A EXPERIÊNCIA ATRAVÉS DO GRUPO OPERATIVO COM CRIANÇAS E O PAPEL DE SEUS COMPONENTES NO GRUPO1 ² OLIVEIRA, Micheli Viera²; MELLO, Lauren Machado ; OLIVEIRA, Vânia Fortes³. 1 Trabalho de Pesquisa _UNIFRA 2 Psicólogas graduadas no Centro Universitário Franciscano (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil 3 Orientadora e Professora do Curso de Psicologia do Centro Universitário Franciscano, (UNIFRA), Santa Maria, RS, Brasil E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]. RESUMO Esse trabalho tem como objetivo relatar a experiência de acadêmicas de psicologia no ano de 2008, através de grupos com crianças. Buscou-se observar o papel dessas no grupo , como também observar os fenomenos grupais. Os encontros aconteceram em uma escola estadual da cidade de Santa Maria- RS, ocorrendo semanalmente no periodo de um mês, com crianças da terceira série. salienta-se a importancia desse espaço para a realização de atividades com as crianças,e para a observação dos fenômenos de grupos, sendo esse um espaço de livre expressão para o acolhimento. Palavras-chave: Crianças; Grupo operativo; Papéis grupais. 1. INTRODUÇÃO O grupo operativo é aquele centrado em uma tarefa. Sua finalidade baseia-se em aprender a pensar em termos da resolução das dificuldades, dúvidas e conteúdos manifestadas no campo grupal (PICHÓN- RIVIÉRE, 1960). Dessa forma, esse trabalho tem como objetivo apresentar a experiencia do estágio básico II realizado no ano de 2008 em uma escola estadual da cidade de Santa Maria, cujo objetivo baseava-se em atender a demanda do grupo de crianças. Através dele foram realizadas diversas atividades, promovendo um espaço de intregração e esclarecimento de questões vivenciadas no grupo. Além do mais foi observado o papel que cada integrante desempenhava no grupo. Assim, salienta-se a importancia da abertura desse espaço para 1 as crianças colocarem suas questões questões no grupo e para que o conteúdo ali trazido seja trabalhado. Destaca-se também importancia desses espaços para a formação acadêmica e na compreensão dos fenômenos grupais. 2. DESENVOLVIMENTO O grupo operativo centra-se em uma tarefa com a finalidade de trabalhar grupalmente as questões e dificuldades surgidas no grupo. Dessa forma, os conteúdos manifestos devem ser trabalhados a nivel grupal, e não no campo de cada um de seus integrantes, o que seria considerado uma psicanálise individual em grupo (PICHÓNRIVIÈRE, 1960). Diante do grupo operativo, ele pode ser caracterizado como um grupo fechado, ou seja, constituido por um contrato grupal, onde é estabelecido o prazo de vida do grupo, e uma vez iniciado, não há possibilidades da entrada de novos elementos, teoricamente aqueles que pertence ao grupo não poderão sair até a data aprazada (CASTILHO, 2002). Assim o grupo possui um conjunto de conhecimentos e de atitudes utilizados nas vinculações. Cada integrante tem um esquema de referência, mas com o trabalho grupal vai se configurando em um esquema conceitual referencial operativo. Dessa forma, a tarefa prioritária no Grupo Operativo é a elaboração de um esquema referencial comum, sendo que, normalmente, o grupo passa de estereotipado para uma estrutura com maior mobilidade de papéis (FERNANDES, 2003). 3. METODOLOGIA Após apresentação da proposta do estágio básico II e depois da autorização da direção, os encontros foram realizados em uma escola estadual da cidade de Santa MariaRS, numa sala de aula cedida pela escola,. Participaram do grupo quatorze crianças que estudavam na terceira série, entre idades de nove a onze anos. O grupo era conduzido por duas estudantes de psicologia da Unifra que exerciam o papel de coordenadoras. Os encontros foram realizados no mês de novembro de 2008, todas as terças feiras das duas e trinta ás cinco horas da tarde, sendo este um grupo operativo, fechado, e heterogêneo. 2 Deve-se salientar que alguns participantes foram nomeados no decorrer do artigo através de letra para preservar suas identidades e garantir o sigilo das informações. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES Ao iniciarmos o grupo pedimos a todos os componentes que se sentassem no circulo formado por cadeiras, mas nem todos se sentaram, dois dos meninos foram se esconder embaixo das classes dizendo que não queriam sentar, foi com um pouco de insistência que todos sentaram, mas continuavam conversando. Assim começamos a estabelecer o contrato, onde foi combinado que tudo o que fosse trazido por eles no grupo, não sairia dali, e que eles poderiam falar e expressar tudo o que quisessem. Segundo Castilho (2002), o grupo tem total liberdade para tratar do assunto que quiser, desde que os componentes presentes reflitam o sentido e o significado do material no aqui- agora. Tudo o que se passa no grupo é de exclusividade dele e todas as coisas que nele ocorrem devem ficar ali na sala. Eles não paravam de conversar por um só instante, por mais que reforçassemos o pedido de silêncio, mas mesmo assim, ficou combinado que os encontros seriam todas as terças feiras das 14:30 ás 15:00 da tarde. Assim, entende-se que esse movimento inicial de não escutar as normas e não colaborar como forma de resistência, ocorrendo uma transferência negativa com a figura das coordenadoras. Segundo Zimmerman (2000), a transferência negativa é modelada por identificações projetivas, e por manifestações de aparência agressiva, que podem se tornar positivas desde que sejam bem absorvidas, entendidas e manejadas. Nesse e em vários momentos foi exercida a capacidade de paciência, sendo esta, uma das caracteristicas fundamentais para o perfil do coordenadoras. A paciência deve ser entendida como uma atitude ativa, como um tempo de espera necessário para que uma determinada pessoa do grupo reduza a sua possível ansiedade paranóide inicial, adquirindo uma confiança basal nos outros, permitindo dar uns passos rumo a um terreno desconhecido, levando o coordenador a funcionar como um continente (CASTILHO, 2002). Assim, iniciamos as atividades pedindo a eles o que o grupo deveria ter, como uma forma das crianças montarem regras grupalmente, dessa forma eles falaram várias características que foram postas no quadro como respeito, não gritar, não brigar, entre 3 outras. Após, foi comentado que eles haviam criado as regras do grupo e que todos deveriam respeitá-las pois tudo isso foi construido por eles. As crianças concordaram. Depois disso, foi sugerido que eles fizessem desenhos referentes ao que eles esperavam do grupo. A maioria deles desenhou e escreveu as regras criadas por eles. Apenas uma criança apresentou grande resistência ao desenhar, dizendo que não queria desenhar pois não sabia, e mantinha-se fazendo gracinhas buscando chamar a atenção dos colegas e despersar a atenção da turma. Após conversarmos com ele falando da importância de fazer as mesmas atividades que os coleguinhas, ele desenhou um diabinho, afirmando que este era ele, demonstrando nesse instante ser o sabotador do grupo. Pedimos o porque que havia desenhado isso, uma coleginha se manifestou e disse que é porque ele não parava quieto e ficava sempre incomodando os outros, agindo naquele momento como a porta voz do grupo. Relata Zimerman (2000), o sabotador é aquele que por meio de inúmeros recursos resistenciais, procura obstaculizar o andamento exitoso da tarefa grupal. Em geral, o papel assumido pelo individuo que seja portador de uma excessiva inveja e defesas narcisisticas. Zimerman (2000) também complementa que o porta- voz manifesta aquilo que o restante do grupo pode estar, latentemente pensando ou sentindo. Essa comunicação também pode ser feita através da linguagem extraverbal, das dramatizações, silêncios, actings, etc. Passado algum tempo após terem apresentado o que haviam desenhado, os alunos começaram a pedir que queriam ir ao banheiro, e alguns a tomar água, assim permitimos que eles saíssem da sala em fila, mas após terem se retirado, saíram correndo e falando alto pelos corredores. Depois de terem agido dessa forma pedimos a eles porque saíram gritando e correndo se haviam criado as regras para não gritar, e respeitar os outros. Alguns concordaram que não haviam respeitado as regras, mas a maioria nem deu importância, assim continuamos a dar prosseguimento com as atividades. Nesse instante uma menina reclamou que não agüentava mais, pois estava com dor de cabeça, como uma forma de somatizar toda aquela algazarra e a falta de sintonia da turma, assumindo assim o papel de radar do grupo. Argumenta Zimerman (2000), que o radar é o individuo que capta os primeiros sinais das ansiedades, que estão emergindo no grupo. Esse papel também é conhecido com caixa 4 de ressonância, em razão de que o paciente torna-se o radar por não ter condições de poder processar simbolicamente o que captou, podendo vir a expressar essas ansiedades por meio de somatizações. Nesse momento, foi necessário fazer uso da capacidade de respeito relatada por Zimerman (2000), como sendo a capacidade do coordenador fazer com que os membros do grupo voltem a olhar para as pessoas com as quais está em intima interação com outros olhos, com outras perspectivas, sem a miopia repetitiva dos rótulos e papéis. Eles queriam brincar, assim pedimos a eles que sugerissem alguma brincadeira para fazerem. A maioria concordou em brincar de dança na cadeira. Nessa brincadeira foi percebido que uma menina ocupava o papel de lider na brincadeira, pois ela organizava e dizia que era aquela pessoa que devia sair por não ter conseguido sentar na cadeira. Yalom (2006), nos fala que o papel do líder surge em dois planos: um é que naturalmente foi designado ao coordenador, e o outro é o que surge espontaneamente entre os membros dos grupos. Os lideres construtivos são aqueles que exercem o papel de integradores e construtores, e os lideres negativos nos quais prevalece um excessivo narcisismo destrutivo. Quando encerrou o tempo do encontro, eles deram a sugestão de trazer lanche para o proximo encontro, assim todos se responsabilizaram em trazer. Foi reforçado novamente a data do próximo encontro e como tarefa de casa pedimos que trouxessem sugestões sobre o que gostariam de fazer no próximo encontro. Todos se despediram de nós e partiram para suas casas. No segundo encontro, ao entrarmos na sala, grande parte dos alunos tinham trazido um lanche que iriam compartilhar em forma de piquenique, mas houve uma divisão no grupo, primeiramente com o participante (G) e a participante (C), onde estes se uniram pra comer seus lanches sozinhos, não compartilhando assim com o restante do grupo, pois nem todos os integrantes haviam trazido lanches, alguns afirmaram que haviam esquecido. Na hora do lanche, alguns coleguinhas Assim o grupo na maior parte do tempo encomodar (G) e (C) dizendo que os dois estavam namorando. A principio os dois nem ligaram, mas quando acabaram de lanchar, (G) queria bater na coleguinha (M P), pois ela não parava de provocá-lo, levando assim o grupo a dispersão. Neste momento (G) exerceu o papel de bode- espiatório, pois o grupo depositou nele toda a angústia referente na situação. 5 Argumenta Zimerman (2000), que o bode- expiatório é aquele em que fica depositada toda a maldade do grupo, e se tiver uma tendência prévia, servirá como depositário até vir a ser expulso, o que é muito comum, e neste caso, o grupo sairá em busca de um novo bode. E foi o que aconteceu posteriormente, (G) que saiu do grupo naquele momento. Zimerman (2000), comenta que o instigador consiste na função de provocar uma perturbação no campo grupal, por meio de um jogo de intrigas, mobilizando papéis nos outros. O instigador consegue dramatizar no mundo exterior a reprodução da mesma configuração que tem o seu grupo interior, bem como a dos demais que aderiram a esse jogo. Já o apaziguador é aquele que costuma com freqüência a ser desempenhado por algum membro do grupo que tem uma dificuldade de se confrontar com situações tensas, especialmente aquelas que envolvem outros participantes em um clima de agressividade, de modo a executar o papel e a função do que acostumamos a chamar de algodão entre os cristais (ZIMMERMAN, 2000). Foi preciso utilizar também a capacidade negativa, pois esta função consiste na condição do coordenador do grupo conter as suas próprias angústias, que, por vezes surgem em alguma forma e grau de modo que elas não invadam todo o espaço de sua mente. Esses são sentimentos nobres despertados pelo todo grupal, ou por determinadas pessoas do grupo (ZIMERMAN, 2000). Também utilizamos a capacidade continente, que consiste em poder acolher e conter as necessidades, angústias e, ao mesmo tempo as vai compreendendo, desintoxicando, emprestando desta forma um sentido, um significado ( ZIMERMAN, 2000). O grupo estava todo disperso depois desse acontecimento, foi um pouco complicado organiza-lo novamente, pois não paravam de conversar alto, gritar, e fazer bagunça. De inicio aplicamos uma dinâmica onde a turma deveria se dividir em dois grupos, e assim cada grupo deveria escolher um mico para o outro grupo pagar, mas na verdade quem pagaria o mico que eles escolheram para o grupo oposto eram eles mesmos, ou seja, como diz o nome da dinâmica o feitiço virou contra o feiticeiro, não deseje para o outro o que você não quer. O grupo 1 havia escolhido que os integrantes do grupo oposto dançassem a música na boquinha da garrafa, assim eles tiveram que dançar, e o grupo 2 haviam escolhido que dançassem a dança do créu, desta forma foram eles que pagaram a 6 prenda. Eles apresentaram um pouco de resistência a cumprir a tarefa, pois ninguém queria pagar o mico estipulado por eles mesmos, mas depois que o fizeram, acharam legal. Quando íamos aplicar outra dinâmica neles, eles sugeriram que brincassem de desfile de moda, e assim brincaram, onde foi muito interessante, pois todos, sem exceção participaram, uns como jurados e outros desfilando. No inicio dessa brincadeira o menino (F) e (J V) começaram a fazer bagunça, como forma de sabotar a brincadeira, corriam, atiravam papel nos coleginhas, assim fomos lá e conversamos primeiramente com o (F), pedimos sua idade e dissemos que ele já era bem grandinho, o mais velho da turma e pedimos a ele que nos ajudasse a controlar a turma que era muito bagunceira, pra ele ter uma tarefa no grupo, de modo a se sentir mais importante, assim ele participou dessa brincadeira com os outros, fizemos a mesma coisa com o (J V) e também funcionou. No fim da brincadeira quando foi eleita a campeã do desfile, eles agiram de forma compreensiva, aceitando a vitória e a perda, isso foi muito interessante. Sendo (F) e (JV) no inicio da brincadeira agiram como sabotadores do grupo, mas no final, todos os integrantes agiram como o vestal, zelando pela moral e os bons costumes, aceitando a brincadeira de modo compreensivo. O vestal é quando os/ou um integrante(s), assumem um papel de zelar pela moral e os bons costumes. Há um risco nada comum de que o próprio grupoterapeuta venha a assumir esse papel (ZIMMERMAN, 2000). Na maioria do tempo , um menino do grupo mostrou-se o apaziguador e ao mesmo tempo o porta voz, pois se os coleginhas estão brigando ele tenta amenizar a briga, ele diz que o grupo gostaria de fazer tal atividade, e também é em alguns momentos o líder, pois ele puxa a frente na organização da sala e diz para os outros falarem mais baixo pois os alunos da sala ao lado têm aula. Depois que a escola saiu da greve, e nós fomos pegar as assinaturas, outro fenômeno nos impressionou, pois estávamos nos retirando do local, de repente encontramos duas integrantes do grupo dizendo que tinham vindo pra participar dele. Quando nos deparamos, onze dos treze integrantes (sendo que um desistiu) tinham vindo para o grupo, isso foi muito motivador para nós, pois mostrou que eles estavam gostando de nosso trabalho. Assim foram realizadas várias atividades neste dia, entre essas, diversas brincadeiras, e o amigo secreto, que seria revelado na próxima semana, junto de uma confraternização. 7 Deu para perceber também a identificação que eles tiveram com nós Conosco, pois pediram que fossemos com eles nas férias olhar o filme High Scholl Musical que vai ser lançado no período das férias, como forma de manter o contato com a gente. Assim, ficamos satisfeitas com a realização desse trabalho e encerramos as atividades. 5. CONCLUSÃO A experiência de interação em grupo foi uma experiencia muito produtiva, pois percebeu-se as diferenças entre os papéis que cada integrante demonstra no grupo, além das mudanças constantes dos papéis; a identificação com os facilitadores; a resistência inicial; entre outros fenômenos que se passam em um grupo. Foi também muito produtivo perceber o aumento da interação grupal através das atividades propostas, o carinho que demonstravam por nós, a espontaneidade deles, o interesse referente a participação e até o comentário que a diretora nos fez, dizendo que o nosso trabalho com o grupo estava sendo muito bom, entre outros acontecimentos. Neste período de estágio, mesmo sendo um período curto, foi muito importante, pois através dele, tivemos a oportunidade de aplicarmos na prática o que vimos em sala de aula. Passamos também a perceber a importância de ter psicólogos nas escolas, e o quanto seria importante que além de grupos com alunos tivesse grupos com pais e professores. Assim salienta-se a importancia desse espaço para a realização de atividades com as crianças, sendo esse um espaço de livre expressão para o acolhimento. REFERÊNCIAS CASTILHO, Áurea. A dinâmica do trabalho de grupo. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. FERNANDES, Waldemar José. A importância dos grupos hoje. Rev. SPAGESP, Ribeirão Preto, v. 4, n. 4, dez. 2003 . GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. PICHON-RIVIÉRE, Enrique. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes, 2005. YALOM, I. D. Psicoterapia de grupo: teoria e prática. Tradução Ronaldo Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed. 2006. 8 ZIMERMAN, David E. Fundamentos básicos das grupoterapias. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. 9