Universidade Estadual de Maringá
12 a 14 de Junho de 2013
REFLEXÕES SOBRE A ESCRITA DE SINAIS DE LIBRAS
DESDE TENRA IDADE
BÓZOLI, Daniele Miki Fujikawa (UEM)
SILVA, Tânia dos Santos Alvarez da (Orientadora/UEM)
Introdução
Com a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, regulamentada pelo Decreto nº
5.626, de 22 de dezembro de 2005, o acesso à educação para pessoas surdas tem sido
cada vez mais significativo trazendo desafios e ao mesmo tempo, trazendo novas
possibilidades para as escolas e para as universidades.
Esse novo momento na educação dos surdos impõe desafios às escolas bilíngues.
Exige-se do professor o domínio de noção básica de libras – língua brasileira de sinais
para conduzir a educação de seus alunos, nas diferentes disciplinas regulares.
A libras é reconhecida como língua natural de pessoas surdas e a língua
portuguesa, na modalidade escrita, é tida como sua segunda língua.
Um novo conhecimento possível à emancipação intelectual de alunos surdos, em
escolas bilíngues, é o sistema SignWriting. Trata-se de uma forma gráfica de
representação de línguas gestuais. No Brasil esse sistema é também conhecido como
escrita dos sinais. A escrita dos sinais é um sistema de escrita empregado para a
representação da primeira língua dos surdos – no Brasil a libras. A inserção da
disciplina de escrita de sinais na grade curricular de escolas bilíngues, além de permitir
a leitura e registro de ideias em libras pode atuar na escolarização do aluno surdo como
uma base, a partir da qual se poderá aprender a escrita de uma segunda língua – o
português. Para adquirir signwriting é imprescindível saber libras: o seu funcionamento
e as suas regras.
Neste texto em um momento inicial, discutiremos sobre a libras: a sua definição,
a sua origem, o seu funcionamento e a importância do seu uso. A retomada de aspectos
afetos à libras justifica-se por ser esta uma base para a utilização da escrita de
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sinais e ainda por constituir-se como ferramenta capaz de promover o desenvolvimento
cognitivo das crianças surdas nas escolas especializadas na área da surdez. Em um
segundo momento desse texto, apresentaremos a história do signwriting e discutiremos
sua relevância para o processo de aquisição da escrita pelos surdos desde tenra idade.
Corroborando Stumpf (2004) defendemos que o aprendizado da escrita de sinais
favorece a aprendizagem da modalidade escrita da língua portuguesa, sem bloqueios,
pelo aluno surdo.
A libras
A língua de sinais é um patrimônio da comunidade surda, sendo também, um
canal de comunicação entre surdos e ouvintes. As pesquisadoras Quadros e Karnopp
(2004) descrevem a libras como uma língua visual-espacial, ou seja, é realizada no
espaço com características visuais: as mãos, o corpo, os movimentos e o espaço de
sinalização.
A libras é utilizada pelos surdos brasileiros enquanto surdos estrangeiros têm a
sua língua de sinais. No entanto, as línguas de sinais não são universais; são
dessemelhantes para cada nação devido às suas culturas e crenças.
Todas as línguas de sinais tiveram a mesma origem tendo por base a língua de
sinais francesa. Menezes e Santos (2006) esclarecem a respeito do surgimento da libras:
O Brasil ainda era uma colônia portuguesa governada pelo imperador
Pedro II quando a língua de sinais para surdos aportou no país, mais
precisamente no Rio de Janeiro. Em 1856, o conde francês Ernest
Huet desembarcou na capital fluminense com o alfabeto manual
francês e alguns sinais. O material trazido pelo conde, que era surdo,
deu origem à Língua Brasileira de Sinais (Libras). O primeiro órgão
no Brasil a desenvolver trabalhos com surdos e mudos surgiu em 1857
foi do então Instituto dos Surdos-Mudos do Rio de Janeiro, hoje
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), que saíram os
principais divulgadores da Libras. A iconografia dos sinais, ou seja, a
criação dos símbolos só foi apresentada em 1873, pelo aluno surdo
Flausino José da Gama. Ela é o resultado da mistura da Língua de
Sinais Francesa com a Língua de Sinais Brasileira antiga, já usada
pelos surdos das várias regiões do Brasil.
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Destacamos segundo Felipe (2006), algumas informações técnicas referentes às
línguas de sinais. As palavras que compõem as línguas orais-auditivas correspondem
aos sinais nas línguas de sinais. Os sinais são formados a partir da combinação da forma
e do movimento das mãos e do ponto no corpo ou no espaço onde esses sinais são
realizados. Nas línguas de sinais podem ser encontrados os seguintes parâmetros que
formarão os sinais:
•
Configurações de mãos: são formas das mãos que podem ser o alfabeto manual
e outras formas feitas pela mão predominante (mão direita ou mão esquerda), ou
pelas duas mãos. Os sinais DESCULPAR, IDADE e TELEFONE, por exemplo,
possuem a mesma configuração de mão (com a letra ‘Y’). A diferença é que
cada uma é realizada em um ponto diferente no corpo.
Figura 1 - Sinal de DESCULPAR
Figura 2 - Sinal de IDADE
Figura 3 - Sinal de TELEFONE
Fonte: Acervo da primeira autora
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•
Ponto de articulação: é o local onde é realizado o sinal, podendo tocar alguma
parte do corpo ou estar em um espaço neutro.
•
Movimento: os sinais podem ter movimento ou não. Por exemplo, os sinais
DESCULPAR e CASA não têm movimento; já os sinais TRABALHAR e
CARRO/DIRIGIR possuem movimento.
Figura 4 - Sinal de DESCULPAR
Figura 5 - Sinal de CASA
Figura 6 - Sinal de TRABALHAR
Figura 7 - Sinal de CARRO/DIRIGIR
Fonte: Acervo da primeira autora
•
Expressão facial e/ou corporal: As expressões facial e corporal são de
fundamental importância para o entendimento real do sinal, sendo que a
entonação em língua de sinais é feita pela expressão facial.
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•
Orientação/direção: os sinais têm seu significado definidos também pela
direção que os acompanham. Assim, os verbos IR e VIR são produzidos pela
indicação de direções opostas.
Apesar da flagrante sobrevivência da libras desde a década de 1860, somente no
dia 24 de abril de 2002 essa língua foi reconhecida oficialmente em território
nacional por meio da promulgação da Lei nº 10.436, conhecida também como
“Lei de Libras”. No Brasil, a libras é a língua oficial da comunidade surda brasileira. O
aprendizado da libras para o surdo ocorre quase naturalmente, visto que para aprendê-la
não é necessário o ensino sistematizado, da mesma forma que ocorre com o português
falado para brasileiros ouvintes.
A língua natural é aquela que aprendemos sem precisar de um ensino
sistematizado, no caso da libras para surdos, o aprendizado ocorre quando forem
expostos à uma língua de sinais na escola de surdos e/ou nas comunidades
surdas. Com relação à língua portuguesa, alguns podem enfrentar dificuldades de
aprendizagem na aquisição da língua portuguesa, tanto oral quanto escrita.
Quadros (1997) afirma que, a escrita alfabética do português no Brasil não serve
para representar conceitos elaborados na libras. Um grafema, uma sílaba, uma palavra
escrita no português não apresenta nenhuma analogia com um fonema, uma sílaba e
uma palavra em libras, mas sim com o português falado. A língua portuguesa não é a
língua natural da criança surda.
Signwriting: um sistema de escrita de sinais
Signwriting é uma palavra em inglês. Sign significa sinal e writing, escrita. No
Brasil corresponde à escrita de sinais. Este é um sistema de escrita das línguas de sinais
inventado em 1974 por Valerie Sutton. No início, como coreógrafa, Sutton criou um
sistema para registrar a composição das danças que organizava, com notações de
movimentos.
Esse
sistema,
denominado
DanceWriting,
gerou
interesse
dos
pesquisadores da língua de sinais dinamarquesa, que procuravam uma forma de registrar
graficamente os sinais (Stumpf, 2002).
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A Universidade de Copenhagen solicitou à Sutton que registrasse a língua de
sinais gravada em videocassete, adaptando o sistema de escrita das danças para o de
escrita das línguas de sinais. Segue um exemplo de DanceWriting:
Figura 8 - Registro do movimento de dança
Fonte: Sutton Movement Writing
O surgimento do signwriting representou uma alternativa de registrar qualquer
língua de sinais do mundo sem passar pela transcrição da língua falada. Isso porque,
essa escrita pode expressar as configurações de mãos, os pontos de articulação, os
movimentos e as expressões faciais das línguas de sinais. Capovilla e Sutton (2009, p.
73) esclarecem que:
SignWriting permite uma descrição detalhada dos quiremas (i.e., do
grego quiros, mão) de uma Língua de Sinais e um registro preciso dos
sinais que resultam de sua combinação. Quando SignWriting é usado
pela primeira vez para documentar cientificamente os itens lexicais de
uma Língua de Sinais jamais antes escrita (como é o caso da Língua
de Sinais Brasileira).
Conforme as publicações do site www.signwriting.org, são mais de 40 países
que utilizam esse sistema em escolas, universidades, associações e outros espaços
relacionados à comunidade surda. O Brasil é um destes países que tem algumas
publicações apresentando a escrita de sinais junto aos textos em língua portuguesa.
Também a disciplina ‘Escrita de Sinais’ é componente curricular que compõe a matriz
curricular do curso de graduação em Letras/Libras.
Infelizmente, o uso da escrita de sinais não se encontra na matriz curricular das
escolas especializadas para surdos. Mesmo escolas bilíngues seguem investindo na
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língua portuguesa como única modalidade escrita das crianças surdas. É preciso lembrar
que a língua portuguesa em sua modalidade escrita constitui-se como segunda língua
dos alunos surdos. Seu aprendizado é árduo e demorado devido à falta de
acesso/domínio dos sons.
Para o surdo usuário de libras a escrita alfabética não mantém qualquer relação
com os sinais que emprega em sua língua. Isso porque a escrita alfabética está ancorada
nos sons da fala e mantém estreitas relações com esses sons. Exemplificando, podemos
refletir sobre a letra ‘A’. Sabemos que ela é a representação escrita do fonema ‘A’. Som
esse, que o surdo não discrimina auditivamente. Ressaltamos que, a grande diferença da
libras e das demais línguas orais-auditivas é a sua modalidade visual-espacial.
Já no sistema signwriting, temos a escrita do sinal ‘A’ (figura 10), um símbolo
que assemelha ao sinal da figura 9. Vejamos:
Figura 9 - 'A' em datilologia
Figura 10 - ‘A’ em signwriting
Fonte: Acervo da primeira autora
Essa escrita representa o quadrado como mão fechada com um palitinho
inclinado por ser dedo polegar. Assim, os alunos surdos usuários de libras assimilarão
facilmente e poderão transmitir suas ideais por escrito. Acreditamos que com o uso de
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escrita de sinais nas escolas, os surdos lerão e escreverão mais rápido. Stumpf (2005, p.
44) revela a sua experiência de ensino em signwriting que
[...] depois que as crianças aprendem os símbolos da escrita da língua
de sinais, aparecem muitas idéias e variações na sua escrita, pois cada
um está à vontade para expressar seu pensamento, sem a insegurança
de tentar encontrar a palavra da língua oral, que procura, e não
encontra, quando encontra não sabe bem se era aquela a palavra certa.
O aprendizado da escrita de sinais pode representar para os alunos surdos um
recurso simbólico a mais para seu desenvolvimento intelectual. Acreditamos que esse
saber pode favorecer a aprendizagem da língua majoritária do Brasil, tanto na
modalidade falada como na modalidade escrita. Assim, tendo por base a escrita de
sinais, o aluno surdo contará com novas ferramentas intelectuais para enfrentar o
desafio de aprender o português escrito.
Considerações finais
Com a valorização das línguas de sinais, muitos pesquisadores estão
empenhados em encontrar o melhor caminho para a educação dos surdos. Aqui no
Brasil, os ouvintes/falantes dominam a língua oral-auditiva, o português, e eles
registram graficamente essa língua por meio da escrita alfabética. Já os surdos, usuários
de línguas de sinais têm o direito de escrever esses sinais, uma vez que usam a língua de
sinais e pensam por meio dela.
Para o aprendizado da escrita de sinais é necessário que os alunos surdos
adquirirem primeiro a língua de sinais, para posteriormente, serem conduzidos ao
aprendizado da forma escrita dessa língua, a escrita de sinais.
Concluindo, cabe ressaltar que, é indispensável pessoas surdas terem domínio da
língua portuguesa também, já que vivem no território de ouvintes, para a compreensão
das informações cotidianas. Essa língua poderá também conferir ao surdo uma
qualidade de vida e de educação.
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REFERÊNCIAS
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Libras no sistema de escrita visual direta de sinais SignWriting. In: CAPOVILLA,
Fernando César; RAPHAEL, Walkiria Duarte & MAURICIO, Aline Cristina L. (Orgs.)
Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. São Paulo:
Universidade de São Paulo, 2009.
BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei nº 10.436,
de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o
art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>
Acesso em: 20/05/13.
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reflexões sobre a escrita de sinais de libras desde tenra idade