O PAPEL DA ANIMAÇÃO SOCIOCULTURAL NA EDUCAÇÃO ARTÍSTICA Ana Lampreia Ramos* “Estar no mundo sem fazer história, sem por ela ser feito, sem fazer cultura, sem “tratar” sua própria presença no mundo, sem sonhar, sem cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência, ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem ideias de formação, sem politizar não é possível”. (Paulo Freire, 1997, p. 64) Resumo Pretende-se com este texto realçar o contributo da Animação Sociocultural como veículo facilitador na promoção e na inovação das artes com vista ao desenvolvimento biopsicossocial e cultural do aluno, tendo em conta que, como estratégia de intervenção planificada, trabalha para um determinado modelo de desenvolvimento comunitário. Palavras-chave: Animação Sociocultural; Arte; Educação; Criatividade, Desenvolvimento Humano e Educação pela arte, Cultura. Numa sociedade moderna a arte não pode ser vista como exclusividade de uma determinada cultura ou grupo social. As políticas educativas centradas num modelo mais tradicional valorizam ainda a componente técnico-científica em detrimento da artística, posicionando a arte como forma complementar aos processos de ensino mais convencionais. Actualmente, o ensino das artes, da prática inerente à expressão e manifestação artística, ainda apresenta um défice no tecido sociocultural português. A limitação da oferta cultural no currículo de ensino em Portugal, faz com que as que as chamadas elites procurem fora da escola alternativas que lhes garantam um desenvolvimento equilibrado na sua formação; democratizar o acesso e o ensino da arte, ao alcance de todos e como fonte de educação, socialização e humanização torna-se fundamental para o desenvolvimento biopsicossocial infanto-juvenil. Considerando que e o equilíbrio entre os dois hemisférios cerebrais, hemisfério esquerdo e hemisfério direito é fundamental para o equilíbrio do cérebro; como menciona Gardner “(…) el hemisfério izquierdo domina las operaciones lógicas y linguísticas, mientras que el derecho lo hace de los conceptos especiales y creativos” (Marco Tello, 1996, p. 53), todas as manifestações e formas diversificadas de aprender e fazer Arte, nas mais variadas * Ana Lampreia Ramos, DSPGR - Direcção de Serviços de Planeamento e Gestão da Rede, DREAlentejo. REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 59 formas de expressão artística, são fundamentais para o pleno desenvolvimento das crianças e dos jovens. Entendendo-se que a “criatividade é a capacidade que o ser humano possui de produzir um pensamento ou um produto novo (…) os quais podem assumir diversas formas (artísticas), literária, científica de realização técnica, entre outros(…)” (Silva e Moinhos, 2010, p. 25), poder-se-á dizer que o ensino das práticas artísticas são fundamentais para o desenvolvimento da criatividade e da capacidade de reflexão crítica. Tal como referem Silva e Moinhos (2010, p. 25), “tradicionalmente a criatividade estava associada ao talento (inato), contudo se o talento não for desenvolvido e trabalhado, este pode não chegar a manifestar-se ” (idem), como é o caso das novas profissões na área criativa, assim como, dos designers, pintores ou escultores, que “precisam de conhecer e aperfeiçoar as suas técnicas de criatividade, caso contrário limitar-se-ão a reproduzir as mesmas invenções” (idem). Neste sentido e seguindo estas linhas de pensamento mais actuais, que defendem a integração das artes na educação, bem como a importância de um modelo escolar mais holístico no sentido de favorecer a plena formação do indivíduo, considera-se que o ensino, bem como as práticas de educação pela Arte, podem ser um veículo facilitador do desenvolvimento da criatividade e das capacidades de expressão e comunicação de cada um, contribuindo para o seu pleno equilíbrio. Os conceitos de educação pela arte – educação para a arte datam de 1978 pela primeira vez entre nós no projecto do Plano Nacional de Educação Artística. “Nele se considera que a educação pela arte propõe o desenvolvimento harmonioso da personalidade, através de actividades de expressão artística, e que a educação para a arte visa a formação de artistas profissionais e processa-se através do ensino artístico” (Santos, 1989, p. 42). Dentro duma abordagem ou uma pesquisa acerca do que se entende actualmente por “educação pela arte”, verifica-se, antes de mais, a dificuldade em delimitála num conceito mais ou menos definitório” (Santos, 1989, p. 39). Consideremo-la como uma concepção que garante um processo educativo que se vai fazendo ao longo da vida. Neste sentido, “a educação pela arte processar-se-á como via contínua e ascendente ao longo da vida, e, dela decorrendo, a certa altura, mais ou menos intensamente, a do ensino artístico” (Santos, 1989, p. 42). A Educação Artística desenvolve novos modos de expressão, comunicação, integração, compreensão e conhecimento do mundo, de “nós” e dos “outros”. Como diz Raposo (2004, REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 60 p. 16), “quando se trata da educação artística, devemos manter presente que é importante aprender a apreciar (ver, ouvir, sentir, tocar, é essencial) é igualmente importante facilitar o contacto com a arte e educar os sentidos, tal como a sensibilidade, sendo que a sensibilidade implica o nosso pensar sobre as nossas próprias sensações, sobre nós mesmos, sobre os outros e o que nos rodeia, questionando a nossa relação com o mundo.” Neste contexto, a Animação Sociocultural surge como forma de dar resposta a determinadas questões sociais das sociedades modernas. “la animación sociocultural exige que el hombre conozca la realidad en la que vive, no de una forma parcializada, sino desde los distintos ángulos y vertientes que ésta presenta...(...)...con la finalidad de construir entre todos una sociedad más humana y solidaria” Sánchez, 1997, p.17). O termo “Animação” foi utilizado pela primeira vez em 1995 na Áustria, no decorrer de uma reunião organizada pela UNESCO. Mas foi em França, na década de sessenta, que indubitavelmente adquire a verdadeira identificação como instrumento precioso para dar respostas aos problemas ligados a uma fracção social, económica e culturalmente pouco favorecida, a chamada cultura popular. São três os níveis de actuação em Animação: social, cultural e educativo. A Animação Sociocultural parte de um desenvolvimento, entendido como “integral e endógeno, visto que é capaz de unir entre si os progressos económicos, sociais, culturais, morais, reforçando-os na sua relação mútua. Endógeno, como a passagem de si mesmo a um nível superior, em relações de soma positiva com outros” (Trilla, 2004, p.301). Considera-se, portanto, a conjugação das três modalidades essenciais para envolver a participação de todos os cidadãos e alcançar o desenvolvimento harmonioso numa sociedade. A Animação Sociocultural, enquanto instrumento de acção é entendida como um veículo facilitador da promoção e inovação dos indivíduos. De acordo com Palma “estimula o sentido da iniciativa, a criatividade dos mesmo no seu próprio desenvolvimento ( … ) favorecendo formas de comunicação e expressão entre todos ( … ) visa transformar as condições de participação dos indivíduos e dos grupos na comunidade, estimulando o sentido de iniciativa ( … ). Quando a Animação Sociocultural toma a forma de uma intervenção planificada, então podemos dizer que estamos em presença de uma tecnologia social e cultural, que utiliza estratégias e planos de actuação e metodologias operativas de intervenção, como estratégia de intervenção, que trabalha para um determinado modelo de REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 61 desenvolvimento comunitário que favorece formas de comunicação e expressão entre todos” (Palma, 2000, p. 14). Face ao exposto, considera-se que a Educação Artística tem, nos métodos e técnicas de Animação Sociocultural, um preciso contributo no sentido de gerar respostas criativas e inovadoras, com vista a um perfeito desenvolvimento biopsicossocial e cultural do aluno no meio escolar. Perante isto, o domínio das artes é uma área essencial de formação que a educação formal deve considerar. Terminamos com um pensamento de João de Barros: “Sem ensino artístico não há educação da sensibilidade e não há cultura geral que valha”. Pequenas notícias do Centro de Documentação Março/Abril Longe da finalidade de criar artistas, a programação do Centro de Documentação da DREALE, visa incluir aspectos de crucial importância, no sentido de proporcionar aos alunos a vivência e a experiência no mundo das artes dentro do contexto escolar e, em simultâneo, consciencializar os professores e os monitores de educação para a importância da Artes e das expressões artísticas, no processo de desenvolvimento global infanto-juvenil. Neste sentido, as actividades desenvolvidas para o período de Março/Abril foram as a seguir enunciadas. Book Trailer de Poesia Integrado nas Comemorações do Dia Mundial da Poesia do Centro Cultural de Belém A Direcção Regional de Educação do Alentejo (DREALE), no início do ano lectivo 2010/2011 lançou o Concurso de Poesia “ Em Portugal, Sê Poeta”, direccionado a todos os Agrupamentos de Escolas e Escolas não Agrupadas da sua área geográfica. O objectivo deste concurso visou promover e fomentar nos alunos o gosto por um género literário específico, a poesia, num contexto interdisciplinar e interescolar. A versão digital destes poemas – Book Trailer –, elaborado pelos alunos e professores do Curso Profissional de Multimédia da Escola Secundária de Castro Verde, surge neste contexto como resultado da compilação e ilustração dos poemas. REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 62 1º Festival de Teatro Escolar do Alentejo No âmbito das Comemorações do Dia Mundial do Teatro, a Direcção Regional de Educação do Alentejo realizou o primeiro Festival de Teatro Escolar. Nos dias 24, 25 e 28 de Março, o Auditório da DREALE, foi palco de uma programação repleta de temas, métodos e técnicas de actuação diversificadas. Estas pequenas actuações teatrais envolveram toda a comunidade educativa da sua área geográfica. REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 63 Comemorações da Páscoa O concurso e as exposições da Páscoa tiveram o objectivo de festejar a Páscoa e contribuir para a divulgação das boas práticas culturais das escolas pertencentes à DREALE. REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 64 Referências Bibliográficas: Palma, A. N. (2000). Filhos da madrugada. Dissertação de Mestrado em Relações Interculturais. Universidade Aberta: Lisboa. Freire, P. (1997). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Editora Paz e Terra. Marco Tello, P. (1996) Motivación y creatividad en la preadolescencia. Secretariado de Publicaciones e Intercambio Científico, Universidad de Valladolid: Valladolid. Raposo, M. E. (2004). A construção da pessoa – Educação artística e competências transversais. Dissertação apresentada para obtenção do grau de Doutor em Ciências da Educação/Educação e Desenvolvimento, Universidade Nova de Lisboa: Lisboa. Sánchez, A. S. (1997). La animación hoy. Una respuesta a la realidad social. Madrid: Editorial CCS. Santos, A. (1989). Mediações artísco-pedagógicas. Lisboa: Livros Horizonte. Santos, A. (2000). Perspectivas psicológicas. Lisboa: Livros Horizonte. Silva, E. & Moinhos, R. (2010). Animação sociocultural – módulos opcionais. Lisboa: Plátano Editora. Trilla, J. (2004). Animação sociocultural – teorias, programas e âmbitos. Lisboa: Instituto Piaget. REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011) 65