EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA VARA EMPRESARIAL DA COMARCA DA CAPITAL DO RIO DE JANEIRO. COMISSÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, órgão vinculado à Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro CNPJ n.º 30.449862/0001-67 sem personalidade jurídica, especialmente constituído para defesa dos interesses e direitos dos consumidores, estabelecida à Rua Dom Manoel s/n, Praça XV, Rio de Janeiro-RJ vem, por seus procuradores, propor AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA Em face de FEDERAÇÃO DE FUTEBOL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO- registrada no CNPJ sob o nº 01.669.316/001-33, com endereço à Rua Jornalista Waldir Amaral, no. 20 –Maracanã, Rio de Janeiro – RJ, Cep: 20271-160, AMÉRICA FOOTBALL CLUB, registrado no CNPJ sob o n° 33898.610/001-03, com endereço à Rua Campos Sales, 118, Tijuca, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 20270-211, BOAVISTA SPORT CLUB, registrado no CNPJ, sob o n°36.479.483/0001-04, com endereço na Travessa Joaquim Olinda da Costa – Bacaxá – Saquarema/RJ, Cep: 28993-000, BOTAFOGO DE FUTEBOL E REGATAS, registrado no CNPJ sob o n° 34.029.587/0001-83, com endereço na Avenida Wesceslau Brás, 72, Botafogo, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 22290140, CLUBE DE REGATAS DO FLAMENGO, registrado no CNPJ sob o n°33.649.575/0001-99, com endereço na Avenida Borges de Medeiros, 1111, Lagoa, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 22340-080, FLUMINENSE FOOTBALL CLUB, registrado no CNPJ sob o n° 33.647.553/0001- 90, com endereço à Rua Álvaro Chaves, 41, Laranjeiras, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 22231-200, MADUREIRA ESPORTE CLUBE, registrado no CNPJ sob o n° 42.2444.442/0001-23, com endereço à Rua Conselheiro Galvão, 130, Madureira, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 21360-000, CLUBE DE REGATAS VASCO DA GAMA, com registro no CNPJ sob o n° 33.617.465/000145, com endereço à Rua General Almério de Moura, 131, São Cristóvão, Rio de Janeiro/RJ, Cep: 20921-060, AMERICANO FUTEBOL CLUBE, registrado no CNPJ sob o n° 29.116.849/0001-61, com endereço à Rua 20 de Março, 948, Campos, RJ, Cep: 28085-480, ASSOCIAÇÃO DESPORTIVA CABOFRIENSE, registrado no CNPJ sob o n° 01.661.864/0001-63, com endereço à Rua Treze de Novembro, 386, Centro – Cabo Frio/RJ, FRIBURGUENSE ATLÉICO CLUBE, registrado no CNPJ sob o n° 30.553.705/0001-05, com endereço à Rua Jardel Hottz s/n, Nova Friburgo, RJ, Cep: 28625-180, NOVA IGUAÇU FUTEBOL CLUBE, com registro no CNPJ sob o n°86.056.036/0001-55, com endereço na Avenida Governador Roberto da Silveira, 1357 – Centro - Nova Iguaçu/RJ, Cep: 26210-210 e VOLTA REDONDA FUTEBOL CLUBE, com registro no CNPJ sob o n° 29.444.957/0001-09, com endereço à Rua Panamá, 200, Vila Americana, Volta Redonda/RJ, Cep: 27202-200, com fundamento na Constituição da República Federativa do Brasil, artigo 5° . , inciso XXXII, no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), artigo 4º., caput e inciso III; artigo 6º., incisos III e IV c/c o artigo 39, incisos V e X; artigo 81, parágrafo único e artigo 82, inciso III; na Lei no. 10.671, de 15 de maio de 2003 (Estatuto de Defesa do Torcedor), bem assim nos demais dispositivos legais atinentes e aplicáveis à espécie, pelas razões fáticas e jurídicas que expõe a seguir: PRELIMINARES Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da legitimidade ativa da autora Tendo em vista que o CDC é, conforme acima mencionado, norma especial de ordem pública e interesse social, e por tratar de matéria processual, mais precisamente sobre a legitimidade ativa ad causam dos órgãos da administração pública para propositura de ações coletivas de consumo (que objetivam defender os direitos e interesses previstos no parágrafo único do artigo 81), deve ser aplicado prioritariamente em relação as demais normas processuais aplicáveis, no caso o Código de Processo Civil e a Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública), conforme expressamente determinado em seu art. 90. “(...) Examinando agora a questão inicialmente proposta, entendemos que, após a vigência do Código de Defesa do Consumidor, apenas os entes legitimados pelo art. 82 podem propor ações coletivas em defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das pessoas equiparadas. Com efeito, o CDC é lei específica para proteção do consumidor, tout court, e prefere, neste ponto, à Lei da Ação Civil Pública, que cuida da ação de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, com bem maior generalidade”. (COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: Direito Processual, Luiz Paulo da Silva Araújo Filho, ed. Saraiva, pp 66/67, grifei). “As normas do CPC e da LACP são aplicáveis às ações individuais e coletivas fundadas no CDC, desde que não sejam incompatíveis com o microssistema do CDC. Caso contrarie dispositivo expresso do CDC ou seu espírito, a norma do CPC ou da LACP não pode ser aplicada” (Nelson Nery Junior, Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, atualizado até 01.08.1997, 3ª edição, ed. RT, p. 1402) (Grifei). “As disposições da LACP são integralmente aplicáveis às ações propostas com fundamento no CDC, naquilo em que não houver colidência, como é curial. (...) Há, por assim dizer, uma perfeita interação entre os sistemas do CDC e da LACP, que se completam e podem ser aplicados indistintamente às ações que versem sobre direitos ou interesses difusos, coletivos e individuais, observado o princípio da especialidade das ações sobre relações de consumo, às quais se aplica o Título III do CDC e só subsidiariamente a LACP” (Nelson Nery Junior, Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, 8ª edição, ed. Forense Universitária, São Paulo 2005, pp. 1032/1033). (Grifei) A legitimidade ativa da autora, que é, inegavelmente, um órgão da administração pública direta destinada à defesa dos direitos e interesses dos consumidores, decorre diretamente da leitura do artigo 82, III, do CDC, que não deixa margem para uma aplicação integrada com outras normas. “Na nossa Federação, portanto, as entidades estatais, ou seja, entidades com autonomia política, são unicamente a União, os Estados-membros, os Municípios e o Distrito Federal, cuja organização é estudada em capítulo próprio. As demais pessoas jurídicas instituídas ou autorizadas a se constituírem por lei ou são autárquicas, ou são fundações, ou são entidades paraestatais, como veremos ao cuidar dos serviços públicos. Esse conjunto de entidades estatais, autárquicas, fundacionais e paraestatais constitui a Administração Pública em sentido instrumental amplo, ou seja, a Administração centralizada e descentralizada, atualmente denominada direta e indireta. (Direito Administrativo Brasileiro, 28ª edição, pp. 59). Código de Defesa do Consumidor, artigo 82: “Para os fins do artigo 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: (...) III – as entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código.” Convém ressaltar que a atribuição específica para demandar em juízo, exigida por alguns aplicadores da lei (indevida, no entendimento da autora e no entendimento expressado no julgamento do recurso de apelação no. 2006.001.13728, 10ª Câmara Cível, Rel. Desembargador José Carlos Varanda), foi recentemente acrescentada ao Regimento Interno da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, com a inclusão da alínea “d” ao parágrafo 19 do seu artigo 26. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA DO CONSUMIDOR. COMISSÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DESTE ESTADO. ILEGITIMIDADE. O ART. 82, III, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, CONFERE LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA AOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO QUE NÃO TENHAM PERSONALIDADE JURÍDICA PARA ESTAR EM JUÍZO EM DEFESA DOS DIREITOS DO CONSUMIDOR, MAS DESDE QUE TENHAM TAL FINALIDADE. A COMISSÃO AUTORA DESTA AÇÃO NÃO TINHA, QUANDO AJUIZADA A AÇÃO ESSA FINALIDADE DENTRE SUAS ATRIBUIÇÕES PREVISTAS NO REGIMENTO INTERNO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. É, PORTANTO, PARTE ILEGÍTIMA, O QUE, ALIÁS, FOI RECONHECIDO PELA PRÓPRIA ASSEMBLÉIA, QUE, EM RESOLUÇÃO DESTE ANO DE 2006, ALTEROU SEU REGIMENTO E INCLUIU TAL FINALIDADE. PROVIMENTO DO SEGUNDO APELO, PARA JULGAR EXTINTO O PROCESSO, FICANDO PREJUDICADO O PRIMEIRO RECURSO (TJRJ, ApCiv. 2005.001.53288, 15ª Cam.Civ. Rel. Dês. Sergio Lucio de Oliveira e Cruz). AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE DA COMISSÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. 1 – A Comissão de Defesa do Consumidor Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro não possuía a época do ajuizamento da ação legitimidade para estar em juízo. 2 – A circunstância de ter sido editada recentemente Resolução conferindo-lhe a mencionada atribuição de defesa do consumidor não interfere no resultado, na medida em que as questões relacionadas à capacidade para estar em juízo e legitimidade devem ser apreciadas a luz da legislação em vigor por ocasião do ajuizamento da ação. 3 – Desprovimento do recurso. (TJRJ, ApCiv. 2006.001.22785, 15ª CamCiv, Rel. Des. Jaqueline Montenegro). Art. 26, Regimento Interno da ALERJ. § 19 – À Comissão de Defesa do Consumidor compete: b) manifestar-se sobre composição, qualidade, apresentação, publicidade e distribuição de bens e serviços, relações de consumo e medidas de defesa do consumidor; c) acolher e investigar denúncias sobre matéria a ela pertinente e receber a colaboração de entidades e associação relacionadas à defesa do consumidor ; d) representar a título coletivo, judicialmente ou extrajudicialmente, os interesses e direitos previstos no parágrafo único do art. 81, conforme autorização expressa no art. 82, III, todos da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. (dispositivo acrescentado recentemente, publicado no DO Estadual do Poder Legislativo do dia 17/02/2006 (Grifamos) Ementa do acórdão proferido no mencionado recurso de apelação n. ° 2006.001.13728. Ação Civil Pública. Direito do Consumidor. Comissão de Defesa do Consumidor da Assembléia Legislativa. Legitimação por força do inciso III do art. 82 do CDC. Sentença que se reforma. Recurso provido (TJRJ, ApCiv. 2006.001.13728, 10ª Cam. Civ. Rel. Des. José Carlos Varanda). Portanto, não se pode negar que a autora possui legitimidade ativa para figurar no pólo ativo da presente demanda coletiva de consumo. DOS FATOS: A imprensa local, em 17.01.07 (DOC. 03, 04, 05, 06) deu grande destaque ao inusitado – e imprevisto – aumento sobre os preços dos ingressos para o Campeonato Estadual da Primeira Divisão, acordado, em 16.01.07 pelas agremiações desportivas ora demandadas. Em face do percentual de aumento imposto pelas Rés, a chamada “entrada” para as partidas realizadas no Maracanã e nos demais estádios teve seus preços majorados de forma abrupta, desleal e extremamente gravosa para os torcedores. Em página retirada da Internet, a Federação de Futebol do Rio de Janeiro (Ferj) – DOC. 02 - procura se eximir da responsabilidade pelos aumentos, alegando que a determinação dos preços dos ingressos é atribuição dos clubes que disputam o campeonato. Ocorre que, houve inegável omissão por parte da FERJ, tendo-se em vista ser a mesma responsável por autorizar atos provenientes das deliberações das agremiações. Portanto, além dos clubes da Primeira Divisão que estão disputando o Campeonato Carioca de 2007 (DOC. 02) e que decidiram, após deliberação conjunta, pelo aumento dos valores dos ingressos, a Ferj deve integrar, também, o pólo passivo da presente demanda, já que autorizou tal majoração, podendo e devendo manifestar-se contrariamente ao percentual que incidiu sobre os valores anteriores. O aumento, sem razão plausível que lhe dê suporte, é da ordem de 100%! Conforme informações fornecidas pela imprensa (DOC. 03 a 06) e pela Federação de Futebol do Rio de Janeiro (Ferj) – DOC. 02, com a nova determinação, os bilhetes da arquibancada nos jogos do Maracanã passam de R$ 15 para R$ 30. E a meia-entrada para estudantes, R$ 15. Quem quiser ficar nas cadeiras especiais passará desembolsará R$ 100, ao invés de R$50, que passou a corresponder à meia-entrada neste setor. A incidência de um aumento em percentual tão elevado só poderia ser aceita mediante prévia disponibilização, aos torcedores-consumidores e aos órgãos de defesa e proteção dos mesmos, das planilhas de custos e a forma de elaboração dos cálculos que tenham embasado a estipulação dos reajustes ora guerreados. Ao invés de planilhas, os clubes, por meio de seus dirigentes, apresentam aos torcedores, cuja presença é parte do show que se desenrola nos campos, justificativas desprovidas de qualquer conteúdo e que demonstram total desrespeito para com aqueles são responsáveis por parcela considerável do sucesso do espetáculo protagonizado pelos jogadores nos gramados (DOC. 05). O presidente do Botafogo (4º. Réu), Bebeto de Freitas, em recente entrevista, apresentou o seguinte argumento: “Todos os clubes investiram muito para esse Estadual. Agora queremos o retorno. A nossa intenção é ajustar o preço ao valor do espetáculo.” Eurico Miranda, presidente vascaíno, usou a meia-entrada como desculpa para o aumento: “(...). Trata-se de um mecanismo de defesa por conta da meia-entrada. E isso não é exclusivo do futebol Já vem ocorrendo em qualquer espetáculo.” Para Kleber Leite, vice-presidente de futebol do Flamengo (5º. Réu), trata-se de uma questão de tempo até o torcedor se acostumar com o novo valor dos ingressos: “O Maracanã foi melhorado. O torcedor pagará um preço compatível para ficar em uma área nobre do estádio. Tudo é questão de tempo até que os torcedores se acostumem. Eles ainda não conhecem a nova estrutura do estádio”. A que espécie de investimento se refere o Sr. Bebeto de Freitas? Estariam os clubes, com a anuência da FERJ, procurando transferir para os torcedores responsabilidades exclusivamente suas? A toda evidência, não cabe ao torcedor assumir obrigações contraídas pelas agremiações, como as derivadas de aquisições de novos jogadores, nem responder por quaisquer despesas, como as advindas, por exemplo, da confecção de novos uniformes. O popular presidente de futebol do Vasco da Gama ( 8º. Réu) acredita, pelo que podemos aferir de suas declarações aos jornais (DOC. 05), que a meia-entrada represente uma agressão, já que justifica os exorbitantes aumentos nos valores dos ingressos como “mecanismo de defesa por conta da meia-entrada”. Alega, ainda, o Sr. Eurico Miranda, que não se trata de medida adotada apenas no futebol, mas que “já vem ocorrendo em qualquer espetáculo”. Desde que a Lei Estadual 2519, que trata da meia-entrada, entrou em vigor, em 1996, nunca se teve notícias de aumentos de 100% nos valores dos ingressos dos espetáculos em cartaz! Também não se tem conhecimento de estabelecimentos culturais e de lazer que, em razão da adesão à meia-entrada, tenham precisado fechar as portas. O Sr. Kleber Leite, vice-presidente de futebol do Flamengo (5º. Réu), mostrou não conhecer o perfil daqueles que torcem pelo seu clube, e que, segundo as estatísticas, integram a maior torcida de futebol do País. Dizer que os torcedores “se acostumarão” a ser enganados, “se acostumarão” a pagar o dobro do que pagavam para assistir aos jogos, sem que seus salários tenham dobrado, “se acostumarão”, enfim, com o gritante desrespeito que os aumentos representam, é duvidar da capacidade de se indignar de uma categoria que, por diversas vezes já demonstrou que o comodismo não faz parte de seu perfil. Os clubes de futebol auferem renda de diversas fontes. Patrocínios, direitos de imagem da transmissão dos jogos e, algumas vezes, de alguns jogadores e a venda de artigos relacionados aos times são apenas alguns, não tendo sido, até o presente momento, demonstrado ser necessário dobrar os valores dos ingressos para que o Campeonato Carioca possa acontecer. A falta de transparência que permita fiscalizar a justa causa de referido aumento permite que os réus procedam a reajuste em percentual muito acima da variação da inflação no período respectivo. Traçando-se um paralelo entre o valor atual do salário-mínimo nacional e o preço recentemente fixado por um lugar na arquibancada do Maracanã em jogos de times da Primeira Divisão - R$30, conclui-se que este representa, praticamente, 10% daquele! A repercussão dos aumentos entre os torcedores – consumidores – foi extremamente negativa, conforme noticiado na mídia, e o foi com sobradas razões, uma vez que qualquer pessoa com o mínimo de sensibilidade percebe claramente que está sendo explorada e usurpada em suas economias. O que deveria ser considerado pelos dirigentes dos clubes de futebol da Primeira Divisão do Campeonato Carioca e pela Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj) é que existe uma conta que nenhuma calculadora é capaz de fazer; a do bem-estar social que o lazer proporcionado pelo espetáculo que têm em mãos proporciona às classes menos favorecidas. Diante dos fatos expostos e da evidência de que os Réus estão desrespeitando a legislação, atuando de forma abusiva e exigindo dos torcedores-consumidores vantagem manifestamente excessiva, cabe a esta Comissão submeter a matéria ao Poder Judiciário, através da presente Ação Civil Pública. DO DIREITO: As agremiações desportivas e a Federação ora demandadas buscam transferir para o consumidor responsabilidade exclusivamente sua, conquanto não caiba ao torcedor arcar com as obrigações peculiares aos referidos clubes. Com efeito, na relação de consumo que se estabelece entre os consumidores (torcedores) e os clubes (fornecedores do serviço), claro está que a obrigação dos primeiros consiste em pagar o valor correspondente ao ingresso de entrada no estádio, enquanto a agremiação é responsável pela realização do evento desportivo, garantindo ao torcedor a segurança de sua integridade física nos locais onde se ocorrem tais eventos, durante e após a realização das partidas. Trata-se de uma típica relação jurídica de consumo, tanto assim que o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671, de 23 de maio de 2003) – DOC. 07, estabelece em seu artigo 3º o seguinte: “Para os efeitos legais, equipara-se a fornecedor, nos termos da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo.” A seu tempo, o artigo 40, da citada lei, prescreve que a defesa dos interesses e direitos dos consumidores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores de que trata o Título III da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (CDC). Tendo em conta trata-se - repita-se - de inequívoca relação jurídica de consumo, onde estão claramente delineados seus elementos caracterizadores, isto é, partes (consumidor x fornecedor) e objeto (serviço), ressai iniludível que o consumidor há de ser reconhecido como ente vulnerável, tal como preconizado na cabeça do artigo 4º, inciso I, do CDC, reclamando, por conseguinte, a intervenção estatal em sua defesa, de sorte a assegurar a incolumidade dos seus direitos e interesses, não permitindo, em via de conseqüência, que a parte mais forte na relação de consumo (os times de futebol) se sobreponha aos entes vulneráveis. No caso concreto, há grave ofensa aos interesses econômicos dos consumidores – considerados em amplitude difusa – conquanto as equipes de futebol, ora demandadas, pretendem impor preço injustificadamente mais elevado do que aquele até então praticado, inserindo o consumidor em situação de onerosidade excessiva, e o que é pior, em decorrência de fatos sobre os quais não têm o menor domínio. Transferir para os torcedores – como pretendem os times, com anuência da Ferj – responsabilidades exclusivamente suas, constitui inominável absurdo, verdadeiro abuso de direito, consubstanciado, principalmente, como a exigência de vantagem manifestamente excessiva e elevação injustificada de preços (CDC, arts. 39, incisos V e X). Sobre a afirmação feita no parágrafo antecedente, é cabível e apropriado deixar assente que a vantagem excessiva constitui prática comercial que bem exemplifica o abuso do direito nas relações de consumo. A propósito deste aspecto, assegura-nos o Professor Guilherme Fenandes que: “Tal vantagem excessiva pode ser exigida em qualquer das fases da relação de consumo, tanto na pré-contratual, na fase denominada de conclusão ou ‘fechamento’ – quando o contrato se ajusta – ou mesmo na fase de execução do negócio jurídico. Impõe ainda asseverar que, se por um lado há a exigência de vantagem manifestamente excessiva por parte do fornecedor, por outro lado há a onerosidade excessiva por parte do consumidor – espécie presumida do gênero ‘desvantagem exagerada’ (art. 51, § 1º, do CDC)”. Sobressai evidente que essa vantagem excessiva (CDC, art. 39, inc. V) encontra correspondência na elevação injustificada dos preços dos ingressos (CDC, art. 39, X). Esses fenômenos jurígenos terminam por infirmar o Princípio da Proporcionalidade – que para KARL LARENZ, ao citar LECHE, chama de Princípio da Proibição do Excesso. Demonstrado a relação entre a vantagem excessiva e o princípio da proporcionalidade, recorre-se, novamente, à cátedra do Professor GUILHERME FERNANDES NETO, para quem: “A exigência de ‘vantagem manifestamente excessiva’ é a clara positivação do subprincípio da proporcionalidade em sentido restrito – advindo do denominado princípio amplo da proporcionalidade ou princípio da proibição do excesso (Ubermassverbot) e, a interpretação deve ser conjugada com o denominado princípio do equilíbrio das relações de consumo, contido no artigo 4º, inc. III, do CDC”. Diante dessa conjugação de argumentos, é de se observar que os Réus tomaram o torcedor de surpresa, noticiando, às vésperas dos eventos esportivos, o descomunal aumento sobre os preços dos ingressos para os jogos, o que vem a configurar, induvidosamente, método comercial desleal, assim compreendido como a violação de direito básico do consumidor, insculpido no artigo 6º, inc. IV, da Lei 8.078/90. Quanto ao que ora é afirmado, não se tenha dúvida de que o método comercial desleal decorre da previsibilidade de grande comparecimento de torcedores aos estádios. Para os dirigentes dos clubes, esta é uma boa hora de aumentar os seus ganhos, nem que para isso seja necessário explorar a fidelidade do torcedor que, em determinadas circunstâncias, priva-se de adquirir um bem de maior necessidade para não se ver impedido de comparecer ao “espetáculo” esportivo. Essa majoração excessiva nos preços dos ingressos transpõe as fronteiras da total ausência de ética empresarial, correspondente à infidelidade e falta de compromisso para com o torcedor, alcançando, literalmente, o “status” de infração consumerista, corporificada como método comercial desleal, exigência de vantagem excessiva e elevação sem justa causa do preço do serviço (CDC, art. 6º, inc. IV, art. 39, V e X). Quanto à elevação do preço sem justa causa, assoma oportuna a transcrição dos comentários abalizados do Professor ANTONIO HERMAN DE VASCONCELOS E BENJAMIN, um dos autores do anteprojeto do CDC, que sobre o assunto pronuncia-se da seguinte forma: “Aqui não se cuida de tabelamento ou controle prévio de preço (art. 41), mas de análise casuística que o juiz e autoridade administrativa fazem, diante de fato concreto. A regra, então, é que os aumentos de preços devem sempre estar alicerçados em justa causa, vale dizer, não podem ser arbitrários, leoninos ou abusivos. Em princípio, numa economia estabilizada, elevação superior aos índices de inflação cria uma presunção – relativa, é verdade – de carência de justa causa” (grifos nossos) A bem da verdade, as justificativas apresentadas pelos times de futebol são pueris, conquanto – como dito em passo anterior - não congregam o mais ralo substrato jurídico, consistindo, isto sim, em manobra escusa para auferir lucro indevido. Estas questões, como dantes aventadas, não se prestam a justificar tantas e tamanhas transgressões ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), a saber: a) Art. 4º, inc. I: a vulnerabilidade do consumidor é aqui literalmente achacada por conta da vontade unilateral das agremiações desportivas, as quais, sem qualquer escrúpulo, impõem, à mingua de justa causa, a majoração em até 100% sobre os preços dos ingressos, tornando o valor da “entrada” proibitivo, isto é, exageradamente superior ao percentual da inflação e ao ganho percentual dito “real” sobre o valor do salário mínimo; b) Art. 4º, inc. III: sem dúvida alguma a onerosidade excessiva provoca o desequilíbrio dos interesses dos consumidores, reclamando, por via de conseqüência a intervenção do Estado-Juiz de molde a prevenir e evitar um prejuízo que alcançará milhares de pessoas; vedando, ademais, o enriquecimento ilícito, portanto sem causa, o que é abominado pelo direito; c) Art. 6º, inc. IV: refere-se, neste aspecto em particular, à utilização de método comercial desleal, uma vez que o aumento se deu por conta de interesses escusos, visivelmente voltados à percepção de vantagem pecuniária injusta e desproporcional; d) Art. 39, V: trata este dispositivo de prática abusiva, consistente na obtenção de vantagem manifestamente excessiva, uma vez que as agremiações demandadas impingiram aos torcedores (consumidores) valores exorbitantes, procurando transferir para os mesmos obrigações que são de sua exclusiva responsabilidade; e) Art. 39, X : a violação deste artigo configura, de igual modo, o cometimento de prática abusiva contra o consumidor, uma vez que está assente em razão dos fatos deduzidos linhas acima, que a elevação do preço do ingresso não tem a mais tênue causa que a justifique. Trata-se, à luz da melhor doutrina, de ato ilegal e francamente direcionado a causar graves prejuízos aos consumidores. Este dispositivo violado, bem como o anteriormente citado, têm estreita vinculação com a ofensa que se faz ao princípio da proibição do excesso. DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA: Os fatos narrados são verossimilhantes e demonstram de forma clara e inequívoca a existência do bom direito e do perigo de dano iminente em detrimento de um sem-número de consumidores. Com efeito, a verossimilhança e a aparência do bom direito dimanam dos argumentos exaustivamente expostos - alinhados nos tópicos acima (letras a/e) -, de sorte que se tem por violados incontáveis direitos e interesses dos consumidores. O perigo de dano, de sua vez, é evidente, eis que vindo a consolidar-se o brutal aumento que pretendem os dirigentes das duas agremiações, com anuência da Ferj, não há dúvida de que os torcedores (consumidores) arcarão com descomunal majoração no preço dos ingressos. DO PEDIDO DE TUTELA ANTECIPATÓRIA: Na letra do artigo 273, do Código de Processo Civil, caberá a antecipação da tutela sempre e quando verossimilhantes os fatos e, por conta dessa circunstância, houver fundado receio de grave ameaça ou lesão a direito. Em vista do exposto, requer o signatário digne-se Vossa Excelência conceder a antecipação da tutela ora porfiada, em caráter de urgência e sem a oitiva das demandadas – sob pena de perda do objeto da ação para, em assim o fazendo, proibir que as agremiações ora demandadas, com a anuência da Ferj, operem a majoração dos valores dos ingressos no percentual em que foi fixado, permanecendo os preços iguais aos cobrados para os jogos da Primeira Divisão do Campeonato Carioca de 2006, até que seja exibida planilha de custos que demonstre o real índice de aumento que, porventura, se faça necessário. Proibir qualquer outro aumento incidente sobre o ingresso nos Estádios sem que os demandados apresentem provas da real necessidade de tal majoração. DO PEDIDO DE MÉRITO: Diante do exposto, requer a Autora: A - A concessão de MEDIDA LIMINAR, inaudita altera parte, obrigando os Réus a, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas a contar da intimação da decisão concessiva de liminar, a proceder nos moldes do pedido acima, sob pena de incidência de multa diária, na forma do parágrafo 3º. do artigo 84 do C.D.C., sem prejuízo da tipificação do crime de desobediência; B – Seja recebida a presente ação e determinada, após a concessão da tutela antecipatória, a citação dos Réus nos endereços indicados supra, para, querendo, contestar a presente ação; C - Tratando-se de matéria de direito, o julgamento antecipado da lide, ratificando-se, em sua integralidade, a tutela antecipatória concedida, consistindo-se, tal ratificação, na proibição de majoração dos ingressos pelos Réus, sem que estes apresentem planilha de custos que justifique o percentual do eventual aumento, determinando-se, naquelas hipóteses em que houver prova do pagamento de importância a maior, sobre ingressos eventualmente vendidos, a devolução da diferença paga em excesso, no moldes do parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor; E – a condenação do réu à publicação do edital previsto no artigo 94 do CDC, não se restringindo, tal ato, apenas ao órgão oficial, mas também aos órgãos de imprensa estadual, às expensas do Réu; Esse pedido, além de servir para recompor o dano moral coletivo sofrido pelos consumidores e por toda a sociedade, também tem como objetivo restabelecer a harmonia e a confiança no mercado de consumo. E – a intimação do Ministério Público; F - a condenação do requerido ao pagamento dos ônus sucumbenciais; G- a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, desde logo, em face do previsto art. 87 da Lei nº 8.078/90; I - seja tornada definitiva a concessão da liminar. Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente pela juntada de documentos, e por tudo o mais que se fizer necessário à cabal demonstração dos fatos articulados na presente inicial. Dá-se a causa o valor de 10.400,00 (dez mil e quatrocentos reais). Rio de janeiro, 19 de janeiro de 2007. ADRIANA MONTANO LACAZ OAB/RJ 78.460 PAULO GIRÃO BARROSO OAB/RJ 107.255 VICTOR CALDAS WILLIAM OAB/RJ 113.689 DEBORA DE BRITO GUERREIRO OAB/RJ 146005-E