IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
A REFLEXÃO CRÍTICA NA PRÁTICA DOS
PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA: A
PROPOSTA CURRICULAR É O PONTO DE
PARTIDA?
Adelmo Carvalho da Silva
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
A REFLEXÃO CRÍTICA NA PRÁTICA DOS PROFESSORES QUE ENSINAM
MATEMÁTICA: A PROPOSTA CURRÍCULAR É O PONTO DE PARTIDA?
Adelmo Carvalho da Silva1
RESUMO: Este ensaio faz parte da tese de doutoramento intitulada “Reflexão sobre a
Matemática e seu processo de ensino-aprendizagem: implicações na (re)elaboração de
concepções e práticas de professores”, defendida no Programa de Pós-Graduação da
Universidade Federal da Paraíba – UFPB/CE/PPGE no ano de 2009. Seu objetivo
consiste em descrever algumas considerações acerca da reflexão crítica no ensino da
Matemática nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, destacando a importância da
compreensão das propostas curriculares para o ensino de Matemática nesse processo.
Finaliza o texto tecendo algumas considerações sobre a importância desta na prática
pedagógica dos professores que ensinam matemática, apontando a mesma como
estruturadora e possibilitadora de transformações na prática educativa cotidiana dos
mesmos.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino da matemática – Reflexão – Proposta curricular.
Discutindo sobre a reflexão da prática
A palavra ‘reflexão’ sugere pensamento sério e austero distante da ação, com
conotações próximas de meditação e introspecção. Neste caso, refere-se a um processo
mental que acontece quando se olha para determinadas ações do passado, objetivando
compreende-las e dar um novo sentido a elas.
Dewey (1959) reconhecia que nós refletimos sobre um conjunto de coisas, no
sentido em que pensamos sobre elas, mas o pensamento analítico só tem lugar quando
há um problema real a resolver. Ou seja, a capacidade para refletir emerge quando há o
reconhecimento de um problema, de um dilema e a aceitação da incerteza. O
pensamento reflexivo tem subjacente uma avaliação contínua de crenças, de princípios e
de hipóteses face a um conjunto de dados e de possíveis interpretações desses dados.
1
Doutor em educação pela UFPB/PPGE/CE. Professor do Departamento de Educação UFMT/CUR –
[email protected]
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
Entender a idéia de ensino reflexivo implica procurar as suas raízes no
pensamento sobre a educação. Importa, então, caracterizar o pensamento reflexivo de
que fala Dewey (1959), destacar o termo reflexão e os vários tipos de reflexão descritos
por Schön (1992).
De acordo com este autor, pode-se distinguir a reflexão na ação, a reflexão sobre
a ação e a reflexão sobre a reflexão na ação. Os dois primeiros tipos são essencialmente
reativos, separando-os apenas o momento em que têm lugar, o primeiro ocorrendo
durante a prática e o segundo depois do acontecimento, quando este é revisto fora do
seu cenário. Ao refletir sobre a ação e como ele pensa a aprendizagem de seus alunos
consciencializa-se o conhecimento tácito, abre-se condições para que o professor possa
procurar crenças errôneas e reformular seu pensamento sobre a aprendizagem, a sua
prática pedagógica, incluindo um pensamento sobre as propostas curriculares que
norteiam a sua ação teórico-prática. Como refere Alarcão (1996, 2003), essa reflexão
consiste numa reconstrução mental retrospectiva da ação para tentar analisá-la. A
reflexão na ação permite ao educador desvincular-se da planificação inicial, corrigi-la
constantemente, compreender o que acarreta problemas, descentralizar-se, regular o
processo em curso sem se sentir ligado a procedimentos prontos. Esta tomada de
consciência sobre a ação de rever pontos, analisar a prática e refletir sobre a própria
prática contribui de forma significativa para o professor compreender como os alunos
estão aprendendo matemática.
Segundo Schön (1992), a reflexão sobre a reflexão na ação é aquela que ajuda o
profissional a progredir no seu desenvolvimento e a construir a sua forma pessoal de
conhecer. Trata-se de olhar retrospectivamente para a ação e refletir sobre o momento
da reflexão na ação, isto é, sobre o que aconteceu, o que o profissional observou, que
significado atribui e que outros significados pode atribuir ao que aconteceu. É a reflexão
orientada para a ação futura, é uma reflexão ativa, que tem lugar quando se revisitam os
contextos políticos, sociais, culturais e pessoais em que ocorreu, ajudando a
compreender novos problemas, a descobrir soluções e a orientar ações futuras.
Este tipo de reflexão é muitas vezes acompanhada de um desejo de justiça
social, emancipação, melhoramento e compromisso com a formação do sujeito
pensante. Esta reflexão auxilia o educador a compreender a sua prática cotidiana, rever
posicionamentos em relação a sua prática pedagógica e também sobre a aprendizagem
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
do aluno porque é a partir da reflexão da e sobre a prática que o educador matemático
poderá entender os fatores positivos ou negativos que interferem no processo de ensino
e aprendizagem dos seus educandos.
Neste contexto, merece ser problematizada a tendência para se dizer que
qualquer pensamento sobre a prática no ensino de matemática e em qualquer outra área
do conhecimento é reflexivo. Assumir essa idéia leva a encerrar a discussão em torno
das características e dos princípios subjacentes ao ensino reflexivo e, deste modo, não se
questiona a importância do pensamento reflexivo na educação, sobretudo, na
matemática. É, pois, necessário que o termo não seja absorvido, nem desvalorizado, mas
que, em vez disso, seja discutido e clarificado de forma crítica no interior da escola.
Interessa, ainda, que nesta análise não se perca a idéia da reflexão crítica associada ao
poder emancipatório dos educadores, pois é ela que favorece a capacidade de avaliar
criticamente a aprendizagem dos seus alunos e a prática do educador.
O movimento das práticas reflexivas tem-se desenvolvido à volta do conceito de
reflexão que foi, e continua a ser, objeto de estudo por parte de autores de diversas
áreas. Para além do substantivo reflexão, o correspondente adjetivo – reflexivo –
adquiriu um grande protagonismo na educação. É comum ouvir na escola ‘aquele
professor é reflexivo’, mas se analisarmos com cuidado veremos que na grande maioria
das vezes o que se denomina reflexão ou prática reflexiva está ligado diretamente a
manutenção e execução de modelo de propostas curriculares, avaliativas e de formação
elaborados por agentes que não pertencem ou não coadunam com a proposta da escola.
É uma reflexão que visa a manutenção de uma proposta neoliberal de educação e não
atende aos objetivos e metas da reflexão crítica – a transformação social.
No que se refere ao ensino de matemática, a reflexão pode partir de diversos
aspectos, uns relativos aos problemas e a organização da sala de aula, outros relativos à
compreensão matemática, isto é, à medida que se “conversa reflexivamente com a
situação” vai-se sendo capaz de tornar explícito o seu conhecimento matemático – falar
sobre os procedimentos e não apenas descrevê-los. Nesse sentido, a reflexão surge
associada ao modo como se lida com problemas da prática profissional, à possibilidade
da pessoa aceitar um estado de incerteza e estar aberta a novas hipóteses dando, assim,
forma a esses problemas, descobrindo novos caminhos, construindo e concretizando
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
soluções. Este processo envolve, pois, um equacionar e reequacionar de uma situação
problemática.
O processo reflexivo na/sobre prática pedagógica do professor de matemática
deve caracterizar-se como um movimento cíclico permanente entre acontecer e
compreender na procura de significado das experiências vividas pelo educador e
também pelos alunos, sujeitos da aprendizagem. Há, através das práticas, um ganho na
compreensão e esta nova compreensão pode fazer surgir novos significados sobre o que
significa ser professor e aluno. Os professores são conduzidos, através da reflexão na
sua própria prática e, especialmente, através da reflexão sobre ela a obter uma visão
crítica do contexto estrutural ou ideológico em que estão a trabalhar. Um papel essencial
atribuído pela reflexão sobre o conteúdo a ensinar, sobre as suas próprias práticas e
sobre o que é o ensino e a aprendizagem da matemática, podendo levar à alteração de
crenças e concepções sobre o que é ensinar matemática e da relação do professor com a
matemática.
O método de ensino deve constituir-se como uma forma de reflexão na ação, isto
é, possibilitar ao educador condições para que o mesmo possa refletir sobre os
acontecimentos e sobre as formas espontâneas de pensar e de agir, surgidas no contexto
da ação, e que orienta a ação posterior.
O professor precisa compreender que apenas a reflexão não basta, ela tem que
possuir força para provocar a ação transformadora, isto é, levar os intervenientes a
repensar a forma de ensinar matemática e de forma geral o ensino. Este processo pode
ser potencializado se existir um ambiente propício, como por exemplo, uma equipe
colaborativa como uma forma de enriquecer a reflexão individual, tornando-a coletiva.
Esta equipe deve funcionar como instigadores das práticas reflexivas, onde se colocam e
discutem de forma crítica as questões que resultam da prática, onde se sentem novas
necessidades e se constroem novos conhecimentos e saberes docentes. Ele deve ser um
agente criativo e inovador no processo de questionamento, característico das práticas
reflexivas críticas, mas o foco desse questionamento deve estar enraizado nos problemas
que afetam o ensino e a aprendizagem dessa disciplina, principalmente as propostas
curriculares, entendidas como eixos norteadores da prática.
Os professores que refletem criticamente em ação e sobre a ação estão
envolvidos num processo investigativo, para além da simples ação de refletir sobre o
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
que faz, mas o que sustenta este fazer – as propostas curriculares – não só tentando
compreender-se a si próprios melhor como professores, mas também procurando
melhorar a sua forma de ensinar conhecer/descobrir, a sua prática pedagógica. Esta
perspectiva pressupõe que ensinar é mais do que uma arte, é uma procura constante com
o objetivo de criar condições para que aconteçam aprendizagens significativas.
Outro ponto importante no desenvolvimento da reflexão crítica é o registro dos
acontecimentos da sala de aula. Mas antes de apresentar a problemática é necessário
analisar algumas questões. A prática do registro é comum nas ecolas brasileiras? Ao
registrar a sua reflexão sobre o ensino de matemática, o professor reflete sobre o que
ensina, as propostas curriculares que sustentam o pensamento sobre o ensino, a
formação, a escola, o contexto social e o aluno? Ele compreende as habilidades e as
competências matemáticas necessárias a serem desenvolvidas no aluno nas aulas de
matemática? Em relação a primeira questão podemos afirmar que alguns professores
possuem a prática de registros. Registros que podem ter conotações de relatos de aula;
relatos específicos sobre aprendizagem; registro tipo planejamento e registros
espandidos. Todos possuem sua relevancia. O principal no movimento da prática do
registro não é o tipo mas sim a utilização que o educador faz do mesmo.
A posteriori, o registro da reflexão permite analisar mais tranqüilamente os
acontecimentos ocorridos na sala, e através da compreensão e reflexão destes, o
educador poderá construir saberes que os ajudarão a compreender e a desenvolver a sua
prática pedagógica e as propostas curriculares que a sustentam. A compreensão da
prática, da aprendizagem matemática dos alunos e o registro reflexivo crítico destes
elementos poderão contribuir de maneira significativa para a educação oferecida nas
escolas. Além disso, para refletir e registar a aprendizagem matemática do aluno, o
educador precisa compreender os vários tipos de aprendizagens enfatizados pelos
pesquisadores na área de educação: aprendizagem por imitação de modelos, a
aprendizagem repetitiva, aprendizagem por descoberta, aprendizagem por recepção e
muitos outros tipos surgidos no contexto da sala de aula.
Retomando a questão da reflexão, na vida profissional do educador e sua
importância para a compreensão das propostas curriculares, é mister considerar que ela
constitui um elemento importante para a compreensão do processo de aprendizagem e
das propostas que o sustenta. Os trabalhos de Schön (1992) sobre as práticas, tornaram
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
claro que há zonas indeterminadas da prática – incerteza, caráter único e conflito de
valores que necessitam de abordagens flexíveis que permitam, justamente, lidar com
situações ambíguas e complexas, incluindo as questões curriculares. As soluções
técnicas não ajudam os professores nestas situações.
As investigações que têm sido conduzidas sobre as práticas dos professores dão
conta de um conhecimento que resulta das suas experiências e sublinham o papel da
reflexão crítica para o desenvolvimento profissional. Zeichner (1993) preocupa-se com
os processos de investigação educacional e tem se envolvido nas investigações
realizadas pelos próprios professores. Considera, tal como Schön (1992), que o agir do
professor na sala de aula é informado pelas suas teorias pessoais. Zeichner (ibid) adianta
que a reflexão constitui uma dimensão do trabalho do professor que, para ser entendida,
precisa integrar as condições de produção desse trabalho. As escolhas e as opções que
os professores fazem têm implicações nas oportunidades que são proporcionadas às
crianças e, neste sentido, na justiça social. Assim, um professor que não reflete sobre o
ensino, atua de acordo com a rotina, aceitando a realidade da escola, do meio social,
econômico, e dos currículos globalizados como únicos meios para moldar a sua prática.
Seus esforços passam a ser direcionados apenas no sentido de encontrar as soluções que
outros definiram por ele. O professor crítico-reflexivo é, então, o que busca o equilíbrio
entre os elementos apontados acima e a ação teórico-prática.
Zeichner (1993), corroborando com o exposto, considera que há aspectos
constituintes das práticas do professor reflexivo como, analisar e enfrentar os dilemas
que se colocam na sua atividade, assumir os seus valores, estar atento aos contextos
culturais e institucionais, envolver-se na mudança e tornar-se agente do seu próprio
desenvolvimento profissional. O ensino reflexivo, na perspectiva de contribuir para a
mudança na prática requer uma auto-análise permanente por parte do professor, o que
implica abertura de espírito, análise rigorosa e consciência social, no que diz respeito à
educação. Por exemplo, quando se fala em ensino da matemática, o professor, inserido
na equipe de professores com quem trabalha em uma determinada escola, precisa
analisar a situação concreta, perceber os alunos com que trabalha, o que se espera que
eles aprendam em matemática, o que entende hoje por aprender e ensinar matemática e
o seu papel na formação pessoal e social do aluno. É este processo investigativo
realizado pelo professor, em termos individuais e coletivos, que o leva a ação, ou
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
melhor, refletir sua ação. Para que esse processo tenha lugar, é necessário que o
professor questione e reflita sobre situações de ensino e aprendizagem ocorridos na sala
de aula e que posteriormente o faça no contexto da sua equipe.
Esta ação reflexiva confere poder emancipatório ao professor para que ele exerça
a transformação e não pode ser dissociada do contexto social e cultural em que se
insere. Implica um “desejo ativo” de transformação no sentido de alterar a situação
social onde nos movimentamos, quer seja a escola quer seja a sala de aula. Neste
enquadramento, o professor reflexivo deve ser um educador que compreende e valoriza
a educação, que atribui importância a questões globais da educação, como as finalidades
e as conseqüências do ponto de vista social e pessoal, a racionalidade dos métodos e do
currículo e a relação entre essas questões e a sua prática de sala de aula.
A capacidade de reflexão do professor torna-se mais profunda à medida que
aumenta a sua autoconfiança que, por sua vez, está ligada ao aprofundamento dos seus
conhecimentos. Mas esta situação nem sempre é confortável para o professor reflexivo,
pois as suas certezas são muitas vezes abaladas por crenças, ideologias, teorias,
propostas de outros, etc. A reflexão, ou melhor, a prática reflexiva proporciona aos
professores oportunidades para o seu desenvolvimento, tornando-os profissionais mais
responsáveis, melhores e mais conscientes, potencializando a transformação que se
deseja no ensino de matemática.
Uma abordagem reflexiva valoriza a construção pessoal do conhecimento e
legitima o valor epistemológico da prática profissional, Schön (1992), surge então, a
prática como elemento de análise e de reflexão do professor. Acredito que esta idéia
deva estar presente na prática pedagógica do professor de matemática. Ao envolver-se
em projetos de investigação-ação sobre a prática numa abordagem reflexiva, o professor
passa a refletir sobre a sua prática, aumentando o seu conhecimento profissional à
medida que consegue explicitar diferentes aspectos do seu conhecimento tácito.
A tomada de decisões consciente é um dos atributos que, de um modo geral, se
considera no professor reflexivo. Ela tem por base um corpo de conhecimentos sólidos,
que o professor reinterpreta de acordo com cada experiência que vive. A intuição, a
sensibilidade, as questões éticas e a consciência sociocultural são outros aspectos
referidos na literatura como constituintes do movimento da prática reflexiva. Os
professores reflexivos, principalmente aqueles que registram sua reflexões, devem
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
desenvolver a prática de reflexão anterior a ação, na ação e posterior a ação para
entender o aluno, sobretudo como ele aprende com base na sua própria investigaçãoação num dado contexto escolar ou sala de aula, que constituem sempre um caso único.
A sua prática deve ser sustentada nas teorias da educação e da psicologia da
aprendizagem em relação às quais o professor mantém uma perspectiva crítica. Deste
modo, a prática é sujeita e submetida a um processo constante de vaivém que conduz a
transformações e a investigações futuras.
Entendo que esta maneira de ver e conceber a prática educativa no ensino e na
aprendizagem da matemática – como elemento de reflexão – contribui de forma
significativa para a compreensão da mesma.
A prática reflexiva crítica no ensino de matemática
Para entendermos a reflexão da prática pedagógica dos professores que ensinam
matemática nos Anos Iniciais, é necessário problematizarmos duas questões
fundamentais na realização da reflexão sobre a prática. A primeira: O que é a reflexão?
A Segunda consiste em ir um pouco mais além. Como começa a reflexão? Peréz (2004,
p. 252) teorizando sobre a prática reflexiva dos professores de matemática afirma que a
reflexão deve ser entendida e vista, “como um processo em que o professor analisa sua
prática, compila dados, descreve situações, elabora teorias, implementa e avalia projetos
e partilha suas idéias com colegas e alunos, estimulando discussões em grupo”.
Pode-se constatar, então, que a reflexão para ser crítica ‘deve’ partir do
individual, na sala de aula, acontecer no contexto da formação docente e até mesmo
extrapolar a esfera individual para a coletiva. Esta socialização das experiências
educativas com os outros é que poderão ser de grande importância para a mudança na
prática educativa dos educadores. Porque deixa de ser solitária e passa a ser coletiva,
imprimindo necessidades de mudanças.
Dewey (1959) afirma que a reflexão não está no fato de que uma coisa indica ou
significa outra. Ela inicia, quando começamos a investigar a idoneidade, o valor de
qualquer índice particular; quando experimentamos, verificamos sua validade para
sabermos qual é a garantia de que os dados existentes realmente indicam a idéia
sugerida de modo que justifique aceitá-la. Dessa forma podemos afirmar que reflexão
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
subtende que se crê ou não se crê em algo, não por causa dela própria e sim por
intermédio de alguma outra coisa que lhe sirva de testemunho, evidência, prova,
documento, garantia, em suma, de fundamento da crença.
No entanto, se analisarmos a literatura referente à educação matemática dos
últimos 25 anos, constataremos que há poucas pesquisas relatando que os alunos de uma
classe ou de um estabelecimento dominassem perfeitamente os saberes e as
competências visadas pelo educador. Por isso, no ensino de matemática, a prática
reflexiva crítica e permanente não pode limitar-se apenas a resolução das crises, de
propostas curriculares, formação de professores, de problemas educativos ou de dilemas
desumanos apresentados no contexto da sala de aula. É importante que o educador
imagine-a como um funcionamento estável, necessário e vital para que ele possa
compreender a sua prática, o quê e como o seu aluno apreende matemática e qual é o
papel dessa área do conhecimento na vida do educando. Para isso, é fundamental que o
professor, tenha ausência de preconceitos em relação ao aluno e a aprendizagem do
mesmo e disposição para aceitar e implementar novas idéias. Ter atitudes, iniciativas
própria para propor alternativas metodológicas inovadoras que venham possibilitar a
aprendizagem dessa disciplina, atitude de responsabilidade baseada em princípios
éticos, morais, culturais, etc. A reflexão crítica da prática educativa implica exatamente
isso.
A prática reflexiva crítica no ensino de matemática deve ser entendida como um
modo possível dos professores interrogarem as suas práticas de ensino, reverem
posicionamentos, crenças em relação a atividade matemática o conhecimento
matemático, a linguagem matemática utilizada pelo educando, etc. A reflexão crítica, na
matemática e em qualquer outra disciplina, fornece oportunidades para que o educador
possa “voltar atrás” e rever, redimensionar acontecimentos e ainda mais sua postura
frente a matemática e seu ensino, na sala de aula e na escola. Esse “voltar” possibilita
ao professor refletir sobre o aluno, sobre a aprendizagem do mesmo e,
conseqüentemente, sobre a sua prática docente. Ou seja, perguntar a si mesmo. Como
ele aprende matemática? O que ele aprendeu? O que poderá ser feito para que ele
aprenda? Qual é a importância da aprendizagem do conteúdo matemático ensinado?
Qual será a relevância dos conteúdos apreendidos para o bom desempenho deste aluno
no mundo atual. Estas são perguntas que só podem ser respondidas com a reflexão
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crítica sobre a prática e no desenvolvimento desta. Como se pode perceber, refletir a
prática em matemática implica também um refletir as propostas curriculares que
sustentam a ação teórico-prática.
Nesse sentindo, pode-se conjecturar que um educador matemático crítico, que
assume a prática de registro na prática cotidiana e rotineira (rotineira não é sinônimo de
sonífera) deve refletir criticamente sobre sua própria relação com o saber matemático,
com a forma de ensinar e avaliar esse saber, com o conteúdo, com as pessoas, com o
poder, com as instituições, com as tecnologias, com o tempo que passa, a cooperação,
tanto quanto sobre o modo de superar as limitações ou de tornar seus gestos técnicos
mais eficazes, buscando desenvolver uma prática que conduza o aluno a exercitar sua
cidadania.
Nesse sentido, reafirma-se que a prática reflexiva metódica e o registro dessa
prática devem inscrever-se no tempo de trabalho do educador matemático como uma
rotina. Não uma rotina sonífera, incoerente e acrítica, mas sim como um estado de alerta
permanente da prática e da relação teoria-prática x prática-teoria. Por isso, ela tem
necessidade de disciplina e de métodos para observar, memorizar, escrever, analisar
para escolher opções novas e transformadoras. Dessa forma, pode-se afirmar que a
reflexão sobre a aprendizagem da matemática do aluno deve ser pensada criticamente,
registrada e analisada de forma a possibilitar ao educador, meios, para que o mesmo
possa rever sua própria prática e com isso buscar alternativas didáticas e metodológicas
eficazes, propiciando uma aprendizagem matemática significativa para o aluno e novos
saberes docentes para o educador.
Uma prática reflexiva profissional, e aqui se insere a prática docente crítica,
jamais é inteiramente solitária, pois se apóia em conversas informais, momentos
organizados de profissionalização entre os educadores, da reflexão individual ou
coletiva sobre o ensino, e de sua qualidade, da avaliação do que se faz e como se faz. A
prática reflexiva, pautada no registro, até pode ser solitária, mas ela passa também pelos
grupos – o professor não vive isolado –, apela para especialistas externos, insere-se em
redes, isto é, apóia-se sobre formações, conhecimentos adquiridos, oferecendo os
instrumentos ou as bases teóricas para melhor compreender os processos em jogo, ou
seja, a prática docente e, com isso, melhor compreender a si mesmo.
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
Por que seria necessário inscrever a atitude reflexiva critica na identidade
profissional dos professores, principalmente, daqueles que trabalham com matemática
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental? Ela serve para liberar os profissionais do
trabalho prescrito, para convidá-los a construir suas próprias iniciativas práticas,
teóricas e técnicas em função dos alunos, do local, do meio ambiente, das parcerias, de
cooperações possíveis, dos recursos e das limitações próprias do estabelecimento e dos
obstáculos encontrados ou previsíveis. Registrar e refletir criticamente é assumir a
possibilidade de mudança de postura educativa, da prática de não aceitação passiva do
imposto pelos outros como verdadeiro e acabado é a busca de novos conhecimentos e
saberes metodológicos, práticos e teóricos.
Como o ato de ensinar é um ofício em que os problemas de aprendizagem de
matemática quase sempre estão voltando ao ponto de partida, isto é, a falta de
conhecimento de uma determinada área, a reflexão sobre a aprendizagem dos alunos
pode e deve se desenvolver também antes da ação, não somente para planificar e
construir os cenários que o professor julga necessário. Os saberes metodológicos
incluem a observação, a interpretação, a análise, a antecipação, a memorização, a
comunicação oral e escrita, uma vez que a reflexão nem sempre se desenvolve em
circuito fechado nem no imediato. Os saberes teóricos, o bom senso, apoiado sobre
capacidades de observação e de raciocínio permite um primeiro nível de reflexão. Em
certos casos, o domínio dos saberes a ensinar é crucial. Se este falha alguns problemas
não podem ser colocados e nem refletidos. Por exemplo, a interpretação de alguns erros
de compreensão em relação à matemática pode e deve ser esclarecido pela história – a
cultura matemática – e pela epistemologia da disciplina.
Uma prática pedagógica reflexiva-crítica confere poder aos professores e
proporciona oportunidades para o seu desenvolvimento profissional.
Propostas pedagógicas para o ensino da matemática: elementos desencadeadores
de reflexão sobre propostas curriculares?
Pesquisadores brasileiros da área de Matemática têm centrado suas investigações
em recursos que norteiam as propostas curriculares. Dentre eles destacam-se: uso de
jogo e materiais concretos no ensino de matemática - o aluno torna-se construtor do seu
conhecimento, onde o professor é simplesmente um orientador; etnomatemática -
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
estudo da matemática usada e criada por cada grupo sócio-cultural, visando recuperar os
conhecimentos culturais de cada grupo, através dela busca a sistematização e a
utilização de tais conhecimentos no processo ensino aprendizagem; resolução de
problemas- relacionadas a dois objetivos distintos, um é o ato de tentar entender quais
são os pontos positivos que cada aluno possui para ser um bom resolvedor de problemas
e o outro seria a intenção de transformar os alunos em bons resolvedores de problemas,
utilizando para tal uma seqüência didática.
A resolução de problemas tem como característica fundamental ao auto
desenvolvimento do aluno que passa a questionar e tirar suas próprias conclusões;
modelagem matemática - utiliza uma situação problema da vida real buscando uma
solução apropriada na matemática, favorecendo ao aluno consciência da utilização desta
disciplina na resolução e análise de problemas do dia-a-dia; uso da história no ensino de
matemática- tem caráter investigatório no processo ensino aprendizagem, auxiliando os
estudiosos na investigação dos tópicos estudados; uso de computadores no ensino de
Matemática - Duas abordagens distintas são observadas no uso de computador no
ensino da Matemática, uma é usada como programa de instrução assistida por
computador, ou seja, o computador é a ferramenta principal no processo ensino
aprendizagem, e a outra o computador é usado simplesmente como mais um recurso da
Educação Matemática; elementos da psicologia cognitiva - nesta abordagem tem-se
como ponto relevante compreender e determinar as condições pelas quais o ensino
poderá ser mais significativo para o aluno amparados na abordagem desenvolvimentista
e construtivista tentam demonstrar, é construído pelo sujeito epistemológico. A partir da
compreensão desses resultados, o educador poderá, desenvolver alternativas
metodológicas e didáticas que fundamentem a sua prática pedagógica e uso de jogos
matemáticos - para conseguir despertar interesse dos alunos e facilitar a compreensão e
assimilação dos conteúdos matemáticos utilizam-se os jogos pedagógicos que tem um
caráter ocasional. Tais jogos possuem duas classificações: Jogos de aprendizagem – que
visa facilitar o entendimento de conceitos matemáticos; Jogos de fixação – são jogos
que facilitam a sistematização dos conteúdos matemáticos através de exercícios.
No entanto, o que se percebe na escola é que ainda há uma grande influencia da
visão tradicional acerca da Matemática, sobre os conteúdos curriculares, onde a mesma
é entendida como sendo uma ciência inacessível para a maioria, mito fortalecido pelos
Adelmo Carvalho da Silva
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
resultados de testes nacionais e internacionais, dos quais têm participado alunos
brasileiros, dos Anos do Ensino Fundamental. O ensino da Matemática na escola,
exceto em algumas, não tem atendido às expectativas da sociedade, que exige que o
educando esteja cada vez mais apto na utilização de recursos que dependem dessa
ciência.
Não se deve negar que a Matemática, principalmente nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental, deveria desempenhar um papel formativo básico das capacidades
intelectuais, um papel funcional, na construção de conhecimentos em outras áreas e um
papel instrumental, de aplicação a problemas e situações da vida cotidiana. Não deve ser
vista apenas como a ciência acabada da quantidade e do espaço, ligada às necessidades
de contar, calcular, medir, organizar o espaço e as formas, mas como ciência em
constante processo de construção/reconstrução, do qual o aluno participa, reconhecendo
suas habilidades matemáticas e empregando-as em situações-problema.
Deve se reconhecer que a Matemática possui conceitos, métodos, regras e uma
linguagem própria, mas entendemos que a sua aprendizagem não se constitui elemento
de excelência apenas para pessoas intelectualmente especiais e/ou de classes mais
abastadas. Por fazer parte do universo das diversas áreas do conhecimento, a
Matemática precisa tornar-se uma ciência de acesso a todos, garantindo a construção de
uma sociedade mais justa, mais igualitária, que favoreça a hominização dos sujeitos
sociais.
Como contraponto a essa idéia, convivemos, salvo raras exceções, com um
sistema escolar que fragmenta e descontextualiza a Matemática, sua proposta curricular
alheio às mudanças da sociedade e às implicações que tais mudanças provocam em
todas as áreas do conhecimento, as quais alimentam novas transformações, de maneira
dialética e permanente. Torna-se necessário, cada vez mais, saber ler e compreender a
Matemática apresentada nas mais diferentes formas e áreas do conhecimento.
O ensino de matemática deve ir além de simples técnicas para a aplicação em
exercícios padronizados. Deve oferecer meios que garantam ao aluno a compreensão
dos conteúdos, através de reflexões, análises, construções e reconstruções. Tal
afirmação exige uma postura crítica em relação às práticas curriculares utilizadas pelos
professores. Implica a participação dos educandos, numa variedade de situações
significativas, é condição essencial para que eles se tornem sujeitos das transformações
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A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
desejadas. O ensino contextualizado, nas mais diversas formas do saber, é uma das
formas de desenvolver a articulação com outros conteúdos e disciplinas. Uma formação
matemática comprometida com a formação do cidadão subentende a integração dos
conhecimentos dessa ciência com os de outras áreas, principalmente com a língua
materna, promovendo o desenvolvimento integral do indivíduo.
No processo de ver o ensino/aprendizagem da Matemática em uma visão de
conjunto, terão grande importância as atividades de comunicação, de organização e
tratamento dos dados, de processos de cálculos, entre outras, que auxiliarão o aluno a
perceber o caráter ferramental da Matemática, mas também sua natureza formativa e sua
beleza.
Em matemática, a simples compreensão de exercícios padronizados não basta
para assegurar a aprendizagem escolar. Tem-se que buscar insistentemente que o
educando chegue ao saber matemático, que compreenda as informações e
conhecimentos. Não basta que o educando aprenda rudimentos de idéias ligadas a
matemática estabelecidas pelos conteúdos curriculares é preciso que este aprendizado
seja reconhecido por uma comunidade científica, a sociedade. Nesse sentido
reafirmamos que uma das principais funções da educação é a propagação do saber ou
dos saberes, a cultura. As novas orientações pedagógicas/curriculares acentuam a
importância da construção do conhecimento, das construções de cada educando para o
acesso ao saber.
Dessa forma, torna-se inegável a asseveração de que as propostas
pedagógicas/curriculares em relação ao ensino de matemática foram obrigadas a
evoluírem-se muito neste final do século XX e inicio do século XXI, principalmente
com a contribuição das ciências humanas, com o grande progresso das teorias da
aprendizagem, do desenvolvimento do construtivismo, realçando o papel ativo do
aprendiz na construção do saber. A matemática, bem como seu ensino foi conduzido a
deixarem de lado as idéias de ser “a rainha das ciências” e o ensino pautado em
fórmulas e regras pré-definidas pela própria ciência matemática, passou a ser entendido
como sendo um conhecimento cultural/social construído e apreendido pelo sujeito nas
suas mais diversas relações com a cultura.
Do exposto, pode-se afirmar que as atuais propostas pedagógicas/curriculares,
não privilegiam mais a transferência dos conteúdos prontos, acabados. Antes disso,
Adelmo Carvalho da Silva
5817
A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
exigem uma reflexão crítica sobre os mesmo, as propostas curriculares que os
sustentam. Acentuam a interação do aluno como objeto de estudo, a pesquisa, a
construção dos conhecimentos para o acesso ao saber. As aulas, bem como os
fundamentos teóricos e as propostas curriculares que as sustentam são consideradas
fundamentais nas situações de aprendizagem, para a mediação, onde o trabalho dos
alunos na apropriação do conhecimento e a orientação do professor passam a ter grande
relevância para o acesso ao saber. O significado da atividade matemática tem um novo
valor para os educandos, o saber elaborado na/pela reflexão crítica do professor passa a
ter um novo sentido para a sua ação prática – ele germina da consciência
deliberada/intencional sobre o que, como e por que se ensina matemática e as bases
teóricas e epistemológicas que a sustenta. Nesse processo de construção do saber, o
aprendiz aplica os seus conhecimentos e modos de pensar ao objeto de estudo; age,
observa, seleciona os aspectos que chamam a sua atenção, estabelece relações entre os
vários aspectos desse objeto e atribui significados a ele, chegando a uma interpretação
própria.
As novas propostas pedagógicas/curriculares exigem que o educador
compreenda as atuais características desejadas para os professores de matemática no
século XXI e além disso, exige que o mesmo tenha condições de refleti-las de forma
crítica em sua prática. A reflexão crítica defendida, distante da idéia de modismo na
educação, assentada nas teorizações de Car (1996), Kar e Kemmis (1998), Giroux
(1986; 1992; 1997), Zeichner (1993a, 1993b) e Contreras (2002) defende um
pensamento e ação do professor capaz de transformar.
Beatriz D’Ambrósio (1993) descreve as cinco características necessárias que
poderão auxiliar no desenvolvimento e compreensão de novas práticas para o professor
de Matemática: visão do que vem a ser a matemática – como disciplina fria sem
espaço para a criatividade ou como disciplina de investigação/criação e resolução de
problemas, onde o aluno é conduzido ao aprendizado matemática e não apenas a mera
“decoreba” de fórmulas e procedimentos matemáticos; visão do que constitui a
atividade matemática – da visão absolutista (acúmulo de conhecimentos pelo aluno) a
visão atual – aluno passa a ter e compreender legítimas experiências matemáticas, estas
experiências devem se identificar pelo reconhecimento de problemas, e legitimidade das
soluções propostas a estes problemas; visão do que se constitui a aprendizagem da
Adelmo Carvalho da Silva
5818
A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
matemática
–
compreender
como
as
crianças
aprendem
como
eles
resolvem/interpretam uma situação-problema, quais conhecimentos usam nesta solução
e quais os conflitos cognitivos cuja resolução leva a aprendizagem; visão do que
constitui um ambiente propício a aprendizagem da matemática – deve ser um
ambiente onde os alunos propõem, exploram e investigam problemas matemáticos,
levando-os a pesquisar sobre a matemática. O professor deixa de ser o dono do saber
matemático e passa a ser um membro integrante do grupo de trabalho. Nesse sentido o
ambiente propício deve encorajar os alunos a propor soluções, encarar os desafios,
explorar as possibilidades, levantar hipóteses, justificar seus raciocínios e com isso
validar suas próprias soluções.
Nessa perspectiva é necessário que o educador seja um crítico reflexivo, que
reflita sobre as práticas utilizadas no processo de ensino-aprendizagem desta disciplina,
que ao abordar um conteúdo considere-o como imprevisível e passível de mudanças de
organização didática da aula, pois o problema a ser resolvido na aula de matemática
deve ser direcionado tendo como referencial o educando e não apenas pelo
autoritarismo didático do professor, e ainda, muito menos ao currículo pré-estabelecido.
O entendimento do exposto, da descentralidade da figura do professor nas aulas de
matemática e da reflexão crítica sobre o currículo posto, foi o grande avanço em relação
ao ensino desta disciplina. Ao invés da seqüência do livro didático – da execução do
programa curricular estabelecido por outros atores – e da quantidade de conteúdos a ser
trabalhado pelo educador, deve-se priorizar a compreensão minuciosa de cada problema
a ser resolvido. Nessa perspectiva a primazia passa a ser aprendizagem do aluno, o valor
que o mesmo tem para o educando, e não apenas o conteúdo matemático de uma
proposta determinado por outros agentes distantes da realidade escolar.
O ambiente educativo assume lugar de excelência no processo de ensinar e
aprender, as exigências passam ser outras, procura-se incentivar o uso de recursos
como os livros, material manipulativos, calculadoras, computadores e diversos recursos
humanos. Busca-se reafirmar a necessidade de trabalhar a matemática de forma
significativa, desenvolvendo uma ação norteada na reflexão crítica, sobre as práticas
utilizadas para/no desenvolvimento da aula.
Adelmo Carvalho da Silva
5819
A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
Acreditando no fato de que o processo de aprendizagem da matemática se baseia
na ação do aluno no momento da resolução de problemas, em investigações e
explorações de dinâmicas de situações que o integram. Nesse sentido, pode-se afirmar
que se está diante de um novo paradigma em educação e educação matemática, onde as
principais idéias são: as experiências matemáticas dos professores e dos alunos como
algo fundante para o ensino de matemática, o conhecimento matemático não mais
centrado na figura do professor, mas no professor e no aluno e o aluno como sujeito
principal do conhecimento e a matemática voltada/ligada a outras áreas do
conhecimento, objetivando a construção do saber matemático.
Referências
ALARCAO, I. Reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de
formação de professores. In: ______(Org.), Formação reflexiva de professores:
Estratégias de supervisão. Porto: Porto Editora, 1996.
ALARCAO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 2 ed. São Paulo:
Cortez, 2003
CONTRERAS, J. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002
DEWEY, J. Como pensamos: como se relaciona o pensamento reflexivo com o
processo educativo: uma exposição. 3 ed. São Paulo: Companhia editora nacional, 1959.
D’AMBRÓSIO, B. Formação de professores de matemática para o século XXI: o
grande desafio. In: Proposições. (Revista quadrimestral da Faculdade de Educação da
Unicamp), v. 4, n.10, (Março), 1993. (p.35-41).
FOSSA.J.A; M.I.A. Tendências atuais na educação matemática: experiências e
perspectivas. In: Encontros de Pesquisa Educacional do Nordeste: Educação
matemática. Natal: EDUFRN, 1998.
PEREZ, G. Prática reflexiva do professor de matemática. In: BICUDO, M. A. V;
BORBA, M. DE C. Educação matemática: pesquisa em movimento. São Paulo:
Cortez, 2004.
SCHÖN, D. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a
aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.
Adelmo Carvalho da Silva
5820
A Reflexão na Prática dos Professores que Ensinam Matemática: a proposta curricular é o ponto de partida?
ZEICHNER, K. A formação reflexiva de professores: idéias e práticas. Lisboa:
Educa. 1993.
Adelmo Carvalho da Silva
5821
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
POLÍTICAS CURRICULARES COTIDIANAS E AS
REDES DE CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS
Carlos Eduardo Ferraço
Jackeline Magalhães Brum
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
POLÍTICAS CURRICULARES COTIDIANAS E AS REDES DE
CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS
Carlos Eduardo Ferraço (PPGE/UFES – CNPq)
Jackeline Magalhães Brum (PPGE/UFES)
RESUMO: Trata-se de resultados da pesquisa "Currículo e formação continuada de
educadores na complexidade do cotidiano escolar", desenvolvida no Município de
Vitória/ES, com financiamento do CNPq, na qual realizamos grupos de estudos e
oficinas, a partir das necessidades dos educadores em termos do currículo prescrito
oficial de matemática seguido na escola. Nosso principal objetivo foi investigar os
currículos de matemática tecidos em redes pelos sujeitos praticantes do cotidiano,
tentando nos diferenciar das tradicionais análises que se limitam à defesa de alternativas
que se reduzem às propostas didáticas e/ou metodológicas para o campo da educação
matemática. Tentando corresponder a nossa intenção de realizar uma pesquisa com os
cotidianos escolares, pudemos perceber a força que o discurso hegemônico que associa
a matemática aos processos de quantificação ainda possui no imaginário social,
definindo padrões de beleza, comportamento e valores. Os efeitos dessa visão
reducionista nas escolas são devastadores, sobretudo no fortalecimento de inúmeros
processos de quantificação que perpassam alguns determinantes da escola: estrutura
física, organização administrativa, gestão, planejamento, processo ensino-aprendizagem
e sistemática de avaliação.
PALAVRAS-CHAVE: políticas de currículo; educação matemática; redes de
conhecimentos.
Sobre nossa entrada nas escolas e as questões de interesse comum...
Quando somos convidados pelos educadores1 de escolas públicas para assessoria
na área de currículo, tentamos vincular nosso trabalho à possibilidade de desenvolver
pesquisas nas escolas em questão. Assim, nas conversas iniciais com os professores
buscamos negociar os objetivos da assessoria com nossos interesses de estudo, de modo
1
No decorrer do texto estaremos usando alternadamente o feminino e o masculino.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5825
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
a tecer redes de relações que possam contemplar, minimamente, as expectativas e
necessidades de todos os envolvidos.
O presente texto apresenta fragmentos das discussões realizadas nas oficinas e
grupos de estudos que aconteceram por ocasião das solicitações feitas pelos educadores,
ao mesmo tempo em que expressa algumas problematizações decorrentes da pesquisa
“Currículo e formação continuada de educadores na complexidade do cotidiano
escolar: negociações e performances no entre-lugar da cultura”, desenvolvida no
período de 2005 a 2007 em escolas da Rede Municipal de Ensino de Vitória, ES.
Nas conversas iniciais em uma das escolas pesquisadas, as professoras falaram
sobre a necessidade de discutirmos o ensinoaprendizagem2 de matemática que, segundo
elas, “necessitava de uma injeção de ânimo”. Em suas queixas, apontavam questões de
ordem metodológica e didática associadas aos conteúdos que, como pudemos entender,
“não faziam muita diferença para os alunos, não despertavam a curiosidade deles”.
À medida que íamos dialogando várias situações iam sendo colocadas e, a cada
encontro3, crescia a necessidade por parte dos professores de realizarmos oficinas para
produção de materiais e jogos didáticos, ou mesmo para ensinar a usar os jogos que
foram comprados pela Secretaria de Educação e distribuídos nas unidades de ensino.
De modo a corresponder às demandas sugeridas, confeccionamos e estudamos
alguns jogos e materiais pedagógicos, ao mesmo tempo em que problematizamos o que
estávamos entendendo por “matemática”, o modo como os conteúdos estavam dispostos
na proposta curricular e, ainda, como os mesmos eram “trabalhados” nas salas.
Sobre nossas discussões iniciais nas oficinas e grupos de estudos...
Iniciamos os mini-cursos com a confecção da Escala Cuisenaire4, um material
interessante para trabalhar comparação de quantidades e as quatro operações, entre
2
Estética da escrita que aprendemos com Nilda Alves na tentativa de, ao unirmos determinadas palavras,
ampliar seus significados, inventando outros tantos, buscando romper com as marcas que carregamos da
ciência moderna, sobretudo a maneira dicotomizada de analisar a realidade.
3
Os encontros aconteciam uma vez por semana, às sextas-feiras, das 11h30min às 12h00min para o turno
matutino e das 17h30min às 18h00min para o vespertino. De vez em quando conseguíamos meia hora a
mais em cada um dos turnos e, excepcionalmente, nos era concedido todo o horário depois do recreio.
4
A escola havia recebido caixas de Escala Cuisenaire. Entretanto, as professoras tinham dúvidas em
como trabalhar e, como sempre acontece com os materiais comprados, as barrinhas eram muito pequenas
dificultando o uso pelos alunos. Como alternativa, aumentamos o tamanho das barras usando papel cartão
dobrado nas cores correspondentes e encapamos com contact transparente para durar mais tempo.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5826
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
outros usos (CERTEAU, 1994) possíveis. As barrinhas têm cores padronizadas, e a cada
uma corresponde um número. Assim, a associação com as quantidades se faz pelo
tamanho e pela cor da barra, ou seja, a barra branca corresponde ao número 1 e media,
no nosso caso, 6 cm. A barra vermelha corresponde ao 2 e media 12cm, a barra verdeclaro corresponde ao 3 e media 18cm, e assim por diante como na figura abaixo.
A partir da realização das atividades de comparação de números5,
principalmente quando as professoras questionaram sobre o uso das barras para ensinar
as operações, surgiram interrogações que nos permitiram fazer pontes com a discussão
do currículo. Uma dessas questões derivou de uma situação na qual uma professora
ficou em dúvida sobre como usar as barras de modo a não correr o risco de ter que
trabalhar com a noção de negativo6. Se para as operações de adição não haveria esse
problema7, na subtração8 isso poderia acontecer!
Ou seja, caso um aluno quisesse realizar a operação 5 – 7, ele teria que colocar a
barra do sete em cima da barra do cinco e, ao invés de sobrar um pedaço em cima para
5
Esta era uma atividade na qual, por exemplo, para saber se 5 é maior, menor ou igual a 7, bastava
colocar as barrinhas correspondentes ao 5 e ao 7 uma ao lado da outra e, desse modo, era possível
“visualizar” a quantidade a partir do tamanho e da cor da barra. Cumpre destacar que a Escala Cuisenaire
também é conhecida por “Números coloridos”.
6
A preocupação se originava do fato de o conteúdo de números negativos ser próprio da sexta série e os
alunos, segundo a professora, ainda não estarem “preparados” para o mesmo.
7
Para somar 3 + 4, por exemplo, bastava pegar as barras correspondentes ao 3 e ao 4, colocar uma na
frente da outra e encontrar uma barra, dentre as que sobraram, que correspondesse ao tamanho total das
duas barras juntas, no caso a barra correspondente ao 7.
8
Se as operações de adição eram realizadas colocando uma barrinha em seguida da outra, para as
operações de subtração as barras deveriam ficar uma em cima da outra, ou seja, para realizar a operação
10 – 7 o aluno deveria pegar a barra do dez e colocar a barra do sete em cima. O que não fosse coberto
pela da barra do sete seria o resultado. Ou seja, bastava achar uma barrinha que coubesse “certinho” no
pedaço que sobrou, no caso a barra correspondente ao número 3.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
completar, ia “faltar” um pedaço embaixo. Essa situação acabou gerando polêmicas
entre as professoras apontando para algumas soluções como as que relatamos a seguir:
“É melhor definir com os alunos que a subtração sempre deverá ser
realizada tirando um número menor de um maior, nunca um maior de
um menor”; “Acho que isso não vai ter problemas porque eles
acabarão colocando sempre a barra menor em cima da maior,
mesmo se a operação for a de subtrair um número maior de um
menor”; “Mas isso não pode gerar confusão? Por exemplo, achar
que o resultado de cinco menos sete é igual ao resultado de sete
menos cinco?”; “Não podemos falar que, por enquanto, o resultado é
o mesmo e que eles aprenderão mais tarde, na sexta série, que há
uma diferença?”.
Ao ouvirmos as saídas propostas, percebemos que ali foi “criada” uma brecha9
para discutirmos, por exemplo, os aspectos de linearidade e compartimentalização que
se afirmam na visão que reduz o currículo à proposta curricular10. Assim, começamos a
esboçar algumas questões que se relacionavam com a nossa pesquisa, nesse caso em
particular o debate sobre a falsa idéia de que o conhecimento se “constrói” seguindo
uma arquitetura de temas encadeados por pré-requisitos. Para tanto, fomos buscar em
Machado (2000: 101, 128-129), a análise que considera:
De modo geral, a idéia hegemônica ainda é a de conhecer como
encadear, uma imagem enraizada no pensamento cartesiano.
Ordenação necessária dos assuntos a serem ensinados, prérequisitos, seriação são palavras-chave no âmbito de tal imagem. Se
é verdade que praticamente não há mais não-construtivistas, também
parece sê-lo a assunção de que a construção do conhecimento se dá
por meio de um grande encadeamento. Tratar-se-ia, assim, de um
construtivismo cartesiano. Mas insistimos que a questão fundamental
de como se constrói o conhecimento permanece em aberto, a merecer
todas as atenções. [...] De um modo geral, a organização linear
perpassa o conjunto das disciplinas escolares. [...] A característica
mais marcante de tal organização é a fixação de uma cadeia linear
de marcos temáticos que devem ser percorridos seqüencialmente,
expressando passos necessários no caminho do que se julga mais
9
Como afirma Lefebvre (apud CARVALHO; NETTO, 1994, p. 17-18), “O que é que escapa ao Estado?
O insignificante, as minúsculas decisões nas quais se encontra e experimenta a liberdade [...]. Se é
verdadeiro que o Estado deixa fora apenas o insignificante, é igualmente verdadeiro que o edifício
político-burocrático tem fissuras e intervalos. De um lado, a atividade administrativa se dedica a tapar
esses buracos, deixando cada vez menos esperança e possibilidades ao que podemos chamar de liberdade
intersticial. De outro lado, o indivíduo procura alargar estas fissuras e passar pelos vãos”.
10
Em nossas pesquisas temos defendido que currículo diz respeito a tudo o que acontece no cotidiano
escolar o que inclui, sem dúvida, os usos que são feitos das propostas curriculares. Sendo assim, a noção
de currículo que advogamos não se reduz aos documentos prescritivos, mas está enredada pelos múltiplos
espaçostempos de tessitura das redes de saberes, fazeres e poderes protagonizadas pelos sujeitos
praticantes do cotidiano.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
simples até o mais complexo [...] a linearidade, como um dogma,
nunca parece ser posta em questão.
A partir das discussões que surgiram em função dos usos da Escala Cuisenaire
no ensino das quatro operações, começamos a problematizar o porquê dos alunos dessa
fase da escolarização, isto é, das séries iniciais do Ensino Fundamental não poderem
trabalhar com a noção de número negativo? Que “problemas” isso acarretaria para esses
alunos? Sabíamos que muitos deles viviam em contextos sociais onde, por exemplo, as
famílias tinham dificuldades para comprar à vista, necessitando contrair dívidas a serem
pagas em prestações. As próprias professoras relataram situações como:
“Aqui nessa comunidade as pessoas têm o hábito de comprar fiado e
anotam na caderneta para pagar no final do mês e os alunos vivem
cotidianamente essa situação quando vão às mercearias a pedido dos
pais e penduram a conta”; “É verdade! São crianças que vivenciam
a noção de negativo o tempo todo. Os pais devem na mercearia, na
padaria, na farmácia. O pai pendura a cachaça no bar... Não
conseguiram pagaram a água e a luz... Isso quem não tem gato no
relógio”; “Acho que elas têm muita noção do negativo. São o
negativo, a dívida em carne e osso... Quando brincam também vivem
o negativo, ficam devendo bolinhas de gude pra pagar depois, a
perda de pipas, um fica devendo para o outro. Quer saber, quando eu
falo que vou tirar ponto se eles não ficarem quietos eu to envolvendo
a noção de negativo também”.
Com esses depoimentos, inferimos que os conhecimentos vividos pelas crianças
no cotidiano de suas vidas nem sempre se limitam e/ou coincidem com aqueles
previstos pela proposta curricular das séries que freqüentam.
As redes tecidas pelos alunos em seu dia-a-dia são mais amplas e complexas do
que a organização hierárquica e linear dos conteúdos de um documento curricular. Isso
não significa desqualificar os conteúdos em relação às redes e vice-versa, mas significa
considerá-los em sua relação com essas redes.
Na condição de “pesquisadores com os cotidianos” interessa-nos muito mais
investigar os currículos em redes das escolas do que as metodologias e os conteúdos
prescritos pelas propostas oficiais. De fato, sem negar a importância e necessidade dos
textos prescritivos, concordamos com Alves et al. (2002, p.40-41) quando afirmam:
Ao participarem da experiência curricular cotidiana, ainda que
supostamente seguindo materiais curriculares preestabelecidos,
professores/professoras e alunos/alunas estão tecendo alternativas
práticas com os fios que as suas próprias atividades práticas, dentro
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5829
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
e fora da escola, lhes fornecem. Sendo assim, poderíamos dizer que
existem muitos currículos em ação em nossas escolas, apesar dos
diferentes mecanismos homogeneizadores [...]
Não estamos falando de um ‘produto’ que pode ser construído
seguindo modelos preestabelecidos, mas de um processo através do
qual os praticantes do currículo ressignificam suas experiências a
partir das redes de poderes, saberes e fazeres das quais participam.
Sobre a necessidade de “experienciarmos” as atividades trabalhadas em sala de aula
De modo a ampliar nossa atuação nas escolas, buscamos em Lefebvre (1983) sua
noção de conhecimento a partir da metáfora das redes e da existência dos múltiplos
percursos que ela contempla entre seus nós e fios. Para o autor (1983, p 35-36), a rede
implica e permite uma racionalidade mais aguçada, mais ‘complexa’. A noção de
complexidade, ou melhor, de complexificação sugere a idéia segundo a qual o
pensamento vai do complexo ao mais complexo.
Ainda aqui evocamos Morin (1996) para argumentar sobre a necessidade do
paradigma da complexidade – que não deve ser confundido com a idéia de totalidade –
para superarmos o “cientificismo” e negarmos a idéia de complexidade como solução
e/ou explicação diante da mutilação do conhecimento. Como defende o autor, a
complexidade, assumida na dimensão do que é tecido junto, coloca-se como problema,
como desafio permanente para se pensar a diversidade da realidade sem a anulação
dessa diversidade. Para Morin (1996, p. 176),
A ambição da complexidade é prestar contas das articulações
despedaçadas pelos cortes entre disciplinas, entre categorias
cognitivas e entre tipos de conhecimentos. Isto é, tudo se entrecruza,
tudo se entrelaça para formar a unidade da complexidade; porém, a
unidade do ‘complexus’ não destrói a variedade e a diversidade das
complexidades que o teceram.
Como tentativa, então, de “experienciar”11 a dimensão de complexidade das
redes tecidas no cotidiano e, por efeito, como exercício de aproximação e entendimento
dos currículos realizados em redes (FERRAÇO, 2005), incluímos nas oficinas algumas
atividades comumente trabalhadas nas séries iniciais do ensino fundamental.
11
Entendemos com Larossa (2004, p. 154) que “a experiência é o que nos passa, ou nos acontece, ou nos
toca. Não o que passa ou o que acontece, ou o que toca, mas o que nos passa, o que nos acontece ou nos
toca. A cada dia passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos passa. Dir-se-ia que
tudo o que passa está organizado para que nada nos passe”.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5830
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Num primeiro momento e com auxílio dos educadores das escolas pesquisadas,
selecionamos atividades (01, 02, 03, 04 e 05) para serem vivenciadas pelas professoras
com o propósito de provocar reflexões acerca de como são pensadas e elaboradas as
atividades de matemática destinadas às séries iniciais do ensino fundamental?
Em um segundo momento, dedicamo-nos a ouvir e discutir casos narrados por
essas professoras, por ocasião de situações vividas com a proposição e desenvolvimento
de exercícios (06, 07, 08, 09, 10, 11 e 12) em suas salas, com o objetivo de desconstruir
falas que desqualificam os conhecimentos dos alunos em relação aos textos didáticos.
ATIVIDADE 01: Complete de maneira que, nas casas, você tenha um número e seus
vizinhos. Pense, discuta com seus colegas e responda: O zero tem dois vizinhos?
“Número tem vizinho?”; “Vizinho é uma relação social”;
“Muitas casas do morro não têm números, mas existem
vizinhos”; “Na rua, de um lado é par e do outro é
ímpar”; “Quem mora em apartamento como fica?”;
“Não acho que vizinho é quem mora do lado”; “Na
minha rua algumas casas têm números e letras”; “Tenho
uma vizinha que ta morando em outro bairro e aí?”;
“Hoje em dia essa coisa de vizinho ta esquecida”; “Faz
sentido perguntar se zero tem vizinhos se você não
trabalha número negativo?”; “Vem cá, se zero é ausência
de quantidade então como pensar menos um, zero e mais
um em uma relação de vizinhança? Não fica parecendo
coisa de gente maluca?”; “Acho que trabalhar com esse
conceito de vizinho não ajuda, só atrapalha. Prefiro
antecessor e sucessor”.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5831
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
ATIVIDADE 02: Trabalhando a idéia de inclusão de classe.
“A figura foi distorcida de propósito pra
dificultar o entendimento. Isso não tem
sentido. Não dá para saber quantas
crianças estão jogando e quantas estão
assistindo”; “Acho que ficou confuso
porque a imagem tentou mostrar que as
crianças que estão jogando estão em
movimento. Os risquinhos pretos são os
movimentos e as que estão assistindo não
têm risquinhos. Quem ta assistindo ta
parado”; “Mas na queimada os que ficam
queimados ficam parados atrás da linha
esperando a bola, então eles não teriam
risquinhos, mas estariam jogando”; “A
menina loira tem risquinho e ta ouvindo
música. Ela ta jogando? Ta queimada ou
ta dançando?”.
ATIVIDADE 03: Trabalhando com estimativas de medidas
“Essa atividade pede pra gente dizer
qual o comprimento do cabelo da
Rapunzel e por que; qual a altura de um
dos anões da Branca de Neve e por que;
quanto pesaria o Patinho Feio e por que
e qual seria o número das botas que o
Gato de Botas usava e por quê?”; “O
pior são as respostas do livro do
professor. O patinho feio pesaria menos
de 1kg porque ele ainda era filhote, o
cabelo de Rapunzel devia medir de 2,50
a 8m porque Rapunzel é adulta e deve
medir entre 1,50m e 1,75m e a trança
vai, no mínimo, do pescoço ao pé, ou até
abaixo da altura da torre, a altura do
anão seria aproximadamente 90cm
porque seria mais ou menos a metade da
altura do príncipe que deve medir cerca de 1,80m e o Gato de Botas
deve usar número 40”; “Sinceramente achei essa atividade uma
coisa meio doida. Sei que o autor queria trabalhar estimativas de
medidas, mas achei os exemplos muito sem sentido e o pior é que as
respostas trazem valores precisos. Como ele chegou a valores como
2,50 m, 1,75m e 90cm?”.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5832
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
ATIVIDADE 04: Trabalhando divisões com resto
“O pai que comprou dezesseis barras de
chocolate é absurdo”; “E o neném disputando as
barras?”; “Mesmo o enunciado dizendo que o
pai vai dividir igualmente entre os filhos, pela
imagem não há qualquer possibilidade de se
pensar que cada filho vai ficar com três barras e
vai sobrar uma. Pela figura vai sair briga e quem
for mais forte vai levar vantagem”; “É mesmo,
às vezes o texto do problema propõe uma coisa,
mas a imagem mostra uma outra situação
completamente diferente do que está sendo
pedido”; “E essa história de divisão sem resto
que às vezes temos que ensinar? Tem hora que
fica forçado”; “O que mais quero é que sobre
resto nas divisões que eu faço, principalmente
quando se trata do meu salário”.
ATIVIDADE 05: Trabalhando com operações
“Quem lava as meias separadas do
resto da roupa?”; “E de todos os
filhos ao mesmo tempo”?; “Não dá
pra saber quantos filhos ela tem, a
não ser que ela tenha lavado um par
de cada”; “Eu posso dizer que ela só
tem um filho e que as meias lavadas
são todas dele?”; “Acho que não
porque o enunciado fala em filhos.
Mas você pode dizer que ela tem dois
filhos, ou três, quatro, cinco ou seis”.
As observações feitas pelas professoras no decorrer das oficinas envolvendo
essas atividades, entre inúmeras outras, nos moveram a pensar sobre a impossibilidade
de qualquer tipo de controle sobre as redes de saberes, fazeres e poderes que são tecidas
no cotidiano pelos sujeitos praticantes (CERTEAU, 1994, 1996).
Ou seja, nossa perspectiva de discussão sobre o que estávamos entendendo por
redes não se reduzia a uma tentativa de produzir controle sobre a prática, mas, pelo
contrário, buscava se situar como possibilidades de ampliação das redes esboçadas nas
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
opiniões das educadoras, visando romper com as dimensões de compartimentalização,
linearidade, hierarquização, causalidade e medição que, certo modo, têm caracterizado o
conhecimento curricular prescrito.
Assim, ao invés de propormos novas prescrições curriculares a partir das falas
das professoras, tentamos mostrar que toda e qualquer prática precisa levar em conta a
diversidade de possibilidades que se colocam para os sujeitos cotidianos envolvidos.
Por exemplo, ensinar ou não a noção de números negativos nas séries iniciais
e/ou na educação infantil vai depender das relações tecidas nas redes de saberes, fazeres
e poderes dos sujeitos encarnados que ali se encontram. Com isso, a abordagem na
diversidade de possibilidades das redes de conhecimentos dos sujeitos como alternativa
para pensar os currículos praticados (OLIVEIRA, 2003) implicava em tirar o foco dos
alunos tomados como indivíduos singulares, que “sabem” ou “não sabem”, e assumir
esses alunos em meio às relações que se estabelecem entre os múltiplos contextos de
suas vidas.
Ou seja, a reflexão acerca do conhecimento e, em particular, do currículo, não
poderia ser reduzida nem aos textos prescritivos nem aos indivíduos isoladamente12. De
fato, a idéia de currículo que estávamos propondo só seria possível ser entendida se
assumíssemos a dimensão individualcoletiva que caracteriza essas redes.
Com isso, fomos aos poucos nos dando conta da permanente condição de
complexidade dessas redes, tendo em vista que elas sempre são tecidas em meio às
dimensões sociais, econômicas, culturais, políticas e afetivas, entre tantas outras, que se
colocam no cotidiano coletivo de nossas vidas.
Ainda em relação aos comentários feitos pelas professoras durante esse primeiro
momento de nossas oficinas destacamos que, de modo geral, as atividades propostas nos
livros adotados na escola sempre exigiam dos alunos algum tipo de resposta numérica.
Ou seja, os exercícios apresentados, mesmo em situações consideradas mais qualitativas
– como, por exemplo, os momentos em que os alunos eram estimulados a opinar e/ou
fazer estimativas – sempre requeriam um número, uma quantidade como resposta. Este
12
Essa ênfase nas relações em oposição a uma abordagem individualista nos possibilitou desconstruir as
idéias de “dificuldade ou problema de aprendizagem”, como veremos mais adiante.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5834
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
fato nos levou a inferir que para os autores dos livros em questão o ensinoaprendizagem
de matemática se reduzia, de forma clara, a fazer cálculos.
Sobre a ampliação de nossas redes de discussões nas oficinas e grupos de estudos...
Como já destacado, as conversas iniciais viabilizaram debates acerca de algumas
idéias recorrentes nos discursos das professoras, sobretudo em relação às “dificuldades”
ou “problemas” de aprendizagem que os estudantes, supostamente, apresentavam.
Se, de fato, estávamos assumindo as redes cotidianas de saberes, fazeres e
poderes como referências das discussões dos currículos, então, as “dificuldades” e/ou os
“problemas” de aprendizagem, se é que existiam, não poderiam ser atribuídas ao aluno
de forma isolada e pontual. O conhecimento, nessa dimensão das redes, não seria uma
propriedade ou característica peculiar de uma pessoa singular, mas condição de vida13,
de existência que se tece e se enreda em meio às relações estabelecidas entre os sujeitos
cotidianos complexos e encarnados.
Assim, no lugar da idéia de “dificuldade” ou “problema” de aprendizagem, que
como já dito, só se sustenta numa perspectiva da individualidade singular, propomos e
defendemos a idéia de possibilidades de conhecimento. De fato, estávamos propondo a
seguinte questão para debate: quais as possibilidades de conhecimentos que estão
colocadas, que não são fixas nem únicas e que se encontram relacionadas às condições
de vida e sobrevivência dos alunos sujeitos cotidianos?
Se pensarmos cada sujeito como inserido em diferentes contextos de vida não há
como desconsiderar que suas possibilidades de conhecimentos estão relacionadas às
redes tecidas nesses contextos. Assim, a história de vida de cada aluno e aluna não é
uma história apenas pessoal, descolada das múltiplas redes sociais, econômicas,
culturais e políticas em que viveram/vivem.
Há, então, diferentes possibilidades de conhecimentos colocadas para os alunos
e alunas, a partir de suas vivências nesses contextos, que precisam ser consideradas
quando nos dedicamos a estudar os currículos realizados nas escolas. Ou seja, trata-se
13
Aqui, recorremos às discussões das Biociências que têm defendido que processos vitais e processos
cognitivos são a mesma coisa. Isto é, conhecimento e vida são processos intimamente relacionados que se
complementam. Desse modo, onde há vida há conhecimento. De certo modo, essa idéia já havia sido
proposta por Lefebvre (1983, p.36) ao afirmar que “o conhecimento em si mesmo não é um problema,
mas um fato, que tem por características ser social, histórico e prático! Desde a vida prática mais imediata
e mais simples, nós conhecemos objetos, seres vivos, seres humanos”.
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5835
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
muito mais das oportunidades de vida que esses alunos e alunas tiveram/têm do que de
qualquer qualidade individual de inteligência, habilidade, competência, desempenho ou
força de vontade.
Outra argumentação que usamos na desconstrução da idéia de “dificuldades” ou
“problemas” de aprendizagem tem a ver com a forma como entendemos a relação
sujeito-objeto nas redes de conhecimentos. Se, de fato, estávamos assumimos que nas
redes cotidianas os sujeitos encarnados (NAJMANOVICH, 2001) tecem e partilham
seus significados em meio às suas experiências individuaiscoletivas de vida, então,
sujeito e objeto de conhecimento são indissociáveis.
Nesse sentido, a única possibilidade de se sustentar a idéia de “problema” ou
“dificuldade” de aprendizagem decorreria de uma visão dicotômica da relação sujeitoobjeto. É como se o sujeito praticante pudesse tecer suas redes de conhecimentos
isolado dos contextos cotidianos em que viveu/vive, isto é, a partir de referências
externas a sua existência e fora de sua história individualcoletiva de vida.
Por efeito, as “dificuldades” ou “problemas” de aprendizagens decorreriam da
necessidade desse sujeito buscar um objeto de conhecimento fora de suas possibilidades
e condições de vida, o que para nós não faz nenhum sentido.
Então, com a intenção de superarmos a idéia de “problema” e/ou “dificuldade”
de aprendizagem, incentivamos as professoras a narrarem situações vividas em sala e
que evidenciassem diferentes maneiras como os alunos “entendiam” determinados
conteúdos e “resolviam” alguns problemas. Vamos a alguns exemplos:
ATIVIDADE 06: Trabalhando com a idéia de peso
“Alguns alunos, logo de cara, disseram
que cada tijolo pesava 1 kg. Mas alguns
acharam que os tijolos não tinham o
mesmo peso porque o da frente era um
pouco mais largo em cima do que o de
trás. Na hora, falei que isso não tinha
nada a ver, que matemática é uma ciência
exata. Mesmo assim continuaram com
dúvidas,
mas
aceitaram.
Depois,
comentando com uma colega, disse que
eu também tinha ficado com dúvidas. O
problema não dizia que os tijolos tinham
o mesmo peso, então poderia ser
qualquer valor?”
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Ao analisarmos a atividade chegamos à conclusão que, como o enunciado não
dizia que se tratava de tijolos com pesos iguais, não havia como responder o problema,
ou seja, em linguagem matemática tratava-se de uma situação de equação do primeiro
grau com duas incógnitas, portanto, sem solução. Ou, na melhor das hipóteses, qualquer
resposta poderia ser considerada como válida...
Na ocasião, foram trazidos outros exemplos de atividades nas quais não havia
como se obter uma única resposta. E isso acontecia não porque os alunos apresentavam
dificuldade de aprendizagem, mas porque ou as questões estavam mal formuladas, ou
faltavam informações ou, ainda, porque eram absurdas do ponto de vista do bom senso.
ATIVIDADE 07: Trabalhando com somas e subtrações simples
“É pra contar com o papagaio que ta
chegando ou é pra pensar que vai chegar mais
um? Pode ser dois papagaios ou três
papagaios?”; “Ficou 1 cachorro grande e dois
cachorrinhos”; “Não, ficaram três cachorros
porque os pequenos ainda estão lá”.
ATIVIDADE 08: Trabalhando com noções de longo e curto
“Nunca vi coelho voar”; “Coelho sabe voar?”;
“O caminho de baixo é na terra e o de cima é no
ar”. “Se coelho soubesse voar o de cima ia ser
mais rápido”.
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5837
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
ATIVIDADE 09: Trabalhando com as noções de leve e pesado
“Não dá pra saber quem é mais pesado.
Só porque o menino ta embaixo na
gangorra não quer dizer que ele é mais
pesado. E na hora em que a menina
tiver embaixo, ela vai ser a mais
pesada? O mais pesado vai ser sempre
quem tiver embaixo? E se os dois
tiverem o mesmo peso?”.
ATIVIDADE 10: Trabalhando com as noções de igual e diferente
“O primeiro gato é mais
escuro que o outro”; “As
patas são diferentes”; “Os
dentes do primeiro são
maiores que os do outro”;
“Parece um gato e uma
gata”..
Essa atividade nos proporcionou ampliar as discussões em termos dos conceitos
de igualdade, semelhança e diferença. De fato, interessava-nos problematizar esses
conceitos tendo em vista o uso freqüente dos mesmos na matemática. Começamos por
perguntar sobre a maneira como as professoras abordavam o conceito de igual em sala
de aula. Nesse sentido, foram dados os exemplos: duas carteiras, dois ventiladores, duas
camisas de uniforme, duas réguas, entre tantos outros.
Para que pudéssemos problematizar as respostas dadas pegamos dois copos
descartáveis e pedimos que as professoras observassem com cuidado e respondessem se
eram “iguais”. Após alguns minutos algumas chegaram à conclusão de que eram “um
pouco diferentes”. Sempre havia um detalhe que os diferenciavam.
Com isso, fomos levados a imaginar a possibilidade de usarmos o conceito de
semelhança para os exemplos dados. Assim, nossas redes de conhecimentos em relação
aos conceitos de igual, diferente e semelhante estavam incluindo outras lógicas além das
colocadas até então.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5838
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Ou seja, dependendo da situação seria mais interessante falar em igualdade e
diferença para quantidades, e em semelhança e diferença para objetos, coisas, seres.
Nesse caso, só o simples fato de existirem dois já implicava em algum tipo de processo
de diferenciação entre eles.
Uma das questões que decorreram dessas discussões dizia respeito à utilização
do jogo dos sete erros em sala de aula, atividade que segundo as professoras era bastante
comum para trabalhar as noções de igual e diferente.
“Então, se olharmos com atenção nunca serão só sete erros? Sempre
vai ter milhares de diferenças?”; “Nada é igual então? Duas blusas
da mesma cor e tecido e mesmo número não são iguais?”; “Então
seria melhor, mais correto pedir pros alunos procurarem todas as
diferenças entre as figuras?”; “Mas isso pode nunca ter fim. Vão
ficar procurando até cansarem?”; “Eu trabalho com jogo das 7
diferenças, mas procuro escolher bem as figuras pra não gerar
dúvidas”.
ATIVIDADE 11: Trabalhando com medidas de área e comprimento
“No dia que trabalhei essa
atividade fiquei em dúvida como
responder. Terreno é medido em
área e a imagem não tinha a
medida da largura. Mas considerei
certa a resposta 43 metros apesar
de alguns alunos terem ficado com
dúvidas.
Depois
de
nossas
conversas aqui voltei e falei pros
alunos que aquele exercício dos
terrenos tava incompleto e não
dava pra calcular a área deles sem
a medida da largura. Foi incrível porque alguns alunos disseram:
Ah! Eu sabia.”.
ATIVIDADE 12: Trabalhando com a idéia de volume
“Essa atividade tava na unidade de medidas e quando fui
corrigir fique em dúvida em aceitar uma única resposta
como certa. Claro que a maioria falou 3 copos, mas isso é
uma resposta possível e não a única. Antes de nossas
conversas aqui eu ia desejar que todos respondessem 3, mas
depois de tudo que temos conversado esse tipo de atitude não
acrescenta nada aos conhecimentos dos alunos a não ser
reforçar o óbvio. Não quero ser uma professora óbvia”.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5839
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Os desdobramentos dessas discussões foram vários. Por exemplo, questionamos
sobre a lógica usada pelo autor ao elaborar uma atividade que, na maioria das vezes, não
contempla, minimamente, diferentes possibilidades de leitura e entendimento daqueles
que são convidados a resolvê-la. De fato, na idéia de currículos em redes entra em cena
inúmeras possíveis lógicas que precisam ser consideradas sob pena de mutilarmos a
riqueza dos processos de diferenciação que nelas se manifestam.
Assim, assumir essas redes em meio aos currículos praticados pressupõe que nos
dediquemos a ampliar as possibilidades que se apresentam ao invés de cerceá-las. Isso
não significa tentar prever todas as possíveis lógicas que se enredam nas redes. Seria
absurdo. Mas, significa assumir uma permanente atitude de abertura a toda e qualquer
possibilidade de leitura e entendimento de uma dada situação sem, necessariamente, nos
conformamos com ela. Nosso desafio estava em, ao trabalhar com a perspectiva dos
processos de diferenciação que se enredavam nas redes dos professores e alunos, não
optar por um modelo de pensamento ou de comportamento padrão desejável, nem nos
eximir de uma tomada de posição diante dos processos de diferenciação.
Ou seja, o desafio se colocava na questão: como trabalhar a diferença na
diferença sem nos anular como educadores e/ou alunos, em meio aos processos de
diferenciação vividos no cotidiano? Essas questões nos levaram a ampliar nossas
reflexões, sobretudo no que se referia às relações entre currículo e cultura14. Com isso,
problematizamos: que imagens de matemática têm sido produzidas na sociedade e na
escola pelo discurso hegemônico da ciência moderna? Que outros discursos sobre o que
entendemos ser matemática são necessários à educação e ao currículo?
Reflexões iniciais sobre a imagem hegemônica da ciência matemática...
As discussões nos grupos de estudos das escolas nos permitiram questionar as
imagens de matemática que se faziam presentes no imaginário15 das professoras e, de
modo geral, na sociedade. Interessava-nos, de fato, evidenciar o quanto a matemática
ainda determinava uma série de comportamentos e valores, a partir de seus processos de
14
Compartilhamos da visão de Homi Bhabha (1998) que assume cultura como sendo enunciação, como
“lugar enunciativo”, promulgador, que institui “verdades” a partir da produção discursiva.
15
A partir de Díaz (1996, p. 13), temos que “o imaginário não é a soma de todas as imaginações
singulares, não é, tão pouco, um produto acabado e passivo. Pelo contrário, é o efeito de uma complexa
rede de relações entre discurso e práticas sociais. O imaginário social interage com as individualidades.
Constitui-se a partir das coincidências valorativas das pessoas mas, também, das resistências.
Manifesta-se no simbólico (linguagem e valores), na ação concreta entre as pessoas (práticas sociais)”.
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5840
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
quantificação e de sua imagem hegemônica de ciência exata. Para tanto, recorremos a
Santos (2000, p.63) em sua análise sobre o processo de transição paradigmática.
A matemática forneceu à ciência moderna, não só o
instrumento privilegiado de análise, como também a lógica da
investigação, e ainda o modelo de representação da própria estrutura
da matéria. [...] Deste lugar central da matemática na ciência
moderna derivam duas conseqüências principais. Em primeiro lugar,
conhecer significa quantificar. O rigor científico afere-se pelo rigor
das medições. As qualidades intrínsecas do objeto são, por assim
dizer, desqualificadas e em seu lugar passam a imperar as
quantidades em que eventualmente se podem traduzir. O que não é
quantificável é cientificamente irrelevante. Em segundo lugar, o
método científico assenta na redução da complexidade. O mundo é
complicado e a mente humana não o pode compreender
completamente. Conhecer significa dividir e classificar para depois
poder determinar relações sistemáticas entre o que se separou.
A partir da fala de Santos (2000), fomos incluindo diferentes fios em nossas
redes de conversas com o intuito de mostrar a forte presença de conceitos, elementos e
processos de quantificação matemáticos no decorrer da história da humanidade e, por
efeito, em nossas práticas educacionais. Dentre as situações debatidas, destacamos:
A imagem anterior16 revela uma “medida” a ser observada nos pés das
prostitutas, segundo a Teoria da Antropologia Criminal do século XIX. Para Lombroso,
podemos encontrar sinais de criminalidade inata a partir de elementos como: maior
espessura do crânio, mandíbulas grandes, braços longos, testa baixa e estreita, orelhas
grandes, entre outros processos de quantificação do corpo humano.
16
Obtida em GOULD, S. J. A falsa medida do homem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
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5841
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Nas figuras acima17 temos a proposta de uma “Cadeia evolutiva de acordo com o
tamanho do cérebro” e a proposição de uma “escala unilinear das raças humanas”.
Coerente com as visões anteriores, temos em um Atlas das Raças Humanas18, a
caracterização dos seres humanos a partir da geometria e das medidas da face:
17
Obtidas em GOULD, S. J. A falsa medida do homem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
18
THOMAS -DOMENECH, J. M. e BOLIVAR, A. P. Atlas das raças humanas. Rio de Janeiro: Livro
Ibero-Americano, 1965.
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5842
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Na figura anterior à direita, os autores classificam os tipos humanos em quatro
grupos: cerebral, muscular, digestivo e respiratório, tomando como base as formas
geométricas. Na figura anterior à esquerda, olhos, nariz, boca, faces e lábios são
classificados também a partir de elementos matemáticos: oval, elíptico, redondo,
trapezóide, retangular e pentagonal.
Curiosamente, no mês de setembro de 2006, ainda durante a realização de nossa
pesquisa, encontramos no jornal “A Tribuna”, E.S., a seguinte matéria:
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5843
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
Os exemplos em questão, entre outros que foram discutidos com as professoras,
nos ajudaram a perceber a fascinação pelos números e medidas na produção do discurso
hegemônico da ciência moderna. Como analisa Gould (1991, p. 65-66),
A segunda metade do século XIX não foi apenas a era da evolução na
antropologia. Outra corrente, igualmente irresistível, contaminou o
campo das ciências humanas: a fascinação pelos números, a fé em
que as medições rigorosas poderiam garantir uma precisão
irrefutável e seriam capazes de marcar a transição entre a
especulação subjetiva e uma verdadeira ciência, tão digna quanto a
física newtoniana. A evolução e a quantificação formaram uma
temível aliança: em certo sentido, sua união forjou a primeira teoria
racista ‘científica’ de peso, se definirmos ‘ciência’ erroneamente,
como muitos o fazem, como sendo toda afirmação aparentemente
respaldada por cifras abundantes.
Em nossas conversas, fomos percebendo a força que o discurso da matemática, a
partir do uso de seus conceitos e elementos, ainda possui no imaginário social. De fato,
com as situações que foram apresentadas e debatidas pudemos nos dar conta da forte
presença de alguns elementos-chave da matemática em nossa vida cotidiana, definindo
padrões de beleza, comportamento e valores19.
Ainda como exercício de entendimento da presença desse discurso na sociedade,
nos foi possível remeter essa discussão para o próprio cotidiano escolar tendo em vista a
força dos processos de quantificação que aí se fazem presentes. Assim sendo, pudemos
entender que as práticas de medição das escolas não se limitam ao que chamamos de
avaliação, mas atravessam inúmeros espaçostempos desse cotidiano.
“As quantificações estão presentes o tempo todo nas escolas. Não é
só nas provas que elas aparecem”; “Como ele falou, também somos
o tempo todo controlados por marcações temporais. Horário de
entrar, de sair, de ir para o recreio. Tempo de tolerância de 15
minutos na entrada. Tempo de duração das aulas de 60 minutos.
Quantidade de dias de cada bimestre e 200 dias letivos”; “Tem
também essa história de ter que definir quantas avaliações serão
dadas em cada bimestre”; “Até a quantidade de dias de licença a que
temos direito sem corte de ponto ta definido”; “A quantidade de dias
de prêmio incentivo pra quem não tiver falta”; “A quantidade de
alunos por metro quadrado de sala de aula”; “Quando eu era aluna
as aulas começavam em março. No mês de julho não tinha essa coisa
de recesso e quem passasse de ano, final de novembro já tava de
férias, e a gente aprendia. Hoje em dia o ano letivo começa antes do
carnaval e acaba nas vésperas do natal e a aprendizagem ta
19
Em uma das últimas oficinas realizadas nas escolas as professoras selecionaram matérias de jornais e
revistas que enfatizavam processos de quantificação e/ou conceitos de geometria como definidores de
padrões sociais, estéticos, de comportamentos e valores.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
piorando a cada ano”; “Essa idéia de que aumentando a quantidade
de dias você aumenta a qualidade do ensino é um equívoco”.
Com o objetivo de desconstruir a visão hegemônica de matemática, que a reduz
ao rigor dos processos de quantificação e impõe padrões de comportamentos e valores,
isto é, de modo coerente com nossa proposta de ampliar as redes de entendimento do
que entendemos por matemática, fomos buscar em Santos (2000, p.70) que:
As investigações de Gödel vêm demonstrar que o rigor da
matemática carece ele próprio de fundamento. A partir daqui é
possível não só questionar o rigor da matemática como também
redefini-lo enquanto forma de rigor que se opõe a outras formas de
rigor alternativo, uma forma de rigor cujas condições de êxito na
ciência moderna não podem continuar a ser concebidas como
naturais e óbvias.
A partir de Santos (2000), buscamos produzir outros discursos e sentidos para o
que chamamos de matemática. Em nossas conversas, mostramos a urgente necessidade
de pensarmos a matemática, ou qualquer outra área do conhecimento, para além dos
conteúdos formais das propostas curriculares, abarcando outras tantas redes de sentidos
que têm sido propostas para as ciências e, em particular, para a matemática. A própria
proposta de Santos (2000) de pensarmos “todas as ciências como ciências sociais”
muito nos ajudou nessa ampliação de sentidos.
Desse modo, não fazia mais sentido pensar a matemática como expressão exata
de uma parcela da realidade, mas sim como um discurso, entre tantos outros, que busca
representar o que temos chamado de realidade. Aqui, a matemática foi assumida como
uma forma de produção literária e artística. Como defende D’ambrósio (2005, p. 112)
Em todas as culturas encontramos manifestações relacionadas e
mesmo identificadas com o que hoje se chama matemática (processos
de organização, classificação, contagem, medição, inferência),
geralmente mescladas ou dificilmente distinguíveis de outras formas,
hoje identificadas como arte, religião, música, técnicas, ciências.
Em todos os tempos e em todas as culturas, matemática, artes,
religião, música, técnicas, ciências foram desenvolvidas com a
finalidade de explicar, de conhecer, de aprender, de saber/fazer e de
predizer (artes divinatórias) o futuro. Todas aparecem, num primeiro
estágio da história da humanidade e da vida de cada um de nós,
indistinguíveis como formas de conhecimento.
Com isso, os educadores envolvidos na pesquisa colocaram como necessidade a
realização de processos de formação nos contextos das escolas, de modo a viabilizar um
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
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Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
permanente processo de ampliação de suas redes de saberes, fazeres e poderes, a partir
não apenas de temas relacionados às didáticas e às metodologias, mas, sobretudo, a
partir do estabelecimento de relações com os campos da filosofia, história, sociologia,
psicologia, antropologia e economia.
Posto isso, trabalhar com a noção de currículo em redes tem exigido de nós,
pesquisadores com o cotidiano, o estabelecimento de compromissos com os educadores
das escolas, tendo em vista a realização/produção de outras conexões em suas redes de
conhecimentos que possam nos aproximar da dimensão de complexidade da vida.
Referências
ALVES et al. (Org.). Criar currículo no cotidiano. São Paulo: Cortez, 2002.
BHABHA, Homi. O local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1998.
CARVALHO, Maria do Carmo Brant de; NETTO, José Paulo. Cotidiano:
conhecimento e crítica. São Paulo: Cortez, 1994.
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano 2: morar, cozinhar. Petrópolis: Vozes,
1996.
_____. A invenção do cotidiano: as artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.
D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Sociedade, cultura, matemática e seu ensino. Educação e
Pesquisa. V. 31, n.1, São Paulo: FE/USP, Jan/Abr 2005
DÍAZ, Esther. La ciência y el imaginário social. Buenos Aires: Biblos, 1996.
FERRAÇO, Carlos Eduardo. (Org.). Cotidiano escolar, formação de professores(as)
e currículo. São Paulo: Cortez, 2005.
GOULD, S. J. A falsa medida do homem. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
LARROSA, Jorge. Linguagem e educação depois de Babel. Belo Horizonte:
Autêntica, 2004.
LEFEBVRE, Henri. Lógica formal, lógica dialética. Rio de Janeiro: Civilização.
Brasileira, 1983.
MACHADO, Nilson José. Educação: projetos e valores. São Paulo: Escrituras, 2000.
MORIN, Edgar. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.
NAJMANOVICH, Denise. O sujeito encarnado: questões para pesquisa no/do
cotidiano. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5846
Políticas Curriculares Cotidianas e as Redes de Conhecimentos Matemáticos
OLIVEIRA, Inês Barbosa de. Currículos praticados: entre a regulação e a
emancipação. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
SANTOS, Boaventura de Souza. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da
experiência. São Paulo: Cortez, 2000.
THOMAS -DOMENECH, J. M. e BOLIVAR, A. P. Atlas das raças humanas. Rio de
Janeiro: Livro Ibero-Americano, 1965.
Carlos Eduardo Ferraço & Jackeline Magalhães Brum
5847
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
O USO DA MODELAGEM MATEMÁTICA COMO
AMBIENTE DE APRENDIZAGEM: UMA NOVA
PRÁTICA PARA CONTEÚDOS GEOMÉTRICOS
NO 8º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Danielly Barbosa de Sousa
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
O USO DA MODELAGEM MATEMÁTICA COMO AMBIENTE DE
APRENDIZAGEM: UMA NOVA PRÁTICA PARA CONTEÚDOS
GEOMÉTRICOS NO 8O ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Danielly Barbosa de Sousa1
RESUMO: Esta pesquisa de Mestrado, ainda em andamento, visa à elaboração,
aplicação e análise de uma proposta de ensino aplicada ao estudo de Geometria
utilizando a Modelagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem em uma turma
de 8º Ano de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental localizada na Cidade de
Lagoa Seca, no Estado da Paraíba - PB. Buscamos investigar o alcance e as limitações
dessa proposta com o intuito de superar deficiências no domínio de conteúdos
cognitivos e afetivos dos alunos, em sua maioria oriundos da zona rural, e que foram
observadas durante a realização de uma dinâmica em sala de aula e na aplicação de
questionários. Serão analisados o impacto no domínio conceitual dos alunos, a
capacidade de percepção e representação plana e espacial, o domínio da linguagem
científica, a motivação, a forma de trabalhar coletivamente e a capacidade de
interpretação e solução de situações-problema. Em todo este trabalho utilizaremos na
elaboração da proposta didática, na sua aplicação e análise a teoria sócio interacionista
de Vygotsky, que nos aparece mais adequada à realidade de nossos alunos, a realidade
da escola e aos objetivos propostos.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Geometria. Modelagem Matemática. Teoria de
Vygotsky. Ambiente de Aprendizagem. Educação Matemática.
1. INTRODUÇÃO
O grande desafio dos docentes de Matemática é promover o desenvolvimento de
conhecimentos formativos e funcionais associados à Matemática, que possibilitem ao
aluno sua inserção na cultura como um agente ativo e transformador da realidade,
contribuindo para a sua realização como indivíduo e como membro de uma comunidade
1
Aluna do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática da UEPB; Especialista em Ensino
de Matemática Básica pela UEPB; Especialista em Formação do Educador e Professora de Matemática da
Rede Estadual e Municipal de Ensino do Estado da Paraíba em Campina Grande.Email:
[email protected]
Danielly Barbosa de Sousa
5851
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
(D’AMBRÓSIO, 1993).
Nesta direção torna-se necessário uma prática de ensino transformadora, onde o
aluno desenvolva conteúdos e atitudes voltados para a construção de conhecimentos que
o habilite ao exercício de uma cidadania crítica e reflexiva. O ensino efetuado por meio
do ensino de regras e de fórmulas prontas não desenvolve atividades voltadas para o
exercício do diálogo, da reflexão, da participação ativa, não prepara o aluno para as
mudanças, a curiosidade, a pesquisa e para a autonomia. Este tipo de educação não
responde as demandas da sociedade contemporânea, caracterizada pela constante
mudança e pela introdução de novos produtos e processos tecnológicos de base
científica.
Pressupondo que a educação parte da própria experiência humana e que o ensino
centrado nos interesses do educando ou do grupo, deve se basear em uma proposta
pedagógica mais favorável à aprendizagem, pretendemos nesta pesquisa aumentar nossa
compreensão sobre alguns problemas detectados na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Irmão Damião pertencente à Secretaria de Educação do Município de
Lagoa Seca, situada na Zona Urbana, a 06 quilômetros da cidade de Campina Grande,
no Estado da Paraíba - PB.
Observei no ano de 2009, enquanto professora de uma turma de 8o Ano do
Ensino Fundamental desta Escola, constituída de dezessete alunos (sete do sexo
masculino e dez do sexo feminino), em sua maioria residindo na zona rural da cidade de
Lagoa Seca, apresentam pouco domínio dos conteúdos Geométricos; verbalizam
concepções negativas sobre a aprendizagem de Geometria, considerando-a difícil e
complicada, aparentam desmotivação para realizar estudos na Disciplina de
Matemática, bem como não têm experiência com a realização de trabalhos em grupos.
Estas deficiências, ao lado de dificuldades de leitura e interpretação de textos, foram
percebidas em uma dinâmica realizada no primeiro dia de aula e posteriormente na
aplicação de um questionário.
Na dinâmica, solicitamos que os alunos apresentassem por meio de desenhos a
presença da Matemática no nosso cotidiano, cujo objetivo era diagnosticar
conhecimentos de séries anteriores dominados pelos alunos, bem como respondessem a
um questionário com o objetivo de levantar o domínio das concepções, crenças e mitos
que estes alunos possuíam sobre a Matemática e a Geometria.
Danielly Barbosa de Sousa
5852
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
Lagoa Seca é uma cidade composta de aproximadamente 24.937 habitantes, cuja
Zona Urbana serve de cidade dormitório para parte de sua população que trabalha em
Campina Grande - PB e apresenta um grande contingente populacional residindo na
zona rural em pequenas propriedades rurais especializadas na produção de produtos
horti-granjeiros. Está situada na região úmida denominada de Brejo Paraibano, com
uma altitude média de 650 m, apresentando uma distribuição agrária de granjas com
pequenas áreas, que abastecem o mercado de Campina Grande - PB de frutas e
verduras. Grande parte dos jovens dedica-se a ajudar os pais realizando tarefas nas
hortas ou trabalhando nelas informalmente.
Dos dezessete alunos da turma do 8o Ano da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Irmão Damião, localizada em Lagoa Seca-PB, 15 (quinze) alunos (88%),
residem na Zona Rural de Lagoa Seca (PB) e estão na faixa etária de 14 a 16 anos de
idade, havendo um único caso de repetência.
Através da aplicação da dinâmica e do questionário, na turma do 8o Ano da
Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmão Damião, localizada em Lagoa SecaPB, observamos as dificuldades apresentadas por eles em relação aos conteúdos
geométricos de retas, ângulos e figuras planas. Justifica-se dessa forma, as concepções
negativas desta turma, de que a Geometria é difícil e complicada.
Para Ponte (1992, p. 185-186) as concepções constituem uma forma de ver o
mundo e de pensar, pois:
As concepções têm uma natureza essencialmente cognitiva. Atuam como
uma espécie de filtro. Por um lado, são indispensáveis pois estruturam o
sentido que damos às coisas. Por outro lado, atuam como elemento
bloqueador em relação a novas realidades ou a certos problemas, limitando as
nossas possibilidades de atuação e de compreensão.
As atitudes do professor das séries iniciais em relação à Matemática exercem um
papel relevante na formação do aluno, pois são eles que iniciam a formação Matemática
das crianças, bem como sua relação afetiva com a matéria. Segundo os Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN) de Matemática (BRASIL, 1998), deve-se desenvolver
atitudes favoráveis para a aprendizagem da matéria. Para Araújo (1999), essas atitudes
são desenvolvidas a partir das experiências, que influenciam e são influenciadas pela
maneira de ensino e de como é trabalhada a Matemática na escola; pela forma como os
Danielly Barbosa de Sousa
5853
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
primeiros conceitos básicos são adquiridos; pelas habilidades que são exigidas do
indivíduo e pelo sucesso e insucesso na realização de tarefas Matemática.
Em conversa com os professores de Matemática da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Irmão Damião, localizada na cidade de Lagoa Seca – PB, constatamos que
os mesmos mostravam-se apreensivos ao ensinar os conteúdos de Geometria, optando
por fazer esta abordagem no último bimestre, quando geralmente este campo
matemático é sacrificado em relação aos outros conteúdos.
As deficiências no ensino de Geometria vêm sendo assunto de diversas
pesquisas tanto a nível nacional como internacional. Passos (2005, p. 18) afirma que “o
desenvolvimento de conceitos Geométricos é fundamental para o crescimento da
capacidade de aprendizagem, que representa um avanço no desenvolvimento
conceitual”.
Por esse motivo alguns pesquisadores explicitam a idéia de que o ensino de
Geometria deve ser iniciado desde os primeiros anos escolares. Lorenzato (1995) mostra
que o ensino de Geometria deve ter início ainda na pré-escola por meio da Geometria
intuitiva que possibilite a observação e exploração de formas presentes no mundo das
crianças. Segundo Pavanello (1993), o início do abandono do ensino de Geometria
ocorreu devido à promulgação da Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de 1º e 2º Graus
em 1971, pois possibilitou que cada professor elaborasse seu próprio programa
curricular de acordo com as necessidades dos alunos. Para Lorenzato (1995) muitas são
as causas para esse abandono, mas os principais são: a má formação dos professores,
que sem os conhecimentos de Geometria tendem a não ensiná-la e a dependência dos
livros didáticos que até meados da década de 90 traziam esses conteúdos no final de
cada volume. Como grande parte dos nossos docentes “seguiam” o livro, os conteúdos
geométricos ficavam para serem lecionados no final do curso.
1.1.
Objetivos da Pesquisa
Nosso problema consiste em desenvolver uma intervenção didática que levem a
superação da baixa aprendizagem de conhecimentos geométricos, ao mesmo tempo
supram as deficiências detectadas nos aspectos afetivos dos alunos – relacionados à falta
de motivação e as concepções negativas sobre a matemática, levando em conta a
Danielly Barbosa de Sousa
5854
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
realidade por ele vivenciada.
Portanto, propomos neste trabalho, o ensino de Geometria a partir da utilização
da Modelagem Matemática como um Ambiente de Aprendizagem, com o intuito de
fazer com que os alunos sintam-se motivados em aprender; associem o conhecimento
escolar ao seu dia a dia; superem as dificuldades encontradas nos conteúdos de
Geometria tornando-os mais significativos; estabeleçam conexões entre a Geometria e
outras áreas do conhecimento; desenvolvam conceitos elementares de Geometria
relacionados às habilidades de percepção plana e espacial, representação, orientação
espacial e valorizem o trabalho coletivo colaborando na interpretação de situaçõesproblema e estratégias de resolução.
Os
conteúdos
serão
trabalhados
por
meio
de
situações-problema
contextualizadas que constarão de ângulos, perímetros, escalas, áreas e volumes, para
analisar situações vividas pelo aluno, e dessa forma levando-o a um aprendizado mais
significativo e agradável. Cada projeto será realizado por grupos contendo em média 04
(quatro) alunos selecionados por critérios de desenvolvimento cognitivo.
As situações - problema a serem trabalhadas são duas:
1.
A localização do aluno no espaço. Para isto elaborar um mapa
geográfico de Lagoa Seca, contendo a localização espacial da
residência de cada aluno à escola, possíveis trajetos de transporte,
opções de transporte, distância percorrida por cada aluno, tempo
médio, etc.
2.
Projetar a construção de uma casa para cada grupo – explicitando o
número de moradores, as características dos cômodos – tendo como
resultado uma planta baixa, uma maquete com caixa d’água e uma
estimativa do custo da obra.
Com a realização destas atividades serão trabalhadas as seguintes habilidades:
efetuar medidas de comprimento, de área e de volume; trabalhar com ângulos e suas
medidas; reconhecimento e traçado de figuras Geométricas – incluindo polígonos, área
e perímetro; desenvolvimento de raciocínio proporcional por meio de escalas; traçado
de planta baixa; relação entre área, tamanho de terreno, localização e custo de
construção.
Neste trabalho seguiremos basicamente no processo de Modelagem Matemática
Danielly Barbosa de Sousa
5855
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
os resultados de pesquisa de Biembengut e Hein (2003) para a construção das maquetes
das casas. Outros autores que abordam a Modelagem no Ensino de Matemática também
servirão de subsídios durante o desenvolvimento desta temática, mas adotaremos a
concepção de Bassanezi (2002, p. 16) para o qual a “Modelagem Matemática consiste
essencialmente na arte de transformar problemas da realidade em problemas
Matemáticos e resolvê-los, interpretando suas soluções na linguagem do real”.
Utilizaremos também ao lado da Modelagem Matemática a teoria sócio
interacionista de Vygotsky, que nos aparece mais adequada a realidade de nossos
alunos, a realidade da escola e aos objetivos propostos.
1.2.
Metodologia
O procedimento metodológico adotado para o desenvolvimento deste trabalho é
a pesquisa-participante, acompanhado também por uma abordagem qualitativa por
trabalhar com o pensamento do aluno, analisando as respostas e atitudes em sua
complexidade (D’AMBRÓSIO, 2004 apud BORBA, 2004).
Para Oliveira (2002, p. 117):
As pesquisas que utilizam da abordagem qualitativa possuem a facilidade de
poder descrever a complexidade de uma determinada hipótese ou problema,
analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos
dinâmicos experimentados por grupos sociais, apresentar contribuições no
processo de mudança, criação ou formação de opiniões de determinado grupo
e permitir, em maior grau de profundidade, a interpretação das
particularidades dos comportamentos ou atitudes dos indivíduos.
A pesquisa-participante é caracterizada pela interação do pesquisador com os
sujeitos da pesquisa. Buscamos o aporte teórico em relação à pesquisa-participante em
Veiga (1985 apud ROZAL, 2007, p. 7), destacando que:
O propósito destas reflexões é o de resgatar a importância da discussão
teórico-metodológica para a compreensão do campo de pesquisa- participante
entendida como a alternativa epistemológica na qual pesquisadores e
pesquisados seriam sujeitos ativos da produção do conhecimento.
Nesta pesquisa exercerei o papel de professor-pesquisador, sendo a mesma
realizada com os alunos de uma turma do 8 o Ano do Ensino Fundamental de uma
Danielly Barbosa de Sousa
5856
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmão Damião, localizada na cidade de Lagoa
Seca - PB.
Nossa pesquisa foi dividida em seis momentos. No primeiro momento,
efetuamos um Levantamento Bibliográfico sobre a Modelagem Matemática com autores
que abordam sobre este tema.
No segundo momento, foram elaborados dois questionários: o primeiro deles já
aplicado e analisado e teve como objetivo levantar o domínio das concepções, crenças e
mitos que os alunos do 8o Ano do Ensino Fundamental, da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Irmão Damião possuíam sobre a Matemática e a Geometria. O outro
questionário será aplicado no final da proposta didática, com o objetivo de levantar
dados sobre o impacto da intervenção didática na aprendizagem e nas atitudes dos
alunos sobre o conteúdo trabalhado.
No terceiro momento, foram selecionados alguns conteúdos de conhecimentos
referentes ao ensino da Geometria de acordo com as dificuldades apresentadas e
analisadas do questionário.
No quarto momento, elaboramos uma proposta didática que será aplicada na
turma do 8o Ano do Ensino Fundamental da referida Escola, constando de objetivos a
serem atingidos com a intervenção didática, módulo didático com teoria e atividades
propostas em forma de situações-problema do cotidiano adequados ao uso da
Modelagem Matemática como metodologia a ser empregada, procedimentos a ser
adotado em sala de aula, recursos materiais a serem empregados e a avaliação.
No quinto momento, iremos aplicar a proposta didática para em seguida, realizar
a análise dos resultados, verificando e avaliando o alcance e as limitações.
E no sexto e último momento, iremos aplicar o segundo questionário, analisar e
avaliar o impacto da intervenção didática na aprendizagem e nas atitudes dos alunos
sobre os conteúdos trabalhados em sala de aula.
Os instrumentos que serão utilizados para o desenvolvimento da pesquisa são:
entrevistas, questionários, câmera digital e um caderno de campo. O método de coleta
de dados será por meio da observação participante e filmagem de pelo menos 06 horas
de aula, com a câmera centrada no trabalho de grupo, análise de entrevistas, da
aplicação dos dois questionários entre os alunos e das atividades realizadas em sala de
aula contidas no módulo didático.
Danielly Barbosa de Sousa
5857
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
Teremos também um caderno de campo para registrarmos os problemas e as
soluções encontradas durante a pesquisa.
Durante o desenvolvimento das atividades de Modelagem Matemática os alunos
atuarão como pesquisadores e trabalharão dentro da metodologia de estudo de grupo a
partir de um processo de redescoberta, ou seja, executarão as atividades de forma
cooperativa na construção do conhecimento, pois segundo os PCN (1998), eles
terminam valorizando o trabalho coletivo, colaborando na interpretação de situaçõesproblema, na elaboração de estratégias de resolução e na sua validação.
2. MODELAGEM MATEMÁTICA NO PROCESSO DE ENSINO E
APRENDIZAGEM.
A Escola tem como função de levar os jovens a desenvolverem determinadas
capacidades e competências, tornando-os capazes de enfrentar, resolver e superar as
situações-problema que encontrarão no seu dia-a-dia. Nesta direção torna-se necessário
a aprendizagem de conceitos Matemáticos, associados a competências, atitudes e
valores que esta disciplina proporciona e, ao mesmo tempo, vivenciar uma educação
crítica e cidadã, associando o currículo escolar à realidade vivenciada pelo aluno –
buscando superação e transcendência.
Assim, a Matemática faz parte do currículo escolar e também do mundo, e para
formar cidadãos necessita participar dos processos de transformação e construção da
realidade, devendo estar aberta a novos comportamentos e percepções. Quanto a este
aspecto, os PCN (BRASIL, 1998, p. 27) colocam:
[...], a Matemática pode dar sua contribuição à formação do cidadão ao
desenvolver metodologias que enfatizem a construção de estratégias, a
comprovação e justificada de resultados, a criatividade, a iniciativa pessoal, o
trabalho coletivo e a autonomia advinda da confiança na própria capacidade
para enfrentar desafios.
O ensino de conteúdos e conceitos apresentados por meio de fórmulas e de
regras, ou como um sistema formal de verdades absolutas e incontestáveis, limita a
capacidade de ação e de criação dos alunos, não motivando a maioria na busca de
aprendizagem e aquisição de conhecimentos.
Danielly Barbosa de Sousa
5858
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
Segundo os PCN (BRASIL, 1998), mais importante do que transmitir
informações e conteúdos para serem reproduzidos quando solicitados, é desenvolver nos
alunos habilidades e estratégias que lhes permitam, de forma autônoma, gerar novos
conhecimentos a partir de outros já previamente adquiridos. A aprendizagem partindo
dos recursos dominados pelos alunos, certamente, terá melhores condições para levá-los
a adequar-se e a adaptar-se criticamente às mudanças tecnológicas e culturais.
Dessa forma, optamos pelo uso da Modelagem Matemática como um Ambiente
de Aprendizagem, por meio de uma intervenção didática tendo como ponto de partida
situações-problema contextualizadas que levem os alunos a elaborarem Modelos
Matemáticos para facilitar e dar suporte intuitivo ao processo de Ensino e
Aprendizagem de Geometria.
O movimento de Modelagem Matemática fundamenta a importância do seu uso
no currículo de matemática em cinco pilares, de acordo com Blum, citado por Barbosa
(2003b, p. 67):
Motivação: os alunos sentir-se-iam mais estimulados para o estudo de
Matemática, já que vislumbrariam a aplicabilidade do que estudam na
escola;
Facilitação da aprendizagem: os alunos teriam mais facilidade em
compreender as idéias Matemáticas, já que poderiam conectá-las a
outros assuntos;
Preparação para utilizar a Matemática em diferentes áreas: os
alunos teriam a oportunidade de desenvolver a capacidade de aplicar
Matemática em diversas situações, o que é desejável para moverem-se
no dia a dia e no mundo do trabalho;
Desenvolvimento de habilidades gerais de exploração: os alunos
desenvolveriam habilidades gerais de investigação;
Compreensão do papel sócio-cultural da Matemática: os alunos
analisariam como a Matemática é usada nas práticas sociais.
A Modelagem Matemática leva o aluno a desenvolver um pensamento mais
crítico e reflexivo, permitindo trabalhar estratégias de ação, oferecendo condições para a
análise global do estudo e construindo um saber contextualizado.
Segundo Bassanezi (2002, p. 38) quando se utiliza a Modelagem Matemática o
ensino fica mais atraente e interessante para o estudante:
A utilização da Modelagem para o Ensino e Aprendizagem da Matemática,
além de tornar um Curso de Matemática atraente e agradável, pode levar o
Danielly Barbosa de Sousa
5859
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
aluno a desenvolver um espírito de investigação, utilizar a Matemática como
ferramenta para resolver problemas em diferentes situações e áreas, entender
e interpretar aplicações de conceitos Matemáticos e suas diversas facetas,
relacionar sua realidade sócio-cultural com o conhecimento escolar e, por
tudo preparar os estudantes para a vida real, como cidadãos atuantes na
sociedade.
Por outro lado, Barbosa (2002, p. 06), considera que a Modelagem como
Ambiente de Aprendizagem favorece a investigação de outras áreas do conhecimento
por meio da Matemática:
Modelagem é um Ambiente de Aprendizagem no qual os alunos são
convidados a indagar e/ou investigar, por meio da Matemática, situações
oriundas de outras áreas do conhecimento. Se tomarmos a Modelagem de um
ponto de vista sócio-crítico, a indagação ultrapassa a formulação ou
compreensão de um problema, integrando os conhecimentos de Matemática,
de Modelagem e reflexivo.
Esta conceituação de Modelagem Matemática como um ambiente de
aprendizagem será a utilizada no nosso trabalho. Esperamos desta forma levar o aluno a
desenvolver conhecimentos geométricos, pois, de acordo com os PCN (BRASIL, 1998,
p. 25):
A Matemática faz-se presente na quantificação do real - contagem, medição
de grandezas - e no desenvolvimento das técnicas de cálculo com os números
e com as grandezas. No entanto, esse conhecimento vai muito além, criando
sistemas abstratos, ideais, que organizam, inter-relacionam e revelam
fenômenos do espaço, do movimento, das formas e dos números, associados
quase sempre a fenômenos do mundo físico.
Acreditamos que o aluno se envolva em um maior grau e encontre motivos para
superar suas dificuldades quanto à aprendizagem de Matemática quando é movido por
interesses e estímulos externos à Matemática, vindos do “mundo real”.
D’Ambrósio (1986) caracteriza a Modelagem Matemática por meio do ciclo
dinâmico realidade – reflexão – ação – realidade, que resulta em uma ação planejada,
consciente. Este processo ocorre, segundo ele, por meio da construção de Modelos
sobre os quais o indivíduo opera, aplicando toda a sua experiência e o conhecimento
acumulado no seu cotidiano.
Para esse pesquisador, o Modelo seria o ponto de ligação entre as informações
captadas pelo indivíduo e sua ação sobre a realidade; situa-se no nível do indivíduo e é
Danielly Barbosa de Sousa
5860
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
criado por ele como um instrumento de auxilio à compreensão da realidade através da
reflexão; é, enfim, um recurso que dá ao homem condições de exercer seu poder de
análise da realidade.
Já para Biembengut & Hein (2003, p.13) a interação que permite transformar
uma situação real em um “Modelo Matemático” pertinente deve seguir três etapas
básicas, sendo cada etapa subdividida em duas subetapas:
Interação – (Reconhecimento da situação-problema e Familiarização com o
assunto a ser modelado); Matematização – (Formalização do problema e
Resolução do problema em termos do Modelo) e Modelo Matemático –
(Interpretação da solução e Validação do Modelo).
Este processo sugerido por Biembengut e Hein (2003) será utilizado no nosso
trabalho, nas duas situações problemas abordadas anteriormente. Além dos passos
sugeridos por Biembengut, será elaborado um mapa e uma maquete, respectivamente,
que servirá de Modelo Concreto que será desenvolvido passo a passo com o Modelo
Matemático, servindo de apoio para o aluno visualizar os processos, em todas as fases.
3. A
MODELAGEM
MATEMÁTICA
E
A
TEORIA
SÓCIO-
INTERACIONISTA.
Os alunos do 8 o Ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmão Damião
que participam desta pesquisa apresentam deficiências tanto na parte de formação de
conteúdos Geométricos, como no domínio de linguagem e na realização de trabalhos em
grupos conforme detectados na dinâmica e do questionário. Apresentaremos argumentos
baseados na teoria sócio interacionista de Vygotsky mostrando a adequação dessa
abordagem à realidade de nossos alunos, aos objetivos propostos e à utilização de
modelos matemáticos como ponto de partida no processo de ensino e aprendizagem.
Os estudos de Vygotsky (1987 apud COLL et all, 2000)
enfatizam a
importância da interação e da construção de significados para a aprendizagem e nesta
direção o professor exerce o papel de mediador, sendo a ponte entre o mundo dos signos
socialmente estabelecidos e os conhecimentos até então desenvolvidos pelos alunos. A
interação professor aluno ocorre por meio de processos dialógicos durante os processos
de ensino e aprendizagem.
Danielly Barbosa de Sousa
5861
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
Segundo os PCN (BRASIL,1998, p. 36):
Para desempenhar seu papel de mediador entre o conhecimento matemático e
o aluno, o professor precisa ter um sólido conhecimento dos conceitos e
procedimentos dessa área e uma concepção de Matemática como ciência que
não trata de verdades infalíveis e imutáveis, mas como ciência dinâmica,
sempre aberta à incorporação de novos conhecimentos.
Os conhecimentos a serem apreendidos por meio da mediação simbólica surgem
em um primeiro momento no ambiente externo, de forma inter-psíquica, sendo depois
internalizada, ou seja, passa ser um conhecimento intra-psíquico (individual).
Vygotsky (1998) estabelece então dois níveis de desenvolvimento um chamado
de Desenvolvimento Real e outro de Desenvolvimento Proximal. O Desenvolvimento
Real é determinado pelo domínio da capacidade de solucionar determinados problemas
e que constitui aquele domínio de conhecimentos já desenvolvido pelo aluno fazendo
parte do acervo de conhecimentos por ele dominado.
O Nível de Desenvolvimento Proximal - ZDP está associado ao domínio de
conhecimentos que o possibilitam a resolver determinadas situações-problema apenas
com a ajuda de adultos ou companheiros mais capazes. A ZDP pode se definida
segundo Vygotsky (1993) como o espaço no qual, graças à interação e à ajuda de
outros, uma pessoa pode trabalhar e resolver um problema ou realizar uma tarefa que
não seria capaz de resolver individualmente.
Segundo os PCN (BRASIL, 1998, p. 39) trabalhar coletivamente favorece o
desenvolvimento de capacidades como:




perceber que além de buscar a solução para uma situação proposta
devem cooperar para resolvê-la e chegar a um consenso;
saber explicitar o próprio pensamento e procurar compreender o
pensamento do outro;
discutir as dúvidas, supor que as soluções dos outros podem fazer
sentido e persistir na tentativa de construir suas próprias idéias;
incorporar soluções alternativas, reestruturar e ampliar a compreensão
acerca dos conceitos envolvidos nas situações e, desse modo, aprender.

Neste sentido, a Modelagem Matemática como um Ambiente de Aprendizagem
é uma ferramenta de grande utilidade para as aulas de Matemática e, em especial, para a
Geometria, pois possibilita o aluno a realizar atividades associadas a sua realidade,
possibilitando-o a coletar informações, compreender, analisar e explicar as situações-
Danielly Barbosa de Sousa
5862
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
problemas tornando a Matemática escolar mais interessante. Dessa forma o aluno terá
oportunidade ao de aplicar os conhecimentos construídos a novos contextos,
desenvolvendo sua competência profissional futura.
Precisamos de uma educação que incentive os alunos a resolução de problemas
mostrando onde e como se aplica a Matemática no nosso dia a dia.
Para Ponte (1992) a apresentação de novos conceitos a partir de situações reais,
pode ser uma base concreta para desenvolver os conceitos, como também ter um
importante papel motivador. Já para Vygotsky (1682 apud BAQUERO, 1998, p. 62),
esta construção apresenta dois níveis de compreensão: o nível do sentido e do
significado.
O primeiro alude à série de conotações que um termo possui para um sujeito,
de acordo com seu próprio repertório de experiências; o sentido de uma
palavra é instável, dinâmico, mutante de acordo com os contextos em que o
termo em questão se situe. O significado de um termo representará sua “zona
mais estável”, na medida em que alude a seu uso convencional; o significado
remete a uma espécie de definição mais ou menos expressa e socialmente
convencionada.
Podemos dizer que, aprender um conceito consiste inicialmente em atribuir
sentido e depois construir o seu significado. Em outras palavras, é estabelecer relações
desse conceito com um sistema mais amplo, presentes na cultura, pois se o conceito for
construído pelo aluno será facilmente relembrado quando necessário.
Os alunos quando chegam à sala de aula trazem conhecimentos oriundos do seu
cotidiano extra-escolar. Em atividades com a família, amigos e outros grupos aprendem
o que Vygotsky (1987 apud COLL et al, 2000) denominou de conceitos espontâneos (ou
conceitos do cotidiano) – os conceitos formados a partir da experiência dos alunos fora
da escola. Estes conceitos nem sempre tem o grau de abstração e de generalização dos
conceitos científicos – estes apreendidos na escola. Os conceitos matemáticos são
conceitos científicos, requerendo do docente mediação para partindo - dos conceitos
espontâneos, chegarem aos conceitos científicos.
Segundo os PCN (BRASIL, 1998, p. 36):
Um conhecimento só é pleno se for mobilizado em situações diferentes
daquelas que serviram para lhe dar origem. Para que sejam transferíveis a
novas situações e generalizados, os conhecimentos devem ser
descontextualizados, para serem novamente contextualizados em outras
Danielly Barbosa de Sousa
5863
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
situações. Mesmo no Ensino Fundamental, espera-se que o conhecimento
aprendido não fique indissoluvelmente vinculado a um contexto concreto e
único, mas que possa ser generalizado, transferido a outros contextos.
Para ensinar conceitos elementares muitas vezes o professor precisa
primeiramente desconstruir alguns conceitos em seus elementos básicos e a partir deles
reconstruir o seu próprio conhecimento (SHEIDE, 2008). Esta transformação é
necessária e nos proporciona um acompanhamento do processo de Ensino e
Aprendizagem do aluno. O trabalho de construção de conceitos por meio de Modelagem
Matemática realizada em grupo contribui para que por meio da interação os conceitos
espontâneos sejam reformulados e partir destes construídos os científicos.
4. RESULTADOS PARCIAIS DO QUESTIONÁRIO
Para verificar o domínio das concepções, crenças e mitos dos alunos sobre a
Matemática e a Geometria em uma turma do 8 o Ano do Ensino Fundamental da Escola
Irmão Damião, localizada em Lagoa Seca, Paraíba foi aplicado e analisada as respostas
ao questionário com 10 questões, (ANEXO-FIGURA 1). A turma é composta de 17
alunos e todos participaram desta pesquisa.
A questão 1, pretendia levantar se o aluno considera ou não a Matemática como
útil no seu cotidiano - 100% responderam que SIM, que consideram a Matemática como
sendo útil no nosso dia a dia.
Na questão 2, queríamos verificar se os alunos conseguiam fazer a ligação da
Matemática escolar com a Matemática do cotidiano, as possíveis aplicações nas
profissões e no dia a dia. Aproximadamente 70% dos alunos conseguiram fazer a
ligação entre a Matemática Escolar e a Matemática do cotidiano, pois associaram
números e operações; espaço e forma; grandezas e medidas ao seu dia a dia.
Entre suas respostas, a presença da Matemática esta inserida nas seguintes
situações: nos relógios, nos jogos, na TV, nas numerações das casas, nos desenhos
como a pizza, o dado, nas placas dos carros, na contagem dos objetos, no dinheiro, que
a Matemática é útil nos mercados, nas empresas, nos documentos pessoais, e em tudo
que fazemos no nosso dia a dia, nas refeições diárias. Não foi observada nenhuma
citação relacionando a Matemática às profissões. Algumas destas respostas lembram as
Danielly Barbosa de Sousa
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O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
aplicações sugeridas nos livros textos, ou sejam, este é um conhecimento de origem
escolar.
O objetivo das questões 3 e 4 respectivamente, era a de verificar quais conteúdos
de Matemática e Geometria eram lembrados pelos alunos.
Observamos que na questão 3, apenas 5 (cinco) alunos, ou seja,
aproximadamente 30%, não conseguiu fazer a distinção entre os conteúdos de
Geometria e dos demais campos de Matemática; o restante lembrou conteúdos
Matemáticos vistos a em sala de aula. Citaram os seguintes conteúdos de Matemática:
dízima periódica, equação, potenciação, números naturais, expressões algébricas, raiz
quadrada, frações equivalentes, divisão e multiplicação, números reais, números
irracionais e inteiros, expressões numéricas, frações equivalentes, noções de Geometria.
Apenas 2 (dois) alunos citaram conteúdos de Geometria dentro da Matemática – talvez
por terem lido a questão 4 que tratava deste assunto, ou por pouca lembrança.
Nas respostas da questão 4, concluímos que aproximadamente 50% da turma
conseguiram lembrar dos conteúdos já vistos em Geometria sendo citados: o lado de
um quadrado, os triângulos, circunferências e diâmetro, medição de ângulos, retas
transversais, ângulos alternos e externos, as formas Geométricas, os planos e noções de
Geometria.
A questão 5, visava levantar o sentimento que a Matemática desperta nos alunos:
se eles gostam muito, se gostam pouco ou se não gostam da disciplina.
Apenas 04 (quatro) alunos – aproximadamente 25%, disseram que gostam de
Matemática o restante responderam que gostam pouco. Apesar de nenhum ter
respondido que não gosta, acreditamos que a resposta dada visa agradar o professor.
A questão 6, procura levantar se a forma de ensino dos professores de
Matemática agrada aos alunos e o porquê. Queríamos verificar se a forma de ensino dos
professores de Matemática agrada aos alunos, se a metodologia usada por eles facilita
ou dificulta na aprendizagem, se os professores têm paciência em ensinar, se atendem
aos objetivos dos alunos, conseguindo superar as dificuldades existentes em sala de
aula.
Observamos nas respostas desta pergunta que apenas 02 (dois) alunos
responderam negativamente. Os demais citaram que este ano e nos anos anteriores
tiveram bons professores de Matemática, que ensinam muito bem, tem paciência com os
Danielly Barbosa de Sousa
5865
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
alunos e que eles entendem as explicações e as correções dos exercícios pelo fato do
professor explicar de forma clara e de fácil entendimento.
A questão 7, tinha como objetivo verificar quais os materiais didáticos que são
utilizados em sala de aula pelos professores de Matemática, se trabalha com o livro
didático, se utilizam outros recursos além do quadro, o giz e o livro didático e se estes
recursos facilitam a aprendizagem.
Todos, exceto um aluno, afirmaram que os materiais didáticos trabalhados pelos
professores facilitam o processo de Ensino Aprendizagem, sanando algumas
dificuldades apresentadas por eles. Estes materiais didáticos não foram especificados
por eles, sendo citado apenas o livro didático.
Na questão 8, pretendíamos verificar se os alunos conseguiam apontar os
conteúdos Matemáticos e Geométricos que apresentaram mais dificuldades.
As respostas indicam que os alunos apresentam dificuldade de leitura e escrita
Matemática; dificuldades em equações e expressões numéricas, dificuldade nas quatro
operações, em conteúdos Geométricos, em ângulos, entre outros.
Na questão 9, tivemos como objetivo descobrir o tempo que estes alunos se
dedicam aos estudos em especial a disciplina de Matemática. Se o aluno conseguiu
construir um hábito de estudos diários no seu dia a dia.
Tivemos como resultado que aproximadamente 48% dos alunos dedicam em
torno de 2 (duas) horas diárias para o estudo de Matemática. O restante, afirmou que
dedicam em torno de 30 a 40 minutos ao estudo desta disciplina.
Na questão 10, nosso alvo era descobrir se os alunos estudam sozinhos, estudam
acompanhados ou recebem ajuda de alguém mais velho.
Observamos que a maioria dos alunos – 14 (quatorze) responderam
que
estudam sozinhos, 2 (dois) responderam que estudam com a ajuda dos pais ou irmãos e
um aluno não respondeu a esta questão.
O questionário nos permitiu concluir que os alunos apresentam problemas de
leitura e interpretação de texto, deficiências no domínio de conteúdos Geométricos,
ausência de hábito de estudo em grupo, dedicação de pouco tempo para o estudo da
disciplina de Matemática em casa.
Danielly Barbosa de Sousa
5866
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
5. CONCLUSÃO
A partir da revisão bibliográfica constatamos que o ensino de Matemática por
meio da resolução de situações-problema vivenciada pelos alunos, utilizando a
Modelagem Matemática, oportuniza o desenvolvimento de saberes formativos e
funcionais, demandados para o exercício de uma cidadania crítica e participante.
Verificamos também a adequação da teoria sócio-interacionista de Vygotsky
como guia para elaboração da proposta didática, na escolha da metodologia a ser
seguida, incluindo a resolução de problemas dentro de um ambiente de Modelagem
Matemática, bem como a discussão e a análise como uma necessidade no
desenvolvimento das atividades.
A pesquisa encontra-se na fase de aplicação da proposta em sala de aula.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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algumas implicações para o ensino e aprendizagem da Matemática. In:
CONFERÊNCIA INTERAMERICANA DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, 11. 2003,
Blumenau. Anais. Blumenau: FURB, 2003. 1 CD-ROM.
ARAÚJO, E. A. Influência das habilidades e das atitudes em relação à matemática e à
escolha profissional. 228 p. Tese (Doutorado). Faculdade de Educação, Universidade
Estadual de Campinas, Campinas, 1999.
BAQUERO, Ricardo.Vygotsky e a aprendizagem escolar.. Porto Alegre: Artmed,1998.
BARBOSA, JONEI C. Modelagem Matemática na sala de aula. Perspectiva, Erichim
(RS), v.27, n.98, Junho/ 2003b.
__________. Modelagem Matemática e os futuros professores. In: REUNIÃO ANUAL
DA ANPED, 25., 2002, Caxambu. Anais. Caxambu: ANPED, 2002. 1 CD-ROM.
BASSANEZI, Rodney Carlos. Ensino–aprendizagem com Modelagem Matemática:
uma nova estratégia. São Paulo: Contexto, 2002.
BIEMBENGUT, M. S.; HEIN, N. Modelagem Matemática no Ensino. 3.ed. São Paulo:
Contexto, 2003.
BORBA, Marcelo Carvalho; ARAUJO, Jussara de Loiola (orgs). Pesquisa Qualitativa
em Educação Matemática. Belo Horizonte : Autêntica, 2004.
Danielly Barbosa de Sousa
5867
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. Secretaria de Educação
Fundamental Brasília: MEC/SEF, 1998.
COLL, Cesar; [et al]. Psicologia da Educação. Porto Alegre, Editora Artmed, 2000.
D’AMBROSIO,Ubiratan. Da realidade à Ação: Refexões sobre educação e
Matemática. Campinas Summus, 1986.
___________ . EtnoMatemática, 2 ed, Ática, 1993, São Paulo.
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em Revista. Blumenau: SBEM, Ano III, n. 4, 1995.
OLIVEIRA. S. Luiz de. Tratado de Metodologia Científica: projetos de pesquisas,
TGI, TCC monografias, dissertações e teses. São Paulo : Pioneira Thompson Learning,
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MIZUKAMI, Maria da Graça N., REALI, Aline Maria M. R. Processos formativos da
docência: conteúdos e práticas. São Carlos: EDUFSCar, 2005, pp. 16-44.
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e conseqüências. Revista Zetetiké. Campinas: UNICAMP, Ano 1, n. 1, 1993.
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2008.
SCHEIDE, T. O Ensino e Aprendizagem de Matemática nas Séries iniciais de
Escolarização.
Disponível
em:
http://www.sbem.com.br/files/ix_enem/Comunicacao_Cientifica/Trabalhos/CC0411169
9804T.rtf. Acessado em: 29 de Mar. De 2008.
VYGOTSKY, L. S. – Pensamento e Linguagem. (trad. Jefferson Luiz Camargo). São
Paulo : Martins Fortes, 1993.
____________. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone,
1988.
Danielly Barbosa de Sousa
5868
O Uso da Modalagem Matemática como Ambiente de Aprendizagem: uma nova prática para conteúdos
geométricos no 8º ano do ensino fundamental
ANEXO
FIGURA 1- Questionário para verificar o domínio das concepções, crenças e mitos dos alunos
sobre a Matemática e a Geometria
FONTE: Questionário adaptado (SANTOS, 2006)
Danielly Barbosa de Sousa
5869
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
APROXIMAÇÕES POSSÍVEIS ENTRE
MATEMÁTICA E LINGUAGEM: A QUESTÃO DO
PROBLEMA MATEMÁTICO
Doralice Pereira de Santana
Maria das Dores de Morais
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
APROXIMAÇÕES POSSÍVEIS ENTRE MATEMÁTICA E LINGUAGEM: A
QUESTÃO DO PROBLEMA MATEMÁTICO
Doralice Pereira de Santana
Maria das Dores de Morais
Universidade Católica de Pernambuco
RESUMO: Este trabalho objetiva analisar o Problema Matemático à luz da teoria de
gêneros discursivos de Bakhtin, buscando estabelecer a relação entre Matemática e
Linguagem, necessária à compreensão dos enunciados. É desafio para a Escola
incorporar ao seu trabalho, apoiado na oralidade e na escrita, novas formas de
comunicar e conhecer (PCNs, 2001). Assim, no processo de interação do aluno com a
Matemática e seu conteúdo, importa comunicar-se matematicamente, argumentar,
estabelecer relações entre a linguagem e as diferentes representações matemáticas e
entre temas matemáticos e conhecimentos de outras áreas curriculares (PCNs, 2001).
Por outro lado, a língua materna é a detentora dos elos de raciocínio matemático, visto
que nela os enunciados e suas respostas são produzidos, lidos e interpretados (SMOLE;
DINIZ, 2002). Para esta análise, foram selecionados vinte e nove itens da Prova Brasil
de Matemática, aplicados na quarta série do Ensino Fundamental, aqui investigados
com base nas concepções de gênero do discurso de Bakhtin (2003), nos critérios para
reconhecimento de gêneros de B. Marcuschi e Cavalcante (2005) e Dionísio, Machado e
Bezerra (2002).
PALAVRAS-CHAVE: PCN, Linguagem, Matemática, gêneros.
Referencial Teórico:
Alguns autores, sob diferentes pontos de vista, preocupam-se em estudar a ligação entre
a Matemática e a Linguagem, ou entre a Matemática e a Língua Materna. Machado
(1991) chama a atenção para as interações possíveis entre a Matemática e outras áreas
do conhecimento, ressaltando que com a Língua Materna a interação se dá de forma
singular, podendo ser caracterizada como uma relação de complementaridade, que se
pode observar até mesmo no nível lexical, sem falar na necessidade de utilização de
termos matemáticos para exprimir situações ligadas a tempo, espaço ou no campo dos
negócios, no uso ordinário do relógio, do calendário, medidas e da moeda corrente.
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5873
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
Além disso, Smole e Diniz (2001) atribuem à Língua Materna os elos de raciocínio
matemático, uma vez que, embora os enunciados e suas respostas sejam matemáticos, é
na Língua Materna que eles são produzidos e lidos.
Pensar a relação entre a matemática e a linguagem, a partir dos problemas matemáticos,
pressupõe uma concepção de língua que comporte em si a noção de problema enquanto
enunciado, atividade humana e, por conseguinte, elemento discursivo. A adoção dessa
postura implica uma concepção de língua como a adotada por Marcuschi (2008, p. 61),
que vê a linguagem como uma atividade sociointerativa, de base cognitiva e histórica, e
uma reflexão sobre a posição dos PCNs com relação aos objetivos da Matemática e os
desafios da Escola atual, destacando-se, aqui, o estabelecimento de relações entre a
Linguagem e as diferentes representações matemáticas. Nessa perspectiva, há que se
considerar também as demais áreas curriculares, visto que é por meio da utilização da
língua, enquanto atividade sociointerativa, que essa relação acontece.
Para esse fim, adotou-se neste trabalho, a concepção discursiva de Bakhtin (2003), que
afirma que todos os campos da atividade humana estão ligados ao uso da linguagem
(BAKHTIN, 2003, p. 261), e ainda que o emprego da língua efetua-se em forma de
enunciados (orais e escritos) concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou
daquele campo da atividade humana (BAKHTIN, 2003, p. 261). Assim, os diferentes
campos dessa atividade, ao fazerem uso da língua, criam seus tipos relativamente
estáveis de enunciados, ao que Bakhtin (2003) dá o nome de Gêneros do Discurso. Cada
gênero está intimamente ligado ao seu campo de atividade, ou à esfera discursiva da
qual se origina, por meio de seu conteúdo, do estilo e da construção composicional.
Esses três elementos, ao mesmo tempo em que os situam em suas esferas discursivas,
caracterizam-nos como gêneros.
Por outro lado, quando B. Marcuschi e Cavalcante (apud MARCUSCHI; DIONÍSIO,
2005, p. 126) questionam sobre o que faz um gênero ser reconhecido, falam de função
sociocomunicativa, mais do que de forma textual, visto que a estabilidade dos gêneros é
algo relativo. Falam ainda da importância do contexto de produção e da aceitabilidade
dos atores envolvidos, de modo que a identidade do gênero é estabelecida com base
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5874
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
num acordo entre os participantes da interação. Portanto, considerem-se neste trabalho,
para efeito de identificação do gênero, essas proposições somadas às de Bakhtin sobre o
mesmo tema.
A questão do Problema Matemático
Para abordar a questão do Problema Matemático à luz das reflexões acima, recorremos a
vinte e nove itens da avaliação em Matemática da Prova Brasil, por se tratarem de
instrumentos socialmente reconhecidos, especialmente no campo da Educação
Matemática. Assim, considerando a Matemática um campo da atividade humana, em
termos bakhtinianos, entende-se, pois, que ela também produz seus tipos relativamente
estáveis de enunciados, seus gêneros discursivos. Sobre a avaliação de Matemática da
prova Brasil, é dito que
O conhecimento de matemática na Prova Brasil e no Saeb deve ser
demonstrado por
meio da resolução de problemas. São consideradas capacidades como: observação,
estabelecimento de relações, comunicação (diferentes linguagens), argumentação e
validação de processos, além de estimular formas de raciocínio como intuição, indução,
dedução e estimativa. Essa opção traz implícita a convicção de que o conhecimento
matemático ganha significado quando os alunos têm situações desafiadoras para
resolver e trabalham para desenvolver estratégias de resolução (INEP, 2009).
Nesse sentido, uma vez que o Problema Matemático assume tal importância no contexto
da avaliação de desempenho dos estudantes brasileiros, pode-se inferir que sua
identificação na relação entre Matemática e Linguagem pode se dar a partir da
concepção de linguagem enquanto atividade sociointerativa, a qual se realiza por meio
do discurso que, elaborado sob os critérios dos diversos campos da atividade humana,
geram enunciados que se materializam em gêneros. Em outras palavras, é o
reconhecimento da Matemática como esfera discursiva, que dá origem a um discurso
particular, que gera em si diversos gêneros.
Retomando as posições teóricas de Bakhtin (2003) e de B. Marcuschi e Cavalcante
(2005) sobre gêneros, sabe-se que o contexto é um elemento importante na identificação
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5875
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
dos mesmos, e tomando a afirmação do INEP (2009) de que os Problemas são baseados
no contexto do aluno, já localizamos um dos critérios para identificação de gêneros
presentes no Problema Matemático: o contexto de produção.
Tomemos os seguintes exemplos de Problemas Matemáticos que compõem os itens da
Prova Brasil:
Exemplo 1
01
IT_038252
João participou de um campeonato de judô na categoria juvenil, pesando
45,350kg. Cinco meses depois estava 3,150kg mais pesado e precisou
mudar de categoria. Quanto ele estava pesando nesse período?
(A) 14,250kg
(B) 40,850kg
(C) 48,500kg
(D) 76,450kg
Exemplo 2
02
IT_010668
Para uma temporada curta, chegou à cidade o circo Fantasia, com palhaços,
mágicos e acrobatas. O circo abrirá suas portas ao público às 9 horas e ficará
aberto durante 9 horas e meia. A que horas o circo fechará?
(A) 16h30
(B) 17h30
(C) 17h45
(D) 18h30
Observando estes exemplos, percebe-se que há certa estabilidade na forma como os
problemas são construídos. Eles apresentam uma situação, seguida de uma complicação
para a situação e a sugestão de que o aluno poderá encontrar, entre as alternativas
apresentadas, a solução. Todos os vinte e nove problemas analisados trazem a mesma
composição formal, comum em Problemas Matemáticos. Por se tratar de itens da Prova
Brasil, todos eles são numerados. Essa numeração não é necessária a problemas
matemáticos, embora o seja aos Problemas Matemáticos construídos no contexto dessa
avaliação, o que, no entanto, não compromete a estrutura formal que os identificam e
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5876
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
caracterizam como tal, e refere-se ao que Bakhtin (2003) chama de construção
composicional.
Vejamos, agora, os seguintes exemplos:
Exemplo 3
04
IT_046318
Mariana colou diferentes figuras numa página de seu caderno de Matemática, como
mostra o desenho abaixo. Essas figuras têm em comum
(A) o mesmo tamanho.
(B) o mesmo número de lados.
(C) a forma de quadrado.
(D) a forma de retângulo.
Exemplo 4
08
IT_033258
No ábaco abaixo, Cristina representou um número. Qual foi o número
representado por Cristina?
(A) 1.314
(B) 4.131
(C) 10.314
(D) 41.301
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5877
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
A inserção de elementos extralinguísticos na construção composicional dos dois
exemplos acima demonstra o que Bakhtin chama de estilo, que está, nesta situação, para
a função sociocomunicativa. O estilo é um dos fatores de relativização da estabilidade
do gênero.
Ainda que relativamente estáveis, os gêneros mantêm uma convenção baseada no
acordo entre os participantes da interação que os torna reconhecíveis. Um problema
matemático é assim reconhecido não só pela sua estrutura formal, visto que nos
exemplos retirados do corpus investigado há variação dessa estrutura conforme a
intenção comunicativa dos enunciados, mas também pela seleção lexical que faz parte
do conteúdo do domínio discursivo ao qual pertencem, e ainda pelo contexto de
produção e aceitabilidade social.
Outro aspecto observado é a presença de outros textos na composição dos problemas
matemáticos como as figuras geométricas e os gráficos. É comum, também, a presença
de retas, tabelas, como parte integrante desse gênero textual. A intertextualidade,
presença de um ou mais outros textos na composição de um gênero, ocorre também nos
gêneros do discurso matemático, a exemplo dos problemas, por necessidade de cumprir
a função sociointerativa a que se destinam. O aluno lê, compreende o problema e o
soluciona construindo, para tanto, uma resposta matemática, para a qual muitas vezes
recorre à língua materna como a detentora dos elos de raciocínio matemático, visto que
nela os enunciados e suas respostas são produzidos, lidos e interpretados (SMOLE;
DINIZ, 2002).
Esta reflexão, portanto, leva-nos a supor que a Matemática, em aproximação com a
Linguagem, e enquanto campo da atividade humana gera seu próprio discurso,
atravessado por símbolos do seu próprio sistema e elementos linguísticos que se
complementam na construção dos sentidos. Esse discurso se materializa por meio de
gêneros discursivos, dentre os quais o problema matemático, um exemplo da relação de
complementaridade entre as duas esferas discursivas.
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5878
Aproximações Possíveis entre Matemática e Linguagem: a questão do problema matemático
Essa conclusão abre caminho para uma outra questão: Se há uma relação de
aproximação e complementaridade entre a Matemática e a Linguagem, estabelecida por
meio de gêneros discursivos, de que forma a Educação Matemática poderia voltar-se
mais para a Linguagem, no sentido da transposição didática desse princípio para a
leitura e compreensão dos Problemas Matemáticos?
Referências
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INEP (2009) <<http://provabrasil2009.inep.gov.br>> Acesso em 27/08/2009
Doralice Pereira de Santana & Maria das Dores de Morais
5879
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
PROFISSIONALIDADE DO PROFESSOR DE
MATEMÁTICA: UM ESTUDO SOBRE AS
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
PROFISSIONALIDADE DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA: UM ESTUDO
SOBRE AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Elisângela Bastos de Melo Espíndola – SEE/PE
[email protected]
RESUMO: Este trabalho apresenta resultados de uma pesquisa realizada com 508
professores(as), sendo 362 formados(as) em matemática e 146 formados(as) em
diversas áreas do conhecimento como: Geografia, História, Biologia, Pedagogia e
Letras. A pesquisa foi realizada com a intenção de observarmos os significados
atribuídos ao exercício da profissão docente em matemática por estes (as) professores
(as). O campo de investigação foi encontros de formação continuada promovidos pela
Secretaria Estadual de Educação de Pernambuco. Tomamos como referência teóricometodológica a teoria das Representações Sociais de Serge Moscovici e o enfoque
estrutural de Jean Claude Abric. Utilizamos no levantamento dos dados o questionário
de associação livre e na análise um software estatístico, o Trideux.Como resultados,
apontamos alguns pontos de convergência e/ou divergência entre professores (as)
formados(as) em matemática e àqueles(as) não formados (as) nesta disciplina.
PALAVRAS-CHAVE: Docência em matemática.
Desenvolvimento profissional. Profissionalidade.
Representações
sociais.
Introdução
Nas últimas décadas, as discussões sobre a profissionalidade docente tem sido
recorrentes. A “profissionalidade” é um termo de origem italiana, introduzido no Brasil
pela via francesa, está associada às instabilidades e ambigüidades que envolvem o
trabalho em tempos neoliberais, e geralmente vem colocado como uma evolução da
idéia de qualificação (Bourdoncle, 1991) apud (Lüdke e Boing, 2004, p.1173).
O conceito de profissionalidade é associado ao de competência, mas de forma
distinta ao de qualificação, no sentido mercadológico americano. Lüdke e Boing
(ibidem) esclarecem que este é tomado no sentido evolutivo dentro do território francês
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5883
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
à medida que veio sendo adaptado, sucessivamente, pelas correntes psicopedagógicas,
lingüísticas, psicolingüísticas etc.
A profissionalidade pode ser definida como a observância de um certo tipo de
regras, baseadas num conjunto de saberes e do fazer-docente. No entanto, estas regras
nem sempre são muito precisas, estando sujeitas a uma permanente reelaboração pelos
professores (Sacristán, 1999, p.77). No avanço desta linha de discussão, o autor tem
posto a profissionalidade, como “afirmação do que é específico na ação docente, isto é,
o conjunto de comportamento, destrezas, atitudes e valores que constituem a
especificidade de ser professor” (ibidem, p.65). Para Tardif (2002):
O saber dos professores não é um conjunto de conteúdos cognitivos definidos
de uma vez por todas, mas um processo em construção ao longo de uma
carreira profissional na qual o professor aprende progressivamente a dominar
seu ambiente de trabalho, ao mesmo tempo que se insere nele e o interioriza
por meio de regras de ação que se tornam parte integrante de sua “consciência
prática” (TARDIF, 2002, p.14).
O conhecimento do professor para o exercício da profissão, como todo trabalho
humano, de acordo com Tardif, exige um saber e um saber-fazer que apontam para a
subjetividade desse profissional. O autor define o saber docente como um saber plural,
formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação
profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experenciais (p. 36).
Os saberes das disciplinas são selecionados e transmitidos pelas universidades e
específicos aos vários campos dos conhecimentos, adquiridos também na formação do
professor. Os curriculares são os saberes definidos pela instituição nos programas
escolares a serem aprendidos e aplicados pelos docentes em sala de aula. Os
experenciais são saberes próprios ao professor e emergem de seu trabalho cotidiano, no
conhecimento de seu meio e da sua prática profissional, sendo validados nessas
experiências.
Neste aspecto a “formação de professores pode desempenhar um papel
importante na configuração de uma ‘nova’ profissionalidade docente, estimulando a
emergência de uma cultura organizacional no seio das escolas” (Nóvoa, 1992, p.24).
Basicamente o que Nóvoa (1992, p. 15) propõe nesta direção é a formação do
professor relacionada ao desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor), com o
desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e com o desenvolvimento
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5884
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
organizacional (produzir a escola) na dupla perspectiva do professor individual e do
coletivo, como processo de formação da pessoalidade e da profissionalidade docente.
Ramos (2008, p. 57) aponta que em termos gerais, num sentido lato, a
profissionalidade representa as características de uma dada profissão. Segundo a autora,
na origem italiana deste termo, é dito que “a profissionalidade respeita à capacidade
profissional no trabalho”. Sobre este aspecto Sacristán (1999), tem discutido que é
preciso ampliar o sentido e o conteúdo de profissionalidade docente, isto é, o âmbito dos
temas, problemas, espaços e contextos em que o professor deve pensar e intervir (p.75).
Adotamos o referencial teórico da Teoria das Representações Sociais proposta
por Serge Moscovici (1961), por esta reconhecer “o homem como agente do seu próprio
conhecimento do mundo, levando em consideração a importância da imagem que o
homem faz de si mesmo e de seu meio, na determinação da maneira de se conduzir ou
de explicar as experiências vividas ou pensadas” (Maia, 2001).
A noção de representação social vai levar em consideração, ao mesmo tempo, a
atividade do sujeito sobre o mundo e, reciprocamente, da ação do meio, empírico e
social, sobre o indivíduo. O produto dessa interação é um conhecimento particular que
corresponde ao que Moscovici chamou de representação social (Maia, 2001).
A Educação tem sido um campo em que é possível encontrar um número
significativo de trabalhos que fazem uso das representações sociais.
Em relação à Matemática tem ocorrido uma ampliação de pesquisas na área com
o uso das representações sociais para compreensão de aspectos que envolvem a pertença
social dos indivíduos com as implicações afetivas e normativas, as interiorizações de
experiências, práticas, condutas e pensamentos, que são socialmente transmitidos pela
comunicação social.
A teoria das representações sociais
As proposições originais da teoria das Representações Sociais de Moscovici têm
sido desdobradas em três correntes, colocadas como complementares: a de Denise
Jodelet, mais fiel à teoria original das RS, de Doise com uma perspectiva mais
sociológica e de Abric que enfatiza uma dimensão cognitivo-estrutural das
representações. No entanto, “não se trata por certo; de abordagens incompatíveis entre
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5885
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
si, na medida em que provêm todas de uma mesma matriz básica e de modo algum a
desautorizam” (SÁ, 1998, p.65).
Segundo Sá (1998) das correntes complementares à Teoria das Representações
Sociais que já apresentamos, a de Abric foi a única que se chegou a se formalizar como
uma teoria, a chamada teoria do núcleo central:
Ela se ocupa mais especificamente do conteúdo cognitivo das representações,
mas concebendo-o como um conjunto organizado ou estruturado, não como
uma simples coleção de idéias e valores. A proposição de que o conteúdo da
representação se organiza em um sistema central e um sistema periférico, com
características e funções distintas, é certamente a sua principal contribuição
(SÁ, 1998, pp.76-77).
A abordagem estrutural - a Teoria do Núcleo Central foi proposta em 1976, na
forma de uma hipótese explicativa da organização interna das representações sociais,
proposta por Jean Claude Abric e coletivamente desenvolvida pelo chamado “Grupo do
Midi”, composto por pesquisadores do sul da França. Para Maia (1999), o modelo
estrutural é, na realidade, um prolongamento do modelo processual, proposto por
Moscovici. Não há dúvida que ele vem contribuir, de maneira fundamental, para a
compreensão do processo pelo qual se forma, e, sobretudo, por serem essas
representações modificadas, uma dimensão pouco explorada por Moscovici.
Segundo Abric (1994) apud Almeida (2005, p.132): “A organização de uma
representação apresenta uma modalidade particular, específica: não apenas os elementos
da representação são hierarquizados, mas ainda, toda representação é organizada em
torno de um núcleo central, constituído de um ou de alguns elementos que dão à
representação sua significação”.
Para Almeida (2005, p.132) a idéia essencial desta teoria é que toda
representação é organizada em torno de um núcleo, entendido como o elemento
fundante, porque determina sua significação e organização interna. O núcleo central
seria composto de um ou mais elementos, mais estáveis, coerentes, consensuais, e
historicamente definidos, “cuja ausência destruiria a representação ou lhe daria uma
significação completamente diferente” (Abric, 1994 b, p.73).
Mazzotti (2000) aponta que o núcleo central determina ao mesmo tempo a
significação e a organização interna das representações sociais, enquanto, os elementos
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5886
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
periféricos, constituem a parte operatória da representação, desempenhando um papel
essencial no funcionamento e dinâmica das representações.
A representação recebe uma normatização através do sistema central, enquanto o
sistema periférico relaciona-a a sua funcionalidade. “O sistema periférico ancora a
representação na realidade sócio-histórica do momento, fazendo a adaptação do objeto
ao contexto e protegendo o núcleo central de transformações” (CRUZ, 2006, p. 125).
Mazzotti (2000) apresenta características do núcleo central e do sistema
periférico das representações sociais, distingüindo-as entre si. Para a autora: o núcleo
central está ligado á memória coletiva e a história do grupo, enquanto o sistema
periférico permite a integração das experiências e histórias individuais. O núcleo central
é consensual, define a homogeneidade do grupo, é estável, coerente e rígido, resiste à
mudança e é pouco sensível ao contexto imediato, enquanto o sistema periférico suporta
a heterogeneidade do grupo, é flexível, suporta contradições, se transforma e é sensível
ao contexto imediato (p.61).
A teoria do núcleo central tem como hipótese geral para seu estudo experimental
das RS, que toda representação se organiza em torno de um núcleo central (elemento
fundamental da representação), que, por ser estruturante da representação, tem função
geradora (cria ou transforma a significação dos outros elementos da representação) e
organizadora (determina a natureza dos vínculos que unem entre si os demais elementos
da representação).
O núcleo central é um subconjunto da representação cuja ausência
desestruturaria ou daria uma significação radicalmente diferente à representação em seu
conjunto. Por outro lado, é o elemento mais estável da representação, o que mais resiste
à mudança. Uma representação é suscetível de evoluir e de se transformar
superficialmente por uma mudança no sentido ou da natureza de seus elementos
periféricos. Mas ele só muda de significação quando o próprio núcleo central é posto em
questão.
Entre as características distintas entre o núcleo central e o sistema periférico,
destacamos as funções de cada um desses elementos. O núcleo central gera a
significação da representação e determina sua organização, enquanto o sistema
periférico permite a adaptação à realidade concreta e a diferenciação de conteúdo,
protegendo o sistema central (Mazzotti, 2000, p.65).
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5887
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Pelo exposto, observar os elementos do núcleo central e os elementos periféricos
é um requisito para compreender a organização das representações sociais, assim como
o conteúdo, o significado em termos de campo semântico, como se organizam e em que
elas se diferenciam em função de algumas características dos sujeitos.
Ao pretendermos identificar as representações sociais dos professores em
exercício docente ou não, na disciplina matemática sobre a “profissão professor”,
buscamos ampliar a compreensão de fatos que tem permeado a docência em
matemática, através do dizer/falar destes professores, mediante o que circula no senso
comum.
Considerando que a marca social das representações sociais expressa-se “nos
contextos em que elas emergem, nas comunicações pelas quais circulam”, na interação
dos sujeitos com o mundo e com os outros (Jodelet, 1985, p.361 apud Weber, 1996, p.
44).
A abordagem teórico-metodológica da teoria das representações sociais
O conceito de Representações Sociais, sugere “uma visão funcional do mundo,
que permite ao indivíduo ou grupo dar um sentido a suas condutas e compreender a
realidade através de seu próprio sistema de referência, logo, adaptar-se a definir seu
lugar nesta realidade” (Abric, 1994) apud (Santos 2005); propusemos o trabalho com
esta teoria, considerando a Representação Social, ao mesmo tempo como o produto e o
processo de uma atividade mental pela qual um indivíduo ou um grupo reconstitui o
real, ao qual é confrontado.
Comumente, pela complexidade e multidimensionalidade das representações
sociais, faz-se necessária a adoção de uma abordagem plurimetodológica que leve em
conta a condição multifacetada do objeto de pesquisa inserido no senso comum. O
estudo das representações sociais vai necessitar a utilização de métodos que visem por
um lado levantar e fazer emergir os elementos constitutivos da representação e por outro
lado conhecer a organização interna desses elementos.
Vale ressaltar que a “Teoria das Representações Sociais não privilegia nenhum
método de pesquisa de forma especial” (Farr, 1993) apud Sá (1998 p.80). Para o autor,
este caráter pluri-metodológico, que tem marcado as pesquisas em representações
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5888
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
sociais, deve-se a necessidade imposta pela própria teoria de abarcar o objeto a partir de
diferentes perspectivas.
Neste trabalho, para a apreensão das representações sociais dos (as) professores
(as) sobre a profissão docente em matemática, foi utilizado o instrumento de coleta de
dados “questionário de associação livre”, por “tratar-se de uma técnica maior para
coletar os elementos constitutivos do conteúdo de uma representação” (Abric,1994)
apud Sá (1996).
Este tipo de questionário é considerado um instrumento privilegiado no estudo
das representações sociais. Para Almeida (2005): “a possibilidade de padronização do
instrumento reduz os riscos de uma interpretação equivocada por parte do pesquisador e
evita grandes variações na interpretação das perguntas, já que as questões são
exatamente as mesmas para todos os sujeitos”. Um aspecto a destacar, é que o uso da
associação livre em pesquisas com representações sociais está relacionado, muitas
vezes, aos pesquisadores ligados à Teoria do Núcleo Central, interessados em conhecer
não apenas os conteúdos da representação, mas também sua estrutura ou organização
interna (Sá, 1998). Para isso é preciso um trabalho, por parte do sujeito de reflexão
sobre as associações por ele propostas.
Assim, no processo de coleta de dados com o uso da associação livre, além dos
sujeitos indicarem as seis palavras que à Profissão Professor de Matemática - PPM, os
fizessem lembrar, foi pedido para que efetuassem sobre suas próprias produções um
trabalho cognitivo de análise, de comparação e de hierarquização da importância dos
sentidos por eles atribuídos, que se deu através da indicação das duas palavras
consideradas como mais importantes dentre as palavras associadas à referida expressão.
A utilização da “associação livre” nos permitiu a apreensão das representações
sociais de uma amostra significativa: 508 sujeitos, sendo 362 professores (as) formados
(as) em matemática e 146 formados (as) em diversas áreas do conhecimento: Biologia
(30), Letras (30), Geografia (29), História (29), e Pedagogia (28).
Através da associação livre, procuramos identificar o campo semântico das
representações sobre a profissão docente em matemática, assim como as palavras
candidatas ao Núcleo Central destas representações, ou seja, as palavras apontadas
como mais importantes pelos sujeitos investigados.
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5889
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Na análise dos dados utilizamos o software estatístico denominado Trideux, que
nos permitiu melhor apreender o campo semântico das representações.
As representações compartilhadas entre professores de matemática e professores
não formados nesta área sobre a docência em matemática
Podemos dizer que os professores de matemática compartilharam com os
professores que não são formados nesta área, o destaque sobre a dimensão pessoal como
fator de relevante importância à profissão docente em matemática mediante a palavra
“criatividade”. Segundo Maia e Peixoto (2008) este fato pode ser atribuído à “tentativa
de motivar e despertar o interesse do aluno para a aprendizagem”, como se fizesse parte
do universo imaginário de todos os professores. De forma que “se revelam em uma rede
simbólica positiva que ancora seus discursos sobre o ser professor” (p.12).
A ênfase dada pelos professores de matemática e das outras áreas à vocação
também é discutida em Maia e Peixoto (2008). Estas autoras apontam que a “vocação
parece ser um mito que ancora e subjaz” o imaginário docente, “oferecendo um
significado pessoal ao seu ofício de educador” (idem, p. 15).
Aspectos relacionados à dimensão profissional, por meio da qual se revelou a
palavra “difícil” indica se referir, particularmente, ao exercício da profissão docente em
matemática e não necessariamente, ao plano cognitivo, devido esta representação ter
tido menor freqüência entre os professores não formados nesta área; embora, estes
tenham enfatizado o saber disciplinar, com maior freqüência que os próprios professores
de matemática (em anexo).
Podemos perceber uma aproximação entre a freqüência das palavras “difícil” e
“criativo”, sobretudo, entre os professores de matemática. Entretanto, constatamos que
no consenso das representações dos professores formados ou não em matemática são
destacados aspectos psicopedagógicos com ênfase sobre a palavra “compreensão”. Estes
aspectos são voltados ora para uma dimensão pessoal, ora para uma dimensão cognitiva.
Na dimensão pessoal, percebemos vários aspectos relacionados à cognição e a
destrezas do professor como prático, hábil e ágil. Mas também a aspectos de ordem
interpessoal como “chato”. De forma interessante a representação sobre a chatice do
professor de matemática, foi reconhecida, de forma mais freqüente por os professores
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5890
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
desta área. Enquanto os aspectos cognitivos foram em maior medida, enfatizados por os
professores de outras áreas.
Destacamos os saberes curriculares na ênfase dada às associações planejamento e
avaliação; assim como os saberes didático-pedagógicos na ênfase ao professor visto
como facilitador e os experenciais na ênfase dada à palavra domínio, como elementos
consensuais entre as representações dos dois grupos de professores investigados.
Entretanto, ressaltamos que entre os professores de matemática, os sabres curriculares e
experenciais foram mais enfatizados.
Particularmente, na dimensão social a palavra “fracasso” recebeu maior destaque,
entre os professores de matemática. Segundo Cruz (2006) “às vezes é o próprio
professorado que tem consolidado a idéia de fracasso, atestando que o cenário escolar é
o pano de fundo de uma crise educacional irreversível” (p.42).
A expressão do fracasso associado à profissão professor de matemática, também
pode ser atribuída ao fato que “o ensino da matemática tem reforçado a exclusão e a
reprodução das desigualdades sociais dentro da escola” (Rocha, 2001, p.24).
As representações sociais apenas dos professores de matemática sobre a docência
nesta disciplina
Ressaltamos que no núcleo central destas representações, enfatizaram-se os
saberes didático-pedagógicos, do qual destacamos a tríade “ensino, aluno e mediação”.
Percebemos também, a importância mencionada aos saberes disciplinares e aos
curriculares como o planejamento, o contexto e a conexão, no sentido de uma
articulação do saber matemático com outras áreas do conhecimento.
Percebemos a importância dada à dimensão sócioafetiva pela palavra “realização”
e também pela palavra “paixão”. Como indica Maia e Peixoto (2008) sobre o imaginário
dos professores de matemática, a satisfação pessoal com o dia-a-dia da escola é
raramente mencionada, entretanto, “todos falam da satisfação de encontrarem, depois de
alguns anos, alunos bem sucedidos e que só então demonstram reconhecimento pelas
lições recebidas” (p.12). Quanto à palavra paixão, as autoras indicam que os professores
de matemática referem um vínculo afetivo muito forte com a disciplina, “uma paixão
mesmo”.
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5891
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Com efeito, observamos a ênfase dada à dimensão motivacional sobre a profissão
docente em matemática pelos professores desta área.
A palavra “esperança” em
destaque nas RS destes professores pode ser atribuída ao fato destes se sentirem
“portadores e porta-vozes de um imaginário ancorado em raízes profundas que mantêm
o sonho e a crença nas possibilidades de contribuir para transformar e reinventar a
educação e a sociedade” (Maia e Peixoto, 2008, p. 17).
Especificamente, nas representações dos professores de matemática como
elemento do núcleo central foi enfatizado a “desvalorização” da profissão docente nesta
área, com ênfase sobre o salário. Ou seja, os professores de matemática enfatizaram
mais o salário que os demais grupos investigados. Enquanto, numa perspectiva de
valorização
docente,
observamos
alguns
elementos
relacionados
a
uma
profissionalização da docência em matemática como a formação e a pesquisa.
Podemos observar que a profissionalização/ desprofissionalização da profissão
docente em matemática é referenciada a outros fatores.
No que concerne aos elementos relacionados à profissionalização, ressaltamos
enquanto desenvolvimento profissional do professor, a exemplo, a palavra reflexão.
Elementos desta ordem, segundo Ramalho et (2004) podem fazer do professor não mais
“um técnico que executa os procedimentos vindos de uma ‘racionalidade técnica’ e sim
sujeito construtor da sua profissão” (p.37). Perez (2004) destaca que “é fundamental que
o professor de Matemática acredite no seu potencial, acredite que sua prática é muito
importante
e
que
possui momentos
riquíssimos,
os
quais
merecem
uma
discussão/reflexão coletiva” (p.256).
Outro aspecto, diz respeito ao desenvolvimento pessoal do professor, baseado na
dimensão sócioafetiva em palavras de conotação positiva como interagir e troca, afeto e
humildade.
De outro modo, em uma conotação negativa observamos as palavras
frustração, cansaço, preocupação, carrasco, solidão e sofrer. Cruz (2006) aponta que
“o professor de matemática é visto como uma pessoa anti-social e como um professor
angustiado”; segundo a autora, os próprios docentes se reconhecem em suas
dificuldades de interação, por exemplo, quando dizem: “o professor de matemática é
angustiado...não sabe o que fazer pro aluno aprender, eles não querem nada”(p. 258).
Neste sentido, Correia e Matos (1999) tem enfatizado que embora o
individualismo/isolamento no exercício profissional seja uma das propriedades mais
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5892
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
marcantes da profissão docente, o professor, mais do que alguém que está na escola,
tende hoje a ser definido como alguém que vai à escola.
Para Cunha (1999)
ainda que participe de reuniões, grupos e equipes de trabalho, o professor
reserva sua condição de estar só com seus alunos na sala de aula como uma
possibilidade de exercer a sua autonomia. A possibilidade de se expor em suas
dificuldades e desafios lhe traz insegurança e, ao contrário de outras profissões,
essas situações não o levam ao trabalho coletivo, em que a participação dos
colegas poderia ajudá-lo a encontrar soluções (CUNHA, 1999, p. 140).
Percebemos que os professores de matemática, associaram à profissão docente
nesta área, um enfoque nas palavras tempo e escola; aspectos voltados para o
desenvolvimento organizacional da profissão do professor, lembrando Nóvoa (1992),
“hoje em dia nenhuma inovação pode passar ao lado de uma mudança ao nível das
organizações escolares e do seu funcionamento” (p. 28-29).
Neste sentido, Câmara dos Santos (1997) discute que não é difícil verificar a
maneira como o vocabulário do professor de matemática está impregnado pela palavra
tempo, em expressões do tipo “não deu tempo de ver o último capítulo do livro” (...) ou
ainda, “o tempo é curto para que eu possa me preocupar com inovações pedagógicas”,
em geral como manifestações dentro de um quadro formado por limitações de ordem
institucional (p. 105).
Em especial, ressaltamos que a presença da palavra “extinção”, somente entre as
associações à PPM, pelos professores de matemática, lembra-nos Cunha (1999, p.132)
quando afirma: “se há profissões que se extinguem, é porque há estruturas que
provocam esse resultado, assim como o mesmo se dá quando novos espaços
profissionais se articulam”. A autora discute que no caso da educação, “isso significa
afirmar que os processos de profissionalização do professor respondem a diferentes
forças que, por interesses diversos, poderão reforçá-los ou não” (idem, p.133). O que
pensarmos, então no caso da Matemática?
Para Moura (1995) o campo de atuação do profissional de Educação Matemática
deve ser objeto de pesquisa para os centros de formação deste profissional. E lembra
que embora continuemos a formar professores, “é preciso, no entanto, sabermos onde
estão atuando como educadores. É preciso criar um novo conceito do que venha a ser o
Educador Matemático para daí definirmos como promover a formação adequada para
esse futuro educador” (p. 20).
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5893
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Entendemos que a carência/falta de professores de matemática, à parte a
depauperização e falta de prestígio social do profissional da educação (Moura, 1995),
deve se voltar para o “entendimento sobre o papel do educador matemático” (idem,
p.23). Para o profissional da educação matemática – “aquele que toma o conhecimento
matemático como um projeto humano e procura todos os meios de fazer com que os
seus educandos adquiram este conhecimento através de situações de ensino onde quer
que a Matemática possa estar” (idem, p. 24).
As representações sociais apenas dos professores de outras áreas sobre a docência
em matemática
O que particularmente ressaltamos neste grupo de professores são as RS sobre a
superioridade cognitiva expressa pela palavra “inteligente” e o estereótipo do “medo”
relacionado à profissão professor de matemática.
Consideramos que a dimensão cognitiva, enfatizada entre os professores não
formados em matemática, pode ser atribuída ao ensino de uma matemática “perfeita,
exata e infalível: os teoremas, as fórmulas incontestáveis” (Rocha, 2001, p. 26). Para a
autora, essa ‘magia’ provoca admiração em algumas pessoas, mas assusta e afasta outras
(idem, ibidem).
É neste contexto, que observamos como as RS dos professores que trabalham
com outras áreas do conhecimento enfatizam aspectos sobre a pessoa do professor de
matemática, ora de forma positiva em relação a sua “inteligência”, ora de forma
negativa, a exemplo das palavras intolerância, arrogante e auto-suficiente.
Outro aspecto observado, é que estes professores indicam a palavra inovar,
associada à expressão profissão professor de matemática. Como afirma Pérez (2006),
sobre o professor de matemática, já não basta “conhecer proposições e teorias. É preciso
estudo, trabalho e pesquisa para renovar e, sobretudo, reflexão para não ensinar apenas
“o que” e “como” lhe foi ensinado” (p. 252).
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5894
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Considerações finais
Nas representações dos professores com formação em outras áreas, ou seja,
diferentes de matemática, o caráter cognitivo e sócioafetivo da profissão docente em
matemática foram enfatizados em maior parte por estereótipos sobre a figura do
professor visto como “inteligente” ou sobre o “medo” da matemática. Ao mesmo tempo,
em menor freqüência, observamos a ênfase dada aos saberes didático-pedagógicos e a
função social do ensino.
Sobre esta suposta dissensão entre saberes pedagógicos e específicos, Moura
(2006) em discussão sobre os desafios para o ensino da matemática destaca que estes
devem se constituir, necessariamente “as duas faces de uma mesma moeda”.
Um saber específico é um produto social que sendo relevante torna-se objeto
social, o que resulta em conteúdo escolar: motivo para o ensino, campo próprio
do saber pedagógico. Isso significa assumir um modo de produzir saberes
pedagógicos que proporcionem a apropriação de ferramentas simbólicas
capazes de promover a integração de indivíduos na solução de problemas
coletivos (MOURA, 2006, p. 490).
Acreditamos que as representações sociais dos professores que não são
formados em matemática como parte de reflexões externas a esta área, afirmam a
necessidade de pesquisas sobre uma perspectiva de desenvolvimento profissional do
professor de matemática, sem perder de vista a dimensão pessoal e institucional no
exercício docente deste professor.
Percebemos que os professores de matemática, sentem-se “criticados”, que a
“desvalorização” da profissão do professor de matemática não pode ser vista em termos
gerais, apenas no plano da depauperização do trabalho docente. Concordamos
com
Schaffel (2000) quando afirma que além de construída a partir da convivência entre os
seus pares, admite-se as identidades profissionais dos docentes como contingentes,
pressupondo um processo complexo de relacionamento do grupo profissional com um
conjunto de instâncias sociais.
Neste sentido, esperamos que a relação entre professores de matemática e de
outras áreas do conhecimento possa caminhar em direção ao desenvolvimento de uma
profissionalidade docente.
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5895
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
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Elisângela Bastos de Melo Espíndola
5896
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
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Anexo 1
Campo semântico/ NC das representações compartilhadas entre
professores sobre a profissão professor de matemática
PROFESSORES DE
MATEMÁTICA
palavras
associadas
difícil
criativo
lógica
vocação
compreensão
avaliação
pensar
solução
planejar
prático
exato
chato
hábil
fracasso
Fq
39
36
27
21
20
14
12
11
10
9
9
8
8
7
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
NC
8
12
4
11
5
PROFESSORES NÃO
FORMADOS EM MATEMÁTICA
Fq
10
15
26
6
21
6
7
5
5
8
15
5
8
4
NC
4
4
12
5
5
5897
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
clareza
domínio
ação
alegria
atenção
objetivo
ágil
facilitador
orientar
Total
7
7
6
6
6
6
5
5
4
160
5
4
7
4
12
10
4
6
4
140
Anexo 2
Campo semântico/ NC das representações apenas dos professores de matemática
sobre a profissão professor de matemática
campo semântico
palavras
palavras
associadas
fq
associadas
pesquisa
21 interpretação
crítica
19 seguro
esperança
19 solidão
frustração
16 vivência
interagir
15 entender
mudar
15 operar
aluno
14 sistematização
cansaço
13 análise
contexto
12 busca
reflexão
12 conquista
paixão
11 escola
afeto
10 interdisciplinaridade
humilde
10 racional
tempo
10 sonho
construir
9 técnica
preocupação
9 troca
abstrato
8 admirado
conexão
8 capacitação
curioso
8 cidadania
descobrir
8 organizar
extinção
8 prática
futuro
8 qualidade
transformação
8 social
carrasco
7 sofrer
gratidão
7
humano
7 total
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
NC-palavras consideradas
como mais importantes
palavras
palavras
fq
associadas
fq
associadas
7 ensino
9 problema
7 persistir
9 clareza
7 realização
9 conexão
7 mediar
8 mudar
6 aluno
7 número
6 esperança
7 respeito
6 paixão
7 transformação
5 pesquisa
7 humano
5 contexto
6 interagir
5 desvalorização
6 planejar
5 formação
6 salário
5 gosto
6
5 motivação
6 total
5
5
5
4
4
4
4
4
4
4
4
fq
6
5
5
5
5
5
5
4
4
4
4
93
511
5898
Profissionalidade do Professor de Matemática: um estudo sobre as representações sociais
Anexo 3
Campo semântico/ NC das representações apenas dos professores não formados em matemática
sobre a profissão professor de matemática
campo semântico
palavras
palavras
associadas
fq associadas
trauma
8 inovar
exigir
7 resultado
intolerância
7 confiança
soma
7 detalhe
arrogante
6 determinação
atitude
6 expressão
coragem
6 partilha
experiência
6 ponderar
metódico
6 preciso
tolerância
6 sagaz
auto-suficiente
5 total
dúvida
5
Elisângela Bastos de Melo Espíndola
NC-palavras consideradas
como mais importantes
palavras
fq
associadas
fq
5 inteligente
8
5 medo
7
4 objetivo
6
4 exato
5
4 atenção
4
4 resultado
4
4 total
34
4
4
4
75
5899
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
A COLABORAÇÃO ENTRE PROFESSORAS EM
UM GRUPO DE ESTUDO EM ENSINO DE
MATEMÁTICA: O OLHAR SOBRE O CURRÍCULO,
OS SEUS SABERES E SEUS FAZERES
Francisca Terezinha Oliveira Alves
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
A COLABORAÇÃO ENTRE PROFESSORAS EM UM GRUPO DE ESTUDO
EM ENSINO DE MATEMÁTICA: O OLHAR SOBRE O CURRÍCULO, OS
SEUS SABERES E SEUS FAZERES
Francisca Terezinha Oliveira Alves
RESUMO: O artigo fala do processo de colaboração vivido por professoras que
trabalham com a matemática nos anos iniciais do ensino fundamental, em um grupo de
estudo em ensino de matemática. Tal grupo foi composto por três professoras
colaboradoras e a pesquisadora, que durante um ano e dois meses se dedicaram a
estudar o currículo, os modos de ensinar/aprender matemática, em um processo
constante de colaboração e de olhar a si e o outro. O acompanhamento do movimento
do grupo foi realizado através de um memorial sobre a matemática, de diários das
professoras colaboradoras e da pesquisadora e de uma entrevista coletiva. Os resultados
e achados do grupo apontaram que a colaboração possibilita a mudança de saberes e
fazeres docentes de professores quando se debruçam sobre suas práticas entrelaçadas
por processos de estudar/refletir.
PALAVRAS-CHAVE: Colaboração - Professoras - Matemática.
Este artigo tem a finalidade de apresentar resultados do processo de colaboração
vivido por professoras que ensinam matemática nos anos iniciais do ensino
fundamental. Tal processo de colaboração se deu em um grupo de estudo em ensino de
matemática composto por professoras denominadas pelos nomes de Rubi, Esmeralda e
Jade e a pesquisadora. O grupo teve a duração de um ano e dois meses, período no qual
foram desenvolvidos estudos, vivências de atividades diversas, elaboração de proposta
de trabalho e discussões acerca do ensino e do currículo da matemática nos anos iniciais
do ensino fundamental. Para o acompanhamento do movimento do grupo foram
utilizados o memorial da matemática, o diário e a entrevista coletiva, além de registros e
observações da pesquisadora.
Formar um grupo que tenha a colaboração como essência pressupõe que este
tenha como eixo central, a participação de seus integrantes de forma igualitária e que
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
todos estejam dispostos a colaborar, um com o outro, no sentido de viabilizar o
crescimento do grupo e ao mesmo tempo de cada um. Para que isto possa ocorrer é
preciso que o grupo esteja alicerçado em princípios claros que norteiem a sua
organização. Fiorentini (2004) argumenta que em um grupo colaborativo os integrantes
não são meros auxiliares ou fornecedores de dados e materiais, mas assumem funções
de produção de conhecimento. O autor argumenta também, que um grupo colaborativo
tem sua organização influenciada pela identificação entre os participantes e pela
possibilidade de compartilhamento de problemas, experiências e objetivos comuns.
Fiorentini (2004) faz uma distinção entre o que seja cooperação e colaboração. A
cooperação tem em sua essência o trabalho coletivo, mas não quer dizer que todos os
integrantes desse processo tenham igual participação. Pode haver ajuda entre todos na
realização de tarefas, só que necessariamente essas não são resultantes de ações
negociadas no grupo e também, pode ser que haja posição hierárquica pressupondo
subserviência de participantes.
A colaboração pressupõe que todos trabalhem juntos, que tenha negociação para
atingir objetivos comuns no grupo. Com a colaboração não há hierarquização de
funções e todos são responsáveis pelo caminhar do grupo. É um processo construído por
todos os integrantes do grupo.
Segundo Fullan e Hargreaves (2000) a colaboração é necessária para que se
vença o individualismo que a ação docente tende a ter. De acordo com os autores, locais
em que a colaboração é uma constante, tornam-se ambientes de maior satisfação e
produtividade, além de favorecer um crescimento da pessoa e do profissional. Sendo
assim, na colaboração pressupõe-se que haja interação tal, que os sujeitos tenham voz
ativa para se posicionar e ao mesmo tempo possam escutar o outro. É um processo que
envolve compreensões, concordâncias e discordâncias e, esse foi o sentido que norteou
a organização do grupo e a clara definição das atribuições de cada professora
colaboradora.
No início da constituição do nosso grupo, as atividades de estudo foram
organizadas e propostas por nós (enquanto pesquisadora), uma vez que essa era a
expectativa inicial das professoras da escola, mas aos poucos, cada membro do grupo
foi se tornando participativo no sentido de contribuir com sugestões para estudo e
produção de conhecimento. Às professoras colaboradoras participantes do grupo, coube
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
o papel de atuarem como co-partícipes do processo vivenciando as atividades propostas,
discutindo as possíveis soluções, relacionando com os conhecimentos anteriores,
discordando de pontos de vista expressos pelos autores dos textos estudados, ajudandose mutuamente na realização das atividades, sugerindo leituras e estudos para a
continuidade dos encontros do grupo e também na elaboração de uma proposta para se
trabalhar com os números racionais sob forma fracionária para o 5º ano de escolaridade
do ensino fundamental.
Diante do exposto destacamos que as diferenciações de papéis no grupo não
estavam centradas na ideia de hierarquia e nem tampouco no domínio de conhecimento.
Os papéis vivenciados se inter-relacionavam numa dinamicidade única, essencial para a
manutenção do grupo. Cada participante contribuía para que houvesse a realização dos
encontros. Na sequência do artigo exporemos os momentos de colaboração que
permearam os estudos, as discussões e as reflexões realizadas pelas professoras nos
encontros e expressos nos instrumentos utilizados para o acompanhamento do
movimento do grupo. Para tanto, faremos uso das falas das professoras Rubi, Esmeralda
e Jade, entrelaçadas em tal processo.
A colaboração vivida pela professora Rubi: momentos de trocas no grupo de
estudo
Para falarmos do processo vivido pela professora Rubi no grupo de estudo em
ensino de matemática se faz necessário enfatizarmos que a colaboração entre as três
professoras participantes foi fator decisivo para que este tivesse êxito e se tornasse
importante no processo de reelaboração dos saberes docentes. Compreendemos a
colaboração de acordo com o que propõe Fiorentini (2004), como um processo
construído por todos os integrantes de um grupo. Não é apenas o estar coletivamente no
desenvolvimento de tarefas, mas é um processo em que todos os membros têm voz e
vez; todos se empenham na busca de atingir um objetivo comum. Tendo esse
entendimento para o que seja colaboração passaremos a analisar como se deu esse
processo com a professora Rubi.
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
Em seu diário essa professora destaca que o estar junto no grupo favoreceu uma
aprendizagem que até então não havia experimentado em matemática. Ela assim se
expressou:
O encontro hoje foi muito proveitoso, pois nos fez relembrar de
alguma coisa que já havíamos estudado sobre esse assunto. Só que
hoje vi com novos olhos, de forma prazerosa esses sistemas de
numeração, porque a metodologia usada foi ótima, onde o grupo ia se
ajudando nas descobertas, através das discussões (PROFESSORA
RUBI).
A partir desta fala podemos observar o destaque dado a ajuda entre as
professoras do grupo. Esta ajuda é no sentido de que uma ia colaborando com a outra
em um processo de interação mútuo com a finalidade de vivenciar as atividades
propostas ao grupo e favorecer uma aprendizagem para todas. Sendo assim, podemos
inferir que a colaboração se fez presente na atividade sobre os antigos sistemas de
numeração e possibilitou um reelaborar de saberes disciplinares e também pedagógicos
que a professora Rubi possuía sobre tal temática.
Assim o processo de colaboração tem uma finalidade comum em que todas as
participantes interagem na busca de um crescimento pessoal e também coletivo. O verse como sujeito que colabora com o outro pressupõe a professora Rubi o dispor-se a
compartilhar sentimentos, dúvidas, incertezas, fazeres e saberes que até então eram
guardados só para si. O si já não basta, ele necessita do outro em uma imbricação do
fazer juntos.
Na entrevista coletiva a participação da professora Rubi enfatiza a colaboração
como um dos itens necessários para a reflexão de sua atuação docente. Enquanto
professora e participante de um grupo de estudo em ensino de matemática, ela destaca
este ser essencial para o crescimento profissional das professoras. Vejamos como a
professora Rubi se expressa:
Depois das nossas reflexões compreendi que precisamos dar ao aluno
condições deles formarem seus próprios conceitos. Aprendi com as
atividades dinâmicas e prazerosas e refleti sobre as que eu levava
para a sala de aula para os meus alunos. Além disso, as experiências
trocadas, entre nós professoras, nos fez crescer como profissionais
(PROFESSORA RUBI).
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
A fala da professora nos aponta caminhos que são indicados por ela como
necessários para um crescimento do sujeito professor como profissional da educação.
Estes caminhos são a colaboração (através das trocas de experiências) e a reflexão sobre
o que estudava e selecionava para trabalhar em suas aulas.
A colaboração apontada por ela através das trocas de experiências é uma
possibilidade de crescimento pessoal e profissional dos professores extremamente
discutida hoje em dia. A esse respeito Fontana (2000) destaca que é uma relação
extremamente conflituosa partilhar o saber e experiências com o outro. Para isto
acontecer é preciso um ambiente propício e de confiança com quem se vai compartilhar.
A confiança é necessária para que possamos trocar experiências, acertos e desacertos de
nosso trabalho docente. Ela é primordial para que não nos enfraqueçamos enquanto
sujeitos isolados em um mundo de trabalho competitivo em que é tão difícil aproximarse para estender a mão, apoiar, dividir, incentivar, ouvir, ser incentivado, escutado e
ajudado pelo outro.
Ao compartilhar o sujeito se dá a conhecer ao outro, mostra-se como é e para
que assim proceda é necessário acreditar que seus pares estão dispostos a fazer o
mesmo. Em nosso grupo de estudo esta relação foi possível em virtude de que nos
considerávamos em posição de aprendizes.
O partilhar entre si e os outros: A professora Esmeralda e o processo de
colaboração
O grupo de estudo em ensino de matemática foi um local que serviu para
observarmos a efetivação entre as suas integrantes e dentre estas a professora
Esmeralda, como alguém que se dispõe a colaborar com o outro. Neste grupo pudemos
ver emergir momentos diversos de partilhar de saberes e fazeres oriundos de atividades
de sala de aula e muitas vezes de questões mais amplas como da escola como um todo e
também de aspectos da vida pessoal, demonstrando assim o grau de interação entre
todas.
Em seu memorial da matemática, a professora Esmeralda deixa transparecer o
processo de colaboração que foi vivenciado por ela em momentos anteriores a sua
entrada no grupo de estudo. São momentos revestidos por um olhar que busca no
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
passado memórias e fragmentos de vivências com a matemática, seja como aluna, seja
como profissional. Tais vivências trazem a tona episódios de uma formação escolar que
encontrou na matemática uma aliada para a vida toda.
Esta relação com a matemática, segundo a professora, é resultante de um gostar
que não tem razão aparente, mas que a nosso ver influenciou o seu futuro profissional
tão envolvido com um ensino comprometido com esta área de conhecimento. Nas falas
da professora, transcritas de seu memorial, observamos o quanto é latente a sua
interação com a matemática e que ela se propõe a compartilhar com outros as suas
descobertas. Vejamos uma de suas falas: “Em Metodologia da Matemática é que a
professora nos fez compreender que ‘ia’ e porque ‘ia’. Foi uma descoberta maravilhosa
que dividi com filhos e alunos”. Dividir, compartilhar e colaborar são ações que a
professora Esmeralda vivenciou desde a sua formação inicial. Momentos de descobertas
em que ela fez questão de socializar com os outros em seu desejo de partilhar saberes e
olhares que ia construindo sobre o currículo e a matemática.
A colaboração é retratada pela professora Esmeralda em seu diário com relatos
que expressam todo o seu envolvimento com a matemática e com as colegas de grupo
de estudo. Em seu diário ela cita momentos em que o estar junto e partilhar com o outro
é revestido de significados que proporcionam um aprender juntos, tão necessário para
alguém que acredita que se pode aprender e isto é expresso em seus escritos. Vejamos
um deles: “Foram muitas descobertas, desafios que conseguíamos vencer juntos e vibrar
ao fazê-los, imaginando como poderíamos fazer com os nossos alunos”. As descobertas
e os desafios vencidos juntos refletem a colaboração que as participantes demonstram
no convívio do grupo e a professora Esmeralda expressa tão bem através de seus relatos.
Nas falas da professora Esmeralda vemos surgir fragmentos deste ser que se constitui a
todo o momento e que busca sempre a aprendizagem. Assim se expressa a professora:
Quando iniciamos o estudo das frações, percebi que ainda tenho
muito o que aprender, tanto para poder trabalhar com os meus alunos
como para meu próprio conhecimento, pois já está longe a época em
que tive contato com esse assunto. (PROFESSORA ESMERALDA).
Aprender para si, aprender para ensinar. Ensino que busca um caminho
favorável à aprendizagem dos alunos. Esta é a tônica da ação da professora Esmeralda:
uma busca constante de se constituir como um ser aprendente. Em sua fala percebemos
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
o desejo latente de se declarar incompleta, uma incompletude que não é proposital, mas
que possibilita momentos de ganhos à sua formação pessoal e profissional. É uma
tomada de consciência de que a sua formação é sempre incompleta e não está
terminando, conforme afirma Alarcão (2001).
A professora, em outro momento de seu diário, destaca decisões que o grupo
tomou como possibilidade de melhoria das aulas. Tal decisão se referia a análise do
livro didático de matemática utilizado por elas com os alunos. A análise se referia em
observar se o mesmo trazia as diversas ideias significativas das operações fundamentais
na parte a que se referia a este conteúdo. Neste relato ela deixa claro como o processo
de colaboração entre as participantes possibilitou a tomada de decisão para análise do
livro. Ela assim se expressa: “No próximo encontro, decidimos analisar o nosso livro
didático para detectar se o autor aborda as ideias das operações, as quais acabamos de
estudar”. Este relato nos indica o quanto à decisão tomada em conjunto é fruto de um
processo de colaboração e negociação entre as participantes.
A colaboração entre todas não pode ser vista como consenso absoluto, mas como
um processo que após discussões (e eram muitas) chegávamos a uma possibilidade de
concretização do que gostaríamos de alcançar em nosso grupo de estudo, pois era do
confronto de ideias que muitas vezes surgiam atividades a serem desenvolvidas.
No diário da professora Esmeralda outro relato também nos chamou a atenção
para a questão da cooperação e partilha de momentos significativos no grupo de estudo.
É um relato sobre o texto do livro “Aritmetruques” (JULIUS, 2002) em que o autor
propõe vivências de situações com truques para operar com números. A professora
assim se expressou: “Ficamos entusiasmados em aplicá-los em nossas aulas, pois nós
mesmos nos divertimos muito resolvendo os problemas propostos”. Neste relato
encontramos o entusiasmo de quem é capaz de se encantar e vibrar com descobertas
cotidianas que podem trazer contribuições para o seu fazer docente. São momentos em
que a professora se debruça a aprender em contato com algo novo, se despe de qualquer
pudor pedagógico e se dispõe a brincar e viver experiências enriquecedoras juntamente
com as suas companheiras de vivências.
Este estar junto no grupo de estudo em ensino de matemática é também
favorecido pela vontade que a professora Esmeralda tem de aprender uma matemática
que possibilite aos seus alunos o aprender desta área de conhecimento. Tal vontade é
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
expressa em um de seus relatos do diário, onde ela se coloca com convicção de se ver
como professora que ensina matemática e tem a preocupação de proporcionar aos seus
alunos “[…] um melhor aproveitamento do que é trabalhado na escola em sua vida fora
dela, desmanchando aquela ideia de que o que se aprende na vida é desmanchado na
escola”.
A aprendizagem do aluno para a vida é uma preocupação da professora e não
apenas que sejam momentos passageiros e que ficam esquecidos nos cadernos da vida e
nas carteiras escolares. Ela, enquanto professora que ensina matemática procura vê-la
como uma área que contribui para que o aluno tenha um conhecimento maior e possa
fazer uso deste em sua vida fora dos muros escolares.
Tal olhar da professora expressa um desejo latente de que o currículo para a
matemática seja possibilitador de aprendizagens significativas para os alunos e neste
sentido ela traz à tona a discussão sobre saber escolar e o saber do senso comum, uma
discussão já tão realizada em que a escola é vista como vilã por não ter condições de
aproveitar os saberes prévios dos alunos e fazer uma transposição para os escolares.
Neste processo de busca para favorecer a aprendizagem de seus alunos, a professora
Esmeralda encontra em suas colegas de grupo o suporte para discussão de ideias,
angústias, dúvidas metodológicas e perspectivas de atuação. É a cooperação entre estas
professoras que favorece uma incessante procura de caminhos para o fazer docente.
A professora Esmeralda durante a entrevista coletiva expressa, em sua fala, que a
colaboração é um dos fatores que favorece a troca entre todas. Vejamos o que a
professora diz:
O contato com as colegas, a troca de angústias, dúvidas e conquistas;
o acesso a novas leituras, sugestão de atividades (antes nós as
fazemos para só então passarmos para os nossos alunos), existência
de momentos como este para refletir, analisar e reformular nossa
prática de sala de aula (PROFESSORA ESMERALDA).
A partir desta fala da professora podemos analisar que o seu envolvimento no
grupo é total, ela se dedica a partilhar “angústias, dúvidas e conquistas” com suas
colegas, mas ao mesmo tempo se dispõe a escutar as outras também em suas
particularidades. É um momento de troca compartilhada por todas, em que predomina o
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
desejo de falar de si e deixar que o outro lhe veja. Ainda nesta fala, a professora faz
referência a reflexão da prática e consequente reformulação. Ela se propõe a analisar a
sua prática no coletivo do grupo em um processo de colaboração com suas colegas. O
que diz, o que se dispõe, o que propõe, expõe o seu fazer docente, que é permeado por
ações de reflexão sobre como proceder para possibilitar um quefazer matemático
considerando seus alunos como sujeitos aprendentes da matemática. Uma matemática
que, no dizer da professora, pode ser usada fora da escola.
As falas da professora Esmeralda são expressões que deixam emergir o seu
perceber do grupo: um espaço em que pode falar de si, contar suas angústias e suas
dúvidas por que na escuta estão colegas de profissão que vivenciam as angústias e
dúvidas parecidas. São momentos que pode se expor sem receios, mas com a convicção
de que o outro entende o que está falando, que pode lhe trazer ajuda em suas aflições.
Tais falas sugerem indícios de aspectos da formação em que a colaboração com
o outro tem papel decisivo. Ela necessita partilhar para se sentir completa em seu ser
professora e para isto se faz presente no grupo como é, com todas as suas dúvidas,
angústias, fazeres e saberes. E assim, ela aprende e ganha profissionalmente, contribui
com o outro e se faz professora em um processo mútuo de interações do ser que forma e
se forma. São os olhares sobre o currículo, a matemática, a colaboração, a formação e o
ser professora.
Os saberes que se entrelaçam: a professora Jade, a colaboração e a troca no grupo
de estudo
O grupo de estudo em ensino de matemática nos proporcionou entendermos que
a colaboração é um processo primordial para que professores percebam a sua prática
como um campo fértil de produção de saberes. Através da colaboração é possível que
professores socializem experiências, estudem coletivamente e vivenciem momentos de
trocas e ajudas mútuas. É neste processo que o crescimento pessoal e profissional é
favorecido pelas ações desenvolvidas coletivamente.
Sobre o papel da colaboração na vida dos professores, Fullan e Hargreaves
(2000) discutem que ainda há muita dificuldade em se favorecer nos espaços escolares o
processo de colaboração, em virtude de prevalecer a “cultura do individualismo” que é
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
favorecida pela própria organização do espaço escolar. Os autores comentam também
que há pequenos espaços de colaboração sendo construídos, mas é preciso se considerar
aspectos como a disposição para dar e receber ajuda e o receio de expor-se em suas
fraquezas e necessidades. Para estes autores a colaboração traz benefícios à profissão e
o trabalho no âmbito escolar. Neste sentido é importante trazer a tona uma discussão a
respeito da colaboração no grupo de estudo na perspectiva que a professora Jade atribui
a sua participação neste processo.
Sendo assim, discutir a colaboração tendo como elemento direcionador as falas e
os relatos da professora, evidenciado pelos diversos instrumentos da pesquisa, é trazer
um posicionamento de que o “estar junto” é primordial para a sua aprendizagem
enquanto sujeito que participa e interage com outros sujeitos em um locus de produção
de saberes como se constituiu o grupo de estudo em ensino de matemática. Em suas
falas e relatos, a professora Jade se mostra como uma pessoa que se dispõe a aprender
na e com a interação com o outro. Vejamos um relato de seu em que expressa a sua
relação com a matemática em um processo de interação com seus professores que lhe
possibilitaram as tristezas e desencontros nos contatos iniciais com esta área e,
principalmente, a sua emoção de descobrir-se aprendendo matemática, de forma alegre
e prazerosa, quando foi cursar Pedagogia:
Quando fui cursar Pedagogia […] é que percebi de que nada sabia e
somente descobri (compreendi) […] quando paguei Metodologia da
Matemática e Didática da Matemática. […] a professora trabalhava
com material concreto, me fez realmente aprender […].
(PROFESSORA JADE).
Deste relato podemos destacar que o processo de colaboração da professora Jade
se deu com os conteúdos matemáticos e o tratamento didático dispensado por seus
professores no curso de Pedagogia. Dessa interação decorreu o gosto e a vontade da
professora em ser uma profissional disposta a atuar de forma a favorecer uma melhor
aprendizagem aos seus alunos. São momentos em que a formação inicial de um sujeito
contribui para um fazer docente que considere os aspectos da colaboração como
importante neste processo.
O diário da professora Jade traz relatos de momentos vivenciados no grupo de
estudo, bem como reflexões, inferências e posicionamentos acerca dos estudos e
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
atividades desenvolvidas ao longo dos encontros. Ela abordou questões que nos servem
de apoio para analisarmos a sua participação como também o seu crescimento pessoal e
profissional possibilitado pelo trabalho de interação e colaboração do qual vivenciou.
Sendo assim, os relatos transcritos a seguir servem para ilustrar tais momentos, mas
também para pensarmos a respeito dos saberes que foram sendo reelaborados pela
professora.
O grupo de estudo e ensino em matemática teve em sua essência a participação
voluntária das professoras e assim sendo o caráter de colaboração esteve presente todo o
tempo nas diversas falas e relatos das professoras. Um dos relatos da professora Jade
contido em seu diário aborda tal questão:
No encontro de hoje definimos o calendário do 1º semestre,
trabalhamos com a 5ª atividade que foi um resumo das discussões do
último encontro contendo sugestões de abordagens das operações
fundamentais, gerando novas perspectivas na forma de ensinar
matemática. Ficou sugerido para o próximo encontro trazer o nosso
livro didático para observação dos problemas propostos e também
propor atividades baseadas nos tópicos propostos (PROFESSORA
JADE).
Tal relato da professora Jade aborda o seu envolvimento no grupo como alguém
que participa das decisões que são tomadas no coletivo. As decisões são resultantes de
momentos pensados juntos, onde cada uma se posiciona para se chegar ao consenso
momentâneo do que se projeta a ser feito nos encontros posteriores. São negociações
realizadas a partir das discussões, divergências e acordos gestados no grupo. São
momentos em que não “[…] se imagina que a negociação acabe com as divergências. O
que se pretende é a acomodação delas em patamares que permitam a convivência e a
realização relativa de interesses específicos” (DEMO, 1999, p. 76). Ao chegarmos a um
determinado acordo no grupo não quer dizer que antes não havia tido divergências, ao
contrário, muitas vezes tal decisão era precedida de muitas discussões.
Outro ponto a destacar com relação ao relato da professora diz respeito aos
saberes que eram permeados no grupo. Ao ser abordado elementos de um fazer
matemático, estes poderiam proporcionar outras possibilidades de se tratar os conteúdos
matemáticos, gerando talvez futuras reelaborações dos saberes experienciais da
professora (GAUTHIER et al, 1999). São possibilidades de ação docente vistas sob um
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
novo olhar. O olhar de quem busca um fazer diferente tendo como parâmetro as novas
informações construídas no grupo.
Em outro relato do diário, a professora Jade aborda reflexões sobre os algoritmos
das operações trazendo indagações de modos de fazê-los. Vejamos o que ela relata:
Retomamos a 5ª atividade do grupo na apostila do encontro passado.
Partimos dos algoritmos com variadas formas de operacionalizar as
adições com diferentes agrupamentos, subtrações, multiplicações e
divisões. Levantei o questionamento do por que não fazíamos divisão
como às outras operações, isto é, da unidade para dezena […],
discutimos, tentamos, fizemos e concluí que é mais complicado para
ensinar aos alunos (PROFESSORA JADE).
Mais uma vez neste relato encontramos o caráter da colaboração permeando as
ações no grupo. Ao discutirmos um questionamento levantado pela professora Jade
surgem as inquietações pessoais acerca de um conteúdo matemático que geralmente
causa dúvidas no modo mais apropriado para abordá-lo com os alunos, como é o caso
da divisão com números naturais, que é geralmente trabalhado nos anos iniciais, mas o
professor ainda tem dificuldades em trazer uma abordagem, que auxilie da melhor
maneira possível, a aprendizagem dos alunos.
A professora Jade encontrou espaço no grupo de estudo para expor uma dúvida
sua e ao fazê-lo deixou se mostrar em uma fragilidade que não é só dela, mas também
de outras pessoas que trabalham com a matemática nos anos iniciais e que possuem uma
formação generalista (no caso em Pedagogia). O domínio conceitual e procedimental
por parte do professor é necessário para um fazer docente que possibilite um aprender
dos alunos com compreensão e neste caso o grupo de estudo em ensino de matemática
abordou em diversos momentos, caminhos e alternativas metodológicas para tal fazer
docente.
No relato transcrito a seguir também percebemos que a colaboração foi uma
prática constante no grupo de estudo. O relato da professora Jade aborda questões
referentes a uma oficina trabalhada com os alunos em sala de aula e que nós a ajudamos
na análise do desempenho dos alunos. Ela fez o seguinte relato:
Nosso estudo começou com a análise dos dados com nossos alunos
em sala de aula. Percebemos diferentes maneiras de pensar dos
alunos e discutimos as várias respostas dadas por eles durante a
Francisca Terezinha Oliveira Alves
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A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
execução da oficina 1 (precisamos fazer anotações!). Definimos a
montagem da proposta com a justificativa, objetivos, atividades
propostas a serem desenvolvidas, as formas de avaliação e o
cronograma previsto (PROFESSORA JADE).
Este relato aborda um dos momentos de trabalho do grupo em que estávamos
montando uma proposta sobre números racionais a ser desenvolvida com os alunos. A
proposta teve início a partir dos estudos teórico-metodológicos efetivados pelo grupo. A
elaboração da proposta se concretizou como uma ação coletiva em que a colaboração
foi a essência do trabalho. Sendo assim, é possível inferirmos que ao pensarmos
coletivamente sobre uma questão que nos inquieta como era o caso de ensino dos
racionais sob a forma fracionária, há a possibilidade de juntos construirmos um
encaminhamento a ser usado com os alunos. Uma ação destas se constitui como um
meio de reflexão da prática docente em que se analisam e se elaboram saberes a serem
efetivados nesta mesma prática. Sendo assim, podemos inferir também, que a reflexão
no coletivo viabilizada por ações colaborativas é um caminho possível de construção e
reelaboração de saberes docentes.
Na entrevista coletiva também destacamos falas da professora Jade em que ela
aborda a colaboração como fator decisivo para a ação docente. Nestes relatos ela traz a
sua percepção do grupo se constituindo como um espaço de veiculação de informações,
elaboração e reelaboração de saberes e, principalmente, um local em que se pensa a
prática, se discute alternativas e se busca e encontra caminhos. Ela apresenta em um dos
relatos momentos de reflexão que diz: “Quero enfatizar o clima de prazer […] visto que
esse prazer de estarmos juntos influi consideravelmente na aprendizagem”. Neste relato
é abordado que o “estar junto” é fator que influi no processo de aprendizagem das
participantes. Neste sentido o “estar junto” pressupõe que estejam em processo de
colaboração para que possam alcançar objetivos comuns.
Em outra fala da entrevista, a professora Jade, se expressa com respeito a uma
discussão sobre as contribuições do grupo de estudo para o seu trabalho em sala de aula:
Creio que eu deveria ter aproveitado mais os conhecimentos e
sugestões apresentados nos encontros. Todavia, utilizei sim vários
recursos e informações como o material e procedimentos para
trabalhar o sistema de numeração decimal; usei a tabuada de dupla
entrada na multiplicação, os aritmetruques para facilitar a
Francisca Terezinha Oliveira Alves
5915
A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
compreensão e operacionalização das operações fundamentais e
outras coisas mais (PROFESSORA JADE).
Percebemos nesta fala da professora o quanto é exigente consigo mesma.
Acredita que não fez o uso adequado de todos os conhecimentos construídos no grupo,
mas ressalta várias atividades que vivenciou com seus alunos, demonstrando que
acredita nas aquisições que fez com seus estudos. Ela aborda em um momento que não
utilizou de todo o conhecimento, mas essa não era a finalidade máxima do grupo e sim,
que a partir dos estudos e discussões permeadas por um processo de colaboração, as
professoras pudessem refletir sobre o seu fazer docente, pensar sobre o currículo e o
ensino de matemática nos anos iniciais e reelaborar os seus saberes mediatizados por
todo o processo vivenciado no grupo.
Considerações finais
No transcorrer do texto fomos expondo diversos momentos e situações
retratadas pelas falas das professoras em que o processo de colaboração vivido no grupo
estava explícito. Tais falas apontadas nos dados fornecidos pelo memorial, diário e a
entrevista coletiva nos conduzem a afirmar que o grupo favoreceu um processo de
colaboração que auxiliou as professoras na reelaboração de seus saberes e fazeres
docentes, o modo de olhar o currículo e o ensino de matemática. A colaboração se
constitui assim, como uma possibilidade de mudança para um outro fazer docente das
professoras. Acreditamos que os estudos do grupo deram um embasamento teórico às
professoras para perceberem o processo de aprendizagem dos alunos com um novo
olhar. A respeito disso a professora Jade expressa: “O trabalho com frações na
perspectiva que estamos abordando é muito útil e facilita a aprendizagem dos alunos. É
como se fluísse, se fosse fácil para eles entenderem”.
O grupo de estudo, ao ser constituído por professoras que trabalham com
matemática nos anos iniciais do ensino fundamental, teve em sua essência a discussão
de temáticas relevantes para tal segmento de escolaridade e assim buscou desenvolver
em seus encontros estudos que podiam contemplar os conteúdos necessários à prática
docente das professoras. A propósito de tal afirmação a professora Esmeralda fez o
seguinte comentário: “Já tive grandes progressos em minhas aulas, pois consigo
Francisca Terezinha Oliveira Alves
5916
A Colaboração entre Professoras em um Grupo de Estudo em Ensino de Matemática: o olhar sobre o currículo, os
seus saberes e seus fazeres
organizar atividades a partir do que estudamos aqui”. Na mesma perspectiva, a
professora Jade afirma: “Tenho refletido muito sobre o modo como ensino e apresento
os conteúdos nas minhas aulas. E esta reflexão é fruto do grupo de estudo. No pessoal,
tenho aprendido e crescido muito”. Estas afirmações nos foram indicando que o grupo
de estudo se consolidou como um grupo que contribuiu para um refletir e reelaborar da
prática docente.
Assim, a cada encontro, privilegiava-se contemplar o estar junto na procura de
um caminho que favorecesse, a partir do aporte teórico abordado, refletir sobre a prática
docente. Uma reflexão que como coloca Freire (2006) se constrói com o outro, em que
ambos aprendem em comunhão. Nesse processo dinâmico de refletir, estudar e refletir é
que o grupo se constituiu como um grupo de estudo em ensino de matemática.
Referências
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dividir sem calculadora. Campinas: Papirus, 2002.
Francisca Terezinha Oliveira Alves
5917
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
REFLEXÕES ACERCA DO CURRÍCULO E
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA SOB UM ENFOQUE
HISTÓRICO, SOCIAL E CULTURAL NA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Francisca Vandilma Costa
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
REFLEXÕES ACERCA DO CURRÍCULO E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA SOB
UM ENFOQUE HISTÓRICO, SOCIAL E CULTURAL NA FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
Prof. Ms. Francisca Vandilma Costa1
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo principal promover uma análise
reflexiva sobre Currículo e Educação Matemática sob um enfoque histórico, social e
cultural na formação de Professores. Desse modo, apresenta-se um breve aspecto
histórico de Currículo e discute-se a relação de Currículo e Educação Matemática. Isto,
por temos a plena convicção da importância da Educação Matemática como favorável
ao campo de estudo e pesquisa aos cursos acadêmicos da profissionalização docente de
professores. Para tanto, promove-se um diálogo entre alguns princípios epistemológicos
sociais e culturais relacionados a algumas concepções teóricas da matemática, a fim de
discutir currículo articulado a Educação Matemática junto a questões históricas, sociais
e culturais. Estudam-se as verdades, as falhas e os modelos matemáticos com seus
paradigmas. Interroga-se o que é a Matemática, onde ela está presente, que filosofia e
quais as concepções que estão ao seu redor, quais matemáticos se faz presente nela, ou
ainda que mundo a contemple, que homem e qual a sociedade que se quer formar.
Assim, para respondê-las tais questionamentos é preciso compreender que em qualquer
fundamentação Matemática vão existir correntes filosóficas defendidas por estudiosos
matemáticos.
PALAVRAS-CHAVE: Currículo. Formação de Professores. Educação Matemática.
1-INTRODUÇÃO
Este artigo é o produto de um estudo dentro do Programa de Pós-Graduação em
Educação no Núcleo de estudos e Pesquisas em Educação e Docência na unidade de
Educação matemática abordado no seminário “Matemática como instituição social”. O
objetivo principal é promover uma análise reflexiva sobre Currículo e Educação
1
Aluna Especial do Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande
do Norte - UFRN. Professora da Rede Municipal do Ensino Fundamental de Mossoró, Estado do Rio
Grande do Norte. Professora formadora do Instituto Superior de Educação Presidente Kennedy – IFESP RN.
Francisca Vandilma Costa
5921
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
Matemática sob um enfoque histórico, social e cultural na formação de Professores.
Assim, ele é a concretização de resultados de estudos gerados através das discussões e
debates em sala de aula após estudos em grupos ou individuais e leituras de várias
teorias e diversas práticas de natureza do conhecimento e sócio cultural da Matemática.
Para tanto, elegemos como objetivos centrais:

Promover uma análise reflexiva sobre Currículo e Educação Matemática sob um
enfoque histórico, social e cultural na formação de Professores;
 Dialogar princípios epistemológicos sociais e culturais relacionados a teorias
fundamentais da matemática apresentamos o campo da Educação Matemática como
favorável ao campo de estudo e pesquisa à formação de professores.
Assim, a fim de atender os objetivos acima citados, estaremos desenhando o
texto sob um olhar atento às abordagens e incorporando questões significativas em
seminários sob enfoque socioculturais que, a nosso ver, são significativas e necessárias
à construção de uma (re) leitura e um (re) significado de pautas como:
 História e formação de professores;
 Currículo e Educação Matemática.
Desse modo, a partir desse instante, primeiramente, apresentaremos cada uma destas
questões fazendo breves enfoques históricos, sociais e culturais, e depois faremos
algumas considerações relevantes que advogamos como emergentes
2 – BREVE ENFOQUE HISTÓRICO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Frigotto (2001, p. 59), comenta que a “década de 80, mesmo no contexto de
intensas transformações de natureza conservadora no cenário político e econômicosocial internacional uma década de fortalecimento dos processos constitutivos da
cidadania e democracia ativas”. É nesse cenário, que ressurgem debates e movimentos
de políticas educacionais em prol de uma reformulação dos cursos de formação de
professores no Brasil. Para a ANFOPE– Associação Nacional pela Formação dos
Profissionais da Educação (1990), dois eventos que marcaram o surgimento do
movimento dos educadores pela reformulação dos sistemas de formação de professores
Francisca Vandilma Costa
5922
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
foram o I Seminários Brasileiro de Educação realizado no UNICAMP em 1978 e a I
CBE – Conferência Brasileira de Educação realizada na PUC de São Paulo em 1980.
Na atualidade, a garantia da formação e carreira dos profissionais da educação
brasileira é respaldada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) –
9.394/96 que foi sancionada em 20/12/1996 e pelos Referências para formação de
professores de 1999. Porém, poderemos indagar se essas leis e referências garantem na
realidade as instituições formadoras serem capazes de construir um novo perfil
profissional de professor para o mundo atual. Tal mundo analisado por Brzezinski
(1997, p. 142) como dois mundos, um de sistema oficial e outro vivido, em que define:
“Este mundo é aquele construído na luta dos educadores desde 1980 para modificar as
práticas autoritárias brasileiras de formar profissionais da educação e de determinar
critérios para a definição da barreira de magistério”.
É o perfil de um profissional em educação, em que os Referenciais para
Formação de Professores (1999) situa pontuando que: “É certo que há uma enorme
distância entre o perfil do professor que a realidade atual exige e o perfil de professor
que a realidade até agora criou”. Assim, tal circunstância exige um grande investimento
na formação profissional. Sabe-se que uma educação de qualidade não se conquista
apenas com formação de professores, até porque como o próprio documento assegura “a
formação de professores é um requisito fundamental para as transformações que se
fazem necessárias na educação. Mas é apenas um dos requisitos” (BRASIL, 1999).
Entendemos que muitas são as novas exigências na formação de professores, que
vão além da capacitação e de treinamentos para chegar às respostas de questões
emergentes da atualidade. Neste ponto concordamos com Imbérnon (2000, p. 40) ao
reforçar que, a “formação deve dotar o professor de instrumentos intelectuais que sejam
úteis ao conhecimento e à interpretação das situações complexas que por outro lado,
envolvam os professores em tarefas de formação”.
Sobre a formação inicial, elegemos as falas de Ramalho e Nuñez (1997, p. 54)
ao enfatizarem que a “formação inicial tem uma instância extraordinária, no sentido de
poder antecipar e contribuir no desenvolvimento de uma evolução global da
profissionalização”. Isto, porque para os autores “existe hoje quase um consenso em que
às necessidades atuais e perspectivas da sociedade podem ser satisfeitos se formando
um profissional de perfil amplo” (RAMALHO e NUÑEZ, 1997, p. 54).
Francisca Vandilma Costa
5923
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
Quando a discussão remete para a formação continuada o questionamento é mais
complexo. Isso se deve pelo fato do professor já estar em pleno exercício da sua
docência, mas ele não precisa apenas saber ensinar e usar técnicas. Ele precisa ir além
dos seus saberes e das suas competências. Competência que para Rios (2002, p. 169)
não se pode ser listada, acreditando que: “Na verdade, o conceito de competência vai se
construindo a partir mesmo da práxis’”. Perrenoud (2000) nos fala que “as
competências profissionais só podem, na verdade, ser construídas graças a uma prática
reflexiva e na qual haja participação que se assegure desde o ínicio dos seus estudos”.
No ponto de vista de Ramalho, Nuñez e Gauthier (2004, pg. 70), o termo competência é
compreendidos por eles como uma capacidade manifestada na ação, para fazer com
saber, com consciência, responsabilidade, ética que ofereça chance de resolver com
eficácia e eficiência situações-problemas da profissão.
Por fim, temos a visão que falar de formação, quer seja inicial ou continuada,
requer que o professor se volte para uma prática reflexiva, tornando-se propenso para
tomar decisões frente a toda demanda das complexidades da atual sociedade, abertos
(re) descobertas de novas competências e de novas habilidades, em busca de atingir
novos saberes docentes.
3-CURRÍCULO E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Currículo como são afirmadas por Lopes e Macedo (2005, p. 13), suas primeiras
preocupações datam dos anos de 1920. Daí até a década de 1980, o campo curricular foi
marcado pela transferência instrumental de teorizações americanas. Essas transferências
que, segundo os autores, são centradas na assimilação de modelos para a elaboração
curricular em viés funcionalista, foram viabilizadas por acordos bilaterais entre o
governo brasileiro e norte-americano. Para os mesmos autores, no início dos anos 1990,
os estudos curriculares assumem um enfoque sociológico, contrapondo a primazia do
pensamento psicológico. Há superação de estudos de discussão de currículo no aspecto
administrativo-científico.
Para Lopes e Macedo (2005), o campo curricular é capaz de influenciar
propostas curriculares oficiais e práticas pedagógicas nas escolas, por meio de diferentes
Francisca Vandilma Costa
5924
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
processos de (re) contextualização de seus discursos. Daí considerarem ser um campo
intelectual, cujas produções configuram-se em um capital social.
Assim, esse relato histórico nos faz compreender e concordar com Sacristán
(1998, p. 122) ao enfatizar que o pensamento pedagógico em torno do currículo é muito
heterogêneo e disperso, podendo se encontrar inclusive posições que desprezem a
análise e decisões sobre os conteúdos, pretendendo unicamente proporcionar esquemas
de como organizá-los e manejá-los por parte dos/as professores/as.
Moreira, Alves e Garcia (2006, p. 61) ao falarem sobre o campo do currículo no
Brasil nos anos noventa, dizem que a maioria dos especialistas considera que este
campo desfruta hoje de visibilidade e prestígio crescentes. Isso, para os autores, deve-se
tanto às recentes discussões sobre políticas oficiais de currículo, como ao
desenvolvimento de pesquisas e de uma produção teórica significativa, que atualmente
aborda novos temas e reflete novas influências.
Nessa discussão de currículo não podemos deixar de realçar o valor dado ao
currículo na Educação e nas escolas de formação de professores de matemática, fazendo
que os futuros professores compreendam que “o currículo não é elemento inocente e
neutro de transformação desinteressada do conhecimento social” (MOREIRA e SILVA,
1995, p. 7-8). Segundo os autores, o currículo está implicado em relações de poder, ele
transmite visões sociais particulares e interessadas e produz identidades individuais e
sociais particulares. D’Ambrosio (2002, p. 63) tem essa mesma visão ao mencionar que
ao longo da história, o currículo é organizado como reflexo das prioridades nacionais e
internacionais e do interesse dos grupos que estão no poder. Com isso, o currículo deixa
de ser apenas uma área meramente técnica voltada para questões relativamente técnicas,
procedimentos e métodos. Logo, já se pode falar em uma tradição crítica de currículo,
guiada por questões políticas, epistemológicas e sociológicas.
Outra questão do discurso do currículo, que acrescentaremos é o papel
representativo de currículo educacional frente à sociedade. Por exemplo, na sociedade
capitalista a escola é colocada como uma instância social da transmissão, assimilação e
produção do conhecimento e tem a função de manter a hegemonia das camadas
dominantes (CARDOSO, 2007, p. 8). Assim, nesse caso, o currículo é moldado
meramente em ser em narração de conteúdos. Para Freire (1998), conduz à
memorização mecânica do conteúdo, ou seja, a educação bancária, cujo educador é
Francisca Vandilma Costa
5925
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
aquele que aliena, nega a educação e o conhecimento como processos de busca. O
currículo toma vários modelos e com vários enfoques e paradigmas que segundo
Habernas (apud Cardoso, 2007, p. 14) apresenta alguns paradigmas serviram de modelo
de currículo dos anos 1970: paradigma técnico-linear; paradigma curricular-consensual;
e o paradigma dinâmico-dialógico.
Hoje se fala da existência de um currículo oculto, Sacristán (1998, p. 131), ao
comentar sobre este tipo de currículo situa que, ao lado do currículo que se diz estar
desenvolvendo, expressando ideais e intenções, existem outro que funciona
subterraneamente, que se denomina oculto. Podemos dizer que os currículos ocultos
provêm dos estudos sociais e políticos dos conteúdos e das experiências escolares.
Concepção mais recente de currículo é a discussão sobre conhecimentos em
rede, esta ganhou destaque nos estudos em currículo a partir da metade da década de
1990. Segundo Cardoso (2007), essa abordagem de currículo apresenta como eixo
central a dialética-prática/teoria/prática, que nos remete a uma nova opção: a de buscar
novas relações metodológicas.
Para discutir currículo articulado a Educação Matemática junto a questões
históricas, sociais e culturais se faz necessário estamos debatendo as verdades, as falhas
e os modelos matemáticos como também quebras de paradigmas sobre cada um desses
itens citados. Mas, entendemos que requer também está se interrogando sobre o que é a
Matemática, onde ela está presente, que filosofia e quais as concepções que estão ao seu
redor, quais matemáticos se faz presente nela, ou ainda que mundo a contemple, que
homem e qual a sociedade que se quer formar.
Assim, para respondê-las tais questionamentos é preciso compreender que em
qualquer fundamentação Matemática vão existir correntes filosóficas defendidas por
estudiosos matemáticos como Bertrand Russel, David Hilbert e L.E. J Brouwer. Cada
um deles representando sua escola filosófica como: o platonismo com seu logismo,
formalismo e o construtivismo ou intuicionismo. Logo, elas muito vêem corroborar em
estudos e compreensão dessa ciência principalmente no campo da Educação
Matemática.
É nesse contexto que queremos está situando a Matemática na busca de um
currículo articulado com as ciências culturais, até porque concordamos com Davis e
Hersh(1989) quando diz que “não há cultura, por mais primitiva que seja que não
Francisca Vandilma Costa
5926
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
demonstre possuir uma espécie rudimentar de matemática”. Desse modo, as atividades
matemáticas historicamente se fazem presente ao longo de tempos nas culturas do povo
do oriente ao povo do ocidente, passando por civilizações gregas, chineses, hindus e
inca-astecas e outras. Daí, os mesmos autores afirmarem que “hoje em dia não há
praticamente um único país no mundo que não crie matemática nova. Até mesmo os
chamados países em vias de desenvolvimento procuram estabelecer programas
atualizados de matemática universitária...” (DAVIS; HERSH, 1989, p. 28).
Cremos que a escola precisa urgentemente incluir um currículo de matemática
que não se preocupe só com demonstrações e conhecimento com verdades absolutas, já
que hoje se é admissível se falar, por exemplo, outras geometrias, não mais só na
geometria euclidiana. Essa geometria, definida como a ciência construída com régua e
compasso, não é única. E a escola esta vendo também que existe o quinto postulado de
Euclides, ponto máximo de descoberta e revolução na matemática social e cultural na
história da matemática. Isso leva a concordamos com Davis e Hersh(1989, p.193), ao
afirmarem que “a geometria não euclidiana representa um dos maiores avanços da
matemática e é o ponto de viragem na história das idéias”. Logo, essa postura nova de
fazer matemática é que precisa se articular com o pensar e o fazer de definir-se currículo
nos cursos de formação de professores, a fim de quebrar certos paradigmas no universo
acadêmico.
Como exemplo do que estamos afirmando queremos acrescentar o que pensa
Santos (2004, p.163) sobre as mudanças ocorridas na matemática provocado em um
certo período na história da reconstrução da geometria, ao assegurar com convicção,
que a reconstrução da geometria fez parte de grandes mudanças na matemática e na
ciência que tiveram inicio na década de 1820 com três matemáticos como Gauss, Boyai
e Lobachewsky. Isso pro eles terem criados independentemente outras formas de
produção matemática, e consequentemente, provocado uma revolução na geometria.
Culturalmente o conceito que a grande maioria das pessoas, como pais e
professores e demais profissionais do campo escolar tem a Matemática no currículo
escolar é a como o componente curricular mais importante. Para Bishop (1988, p. 17)
sem dúvida, os educadores, os pais e a sociedade tecnológica moderna em geral
consideram que a Matemática é uma das disciplinas mais importante do currículo
escolar, estando ela apenas seguida da língua materna de um país. Isto faz criar um
Francisca Vandilma Costa
5927
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
rótulo que privilegia essa ciência. Sobre essa nossa observação acrescentaremos a
posição dada por Stenhouse apud Bishop (1988, p. 22) ao situar que “a cultura consiste
em um complexo de compreensão compartilhada que atua como meio pelas quais se
inter-relacionam para comunicar se entre si”. Para esse mesmo autor cabe a Educação
Matemática está desmistificando idéias centrais como essas e outras que assombram o
caminho na construção de um currículo modelando para essa nova sociedade da
tecnologia e da informática.
Para tanto, o currículo que idealizamos é que ele esteja voltado para o contexto
cultural até por que segundo Wilder(1998, p. 6 ) que olhar para a matemática como um
elemento cultural, não é nenhuma novidade. Já que para o autor os antropólogos bem
antes já tenham feito tal proposta mais pelo motivo de seus restritos conhecimentos
matemáticos se resumiram o contexto cultural se restringiu apenas em notas de
aritméticas em certas culturas primitivas.
Isso até por que Para Wilder(1998) “enquanto corpo de conhecimento, a
matemática não é algo que eu sei que tu sabes, ou que algum indivíduo sabe: é parte da
nossa cultura, da nossa posse coletiva”.
Historicamente, sabemos que o ensino de matemática no Brasil teve seu
currículo escolar devidamente marcado por uma pedagogia nos bancos escolares,
memorístico e descontextualizado do presente, voltado puramente para a cientificidade
nos moldes linear e cartesiano. Isso se dava desde as séries iniciais e perdurava até a
academia nos cursos de formação de professores ao longo dos anos.
Muitos foram os movimentos reivindicatórios na luta por um ensino e,
conseqüentemente, um currículo mais flexível e menos elitista. Tais movimentos
iniciaram-se, com o movimento da Escola Nova no final do século XIX e ínicio do
século XX, cujo idealizador maior era o educador e filósofo americano John Dewey
(1859-1992).
Nos anos de 1960 a 1970, o ensino de Matemática no Brasil e em outros países
passa a sofrer fortes influências de um movimento que fica conhecido como a
“Matemática Moderna”. O ensino dessa Matemática era puramente formalístico com
supervalorização da teoria dos conjuntos e do livro-didático. Porém, por não conseguir
atender a um currículo ativo, nas décadas seguintes esse movimento da Matemática
Moderna é fracassado.
Francisca Vandilma Costa
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Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
Desse modo, surgem novos movimentos de reorientação curricular no Brasil e
no mundo. Assim, foi nos anos de 1980 que educadores, matemáticos, filósofos e
pesquisadores da Educação, todos preocupados com o uso de um currículo universal da
Matemática, reunidos em conferências e congressos nacionais e internacionais, fazem
sugestões e apontam saídas alternativas para o ensino da Matemática. Eles vêem que é
preciso abordar um ensino de Matemática crítico que possibilitasse mudanças no modo
de professores da área compreender que ela é uma construção do homem com
significados e valores, que vão além dos sociais, antropológicos, afetivos, cognitivos e
lingüísticos.
4- CONCLUSÃO
Compreendemos que na busca da sua identidade e profissionalização docente,
acredita-se que a formação do professor deve basear-se em estabelecer estratégias de
pensamento, de percepção, de estímulos e centrar-se na tomada de decisão para
processar, sistematizar e comunicar a informação (IMBERNÓN, 2000, p. 41). Nesse
sentido o professor deverá intervir de maneira intencional nas atividades a serem
realizadas pelas crianças, que para Zabala (1998, p. 29) por trás de qualquer intervenção
pedagógica, consciente se escondem uma análise sociológica e uma tomada de posição
que sempre é ideológica.
No tocante à Educação Matemática e às suas atuais tendências, deverá o
professor de Matemática tomar decisões para com o uso de um currículo mais aberto na
sua prática diária e saberes docentes no contexto das inovações curriculares. Assim,
através deles chegar as suas competências, seus saberes e a sua reflexão - critica
consciente de sua docência profissional. A nossa intenção não foi trazer idéias prontas
para a construção desse texto do que representa a formação do professor e as tendências
da Educação Matemática na atualidade, para o ensino-aprendizagem da Matemática,
mas de trazer um conjunto de reflexões nossas e dos técnicos dos dois campos, de modo
a entendermos que “os futuros professores e professoras também devem estar
preparados para entender as transformações que vão surgindo nos diferentes campos e
para ser receptivos e abertos a concepções pluralistas, capazes de adquirir suas atuações
as necessidades dos alunos e alunas em cada época e contexto”. (IMBERNÓN, 2000, p.
61).
Francisca Vandilma Costa
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Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
de Professores
Nesse sentido, cremos o conhecimento matemático é algo para ser difundido
universalmente de forma crítica, política e sem interesse de dominação ou de exclusão.
É ainda a estratégia mais importante para levar o indivíduo a estar em paz consigo
mesmo e com seu entorno social, cultural e natural a se localizar numa realidade
cósmica (D’Ambrosio, 2000, p. 87).
Na maioria das vezes, a falta de um currículo reflexivo recai ainda nos ombros
dos/as professores/as de Matemática. Isso por ser o componente que, por décadas e mais
décadas, eletiza e discrimina crianças, adolescentes e adultos/as no acesso ao seu saber.
Daí, ser o nosso artigo intitulado “currículo e educação matemática sob um enfoque
histórico, social e cultural na formação de professores”, é preciso criar na academias,
principalmente nas licenciaturas formação de professores, um novo currículo de
Matemática, tendo um olhar atento a tudo que está implícito e explícito ao redor da
comunidade escolar. Portanto, o nosso desafio foi provocar a compreensão da a
construção de uma Matemática dos programas curriculares que possa ganhar vida no
social, no cultural e no histórico. Assim, a expectativa é que se construa a e oportunizem
novas formas se fazer Matemática.
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Francisca Vandilma Costa
5931
Reflexões acerca do Currículo e Educação Matemática sob um Enfoque Histórico, Social e Cultural na Formação
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Francisca Vandilma Costa
5932
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
OBJETOS DE APRENDIZAGEM E O ENSINO DE
MATEMÁTICA: UMA NOVA PRÁTICA DE ENSINO
E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA APRENDIZAGEM
DE CONCEITOS DE PROBABILIDADE
José Jefferson Aguiar dos Santos
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
OBJETOS DE APRENDIZAGEM E O ENSINO DE MATEMÁTICA: UMA
NOVA PRÁTICA DE ENSINO E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA
APRENDIZAGEM DE CONCEITOS DE PROBABILIDADE
José Jefferson Aguiar dos Santos1
RESUMO: Neste trabalho mostramos como o uso dessas tecnologias pode contribuir,
de forma significativa, no processo de ensino e aprendizagem, e para isso, abordamos
como Objetos de Aprendizagem (OA) podem auxiliar no ensino de conceitos de
probabilidade. O uso dessas tecnologias permite ao professor interpretar, refletir e criar
processos de ensino inovadores, numa prática produtiva e dinâmica, e de reinventar o
ato de educar. Os Objetos de Aprendizagem são definidos explorando sua característica
interacionista e são feitas relações com a Teoria da Aprendizagem Significativa. O OA
proposto visa aproximar a tecnologia ao ensino, favorecendo ao usuário a aquisição de
conhecimentos, competências e habilidades sobre o conceito de probabilidade, tornando
a aprendizagem mais dinâmica e atraente.
PALAVRAS-CHAVE: Tecnologia da Informação e Comunicação. Objetos de
Aprendizagem. Aprendizagem Significativa. Probabilidades.
Introdução
Dentro do contexto da revolução tecnológica ocorrida nos últimos vinte anos, o
ensino não poderia ficar de fora. As livrarias e bancas de revistas costumam dedicar
prateleiras à divulgação de produtos multimídias. As Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs) deram um novo suporte ao ato de ensinar e aprender. Elas estão
cada vez mais presentes no cotidiano de alunos e professores. Mas e na escola? E
principalmente no ensino da matemática?
Apesar desse avanço nas tecnologias da informação e dacomunicação
continuamos a presenciar em nossas escolas que aprender e ensinar matemática não é
1
Mestrando em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela UEPB. Professor da rede Estadual de
Ensino da Paraíba.
José Jefferson Aguiar dos Santos
5936
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
tarefa fácil e muitos são os medos, as queixas, das dificuldades para enfrentar o desafio
de ensinar bem e aprender apreendendo os conceitos matemáticos.
Assim muitos são os processos de ensino e de aprendizagem, mas é preciso
considerar três variáveis fundamentais e as necessárias relações que se estabelecem
entre elas: aluno, professor e conhecimento matemático. Neste texto apresentaremos não
só a relação de professor e aluno, mas uma interface a mais, os objetos de aprendizagem
como mediadores de um saber de forma lúdica, crítica e criativa. Devemos pensar no
conhecimento matemático como ciência viva, aberta à incorporação de novos
conhecimentos de forma que o aluno possa aprender apreendendo e generalizando os
conhecimentos apreendidos.
Nessa perspectiva muitos são os obstáculos envolvidos na construção dos
conceitos matemáticos para que se possa compreender como acontece sua aprendizagem
pelos alunos. Os obstáculos não estão presentes somente na dificuldade, complexidade
de aprender os conteúdos, mas são determinados também pelas características
cognitivas, sociais e culturais de quem aprende e pelas formas como são ensinados. A
matemática ela está na vida de todos nós, no entanto é ensinada como algo abstrato que
não existe, que ninguém vivencia no seu cotidiano.
A contextualização dos conhecimentos ajuda os alunos a torná-los mais
significativos estabelecendo relações com suas vivências cotidianas e atribuindo-lhes
sentido.
No entanto é preciso novas formas e novas interfaces para mediar esse ensinar e
aprender.
Nessa perspectiva as TICs podem contribuir garantindo simulações que possam
observar regularidades, generalizar e transferir tais conhecimentos a outros contextos,
pois um conhecimento só torna-se pleno quando pode ser aplicado em situações
diferentes daquelas que lhe deram origem.
O estabelecimento de conexões é fundamental para que os alunos compreendam
os conteúdos matemáticos e contribui para o desenvolvimento da capacidade de resolver
problemas.
A falta de comunicação nas aulas de Matemática é muito grande e a interação é
quase inexistente. Nesse processo parco de aprendizagem, todos os conceitos de
probabilidade são apresentados de forma bem tradicional. Por isso, temos a teoria da
José Jefferson Aguiar dos Santos
5937
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
aprendizagem significativa como um dos principais suportes teóricos para a ferramenta
tecnológica que estamos utilizando, visando à necessidade de construir um elo entre os
conceitos de probabilidade que são abordados em sala de aula e o mundo real do aluno
sob a forma virtual. Portanto, temos neste trabalho o objetivo de investigar a utilização
de Objetos de Aprendizagem no processo de ensino de conceitos de probabilidade.
As Tecnologias da Informação e Comunicação como suporte à Aprendizagem
As sociedades contemporâneas têm grandes desafios a enfrentar pelo fato do
conhecimento ter se tornado o centro dos processos de transformação social,
conseqüentemente, a educação assume, neste contexto, um importante papel
para além da reprodução e promoção social. Aliada as tecnologias à educação
tenta enfrentar estes desafios quando utiliza alternativas importantes para o
processo de reflexão e (re) leituras das diferentes formas de conhecimento
que são disseminados pelas novas tecnologias da informação (TIC) como são
chamadas. (PEREIRA E MOITA, 2007, p. 86)
Diante do cenário atual escolar brasileiro, os educadores necessitam cada vez
mais de alternativas pedagógicas que auxiliem o processo de ensino e aprendizagem. A
informática e o computador podem ser recursos altamente eficientes para a melhoria
desse processo.
As Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) deram um novo suporte
ao ato de ensinar e aprender. Elas estão cada vez mais presentes no cotidiano de alunos
e professores.
A sociedade vem sendo atingida por uma quantidade enorme de transformações
provocadas pelo desenvolvimento de tecnologias. Essas transformações chegaram
também na escola, e esta por sua vez, viu-se na necessidade de adequar-se e introduzir
em suas atividades pedagógicas algumas dessas ferramentas para proporcionar novas
formas de trabalho para o professor.
O uso do computador na Educação objetiva a integração deste no processo de
aprendizagem dos conceitos curriculares em todas as modalidades e níveis de ensino,
podendo desempenhar papel de facilitador entre o aluno e a construção do seu
conhecimento. Ele enfatiza a necessidade de os docentes estarem preparados para
realizar atividades computadorizadas com seus alunos (VALENTE, 1999).
José Jefferson Aguiar dos Santos
5938
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
O setor educativo precisa explorar e construir conhecimentos segundo as
necessidades de seu desenvolvimento numa articulação em que a unidade escolar
assume o papel de mobilizadora de transformações e o professor, o papel de promotor
da aprendizagem.
O professor é o principal ator de qualquer processo de escolha ou introdução de
inovações tecnológicas na escola. Para que haja mudanças na qualidade do seu trabalho
docente, é necessário que possa refletir e entender as suas escolhas pedagógicas, a
importância que dá aos diferentes componentes curriculares para, então, analisar de que
modo as diversas tecnológicas poderão auxiliá-lo no processo de ensino-aprendizagem.
(VALENTE, 1999).
No Ensino da Matemática, torna-se evidente que ao usar o computador, seja com
uma simples apresentação de slides ou algo mais complexo como softwares
matemáticos, os alunos retêm forma mais concreta o conhecimento.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática trazem em seu texto
indicações de como e para quais finalidades o computador pode ser usado nas aulas de
Matemática:

Como fonte de informação;

Como auxiliar no processo de construção do conhecimento;

Como meio de desenvolver formas de pensar, refletir e criar soluções;

Como ferramenta para determinadas atividades.
[...] [O computador] pode ser um grande aliado do desenvolvimento
cognitivo dos alunos, principalmente na medida em que possibilita o
desenvolvimento de um trabalho que se adapta a distintos ritmos de
aprendizagem e permite que o aluno aprenda com seus erros.
Por outro lado, o bom uso que se possa fazer do computador na sala de
aula também depende da escolha de softwares, em função dos objetivos que
se pretende atingir e da concepção de conhecimento e de aprendizagem que
orienta o processo. (PCN MATEMÁTICA, 1998, p. 44)
Nessa perspectiva utilizamos Objetos de Aprendizagem (OA), investigando seu
uso no processo de ensino e aprendizagem de probabilidade.
José Jefferson Aguiar dos Santos
5939
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
Teoria da Aprendizagem Significativa de Ausubel
Para este estudo adotamos o modelo pedagógico da aprendizagem significativa
de David Ausubel (2003), por ser um modelo que possui uma excelente adaptação ao
contexto da aprendizagem em Ambientes Virtuais, donde ressaltamos alguns pontos:
1- Um corpo de conhecimento é muito mais fácil de compreender e lembrar, se for
relacionável as idéias preexistentes na estrutura cognitiva do aluno, a “Aprendizagem
Significativa” (AUSUBEL, 2003), facilita a aprendizagem e motiva o aluno.
2- A teoria de Ausubel oferece um sistema de referência de aprendizagem que não
necessita alterar substancialmente o atual modelo de ensino e a aprendizagem.
3- Proposta de aprendizagem centrada no aluno, uma característica que torna a teoria
“ausubeliana” favorável para ser utilizada em Ambientes Virtuais de Aprendizagem.
4- As melhores estratégias de ensino são as que permitem a alteração, tanto por parte do
professor quanto por parte do aluno, do tempo de Aprendizagem.
A teoria da Aprendizagem de Ausubel (AUSUBEL, 2003) entre outros aspectos,
tenta compreender o modo como o ser humano constrói significados e, por conseguinte
aponta caminhos para a elaboração de estratégias de ensino que facilitem uma
aprendizagem significativa. Essa perspectiva significa entender a aprendizagem como
um processo de modificação do conhecimento e reconhecer a importância que os
processos mentais têm nesse desenvolvimento. As idéias dessa teoria também se
caracterizam por basearem-se em uma reflexão específica sobre a aprendizagem escolar
e o ensino, em vez de tentar somente generalizar e transferir à aprendizagem escolar
conceitos ou princípios explicativos extraídos de outras situações ou contextos de
aprendizagem.
Quanto mais se relaciona o novo material de maneira substancial e não-arbitrária
algum aspecto da estrutura cognitiva prévia que lhe for relevante, mais próximo se está
da aprendizagem significativa. Quanto menos se estabelece esse tipo de relação, mais
próximo se está da aprendizagem mecânica ou repetitiva. (COLL, 2008, p. 232).
Ainda segundo Coll (2008) a aprendizagem significativa, como um processo
central, implica a interação entre a estrutura cognitiva prévia do aluno e o material ou
conteúdo de aprendizagem.
José Jefferson Aguiar dos Santos
5940
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
Entendemos que a importância da estrutura cognitiva, prévia e a sua
conscientização pelo ensino evidencia o que talvez seja a afirmação mais conhecida
entre as formulações de Ausubel: “o fator mais importante que influi na aprendizagem é
aquilo que o aluno já sabe. Descubram o que é e o ensinem em seqüência” (AUSUBEL,
NOVAK E HANESIAN, 1983, p. 6).
O professor pode promover a aprendizagem significativa, com o uso do
computador, em um enfoque construcionista e, nesse caso, ele deve identificar a Zona
de Desenvolvimento Proximal (ZDP) de cada aluno. Nessa abordagem, cabe ao
professor promover a aprendizagem do aluno para que esse possa contribuir o
conhecimento em um ambiente que o desafie e o motive para a exploração, a reflexão, a
depuração de idéias e a descoberta. Ao mesmo tempo, o professor realiza uma reflexão
sobre a própria prática (PAPERT, 1994).
Objetos de Aprendizagem
Neste estudo enfocamos a utilização de Objetos de Aprendizagem nas aulas de
Matemática para resolver problemas sobre o conceito de probabilidade.
Para tanto, no que se refere a Objetos de Aprendizagem, iremos nos apoiar nos
textos de Wiley (2001).
A Tecnologia é um agente de mudança, e as principais inovações tecnológicas
podem resultar em todos os paradigmas. A rede de computadores conhecida como
Internet é um exemplo dessa tal inovação. Depois que afetam grandes mudanças na
forma como as pessoas se comunicam e fazem negócios, a Internet está pronta para
trazer uma mudança paradigmática na forma como as pessoas aprendem. Por
conseguinte, uma mudança importante também pode ser proveniente da forma que os
materiais educativos são concebidos, desenvolvidos e entregues às pessoas que desejam
aprender. Um exemplo dessa instrução tecnológica são os Objetos de Aprendizagem
(WILEY, 2001).
Mas, o que são Objetos de Aprendizagem? Não se tem um conceito muito bem
estabelecido sobre Objetos de Aprendizagem. Sua definição possui várias versões. Não
há um consenso universalmente aceito sobre sua definição.
Sá Filho e Machado (2003, p. 3-4) definem Objetos de Aprendizagem como:
José Jefferson Aguiar dos Santos
5941
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
recursos digitais que podem ser usados, reutilizados e combinados com
outros objetos para formar um ambiente de aprendizado rico e flexível. [...]
podem ser usados como recursos simples ou combinados para formar uma
unidade de instrução maior.
Para Wiley (2001, p. ) um Objeto de Aprendizagem é “qualquer recurso digital
que pode ser reutilizado para suporte ao ensino”.
Para fins deste estudo, o conceito de Objetos de Aprendizagem que
mencionamos se aproxima do de Wiley, como sendo recursos digitais utilizados como
apoio a aprendizagem. São ferramentas que têm a possibilidade de serem reutilizadas
inúmeras vezes, em diferentes contextos de aprendizagem, e que podem ser
disponibilizados concomitantemente para um grupo diversificado de pessoas.
O OA proposto para esta pesquisa versará sobre o tema de probabilidade e será
elaborado com o intuito de promover uma aproximação entre o cotidiano representado
por uma tela virtual e a aprendizagem na sala de aula.
Seguindo o pensamento de Wiley (2001), para que o Objeto que será elaborado
seja considerado um Objeto de Aprendizagem e possam ser inseridos em um
determinado ambiente de aprendizagem, precisa apresentar as seguintes características:
a) Reusabilidade: reutilizável diversas vezes em diversos ambientes de
aprendizagem;
b) Adaptabilidade: adaptável a qualquer ambiente de ensino;
c) Granularidade: conteúdo em pedaços, para facilitar sua reusabilidade;
d) Acessibilidade: acessível facilmente via Internet para ser usado em diversos
locais;
e) Durabilidade: possibilidade de continuar a ser usado, independente da
mudança de tecnologia;
f) Interoperabilidade: habilidade de operar através de uma variedade de
hardware, sistemas operacionais e browsers, intercâmbio efetivo entre
diferentes sistemas.
Possuindo essas características os Objetos são normalmente armazenados em
grandes bases de dados disponíveis na Internet, chamados repositórios. No Brasil,
podemos citar o Programa RIVED (Red Internacional Virtual de Educación) que é um
José Jefferson Aguiar dos Santos
5942
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
projeto de cooperação internacional entre países da América Latina, em que atualmente
trabalham em conjunto Brasil, Peru e Venezuela. Esse programa, no Brasil, é
desenvolvido pelo Ministério da Educação, pela Secretaria de Educação a Distância
(SEED), em parceria com a Secretaria de Ensino Médio Tecnológico (SEMTEC). É
uma iniciativa para criação de material didático digital para potencializar o processo de
ensino das ciências da natureza e da matemática no ensino médio.
Além da parte digital e tecnológica, o OA também possui característica didáticopedagógica, pois está direcionado a uma parte, ou um conjunto de partes de
determinado conteúdo.
Os OAs podem ser criados em qualquer mídia ou formato, podendo ser uma
simples animação ou uma apresentação de slides feitos no PowerPoint ou complexos
como uma simulação feita em flash. O que se defende é que ele tenha uma intenção
educacional definida.
Nesse âmbito, o conceito de material pedagógico tradicional tem dado lugar a
uma nova concepção desses materiais, que é digital e interativa, e na sociedade em que
vivemos atualmente, temos os Objetos de Aprendizagem como modelo ideal de material
educacional que possui essa nova concepção.
Característica interacionista do OA
A interação é uma das qualidades próprias que deve ser identificada num Objeto
de Aprendizagem. Ao utilizar Objetos de Aprendizagem os alunos permanecem em
plena comunicação, fazendo com que o OA promova uma interação e interação entre
eles. Essa interação pode se dá através da resolução de problemas, análise de
representações gráficas de possibilidades, simulações e participação ativa no próprio
ambiente onde os Objetos estiverem localizados.
Vygotsky (1987, 1989) enfatiza que é na interação entre as pessoas que se
constrói o conhecimento. A interação está entre as pessoas e é neste espaço hipotético
que acontecem as transformações e se estabelece o que consideramos fundamental neste
processo: as ações partilhadas, onde a construção do conhecimento se dá de forma
conjunta. O importante é perceber que tanto o papel do professor como o do aluno são
olhados não como momentos de ações isoladas, mas como momentos convergentes
José Jefferson Aguiar dos Santos
5943
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
entre si, e que todo o desencadear de discussões e de trocas colabora para que se
alcancem os objetivos traçados.
Neste processo de interação, cada indivíduo tem uma participação no processo
de aprendizagem. Para Lévy (2001), o coletivo terá sempre um destaque maior na
gestão do conhecimento.
A inteligência ou a cognição são o resultado de redes complexas onde
interagem um grande número de atores humanos, biológicos e técnicos. Não
sou “eu” que sou inteligente, mas “eu” com o grupo humano do qual sou
membro, com minha língua, com toda uma herança de métodos e tecnologias
intelectuais. [...] Fora da coletividade, desprovido de tecnologias intelectuais,
“eu” não pensaria. O pretenso sujeito inteligente nada mais é que um dos
micro atores de uma ecologia cognitiva que o engloba e restringe. (LÉVY,
2001, p. 135)
Deve-se lembrar que, quando se fala em interação usuário-máquina, ou seja,
aluno-computador, não se deve dar ênfase maior nem para a máquina nem para o
usuário.
A interatividade é uma das principais características que dão suporte às ações e
reflexões sobre os Objetos de Aprendizagem.
Neste aspecto de Ensino Interacionista de Aprendizagem tem-se o aluno como
centro, já o professor assume o papel de mediador do processo de Ensino e
Aprendizagem e o erro do aluno perde o caráter de punição e passa a ser visto como
parte integrante do processo e o meio pelo qual o professor pode verificar como o aluno
está compreendendo os conceitos estudados. Fazendo a análise do erro o professor passa
a entender até que ponto seu aluno aprendeu a matéria, a assim, possa re-planejar suas
aulas de modo a torná-las mais dinâmicas.
A mediação pedagógica consiste no tratamento dos conteúdos e das formas de
expressão dos diferentes temas, a fim de tornar possível o ato educativo, dentro do
horizonte de uma educação concebida como participação, criatividade, expressividade e
relacionalidade. Nesse caso, não interessa apenas transmitir uma informação, mas
também uma informação mediada pedagogicamente. (GUTIERREZ e PRIETO, 1994).
A idéia é que o professor atue como mediador na construção do conhecimento,
propondo atividades que permitam aos alunos a realização de dois tipos de ações: o
José Jefferson Aguiar dos Santos
5944
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
contato com o mundo oriental e, ao mesmo tempo, com o mundo real, levando-os a
trabalharem do concreto ao virtual e vice-versa.
Isso quer dizer que, ao mesmo tempo em que o aluno explora o OA no
computador, realiza atividades complementares ao comparar informações e organizar
idéias. O aluno faz isso a partir do que está sendo mediado pelo professor e tendo o
computador como centro motivador.
Erroneamente, algumas pessoas acreditam que o ensino só acontece quando o
professor faz uso de materiais concretos e/ou TICs. Se for considerado o uso isolado
dessas ferramentas no processo de ensino, nem os materiais concretos nem as TICs,
sozinhos são determinantes de uma postura tradicional ou construtivista, e sim, o modo
de uso que damos a esses recursos ao conduzir uma determinada aula.
Caminhos Metodológicos a Serem Traçados
Uma investigação pode colaborar para extrair conclusões que sejam de crucial
importância para educação ou para sociedade. Seguindo este aspecto a metodologia
usada nesta pesquisa será baseada nos estudos sobre pesquisa qualitativa (BOGDAN E
BIKLEN, 1994; ANDRÉ E LUDKE, 1986; BAUER E GASKELL, 2000) aprofundando
os estudos com a observação participante que consiste de um estudo centrado numa
organização particular ou em algum aspecto particular dessa organização (BOGDAN E
BIKLEN, 1994).
Entendemos que para esse estudo a pesquisa qualitativa é a mais apropriada
porque será dada mais ênfase ao processo que o produto e é mais adequada para inquirir
realidades que não podem ser quantificadas, como por exemplo, significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes (MINAYO, 1999).
Não será rejeitada a contribuição de dados quantitativos, uma vez que serão
usados como complementos para se chegar à compreensão da realidade estudada.
Dentre as modalidades de pesquisa qualitativa, escolhemos o Estudo de Caso,
que consiste na observação minudenciada de um contexto, ou indivíduo de uma única
fonte de documentos ou de um acontecimento específico (MERRIAN, 1998 apud
BOGDAN E BIKLEN, 1994).
José Jefferson Aguiar dos Santos
5945
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
Trabalharemos com 10 alunos de uma turma de 3º série do Ensino Médio, de
ambos os sexos, na faixa etária de 15 a 20 anos da Escola Estadual de Ensino Infantil,
Fundamental e Médio Presidente João Pessoa no Município de Umbuzeiro no interior
da Paraíba. Os 10 alunos serão divididos em duplas aleatoriamente ou por escolha deles
para usarem essas tecnologias.
Para recolha de dados, além das observações, será entregue uma folha de
relatório para que o aluno descreva as estratégias e caminhos utilizados para resolver os
problemas que serão gerados pelo OA. No momento da aplicação do OA será feita
também uma filmagem.
Usaremos essas filmagens para apreendermos de forma mais clara possível
como os alunos se comportarão no momento do uso do recurso tecnológico que será
utilizado. Usaremos a videografia porque ela oferece alguns passos para a análise dos
registros de vídeos das atividades humanas, como por exemplo: assistir, fazer índice de
eventos, relacionar com o problema da pesquisa, transcrição literal dos itens
selecionados, categorização densa e apresentação de resultados com exemplos (MEIRA,
1994).
Para completar a as observações não será descartada a utilização de um diário de
campo que vise registrar idéias, estratégias, reflexões e palpites. “Isto são as notas de
campo: o relato escrito daquilo que o investigador, ouve, vê, experiencia e pensa no
decurso da recolha [...] este termo refere-se coletivamente a todos os dados de um
estudo qualitativo.” (BOGDAN E BIKLEN, 1994, p. 150)
A pesquisa consistirá em três etapas.
Antes de apresentar as etapas deve ser lembrado que estas etapas deverão ser
seguidas após a turma selecionada ter visto o assunto de probabilidades, pois para esta
pesquisa, supõe-se que os alunos já tenham visto em seu conteúdo programático este
conteúdo.
1ª Etapa: O pré-teste
Será feito um questionário com perguntas fechadas e abertas sobre
probabilidades com o intuito de fazermos um levantamento dos conhecimentos prévios
dos alunos.
José Jefferson Aguiar dos Santos
5946
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
2ª Etapa: Aplicação do AO
Neste momento utilizaremos o OA “Probabilidade no Jogo de Bolas de Gude”
com a finalidade de promover uma interação entre Professor/Computador/Aluno,
acicatando os alunos a se comunicarem, tornar a aprendizagem mais significativa e, por
conseguinte, chegar a uma melhoria na Resolução de Problemas nas aulas de
Matemática, em especial no conceito de probabilidade.
Antes, portanto, deve-se abrir um parêntese para mostrar como se dará o
processo de elaboração do OA.
Primeiramente selecionamos o tema Probabilidade para ser trabalhado no OA.
Depois da escolha do tema, escrevemos o Design Pedagógico, um documento que serve
como parâmetro para a construção do OA. Seguiremos um modelo pré-determinado
pelo RIVED, onde enunciaremos os objetivos, habilidades e que atividades estariam
sendo contempladas, além de uma série de outros itens, como tempo de execução,
público alvo, roteiro de execução, atividades complementares com ou sem auxílio do
computador, mapas conceitual, de cenário e de navegação e por fim a construção de um
Guia para o Professor.
A seguir mostramos duas telas informacionais, pois como foi dito anteriormente,
o OA ainda encontra-se em fase de construção.
Fig. 01: Tela Inicial do OA.
José Jefferson Aguiar dos Santos
5947
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
Fig. 02: Tela interativa com modelo de jogo e personagens
3ª Etapa: O pós-teste
Na terceira e última etapa será feito outro questionário, diferente do primeiro,
mas com questões de mesmo teor de dificuldade, para fazermos outro levantamento
sendo agora sobre os conhecimentos adquiridos pelos alunos depois de resolverem
problemas matemáticos ao usar o OA.
Considerações Finais
Objetos de Aprendizagem é uma tecnologia recente que desponta no processo de
ensino e aprendizagem como uma solução que pode beneficiar a todos, professores e
alunos.
A utilização das TICs e de Objetos de Aprendizagem já é uma realidade. Por
isso, pode e devem ser utilizados como uma das alternativas para tornar a aprendizagem
mais significativa e as relações de socialização na sala de aula bem mais interativa.
Espera-se que esta relação entre o mundo virtual e o mundo real que se
estabelece pelo uso do OA Probabilidade no Jogo de Bolas de Gude, seja capaz de
proporcionar melhorias significativas no processo de ensino e aprendizagem, dando
condições ao estudante para participar na construção de seu próprio conhecimento,
favorecendo-lhe uma melhor aquisição de conhecimentos, competências e habilidades
José Jefferson Aguiar dos Santos
5948
Objetos de Aprendizagem e o Ensino de Matemática: uma nova prática de ensino e suas contribuições na
aprendizagem de conceitos de probabilidade
sobre os conceitos de probabilidade e o professor de tornar sua aula mais dinâmica e
atraente.
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José Jefferson Aguiar dos Santos
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José Jefferson Aguiar dos Santos
5950
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
ATIVIDADES SOBRE NÚMEROS NATURAIS NO
CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO INFANTIL
Mercedes Carvalho
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
ATIVIDADES SOBRE NÚMEROS NATURAIS NO CURRÍCULO DA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Mercedes Carvalho - UFAL
RESUMO: Este trabalho é uma análise comparativa entre as atividades sobre números
naturais que são propiciadas às crianças de três escolas da educação infantil na cidade
de São Paulo. Meu trabalho como docente do curso de Pedagogia e assessora
pedagógica e as pesquisas na área sinalizam para o fato de que há escolas que adotam
um plano de trabalho com estrutura linear e atividades ancoradas na reprodução de
modelos em que os alunos têm poucas oportunidades de criar estratégias utilizando seus
conhecimentos implícitos acerca dos números. A análise de dados revelou que
similaridades entre as atividades propostas para os alunos das três escolas investigadas.
As atividades priorizam a função ordinal do número, em detrimento das outras funções,
como a cardinal, a memória de quantidade ou de posição e como antecipação de
resultado. As docentes não trabalham resolução de problemas como eixo norteador do
trabalho matemático indicando que não consideraram as orientações contidas nos
documentos oficiais como Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil.
Nessa direção se revelou a importância de se considerar a escola como espaço de
formação de professores em que ele tenha a oportunidade de discutir a sua prática,
repensar o currículo e estudar as propostas curriculares para que possa viabilizá-las.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Infantil, Matemática, atividades.
Apresentando o trabalho
Os números estão presentes em diferentes situações do cotidiano e as crianças,
mesmo antes de entrarem na escola, têm contato com a escrita numérica e elaboram
hipóteses sobre ela. Portanto, para favorecer o processo de compreensão do conceito
numérico, é importante proporcionar às crianças situações e atividades em que elas
possam comparar, ordenar e ler números.
Pensando nessas questões, procurei investigar as atividades que são propiciadas
às crianças da educação infantil sobre números. Isto porque meu trabalho como docente
do curso de Pedagogia e assessora pedagógica e pesquisas na área sinalizam para o fato
de que há escolas que adotam um plano de trabalho com estrutura linear e atividades
Mercedes Carvalho
5954
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
ancoradas na reprodução de modelos em que os alunos têm poucas oportunidades de
criar estratégias utilizando seus conhecimentos implícitos acerca dos números. Para
tanto, analisei o material de alunos de educação infantil de três escolas da cidade de São
Paulo.
As políticas públicas educacionais e as reformas curriculares
É desejável que o professor, no exercício do magistério, tenha conhecimentos
acerca do currículo, porque envolve “a totalidade dos programas estabelecidos para o
ensino de temas e tópicos específicos de um certo nível” (SHULMAN, 1986, p. 10). Os
materiais didáticos (livros, programas de computador, entre outros) referentes às
disciplinas e segmentos educacionais podem ser um dos meios de veiculação das
propostas curriculares, que são políticas públicas educacionais desenvolvidas, de
maneira geral, para atender a interesses políticos, sociais e econômicos de uma época.
Quanto às reformas curriculares para o ensino da matemática, segundo Pires
(2000), existe uma crença de que elas “constituem fatores decisivos para a renovação e
o aperfeiçoamento do ensino da matemática” (p. 8). No entanto, há indicações de que
muitas das reformas curriculares pretendidas para o ensino básico não chegam aos
professores e, quando chegam, não são incorporadas às práticas pedagógicas da maioria
deles, de acordo com mesma autora.
Nessa direção, Fiorentini et al. (2001) entendem que os papéis atribuídos aos
professores da educação básica, no que se refere às propostas curriculares, oscilam entre
dois extremos: de um lado, o professor está reduzido à condição de técnico de ensino, e
os conhecimentos que lhe são apresentados por meio dos cursos de formação são
produzidos pelos especialistas; por outro lado, há o professor que luta pela sua
autonomia “intelectual/profissional, que o habilite a atuar como agente ativo/reflexivo
que participa das discussões/investigações e da produção/elaboração das inovações
curriculares que atendam aos desafios socioculturais e políticos de seu tempo”(p. 310).
Mercedes Carvalho
5955
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Da matemática moderna aos PCNs: breve histórico acerca dos currículos de
matemática no Brasil
Na década de 50 do século XX, as reformas curriculares foram fomentadas pelo
desenvolvimento econômico e pelos avanços tecnológicos em países desenvolvidos.
Nesse cenário, o movimento da “matemática moderna inscreveu-se muito claramente
numa política de formação a serviço da modernização” (PIRES, 2000, p. 9), provocando
mudanças significativas nos currículos de matemática das escolas em muitos países,
inclusive no Brasil.
A proposta desse movimento explicitava a preocupação e o compromisso com o
desenvolvimento tecnológico, assumindo “a matemática como base de uma cultura
voltada para a ciência e a tecnologia e tinha como meta ensinar o aluno mais a abstrair
do que se preocupar com as aplicações diretas” (PIRES, 2000, p. 17). Sendo assim, a
concepção acerca da matemática a ser ensinada nas escolas era a lógica compreendida a
partir das estruturas e atribuindo papel de destaque à linguagem matemática. Nessa
direção, as abstrações internas à própria matemática, voltadas mais à teoria em
detrimento da prática, ocuparam espaço significativo nas discussões sobre essa
disciplina, como “a linguagem da teoria dos conjuntos, por exemplo, introduzida com
tal ênfase que a aprendizagem de símbolos e de uma terminologia interminável
comprometia o ensino do cálculo e das medidas” (PCN, 1997, p. 21).
Consequentemente, essa proposta para o ensino da matemática desconsiderou que as
crianças dos anos iniciais de escolarização poderiam não compreender o conteúdo
proposto.
No Brasil, as ideias sobre a matemática moderna foram vinculadas por meio dos
livros e materiais didáticos, influenciando a elaboração dos currículos oficiais.
Entretanto, Pires (2000) entende que não houve uma ampla discussão com os
professores sobre os seus objetivos, favorecendo algumas distorções na sua
implantação.
As ideias que pautaram o movimento da matemática moderna foram sendo
abandonadas nas reformas curriculares das décadas seguintes, porque estudiosos do
assunto entenderam que diversos fatores, entre eles o internalismo e o formalismo
demasiados da matemática, deixavam de contemplar as diversas matemáticas na
sociedade, como aponta Maranhão (2006).
Mercedes Carvalho
5956
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Nos anos 80 e 90 do século XX, vários países, como França, Itália, Estados
Unidos, Japão, Inglaterra, promoveram reformulações curriculares acerca do ensino da
matemática, em contraposição ao movimento da matemática moderna. Considerando a
reforma implementada pelos Estados Unidos, o National Council of Teachers of
Mathematics (NCTM) apresentou documento intitulado “Agenda para Ação”, no qual
propôs a resolução de problemas como eixo norteador do ensino da matemática. As
discussões sobre aspectos sociais, antropológicos e linguísticos na aprendizagem
matemática também marcaram as discussões curriculares.
Na França, o grupo Ermel (Equipe de didactique dês mathématiques – France)
realizou estudos entre 1985 e 1988 sobre “a aprendizagens numéricas e resolução de
problemas”, produzindo um documento para a formação de professores: A descoberta
dos números: contar, cantar e calcular. No entendimento do grupo, os docentes
precisariam de tempo para a apropriação das ideias presentes nesse documento, entre
elas a de que “praticar matemática é antes de mais nada resolver problemas” (p. 10).
No Brasil, a década de 80 do século XX foi marcada pelo processo de
redemocratização. Os governos estaduais eleitos, a maioria de oposição ao regime
militar, elaboraram políticas públicas visando acesso aos serviços públicos de qualidade
a todos que estiveram excluídos até então. Nessa direção, as reformas curriculares
elaboradas na época, de maneira geral, foram “marcadas pelo discurso que dava ênfase
à necessidade de recuperar a relevância social dos conteúdos veiculados na escola,
contrapondo-se às orientações tecnicistas que prevaleceram na década anterior”
(BARRETO, 2000, p. 8), já que nos anos 70 do século XX o que ensinar ficou em
segundo plano.
No que se refere ao ensino da matemática, Pires (2008) comenta que as reflexões
sobre as distorções em torno do movimento da matemática moderna levaram as
secretarias estaduais e municipais de educação a elaborar propostas curriculares para o
ensino da disciplina. Em 1985, a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo iniciou
as bases da Proposta Curricular para o ensino de 1º grau. Nesse documento, foram
apresentados os principais problemas diagnosticados:
A preocupação excessiva com o treino de habilidades, com a
mecanização dos algoritmos, com a memorização de regras e
esquemas de resolução de problemas, com a repetição e a imitação,
não com uma aprendizagem que se dê, inicialmente, pela
Mercedes Carvalho
5957
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
compreensão de conceitos e de propriedades, pela exploração de
situações-problema nas quais o aluno é levado a executar sua
criatividade, sua intuição. (PIRES, 2008, p. 6)
É possível depreender, dos problemas diagnosticados pela SEESP, as
concepções de um currículo tradicional, com ênfase no desenvolvimento de técnicas
operatórias. Entretanto, de acordo com a interpretação de Pires (2008), nessa proposta
também se explicitava a matemática como sendo “necessária em atividades práticas que
envolvam aspectos quantitativos da realidade, como são as que lidam com grandezas,
contagens, medidas, técnicas de cálculo” (PIRES, 2008, p. 6).
No entanto, apesar das críticas ao treino de habilidades e memorização dos
algoritmos, contrapondo-se à compreensão dos conceitos e procedimentos matemáticos,
e com o incentivo à resolução de problemas como eixo norteador do trabalho
matemático, os professores opuseram resistência à implantação dessa proposta, “em
função de concepções e crenças muito arraigadas, como a de que se aprende matemática
pelo treino repetitivo de exercícios a serem copiados de um modelo dado” (PIRES,
2008, p. 8). Para Tardif (2000), isso é compreensível, pois os saberes dos professores
são construídos a partir dos seus modelos, dos conhecimentos que construíram ao longo
da sua formação básica e universitária e também da escola em que desenvolvem suas
práticas, e que se mostram preponderantes para o desenvolvimento dos seus saberes
profissionais.
O final dos anos de 1980 e o início da década de 90, a última do século XX,
foram marcados por mudanças sociais, econômicas e políticas significativas em todo o
mundo, como o fim da guerra fria, a queda do muro de Berlim, a globalização da
economia, o avanço das tecnologias etc., emergindo, assim, necessidades de mudanças
na educação.
Em março de 1990, aconteceu em Jomtien, na Tailândia, a Conferência Mundial
sobre a Educação para Todos, patrocinada pela Organização das Nações Unidas para a
educação, a ciência e a cultura (UNESCO) e pelo Banco Mundial. Para Torres (2001),
“Jomtien não foi só uma tentativa de garantir educação básica – satisfação de
necessidades de aprendizagem – para a população mundial, mas uma tentativa de
renovar a visão e o alcance dessa educação básica” (p. 8). Esse encontro acelerou o
processo de reformas educativas nos países em desenvolvimento.
Mercedes Carvalho
5958
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Segundo
Libâneo
et
al.
(2003),
a
nova
ordem
político-econômica
(neoliberalismo) no mundo afeta a escola, pois a sociedade está se transformando e, por
conta disso, precisa de um trabalhador que seja mais flexível, trabalhe em grupo, resolva
problemas, o que incide em um processo educacional voltado para o desenvolvimento
de habilidades e competências. O avanço tecnológico também força a escola a procurar
mudanças em suas práticas para se adequar à nova realidade, já que as tecnologias são
mais atraentes e dinâmicas do que as aulas expositivas, gerando no professor a
necessidade de se atualizar e, principalmente, ampliar sua visão sobre a disciplina que
leciona.
Em meados dos anos de 1990, fazendo parte das políticas públicas em busca da
melhoria da qualidade de ensino, afinado com os princípios da Declaração Mundial
sobre Educação para Todos (LDB 9394/96, art. 87º, § 1º), o Ministério da Educação
pela primeira vez fez determinações relativas ao currículo para a educação básica, as
quais, segundo Barreto (2000), “vão muito além das normas e orientações gerais que
caracterizaram a atuação dos órgãos centrais em período anteriores” (p. 35). Essas
orientações, segundo a autora, diferem das propostas curriculares dos estados brasileiros
porque propõem uma revisão dos conteúdos das disciplinas a partir de pressupostos
teórico-metodológicos, acolhendo as questões do mundo contemporâneo, com o
objetivo de atualizar os componentes curriculares. Nessa direção, propõe-se que os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e o Referencial Curricular Nacional para a
Educação Infantil (RCNEI) não tenham caráter de obrigatoriedade nas escolas, mas sim
de uma proposta entendida sobretudo “como uma experiência em estudo que deve
passar pelo crivo do trabalho de ensino e da aprendizagem” (BARRETO, 2000, p. 40).
Sobre o PCN (1997) de matemática, Pires (2000) observa que se, de um lado, as
orientações apresentam a matemática como necessária ao desenvolvimento de uma
sociedade cada vez mais complexa, de outro mostram-na funcionando como filtro
social dentro e fora da escola, e essa dualidade no papel da matemática contribui para
que muitas pessoas lidem mal com essa área do conhecimento, motivando os
educadores matemáticos a procurarem caminhos “visando à democratização desse
conhecimento (matemática para todos) e a adequação a novas demandas sociais” (p.
56).
Mercedes Carvalho
5959
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Currículo para educação infantil – Orientações acerca dos números naturais
Quanto ao ensino da matemática na educação infantil, o Referencial Curricular
Nacional para Educação Infantil (RCNEI, 1998) oferece orientações para o
desenvolvimento dos conteúdos matemáticos, organizados em duas faixas etárias:
crianças de 0 a 3 anos de idade e crianças de 4 a 6 anos de idade. No caso das crianças
de 0 a 3 anos, orienta-se que elas sejam estimuladas a realizar a contagem oral para
desenvolver noções de quantidade, de tempo e espaço em situações de jogos,
brincadeiras e músicas, junto com o professor e “nos diversos contextos nos quais as
crianças reconheçam essa utilização como necessária” (p. 217). Também são sugeridas
situações de aprendizagem em que elas tenham a oportunidade de manipular e explorar
objetos e brinquedos em quantidade suficiente “para que cada criança possa descobrir as
características e propriedades principais e suas possibilidades associativas: empilhar,
rolar, transvasar, encaixar etc.” (RCNEI, 1998, p. 218).
Para crianças de 4 a 6 anos, os RCNEIs estão organizados em três blocos de
conteúdos: números e sistema de numeração, grandezas e medidas, espaço e forma. Há
orientações, no bloco do conteúdo números e sistema de numeração, para o
desenvolvimento da contagem, notação e escrita numérica e as operações matemáticas,
devendo-se privilegiar a utilização da contagem oral em brincadeiras e situações nas
quais as crianças reconheçam a necessidade dos números, utilizando noções simples de
cálculo mental como instrumento para resolução de problemas e identificando a posição
de um objeto ou número na série numérica, de forma a explicitar noções de sucessor e
antecessor. Também devem ser propiciadas aos alunos situações em que possam
comparar a escrita numérica, a fim de identificar algumas das regularidades do sistema e
reconhecer os “números em diferentes contextos em que se encontram” (p. 220).
Uma breve discussão sobre o significado do número para as crianças
Para Milles e Coelho (2003), a noção de número natural desenvolveu-se
gradativamente, a partir do cotidiano das civilizações, e seu emprego generalizou-se aos
poucos.
Para esses autores, os números naturais podem ser ordenados em uma
sequência, sendo que cada um dos elementos tem um sucessor (ordinal), e cada número
expressa quantidade (cardinal).
Mercedes Carvalho
5960
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Os diferentes usos dos números
Sinclair (1990) aponta em seus estudos que “em nossas sociedades os algarismos
representam uma variedade muito grande de conceitos numéricos e quantitativos e são
igualmente usados de outras maneiras” (p. 74). Segundo a autora, os números
descrevem conjuntos de “objetos discretos” envolvendo aspectos cardinais e ordinais;
também descrevem quantidades contínuas (os pesos, os comprimentos), além de serem
utilizados como etiqueta, “sendo então sua única função a de distinguir um objeto
particular de outros objetos similares ou idênticos” (p. 74), como por exemplo,
informarem o tamanho da roupa, do calçado, etc. Portanto, a criança, no seu cotidiano, é
confrontada com o sistema numérico em suas diferentes funções e, apesar de a grafia
estar presente, em princípio ela não se apropria do uso aritmético dos números. No
ERMEL (1995), além das funções cardinal e ordinal do número, são apresentadas duas
outras funções: número como memória de quantidade ou de posição e número como
antecipação de resultados. Número como memória permite à criança lembrar uma
quantidade sem que esta necessariamente esteja presente concretamente (corresponde ao
aspecto cardinal); número como memória de posição permite à criança lembrar o lugar
que o número ocupa na reta numérica (corresponde ao aspecto ordinal); número como
antecipação de resultado possibilita à criança utilizar estratégias de cálculo ou de
contagem a partir de algumas informações de situações ainda não realizadas ou não
presentes.
A criança e os processos de contagem
As crianças, mesmo as pequenas, possuem estratégias que lhes permitem
enumerar ou falar a sequência numérica, o que não significa que elas possam quantificar
objetos. Para Fayol (1996) e Vergnaud (2003), o ato de contar é considerado uma
habilidade cognitiva que requer a coordenação de atividades visuais, manuais e vocais,
além de envolver as funções cardinal e ordinal. Portanto, para as crianças aprenderem a
contar, elas precisarão, por exemplo, fazer a correspondência termo a termo, que para
Fraga (1988) “precede e dá espaço à compreensão das complexas relações assimétricas:
‘mais que’, ‘menos que’ integrantes do processo lógico da adição e subtração e do dizer
usual: cinco é mais que três e menos que sete” (p. 55).
Mercedes Carvalho
5961
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
As atividades
Wolman (2005) também entende que as crianças desde cedo se questionam a
respeito dos números e têm hipóteses elaboradas sobre eles. Sendo assim, a autora
sugere atividades que favoreçam o processo de compreensão do sistema numérico
adotado pela civilização, categorizando-as em quatro tipos:
a- Permanentes: relacionam-se aos aspectos gerais do cotidiano escolar. Estão
amplamente difundidas em uma série de atividades que levam a criança a contar,
como: registrar os alunos presentes, o calendário, o controle dos materiais, os
livros da biblioteca etc.
b- Vinculadas e inseridas no desenvolvimento de unidades didáticas e projetos: o
planejamento dos docentes pode contemplar situações vinculadas aos projetos e
unidades didáticas a serem desenvolvidos propondo situações para abordagem dos
números de forma a favorecer que “as crianças descubram as funções que os
números cumprem na sociedade” (p. 207).
c- Jogos: a autora reconhece o valor do jogo no desenvolvimento das crianças tanto
da educação infantil quanto dos anos iniciais do ensino fundamental, por isso
devem ser propostos jogos que impliquem em regras sobre o uso do conhecimento
numérico: dados, cartas, bingos e todas as variações que se podem fazer. Mas
enfatiza que durante o jogo é importante que a criança expresse suas ideias, os
diferentes procedimentos, interprete e escreva os números.
d- Projetos: a autora denomina de projetos as atividades que podem ser trabalhadas
por um tempo prolongado. A ideia de projetos permite trabalhar vários aspectos da
matemática, por exemplo, formular situações interessantes para anotação,
contagem e resolução de problemas. Ela cita o álbum de figurinhas e coleções
como exemplo de projetos.
Kamii (1995) também sugere atividades que podem favorecer a aprendizagem
das crianças acerca dos números. Porém, segundo essa autora, solicitar a elas que
contem objetos de uma coleção perguntando: Há quantos aqui? ou Você pode me dar
oito? não é estratégia que possa favorecer a compreensão do número. Para ela, uma
possibilidade de trabalho é criar situações em que as crianças façam comparações entre
coleções, identificando igualdade e diferença entre elas. Entretanto, a pesquisadora não
aconselha atividades em que as crianças sejam solicitadas a fazer a correspondência
Mercedes Carvalho
5962
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
entre os elementos de duas coleções, pois visualmente já é possível perceber em qual
delas há mais elementos.
Essas atividades propostas por Wolman (2005) e Kamii (1995) podem ser
veiculadas por meio da resolução de problemas, porque este é o eixo norteador do
trabalho matemático, isto porque, “ao se trabalhar com conhecimentos matemáticos [...]
por meio da resolução de problemas, as crianças estarão, consequentemente,
desenvolvendo sua capacidade de generalizar, analisar, sintetizar, inferir, formular
hipótese, deduzir, refletir e argumentar” (RCNEI, 1998, p. 212).
Como a pesquisa foi realizada
Este trabalho teve por objetivo realizar um estudo comparativo entre as
atividades sobre números de três escolas de educação infantil na cidade de São Paulo,
por meio da análise do material das crianças e do plano de matemática das unidades de
ensino investigadas.
Foram utilizados como instrumentos de coleta de dados o material dos alunos
(pastas, cadernos e livro didático), o plano de disciplina e a entrevista com as
respectivas docentes, com o objetivo de verificar as intenções delas em relação às
atividades propostas aos seus alunos.
A análise do conteúdo das entrevistas e dos documentos buscou identificar a
coerência entre os planos, os discursos das entrevistas e dos respectivos materiais a fim
de também analisar as convergências e recorrências nas atividades.
Para resguardar a identidade dos sujeitos foram usados pseudônimos.
Análise do material dos alunos de Letícia
Letícia trabalha no último estágio da educação infantil, em uma escola particular
da Zona Leste de São Paulo. Seus alunos têm 6 anos completos. É uma classe da
alfabetização denominada “Pré”.
Os materiais dos alunos são: um caderno pedagógico (quadriculado), uma pasta
com atividades em folha sulfite tamanho A4 e o livro didático.
Na entrevista, ela disse não ter escolhido o livro e que gostaria de trabalhar com
projetos.
Mercedes Carvalho
5963
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Não escolhi. Eu acho que o trabalho seria muito mais rico se fosse
através de projetos, porque você acaba relacionando todas as
disciplinas. O livro é muito automático, tem que fazer, tem que dar a
conta. Então, para a educação infantil, eu sou contra adotar livro
didático.
Trabalhar com projetos “possibilita divisão de tarefas e responsabilidades e
oferecer contatos nos quais a aprendizagem ganha sentido” (RCNEI, 1998, p. 237). No
entanto, a análise do material dos alunos indicou não haver diferença entre a proposta de
atividades do livro didático e dos outros materiais. Portanto, é possível conjecturar que
o livro não impediria que a professora propusesse atividades diversificadas no caderno e
nas folhas A4, com propostas mais ricas, como resolução de problemas, pesquisas em
revistas e jornais, registros coletivos dos jogos, entre outras.
O livro didático adotado na escola em que Letícia atua é um volume único
integrando todas as áreas do conhecimento. As atividades de matemática propostas no
livro são mecânicas. As crianças devem reproduzir modelos, por exemplo: contar até
10, pintar a quantidade de elementos indicada, escrever os números seguindo o modelo.
No livro aparecem os termos: “elementos” e “conjuntos”, a palavra “vizinho” para
indicar números antecessores e sucessores, além dos símbolos +, +, <, >. Para iniciação
do trabalho com a adição, há a seguinte explicação: que o sinal de + é uma cruz. Não
são propostos jogos e brincadeiras e, ao final da explicação da adição, há um modelo
mostrando como fazer o algoritmo, seguido de uma lista de “continhas de adição” para
o aluno resolver.
No caderno quadriculado dos alunos, foram encontradas atividades tão
mecânicas quanto as propostas no livro. Alguns exemplos:
1- Faça bem bonito:
a) do 1 ao 5
b) do 7 ao 10
2- Coloque = ou =
5 ___ 3
2 ____ 12
3- Copie os números de 0 a 14
0 − 1 – 2 − 3 − 4 − 5 − 6 − 7 – 8 – 9 − 10 − 11 – 12 – 13 − 14
Mercedes Carvalho
5964
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
4- Quem fugiu? (O aluno deve completar a sequência usando apenas um
numeral.)
10 ____ 12
14 ____ 16
1 ____ 3
5- Copie os números até 30.
6 – Efetue:
5
7
4
9
8
+1
+2
+4
– 5
– 3
É possível depreender dessas atividades uma ênfase na conta armada, não
possibilitando ao aluno trabalhar cálculo mental e registrar estratégias. O ditado de
números não visa identificar as hipóteses numéricas dos alunos, mas sim a memorização
da escrita e da sequência dos números.
Na entrevista, quando questionada por que não havia nos cadernos registros de
atividades em que as crianças fossem incentivadas a criar estratégias, ela justificou:
Letícia: Muitas delas eu trabalhava na hora de uma brincadeira, na
hora da recreação, para não ser só escrita.
Entrevistadora: Então, para você, esse tipo de atividade não precisa ter
registro?
Letícia: Sim, precisa. O registro é sempre importante.
Entrevistadora: E por que você não registrou no caderno essas
brincadeiras?
Letícia: Alguns deles tinham (silêncio). No caso do gráfico, que foi
uma pesquisa a respeito da preferência dos alunos em relação às
frutas, foi registrado em um gráfico que foi afixado no mural da sala,
por exemplo.
Há similitudes entre as atividades do material das crianças e as do livro, embora
a professora tenha declarado que não adotaria o livro didático. Segundo o depoimento
de Letícia, houve pressão por parte da escola para o cumprimento do programa e o
desenvolvimento dos conteúdos. No entanto, em seu planejamento, ela não contemplou
o caderno, as folhas de atividades, as atividades coletivas como espaços de
flexibilização, propondo atividades que considerasse interessantes e significativas para
Mercedes Carvalho
5965
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
as crianças. Portanto, há indicações de que o currículo de matemática proposto para os
alunos é o do livro didático.
Análise do material dos alunos de Vanessa
Vanessa é professora em uma escola particular de educação infantil localizada
na Zona Leste da cidade de São Paulo. Seus alunos têm entre 3 e 4 anos de idade. A sala
tem dez alunos e é denominada Jardim I.
Os materiais dos alunos da Vanessa são um caderno de linguagem e uma pasta
com atividades xerocadas em folha sulfite tamanho A4. No caderno havia muitas
atividades que privilegiavam o trabalho sobre a sequência numérica. Cada página do
caderno correspondia a um número da sequência. A partir do número 5, a consigna
passou a ser: conte 6, conte 7 e assim sucessivamente, até o número 15. Em todas as
atividades, aparecem os números tracejados, para orientar o traçado do numeral.
As folhas da pasta também seguem esse mesmo padrão de atividade. No material
não foram encontradas atividades envolvendo problematizações, registros de jogos,
material de contagem, pesquisas em revistas para recortar figuras com objetos ou
procurar a escrita dos numerais de diferentes formas ou textos para interpretar. As
atividades das folhas eram mecânicas, e nelas as crianças deveriam seguir um modelo.
Alguns exemplos:
* Complete a sequência numérica:
0___ 2 ____ 4 ___ 6 ____ 8 ___ 10.
* Pinte de amarelo os
que têm o numeral 8.
* Cubra o numeral 8.
8 8 8 8 8 8 8
* Ligue o numeral à quantidade de elementos 1 ao 9.
* Faça um x no
que tem 10 unidades
* Com desenhos, complete a sequência até o 10.
* Ditado de números (sequência do 0 ao 10).
Mercedes Carvalho
5966
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
As atividades analisadas limitam-se a solicitar à criança que complete a
sequência numérica, ligue quantidades aos numerais; apenas uma das atividades
propunha ao aluno contar.
Na entrevista, Vanessa foi questionada por ter iniciado o trabalho dos números
com o zero, o último símbolo criado pelos hindus.
Porque, se você pegar os materiais didáticos, todos começam as
atividades pelo zero, e me baseio nessas atividades.
Para a escolha das atividades, Vanessa se baseia no planejamento da escola, que
já determina o que deve ser trabalhado em cada bimestre:
Toda série já tem atividade que nós selecionamos. O que cada série
tem que trabalhar: 1o semestre: numeral do zero ao cinco... que é uma
coisa que já vem da escola, agora a forma de trabalhar em grande
parte é nossa, nos baseamos nos livros de onde tiramos as atividades,
mas o que eu tenho que ensinar para essa faixa etária já está
determinado pela escola.
A resposta da professora remete à questão de a escola determinar o planejamento
e o professor buscar em materiais didáticos apoio para organizar suas aulas. O Ermel
(1995) faz referência à organização curricular das escolas francesas em 1945, em
relação à aprendizagem dos números, apontando “estudo concreto dos números de 1 a 5,
depois de 5 a 10, depois de 10 a 20. Formação, decomposição, nome, escrita” (p. 17).
Apesar de estarmos no século XXI, a organização do conteúdo proposto para o trabalho
numérico com os alunos da educação infantil, na sala de Vanessa, tem como modelo o
currículo da escola do século passado. Os livros didáticos também são materiais de
referência para essa professora, porém, de acordo com a entrevista, podemos conjecturar
que a leitura desses livros é realizada acriticamente e as propostas presentes no RCNEI
(1998) são desconhecidas pela professora.
Análise do material dos alunos de Maria
Maria trabalha em uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) na
periferia da Zona Norte da cidade de São Paulo. Seus alunos têm entre 3 e 4 anos de
idade e sua classe tem 24 alunos.
Mercedes Carvalho
5967
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
O material dos alunos é um caderno de cartografia com atividades que abordam
diferentes áreas do conhecimento e uma pasta de atividades. As que se referem à
matemática são atividades para as crianças relacionarem número e numeral por meio de
colagem de palitos, dobraduras até o número 5, atividades com figuras geométricas
(vários retângulos entregues cortados às crianças para elas colarem).
Há poucos registros das atividades realizadas pelas crianças. Segundo Maria, a
coordenação da escola orienta que as atividades devem estar voltadas para o
desenvolvimento cognitivo e emocional, sem a preocupação com o registro.
No plano da disciplina consta como objetivo “conhecer a sequência dos números
naturais”, indicando como conteúdo “contagem oral através de material concreto,
palitos, dedos, brinquedos” e “número: 1 a 5”. O plano prevê o trabalho de “contagem
oral” utilizando material concreto, mas não há referência à adição e, como
procedimento, o trabalho com resolução de problemas.
Por se tratar de crianças de 3, 4 anos, poderia ser feito o registro de atividades
mais elaboradas, por exemplo, a “realização de noções simples de cálculo mental como
ferramenta para resolução de problema [...] identificação de números nos diferentes
contextos em que se encontram” (RCNEI, 1998, p. 219).
Sobre a resolução de problemas, na entrevista, a professora argumentou que:
Problemas grandes, não. Agora, por exemplo, se eles trazem bolinha
de gude para a sala, eu proponho a situação, ou às vezes nos próprios
brinquedos deles, mas fazer no papel, não. Tem duas maçãs aí, tem
mais duas maçãs, depois faz aquela sominha com a operação embaixo,
não.
Pelo depoimento, Maria entende que resolver um problema é aplicar o
algoritmo, e não uma situação em que a criança pode elaborar uma estratégia para
resolver o problema proposto, registrada por meio de desenhos e esquemas, de acordo
com Carvalho (2005). Mas, ao mesmo tempo, demonstrou entender que no cotidiano da
sala de aula são trabalhadas situações problema, porém não estimulou as crianças a
registrarem suas soluções.
Eu acho que você propõe resolução de problemas a todo momento
para eles, nas próprias brincadeiras você está pondo problemas. [...]
Mercedes Carvalho
5968
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Mas no papel? É muito pouco que eu levo. Fica mais no lúdico
mesmo. As que eu trabalhei no papel já foram para casa.
As atividades propostas no caderno dos alunos exploravam até o numeral 5. Eles
deviam pintar ou colar a quantidade de objetos indicada na consigna da atividade. Por
exemplo: a) cole 3 peixinhos no fundo do mar; b) quantos anos você tem? (anexo A).
Na classe havia crianças que ainda não tinham completado 4 anos e somente
dois alunos iriam completar 3 anos. Essa atividade propiciou-lhes contar para responder
a uma pergunta − quantos anos você tem? −, ao contrário das outras atividades, em que
elas eram orientadas a colar a quantidade determinada, porém, para fazê-lo, deveriam
contar ou reconhecer a quantidade, trabalhando assim com a função cardinal do número.
Similaridades entre as atividades propostas para alunos da educação infantil
A análise dos dados aponta similaridades entre as atividades propostas para os
alunos das três escolas investigadas. As atividades analisadas revelaram prioridade na
função ordinal do número, em detrimento das outras funções, como a cardinal, a
memória de quantidade ou de posição e como antecipação de resultado, mesmo que
algumas das atividades presentes nos cadernos dos alunos solicitassem que eles
contassem ou reconhecessem quantidades.
Porém, essas atividades não propiciavam às crianças desenvolver estratégias,
construir os conceitos matemáticos conforme as propostas do RCNEI ou as sugeridas
por pesquisadoras como Wolman (2005) e Kamii (1995). Ao contrário, são atividades
que priorizam cópia de modelos que desconsideram os conhecimentos implícitos das
crianças. Como exemplo, podemos citar a atividade do ditado e da sequência numérica
que Letícia e Vanessa trabalharam com seus alunos. No caso do ditado, esta atividade
não era proposta com o objetivo de investigar as hipóteses numéricas dos alunos, mas
sim para reforçar a escrita do número que estava sendo trabalhado, e as atividades que
envolviam a sequência numérica reforçavam a memorização.
Quanto às atividades propostas por Maria para seus alunos, mesmo a docente
tendo dito na entrevista que estudou o RCNEI, na análise do material não foi possível
reconhecer as orientações do documento nas atividades dos alunos.
As atividades analisadas apresentam-se coerentes com o plano das escolas, o
qual aponta para uma perspectiva linear do currículo: primeiro ensina-se do 1 ao 5,
Mercedes Carvalho
5969
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
depois do 6 ao 10 até o 100 no final da educação infantil. Moura (2003) argumenta que
a iniciação da aprendizagem dos conceitos matemáticos é um momento importante e
estratégico para que a criança desenvolva os alicerces para compreensão de conceitos
mais complexos. Mas o professor acredita que uma base sólida é construída pela
quantidade de conteúdos que serão apresentados aos alunos, e “essa justaposição
mecânica entre as crianças e o conceito é a que tem criado não só indisposição, mas
também hostilidade para aprender matemática” (p. 8-9).
Entretanto, essas docentes, mesmo não concordando com os respectivos planos,
não se sentiam suficientemente seguras em relação aos seus conhecimentos para
poderem dialogar com a coordenação de suas escolas, de acordo com suas declarações
nas entrevistas.
Considerações finais
Tardif (2002) argumenta que, para desenvolver sua prática, o professor mobiliza
determinados saberes. No caso dessas docentes, elas mobilizaram saberes plurais e
heterogêneos, porque buscaram referência nos programas das escolas e nos livros
didáticos e em seus conhecimentos para desenvolver seu trabalho e elaborar as
atividades para seus alunos. No entanto, a análise do material nos permite conjecturar
que, para a elaboração das atividades, o RCNEI (19998), que faz parte de uma política
educacional, não pontuou o trabalho dessas docentes, confirmando as conjecturas de
Pires (2000).
Nessa direção, revela-se a importância de se pensar a escola como um espaço em
que o professor também aprende, porque, como bem lembra Nóvoa (1995), para que as
reformas educacionais aconteçam, elas têm que necessariamente passar pela escola, e
isso significa a participação efetiva dos professores como agentes e autores de mudança.
Portanto, é necessário que os professores e demais atores do processo educativo
pensem o currículo da instituição escolar, que é reflexo das políticas educacionais, de
forma a explicitar quais conteúdos – conceitos e fatos (o quê) – ensinar e por que
ensiná-los, quais procedimentos (como) adotar para que os alunos aprendam, quais
atitudes (por quê) os alunos irão desenvolver ao aprenderem determinados conteúdos, e
possivelmente o ensino da matemática se tornará significativo para eles, pois as crianças
que hoje frequentam as salas da educação infantil já são do terceiro milênio.
Mercedes Carvalho
5970
Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
Bibliografia
BARRETO, Elba Siqueira de Sá. Tendências recentes do currículo do Ensino
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Mercedes Carvalho
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Atividades sobre Números Naturais no Currículo da Educação Infantil
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Mercedes Carvalho
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Anexo A
Essa foto é uma reprodução da atividade, pois não foi permitido xerografar a atividade do caderno.
Mercedes Carvalho
5973
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
GLOBALIZAÇÃO E A RELAÇÃO
PESQUISA/SALA DE AULA EM EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA: UMA ANÁLISE CRÍTICA
Silvanio de Andrade
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
GLOBALIZAÇÃO E A RELAÇÃO PESQUISA/SALA DE AULA EM
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: UMA ANÁLISE CRÍTICA
Silvanio de Andrade1 - UEPB
RESUMO: Esse trabalho, parte e fruto de uma pesquisa mais extensa (ANDRADE,
2008), trata da relação pesquisa/sala de aula em Educação Matemática e, também,
questiona sobre a influência da globalização ao tema pesquisa/sala de aula.
Enunciaremos e analisaremos discursos produzidos, por 71 pesquisadores de Educação
Matemática, 44 do Brasil e 27 de outros países, em resposta à questão: “Na sua opinião,
o que a globalização tem a ver com as pesquisas em Educação Matemática, em especial
no que diz respeito à relação pesquisa/sala de aula?”. Da análise dos dados, na
perspectiva de Análise do Discurso de Michel Foucault, observa-se que a globalização
foi percebida, pelos pesquisadores, tanto como um meio de manutenção, como também
como um meio de lutar pela superação do status quo, através de práticas
emancipatórias, de explicitação de conflitos, que aponta que um diálogo crítico com
pesquisadores de diversos lugares facilitaria, de certa forma, o debate em torno dos
problemas, e a busca conjunta de soluções capazes de reverter quadros de exclusão.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Matemática. Globalização. Pesquisa/sala de aula.
Introdução, contexto, justificativa, marco teórico e metodologia
Conforme já anunciado no resumo, esse trabalho é parte e fruto de uma pesquisa
mais extensa (ANDRADE, 2008), que trata da relação pesquisa/sala de aula em
Educação Matemática em que, também, nos questionamos sobre a influência da
globalização ao tema pesquisa/sala de aula. Andrade (2008) tem procurando
compreender o processo da relação pesquisa/sala de aula a partir de perguntas tais
como: Qual o impacto da pesquisa em Educação Matemática na sala de aula? Como as
pesquisas e os pesquisadores vêm se relacionando com a sala de aula de Matemática? O
que os pesquisadores têm a dizer à sala de aula de Matemática e o que esta tem
mostrado a eles? Como as pesquisas e os pesquisadores podem contribuir de um modo
1
Doutor em Educação (Área de Concentração: Ensino de Ciências e Matemática), USP, com estágio no
exterior, University of Georgia, EUA.
Silvanio de Andrade
5977
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
mais efetivo, com a mudança, a transformação e a reinvenção da sala de aula de
Matemática? Que possibilidades e impossibilidades a globalização traz ao tema
pesquisa/sala de aula?
Na pesquisa de Andrade (2008), o levantamento de dados/fatos e respectiva
análise compreendem discursos de 71 pesquisadores de Educação Matemática (44 do
Brasil e 27 de outros países: África do Sul, Austrália, Canadá, Dinamarca, Estados
Unidos, França, Israel, Nova Zelândia, Portugal, Reino Unido), obtidos por meio do
questionário aberto/discursivo de pesquisa seguinte:
Questionário - Questões (diálogos) aos Pesquisadores de Educação Matemática.
Tema: A relação pesquisa/sala de aula em Educação Matemática
1. Parece ser consenso entre os educadores que as principais razões que originaram o campo da
Educação Matemática - área de estudo que, de forma direta ou indireta, sempre esteve envolvida
com a sala de aula de Matemática - foram, de um lado, o fracasso escolar dos alunos em
Matemática e, de outro, a importância da Matemática nos currículos escolares de todas as nações
do mundo e no dia-a-dia das pessoas. Ainda, segundo Jeremy Kilpatrick (1992), “a Educação
Matemática começou a se desenvolver quando matemáticos e educadores voltaram sua atenção
ao que é, como é ou deveria ser ensinada e aprendida a Matemática na escola”. Qual a sua
observação frente a estas reflexões?
2. Do seu ponto de vista, quais as evidências do impacto, na sala de aula, das pesquisas em
Educação Matemática? E com relação às suas pesquisas, você percebe alguma evidência nesse
sentido?
3. Como, de fato, as pesquisas e os pesquisadores vêm se relacionando com a sala de aula de
Matemática? Qual a sua experiência/reflexão/sugestão nesse sentido?
4. Como nós pesquisadores poderíamos contribuir, de modo mais efetivo, com a mudança da sala
de aula de Matemática?
5. O que a sala de aula de Matemática pode dizer a nós pesquisadores?
6. Na sua opinião, o que a globalização tem a ver com as pesquisas em Educação Matemática,
em especial, no que diz respeito à relação pesquisa/sala de aula?
7. Além das questões acima, sinta-se à vontade para falar sobre outros pontos que você considera
relevantes, em especial, no que diz respeito à relação pesquisa/sala de aula.
8. Se possível, fale um pouco de você, do tempo de prática como pesquisador e professor,
formação e trajetória acadêmica, experiências profissionais que considera significativas,
trajetória/relação com a Educação Matemática, quando e como se deu o encontro com a
Educação Matemática entre outros.
Silvanio de Andrade
5978
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
Compreende ainda discursos de professores de matemática, selecionados da
nossa tese de mestrado (ANDRADE, 1998) e discursos de trabalhos apresentados nas
sessões ST1: The relation between research and practice in mathematics education e
DG2: The relationship between research and practice in mathematics education, ICME
10, 2004. (ANDRADE, 2008).
Portanto, aqui, nessa comunicação, com base no trabalho de Andrade (2008),
enunciaremos e analisaremos discursos produzidos, por 71 pesquisadores de Educação
Matemática, 44 do Brasil e 27 de outros países, em resposta à questão: “Na sua opinião,
o que a globalização tem a ver com as pesquisas em Educação Matemática, em especial
no que diz respeito à relação pesquisa/sala de aula?”. (ANDRADE, 2008). Na análise
dos dados, temos como orientação principal a perspectiva de Análise do Discurso de
Michel Foucault.
Faremos uma exposição geral do tema Globalização, olhado a partir da
perspectiva da metáfora da Sociedade da Modernidade Líquida (BAUMAN, 1998,
1999a, 1999b, 2001, 2005, 2007a, 2007b), principalmente. Num segundo momento,
enunciaremos os discursos dos pesquisadores produzidos em resposta à questão 06 do
questionário da pesquisa.
Segundo Bauman, hoje vivemos tempos de incertezas, de total insegurança e
fluidez que trazem a sensação de inconstância que parece refletir o distanciamento de
um passado tão próximo, mas tão distante, do qual só resta uma vaga miragem que
espelha a segurança perdida e uma dolorosa angústia. Nesse período é preciso correr o
máximo que puder para permanecer no mesmo lugar. Se quiser ir a algum outro lugar,
deve-se correr pelo menos duas vezes mais depressa do que isso! Estamos, portanto,
num período de Modernidade Líquida. O cenário é o do capital e do consumo - e a
ciência e a pesquisa, de uma vez por todas, parecem deixar de serem críticas para
atenderem exclusivamente às regras do capital e do consumo. A figura do cientista
crítico, do pesquisador crítico, do filósofo, do sociólogo, do cientista político crítico
anda em crise. A sociedade da modernidade líquida é inóspita para a crítica. Nela,
nossa crítica é “desdentada”, incapaz de afetar a agenda estabelecida para nossas
escolhas na “política-vida”.
Na sociedade da modernidade líquida, parece ser cada vez mais reduzido o
número daqueles que realmente se envolvem na luta por uma sociedade democrática e
Silvanio de Andrade
5979
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
pela democratização do ensino de Matemática. Nesse sentido, é interessante o
pensamento do pesquisador P01 quando diz que “a grande maioria das pesquisas se
refere aos modelos em prática [aprimoramento da mesmice]” (P01, questão 02,
Anexo). (ANDRADE, 2008).
Sem dúvida, há pesquisas que têm certo impacto na sala de aula, mas o problema
é que tal impacto, muitas vezes, tem visado à manutenção do status quo, ao
aprimoramento da mesmice, ao aprimoramento da sociedade da modernidade líquida.
Na sociedade da modernidade líquida, discursos como: Matemática aplicada à
vida, Matemática em contexto, história da Matemática, formação do cidadão, realidade
do aluno, interdisciplinaridade etc. atualmente têm feito parte dos discursos e práticas da
Educação Matemática e da Educação como um todo. Mas, muitas vezes, tais discursos
operam ocultamente no aprimoramento da mesmice, do status quo, e não como um
instrumento de luta por uma sociedade democrática, no sentido mais pleno dessa
expressão.
Quando pensamos a ligação pesquisa/sala de aula, é importante refletirmos sobre
que tipo de sala de aula estamos almejando, uma vez que termos como cidadania,
formação do cidadão, Matemática aplicada à vida, Educação Matemática Crítica, entre
outros nem sempre mantêm-se contra o status quo, tais termos às vezes assumem formas
ocultas de aprimoramento do status quo.
A formação do cidadão, por exemplo, é muitas vezes confundida com a
formação do mais esperto, daquele que consegue levar vantagem em tudo. Ensino da
Matemática numa perspectiva crítica é, muitas vezes, confundido com ensino da
esperteza. A expressão Matemática Aplicada à Vida, empregada em livros didáticos,
por professores de Matemática e educadores matemáticos tem sido muitas vezes a
máxima de um ensino da esperteza e pela esperteza. (ANDRADE, 1998).
Portanto, como professores e pesquisadores, precisamos estar engajados nos
debates sociais da atualidade e um desses debates tem sido a globalização. Em que
circunstâncias a globalização pode operar na manutenção do status quo? Em que
momento ela pode ser vista, operada por nós, professores e pesquisadores, como um
mecanismo de resistência ao status quo?
É nesse contexto então, que a globalização opera, de alguma forma, na relação
pesquisa/sala de aula. Possivelmente, tanto como uma forma de resistência ao que está
Silvanio de Andrade
5980
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
posto como também pela manutenção do que aí está. Mas, como é que os pesquisadores
em Educação Matemática têm pensado nisso? Como tem também pensado numa
relação globalização e pesquisa/sala de aula?
Foi com base nas preocupações e cuidados alinhados acima que, ao
investigarmos o tema pesquisa-sala de aula (ANDRADE, 2008), passamos também a
investigar, com base na questão 6 do questionário acima mencionada, sobre a influência
da globalização no desenvolvimento da realça pesquisa/sala de aula.
Resultados e Conclusões.
Do conjunto de dados observados e analisados, uma primeira coisa que
percebemos como parte dos diversos olhares dos pesquisadores em resposta à questão
6, foi a de que há dois lados quando se trata da globalização: um lado excludente,
extremamente perverso, que sutilmente domina o debate em torno do tema, mas
também há outro lado, que luta, olha e pensa a globalização como parte de um possível
projeto emancipatório. Neste último, são cobradas de nós novas posturas, novas formas
de pensar e pesquisar que questionam e colocam sob suspeição o movimento do
mundo. Nessa perspectiva, a pesquisa e os pesquisadores podem colaborar com a sala
de aula a partir do momento em que procuram questionar e colocar sob suspeição o que
acontece no seu interior, ao seu redor e no seu exterior. Dessa forma, temos que
reconhecer que a globalização faz parte das exigências do mundo contemporâneo e,
portanto, não há como escapar dela, mas devemos ter o cuidado para que ela não se
cristalize como forma de exclusão. A fala de P02 é um bom exemplo nessa direção.
P02: A globalização – e mais amplamente, as exigências do mundo
contemporâneo – nos cobram algumas posturas novas, sobre as quais
sequer precisávamos pensar até um certo tempo. Entender o que a
globalização é; julgando-a, estudando para compreender como a
Matemática e a Educação Matemática participam ou podem participar
desse processo para que ele não se cristalize (como parece ser a
tendência atual) como forma de exclusão, creio, são questões que nos
surgem e nos obrigam a novas práticas de atuação nos espaços
educacionais (de docência ou de pesquisa). Essas novas práticas
exigem novos métodos para compreendê-las, novos instrumentais...
que podem (ou não) desencadear novas posturas. Entender o mundo
contemporâneo é aceitar (questionando, colocando sob suspeição) o
movimento do mundo. Ter isso como objeto e objetivo é, já, uma
forma de fazer pesquisa. (P02, questão 06, Anexo). (ANDRADE,
2008).
Silvanio de Andrade
5981
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
Nesse debate sobre a globalização, a partir de falas dos pesquisadores, podemos
afirmar que há duas perspectivas sobre o tema: uma emancipatória e outra excludente.
No desenvolvimento desta pesquisa, por exemplo, através da Internet,
mantivemos um diálogo bastante frutífero com pesquisadores de diversos lugares do
mundo. Isso é muito bom mesmo, não há como questionar o contrário. Mas, por outro
lado, na qualidade de pesquisadores, temos cada vez mais estado presos, submissos aos
ditames das agências de fomento que têm operado cada vez mais nos moldes das
políticas neoliberais impostas por grandes impérios como o norte-americano, por
exemplo. Como ilustração dessa discussão, vejamos, a seguir, falas de alguns dos
pesquisadores com quem trabalhamos na pesquisa.
P03: Globalização? Não entendo o sentido da sua pergunta...
Globalização do quê? Econômica? Dos meios de comunicação? Só
por aí são duas coisas radicalmente distintas (embora associadas). O
fato de que tenhamos um, assim chamado, “Império” norte-americano,
praticamente impõe ao mundo uma certa forma de cultura... associada
com uma forma de dominação econômica. Mas, por outro lado, a
velocidade e variedade de informações disponíveis a um número cada
vez maior de pessoas torna possível o conhecimento e o contato com
diferenças e particularidades quase que individuais (por exemplo, ao
se tornarem disponíveis os “diários” das pessoas para consultas e
intervenções na Internet). Com a sala de aula... Cada vez mais
rapidamente poderemos saber o que um professor numa sala da
polinésia está fazendo, mas cada vez temos menos tempo para
processar tal informação, enquanto recebemos massivamente
propostas de grandes grupos educacionais privados que vendem seus
serviços aos governos, homogeneizando as propostas com a adoção,
por exemplo, de apostilas de “cursos” em diversos Estados e
Municípios. (P03, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008).
P14: Os processos de globalização têm de ser encarados dentro da
premissa de que somente teremos condições de nos realizarmos como
indivíduos e como membros de uma comunidade se nos inserirmos no
mundo global mantendo e desenvolvendo uma série de características
que são caras a nossa civilização. A sala de aula é um momento ímpar
para introduzir elementos da nossa cultura, incluindo elementos da
cultura popular praticada pelos grupos sociais subalternos para
sobreviver e transcender as limitações da realidade. Sem isto
entraremos em um projeto onde teremos rodeios, fast food e costumes
que nada nos dizem. Sobre este tema estamos lançando um novo livro
sobre cultura popular e matemática. (P14, questão 06, Anexo).
(ANDRADE, 2008)
P16: Existe um mito da globalização. O que assistimos hoje é um
crescimento grande da nacionalização, o que é muito perigoso, pois
incentiva a disputa internacional pelos saberes. Se você quer saber
Silvanio de Andrade
5982
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
sobre o uso de novas tecnologias eu acredito que é uma realidade que
não podemos fugir. O professor hoje tem que estar preparado para
usá-la e se adaptar a todo instante dos avanços que vem das novas
pesquisas tecnológicas. (P16, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008)
P32: Nos países latino-americanos é muito comum tentar copiar o que
os países mais desenvolvidos estão trabalhando na pesquisa em
educação matemática. Mas, pese a que os problemas parecem muito
similares, o âmbito em que tais problemas estão inseridos faz com que
os pontos de partida sejam sensivelmente diferentes. Por uma
globalização imitativa perniciosa, as reformas educacionais daqueles
países tentam inserir, sem uma pesquisa profunda, o mesmo tipo de
reformas dos países desenvolvidos. O professor vê-se lançado a uma
corrida louca contra o tempo para se adaptar às novas exigências. E os
pesquisadores, sem enxergar a sala de aula, enfiam a cabeça, qual
avestruz, nas teorias tentando inserir estas, como referencial de
análise, em qualquer fenômeno estudado. Craso erro. Para usar uma
teoria importada dever-se-ia comparar as realidades de origem e de
destino, ver as coincidências e as diferencias e apontar as
modificações necessárias para a implementação nessa outra realidade.
(P32, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008).
P12: A globalização tem duas faces: por um lado, permite mostrar o
que é universal, o que é relevante para alunos em vários contextos
sócio-culturais, além das fronteiras nacionais; por outro lado, introduz
o perigo de querermos adotar certos resultados ou modismos que
funcionaram bem em um certo contexto mas podem muito bem
fracassar em outros. (P12, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008).
P12 mostra, também, os dois lados da globalização, mas de forma um pouco
diferente dos outros pesquisadores, haja vista que sua preocupação, em princípio, não
parece ser de ordem econômica, mas apenas de ordem epistemológica, no sentido de
discutir a validação de certos conhecimentos, de certas experiências e resultados com o
intuito de explicitá-los se são locais ou universais. Tal posição faz sentido, mas pode,
por um lado, ocultar perigos como a idéia do conhecimento matemático ser um
conhecimento exclusivamente universal e também a idéia do universal ser mais
importante do que o local.
Há pesquisadores, como P06, vamos dizer, que pensando no lado emancipatório
da globalização, chama-nos a atenção de que a globalização ajuda-nos a pensar na
totalidade e não na fragmentação, que ela também aponta para a necessidade de
mudanças, que a pesquisa não pode ficar alheia à sala de aula e vice-versa, que há
necessidade de que o diálogo ensino-pesquisa-extensão aconteça de fato, que também se
Silvanio de Andrade
5983
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
faz necessário que este diálogo seja reconhecido por nossos governantes. Eis então a
fala de P06:
Aponta para a necessidade de mudanças. De pensar a
totalidade e não a fragmentação. A pesquisa não pode ficar alheia à
sala de aula e vice-versa. Há necessidade que o diálogo ensinopesquisa-extensão aconteça de fato. Ao mesmo tempo, faz-se
necessário que este diálogo seja reconhecido por nossos governantes.
(P06, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008)
A partir da seguinte fala, de P20, podemos também dizer que um dos efeitos
mais perversos da globalização é a distância cada vez mais acentuada entre ser
desenvolvido e ser subdesenvolvido num mundo globalizado.
P20: É de suma importância para nós, pesquisadores, mas não para a
sala de aula, se observarmos que esta globalização não é realidade
para quase todos os professores, sobretudo aqueles que estão no
interior do interior de nossas continentais regiões, onde o próprio
telefone ainda não é uma realidade. Mas para o professor dos grandes
centros também não o é, pois, preocupado em sobreviver, muitas
vezes o professor tem computador e até Internet, mas não é pra ele
pesquisar, mas para o filho dele que está estudando para o vestibular.
O tempo desse professor é quase sempre entre meia noite e seis da
manhã, mas ele precisa dormir. (P20, questão 06, Anexo).
(ANDRADE, 2008).
Pensando mais diretamente na relação pesquisa/sala de aula, é interessante notar
que o pensamento a seguir, de P08, chama atenção para o fato de que a globalização
pode ser percebida tanto como um meio de manutenção, como também como um meio
de luta pela superação do status quo, através de práticas emancipatórias, de explicitação
de conflitos.
P08: Para mim, a globalização, em suas relações com sala de aula e a
pesquisa se faz sentir:
*quando se observa pesquisas comparativas entre currículos que
mostram uma face unificadora das escolas, face esta voltada para a
constituição de um mercado consumidor e de uma massa trabalhadora,
*quando o multiculturalismo se faz presente tanto na escola quanto
nas pesquisas, multiculturalismo esse que se mostra em qualquer das
suas vertentes, aquela voltada para a harmonia, para uma especial
proteção às minorias e, de certa forma, para a manutenção da situação
atual e a outra vertente, voltada para práticas emancipatórias, para a
Silvanio de Andrade
5984
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
explicitação de conflitos, para a superação do status quo. (P08,
questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008).
A partir dos olhares dos pesquisadores, vale dizer que, embora dominante nos
discursos da literatura acadêmica, a globalização como algo excludente, entretanto, não
foi unanimidade no olhar dos pesquisadores. Ela foi focada muito mais na sua forma de
intercâmbio entre pesquisadores, troca de experiências etc. do que sob a ótica do livre
mercado, do capital, do neoliberalismo. Isso talvez possa indicar que o lado pernicioso,
excludente, neoliberal da globalização não seja ainda um fato bem debatido dentro da
Educação Matemática.
Na literatura acadêmica de Educação Matemática, temos notado que o tema
globalização tem estado presente nos discursos dos pesquisadores da chamada
Educação Matemática Crítica e no grupo “Educação Matemática e Sociedade”. O lado
neoliberal da globalização ainda é bem tímido enquanto debate dentro da Educação
Matemática. Parece ainda não estar bem divulgado e discutido entre os pesquisadores
de Educação Matemática que o compromisso da globalização tem sido muito mais para
com a exclusão do que para com a inclusão. Com isso, não queremos dizer que os
educadores matemáticos não estão preocupados com o aspecto excludente da
globalização. O que se evidencia é que esse debate crítico ainda não é publicamente um
tema dominante nos debates da área de um modo geral, exceto no grupo Educação
Matemática e Sociedade. Como ilustração dessa discussão, vejamos, a seguir, falas de
alguns dos sujeitos pesquisados:
P18: Entendo que o termo “globalização” aqui tem a ver com uma
possibilidade interessante da facilidade hoje oferecida em termos de
comunicação de idéias. Evidentemente é um fator muito positivo o
intercâmbio que vem se realizando entre as diferentes comunidades de
educadores matemáticos, seja em função da Internet, seja em função
dos inúmeros congressos internacionais. Evidentemente, as
informações, os resultados de pesquisas que são trocados, precisam
ser “contextualizados” ´pelos pesquisadores em suas diferentes
realidades. Importar “modelos” sem qualquer tipo de adequação não é
uma boa alternativa. Mas o intercâmbio entre educadores matemáticos
é, sem dúvida, responsável por avanços consideráveis na área da
Educação Matemática. (P18, questão 06, Anexo). (ANDRADE,
2008).
P05: Os problemas encontrados no Brasil são também identificados
em quase todo o mundo. Nesse sentido, a globalização é o contexto no
Silvanio de Andrade
5985
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
qual faremos as trocas e intercâmbios com pesquisas internacionais
sem a necessidade de um grande esforço de adaptação de contextos.
(P05, questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008)
P38: O movimento da globalização reconfigurou o espaço escolar e
nossa forma de olhar para ele, assim, ela exige de nós pesquisadores e
também dos professores um compromisso maior com a inclusão, com
o respeito pelo outro, pela diversidade. O Grande aprendizado nesse
momento é aprender a construir na diversidade, é problematizar e
superar o conflito: geral x local. (P38, questão 06, Anexo).
(ANDRADE, 2008).
P42: A globalização tem associada a circulação mais rápida de
informação. Podemos saber com mais facilidade o que está sendo
investigado em diversos pontos mundo e reconhecer em que medida
os problemas são semelhantes ou diferentes e as soluções que estão
sendo ensaiadas noutro local podem ou não ser úteis para a nossa
realidade. Além disso, os pesquisadores entram mais facilmente em
contacto uns com os outros, trocam idéias, encetam trabalhos
colaborativos conjuntos, etc.
Esta circulação de informação processa-se nos mais diversos
subdomínios dentro da educação matemática e em particular na
pesquisa que se interessa mais diretamente sobre a sala de aula. (P20,
questão 06, Anexo). (ANDRADE, 2008).
Não há como discordar da fala desses pesquisadores quando, por exemplo, P18
diz que “globalização” tem a ver com uma possibilidade interessante da facilidade hoje
oferecida em termos de comunicação de idéias”. Isso realmente é excelente e também
pode perfeitamente colaborar no desenvolvimento de práticas de salas de aula de fato
emancipatórias.
Mas olhando por um outro ângulo, do ponto de vista da Educação Matemática
Crítica, é urgente que nosso debate não perca de vista o lado perverso da globalização,
o lado da exclusão, daqueles que estão cada vez mais na periferia dos meios de
comunicação e da tecnologia, excluídos justamente pela globalização econômica feita
sob os moldes neoliberais. Não há dúvida de que a globalização nos moldes neoliberais
pode afetar de forma negativa nossas atividades de pesquisa, especialmente a relação
pesquisa/sala de aula etc. Falas como a de P24, descrita a seguir, talvez possam indicar,
com mais clareza, que um debate crítico em torno da globalização na Educação
Matemática é assunto de extrema necessidade e urgência.
P24: A globalização tem interferido em nossa área em duas vertentes.
Silvanio de Andrade
5986
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
A primeira diz respeito à própria pesquisa. Atualmente, o
processo de avaliação externa que nos é imposta pela Capes e outras
agências de fomento, tem nos ‘obrigado’ a atuar em linha de
produção, sem muito tempo de reflexão e amadurecimento intelectual
de nossas idéias e pesquisas. Os poucos recursos destinados à pesquisa
vêm provocando um ranqueamento geral: de instituições, de
programas, de pesquisadores. Isso vem gerando a competitividade e a
falta de cooperação entre os pesquisadores. Com isso, a qualidade da
pesquisa vem caindo visivelmente. Muitas tratam da questão da sala
de aula com uma certa superficialidade, sem se aprofundar nos
complexos problemas que a escola, os professores e os alunos vêm
vivendo. Essa característica do estado avaliador é conseqüência das
políticas educacionais de cunho neoliberal que vêm sendo a nós
imposta e entendida como ‘necessária’ para que façamos parte do
mundo globalizado.
A segunda vertente, diz respeito à escola e seus atores.
Começando pelos alunos: o processo de globalização, como diz
Skovsmose, vem gerando um grande contingente de descartáveis na
sociedade; aqueles para quem a matemática escolar não fará falta
alguma, pois suas perspectivas de vida e de futuro são mínimas. E é
essa a grande massa que freqüenta a escola pública que nunca esteve
tão abandonada e relegada a um projeto secundário de governo –
muito embora a propaganda alardeie outra imagem à população. No
que diz respeito ao aluno das camadas mais favorecidas
economicamente – e que freqüentam as escolas privadas – esses, na
maioria das vezes, caracteriza o autêntico ‘cidadão consumidor’, para
quem a própria escola é um tipo de consumo. Falta-lhe valores e
atitudes condizentes com a solidariedade e a cooperação. Prevalece
individualidade, a competição.
Concordo com as discussões do pesquisador anglo-canadense
Andy Hargreaves que discute o quanto o professor ocupa um triângulo
de interesses competitivos e conflituosos. Dele se espera que seja o
catalisador de uma sociedade do conhecimento, que apresente aos seus
alunos a maravilha do mundo tecnológico que vivemos, conseqüência
de um planeta global; mas, também se espera que seja o contraponto
de tanta desigualdade social, que promova formas de aprendizagem
com a qual não foi ensinado, que desenvolva competências em seus
alunos, para as quais não foi preparado. Nesse contexto, o professor
tem sido a maior vítima desse mundo globalizado. Em décadas
passadas, pouco se exigiu do professor; no entanto, nessa sociedade
globalizada, a escola e o professor passam a ser peças fundamentais.
O tipo de cidadão necessário à atual sociedade do conhecimento
necessita de saberes e competências que somente os processos de
escolarização podem fornecer. No entanto, a escola e seus professores
não estão preparados para isso. As mudanças em educação são muito
lentas; não dão conta de acompanhar a velocidade com que as
mudanças estão ocorrendo.
E, finalmente, quem pensa as políticas públicas de educação
no Brasil, não tem como se desvencilhar (e também não sei se assim o
querem) das exigências postas pelas agências de financiamento da
educação brasileira. A preocupação com melhorias de índices (de
aprovação, de não evasão, de acesso etc) não tem sido acompanhada
da melhoria de condições estruturais às escolas e de trabalho aos
Silvanio de Andrade
5987
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
professores. Exige-se do professor aquilo que ele não recebeu em sua
formação; os projetos de formação continuada não são aqueles que o
professor gostaria de receber: aos sábados (como uma explícita
demonstração de desprofissionalização docente), com profissionais
distantes da realidade escolar, com temáticas que não levam em
consideração as diferentes realidades e, principalmente, em contextos
nos quais o professor não tem voz e não é ouvido.
Entendo que toda essa conjuntura é decorrente dos processos
de globalização que anula nossas identidades; não considera nossas
peculiaridades e a diversidade cultural.
Em diversos pontos do país, temos assistido a pesquisadores e
formadores que buscam romper com esse contexto; mas os resultados
ainda são muito tímidos quando comparados ao estrago que já foi
feito. Reitero que o professor, via de regra, está cansado de ser
culpabilizado pelo fracasso escolar e busca formas de se desenvolver
profissionalmente. E, quando as encontra, é nítida as transformações
que a pesquisa provoca em sala de aula. (P24, questão 06, Anexo).
(ANDRADE, 2008).
No contexto, da modernidade líquida, da sociedade neoliberal, da globalização
excludente, a tendência é a de que a pesquisa em Educação Matemática fique cada vez
mais distante da sala de aula de Matemática, pois o mais importante é o currículo lattes,
artigos publicados em revistas internacionais. São atividades dessa natureza que
garantem ao pesquisador ser, amanhã, um sênior do CNPq, da FAPESP. Já um
pesquisador que desenvolve um trabalho de extensão com algum grupo de professores
de escola pública raramente tem algum ganho pessoal com isso, em comparação com a
publicação de papers em revistas nacionais ou internacionais de conceito A.
Dentro dessa discussão, mencionaremos aqui o depoimento do pesquisador P03:
P03: As cobranças das agencias de avaliação dos sistemas de pósgraduação acabarão por impor um modelo de pesquisa onde o
professor determina aos seus orientandos aquilo que deverá estudar.
(Hoje, em muitos programas os alunos de mestrado são, em sua
maioria, professores oriundos das salas de aula que trazem seus
problemas para tentar transformá-los em uma pesquisa acadêmica). Os
problemas peculiares às salas de aula não têm um grande status
acadêmico... são considerados “locais”, de pouco interesse em termos
de gerar categorias de análise, em termos de causar impactos sobre os
indicadores
sistêmicos:
dificilmente
uma
pesquisa
sobre
a
compreensão que os alunos de uma determinada turma tenham sobre
Silvanio de Andrade
5988
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
as frações incidirão sobre os resultados do SAEB, por exemplo. Como
os índices de produtividade dos professores-pesquisadores estão cada
vez mais atrelados às publicações em revistas “nacionais” e
“internacionais”, é natural que estes pesquisadores busquem temas
que venham a se transformar, com mais facilidade, em artigos
passíveis de virem ser aceitos por estas publicações. Não estou
dizendo que “sala de aula” não se enquadra nesse sistema, estou
afirmando que é mais difícil de fazê-lo... (P03, questão 7, Anexo).
(ANDRADE, 2008).
Portanto, vivemos constantemente, como educadores e pesquisadores, esse malestar da sociedade da modernidade líquida. Como viver e sermos “educadores e
pesquisadores” autênticos e críticos nessa trágica sociedade, de conflitos e tensões, de
futuro incerto, desesperos, choros, ranger de dentes e esfarrapados? Será que ainda
podemos ser nós mesmos, como seres verdadeiramente autênticos, honestos, éticos e
críticos? Que práticas de resistência ainda podem ser desenvolvidas?
BAUMAN (1998, p. 97) aponta duas possibilidades: ou buscamos novas
certezas, em instituições, espaços, teorias, explicações que ainda não perderam sua
autoridade e sua credibilidade; ou desistimos de toda e qualquer certeza ou
verdade, recusando todas as explicações e teorias, abandonando-se, assim, todas as
“certezas antigas, novas e ainda por vir” Ou seja, abandonamos a noção de certeza
de que um outro mundo é possível.
Para que isso aconteça, é necessário também nosso engajamento, num processo
eu-tu-nós, nos tempos e espaços possíveis, como sujeitos fazedores responsáveis de uma
nova história e de um novo mundo. Nesse sentido, afirmamos que a pesquisa em
Educação Matemática pode ser uma ferramenta importante nessa luta, mesmo sabendo
que isso possa não representar quase nada na universalidade da agenda de luta e
emancipação que temos que enfrentar. Mas acreditamos que tais contribuições, por
menores que sejam, são elementos singulares imprescindíveis na concretização de tal
agenda.
Assim, a resposta dada por P01 à questão 4 do questionário de pesquisa - “Como
nós, pesquisadores poderíamos contribuir para uma transformação significativa no que
se refere à relação das pesquisas e dos pesquisadores com a sala de aula de
Silvanio de Andrade
5989
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
matemática? Quais são suas sugestões nessa direção?” - em que ressalta a necessidade
de nos engajarmos, politicamente, numa transformação social mais ampla é, de fato,
muito significativa se quisermos, como pesquisadores, desenvolver uma agenda de
práticas emancipatórias no que diz respeito, especialmente, à relação pesquisa/sala de
aula.
Continuando a fazer o que estamos fazendo, isto é, ações
micro. E, ao mesmo tempo, engajar-se, politicamente, numa
transformação social ampla. Em outros termos, é ilusão achar que
podemos mudar a educação matemática na sociedade como ela está.
Os sistemas de valores, os modelos de governança, isto é, a política, a
economia, a moral embutida em grupos religiosos e políticos, tudo
isso constitui o campo no qual a educação se situa. A Educação
Matemática “macro” está a serviço do poder estabelecido a partir
desses fatores. O engajamento político que menciono é incutir, nos
nossos alunos, algo mais que competência matemática. É necessário
incutirmos ética! Não esquecer que nossos alunos hoje serão os
cidadãos adultos que, em 20 anos, formarão a sociedade. Serão
essencialmente de duas categorias: os que decidem e mandam [filhos
dos atuais mandantes e freqüentando as escolas de elite] e os que
obedecem. Esses, que obedecem, se tiverem uma boa formação
matemática, estarão capacitados a seguir ordens e obedecer e serão
empregados pelo sistema, mantendo o status quo. Os que mais se
distinguem [os que forem melhores nas provas e testes] serão
candidatos a terem os melhores empregos e a serem cooptados para
cargos de chefia. A História nos ensina isso.
Vale pesquisar o que foi feito com as reformas da Educação
Matemática após a Revolução Francesa [foram a ativação do
baccalauréat e da École Polytechnique, que dão o sentido político à
obra de Cauchy], como seleção e preparação das elites para
administrarem o novo regime da burguesia. Quem estudou bem isso
foi Marx nos seus escritos matemáticos. É a passagem do misticismo à
mistificação na Educação Matemática.
E se quiser exemplo mais evidente: você sabe quem eram os
capitães-de-mato do Brasil [os blade-runners nos Estados Unidos],
não sabe? Eram negros escravos de bom comportamento,
“civilizados” e cooptados pelos senhores de escravos, para serem
empregados pelo sistema. Por isso Vidal de Negreiros é herói e
Calabar é traidor [veja o Chico]. Se quiser ver essas denúncias bem
explicitadas, vá ao cinema e assista dois filmes: O Homem que Virou
Suco e O Caçador de Andróides. Ou leia os primeiros versículos do
livro Gênesis, da Bíblia. Estou anexando um trabalho sobre isso.
Acho que os Educadores e Historiadores (particularmente os
Educadores Matemáticos) deveriam ler mais ficção para ver como os
que não são especialistas vêem o que nós, especialistas, fazemos
[estou enviando em anexo a conferência que fiz agora nos Estados
Unidos sobre isso].
Não se trata de deixar de ensinar Matemática, mas sim de
ensinar algo mais. Queremos preparar um outro tipo de cidadania.
Silvanio de Andrade
5990
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
Aqueles que mandarão, que são filhos dos que hoje mandam, e
aqueles que obedecerão, que são filhos dos que hoje obedecem. E ter o
maior cuidado com a armadilha de preparar esses últimos para a
cooptação.
Infelizmente, temos dedicado muito mais esforço em dar uma
“melhor educação matemática” nas escolas públicas e para as classes
mais pobres, preparando-os para serem mais facilmente cooptados. E
temos dado pouca atenção para a educação das elites, que estão sendo
muito bem preparadas para serem iguaizinhos aos pais [deveríamos
prestar atenção à música da Elis Regina, que fala sobre isso]. Uma
Educação Matemática para eles teria, necessariamente, que incluir
Ética. (P01,questão 04,Anexo)2. (ANDRADE, 2008).
Portanto, observa-se que o mundo atual, do capitalismo fluido, da globalização
excludente, tem sido um dos grandes obstáculos às possibilidades concretas de
pesquisadores e educadores críticos poderem impactar a sala de aula de Matemática
através de suas pesquisas. Mas se estivermos dispostos a resistir a tal quadro e, se for o
caso, dispostos até a sairmos da corrida dos consumidores-pesquisadores da sociedade
da modernidade líquida, então as pesquisas em Educação Matemática poderão ser, sim,
pensadas para impactarem a sala de aula.
Referências
ANDRADE, S. de. A pesquisa em educação matemática, os pesquisadores e a sala
de aula: um fenômeno complexo, múltiplos olhares, um tecer de fios. 2008. 461 p.
Tese (Doutorado em Educação. Área de Concentração: Ensino de Ciências e
Matemática) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
______. Ensino-aprendizagem de Matemática via resolução, exploração,
codificação e descodificação de problemas e a multicontextualidade da sala de
aula. 1997. 325 p. + anexos. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - IGCE,
UNESP, Rio Claro, 1998.
BAUMAN, Z. Vida líquida. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2007a. 210 p.
______. Tempos líquidos. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2007b. 119 p.
______. Vidas desperdiçadas. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 2005. 170 p.
2
P01, embora não tenha respondido diretamente a questão 06 do questionário, faz isso na questão 04
quando, na questão 06, ele diz: “Tratei disso na questão no 4”.
Silvanio de Andrade
5991
Globalização e a Relação Pesquisa/Sala de Aula em Educação Matemática: uma análise crítica
______. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Tradução Carlos
Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. 190 p.
______. Modernidade líquida. Tradução Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 2001. 258 p.
______. Modernidade e ambivalência. Tradução Marcus Penchel. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1999a. 334 p.
______. Globalização: as conseqüências humanas. Tradução Marcus Penchel. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999b. 145 p.
______. O mal-estar da pós-modernidade. Tradução Mauro Gama; Cláudia Martinelli
Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. 272 p.
Silvanio de Andrade
5992
IV COLÓQUIO INTERNACIONAL DE POLÍTICAS E PRÁTICAS CURRICULARES
“DIFERENÇA NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO”
MUSICALIZANDO O CURRÍCULO: UMA
PROPOSTA DE ENSINO E APRENDIZAGEM
MATEMÁTICA
Valdir de Sousa Cavalcanti
Abigail Fregni Lins
JOÃO PESSOA - PB - BRASIL
10 A 13 DE NOVEMBRO DE 2009
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
MUSICALIZANDO O CURRÍCULO: UMA PROPOSTA DE ENSINO E
APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA
Valdir de Sousa Cavalcanti1
Abigail Fregni Lins2
RESUMO: Os Parâmetros Curriculares Nacionais deveriam de alguma forma, ter
repercutido na construção de projetos e programas nas escolas. Por outro lado, uma das
questões apontadas hoje se relaciona com as dificuldades dos professores para
concretizar, em sala de aula, as renovações do conteúdo e as inovações pedagógicas que
são produzidas em diferentes instâncias dos sistemas educativos. Neste artigo apresento
minha pesquisa de mestrado em andamento que propõe desenvolver uma abordagem
didática utilizando a música na aprendizagem da Matemática, em composição de
paródias, criadas por alunos do Ensino Médio. A pesquisa tem como enfoque os
conteúdos de probabilidade, números complexos, circunferência e polinômios. A coleta
dos dados se deu em sala de aula, final de 2008. Os métodos utilizados foram
questionários, entrevistas semi-estruturadas e uma lista de exercícios sobre os conteúdos
trabalhados. Resultados do Questionário I mostram que a maioria dos alunos prefere a
aula de Matemática na exposição dos conteúdos. Quanto aos conteúdos, os alunos
acreditam que têm importância para a vida, e as dificuldades encontradas nos mesmos
são consideradas normais. Quanto à paródia Estudando os Polinômios, o grupo de
alunos mostrou compreensão sobre os conceitos nele trabalhados.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Matemática. Música. Ensino Médio.
1-Introdução:
No Brasil, assim como em outros países, os estudos sobre políticas de currículo
vêm se ampliando nos últimos anos. Segundo Schmidt e Garcia (2007, p.161), “as escolas
brasileiras têm sido envolvidas em reformas curriculares que pretendem reorganizá-las,
propondo conjuntos de saberes a serem ensinados aos alunos”.
1
Mestrando do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade
Estadual da Paraíba- UEPB; Professor do Ensino Médio da Rede Estadual de Ensino. E-mail:
[email protected]
2
PhD em Educação Matemática; Orientadora e Docente do Programa de Mestrado Profissional em
Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Estadual da Paraíba- UEPB. E-mail:
[email protected]
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
5996
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
As pesquisas sobre políticas de currículo tendem a se caracterizar pela
interlocução com ações governamentais, análise de documentos e legislações,
investigação de programas de avaliação e de fomento a mudanças curriculares. Os
Parâmetros Curriculares Nacionais deveriam de alguma forma, ter repercutido na
construção de projetos e programas nas escolas brasileiras. Entretanto, resultados de
várias avaliações reafirmam que há uma enorme distância entre o que as propostas
curriculares sugerem e o que acontece em sala de aula, como efeito da construção das
práticas escolares pelos professores.
No caso dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM),
são analisadas as diferentes formas de atuação de comunidades disciplinares em ensino
de Biologia, Física, Química e Matemática, como mediadores entre o contexto oficial e
o contexto da prática, no processo de produção de políticas curriculares. Entendam-se
Comunidades disciplinares como sendo professores das disciplinas escolares, segundo
Ball e Bowe (1998, apud Silva e Lopes, 2007, p. 3), e também os pesquisadores em
ensino dessas mesmas disciplinas.
De acordo com Schmidt e Garcia (2007), uma das grandes questões apontadas
hoje, nos debates em torno da problemática do ensino, relaciona-se com as dificuldades
dos professores para concretizar, em sala de aula, as renovações do conteúdo e as
inovações pedagógicas que são produzidas em diferentes instâncias dos sistemas
educativos. Especificamente no caso do ensino da Matemática, observamos que os
alunos sabem menos do que antes, que não se interessam pelos conhecimentos
matemáticos e que não conseguem alcançar os níveis educacionais desejados.
Currículo é uma noção que precisamos discutir mais de perto: aqui ele é
entendido como o núcleo que corporifica o conjunto de todas as experiências cognitivas
e afetivas vividas pelos estudantes no decorrer do processo de educação escolar, o que
significa entendê-lo como um espaço conflituoso e ativo de produção cultural, (SILVA,
1995).
2- Musicalizando o Currículo
A música quando bem trabalhada desenvolve o raciocínio, criatividade e outros
dons e aptidões, por isso, pode-se aproveitar esta tão rica atividade educacional dentro
das salas de aula. No contexto escolar, a música tem a finalidade de ampliar e facilitar a
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
5997
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
aprendizagem do aluno, pois ensina o indivíduo a ouvir e a escutar de maneira ativa e
refletida. A música é uma arte que vem sendo esquecida, mas que deve ser retomada
nas escolas, pois ela propicia ao aluno um aprendizado global, emotivo com o mundo.
Na sala de aula, ela pode auxiliar de forma significativa na aprendizagem.
Faria (2001) define a música como um importante fator na aprendizagem, pois a
criança desde pequena já ouve música, a qual muitas vezes é cantada pela mãe ao
dormir, conhecida como cantiga de ninar. Segundo a autora, a música é muito
importante na aprendizagem, pois o aluno convive com ela desde muito pequeno.
Sendo assim, a pesquisa em questão tem como objetivo geral o desenvolver uma
abordagem didática utilizando a Música na aprendizagem da Matemática, via
composição de paródias, criadas pelos alunos. Os objetivos específicos envolvidos
foram o de levantamento bibliográfico sobre a relação da Música com a Matemática;
fundamentação teórica; produção de paródias compostas pelos alunos em forma de CD
e DVD; analisar o interesse, através da criatividade, e a assimilação dos conteúdos
matemáticos desenvolvidos em sala de aula.
As perguntas norteadoras desta pesquisa são a de que se o uso de músicas, em
forma de paródias, criadas pelos alunos, nas aulas de Matemática poderia estar
relacionado ao interesse dos alunos com relação à Matemática, e como as mesmas
poderiam contribuir para aprendizagem dos conteúdos.
Anterior a descrição da pesquisa em questão e detalhes metodológicos, uma
breve discussão sobre aspectos históricos e didáticos com relação à Música é
apresentada a seguir como também o conceito de inteligência musical, difundido por
Gardner (1994).
3- A Matemática e a Música
3.1-Aspectos históricos
A Matemática e a Música possuem laços profundos, conhecidos desde a
Antiguidade. O primeiro registro científico associado à Matemática e a Música ocorre
por volta do século VI a.C na Grécia Antiga, na escola Pitagórica. Segundo Abdounur
(2003), os pensadores desta época relacionavam intervalos musicais com o conceito de
frações, há mais de 2000 anos, fazendo uso de um instrumento de corda denominado
monocórdio.
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
5998
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Os Pitagóricos, até Aristóteles, foram os únicos a fundamentar cientificamente a
Música. Pitágoras deu continuidade a experimentos investigando a relação entre o
comprimento de uma corda vibrante e o tom musical produzido por ela. Com a
descoberta da relação entre razão de números inteiros e tons musicais, Pitágoras
estabeleceu relações entre a Matemática e a Música associando, respectivamente, aos
intervalos musicais referentes às consonâncias perfeitas – oitava, quinta e quarta, as
relações simples.
O experimento de Pitágoras contribuiu para a construção do conceito de fração,
que ganha a partir de então uma roupagem musical. Até os dias atuais, a Música passou
a ser usada por muitos professores, seja como forma de relaxamento ou em forma de
paródias nos cursinhos como recurso de abstração nas fórmulas matemáticas.
Entre os estudiosos que tratam do assunto, Abdounur (2003), em seu livro
Matemática e Música, fizeram de fato considerações que nos leva a entender que em
algum momento o homem começou a conjecturar relações entre Matemática e Música.
3.2- Aspectos didáticos
Alguns professores de Matemática, entre eles, Negreiro, Batista, Ferrari, já
fazem uso da Música como recurso didático, apesar de nenhum deles ter publicações
acadêmicas a respeito, mas têm propriedade em falar sobre esse recurso porque utilizam
em suas salas de aulas já há algum tempo, mostrando que a aprendizagem da
Matemática não deve ser passada como outrora fizera tornando-a uma disciplina técnica
e sem funcionalidade, mas, que ao ensinar Matemática ensinamos conceitos,
procedimentos, atitudes, princípios nos quais os alunos vêem como algo do cotidiano.
Como professores de matemática, Negreiro, Batista e Ferrari, desenvolveram
CDs com músicas compostas por eles, tendo as letras voltadas aos conteúdos
matemáticos. Negreiro atua na Pedagogia e no Ensino Médio, mostrando que a música
pode ser um recurso interessante para as aulas de Matemática, provocando
envolvimento dos alunos e os auxiliando a superar suas dificuldades.
Apesar dos trabalhos de Negreiro ser de grande alcance e aceitação, a pesquisa
em questão tem como intenção provocar a criatividade nos alunos, para que eles
próprios componham músicas (paródias) com os conteúdos matemáticos apresentados a
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
5999
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
eles, e é neste ponto que a mesma difere fortemente do trabalho de Negreiro, Batista e
Ferrari.
Com relação aos Encontros, foi durante o IX Encontro Gaúcho de Educação
Matemática, EGEM, com professores dos Ensinos Fundamental, Médio e Superior, que
Ribeiro (2006) realizou uma Oficina para possibilitar ao professor relacionar
Matemática
e Música.
Ao
final do
Encontro,
houve
uma plenária
para
discussão/reflexão sobre as possibilidades pedagógicas de utilização da Música para o
ensino da Matemática.
De fato, o aspecto mais importante desta atividade foi o de tentar romper com
alguns paradigmas, como ressalta D´Ambrosio (1989, p. 15), “a típica aula de
Matemática ainda é uma aula expositiva, em que o professor passa para o quadro negro
aquilo que ele julga importante”.
Para melhor esclarecimento de como a pesquisa em questão está sendo
trabalhada, a seguir o referencial teórico que a fundamentará, anterior às questões
metodológicas.
4- Inteligência Musical
A pesquisa se fundamenta centralmente em que Gardner (1994) argumenta, isto
é, que o ser humano possui um conjunto de diferentes capacidades, entre elas, a musical,
associada à capacidade de se expressar por meio da música.
O autor afirma que sua teoria está baseada numa “visão pluralista da mente”, que
reconhecem muitas facetas diferentes e separadas da cognição, reconhecendo que as
pessoas têm forças cognitivas diferenciadas e estilos cognitivos contrastantes.
Segundo Gardner (1994, p. 25), “numa visão tradicional, a inteligência, definida
operacionalmente como capacidade de responder a itens em testes de inteligência, é um
atributo ou faculdade inata do indivíduo”.
Para Gardner, um problema matemático, no qual não seja possível usar também a
dimensões lingüísticas e espaciais, poderia apresentar-se insolúvel. Mais que isso, ele
afirma que cada papel cultural que o indivíduo assume na sociedade, seja qual for o grau
de sofisticação, requer uma combinação de inteligências.
A dimensão lingüística da inteligência é segundo Gardner, a competência que
parece mais ampla e democraticamente compartilhada na espécie humana, assim como a
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6000
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
dimensão lógica- matemática tem sido tradicionalmente estudada e pesquisada pela
psicologia cognitiva. Essa competência se expressa de modo característico em todos que
lidam de forma criativa com as palavras, com a língua corrente, com a linguagem de um
modo geral. Poetas, oradores, escritores, vendedores e publicitários seriam exemplos de
indivíduos com a dimensão lingüística da inteligência bastante desenvolvida.
O principal canal de construção-desenvolvimento dessa inteligência seria o oralauditivo, muito embora pessoas com deficiência em uma das partes desse mesmo canal
possam desenvolver a competência lingüística.
Com a sua definição de inteligência como a habilidade para resolver problemas
ou criar produtos que são significativos em um ou mais ambientes culturais, Gardner
sugere que alguns talentos só se desenvolvem porque são valorizados pelo ambiente.
Aquilo que se teorizou como inteligência musical é descrito como "habilidade
para apreciar, compor ou reproduzir uma peça musical. Inclui discriminação de sons,
habilidade para perceber temas musicais, sensibilidade para ritmos, texturas e timbre, e
habilidade para produzir e/ou reproduzir música" (GAMA, 2008, p.25).
A seguir, descrição da pesquisa a nível metodológico.
5- Metodologia e o Uso de Multimídias
Esta pesquisa é de cunho qualitativo e quantitativo, que segundo Gunter (2006),
enquanto participante do processo de conhecimento, idealmente, o pesquisador não
deveria escolher entre um método ou outro, mas utilizar as várias abordagens,
qualitativas e quantitativas que se adéquam à sua questão de pesquisa. Sendo assim, os
métodos de pesquisa utilizados foram questionários e entrevistas semi-estruturadas,
observação participante, notas de campo e lista de exercícios matemáticos. Os
instrumentos utilizados foram fotos, áudio, vídeo e estúdio. A pesquisa envolveu quatro
turmas da 3ª série do Ensino Médio, totalizando em 100 alunos, da Escola Estadual de
Ensino Médio e Educação Profissional Dr. Elpídio de Almeida, Estadual da Prata,
Campina Grande, Paraíba. Fui eu o professor pesquisador. No momento se inicia a
análise preliminar dos dados coletados.
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6001
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
5.1- Etapas da Pesquisa
Foram sete as etapas desta pesquisa, sendo elas:
(i)
Levantamento
Bibliográfico: Este se
encontra em andamento
e
permanecerá ao longo da realização da pesquisa em questão.
(ii)
Fundamentação Teórica: A pesquisa em questão se fundamentará na
Teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner (1994), que argumenta que o
ser humano possui um conjunto de diferentes capacidades, entre elas, a
Musical, associada à capacidade de se expressar por meio da Música.
Provavelmente, a Teoria das Situações Didáticas de Brousseau (2008), que
argumenta o uso de situações didáticas e adidáticas no processo de
aprendizagem, será também adotada como o referencial teórico.
(iii)
Conteúdos Matemáticos e Composição de Paródias: Foram trabalhados os
conteúdos probabilidade, números complexos, circunferência e polinômios
em sala de aula, sendo eu o professor pesquisador. As aulas se deram na
forma expositiva tradicional. Ao longo das aulas foi feito a proposta do
trabalho e todos os alunos das quatro turmas aceitaram e foram divididos em
doze grupos de 8 a 10 alunos. Tanto a seleção dos grupos como o número de
membros foram de escolha dos próprios alunos. Cada grupo, banda, foi
responsável por desenvolver sua paródia sobre um dos conteúdos
matemáticos trabalhados. As paródias compostas pelos alunos, a partir de
uma música escolhida pelo grupo, foram gravadas em CD, em um estúdio.
Um dos grupos optou por gravar em CD e produzir um DVD (clipe).
(iv)
Lista de Exercícios: Os alunos responderam a uma lista de questões
voltadas aos conteúdos matemáticos abordados nas paródias para que se
investigasse o conhecimento matemático alcançado por eles. A lista foi
entregue aos alunos, uma semana anterior aos shows, apresentados na
Escola.
(v)
Questionário I e II semi-estruturados: Foi aplicado um Questionário
inicial I, para todos os alunos das quatro turmas envolvidas, totalizando por
volta de 100 alunos. Neste questionário foram investigadas questões sobre
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6002
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
desinteresse e desmotivação com relação à Matemática. O mesmo constou
de doze perguntas, dez objetivas e duas subjetivas, as quais serão discutidas
neste artigo. O Questionário final, II, foi aplicado ao final de todo o trabalho
desenvolvido pelos alunos, com o objetivo de investigar se o envolvimento
com a Música provocou maior interesse e motivação dos mesmos pela
Matemática, como também assimilação dos conteúdos matemáticos
trabalhados.
(vi)
Entrevistas semi-estruturadas: Foi realizada uma entrevista inicial, I
denominada grupal, na qual, todos os membros das bandas, ou seja, de 8 a 10
alunos por banda, descreveram o envolvimento dos mesmos na composição
de suas paródias voltados aos conteúdos matemáticos abordados. Dois
alunos de cada banda, os que mais dissertaram, sobre o trabalho realizado,
foram escolhidos para a Entrevista II, com o objetivo de aprofundar os dados
obtidos pelos questionários aplicados.
(vii)
Produção e Apresentação das Paródias: Cada grupo, fez sua apresentação
na sala de vídeo da Escola. Ao todo, foram formados doze grupos, as quais
se intitularam por: Probabilidade; Amor em Probabilidade; Me Explica;
Circunferência; Extra Circunferência; Circle Music; Rockcomplexos;
Balança Complexos; Os Complexos 2008; Descomplicando os Polinômios;
Festa dos Polinômios e Estudando Polinômios. O grupo intitulado Circle
Music, optou por gravar a Paródia em CD e DVD (clipe), enquanto o grupo
Estudando os Polinômios adicionou uma peça de teatro para apresentação da
Paródia. Os alunos gravaram as Paródias em CD em estúdio. Já o DVD, foi
produzido pelo próprio grupo. Alguns alunos dos grupos foram os próprios
intérpretes na gravação dos CDs. Sendo assim, foram produzidos doze CDs e
um DVD.
A seguir as questões do Questionário I e análise preliminar das mesmas.
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6003
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
5.2- Estrutura do Questionário I e primeira análise
O Questionário I, inicial, diz respeito ao desinteresse e desmotivação com relação
à Matemática. Composto de doze perguntas, sendo dez objetivas e duas subjetivas.
Discutiremos neste apenas as questões objetivas. Para isso, apresentamos a estrutura do
Questionário I, anterior às discussões sobre as dez questões objetivas:
5.2.1- Questionário I
O questionário I, semi-estruturado, compõe-se de doze perguntas, sendo dez
objetivas e duas subjetivas. O questionário na íntegra se encontra no Anexo I.
5.2.2- Primeira análise do Questionário I
As questões 1, 2, 3 e 5 abordam o que o aluno acha e como ele prefere uma aula
de Matemática. A primeira pergunta foi: Para você, a aula de Matemática com
exposição dos conteúdos é?
Para nossa surpresa, 64% dos alunos responderam que a aula de Matemática na
exposição dos conteúdos é uma aula normal. Esperava-se que a maioria deles
respondesse monótona ou cansativa (ver Tabela I em Anexo II).
Na segunda pergunta Você considera uma boa aula de Matemática quando?
Os alunos tiveram como opções de respostas:
Opção1: O professor faz a exposição dos conteúdos;
Opção 2: Há interação entre professor e alunos;
Opção 3: O conteúdo é trabalhado por meio de recursos tecnológicos;
Opção 4: O aluno faz apresentações com relação aos conteúdos.
Para 69% dos alunos, a boa aula de Matemática é aquela onde há interação entre
professor e alunos, isto é, para eles o diálogo entre professor e aluno em sala de aula
se faz necessário, (ver Tabela II).
Já na terceira pergunta Como você se sente durante a aula de Matemática?
Mais uma resposta surpresa, 60% dos alunos responderam que se sentem
interessado durante a aula de Matemática. Baseado em nossas experiências de sala de
aula, esperava-se que a maioria respondesse desinteressado ou indiferente (ver Tabela
III).
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6004
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Na quinta pergunta O que você acha das aulas de Matemática no geral?
Sessenta por cento (60%) dos alunos acreditam ser a aula de Matemática, uma
aula normal. Esperava-se que a maioria respondesse ser ela, uma aula chata (ver Tabela
IV).
As questões 4 e 6 abordam as dificuldades dos alunos em relação à Matemática e
a importância dos conteúdos abordados nas aulas.
Com relação à quarta pergunta: Como você classificaria suas dificuldades em
relação à Matemática?
Para 69% dos alunos, a dificuldade em relação à Matemática é normal, o que já
se esperava que fosse respondido (ver Tabela V).
Na sexta pergunta Os assuntos abordados na aula de Matemática, para você?
Os alunos tiveram como opções de respostas:
Opção 1: tem importância para a vida;
Opção 2: não é necessário saber Matemática;
Opção 3: fazem parte do currículo.
Para nossa surpresa mais uma vez, 71% dos alunos responderam que tem
importância para vida. Esperava-se que a maioria respondesse que o assunto abordado
nas aulas de Matemática faz parte do currículo. (ver Tabela VI).
A questão 7 aborda o gostar ou não da Matemática e do professor. Em sua
opinião, para gostar de Matemática, é preciso gostar do professor? Nessa pergunta
obtivemos praticamente um empate, com diferença apenas de um por cento, 38% dos
alunos responderam que o gostar da Matemática e o gostar do professor estão
interligados (ver Tabela VII).
A questão 9 aborda a metodologia utilizada na aula de Matemática, sendo ela,
Você prefere as aulas de Matemática? Tendo como respostas três opções:
Opção 1: Expositiva;
Opção 2: Uso do livro didático;
Opção 3- Recursos de mídias. Resultando:
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6005
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
45% dos alunos preferem aulas expositivas. Esperava-se que a maioria
respondesse que a preferência fosse aulas com recursos de mídia (ver Tabela VIII).
As questões 10 e 11 abordam a exposição e aprendizagem dos conteúdos. Sobre
a décima pergunta: Ao constatar que você entendeu o conteúdo durante a aula de
Matemática, você se sente?
Setenta e dois por cento (72%) dos alunos se sentem satisfeitos quando
entendem o conteúdo durante a aula de Matemática. Esperava-se encontrar um número
maior de alunos que nunca entendem o conteúdo nas aulas de Matemática (ver Tabela
IX).
Quanto à décima primeira pergunta: Após a exposição do conteúdo
matemático, depois da aula, você busca ajuda? Mais uma surpresa na resposta, 44%
dos alunos responderam que buscam ajuda dos colegas. Espera-se que respondessem
que procuravam ajuda do professor (ver Tabela X).
Quanto ao Questionário I, observamos algumas surpresas nas respostas dos
alunos. A maioria prefere a aula de Matemática na exposição dos conteúdos, achando-a
normal e dizem interessados durante a mesma. Quanto aos conteúdos, os alunos
acreditam que tem importância para a vida, assim como as dificuldades encontradas nos
mesmos são consideradas normais. Ficam satisfeitos ao entenderem os conteúdos e
quando há dúvidas consultam os colegas.
6- Estudando os Polinômios: uma banda
Um dos grupos, bandas, denominado Estudando os Polinômios, sendo este
também o título da composição escrita por eles, se inspiraram na música Quem de Nós
Dois, uma das famosas músicas da cantora brasileira Ana Carolina.
Abaixo a letra da Banda Estudando os Polinômios:
Os polinômios
Não é assim tão complicado
Não é difícil aprender
Quem de nós dois
Vai dizer que é impossível
Os polinômios entender.
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6006
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Se eu disser que já não sei mais nada
Que as aulas com Valdir é mais segura
Eu sei todos vão rir da minha cara.
E já conheço os polinômios, sei desenrolar.
O grau do polinômio
É o maior expoente do termo
Vou te dizer
Quando os termos forem iguais a zero, é nulo pode se ligar.
Entre as identidades
Não há nenhum segredo
Os termos correspondentes são iguais
Usando o método da chave
Obtemos a divisão dos polinômios.
E quando x menos a é igual a p(a)
Esse é o teorema do resto
Que você vai aprender
E quando estudo os polinômios
Eu não esqueço de nada
E cada vez que eu estudo, eu aprendo mais
O dispositivo de Briott-ruffini é bom demais
É com raiz e o quociente que acha o resto
Eu faço do estudo o melhor futuro. (2 vezes)
E mesmo que eu não queira aprender o que foi passado
Nem entender um assunto tão complicado
Mas toda vez que eu começo a estudar
Acabo entendendo o T.F.A. (2 vezes)
Eu procurei qualquer desculpa para não estudar
Prá entender e enfim aprender
As relações de Girrard
Que a soma de duas raízes é menos b sobre a
E se for multiplicar é c sobre a
E se eu tentar somar três raízes
É menos b sobre a que eu tenho que usar
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6007
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
E se for multiplicar
Usa menos d sobre a.
A composição descrita acima, do grupo de alunos da Banda Estudando os
Polinômios, retrata o tema Polinômios de uma forma lúdica, não se detendo a
memorização de procedimentos e regras.
Foi apreendido pelo grupo de alunos os conceitos de grau do polinômio e
polinômio nulo, como descrito na letra de sua composição:
E já conheço os polinômios, sei desenrolar.
O grau do polinômio
É o maior expoente do termo
Vou te dizer
Quando os termos forem iguais a zero, é nulo pode se ligar
Ficou claro também, aos alunos envolvidos nesta composição, como manipular
os termos das identidades polinomiais, assim como obter a divisão dos polinômios,
como segue:
Entre as identidades
Não há nenhum segredo
Os termos correspondentes são iguais
Usando o método da chave
Obtemos a divisão dos polinômios.
Como também ficou entendido a eles como determinar o resto da divisão de
polinômios:
E quando x menos a é igual a p(a)
Esse é o teorema do resto
Que você vai aprender
Ficou claro aos alunos como trabalhar o dispositivo de Briott-Ruffini, e
encontrar o quociente e o resto na divisão dos polinômios, como também ficou
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6008
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
entendido o teorema fundamental da álgebra como mostra a letra da composição a
seguir:
E cada vez que eu estudo, eu aprendo mais
O dispositivo de Briott-ruffini é bom demais
É com raiz e o quociente que acha o resto
Eu faço do estudo o melhor futuro. ( 2 vezes)
E mesmo que eu não queira aprender o que foi passado
Nem entender um assunto tão complicado
Mas toda vez que eu começo a estudar
Acabo entendendo o T.F.A. (2 vezes)
Nas equações polinomiais, ficou entendido aos alunos as relações de Girard,
assim como foi apreendido como adicionar e multiplicar raízes, como segue:
Eu procurei qualquer desculpa para não estudar
Prá entender e enfim aprender
As relações de Girrard
Que a soma de duas raízes é menos b sobre a
E se for multiplicar é c sobre a
E se eu tentar somar três raízes
É menos b sobre a que eu tenho que usar
E se for multiplicar
Usa menos d sobre a.
Observamos que o grupo de alunos compreendeu o estudo dos Polinômios.
Mostraram esta compreensão compondo e cantando, ao contrário da aula expositiva,
onde o aluno, geralmente, se detém apenas aos procedimentos e aplicações do conteúdo.
Este trabalho de compor músicas envolveu também momentos de estudo do
grupo de alunos. Precisaram retomar o que haviam aprendido e trabalhado em sala de
aula, durante as aulas expositivas sobre o estudo dos polinômios. Nos momentos de
estudo deles, precisaram se reunir, planejar, tomar decisões, como por exemplo, o que
mais de importante se deve saber sobre polinômios, quais os conceitos e as regras
fundamentais dos mesmos e o que deveria estar presente na composição da música que
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6009
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
estavam criando. Ativando-se assim o processo de construção de conhecimento do e no
grupo, dando significado ao conteúdo abordado na composição e já trabalhado em sala
de aula.
Observamos que essa atividade despertou mais o estudar, na própria letra da
composição do grupo, várias vezes aparece a palavra estudo e/ou estudar, assim como
trouxe melhor entendimento sobre os polinômios. Aproximou o grupo, ao se juntarem
para desenvolver essa atividade lúdica. Até então os estudos eram feitos de maneira
individual.
7- Comentários Finais
Espera-se com a realização desta pesquisa que se possam alcançar resultados
com relação ao interesse e motivação dos alunos para com a Matemática e sua
assimilação, o alcance do conhecimento matemático, como também difundir o uso da
Música para o ensino e aprendizagem da Matemática como um potencial recurso
didático.
A Matemática entra em cena constantemente desde o experimento de Pitágoras
até os dias de hoje. Cabe ressaltar que na pesquisa em questão não se pretende fazer
com que a Música explique completamente a Matemática, mas sim, estudar as possíveis
aplicações das relações entre a Matemática e a Música na construção do processo de
ensino e aprendizagem da Matemática.
Nesse sentido, a pesquisa em questão se propõe que se aprofunde a busca, em
particular a relação prática/teoria no ensino e aprendizagem da Matemática através da
música em forma de Paródias, possibilitando ao professor efetuar relações entre a
Matemática e a Música. Desde já, acreditamos ser significativo trabalhar uma
abordagem de ensino por meio de uma atividade lúdica, explorando assim os conteúdos
matemáticos apresentado no currículo.
8- Referências Bibliográficas
ABDOUNUR, O. J. Matemática e música: o pensamento analógico na construção de
significados. 3. ed. São Paulo: Escrituras Editora, 2003.
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6010
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BATISTA, Joel Hermenegildo. Projeto cantando a matemática. Disponível em:
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D’AMBRÓSIO, Beatriz S. Como ensinar matemática hoje? temas e debates. SBEM,
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GAMA, Maria C. S. Salgado. A Teoria das Inteligências Múltiplas e suas
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RIBEIRO, Marcos Viana. IX Encontro Gaucho de Educação Matemática. Caxias do
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R. C. Competências nas políticas de currículo: recontextualização pela comunidade
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Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
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Ciências v.7, n. 1, 2007. Disponível em
<http://www.fae.ufmg.br/abrapec/revistas/V7N1/v7n1a3.pdf > Acesso em: 01 set. 2009.
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e os novos mapas políticos e culturais. Petrópolis: Vozes, 1995.
9- Anexos I (Questionário I)
1- Para você, a aula de Matemática com exposição dos conteúdos é?
(
) Monótona
(
) Cansativa
(
) Normal
(
) Legal
2- Você considera uma boa aula de Matemática quando:
(
) O professor faz a exposição dos conteúdos
(
) Há interação entre professor e alunos
(
) O conteúdo é trabalhado por meio de recursos tecnológicos
(
) O aluno faz apresentações com relação aos conteúdos
3- Como você se sente durante a aula de Matemática?
(
) Indiferente
(
) Motivado
(
) Interessado
(
) Desinteressado
4- Como você classificaria suas dificuldades em relação à Matemática?
(
) Normal
(
) Mínima
(
) Pequena
(
) Nenhuma
5- O que você acha das aulas de Matemática no geral?
(
) Legal
(
) Normal
(
) Interessante
(
) Chata
6- Os assuntos abordados na aula de Matemática, para você:
(
) tem importância para a vida
(
) não é necessário saber Matemática
(
) fazem parte do currículo
7- Em sua opinião, para gostar de Matemática, é preciso gostar do professor?
(
) Sim
(
) Não
(
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
) Indiferente
(
) Estão interligado
6012
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
8- Se fosse para você mudar algumas regras no funcionamento das aulas de
Matemática, o que você mudaria? Por que ?
9- Você prefere as aulas de Matemática:
(
) Expositiva
(
) Uso do livro didático
(
) Recursos de mídias
10- Ao constatar que você entendeu o conteúdo durante a aula de Matemática, você
se sente?
(
) Normal
(
) Satisfeito
(
) Vitorioso
(
) Nunca entende
11- Após a exposição do conteúdo matemático, depois da aula, você busca ajuda:
(
) Do professor
(
) Dos colegas
(
) Do livro
(
) Não precisa
12- Você tem algum comentário ou sugestão a fazer em relação à aula de
Matemática?
10- Anexo II (Tabelas)
Respostas
Quantidade Respondida
Resultado em %
Monótona
1
1%
Cansativa
8
9%
Normal
58
64%
Legal
23
26%
Não Respondeu
Total
90
100%
Tabela I: Primeira pergunta do Questionário I
Na segunda pergunta Você considera uma boa aula de Matemática quando, os
alunos tiveram como opções de respostas:
Opção1: O professor faz a exposição dos conteúdos;
Opção 2: Há interação entre professor e alunos;
Opção 3: O conteúdo é trabalhado por meio de recursos tecnológicos;
Opção 4: O aluno faz apresentações com relação aos conteúdos. O resultado foi:
Respostas
Opção 1
Quantidade Respondida
10
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
Resultado em %
11%
6013
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Opção 2
Opção 3
Opção 4
Não respondeu
Total
Respostas
Indiferente
Motivado
Interessado
Desinteressado
Não respondeu
Total
Respostas
Legal
Normal
Interessante
Chata
Não respondeu
Total
62
69%
12
13%
4
5%
2
2%
90
100%
Tabela II: Pergunta 2 do Questionário I
Quantidade Respondida
7
23
54
6
Resultado em %
8%
25%
60%
7%
90
100%
Tabela III: Pergunta 3 do Questionário I
Quantidade Respondida
15
54
19
2
Resultado em %
17%
60%
21%
2%
90
100%
Tabela IV: Pergunta 5 do Questionário I
Respostas
Normal
Mínima
Pequena
Nenhuma
Não respondeu
Total
Quantidade Respondida
62
7
17
2
Resultado em %
69%
8%
19%
2%
2
90
2%
100%
Tabela V: Pergunta 4 do Questionário I
Na sexta pergunta Os assuntos abordados na aula de Matemática, para você,
os alunos tiveram como opções de respostas:
Opção 1: tem importância para a vida;
Opção 2: não é necessário saber Matemática;
Opção 3: fazem parte do currículo. O resultado foi:
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6014
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Respostas
Opção 1
Opção 2
Opção 3
Não respondeu
Total
Quantidade Respondida
64
4
22
Resultado em %
71%
4%
25%
90
100%
Tabela VI: Pergunta 6 do Questionário I
Respostas
Quantidade Respondida
Sim
Não
Indiferente
23
33
Resultado em
%
25%
37%
34
38%
90
100%
Estão interligados
Total
Tabela VII: Pergunta 7 do Questionário I
A questão 9 aborda a metodologia utilizada na aula de Matemática, sendo ela,
Você prefere as aulas de Matemática? Tendo como respostas três opções:
Opção 1: Expositiva;
Opção 2: Uso do livro didático;
Opção 3- Recursos de mídias. Resultando:
Respostas
Opção 1
Opção 2
Opção 3
Não respondeu
Total
Quantidade Respondida
41
27
22
Resultado em %
45%
30%
25%
90
100%
Tabela VIII: Pergunta 9 do Questionário I
Respostas
Normal
Satisfeito
Vitorioso
Nunca entende
Não respondeu
Total
Quantidade
Respondida
8
65
15
2
Resultado em %
90
100%
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
9%
72%
17%
2%
6015
Musicalizando o Currículo: uma proposta de ensino e aprendizagem matemática
Tabela IX: Pergunta 10 do Questionário I
Respostas
Professor
Dos colegas
Do livro
Não precisa
Não respondeu
Total
Quantidade Respondida
15
40
32
3
Resultado em %
17%
44%
36%
3%
90
100%
Tabela X: Pergunta 11 do Questionário I
Valdir de Sousa Cavalcanti & Abigail Fregni Lins
6016
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a reflexão crítica na prática dos professores que ensinam