentos e
diminuição de recursos naturais – continuarem imutáveis, os limites de
crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro dos
próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio súbito
e incontrolável, tanto da população quanto da capacidade industrial.
2. É possível modificar estas tendências de crescimento e
formar uma condição de estabilidade ecológica e econômica que se
possa manter até um futuro remoto. O estado de equilíbrio global
poderá ser planejado de tal modo que as necessidades básicas de
cada pessoa na terra sejam satisfeitas, e que cada pessoa tenha igual
oportunidade de realizar seu potencial humano individual.
3. Se a população no mundo decidir empenhar-se em obter
este segundo resultado, em vez de lutar pelo primeiro, quanto mais
cedo ela começar a trabalhar para alcançá-lo, maiores serão suas
possibilidades de êxito.”
(“Limites do Crescimento”, deDonela H. Meadowse outros,
págs. 19/20, Ed. Perspectiva, S. Paulo, 1973).
Os cientistas do Clube de Roma estavam realmente cobertos de razão quando defendiam a
necessidade de equilíbrio entre os fatores população e capital, como condição para o estabelecimento de um
padrão de vida ideal. Segundo eles, nessa situação, o avanço tecnológico seria tão necessário quanto
apreciado, intensificando o funcionamento de uma sociedade estável. Ao mesmo tempo, refutaram o mito de
que o atual padrão de crescimento populacional e econômico levaria ao estabelecimento da igualdade entre
todos. Sustentaram, ainda, que, pelo contrário, como realmente ocorre, aumenta, em escala mundial, as
diferenças entre ricos e pobres. (op. cit, pág. 175).
Essa plêiade de cientistas preconizou uma transição do crescimento para uma situação de equilíbrio
global (idem. pág. 177), mas o que realmente aconteceu foi exatamente o contrário, ou seja, reiteradas crises
que acentuaram diferenças entre os seres humanos, até mesmo em países considerados desenvolvidos.
** ** **
Nesse quadro turbulento, pleno de controvérsias e indefinições, surgiu o Direito Ambiental,
destinado especificamente ao ordenamento das relações do homem com a natureza, por meio de um conjunto
de disposições disciplinadoras do uso do meio ambiente, para a sua conservação equilibrada, de modo a
permitir um racional aproveitamento, propiciando o desenvolvimento sustentável da vida em geral.
Como ocorre com outros ramos da ciência jurídica, o Direito Ambiental exerce tutela não só no
âmbito nacional como no campo internacional.
Sendo este último aspecto fonte e inspiração do primeiro, saliente-se a sua emergência, em caráter
embrionário, no século XIX, devido às ainda modestas preocupações preservacionistas, como, por exemplo, a
Convenção de Berna, entre Baden, então território autônomo, e a Suíça, destinada a regular a pesca no Reno.
Somente no século passado, com o agravamento da intervenção do homem na natureza,
crescentemente degradada, o Direito Ambiental ganhou importância e autonomia.
Em nosso país, no plano ordinário – legal ou regulamentar – o Código de Águas (Decreto nº 24.643,
de 10/7/1934) talvez seja o mais antigo conjunto de regras ambientais em vigor no Brasil.
Antecedendo às disposições da vigente Carta Magna, a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981,
normatizara a política nacional do meio ambiente que até hoje tem sido adotada na espécie, embora com
resultados ainda aquém das expectativas.
A Constituição Federal de 1988 evidenciou, em diversos dispositivos, a grande preocupação do
povo brasileiro com o meio ambiente, estabelecendo princípios basilares para robustecer a legislação existente
e nortear a elaboração de normas sobre a matéria.
Provavelmente, nenhuma Constituição de outro país tenha, como a nossa, manifestado tanta
preocupação com a defesa do meio ambiente.
A nossa Lei Maior instituiu, assim, preceitos da maior importância, tais como os princípios da função
sócioambiental da propriedade, do desenvolvimento sustentável, do poluidor pagador, da prevenção, da
participação, do limite e da cooperação entre os povos.
Já no seu limiar, o art. 5º, após garantir no inciso XXII o direito da propriedade, especifica logo
adiante que esta “atenderá a sua função social”. No art. 20, estende o manto protetor da União sobre terras
devolutas, lagos, rios, ilhas fluviais, recursos naturais, mar territorial e muitos outros pontos ou setores
geográficos ou econômicos de interesse ambiental. O mesmo acontece nos arts. 21, 22, 23, 24, 26, 30, 127,
129, 130, 170, 182, 186 e 225.
Sujeito a tutelas civil, penal e administrativa, o meio ambiente conta com instrumentos processuais
adequados para a sua defesa tais como a ação civil pública (CF, art. 129, III cc Lei nº 7.347, de 24/7/85), a
ação popular (CF, art. 5º, LXXIII, cc Lei nº 4.717, de 29/6/65), o mandado de segurança (CF, art. 5º, LXXIX, cc
Lei nº 1.533, de 31/12/51), o mandado de injunção (CF, art. 5º, inciso LXXI), a ação direta de
inconstitucionalidade (CF, art. 102, I, a, 1ª parte) e a ação declaratória de constitucionalidade (CF, art. 102, I, a,
2ª parte).
** ** **
Apesar desse arsenal defensivo, os ataques ambientais prosseguem em sua faina destruidora, não
obstante os esforços do Governo e a atuação do Ministério Público. Infelizmente, a própria atividade do Poder
Executivo – Federal, Estadual e Municipal – não raro é responsável por contendas de caráter ambiental,
provocando dilemas éticos no seio da Advocacia Pública.
O fulcro da dissidência situa-se, na maioria dos casos, na questão da sustentabilidade, em face da
intensificação do crescimento econômico, devido ao incremento do consumo de bens, da expansão de
serviços e da implantação de empreendimentos públicos em geral, numa simbiose envolvendo o Estado e a
iniciativa particular. Essa associação de interesses – que sempre poderia ser isenta – às vezes privilegia
empreendimentos empresariais divorciados do bem-comum.
Tais antagonismos propiciaram o surgimento do termo “desenvolvimento sustentável”, introduzido no
relatório “Nosso Futuro Comum” – “Our Common Future”, no original em inglês – de 1987, elaborado, a pedido
da ONU, por uma comissão presidida porGro Harlem Brundtland, então primeira ministra da Noruega. A
expressão em foco definiu o uso de recursos renováveis para promover o crescimento econômico, a proteção
das espécies animais e da biodiversidade e o compromisso com a manutenção da pureza do ar, da água e da
terra.
O “Relatório Brundtland” – como o trabalho passou a ser mais conhecido – tal como acontecera com
“Os Limites do Crescimento” – sofreu muitas críticas, por parecer, segundo essas opiniões, um documento
direcionado aos países mais ricos, sem considerar devidamente a situação das nações menos favorecidas,
carentes de desenvolvimento.
Opositores mais extremados alardeiam ser ineficiente o chamado “desenvolvimento sustentável”,
expressão que para estes tem sido usada como uma espécie de disfarce, afim de se dar vazão às enormes
pressões ambientais oriundas da ação do homem sobre a natureza.
Realmente, o crescimento econômico hoje não tem permitido dar uma boa sustentabilidade aos
empreendimentos, muito embora algumas vezes, como é o caso do Brasil, tenha se convertido em
desenvolvimento, a custos ambientais muito altos.
Como fator de agravamento, a crise sem precedentes do atual modelo de produção e consumo
espalhou-se nos setores alimentar, energético, trabalhista e outros, com repercussões no meio ambiente. Falase em superação do problema, mas, na verdade, as aparentes conquistas não têm passado de engenhosos
arranjos para a perpetuação de um sistema pernicioso.
A crise – que não é nova – vem sendo igualmente alimentada pelo grande crescimento populacional
desacompanhado de igual incremento de empregos, devido à constante substituição do homem pela máquina,
desequilibrando a relação entre capital e trabalho, como tão bem descreveu o economistaJeremy Rifkinem
seu livro “O Fim dos Empregos”:
“A morte da força de trabalho global está sendo interiorizada
por milhões de trabalhadores que experimentam sua própria morte
individual, diariamente, nas mãos de empregadores que visam
exclusivamente ao lucro e de um governo desinteressado. São aqueles
que esperam o bilhete azul, e estão forçados a trabalhar meio período
com salário reduzido, ou ser empurrados para as filas do auxílio
desemprego. A cada nova indignidade, sua confiança e sua autoestima sofrem mais um golpe. Tornam-se descartáveis, depois
irrelevantes e, finalmente, invisíveis no novo mundohigh-techdo
comércio global.”
(Op.cit., pág. 218, Makran Books, S. Paulo, 1995)
Fica evidente que a coesão social, em situações de perigo, como a atual, tende a fragilizar-se,
permitindo o surgimento de novas formas de comportamento e atuação capazes de reverter as imposições da
cultura de massa vigente.
Por outro lado, a história, como resultado que é de uma ininterrupta sucessão de fatos, não é
imutável. Vislumbram-se, em consequência, os sinais de uma iminente transformação, motivada pelo
incremento da comunicação em escala global e pela eclosão de uma consciência coletiva mais esclarecida.
Há, portanto, a premente exigência de estruturas institucionais compatíveis com as necessidades do
atual momento, mas o mundo político ainda não percebeu os sinais da mudança, priorizando assuntos
menores de um limitado programa de atuação.
Após esse quadro desolador, no qual - como já salientado – esboçam-se reações para combater
tanto descalabro, conviria precisar que espécie de “terceira via” seria essa que se aponta como capaz de
enfrentar e, possivelmente, resolver os problemas de conjuntura tão adversa.
A denominação, como salientaGiddens, “já emergiu muitas vezes na história do pensamento
político e da prática política, apenas para voltar a desaparecer” (Giddens, Anthony, “O Debate Global sobre a
Terceira Via”, pág. 17, Editora UNESP, S. Paulo, 2007).
Com efeito, a expressão tem sido alvo de interpretações diversas sobre seu significado, a maioria
das quais de conotação política, como natural alternativa mediadora de ideologias opostas. Nessa hipótese, a
“Terceira Via”, embora com características de doutrinas à esquerda ou à direita, segue no mesmo sentido de
ambas.
Imagine-se, porém, uma Terceira Via, na contramão das demais, por onde transitarão idéias visando
produzir ações e comportamentos renovadores em variados aspectos da sociedade, para o enfrentamento da
situação econômica e ambiental do país e do mundo de que somos parte inalienável.
Não se trata na espécie de propor uma fórmula ou solução, preparada entre quatro paredes, mas de
pesquisar sobre a possibilidade de novas formas de vida em sociedade, produzir conhecimentos, educar e
implantar padrões diferentes de convivência e de atividades, em direção a um mundo melhor.
A instabilidade econômico-social do atual momento propicia eleger-se como alvos de estudo, dentre
outros, temas até então insuficientemente abordados, tais como:
- Transformação gradual da sociedade em uma comunidade
interesses baseados, prioritariamente, na erradicação da pobreza,
fome e da ignorância, na repartição da riqueza, na preservação
meio ambiente, na redistribuição populacional, na racionalização
consumo e no desenvolvimento técnico e científico.
de
da
do
do
- Instituição de força de trabalho autônoma, por meio do fortalecimento
das organizações de colaboração existentes e de novas modalidades
de produção de bens ou prestação de serviços.
- Redirecionamento da tecnologia, em proveito da promoção social, no
contexto de uma economia contrária ao desperdício e à obsolescência
programada.
- Interrelacionamento de unidades de mão-de-obra em torno de
objetivos econômicos comuns, inseridos em novos sistemas de vida,
nos quais a cooperação prevaleça sobre a competição.
- Integração mais efetiva do conhecimento científico com a produção
de bens, visando a melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento
humano.
- Administração preferencialmente colegiada, consensual, com
representação de variados segmentos sociais, profissionais e
intelectuais e respeito ao direito de participação de minorias.
- Confrontação sistemática e habitual dos problemas nacionais com os
de outros países e exame do conjunto de questões regionais ou
mundiais de forma integrada, privilegiando os estudos para a redução
do aquecimento global, do crescimento da população e da
concentração de pessoas em áreas carentes.
- Revisão e aprofundamento das pesquisas sobre desenvolvimento
sustentável, visando melhor conhecimento e normatização da matéria,
no sentido de se evitar a utilização do conceito de modo fraudulento e
distorcido.
Os temas ora enumerados, apontando para variadas direções e preocupações, demonstram a
complexidade e amplitude de circunstâncias socioculturais capazes de influir na questão ambiental e na
formulação de novas normas jurídicas, ajustadas à realidade do mundo atual.
Nesse contexto parece predominarem duas posições principais, ou sejam, a dos visionários e a dos
pragmáticos.
Os primeiros, geralmente identificados como portadores de uma perspectiva mais avançada do
modelo de sociedade desejável, são, muitas vezes, vítimas da própria ousadia. Possuídos de fervor reformista,
mas alheios à realidade circundante, não raro são esmagados sob o peso das próprias formulações.
Os pragmáticos, por sua vez, não querendo chocar-se com princípios e sistemas estabelecidos,
dirigem seu interesse para objetivos de mais fácil acolhimento. Jamais se aventuram nas areias movediças de
novas idéias e, para maior segurança, constroem, cuidadosamente, o casulo onde envolvem suas teorias.
Em campo tão dividido e diferenciado, esboçam-se alternativas de posicionamento intelectual
vinculadas a idéias inovadoras e de razoável assimilação, de sentido libertário e descomprometido, capazes
de encarnar uma postura divergente ou contestatória.
Para alguns observadores, a existência desse último grupo seria um sinal evidente de que o mundo
está ingressando numa fase pós-capitalista, o que na verdade representaria um progresso, uma terceira via
baseada na justiça e na solidariedade e não nas fugidias e incertas forças do livre mercado.
Como se pode concluir, nessa seara há terreno bastante para nele lavrarem juristas e
ambientalistas, ao lado de outros operadores de diversos ramos da ciência, pois a especialização não elide a
colaboração recíproca e participativa, quando isenta de vaidades e personalismos e movida por idealismo e
amor ao próximo.
O AUTOR
Manoel Teixeira de Carvalho Neto iniciou seu curso de Direito em Salvador, BA, e o concluiu em
Niterói, RJ, em 12/12/1950, na Faculdade hoje integrante da Universidade Federal Fluminense.
Habilitado em concurso, foi nomeado Promotor de Justiça da Comarca de Irecê, BA, em 21/9/1951,
permanecendo no Ministério Público do Estado até 17/5/1955, quando foi exonerado a pedido.
Está inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil desde 8/4/1952. No Distrito Federal, para onde se
transferiu, vindo do Rio de Janeiro, continua em atividade como Consultor Jurídico do escritório Ladeira &
Schettini.
Exerceu diversos cargos de assessoramento jurídico, nos Ministérios da Justiça e das
Comunicações.
Foi Chefe da Procuradoria Jurídica da Fundação Hospitalar do Distrito Federal, Membro do
Conselho Diretor da Fundação Educacional do Distrito Federal, Assessor do Presidente do Conselho de
Justiça Federal e Assessor da Liderança do PSDB na Câmara dos Deputados.
Integrou a Delegação Brasileira à XVIII Conferência dos Estados da América Membros da OIT,
realizada em Ottawa, Canadá.
Jornalista durante cerca de dez anos, atuou, profissionalmente, em diversos órgãos de imprensa do
Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília.
Tem trabalhos jurídicos publicados na Revista Forense e em outros periódicos.
É Advogado Público, aposentado.
Download

Discurso realizado pelo Dr. Manoel Teixeira, Ouvidor da