UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN FACULADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS SOCIAIS – FAFIC DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICA – DCSP Disciplina: METODOLOGIA DO TRABALHO CIENTÍFICO REALIDADE E CONHECIMENTO - A APREENSÃO DO REAL (texto em elaboração) AÉCIO CÂNDIDO DE SOUSA Mossoró (RN), maio de 2013 O CONHECIMENTO DO MUNDO Aécio Cândido1 Não é de hoje que o conhecimento é objeto da curiosidade humana. Os gregos da Antiguidade, através de muitos de seus filósofos - Platão e Aristóteles à frente, mas também os pré-socráticos -, se interessaram pelo assunto e estabeleceram uma série de conclusões a respeito. Durante a Idade Média o interesse permaneceu, embora escorado em outros fundamentos. Se os gregos firmavam em bases mais materialistas seu interesse em compreender a natureza, o homem e a natureza do próprio conhecimento, durante a Idade Média e até o Renascimento, esse interesse adquiriu uma conotação mais teológica, estava mais ligado à ideia de um Deus onisciente, personificador de uma inteligência cósmica e holística. A Modernidade, após o século XVII, recoloca sobre outros alicerces a reflexão sobre o conhecimento, culminando com a formulação de um método científico de conhecimento. O interesse por esse objeto firmou-se como um campo de estudo específico, assumindo os nomes de Epistemologia, Filosofia da Ciência, Teoria do Conhecimento ou Metodologia Científica. 1. O que sabemos Para melhor compreender o que será apresentado neste capítulo, comecemos por inventariar aquilo que você sabe, porque lhe está muito perto e porque faz parte de seu cotidiano. Você, certamente, tem uma boa quantidade de amigos e um bom conhecimento sobre eles. Esse conhecimento lhe permite distingui-los, isto é, reconhecê-los, pela estatura, pela cor da pele, pelas características do cabelo, pelo tipo de roupa que preferem, por alguns traços da personalidade, pelas preferências musicais e gastronômicas. Suas características, para você, não se restringem apenas aos aspectos físicos: eles têm história, preferências, anseios, talentos, projetos. E você conhece um pouco a respeito de cada um desses aspectos da vida deles. Em relação à história de cada um, pelo menos daqueles mais chegados, é possível que você saiba onde nasceram, onde moram, a profissão dos pais, se tem irmãos... O conhecimento a respeito de seus amigos é formado por uma série de informações abrangendo um leque significativo de aspectos. Algumas dessas informações, relativas a características visíveis, você obteve diretamente, pela observação a olho nu, digamos; outras você obteve pela interpelação, perguntando. Como se vê, você tem um conhecimento considerável a respeito de seus amigos. Podemos extrapolar esse conhecimento. Como você, eles fazem parte do mundo social. Este se expressa pelo fato de que eles têm um gosto musical (um gosto que foi formado, que faz uso de equipamentos tecnológicos para se materializar e que os coloca dentro de um mercado consumidor de música), uma forma de se relacionarem com os pais (fazem parte de uma família), de namorarem, de estabelecerem laços a partir dos relacionamentos amorosos, de se divertirem, de professarem uma religião, de participarem da política (votando, militando num partido político, numa associação ou numa ONG). Conhecendo seus amigos, suas características individuais e os laços que os ligam aos grupos sociais e às instituições, você estará conhecendo a sociedade. Para chamar atenção sobre o conhecimento que temos, sem nem sempre nos darmos conta dele, tomemos um exemplo, de outra natureza, mas também próximo a você porque bastante familiar: o que você sabe sobre o ovo, alimento tão cotidiano a todos nós? Sabe, por exemplo, que ele provém das aves, que é composto por casca, clara e gema, que se constitui numa célula única, que é rico em vitamina A, que o ovo da galinha é bem maior que o da codorna e bem menor que o do avestruz, que chega a pesar 1,5 kg. Talvez saiba que muitos povos da Europa e da Ásia têm o costume de pintar ovos na chegada da primavera e que este costume chegou ao sul do Brasil através da imigração de ucranianos, agora associado à Pascoa e enfeitando árvores – árvores de Páscoa. 1. Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN -, Departamento de Ciências Sociais. Mossoró, RN 2. Como sabemos o que sabemos Com o fim de perceber a conexão existente entre o que sabemos e como esse conhecimento nos chega, como ele se forma para cada um de nós, realize o exercício seguinte, de modo individual: 1. Como você aprendeu que a água é diferente da pedra? Alguém lhe ensinou? Você poderia ter aprendido isto sozinho? Como? 2. Como você descobriu que a água é um líquido e que a pedra é um sólido? Que outros exemplos de líquidos e de sólidos você pode indicar? 3. Quem lhe ensinou que o dia é claro e a noite, escura? 4. Você tem ou já teve medo da escuridão? Quem lhe ensinou a temê-la? 5. Complete a afirmação seguinte com nomes de amigos ou amigas seus. “___________ é mais baixo(a) do que ____________ e mais alto do que ____________”. Em que você se baseou para chegar a esta conclusão? 6. Cite um de seus amigos ou amigas que você classificaria como tímido e outro tido por você como inteligente. Em que você se baseou para chegar a esta conclusão? Comparando com a conclusão anterior, qual a que apresenta maior complexidade? Por que? 7. Você sabe, certamente, que o cangaceirismo foi um fenômeno social presente no interior do Nordeste durante as primeiras décadas do século XX. Você seria capaz de apontar algumas características desse fenômeno? Você teria algo a dizer sobre a possível associação causal entre cangaceirismo e estrutura agrária da região? De onde lhe veio esse conhecimento? Ao responder as questões acima, além de pensar sobre a constituição e as fontes do conhecimento, você certamente percebeu que possui um conjunto considerável de informações sobre o mundo que o rodeia, referentes tanto ao mundo físico como ao mundo social, aquele ligado às pessoas e suas formas de agir e de interagir. É possível que nem todas correspondam à verdade, mas o que importa no momento é destacar como é impressionante a quantidade de informações que cada um de nós possui. É interessante pensarmos sobre essa quantidade, embora não possamos calculá-la com a precisão de um computador em relação ao conteúdo de sua própria memória. Como esse conhecimento nos chega? Nós podemos conseguir algumas dessas informações, alguns desses conhecimentos, por nossa própria conta, basta observar. Se temos a oportunidade de ver uma galinha e uma codorna botarem ovos, podemos identificar a quem cada ovo pertence e comparar-lhes o tamanho, concluindo que um é maior do que outro. Mas nem tudo podemos observar diretamente, de modo que muitas informações (a maioria esmagadora delas) nos chegam por intermédio de terceiros - dos livros, dos professores, do padre, do pastor, dos pais, dos amigos, dos meios de comunicação social. No entanto, mesmo para compreender que a galinha põe ovo e que ele é maior do que o da codorna, eu precisaria saber previamente que outros animais se reproduzem de forma diferente, (por exemplo, a cadela dá à luz cachorrinhos já formados), precisaria saber o que é um ovo e ter noção de tamanhos. De fato, a maior parte do que sabemos nos chega como informação proveniente de outro. Sei que a Terra é redonda, que as estrelas são imensamente maiores do que aparentam, que a água, ao ferver, atinge 100º C, que navios portugueses aportaram no Brasil em 1500. Sei porque me disseram. Também me disseram que chá de camomila é relaxante, que caminhar diariamente faz bem à saúde, que o feijão é uma planta leguminosa, que o catolicismo é a religião predominante no Brasil. Outras verdades, ou informações que eu considero como verdades, não me foram ditas, mas, a partir de inferências, de verossimilhanças, foi possível chegar a elas, por dedução lógica. Com base no conhecimento elencado no parágrafo acima, podemos concluir que há verdades que podem ser percebidas pelos sentidos e que há outras que não. Através dos sentidos, não capto nenhuma evidência clara a respeito da forma arredondada da Terra. Também, pelo olhar, nada me poderia indicar que as estrelas são, em verdade, corpos celestes gigantescos e não pequenas lanternas luminosas a iluminar os céus. Em relação ao comportamento físico da água, posso perceber que ela ferve ao ser aquecida, mas para estabelecer com precisão a temperatura necessária ao ponto de ebulição, precisarei de instrumentos especializados. Quanto à informação histórica da chegada dos portugueses ao Brasil, isto me foi comunicado. Para aceitar como verdadeira a informação, tenho que acreditar nas fontes, embora possa condicionar sua confiabilidade a algumas condições. Para os fenômenos e características perceptíveis pelos sentidos, a observação é fundamental como porta para o conhecimento. Para os outros tipos de fenômenos, nós dependemos de uma fonte autorizada. Podemos concluir que o conhecimento nos chega por três caminhos: pela observação direta, pela dedução (a partir de algumas informações pré-existentes, desenvolve-se uma caminhada de encadeamento lógico até uma conclusão), e pela comunicação da informação. As duas primeiras formas indicam autonomia por parte do sujeito na criação do conhecimento. Isto quer dizer que o sujeito é capaz de, ele próprio, engendrar o conhecimento. A última forma denota, de certo modo, passividade, embora não o seja completamente. Na verdade, só se apreende efetivamente uma mensagem comunicada quando se possui algumas pré-condições para apreendê-la. O aprendizado efetivo é sempre ativo, ele requer, além de certa dose de conhecimento prévio, esforço de quem aprende, traduzido por curiosidade, raciocínio e memória. Nosso conhecimento se constitui da identificação de: a) seres (plantas, animais, minerais, elementos químicos, fenômenos físicos – o trovão, o raio, a corrente elétrica -, fenômenos e instituições sociais – a educação, o casamento, o Estado); b) características (tamanho, densidade, composição, recorrência, frequência); c) processos e comportamentos (mudanças de estado, mobilidade social, rituais); d) causas (relações entre causa e efeito). Esta é a natureza do conhecimento. A partir desses elementos construímos sistemas de classificação, que é o que organiza o conhecimento e do qual nos ocuparemos mais à frente. 2 Esses elementos se referem sobretudo a um mundo tangível, exterior ao homem. Há, porém, outro tipo de conhecimento cuja posse alicerça, em grande medida, as ações humanas. Trata-se dos princípios morais. Estes princípios norteiam o comportamento, as ações das pessoas. Eles também organizam a percepção e a aceitação de algumas verdades. Os princípios morais se justificam por outras razões que não uma razão prática imediata. As noções de bom, de justo e mesmo de belo é que lhe dão substância. Vejamos alguns exemplos: “O respeito aos mais velhos é fundamental”; “A propriedade privada deve ser respeitada”; “A liberdade individual é o valor mais caro a uma democracia”. Ao adotarmos esses princípios, justificamos como sendo justo o respeito aos mais velhos; como sendo bom para a sociedade o respeito à propriedade privada, caso contrário ninguém se esforçaria por possuir nada; como sendo bonito o comportamento de alguém que se mostra livre em suas opiniões. Na verdade, na base de todo conhecimento há um pressuposto, que age como um princípio. Se eu acredito que os jovens são insatisfeitos e revolucionários por natureza, eu vou relacionar a essa essência jovem todas as explicações sobre suas ações. Se, diferentemente, eu creio que o comportamento dos jovens é consequência da intensidade de sua convivência com os pais, é fazendo uso desta relação que eu explicarei o comportamento deles. Se aceito o pressuposto de que a mulher não tem a mesma capacidade intelectual do homem, derivo daí que ela não pode ocupar os mesmos cargos nem gozar do mesmo prestígio social; se, pelo contrário, acredito que neste quesito mulheres e homens, em termos abstratos e gerais, são exatamente iguais, não me surpreenderá uma mulher ocupando cargos de chefia de qualquer nível ou exercendo qualquer profissão. Um aliado forte do conhecimento aberto é questionarmos permanentemente nossos pressupostos e submetê-los ao crivo da lógica e de suas consequências práticas. 2. A observação: olhar o mundo para aprender O papel dos sentidos no conhecimento. 2. Vale a pena conhecer a percepção de um eminente sociólogo, o francês Émile Durkheim, sobre o tema: “Na raiz de nossos julgamentos, há um certo número de noções essenciais que dominam toda a nossa vida intelectual; são aquelas que os filósofos, desde Aristóteles, chamam de categorias do entendimento: noções de tempo, de espaço, de gênero, de número, de causa, de substância, de personalidade, etc. Elas correspondem às propriedades mais universais das coisas. São como quadros sólidos que encerram o pensamento; este não parece poder libertar-se deles sem se destruir, pois tudo indica que não podemos pensar objetos que não estejam no tempo ou no espaço, que não sejam numeráveis, etc.” (DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Martins Fontes, 1996. pp. XV-XVI.) O texto seguinte, o primeiro capítulo do romance O Nome da Rosa, de Umberto Eco, ilustra de forma admirável o papel dos sentidos, da observação na construção do conhecimento, sem deixar de considerar a existência de princípios gerais que dão significação ao que os sentidos captam. O Nome da Rosa Capítulo I3 Enquanto os nossos mulos arrastavam-se pelo último cotovelo da montanha, lá onde o caminho principal se ramificava em trevo, dando origem a dois atalhos laterais, meu mestre deteve-se por algum tempo, olhando para os lados ao redor da estrada, para a estrada e acima da estrada, onde uma série de pinheiros sempre verdes formava por um breve trecho um teto natural, encanecido de neve. "Abadia rica", disse. "Ao Abade agrada aparecer bem nas ocasiões públicas." Habituado que estava a ouvi-lo fazer as mais singulares afirmações, não o interroguei. Mesmo porque, após mais um trecho de estrada, ouvimos rumores, e numa curva apareceu um agitado punhado de monges e de fâmulos. Um deles, como nos visse, veio ao nosso encontro com muita urbanidade: "Bem-vindo, senhor", disse, "e não vos admireis se adivinho quem sois, porque fomos advertidos de vossa visita. Eu sou Remigio de Varagine, o despenseiro do mosteiro. E se vós sois, como creio eu, frei Guilherme de Baskerville, o Abade precisaria ser avisado." "Tu", ordenou voltando-se para alguém do séquito, "sobe para avisar que nosso visitante está para adentrar os muros!" "Agradeço-vos, senhor despenseiro", respondeu cordialmente meu mestre, "e tanto mais aprecio a vossa cortesia quanto para saudar-me interrompestes a perseguição. Mas não receeis, o cavalo passou por aqui e dirigiu-se para o atalho da direita. Não poderá ter ido muito longe, porque chegado ao depósito de estrume precisará deter-se. É inteligente demais para lançar-se escarpa abaixo..." "Quando o vistes?", perguntou o despenseiro. "Na realidade não o vimos, não é, Adso?", disse Guilherme voltando-se para mim com ar divertido. "Mas se estais à procura de Brunello, o animal não pode estar senão onde eu disse." O despenseiro hesitou. Olhou Guilherme, em seguida o atalho, e por fim perguntou: "Brunello? Como sabeis?" "Vamos", disse Guilherme, "é evidente que andais à procura de Brunello, o cavalo favorito do Abade, o melhor galopador de vossa escuderia, de pêlo preto, cinco pés de altura, de cauda suntuosa, de casco pequeno e redondo mas de galope bastante regular; cabeça diminuta, orelhas finas e olhos grandes. Foi para a direita, estou vos dizendo, e apressaivos, em todo caso." O despenseiro teve um momento de hesitação, depois acenou aos seus e tomou o atalho à direita, enquanto nossos mulos recomeçavam a subir. Quando estava para interrogar Guilherme, porque tinha sido mordido pela curiosidade, ele fez-me um sinal para esperar: e de fato alguns instantes depois ouvimos gritos de júbilo, e na curva do caminho reapareceram monges e fâmulos conduzindo o cavalo pelo cabresto. Passaram por nós continuando a nos olhar um tanto aturdidos e nos precederam em direção à abadia. Creio também que Guilherme diminuíra o passo de sua cavalgadura para permitir-lhes contar o que acontecera. Com efeito tivera oportunidade de perceber que meu mestre, em tudo e por tudo homem de altíssima virtude, tolerava o vicio da vaidade quando se tratava de dar provas de sua argúcia e, tendo já apreciado seus dotes de sutil diplomata, compreendi que queria chegar à meta precedido de uma sólida fama de homem sábio. "E agora dizei-me", não pude me controlar por fim, "como conseguistes saber tudo isso?" "Meu bom Adso", disse meu mestre. "Durante toda a viagem tenho te ensinado a reconhecer os traços com que nos fala o mundo como um grande livro. Alan das Ilhas dizia que omnis mundi creatura 4 quasi liber et pictura 3. ECO, Umberto. O Nome da Rosa. Rio de Janeiro: Record, 1986. p. 36-39 4. “Toda criatura do mundo, como se fosse um livro ou pintura, é para nós como um espelho”. (Tradução do Prof. Gilson Chicon. UERN, Departamento de Letras Vernáculas). nobis est in speculum e pensava na inexaurível reserva de símbolos com que Deus, através de suas criaturas, nos fala da vida eterna. Mas o universo é ainda mais loquaz do que pensava Alan e não só fala das coisas derradeiras (caso em que o faz sempre obscuramente), mas também daquelas próximas, e nisto é claríssimo. Quase me envergonho de repetir aquilo que devias saber. No trevo, sobre a neve ainda fresca, estavam desenhadas com muita clareza as marcas dos cascos de um cavalo, que apontavam para o atalho à nossa esquerda. A uma distância perfeita e igual um do outro, os sinais indicavam que o casco era pequeno e redondo, e o galope bastante regular — disso então deduzi a natureza do cavalo, e o fato de que ele não corria desordenadamente como faz um animal desembestado. Lá onde os pinheiros formavam como que um teto natural, alguns ramos tinham sido recém-partidos bem na altura de cinco pés. Uma das touceiras de amoras, onde o animal deve ter virado para tomar o caminho à sua direita, enquanto sacudia altivamente a bela cauda, trazia presas ainda entre os espinhos longas crinas negras... Não vais me dizer afinal que não sabes que aquela senda conduz ao depósito do estrume, porque subindo pela curva inferior vimos a baba dos detritos escorrer pelas escarpas aos pés do torreão meridional, enfeando a neve; e do modo como o trevo estava disposto, o caminho não podia senão levar àquela direção". "Sim", disse, "mas a cabeça pequena, as orelhas pontudas, os olhos grandes..." "Não sei se os tem, mas com certeza os monges acreditam piamente nisso. Dizia Isidoro de Sevilha que a beleza de um cavalo exige 'ut sit exiguum caput et siccum prope pelle ossibus adhaerente, aures breves et argutae, oculi magni, nares patulae, erecta cervix, coma densa et cauda, ungalarum soliditate fixa rotunditas' 5. Se o cavalo de quem inferi a passagem não fosse realmente o melhor da escuderia, não se explicaria por que não foram apenas os cavalariços a persegui-lo, mas até o despenseiro deu-se ao incômodo. E um monge que considera um cavalo excelente, além de suas formas naturais, só pode vê-lo assim como as autorictates o descreveram, especialmente se", e aqui endereçou-me um sorriso de malícia, "é um douto beneditino..." "Está bem", disse, "mas por que Brunello?" "Que o Espírito Santo te dê mais esperteza que a que tens, meu filho!" exclamou o mestre. "Que outro nome lhe darias se até mesmo o grande Buridan, que está para tornar-se reitor em Paris, precisando falar de um belo cavalo, não encontrou nome mais natural?" Assim era meu mestre. Sabia ler não apenas no grande livro da natureza, mas também no modo como os monges liam os livros da escritura, e pensavam através dele. Dote que, como veremos, lhe seria bastante útil nos dias que se seguiriam. Sua explicação, além disso, me pareceu àquela altura tão óbvia que a humilhação por não a ter achado sozinho foi superada pelo orgulho de participar dela e quase congratulei a mim mesmo por minha agudeza. Tal é a força do verdadeiro que, como o bem, se difunde por si. E seja louvado o santo nome de nosso senhor Jesus Cristo por essa bela revelação que tive. Roteiro para compreensão do texto 1. Abadia, fâmulos, urbanidade, despenseiro, inexaurível, loquaz, senda, torreão meridional, dote. Veja no dicionário o significado destas palavras. 2. Experimente fazer uma planta do terreno, assinalando os lugares aludidos no texto. 3. Como o frei Guilherme chegou à conclusão de que a) procuravam um cavalo? b) era o cavalo do abade? 4. Como ele chegou a estabelecer as características físicas e psicológicas do cavalo? 5. Havia características físicas dedutíveis de pistas evidentes e outras que não seguiam este caminho. Distinga-as e esclareça que caminho foi tomado para chegar às últimas. 6. A atenção, o senso de observação é fundamental à pesquisa científica. Justifique a afirmativa de que frei Guilherme é um grande observador. 7. De onde veio a confirmação de que frei Guilherme produzira conhecimento verdadeiro? 5. Que a cabeça seja pequena, a pele seja seca, quase ligada aos ossos, as orelhas sejam curtas e finas, olhos grandes, nariz achatado, do pescoço para cima, a juba e a cauda [devem] ser espessas, os cascos arredondados [devem ser] ligados e sólidos. ((Tradução do Prof. Gilson Chicon. UERN, Departamento de Letras Vernáculas). 8.As assertivas de frei Guilherme a respeito do que procuravam, das características e do nome daquilo que os frades procuravam eram, na verdade, hipóteses. O que é uma hipótese e de que depende ela para ser aceita como conhecimento verdadeiro? 9. Atente para o trecho a seguir: "Sim", disse, "mas a cabeça pequena, as orelhas pontudas, os olhos grandes..." "Não sei se os tem, mas com certeza os monges acreditam piamente nisso. Dizia Isidoro de Sevilha que a beleza de um cavalo exige 'ut sit exiguum caput et siccum prope pelle ossibus adhaerente, aures breves et argutae, oculi magni, nares patulae, erecta cervix, coma densa et cauda, ungalarum soliditate fixa rotunditas'. Se o cavalo de quem inferi a passagem não fosse realmente o melhor da escuderia, não se explicaria por que não foram apenas os cavalariços a perssegui-lo, mas até o despenseiro deu-se ao incômodo. E um monge que considera um cavalo excelente, além de suas formas naturais, só pode vê-lo assim como as autorictates o descreveram, especialmente se", e aqui endereçou-me um sorriso de malícia, "é um douto beneditino..." Podemos dizer que ele exemplifica o poder do paradigma sobre a conformação do real. Para entender esta afirmação, procure saber o significado de paradigma. Associe-o ao conceito de ideologia e de dogma. 10. “Supremacia dos fatos” na produção do conhecimento. O que significa esta afirmação? 11. Que título você daria ao texto? Olhar o mundo para apreender a realidade – a natureza do objeto do conhecimento (o mundo) e a natureza do sujeito do conhecimento (o homem) No texto de Eco, um mundo físico aparece na forma de mulos, montanha, caminho, trevo, pinheiros, neve, monges, fâmulos, mosteiro, despenseiro, abade, cabresto. Neste breve inventário, há elementos que pertencem diretamente à natureza (mulos, montanha, pinheiros, neve), há outros que foram criados pelo homem (caminho, trevo, mosteiro, cabresto) e há os que expressam relações entre os homens (monges, fâmulos, despenseiro, abade). Há também referências a um outro tipo de realidade representada por termos como vaidade, urbanidade, cortesia, esperteza. Sem dúvida, o mundo real, aquilo que chamamos de realidade, é composto de coisas (pedras, paus, montanhas, nuvens, homens, insetos), as quais possuem atributos (são grandes, pequenas, bonitas, feias, robustas, frágeis, complexas, simples) e praticam ações (movimentam-se, param, caem, sobem, modificamse, desaparecem). Também fazem parte do mundo real os produtos da imaginação humana, tanto aqueles inquestionavelmente tangíveis (carros, discos, romances, poemas, artigos científicos, escolas e sistema escolar) como aquelas criações intangíveis (crenças, identidades sociais, paixões nacionais, racismo, culto ao consumo). Há um mundo das coisas e um mundo das ideias, ambos reais, embora a maioria das pessoas ao se referirem à realidade tenham em mente apenas esse primeiro mundo. Popper, um dos filósofos da ciência mais conhecidos, refere-se àquilo que chamamos de realidade como um conjunto formado por três mundos: o Mundo 1 – o mundo físico, natural, inanimado e biológico, e tudo aquilo que afeta seu comportamento, como a força magnética, a corrente elétrica, a gravidade, a seleção natural, a competição entre espécies e a adaptação, etc. -; o Mundo 2 – mundo da consciência, das ideias e das suas formas de transmissão, isto é, da linguagem. A linguagem possibilita a formulação de apreciações descritivas ou críticas sobre o mundo, da formulação de problemas e de suas soluções. O Mundo 3 é o mundo da cultura, formada pelos produtos que a consciência é capaz de criar. Quando tratamos do conhecimento, de conhecer a realidade, nos referimos à identificação de seres, de elementos, de categorias capazes de enfeixar conjuntos desses seres ou elementos. Nos referimos também à identificação das características desses seres, ao comportamento deles, suas mudanças, suas relações com os outros. Também nos referimos às causas que explicam certas ocorrências relativas a esses seres, ou seja, por que tais seres apresentam tais e tais características, por que sofrem tal mudança, etc. Todo esse conhecimento da realidade, muito vasto, precisa ser classificado, categorizado, para ser mais bem compreendido. Daí a sistematização taxonômica, o enfeixamento em grupos de seres que se aproximam em virtude de alguma semelhança. Quando um botânico descobre um novo vegetal ou um zoólogo, um novo animal, eles estão catalogando um novo ser. E para que o apontem como novo, eles precisam conhecer muito bem as classificações existentes para concluírem que aquele ser não foi ainda referenciado. O mesmo ocorre com um sociólogo quando identifica novas características num grupo social, na juventude, por exemplo, ou na família, nas formas de arranjos familiares ou na distribuição de papéis no interior desta. Quando as pessoas se referem à realidade, estão, na verdade, se referindo ao Mundo 1, físico, assinala Popper. Também nesta categoria, acrescentamos, não é incomum que incluam aqueles objetos, físicos, criados pela mente e pelo trabalho humano, como casas, computadores, carros, estradas, esculturas, livros; portanto, produtos da cultura, do Mundo 3 Popper chama atenção para algo importante: faz parte do Mundo 1, logo, da realidade, não apenas os objetos físicos, mas também as forças que podem atuar sobre esses objetos e alterá-los, tais como as forças de atração magnética e elétrica e a força de gravidade, por exemplo. Lembramos que, do mesmo modo, o Mundo 3, o da cultura, pode abrigar, além dos objetos físicos, também forças que atuam sobre eles. A pressão de grupos sociais sobre o parlamento, por exemplo, ou o desprezo a certas práticas sociais funcionam como forças capazes de modelar e remodelar grupos e comportamentos coletivos. Desse modo, elas também fazem parte do real. O papel dos sentidos na apreensão do mundo – o particular como ponto de partida: a indução Como uma criança se dá conta do mundo? Como ela começa a conhecer o mundo? Creio que podemos afirmar que, se lhe dão liberdade, uma parte da realidade a criança vai conhecendo por seus próprios meios. Ela experimenta o mundo com seu corpo. Desse modo, as sensações de frio, de calor, de doce, de amargo, de sólido, de líquido, de mole e de duro lhe chegam pelos sentidos. A partir de um certo momento do desenvolvimento do cérebro e dos estímulos que ele recebe de seu entorno familiar, ela pode começar a relacionar atributos a seres, e daí passar a fazer generalizações, e estabelecer relações de causalidade. Os acidentes domésticos ocorrem em maior quantidade quando o cérebro infantil não é ainda capaz de, em razão das limitações apontadas ou mesmo do desconhecimento, prever. Desse modo, a ponta aguda e o gume afiado da faca não são associados a corte, a água quente no fogo não é associada a queimadura da pele. Ela não formula a previsão de que ao manusear a faca pode se cortar ou que ao tentar alcançar a vasilha com água no fogo pode se queimar, daí a necessária vigilância dos pais, para anular esses possíveis efeitos catastróficos. A criança vai estabelecer muitas dessas relações, aquelas menos arriscadas, certamente, fazendo uso da experiência. Evidentemente, alguns atributos ela pode sentir em seu corpo e isto lhe servirá de aprendizado. É o caso, por exemplo, de pegar no gelo e sentir que ele e frio. O calor da água fervente e o efeito que ela causa na pele humana muito possivelmente lhe será um conhecimento comunicado, e não experimentado. É preciso que alguém lhe comunique a experiência e não que ela a viva. A criança também vai conhecer o mundo fazendo uso de um método que poderíamos chamar de tentativa e erro. É assim que ela vai aprender a andar, a correr, a subir, a perceber quem gosta dela, a pronunciar as palavras. É evidente que toda essa introdução da criança no mundo se dá envolvida pela linguagem. Todo o seu contado com o mundo se traduz em termos que lhe são ensinados, os quais, por tentativa e erro, ela os recombina. Mas os estímulos de feed-back a guiam na gramática que deve ser usada. Como assinala Rousseau, “o primeiro raciocínio do homem é de natureza sensitiva...: os nossos primeiros mestres de filosofia são os nossos pés, as nossas mãos, os nossos olhos”. Os breves diálogos abaixo retratam a conversa de uma criança de 5 anos e 5 meses. Eles revelam um raciocínio investigativo que lança hipóteses e em seguida firma constatações: I − Pai, você era novo, não era? − Era. − Agora você tá quase velhinho. II – Por que vovó é sua mãe? – Ah, porque ela me teve. – Guardou você na barriga e depois você nasceu, não foi? A série de perguntas abaixo revela a especulação sobre o mundo e a capacidade de estabelecer relações racionais para compreensão. São da mesma criança, no mesmo período de idade: – Pai, por que eu não posso tomar água do mar? – Pai, por que a gente tem que dormir? – Por que o esqueleto só tem ossos, pai? – Pai, por que eu não sou mais bebê? Uma grande parte do conhecimento que temos sobre o mundo pode nos vir da experiência direta.. Mas nem tudo, pelo volume de informações que necessitamos para viver, virá certamente por esta via. Se assim fosse, teríamos, cada um de nós, de reconstituir todo o conhecimento, o que, logicamente, impediria qualquer evolução da cultura. O conhecimento pela experiência direta dá-se tanto em relação ao mundo físico como em relação àquilo que chamamos de experiência existencial, compreendendo por isto aquelas experiências de vida que nos ajudam a viver melhor, que nos trazem menos informação e mais sabedoria. É neste territória que nasce a necessidade da arte. Aprendemos a viver melhor através das vidas alheias, reais ou inventadas pela literatura; de realidades transpostas e transmutadas pelo cinema, teatro, pintura. Podemos aprender não apenas com a própria experiência, mas também com a experiência alheia. Em Ode ao homem simples, o poeta chileno Pablo Neruda reconhece essa possibilidade, embora lhe aplique uma certa matemática: “Conhecer uma vida/ não é bastante / e conhecer todas as vidas / não é necessário”. A experiência do conhecimento pelos sentidos não se esgota na infância. Continuamos pela vida a perceber o mundo, ou boa parte dele, por intermédio dos sentidos. Sei pelo tato, por toda extensão da pele, se o vento é frio ou quente, se é forte ou fraco; pela visão, sei se a montanha é distante ou próxima, se tem vegetação ou se é árida; pela audição, percebo se na mesma floresta há pássaros e quais as espécies. A observação, componente essencial dessa apreensão do mundo, não se restringe, como pode parecer, ao uso da visão. O mundo, como já explicitado, nos chega através de todos os sentidos. Apenas pelo olhar não conseguiremos saber se um fruto desconhecido é ácido ou doce; para sabê-lo, temos que recorrer ao paladar. Daí, podemos dizer que, através do paladar, observamos que o fruto é doce. Os sentidos, claro, têm seus limites, embora possam ser ampliados. Nem todos os fenômenos podem ser captados diretamente por eles. Eles se enganaram em relação ao movimento do Sol e da Terra. Foi preciso o advento da ciência moderna para corrigir a percepção errônea e recolocar cada astro em sua devida órbita. Há muitos outros enganos possíveis. Muito do que vimos até agora refere-se à forma de apreensão do conhecimento processada pelo senso comum, costumeiramente apresentado como um campo no qual vigora uma epistemologia completamente diferente daquela utilizada no campo científico. Há, porém, na verdade, alguns pontos comuns aos dois campos e há também afastamentos absolutos. O que talvez distinga de fato o campo científico do senso comum seja a sistematização e o controle das observações neste último, assim como o rigor para se passar às conclusões e a incorporação da crítica como também um elemento do método, o que não é pouco como distinção. No entanto, os movimentos mentais, se assim podemos chamar, de compreensão da realidade não são muito distintos entre um e outro campo. A literatura antropológica registra os procedimentos de caça do povo !Kun San, habitantes do deserto Kalahari, no sul da África, ocupando áreas da Namíbia, Botsuana e Angola. São caçadores que, na localização e perseguição à caça, demonstram grande capacidade de observação. “Como é que eles agiam?” pergunta-se o físico americano Carl Sagan. “Como podiam obter tantas informações de pouco mais que uma simples olhadela? Dizer que eram observadores argutos nada explica. O que é que realmente faziam? Eles examinavam a forma das depressões. O rasto de um animal veloz exibe uma simetria mais alongada. Um animal levemente manco protege a pata machucada, pondo menos peso sobre ela, e deixa uma marca mais fraca. Um animal mais pesado deixa uma depressão mais profunda e mais larga. As funções e correlação estão nas cabeças dos caçadores. Ao longo do dia, o rasto é em parte destruído pela erosão. As paredes da depressão tendem a desmoronar. A areia soprada pelo vento se acumula no fundo da cavidade. (…) Esse método é essencialmente idêntico ao usado pelos astrônomos planetários, quando analisam as crateras criadas por pequenos mundos que sofreram impactos: sendo iguais todas as outras condições, quanto mias rasa a cratera,mais antiga ela é”6. (…) “Não há vestígio de métodos mágicos no rastreamento dos !Kung – examinar as estrelas na noite anterior ou as entranhas de um animal, lançar os dados, interpretar sonhos, invocar demônios ou qualquer outra das inúmeras formas espúrias de conhecimento que os seres humanos têm intermitentemente levado em consideração. Nesse caso, há uma pergunta específica e bem definida: que direção a caça tomou e quais são as suas características? É necessária uma resposta precisa que a magia e a divinação simplesmente não fornecem – pelo menos não com a frequência necessária para afastar a inanição. Em vez disso, os caçadores-coletores – que não são muito supersticiosos na vida cotidiana, exceto durante danças em transe ao redor do fogo e sob a influência de euforizantes leves – são práticos, rotineiros, motivados, sociáveis e frenquentemente muito alegres. Empregam habilidades escolhidas dentre os sucessos e fracassos do passado”.7 A ginástica mental realizada pelo senso comum para conhecer alguma coisa, para estabelecer uma verdade, e aquela realizada pelo pensamento científico não são, em si, diferentes. A diferença surge quando se observa a incorporação de alguns elementos ao processo desenvolvido num e noutro campo: o rigor na observação e na passagem para as generalizações (observação detalhada, generalizações cautelosas,), a prática da crítica sistemática, o uso constante do ceticismo, da dúvida metódica recomendada por Descartes. Estes elementos quase sempre estão ausentes das formulações ditadas pelo senso comum. Se o método científico impõe cautela para se passar às conclusões, em muitos casos generalizações a partir da observação de exemplares do fenômeno, o senso comum facilmente generaliza, sem preocupação com o rigor da observação, da representatividade do conjunto de exemplares e com a veracidade da generalização. Isto pode ser ilustrado com trechos do romance Cemitério de Praga, de Umberto Eco, à frente dos quais apresentamos entre parêntesis os problemas epistemológicos que apresentam, se se tratassem de um texto com pretensões científicas e não como a ficção que é. Judeus (Generalizações, atribuição de um ethos preconceituoso. Verdades estabelecidas a partir de uma visão subjetiva e partidária - “Quem odeio?” - Hiperbolização de algumas características) Quem odeio? Os judeus, me ocorreria dizer, mas o fato de eu estar cedendo tão servilmente às instigações daquele doutor austríaco (ou alemão) sugere que não tenho nada contra os malditos judeus. Deles, sei apenas o que me ensinou meu avô: “São o povo ateu por excelência”, ele me instruía. Partem do conceito de que o bem deve se realizar aqui, não além-túmulo. Por conseguinte, agem somente para a conquista deste mundo. (…) E quando eu crescera o suficiente para entender, ele me recordava que o judeu, além de vaidoso como um espanhol, ignorante como um croata, cúpido como um levantino, ingrato como um maltês, insolente como um cigano, sujo como um inglês, untuoso como um calmuco, autoritário como um prussiano e maldizente como um astiense, é adúltero por um cio irrefreável — resultado da circuncisão, que os torna mais eréteis, com uma desproporção monstruosa entre o nanismo da corporatura e o tamanhão cavernoso daquela sua excrescência semimutilada”. Alemães Os alemães eu conheci, e até trabalhei para eles: o mais baixo nível concebível de humanidade. Um alemão produz em média o dobro das fezes de um francês. Hiperatividade da função intestinal em detrimento 6 7 SAGAN. Carl. O mundo assombrado pelos demônios. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. Cap. 18: O vento levanta poeira, p. 305. Idem, ibidem, p. 307. da cerebral, o que demonstra sua inferioridade fisiológica. No tempo das invasões bárbaras, as hordas germânicas constelavam o percurso com montes desarrazoados de matéria fecal. Por outro lado, mesmo nos séculos passados, um viajante francês logo compreendia se havia transposto a fronteira alsaciana pelo volume anormal dos excrementos abandonados ao longo das estradas. E não somente: é típica do alemão a bromidrose, ou seja, o odor repugnante de suor, e está provado que a urina de um alemão contém 20 por cento de azoto, ao passo que a das outras raças, somente 15. O alemão vive em um estado de perpétuo transtorno intestinal, resultante do excesso de cerveja e daquelas salsichas de porco com as quais se empanturra. (...) O abuso de cerveja torna-os incapazes de ter a mínima ideia da sua vulgaridade, mas o superlativo dessa vulgaridade é que não se envergonham de ser alemães. Levaram a sério um monge glutão e luxurioso como Lutero (pode-se desposar uma monja?), só porque arruinou a Bíblia traduzindo-a para a língua deles. Alguém não disse que abusaram dos dois grandes narcóticos europeus, o álcool e o cristianismo? Consideram-se profundos porque sua língua é vaga, não tem a clareza da francesa e nunca diz exatamente o que deveria, de modo que nenhum alemão sabe jamais o que queria dizer – e toma essa incerteza por profundidade. Com os alemães é como com as mulheres, nunca se chega ao fundo. Desgraçadamente, essa língua inexpressiva, com uns verbos que, ao ler, temos que procurar ansiosamente com os olhos, porque nunca estão onde deveriam estar, meu avô me obrigou a aprendê-la na juventude – o que não é de espantar, pró-austríaco como ele era. E assim odiei essa língua, tanto quanto odiei o jesuíta que vinha me ensinar a golpes de baqueta nos dedos. Franceses Desde que me tornei francês (e já o era pela metade, pelo lado materno), compreendi quanto meus novos compatriotas são preguiçosos, trapaceiros, rancorosos, ciumentos, orgulhosos além de todos os limites, a ponto de pensarem que quem não é francês é um selvagem, e incapazes de aceitar críticas. Percebi, porém, que para induzir um francês a reconhecer uma tara da sua corja basta lhe falar mal de outro povo, por exemplo, “nós, poloneses, temos esse ou aquele outro defeito”. E, como não querem ficar atrás de ninguém, nem sequer no mal, eles logo reagem com “oh, não, aqui na França somos piores” e passam a difamar os franceses até se darem conta de que você os apanhou na armadilha. Não amam seus semelhantes, nem quando tiram vantagem deles. Ninguém é tão mal-educado como um taberneiro francês, que parece odiar os fregueses (e talvez seja verdade) e desejar que não estivessem ali (e é mentira, porque o francês é avidíssimo). Ils grognent toujours. Experimentem lhes perguntar alguma coisa: sais pas, moi, e protraem os lábios como se peidassem. São maus. Matam por tédio. É o único povo que durante vários anos manteve seus cidadãos ocupados em se cortarem reciprocamente a cabeça, e a sorte foi que Napoleão desviou-lhes a raiva para os de outra raça, enfileirando-os para destruir a Europa. Orgulham-se de ter um Estado que afirmam poderoso, mas passam o tempo tentando derrubá-lo: ninguém é tão eficiente como o francês em erguer barricadas por qualquer razão e a qualquer sussurro do vento, muitas vezes sem sequer saber o porquê, fazendo-se arrastar na rua pela pior ralé. O francês não sabe bem o que quer, exceto que sabe à perfeição que não quer aquilo que tem. E, para dizer isso, não sabe fazer mais do que cantar canções. (Casualidade não comprovada) Li o doutor Tissot; sei que as mulheres fazem mal até de longe. Não sabemos se os espíritos animais e o líquido genital são a mesma coisa, mas é certo que esses dois fluidos têm uma certa analogia, e depois de longas poluções noturnas não somente se perdem as forças, mas também o corpo emagrece, o rosto empalidece, a memória se desfaz, a vista se enevoa, a voz se faz rouca, o sono é perturbado por sonhos irrequietos, sentem-se dores nos olhos e aparecem manchas vermelhas na face; alguns cospem matérias calcinadas, sentem palpitações, sufocações, desmaios, outros reclamam de prisão de ventre ou de emissões cada vez mais fétidas. Por fim, a cegueira. Semitas e arianos (Subjetivismo com pretensões de objetividade. Falta de comprovação estatística. Relação entre geografia e moral). - O semita é mercantil, cúpido, intrigante, sutil, astuto, ao passo que nós, arianos, somos entusiásticos, heroicos, cavalheirescos, desinteressados, francos, confiantes até à ingenuidade. O semita é terrestre, já não vê nada além da vida presente; vocês encontraram na Bíblia alguma menção ao além? O ariano é sempre tomado pela paixão pela transcendência, é filho do ideal. O deus cristão fica no alto dos céus; o judaico ora aparece sobre uma montanha, ora sobre uma sarça, nunca mais alto. O semita é negociante; o ariano é agricultor; poeta, monge e sobretudo soldado, porque desafia a morte. O semita não tem capacidade criativa, vocês já viram musicistas, pintores, poetas judeus? Já viram um judeu que tenha feito descobertas científicas? O ariano é inventor; o semita desfruta das invenções do ariano. ________________________________________________________ Processo intelectuais de apreensão da realidade: dedução e indução. O Método Científico Método dedutivo Na história da ciência e do pensamento, em diversas ocasiões ao longo de 2.500 anos de história, a fonte do conhecimento, por excelência, foi tida como alguns princípios gerais, universais, amplamente aceitos porque emitidos por autoridades filosóficas, dos quais eram derivadas conclusões lógicas. Acreditava-se num conhecimento finito, acabado, e o que mais houvesse a conhecer encontrava guarida e sentido naquele arcabouço geral. O conhecimento era compreendido como derivado exclusivamente da lógica, do intelecto, daquilo que ele previamente conhecia. O conhecimento, na verdade, estava dado através de verdades gerais, universais. A partir dessas verdades gerais, por derivação lógica, o particular seria compreendido. A este processo intelectual dá-se o nome de pensamento dedutivo. O exemplo clássico nos vem da lógica aristotélica, assumida no século XVII por pensadores modernos como Descartes, Spinoza e Leibniz. O processo intelectual de apreensão da realidade apresenta um movimento descendente, partindo do geral para o particular, através de raciocínios derivados, chegando a uma conclusão. Exemplo: O homem é mortal. Pedro é homem. Pedro é mortal. Em linguagem matemática, formal, estas expressões podem ser transcritas como: se A=B e B=C, logo A=C. O famoso postulado de Descartes, “Penso, logo existo”, inscreve-se nesse modelo de raciocínio. Para compreendê-lo como conclusão, é necessário retomar o caminho por ele percorrido. Partindo da hipótese de que tudo que se vê é falso, o que poderia ser inquestionavelmente verdadeiro? Ou formulando de outro modo: se a existência de tudo pode ser questionada e concluir-se pela não existência, o que inquestionavelmente existe? Ora, aquele que pensa, que duvida – o eu pensante, enfim. Nas palavras do próprio Descartes, é assim que o problema aparece: “Suponho que todas as coisas que vejo são falsas. Fixo-me bem que nada existiu de tudo o que minha memória me representa. Penso não ter nenhum órgão de sentidos. Creio que o corpo, a figura, a extensão, o movimento e o lugar são invenções do meu espírito. Então, o que posso considerar verdadeiro?” A existência do eu que pensa é uma verdade “firme e sólida”, resistente aos questionamentos dos céticos, conclui ele. O movimento realizado por Descartes no seu percurso lógico pode ser esquematizado como se segue, de modo simplificado: a primeira premissa é “Os seres exteriores a mim não existem”; a segunda premissa: “Eu não sou exterior a mim” e a conclusão: “Eu existo”. Mesmo sem tentar enquadrá-la dentro do exemplo clássico de pensamento dedutivo, é curioso apreciar a tese do filósofo contemporâneo Stephen Cave, professor em Cambridge. Sua tese: a imortalidade, se existisse, destruiria a civilização. Ele deriva esta conclusão de uma sequência de raciocínios lógicos, e não do levantamento de dados empíricos. Um desses raciocínios: “Grande parte do que fazemos é com base na esperança de vencer a morte. O que faríamos se não fosse mais preciso rezar, criar arte nem fazer pesquisas científicas?” Outro raciocínio: “O valor de uma coisa é definido por sua escassez. Valorizamos o nosso tempo porque é limitado”. (A vida depois da vida. Entrevista a André Petry. Veja ed. 2 256. ano 45. nº 7, de 15/2/2012. p. 104) Durante a Idade Média, de modo amplamente hegemônico, a fonte de conhecimento era a Bíblia. A eleição deste livro como o livro de todas as respostas engendrou uma visão de mundo que enxergava o conhecimento como finito, acabado, já dado em sua totalidade e nele enfeixado. O conhecimento se limitava, portanto, a uma exegese do Livro dos Livros. Daí a reação da Igreja Católica e da cultura letrada da época às conclusões de Nicolau Copérnico, em meados do século XVI, e de Galileu, em princípios do século XVII, concernentes à teoria heliocêntrica. A Bíblia refere-se à Terra como um corpo celeste parado e ao Sol como um corpo em movimento. Está lá no livro de Josué, quando ele, precisando da claridade do dia para completar a vitória sobre a cidade de Jericó, pede a Deus para parar o Sol, e é atendido. A conclusão óbvia é a de que só pára aquilo que se move, logo, é o Sol o astro dotado de movimento. Por uma razão também extraída da Bíblia, como pressuposto, a Terra era o centro do universo, uma vez que aqui Deus estabeleceu sua maior criação, o homem, feita à sua imagem e semelhança. Este mesmo espírito de época impede, ou tenta impedir, o desenvolvimento do conhecimento em várias frentes. É assim que Sophie Chauveau registra as dificuldades, em inícios do século XVI, para Leonardo da Vinci levar à frente o seu interesse pela anatomia. “Os tradicionalistas da época consideram a anatomia como uma curiosidade deslocada e, segundo alguns, escandalosa. Como o homem foi feito à imagem de Deus, não se deve querer analisar seu funcionamento como se fosse um mecanismo” . Porém, “uma das metas de Leonardo é determinar o lugar da alma, as coordenadas exatas do ponto onde ela se encontra”8. Essa racionalidade extraída da Bíblia também fundamentou no Nordeste brasileiro, no século XIX, uma reação à construção de açudes como recurso ao enfrentamento das secas cíclicas. Eles contrariavam a ordem natural das coisas, a vontade de Deus, diziam alguns, porque se fosse para barrar os rios Deus próprio já teria deixado assim disposto. O que se pode concluir a respeito é que um corpo de ideias gerais, tomadas como absolutamente verdadeiras, sejam de fundo religioso ou materialista, fundamenta uma perspectiva dedutivista de apreensão da realidade, a qual prescinde da análise de fatos particulares. Num texto famoso, Durkheim, um dos pais fundadores da sociologia, expõe um postulado norteador da sua análise sociológica, porque compreendido como expressando uma característica essencial da sociedade, objeto de estudo da ciência que ele ajudou a construir. Diz ele: “Com efeito, é um postulado essencial da sociologia que uma instituição humana não pode repousar sobre o erro e a mentira, caso contrário não pode durar. Se não estivesse fundada na natureza das coisas, ela teria encontrado nas coisas resistências insuperáveis”9. Um postulado é definido como aquela proposição que prescinde de demonstração, tão óbvia é a verdade que ele expressa.. O que expressa este axioma? A noção de que a sociedade, e as relações sociais que a constituem, se funda sob a égide da racionalidade. A partir daí, as instituições sociais e as relações entre indivíduos e grupos serão tomadas como impregnadas dessa racionalidade. Desse modo, no âmbito das ciências sociais, algumas proposições circulam com status de postulado, funcionando como matrizes lógicas, das quais são derivadas outras proposições, sem que seus usuários sintam a necessidade de recorrer aos fatos para uma possível validação. Por exemplo: “O progresso é um mito: na verdade, a humanidade regrediu”. “A educação não interessa ao poder”. “O capitalismo precariza o trabalho”. Do mesmo modo, no âmbito do senso comum, mas em muitos momentos pretendendo um certo verniz científico, vê-se formulações como as seguintes, assumidas como postulados: “Os jovens são naturalmente revolucionários”; “As mulheres não podem exercer as mesmas atividades dos homens”; “O paulista só pensa em trabalho”. Sempre que se atribua uma essência a uma categoria de seres geral (os humanos, os homens, as mulheres, o proletariado, os movimentos sociais, a burguesia, os governantes, os cariocas, os brasileiros, os americanos, os jovens, os políticos, etc.) essa essência será reencontrada no particular, como espécime da categoria. Como no exemplo seguinte: As mulheres são vaidosas. Maria é mulher. Maria é vaidosa. Ou 8. CHAUVEAU, Sophie. Leonardo da Vinci. Porto Alegre, RS: L&PM, 2010. p. 58 9 DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Martins Fontes, 1996. pp. VI-VII. neste: Os homens são brutos. Mário é homem. Mário é bruto. Um postulado sem uma base factual sólida nada mais é que uma crença. Desse modo, é recomendável que nos dediquemos a analisar a solidez dos postulados que sustentam e dão sentido a grandes conjuntos de ideias e de ações. Método Indutivo O método indutivo realiza ao contrário o movimento do método dedutivo. Ele parte do particular, a fim de, pela generalização, estabelecer verdades gerais. É a experiência com o fato particular, a observação do fato concreto, real, empírico, que é capaz de gerar conhecimento. O exemplo clássico é: Paulo é mortal. Pedro é mortal. Cláudio é mortal. Paulo é homem. Pedro é homem. Cláudio é homem. Os homens são mortais. Esta visão, a partir do século XVII, começa a tomar forma e se estabelecer como visão predominante no meio da comunidade de homens dedicados ao conhecimento, dando origem ao método científico, e, em consequência, à ciência moderna. Ligados a esse movimento estão nomes como Francis Bacon, Thomas Hobbes, John Locke e David Hume, todos ingleses, reconhecidos como empiristas. As contribuições vindas desses filósofos e de cientistas como Galileu, físico italiano, e de Boyle, químico irlandês, sistematizaram e fizeram avançar a compreensão do método e de seus procedimentos, tornando-o, mais do que empírico, experimental, isto é, não sujeito à ocorrência do evento, para sua observação, mas produzindo experimentalmente o evento, a fim de proceder a uma observação controlada. O caráter empírico impregna a ciência moderna. Como os fatos concretos estão na origem do conhecimento, todo conhecimento com o status de científico é necessariamente empírico. Uma série de cuidados cerca as conclusões generalizantes. Para que um conhecimento seja generalizável, é necessário que ele se basei na análise de um conjunto de seres representativos daquele universo para o qual se estabelecem as generalizações. Vimos nos trechos do romance de Eco, como possíveis exemplos do senso comum, generalizações sem nenhum cuidado, sem nenhum rigor, estabelecidas não a partir da observação cuidadosa, mas de simpatias ou antipatias perturbadoras. De resto, devemos lembrar que uma boa dose de cepticismo, incorporada à postura do sujeito, também faz parte do método. Curiosidade de uma criança de cinco anos e meio: – Pai, por que adulto não tem preguiça? Trata-se aqui do pedido de explicação causal de uma conclusão: adulto não tem preguiça. A conclusão baseou-se na observação de fatos, mas, no entanto, ela é viciada. Ela foi estabelecida, por contraste, a partir de um único exemplo: o exemplo da própria criança, que se sente preguiçosa por não ter as atividades do pai e por oferecer alguma resistência para se levantar da cama logo cedo da manhã, e o do pai, que não reclama por sair para trabalhar. O cuidado com as conclusões, com a significação dada às observações, também deve guiar a busca pelo conhecimento, tanto entre pesquisadores como entre pessoas que não têm a ciência como profissão. “(...) existe uma diferença física entre as raças branca e negra que, segundo acredito, impedirá para sempre que ambas vivam juntas em termos de igualdade social ou política. E, considerando-se que elas não podem viver assim, é preciso que haja, em sua convivência, uma posição de superior e inferior – e, tanto quanto qualquer outro homem, eu sou a favor de que a posição superior seja atribuída à raça branca. Aproveito esta ocasião para dizer que o fato de o homem branco deter a posição superior não significa, em minha percepção, que se deva negar tudo aos negros” 10. Este conjunto de observações e de conclusões delas derivadas são de Abraham Lincoln, o que não o impediram de abraçar decididamente a luta contra a escravidão negra nos Estados Unidos. A convicção expressa na última frase talvez fosse, para si, mais determinante de sua conduta do que todas as outras. Alguns partidários, tanto da visão dedutivista como da indutivista (empiricista), assumiram de modo extremado sua respectiva posição. Para os primeiros, só a teoria pura era capaz de gerar conhecimento, porque ela era derivada da lógica, da razão pura, e não de um particularismo que poderia ser verdadeiro para aquele conjunto, naquele momento, mas que nunca ad aeternun. Em termos concretos, ninguém poderia concluir, após observar uma sequência de eventos em que todos os patos aparecem com a cor branca, que todos os patos são brancos. Quem poderá afirmar que nunca, num tempo futuro, surgirão patos de outra cor, para invalidar a conclusão? Por outro lado, as posições mais extremadas do empirismo enxergavam uma autonomia praticamente absoluta para o poder dos fatos como gerador do conhecimento. É como se eles falassem por si, como se eles fossem o próprio significado. Para compreender, basta olhar. É evidente que o conhecimento não é tão simples assim. Se assim fosse, não haveria necessidade de estudos. Basta nos lembrarmos de que as descobertas na área da química são feitas por químicos e não por sociólogos; assim como as descobertas na área da sociologia não são feitas por físicos experimentais. Na verdade, os fatos não falam sozinhos, eles encontram explicação numa estrutura significa pré-existente. É disto que trata o texto de Albert Jackard, geneticista francês. O processo de conhecimento, a apreensão do mundo11 Albert Jacquard A ferramenta do conhecimento é antes de tudo nosso cérebro. Os sentidos são necessários para nos trazer informações sobre a realidade que nos cerca, mas essas informações são caóticas, semelhantes a um amontoado desordenado - de pequenos quadrados de todas as formas e de todas as cores. Nosso cérebro os arruma em um mosaico organizado e se esforça para dar lugar e significação a todos os elementos recebidos no varejo. Para chegar a isto, ele inventa ferramentas abstratas capazes de transformar um amontoado em estrutura: os conceitos. Todas as palavras que nós utilizamos para descrever o mundo - força, velocidade, duração, campo, partícula... - são invenções humanas que permitem construir em nós um modelo mais ou menos fiel do universo que nos cerca, de fazer nascer, num processo sem fim de conhecimento12, uma imagem propriamente humana do mundo. De início, nós nos contentamos com as informações que o universo nos envia espontaneamente; pouco a pouco, nós tomamos a iniciativa, nós o questionamos, às vezes nós o colocamos até mesmo em xeque para o forçar a nos confessar alguns segredos bem escondidos no coração de galáxias longínquas ou em inacessíveis núcleos atômicos. O mosaico não está nunca terminado. Novos elementos nos chegam, é necessário integrá-los ao mosaico. Às vezes, eles encontram naturalmente seu lugar no esboço já realizado. Às vezes, ao contrário, eles nos obrigam a retomar toda a obra. Acontece que o século XX foi particularmente rico em ocasiões de pôr em xeque a própria estrutura do mosaico; não que fosse necessário apagar tudo, mas a arquitetura global devia ser refeita. Para o cientista, estão aí os momentos mais apaixonantes: ele compreende que não compreende mais 13. É-lhe necessário dar provas de imaginação. É um caçador feliz aquele que está sobre uma nova pista, mas ainda não pegou a presa. Infelizmente para a coletividade, sufocada pelos problemas cotidianos, esses questionamentos passam frequentemente despercebidos; os jogos intelectuais dos físicos à procura de um novo quark parecem passatempos inúteis aos olhos daqueles que têm que lutar dia após dia contra a miséria, o desemprego, o desprezo. Pouco a pouco, o fosso se alarga entre os que dão precisão ao conteúdo do conhecimento e os que têm necessidade de conhecer a realidade para melhor enfrentar as dificuldades. 10 Citado por GUZZO, J. R. Entre ideias e atos. Veja, São Paulo, ano 46, nº 18, ed. 2.319, p. 142, 1º de maio de 2013. 11. Trecho do livro Voici le temps du monde fini, de Albert Jacquard (Paris: Éditions du Seuil, 1991. pp. 15 a 17). Tradução de Aécio Cândido. Título dado pelo tradutor. 12. O termo francês para conhecimento é connaissance, para nascimento é naissance. O autor cria a palavra co-naissance, que encerra três ideias: a de conhecimento, a de nascimento do conhecimento e a de nascimento conjunto do conhecimento. 13. Grifos do tradutor, como todos os outros. Estes podem se encontrar desmunidos, sem meios de reação contra as forças naturais ou sociais que os oprimem, enquanto que o arsenal conceitual do cientista contém justamente as armas que permitiriam lutar melhor. Eles não foram informados disto: a culpa cabe tanto ao sistema educativo, frequentemente atrasado em relação a uma revolução conceitual, como aos diversos meios de comunicação social, para quem só conta os acontecimentos sensacionais. Mas a responsabilidade maior cabe aos cientistas, mais obcecados pelo desejo de brilhar diante de seus colegas que pelo de difundir o conhecimento que eles puderam acumular. A situação de urgência em que se encontra a humanidade neste fim de século impõe a descrição tão precisa quanto possível da realidade da Terra dos homens. Essa descrição deve utilizar os conceitos de hoje, sob pena de repetir os erros passados. Antes de qualquer esforço de precisão dos fatos, é necessário um esforço para colocar em dia os conceitos. Que querem dizer hoje as palavras tempo, matéria, vida, acaso, pessoa? Os fatos como base do conhecimento Se os fatos não são autônomos, no sentido de que eles não falam por si próprios para qualquer um, não quer dizer que o conhecimento científico prescinda deles. Conclusão sem fatos, seja na ciência seja na vida cotidiana – e sobretudo na investigação policial -, não se sustenta. É isto o que se pode concluir do texto do astrofísico americano Carl Sagan reproduzido abaixo. O DRAGÃO NA MINHA GARAGEM14 Carl Sagan [A] mágica, devemos lembrar, é uma arte que requer colaboração entre o artista e seu público. E. M. Butler, The myth of the magus (1948) - Um dragão que cospe fogo pelas ventas vive na minha garagem. Suponhamos (estou seguindo uma abordagem de terapia de grupo proposta pelo psicólogo Richard Franklin) que eu lhe faça seriamente essa afirmação. Com certeza você iria querer verificá-la, ver por si mesmo. São inumeráveis as histórias de dragões no decorrer dos séculos, mas não há evidências reais. Que oportunidade! — Mostre-me — você diz. Eu o levo até a minha garagem. Você olha para dentro e vê uma escada de mão, latas de tinta vazias, um velho triciclo, mas nada de dragão. — Onde está o dragão? — você pergunta. — Oh, está ali — respondo, acenando vagamente. — Esqueci de lhe dizer que é um dragão invisível. Você propõe espalhar farinha no chão da garagem para tornar visíveis as pegadas do dragão. Boa idéia — digo eu —, mas esse dragão flutua no ar. Então você quer usar um sensor infravermelho para detectar o fogo invisível. - Boa idéia, mas o fogo invisível é também desprovido de calor. Você quer borrifar o dragão com tinta para torná-lo visível. — Boa idéia, só que é um dragão incorpóreo e a tinta não vai aderir. E assim por diante. Eu me oponho a todo teste físico que você propõe com uma explicação especial de por que não vai funcionar. Ora, qual é a diferença entre um dragão invisível, incorpóreo, flutuante, que cospe fogo atérmico, e um dragão inexistente? Se não há como refutar a minha afirmação, se nenhum experimento concebível vale contra ela, o que significa dizer que o meu dragão existe? A sua incapacidade de invalidar a minha hipótese não é absolutamente a mesma coisa que provar a veracidade dela. Alegações que não podem ser testadas, afirmações imunes a refutações não possuem caráter verídico, seja qual for o valor que possam ter por nos inspirar ou estimular nosso sentimento de 14. SAGAN, Carl. O Mundo Assombrado pelos Demônios. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. p. 171-173 admiração. O que estou pedindo a você é tão-somente que, em face da ausência de evidências, acredite na minha palavra. A única coisa que você realmente descobriu com a minha insistência de que há um dragão na minha garagem é que algo estranho está se passando na minha mente. Você se perguntaria, já que nenhum. teste físico se aplica, o que me fez acreditar nisso. A possibilidade de que foi sonho ou alucinação passaria certamente pela sua cabeça. Mas, nesse caso, por que eu levo a história tão a sério? Talvez eu precise de ajuda. Pelo menos, talvez eu tenha subestimado seriamente a falibilidade humana. Apesar de nenhum dos testes ter funcionado, imagine que você queira ser escrupulosamente liberal. Você não rejeita de imediato a noção de que há um dragão que cospe fogo na minha garagem. Apenas deixa a idéia cozinhando em banho-maria. As evidências presentes são fortemente contrárias a ela, mas, se surgirem novos dados, você está pronto a examiná-los para ver se são convincentes. Decerto não é correto de minha parte ficar ofendido por não acreditarem em mim: ou criticá-lo por ser chato e sem imaginação — só porque você apresentou o veredicto escocês de "não comprovado". Imagine que as coisas tivessem acontecido de outra maneira. O dragão é invisível, certo, mas aparecem pegadas na farinha enquanto você observa. O seu detector infravermelho lê dados fora da escala. A tinta borrifada revela um espinhaço denteado oscilando à sua frente. Por mais cético que você pudesse ser a respeito da existência dos dragões — ainda mais dragões invisíveis —, teria de reconhecer que existe alguma coisa no ar, e que de forma preliminar ela é compatível com um dragão invisível que cospe fogo pelas ventas. Agora outro roteiro: vamos supor que não seja apenas eu. Vamos supor que vários conhecidos seus, inclusive pessoas que você tem certeza de que não se conhecem, lhe dizem que há dragões nas suas gara-gens — mas, em todos os casos, a evidência é enlouquecedoramente impalpável. Todos nós admitimos nossa perturbação quando ficamos tomados por uma convicção tão estranha e tão mal sustentada pela evidência física. Nenhum de nós é lunático. Especulamos sobre o que isso significaria, caso dragões invisíveis estivessem realmente se escondendo nas garagens em todo o mundo, e nós, humanos, só agora estivéssemos percebendo. Eu gostaria que não fosse verdade, acredite. Mas talvez todos aqueles antigos mitos europeus e chineses sobre dragões não fossem mitos afinal... Motivo de satisfação, algumas pegadas compatíveis com o tamanho de um dragão são agora noticiadas. Mas elas nunca surgem quando um cético está observando. Outra explicação se apresenta: sob exame cuidadoso, parece claro que podem ter sido simuladas. Outro crente nos dragões aparece com um dedo queimado e atribui a queimadura a uma rara manifestação física do sopro ardente do animal. Porém, mais urna vez, existem outras possibilidades. Sabemos que há várias maneiras de queimar os dedos além do sopro de dragões invisíveis. Essa “evidência" — por mais importante que seja para os defensores da existência do dragão — está longe de ser convincente. De novo, a única abordagem sensata é rejeitar em princípio a hipótese do dragão, manter-se receptivo a futuros dados físicos e perguntar-se qual poderia ser a razão para tantas pessoas aparentemente normais e sensatas partilharem a mesma delusão estranha. A mágica requer cooperação tácita entre o público e o mágico – um abandono do ceticismo, ou o que é as vezes descrito como a suspensão voluntária da descrença. Segue-se imediatamente que, para compreender a mágica, para expor o truque, devemos parar de colaborar. COMPREENSÃO DO TEXTO15 1. Que evidências foram buscadas para atestar a veracidade da afirmativa: “Há um dragão na minha garagem”? 2. Que procedimentos metodológicos foram utilizados para a busca de cada evidência? 3. A busca de evidências tem como pressuposto a existência de um conhecimento prévio. Como você entende esta afirmação? Como ela se aplica ao texto? 4. Conhecimento prévio, como aludido na questão anterior, pode ser igualado a teoria? Por que? 5. Ceticismo, postura cética, o que se pode inferir do texto a respeito do papel do comportamento cético na produção do conhecimento? 6. O espírito deste texto pode ser aplicado à investigação em Ciências Sociais? 15. O objeto do conhecimento é, neste texto, a constatação de um dado fenômeno – a existência de um determinado ser. Este é um tipo de conhecimento comum na biologia e na zoologia, por exemplo. A descoberta de uma nova espécie, a reclassificação de uma espécie já conhecida ilustram a observação feita. Também na física: novas estrelas, novos planetas. As ciências sociais também tem seus exemplos: rituais de iniciação, práticas de socialização, relações de poder, instituição social, grupo social, etc. Na verdade, são conceitos que sistematizam os fenômenos, organizando-os em grupos. Uma afirmação como esta: “os assentamentos rurais da reforma agrária recriam o campesinato no Nordeste” carece de evidências para ser aceita como conhecimento verdadeiro. Onde buscar e como buscar essas evidências? Método hipotético-dedutivo A ciência moderna, na verdade, não reconhece a dedução ou a indução, separadamente, como processos eficientes para se chegar a um conhecimento confiável. Mais uma vez, o primeiro texto de Umberto Eco pode nos fornecer alguns esclarecimentos a respeito de como se efetiva o processo de conhecimento. Lembremos que Frei Guilherme dá significado aos fatos que aparecem diante dele. De posse deles, ele compara, aproxima, deduz. Isto só lhe é possível, porque ele possui um certo conhecimento prévio. Sobre cavalos, sobre as relações hierárquicas entre os monges e sobre a vida monástica em geral, sobre a mentalidade da época (conhece pensadores e o pensamento deles), sobre o comportamento social de seu meio. Em outros termos, ele conhece teorias capazes de fornecer significados ao que ele observa. Daí, associando um fato a outro, ele pode levantar hipóteses e aguardar sua confirmação (a indicação da direção do cavalo foi uma hipótese; os gritos de júbilo dos monges, algum tempo depois da indicação fornecida, foi a confirmação da hipótese). As hipóteses, para situações particulares concretas, também são derivadas, ou seja, deduzidas, de formulações gerais, abstratas. Mas para se firmarem como verdades elas carecem da confirmação dos fatos. Desse modo, a formulação de uma verdade (conclusão) passa por uma fase intermediária, de caráter provisório – a hipótese. Confirmada pelos fatos, a hipóteses ganha a condição de conclusão, de verdade, e deixa de ser provisória. Pelo menos num certo sentido. Ela será válida até que uma verdade “mais verdadeira”, digamos, apareça. Para o método hipotético-dedutivo, os fatos geram hipóteses pescadas na teoria. Sem dúvida, só lança hipótese quem conhece a teoria. As hipóteses carecem do retorno aos fatos para serem validadas. Crenças Afirmações categóricas sem a escora de fatos que as sustentem não passam de fantasia. «Numa tradução da História Natural, de Plínio, escrita no início da era cristã, pode ler-se o seguinte parágrafo (...): “A mão da mulher com a menstruação torna o vinho em vinagre, seca as colheitas, mata as sementes, murcha os jardins, embacia os espelhos, oxida o ferro e o latão (sobretudo quando a Lua está na fase de quarto minguante), mata as abelhas, o marfim perde o seu brilho, os cães enlouquecem se lambem o seu mênstruo...” (...) Algumas comunidades judaicas da Europa Oriental acreditam que, se as mulheres se aproximarem das conservas durante a menstruação, estas estragar-se-ão. Na Carolina do Norte mantém-se a crença tradicional de que, se a mulher amassar um bolo durante o período, este não será comestível.» 16 Ao que parece, à época, ninguém se deu ao trabalho de testar essas relações de causalidade, e elas eram aceitas com verdades evidentes. Em relação a fenômenos sociais, as crenças se instalam como ideologia quando se referem, em certos casos, a afirmações relativas a um futuro desejado ou a uma essencialidade que não podem ser testadas ou “falseadas”, na expressão de Popper. Além disso, elas se apresentam como certezas, daí não aceitarem espontaneamente o exercício da “dúvida metódica” recomendado por Descaretes. Princípio da Falseabilidade Deve-se a Popper a formulação do princípio da falseabilidade como critério de verdade científica. Ele defendia, do ponto de vista lógico, que os enunciados verdadeiros e falsos existem em igual quantidade. Ou seja, para cada afirmação verdadeira existe uma afirmação falsa. Os enunciados abaixo ilustram a ideia de Popper. 16 Disponível em <http://cadernosociologia.blogspot.com.br/2009/10/senso-comum-e-ciencia-alguns-exemplos.html > Enciclopédia de Psicologia. Acesso em: 17/12/2012 . A Terra é quadrada. (enunciado falso). A Terra não é quadrada. ( negação do enunciado anterior, enunciado verdadeiro) . Sabemos que a pouca distância da Terra (no nosso sistema solar) há planetas habitados. (enunciado falso). Sua negação: Sabemos que a pouca distância da Terra não há planetas habitados. (enunciado verdadeiro) . A educação não exerce influência sobre o desenvolvimento econômico e social de uma nação. (enunciado falso) A educação exerce influência sobre o desenvolvimento econômico e social de uma nação. (negação do enunciado anterior, enunciado verdadeiro) . As sociedades tradicionais estão alicerçadas sobre a produção industrial. (enunciado falso) As sociedades tradicionais não estão alicerçadas sobre a produção industrial. (negação do enunciado anterior, enunciado verdadeiro) . O Estado democrático é um modelo de organização política que respeita os direitos dos indivíduos. (enunciado verdadeiro) O Estado democrático é um modelo de organização política que não respeita os direitos dos indivíduos. (enunciado verdadeiro, negação do enunciado anterior) Verdade e certeza, verdade científica e nas artes Há muitas coisas em que eu acredito e há outras tantas em que não. Aquilo em que eu acredito eu considero verdade e considero mentira aquilo em que não creio. Não será estranho se eu definir verdade como aquilo em que acredito. Não é estranho, mas é pouco aceitável como definição. Ela tem uma carga excessiva de subjetividade, ou seja, a medida da verdade é o próprio sujeito, e, afora os assuntos sentimentais, esta não é a melhor baliza para orientar uma linguagem facilmente compreensível. O cristão crente, escudado na afirmação do Cristo de que “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”, facilmente admitirá que a verdade é aquilo que está em conformidade com a vontade de Deus. Com esta definição permanecemos ainda dentro de um espaço profundamente subjetivo, pois saber qual a vontade de Deus é tarefa bastante difícil, senão impossível, visto que ela aparece para cada confissão religiosa, e não raramente para cada crente, de uma forma diferente. A verdade da arte é uma verdade subjetiva, a verdade da fé também. A verdade científica busca critérios mais objetivos de definição. Diz Popper: “uma teoria ou uma proposição é verdadeira, se o estado de coisas descrito pela teoria corresponde à realidade” 17. Há, portanto, um critério exterior ao sujeito de validação das proposições que aspiram ao status de verdade. A noção de verdade, porém, sustenta Popper, não pode se confundir com a noção de certeza. São duas coisas distintas. É mais seguro para a ciência trabalhar com a noção de verdade incerta, desse modo ela fica livre para não canonizar nenhuma verdade e poder avançar. Em outros termos, esta noção significa que não é incômodo para a verdade ceder lugar a uma verdade mais certa. Já a noção de certeza incerta não tem sentido lógico. Para a certeza não cabe adjetivação. Ela é certeza e ponto final. A possibilidade de se ter mais ou menos certeza a respeito de algo expressa o caráter subjetivo da certeza – ela está ligada ao sujeito. Já a verdade é objetiva, sua validade independe do sujeito. Se independe do sujeito, é porque é exterior a ele. A verdade da ciência também resiste ao cotejamento com elementos exteriores a ela. Daí o seu grau de objetividade. O discurso religioso fundamentalista tem outra arquitetura. Os pressupostos da fé religiosa encontram-se no livro sagrado da religião e este não tolera qualquer cotejamento. A lógica exigida é apenas a lógica interna, e não essa lógica interna cotejada com uma lógica exterior ao livro. A obra religiosa, para o fundamentalista, é a própria realidade em toda sua totalidade. Opiniões polêmicas postadas no twitter em 2012 como verdades objetivas por um deputado e pastor evangélico brasileiro exemplificam esta característica do discurso religioso. Por exemplo: “Africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé. Isso é fato...” Qual é o fato? É fato para quem acredita na Bíblia como verdade literal revelada por Deus. Para quem não acredita, ou para quem acredita, mas não de forma literal, não existe aí nenhum fato incontestável. Há uma afirmação, mas nenhuma prova de sua 17 POPPER, Karl. Conhecimento e formação da realidade: a busca por um Fontes, 2006. p. 13-49, p. 14. mundo melhor. In Em busca de um mundo melhor. São Paulo: Martins veracidade. E a conclusão: “A maldição que Noé lança sobre seu neto, Canaã, respinga sobre o continente africano, daí a fome, pestes, doenças, guerras étnicas!”18 É uma conclusão completamente arbitrária. Pensar os problemas africanos como consequências de outras causas seria submeter a afirmação a uma lógica externa, assim como investigar se os problemas africanos são exclusividade do continente, se eles não atingem também outros povos ou se já atingiram, também significa submeter a afirmação ao crivo de outra lógica, uma lógica externa à verdade bíblica. A obra literária, diferentemente do fundamentalismo religioso, não se pretende objetiva. A verdade que ela expressa é relativa, e essa relatividade está incrustada na sua natureza de obra de arte, de recriação pessoal e livre da realidade. Exige-se dela apenas que respeite sua lógica interna, que esteja livre de contradições internas. Mas sabe-se que ali está um mundo à parte, autônomo em relação ao mundo exterior. Como se trata de outro mundo, ele pode manter uma relação com esse mundo real, hiperbolizando alguns aspectos, focando fortemente em aspectos quase invisíveis do quotidiano, a fim de dar-lhes destaque e de chamar atenção para eles. Desse modo, há obras literárias que têm lições sociológicas a dar: são obras realistas, naturalistas. Outras não, em virtude de seu aspecto transreal. A ciência está submetida à objetividade e às evidências empíricas. A literatura, não, como a arte em geral. Picasso pinta o mundo sob a sua perspectiva: as figuras lhe parecem formas geométricas acentuadas e assim elas são expressas. O mesmo ocorre com os impressionistas: para eles, não cabe à pintura retratar o mundo de modo realista – para isto existe a fotografia. A realidade lhes chega como impressão de algo e não como esse algo tal e qual, daí as imagens filtradas por uma certa névoa. José Saramago, em Jangada de Pedra, em Ensaio sobre e Cegueira e em O Homem duplicado, afastase completamente da realidade e cria uma realidade própria em cada romance. Sua lógica é interna. E não faz sentido cotejar a realidade que ele apresenta com a realidade do mundo real – não há busca por um teste empírico. A arte é recriação da vida, é reino da imaginação, da fantasia. Ciência, não. A arte é o espaço do subjetivo. Não tem graça interrogar uma obra artística submetendo-a à lógica dos fatos reais. Há uma anedota contada por Ariano Suassuna que ilustra esse caráter se assentimento, essa concordância prévia sobre o papel da literatura. Um hábil contador de história esmerava-se no relato de uma caçada e era frequentemente interrompido por um dos ouvintes que lhe fazia perguntas impertinentes, exigindo uma lógica do mundo real nos detalhes do enredo e nos elementos do cenário. Depois de um certo ponto, o narrador se irrita com as cobranças de objetividade e explode num desabafo: “Você não sabe escutar história!” Alguém já disse que o escritor é um mentiroso suportável. Suas mentiras são não apenas tolerávies como incentivadas. Subjetivo, subjetividade, relativismo Há campos em que a verdade subjetiva é aceita, em outros não. Deve-se ao avanço do pensamento, da filosofia e da ciência, essa aceitação, como conquista e consequência de novos conhecimentos. Por exemplo, a área da religião, no Ocidente moderno, e a da sexualidade. Antes entendia-se a religião como um campo de verdades objetivas: existe um deus único, a forma de senti-Lo e de cultuá-Lo é única, etc. E daí se impunha aos outros uma religião. Boa parte da sociedade ocidental compreende hoje que a religiosidade é uma forma pessoal de sentir e expressar o sobrenatural, portanto subjetiva, está à margem da racionalidade, é indemonstrável. A uma tentativa de racionalização, de objetividade, a pessoa que crê, ou que se dispõe a crer, encontrará contra-argumentos, sempre centrados numa experiência, num sentimento, numa compreensão pessoal. A ideia de ecumenismo, gerada no meio religioso, incorpora essa dimensão relativista e tolerante. Algo semelhante ocorre com a sexualidade. Sempre se pensou na heterossexualidade como a sexualidade indiscutível para todos os seres humanos. Aceita-se hoje, sem que se atine ainda com as razões precisas que fundam a diversidade de preferências, que este é um assunto de cunho pessoal, no qual a verdade do indivíduo deve servir de baliza. Sinceridade e verdade O jornalista alemão Jürgen Schmieder foi protagonista de um experimento antropológico 18 Disponível em http://www.marcofeliciano.com.br/site/?page=materia&MA_ID_MOD=1167 Acesso em 12/06/2012 interessante: durante um ano ele viveu sem mentir. A experiência lhe permitiu algumas reflexões. Por exemplo: “Existe uma relação complexa entre verdade e sinceridade – e com frequência confundimos os conceitos. Quando digo: 'O Bayern de Munique é um time de futebol alemão recordista em campeonatos', sou sincero e falo uma verdade. Quando alguém afirma: 'O TSV 1860 Munique é o time de futebol conduzido com a maior seriedade do mundo', essa pessoa até pode ser sincera (mesmo que maluca), mas de forma alguma está falando a verdade. E a afirmação: “Você é um bundão” também pode ser sincera, contudo é difícil checar sua veracidade, pois quem pode dizer ao certo que tamanho precisa ter um traseiro para receber o aumentativo?”19 E mais este: “Mas alguns autores dizem verdade quando, na maioria dos casos, referem-se à sinceridade. Por isso tive de encontrar uma definição clara para diferenciar verdade e sinceridade: o contrário de verdade não é mentira, mas simplesmente inverdade. Mentira é o contrário de sinceridade”20. A sinceridade, como se vê, comporta uma dimensão mais subjetiva. 19 SCHMIEDER, Jürgen. Sincero; a história real e bem humorada de um homem que tentou viver sem mentir. Campinas: Verus, 2011. p. 17-18. 20 Idem, ibidem, p. 33. A pesquisa bibliográfica [Texto provisório, em elaboração] Aécio Cândido O alargamento do conhecimento começa pela leitura A formação universitária requer do estudante que ele aprenda, se já não sabe, a tirar proveito das leituras. Isto porque ele precisa acumular conhecimentos, seja em relação aos temas tratados nas disciplinas e em razão das avaliações da aprendizagem que enfrentará, seja em razão da necessidade de enfrentar algum tema que ele pretenda desenvolver de forma mais aprofundada. Saber ler de forma competente significa aumentar a autonomia intelectual, isto é, aquela capacidade de “se virar” sozinho diante de um desafio intelectual, seja este desafio o convite para proferir uma palestra ou a necessidade de desenvolver uma pesquisa de campo. A leitura é necessária para fornecer a base a partir da qual se pode olhar o mundo e captá-lo com maior largueza. Ver pela primeira vez é muito provavelmente não ver. Esta afirmativa refere-se a uma situação em que o que é visto é completamente desconhecido. Nestas condições, o que é visto passa despercebido, isto é, não é, de fato, visto. No processo de comunicação, nós lidamos com o signo linguístico, ou seja, com aquele elemento (desenho, som, objeto, ser, etc.) capaz de nos comunicar alguma coisa. Esse signo possui uma componente física, percebida por qualquer um de nós que não seja privado do sentido capaz de detectá-lo, e uma componente mental, dada por aquilo que ele nos comunica. Trata-se do significante e do significado. O significante é percebido por qualquer um, o significado, não. Este só é percebido por aqueles que conhecem o código e sabem como decifrá-lo. Algo semelhante ocorre com a visão de qualquer ser. Todo ser para quem olhamos nos comunica alguma coisa. Comunica, primeiro que tudo, quem ele é. Se, num zoológico, olho para um peba e sei do que se trata, ele me comunica de imediato: “Eu sou um peba”. Se, contrariamente, não sei que bicho é, sei, porém, outras coisas, tais como: trata-se de um animal, possui quatro patas, tem uma cobertura resistente, em placas, tem um focinho fino... Utilizando o modelo do signo linguístico, eu percebo o peba como significante, e sou capaz, porque tenho um repertório anterior de palavras (com significados e conceitos) de apreender, significativamente, alguma coisa sobre ele. Em suma, eu só posso perceber plenamente algo se eu possuir um sistema classificatório onde possa colocar aquilo que estou vendo. Neste caso, o sistema classificatório decifraria para mim o ser que eu estou vendo: estou vendo um ser vivo, é um animal, é um peba. No texto abaixo, um dos primeiros cronistas do Brasil recém-descoberto, Pero Magalhães Gandavo (História da Província de Santa Cruz – 1576), descreve o tatu, servindo-se de comparações que remetem a seu sistema classificatório e ao do seu público, portugueses que nunca viram um tatu e que podem apenas imaginá-lo a partir da descrição fortemente visual do cronista. (...) chamam-lhe tatus e são quase como leitões: tem um casco como de cágado, o qual é repartido em muitas juntas como lâminas e proporcionadas de maneira que parece totalmente um cavalo armado. Têm um rabo comprido todo coberto do mesmo casco. O focinho é como de leitão, ainda que mais delgado e só botam fora do casco a cabeça. Têm as pernas baixas e criam-se em covas como coelhos. A carne destes animais é a melhor e mais estimada que há nesta terra e tem o sabor quase como de galinha Para se perceber alguma coisa sobre o mundo, é preciso se possuir algum conhecimento prévio sobre essa alguma coisa. Para o senso comum, o conhecimento prévio se inscreve na linguagem comum; para a ciência, ele aparece nas teorias e nos conceitos. O estudante, pois, que se propõe a compreender alguma coisa de um dado campo científico terá forçosamente que se munir da teoria desse campo. A teoria funcionam como óculos que nos permitem enxergam os fenômenos e dar-lhes uma explicação convincente. Para o estudante que se inicia na pesquisa científica, a fonte da teoria são os livros. É lá que ele vai buscar o conhecimento necessário, através de conceitos e de teorias, à compreensão dos fenômenos que ele pretende estudar. A pesquisa bibliográfica é o primeiro nível da pesquisa científica. Porque é preciso aprender o que já foi dito sobre um determinado fenômeno para que se pretenda seguir em frente a fim de ampliar esse conhecimento. Antes de empreender uma pesquisa de campo, lidando diretamente com o fenômeno, tal como ele se expressa no mundo real, é necessário se acercar do conhecimento já existente. E isto se dá pela leitura, pela pesquisa bibliográfica. Mas não é suficiente que o estudante vá aos livros. Além de ler, é necessário que ele compreenda o que leu, que saiba retirar da leitura as informações que mais à frente podem lhe servir e que aprenda também a guardá-las de modo organizado, para que, ao precisar delas, possa encontrá-las. Pesquisa bibliográfica Por tudo que já foi dito, a pesquisa bibliográfica é um trabalho importantíssimo para a formação do aluno. Mas há uma condição: é necessário que ele seja realizado diferentemente de como é hoje. Em geral, a pesquisa que os alunos fazem é um simples faz de conta. Fazer pesquisa escolar como muita gente faz hoje não serve pra nada. Serve para mal educar, para viciar na lei do menor esforço. O que pesquisa não é: pesquisa não é cópia. Copiar um texto, da internet ou de um livro, não serve para nada, a não ser para melhorar a caligrafia, se for manuscrito. “Cortar” e “colar” serve menos ainda. Copiar trabalho, assinar trabalho que você não fez é se auto-enganar. Para que serve a avaliação? Para medir a proximidade a que se chegou de um dado objetivo. Você se tomaria por um bom jogador de futebol se colocasse na trave um boneco, em vez de um goleiro para defender o gol? Claro que numa situação dessas você faria muitos gols, mas seriam gols de verdade? Você estaria se auto-enganando. O objetivo maior da pesquisa escolar é começar a treinar o aluno para que ele ganhe uma certa autonomia intelectual. O que é isto? É a capacidade de aprender por si próprio, de não ficar esperando que alguém mastigue para ele todo o assunto e lhe ofereça de mão beijada. É a de criar a possibilidade de ele próprio, através do seu esforço, ir à procura da informação que lhe interessa, de descobri-la, de compreendêla, de ordená-la, de utilizá-la. É aquela velha história que fala em dar o peixe e em ensinar a pescar. De fato, quem dá o peixe, se não quiser ver o outro passar fome, vai ter que ficar permanentemente ao seu lado, servindo-o sempre que ele tiver necessidade de comer. Tem-se aí dois escravos. Se ele ensina a pescar, temos então duas pessoas livres. Quem aprende ganha a liberdade, porque é capaz de responder por si mesmo a uma necessidade. A pesquisa escolar é um fazer. Logo, só se aprende fazendo. Tudo que se quer aprender exige esforço. Quem aprende a nadar engole água no começo, cansa o corpo, pode ter água no ouvido. Tudo isso faz parte do aprendizado. Depois que aprende, ganha a liberdade de não correr o risco de se afogar e ganha também o prazer de dar umas boas braçadas. Desse modo, o que se aprende fazendo uma pesquisa bibliográfica? Primeiro que tudo, há um grande aprendizado de disciplina. E disciplina é necessário a tudo que se faça na vida, se se quiser fazer bem. Disciplina inclui paciência e persistência. Daí aprende-se que as coisas não se fazem de uma vez só, fazemse passo a passo. Não se constrói uma casa sem passar pelo alicerce, depois pela construção das paredes, pela cobertura, pelo reboco e, por fim, pelo acabamento e pintura. Do mesmo modo um trabalho escolar. Primeiro é preciso identificar quais são os livros que têm o assunto que se quer pesquisar, depois saber onde eles estão e como se pode dispor deles. A prática do estudo – por que se estuda O estudo é sempre a resposta a um desafio: o desafio de aprender algo que não se sabe, o de suprir uma lacuna existente. Desse modo, este é seu objetivo: aprender algo. Ou se estuda em função do assunto que o professor está dando em sala de aula ou se estuda em função de uma pesquisa que se empreende. Num e noutro caso, o objetivo do estudo é o mesmo – aprender, ampliar o conhecimento, saber mais. Como a grade curricular de um curso superior é organizada de modo a, ao final, o estudante ter constituído um conjunto de conhecimentos necessários ao exercício da profissão e à ampliação de suas relações com o mundo, o estudo de cada disciplina é essencial, como fragmento dessa formação. A boa formação constituirá a base que dará ao estudante condições de alçar outros voos. Convivem na universidade, como parte de sua missão, dois aspectos que parecem excludentes: a tradição e a inovação. A tradição é representada, em certo grau, pelo ensino, e ela se constitui de tudo aquilo que, numa certa área do conhecimento, o tempo, agindo sobre os indivíduos e as instituições, selecionou como digno de ser guardado e de constituir uma herança a ser transmitida às novas gerações. A inovação é representada pela pesquisa e se constitui dos conhecimentos novos que são agregados a uma dada área do saber. Ora, a educação universitária, como educação em nível superior, pretende não apenas formar profissionais, mas, mais que isto, formar profissionais criativos, inovadores, capazes de enxergar novos desafios, de enfrentá-los e de elaborar respostas para eles. Para se chegar ao nível da inovação, da criação inovadora, tem-se que passar pelo nível da tradição. É preciso conhecer o velho para que se possa criar o novo. Quem não domina os conhecimentos da tradição muito dificilmente será capaz de desenvolver uma contribuição intelectual original, inovadora. Daí, a importância de o estudante, desde cedo, desenvolver o gosto e o hábito de estudo, atrelado a uma metodologia eficiente de aprendizagem. Ele é condição para a atuação qualificada do profissional futuro. O estudo e a criação do hábito O ato de estudar envolve, pelo menos, três elementos: o ambiente, o estudante e o método. Se assim é, as características e o comportamento desses três elementos afetam o processo de estudo. Ambiente Gustavo Ioschpe, articulista da revista Veja21, narra um episódio que o marcou numa viagem à China para conhecer de perto o sistema educacional do país e compreender a relação desse sistema com o alto desempenho de seus estudantes nas provas internacionais de qualidade do ensino. Ele constatou que numa residência pobre, de quarto e sala, os pais sujeitavam-se a dormir num apertado sofá-cama, no canto da sala, para deixar para o filho o quarto de dormir, mais espaçoso, para que ele tivesse aí seu ambiente de estudo. Este arranjo o tocou porque no Brasil nós não temos nada parecido. Muito pelo contrário. Na cultura popular brasileira, e muito provavelmente também na cultura de nossa elite, não se associa estudo a ambiente propício, do qual faz parte o silêncio, assim como pouco se associa estudo a trabalho. O país é barulhento. Mesmo em regiões próximas a escolas não é raro encontrar carros de propaganda circulando a qualquer hora do dia. Como se tornou comum o carro de passeio da família equipado com som potente, para uso em qualquer lugar e a qualquer hora, com muitos decibéis acima do suportável. Do mesmo padrão cultural fazem partem os vizinhos que não pensam na possibilidade de o som de sua casa atrapalhar os estudos de alguém. Todas estas são situações corriqueiras. A possível reclamação contra essa prática é encarada negativamente, como intromissão na vida alheia. Um colega professor numa grande universidade federal já foi surpreendido, em plena manhã de expediente, com um batuque no corredor do prédio onde os professores do departamento têm seus gabinetes de trabalho. Tratava-se do moço que fazia a recarga dos garrafões de água mineral e que, no trajeto de volta, usava o garrafão vazio para recriar o batuque de uma escola de samba. Não ocorria ao rapaz pensar que se encontrava num lugar de estudo e que este requer silêncio. Seria interessante, talvez, saber que ideia têm da universidade aqueles que não a frequentaram e que encerraram seu contato com os estudos ao fim de 4 ou 5 anos. Na Idade Média, a ordem beneditina prescrevia para seus monges pelo menos 1200 horas de leitura por ano. É muito provável que a grande 21 O que você faria pelos seus filhos? Veja, São Paulo, ano 45, nº 29, ed. 2 278, p. 92-93, 18 de julho de 2012. maioria dos camponeses da época, mesmo iletrada, associasse o ambiente do mosteiro a recolhimento e silêncio, e o trabalho dos monges ao estudo. Pensado na importância do ambiente para a eficácia do estudo, deve-se destinar um canto da casa como local apropriado. E deve-se tornar esse local agradável, com pelo menos uma mesinha onde se possa apoiar um caderno e sentar-se para ler os livros e os textos recomendados pelos professores. Cabe a cada um fazer deste um ambiente agradável. Ele precisa ser bem iluminado, silencioso, confortável. Confortável não é sinônimo de luxuoso; o corpo precisa se sentir confortável para render mais. Uma cadeira pouco adequada à mesa, alta, que o deixe encurvado, e excessivamente dura, força o corpo a uma posição desconfortável que afetará o estudo, na duração dos períodos de trabalho e no retorno da ação. Se a gente não sente o corpo é sinal de que ele está confortável e isto ajudará na concentração e num mais longo período de estudo; se a gente o sente, é porque ele não está bem. Se absolutamente o estudante não consegue encontrar em casa esse pequeno local e as condições mais básicas para o seu trabalho intelectual, certamente o encontrará na biblioteca da universidade, onde, além do acervo, encontrará salas para estudo individual e coletivo. Sessões de estudo coletivo que envolvam debate precisam ser realizadas em locais especiais, a fim de não atrapalhar quem precisa estudar sozinho. Estudante No Brasil, entre largos estratos da população, há uma certa compreensão mágica do estudo, desassociando-o da noção de trabalho. Não é raro se escutar, mesmo entre estudantes universitários, frases como a seguinte: “Fulano é inteligente demais; o cara não pega nos livros e só tira 10”. Há essa crença no talento desmedido, aquele que não precisa de nenhuma lapidação, que dispensa qualquer arremate. Esta crença funda-se numa outra, bastante disseminada: “Quem é bom já nasce feito”. Quer dizer, se tudo vem do berço, não há necessidade de trabalho. É estranha a essa cultura uma noção como aquela firmada na frase de T.S. Eliot: “A poesia é 1% de inspiração e 99% de transpiração”, podendo-se entender a inspiração como talento nato ou como aquela ideia feliz que chega ao criador, artista ou outro profissional criativo, não se sabe de onde. Mas que, ao fundo, se sabe: vem em razão de seu envolvimento com uma dada questão, do seu grau de excitação com uma dada ideia, de todo um substrato que ele já tem em mente. É o insigth, de que fala a língua inglesa; é o primeiro verso de que trata Ranier Maria Rilke, quando afirma que o primeiro verso é Deus quem dá ao poeta; os outros é com ele, com o seu trabalho. Como um dos componentes da ação de estudar, depende do estudante, em grande medida, o êxito do seu estudo. Este está ligado ao compartilhamento de algumas noções e da adoção de algumas atitudes. Primeiro, o estudante que não compreender que o maior responsável por seus estudos é ele mesmo não terá nenhuma ação pró-ativa. Ele sempre achará que o responsável por seu estudo é unicamente o professor. Se ele não aprendeu é porque o professor não sabe explicar direito; se a nota foi baixa é porque a prova foi muito acima dos padrões razoáveis de exigência. Enfim, o responsável por seu aprendizado não é ele, são os outros. Ele se enxerga apenas como um receptor passivo. Para ele, se, num processo de comunicação, esta não se efetiva, se a mensagem não é compreendida, o problema deve-se exclusivamente ao emissor, que não formulou bem a mensagem ou que não usou o meio adequado para transmissão da mensagem, mas nunca ao receptor, que não deu atenção à mensagem, que possui um baixo repertório para atinar com o significado da mensagem ou que não sabe lidar com o meio em que a mensagem foi transmitida. Compreendendo que ele é o sujeito do seu aprendizado, o estudante se empenhará por ele, se disporá a aprender. Assim, ele procurará ser disciplinado, em relação ao tempo e em relação aos vários compromissos de estudo. Para criar o hábito de estudo é preciso disciplina e persistência. Qualquer novo hábito, para ser criado, implica em luta consigo mesmo. É preciso ter em mente um forte objetivo para que se pense nos meios a serem utilizados para atingi-lo. A isto se chama racionalidade – racionalidade praxeológica, para ser mais exato. Uma atitude racional é aquela que o sujeito toma conscientemente, porque avalia que ela lhe trará algum tipo de benefício, adequando os meios a seus fins. Desse modo, concluir um curso superior é o objetivo, o fim, e concluir com condições de disputar as melhores fatias do mercado de trabalho. Um dos meios para alcançar este objetivo é estudar com afinco. Daí, criar um hábito de estudo inclui-se no rol desses meios. As atitude racionais contrariam, frequentemente, digamos assim, uma natureza humana. O homem, entregue a si mesmo, ao seu natural, preferirá tudo aquilo que não signifique nenhuma carga de esforço suplementar para ele. O ser humana busca o prazer como primeira alternativa. Freud trata a questão como uma tensão entre o princípio do prazer e o princípio da realidade. Todos os atos que visam a esculpir o homem, a construí-lo são, de certo modo, anti-naturais. A educação é um desses atos contra a natureza. Não sabemos como é o homem natural, podemos apenas imaginá-li. O homem natural só existe como abstração – ele seria apenas um animal, mais um animal na natureza. O que distingue o homem dos outros animais, e o afasta deles, é a capacidade de aprender, de criar e de se diferenciar de sua natureza. Neste sentido, criar um hábito que lhe trará vantagens, como o hábito de estudo, não é natural – ninguém nasce assim. É uma luta do indivíduo consigo mesmo, e é uma escolha. A escolha que se apresenta para o homem é a seguinte: fazer o mais fácil, mas que o distancia do objetivo, ou fazer o mais difícil, mas que o aproxima do objetivo. Na prática, ocorre, porém, que o sacrifício inicial geralmente vira prazer e torna-se hábito, porque a capacidade humana de adaptar-se é algo gigantesco. A repetição gera costume e, depois, naturalização – incorporação à natureza. O prazer de chegar ao objetivo elimina o sacrifício da caminhada, e depois de um certo trecho do caminho a própria caminhada vira prazer. O primeiro ato de disciplina é criar tempo para o estudo, administrando melhor o tempo gasto com outras atividades. Calcular o tempo, dividir tarefas - trabalho em equipe Quanto tempo você terá para fazer o trabalho? Uma semana, duas? Organize seu tempo. Quanto tempo gastará na leitura do material levantado, quanto tempo gastará na redação e, se fizer em equipe, quanto tempo deverá gastar na coordenação do trabalho (planejamento conjunto do trabalho, distribuição de tarefas, uniformização do texto, leituras conjuntas do texto final, planejamento da apresentação em sala de aula, distribuição das tarefas de apresentação, ensaio da apresentação, etc.). A realização de uma pesquisa bibliográfica é um bom momento para se começar a aprender a trabalhar em equipe. Este é outro aprendizado essencial à vida. Em geral, trabalho em equipe é outro faz de conta. É ocasião para muita gente se escorar no outro, não produzir nada e apenas assinar o trabalho. Isso é desonestidade, consigo, com os colegas e com o professor. Mas pode ser diferente. O trabalho pode ser de fato em equipe e a prática desse tipo de trabalho trará ganhos enormes para todos. O primeiro passo para um trabalho em equipe sério é planejar conjuntamente o trabalho e dividir tarefas. Planejar conjuntamente significa, primeiro que tudo, discutir os objetivos da pesquisa. O que se quer com ela? Que conhecimentos se quer adquirir realizando-a? Depois disso, é dividir as tarefas e cada um se comprometer a cumprir com sua parte e ninguém se escorar em ninguém. Após cada um realizar sua tarefa, o grupo deve voltar a se reunir para dar uma feição comum ao trabalho. Não é interessante que cada um fique sabendo do trabalho apenas a sua parte. Cada um deve conhecer e dominar o trabalho por inteiro, embora tenha contribuído para ele com uma parte específica. Mais duas palavras sobre trabalho em equipe. Se você gosta de futebol, discutir futebol com um colega que entende do assunto é uma coisa, tentar conversar com quem não entende é outra bem diferente - a conversa não evolui. Quando você encontra alguém que tem mais ou menos os mesmos conhecimentos que você, aí há troca de opiniões, o papo é agradável, há de fato um diálogo. Conclui-se então que para haver diálogo deve haver uma certa simetria de informações, uma certa homogeneidade de conhecimentos. Esta conclusão é válida para o trabalho em equipe. Para que a equipe funcione como equipe todos os membros devem ter conhecimentos semelhantes. A partir daí pode haver troca, porque todos têm um patamar comum de conhecimento. Daí a necessidade de todos estudarem o assunto, para poderem conversar sobre ele e cada um participar com sua contribuição. Se não for assim, alguns ficam “voando”, não contribuem com nada e ficam apenas “pegando carona” no grupo e se escorando nos outros. Em suma, quais são os passos para se fazer uma boa pesquisa? A pesquisa inclui dois momentos. 1º) O momento de identificação dos livros onde se pode encontrar o assunto que se está pesquisando, a leitura do assunto e o aproveitamento da leitura e 2º) a redação do trabalho. Para se fazer um bom trabalho de pesquisa é necessário: a) conhecer o assunto e b) saber como expressar o que se tem a dizer sobre o assunto. Para se chegar a isto há, porém, uma condição prévia, situada no próprio estudante: ele tem que ter vontade de explicar o mundo, tem que ter curiosidade e senso de desafio. Estes são os ingredientes motivacionais, digamos assim. Gente desmotivada, sem vontade de avançar não vai a lugar nenhum. O restante é trabalho e método, isto é, adoção da melhor maneira de fazer mais facilmente e mais eficientemente uma dada tarefa. Método O método diz respeito aos meios que se utiliza para se chegar a um determinado fim. Comparativamente, éle representa o caminho que toma que se chegar a dado lugar. Para um caminhante, poe haver vários caminhos, com distâncias e condições diferentes. O caminhante avaliará qual o que melhor lhe serve – o que o levará em menos tempo, o que oferece menos perigo, o que é mais agradável. O mesmo pode se dar com o método – o objetivo do estudante é aprender. Como aprender melhor? Esta á questão que ele terá que responder. Compreensão da leitura – como aprender a ler melhor Ler é, para muita gente, um terror. Diante de um texto que se tem que ler, muita gente sua frio e procura por todos os meios adiar o compromisso. Outros enfrentam estoicamente o problema, fazem a leitura – um tanto de má vontade, às vezes – para no final concluírem que não aprenderam nada. Ora, tudo que se faz na vida faz-se melhor se se faz com método. Também se pode tornar uma leitura mais agradável e proveitosa. Há técnicas que nos ajudam a entrar de fato num texto e a compreendê-lo melhor. Como ler com mais proveito Como aprendemos? O homem é, em grande medida, um animal de imitação. Aprendemos por imitação. Claro que também criamos. Mas a criação, embora uma fase superior do intelecto, começa pela imitação, pela compreensão e reprodução daquilo que já é conhecido. Muitos pintores começam a pintar copiando telas de pintores famosos. É assim que começam a dominar a técnica. A imitação da linguagem oral é o primeiro estágio da fala e ela está ao alcance de todos que não tem deficiência de audição. A linguagem oral aprende-se pela escuta; a linguagem escrita, pela leitura. A nossa cultura, profundamente oral, não incentiva a leitura e menos ainda a escrita. Por que aprendemos primeiro a falar e só depois, se houver esforço, a escrever? Porque naturalmente estamos expostos à linguagem oral, mas não o estamos à linguagem escrita. Podemos dizer, sem faltar muito com a verdade, que a linguagem escrita é uma artificialidade do ser humano. Ninguém aprende a escrever se não aprende a ler. A ler atentamente, com profundidade. Escreve-se mal porque não se lê nada, ou se lê pouco e de forma desatenta. Lê-se sem esforço de penetração no texto. Lê-se por cima, superficialmente, às pressas – sem esforço de compreensão. Esforço, esta é a palavra-chave. A compreensão de um texto exige esforço, esforço intelectual. O reconhecimento das ideias O estudante com pouca prática de leitura é capaz de reconhecer as palavras do texto, uma a uma, mas não é capaz de compreender o sentido do que está sendo dito na frase ou no parágrafo. Ora, as palavras, já dissemos, exprimem ideias. Às vezes, o estudante está diante de uma ideia nova, desconhecida, aquele é o seu primeiro contato com aquela ideia. Logo, ele precisa reconhecer essa novidade, ter paciência e procurar ajuda para compreender o que está lendo. Ajuda do dicionário, de um professor ou de outros textos que possam apresentar aquela ideia de modo mais simples e compreensível. Uma pessoa que não conhece a subtração jamais compreenderá um texto sobre divisão. Ela terá que ter humildade para reconhecer sua ignorância e paciência para ir à procura daquele conhecimento anterior que lhe falta. É assim que se avança no conhecimento das coisas. A apreensão do vocabulário Também pode ocorrer que não se conheça muitas das palavras do texto. É o caso, então, de se recorrer ao dicionário. É para isto que ele serve, para esclarecer o sentido das palavras. O dicionário deve ser a companhia de todo estudante. Dominar o vocabulário de um texto é o primeiro passo para entendê-lo. Assim, o estudante deve destacar, grifando com um marca-texto, as palavras desconhecidas e procurá-las no dicionário. Ninguém pode dizer que conhece alguém logo no primeiro contato. O “conteúdo” de uma pessoa – se é paciente ou não, se é solidária, se é arguta, se é tolerante, etc. - só é percebido depois de vários contatos, isto é, com a convivência, o que permite que se observe muito bem a pessoa. A mesma coisa acontece com um texto. A primeira leitura nos dá apenas uma ideia do conteúdo. Para compreendê-lo de fato é preciso ler muitas vezes – ler observando o que se lê, ler com atenção. Portanto, não se julgue burro porque não entendeu um texto na primeira leitura. Muita gente lê sem atenção, apenas passa os olhos no texto. Lê sem penetrar nas ideias, sem distinguir a ideia principal e as ideias secundárias do texto, sem atentar para o tipo de argumentação, etc. Ao fim das contas, essas pessoas leem, mas pouco proveito tiram da leitura. Terminam de ler e se você pergunta alguma coisa a respeito do que foi lido, elas nada sabem. E por que não sabem? Porque não se concentraram suficientemente e porque nada fizeram para ajudar a concentração. Quem lê e não grifa nada, não anota nada pouco proveito tira da leitura. Desse modo, grifar e anotar ajudam a aumentar a concentração e ajudam na retenção as informações importantes, porque o que está grifado e o que está anotado podem ser guardados para uso futuro. Há também um outro tipo de leitor, menos ingênuo, porém presunçoso – como tem boa memória, acha que não precisa anotar nada porque é capaz de guardar tudo na cabeça. Ora, ninguém é um disco rígido de computador. A cabeça não guarda tudo, claro, e se não há anotações, o trabalho de leitura se perde, porque não deixa resultados. E qual deve ser o resultado da leitura? O aprendizado. Identificação da ideia principal A primeira preocupação de quem estuda visando aprender é identificar em cada parágrafo a ideia principal. Um texto dissertativo bem escrito traz na primeira frase do parágrafo a ideia principal. É isto o que se chama de tópico frasal. Vejamos abaixo o exemplo de tópicos frasais em dois parágrafos do sociólogo francês Raymond Boudon, retirados do primeiro capítulo do livro Les Mathématiques en Sociologie (Paris: Presses Universitaires de France, 1971)22 A sociologia é certamente menos consumidora de matemática que outras disciplinas. A física, claro, mas também a economia, mesmo a psicologia, utilizam a matemática bem mais que ela. Várias hipóteses foram apresentadas para explicar esta situação: incompatibilidade entre sociologia e matemática, formação essencialmente “literária” dos sociólogos, e muitas outras. Nós não tentaremos decidir entre essas diferentes hipóteses. Elas foram defendidas e combatidas com paixão. Provavelmente, porque nenhuma delas é nem completamente verdadeira nem completamente falsa. Mas pouco importa essas discussões. Na exposição que se segue, nos esforçaremos para ilustrar uma das funções essenciais e talvez a função essencial da matemática, a saber, sua função de clarificação. Reconhecer que o acesso de uma disciplina à maturidade científica é quase sempre, como o demonstra a história da ciência, correlativa a uma matematização ao menos parcial não é dar prova de positivismo. É simplesmente constatar a concomitância de dois fatos. Pois uma disciplina começa geralmente a ser considerada como científica quando ela está em condições de falar uma linguagem desprovida de ambigüidade. Por outro lado, a 22 Tradução feita por Aécio Cândido (UERN, Departamento de Ciências Sociais), com fins estritamente didáticos. matemática é, por definição, uma linguagem não ambígua. Donde se conclui que matematização e clarificação da linguagem caminham freqüentemente juntas. Dito isto, resta evidentemente que os objetos científicos são mais ou menos difíceis de acesso e que pode ser mais ou menos fácil de atingir uma linguagem clara segundo a complexidade dos objetos de que se trate. Como se pode constatar, a primeira frase do primeiro parágrafo faz uma afirmação categórica, com ares de tese, a respeito do uso da matemática na sociologia. A segunda frase, introduzindo a demonstração factual da tese, apresenta algumas disciplinas da área das ciências sociais que utilizam a matemática bem mais que a sociologia. A terceira frase cuida em elencar razões, como hipóteses, que expliquem o fato: por que a sociologia usa menos a matemática que outras disciplinas? O autor comunica, nas frases seguintes que não tem interesse em responder à questão. Esta última ideia é retomada no tópico frasal do parágrafo seguinte. Como derivação dela, ele passa a explicar seu objetivo: mostrar que se deve ao auxílio da matemática a construção de uma linguagem limpa de ambiguidades, e que tal é condição da maturidade científica de um campo do conhecimento. É evidente que essa relação com a leitura exige atenção, concentração, atitudes decorrentes não só da qualidade do leitor, mas também das condições do ambiente, que deve ser tranquilo, bem iluminado, silencioso. Como exercício do que acabamos de expor, a ssinale a alternativa que traduz corretamente a ideia principal do texto abaixo: "Lacan, amigo pessoal de Sartre, nunca poupou o existencialismo de críticas e ironias. Achava que esta corrente de pensamento desembocava fatalmente nos becos sem saída de uma subjetividade que - centrada na autonomia fictícia da consciência - não era mais que uma versão moderna do cartesianismo, uma espécie de racionalismo trágico. Por exemplo, a ideia de que a liberdade nunca se afirma tão autenticamente como entre os muros de uma prisão, era para Lacan a prova definitiva da impotência da pura consciência existencialista para superar qualquer situação, a não ser de maneira ilusória'' a) ( ) Lacan criticava o existencialismo, porque este estava preso a uma subjetividade impotente para dar conta do real. b) ( ) Lacan era amigo pessoal de Sartre. c) ( ) o existencialismo proclama a liberdade do prisioneiro e Lacan reconhece a importância da consciência na determinação da realidade. d) ( ) a subjetividade centra-se na real autonomia da consciência. A segunda preocupação de quem busca tirar proveito da leitura é se munir de uma marca texto ou mesmo de um lápis de grafite, a fim de destacar aqueles trechos da leitura que lhe chamaram a atenção. São esses trechos destacados que precisam ser guardados para serem revistos mais a miúde e retidos pela memória e, como sabemos que a memória não retém tudo, pelo menos por longo tempo, para serem armazenados no computador ou no papel, na forma de fichas ou de anotações num caderno. A este processo damos o nome de fichamento. Fichamento Assim como, durante a leitura, se grifa palavras desconhecidas, para esclarecer seu significado consultando o dicionário, grifa-se também trechos que parecem interessantes, pela carga de informação que contêm, pela ideia que apresentam ou pela importância que têm para a argumentação. Terminadas as leituras (jamais menos de duas de cada texto), passa-se a anotação, em fichas de papel ou em caderno, dos trechos grifados. A isso a gente chama fichamento. Fichar um texto é retirar dele as informações mais importantes, as ideias mais interessantes, com o fim de nos ajudar a compreendê-lo melhor. O fichamento proporciona um maior diálogo com o texto, com a teoria, já que, assim fazendo, estaremos ora acatando, ora criticando ideias e esse processo é fundamental para acúmulo de teoria, com a qual poderemos perceber e explicar melhor o mundo que nos cerca. Em suma, o fichamento deve gerar aprendizado teórico. O fichamento atende sempre a um objetivo. Ao nos prepararmos para uma pesquisa de campo, o que se inicia com a elaboração do projeto de pesquisa, as leituras feitas e as informações fichadas o serão em função do interesse da pesquisa, daquilo que a pesquisa pretende esclarecer. Há vários tipos de fichamento e eles dependem, numa certa medida, do tipo de texto que se está estudando. Um texto de Biologia ou de História, por exemplo, tem certamente um fichamento em que o mais importante a se reter são as informações. Neste caso, a anotação a ser feita não será uma anotação do trecho inteiro, ipsis litteris, mas uma anotação resumida, esquematizada, apenas do núcleo da informação: datas, fatos, características, definições, personagens, etc. São fichas de resumo esquemático. Essa ficha trabalhará a síntese de informações, de ideias interessantes, sempre em função do objetivo intelectual que nos move (munir-se de mais conhecimento para realizar uma pesquisa? Fazer um teste? Proferir uma palestra? Preparar um seminário?). Num texto de Filosofia ou de Sociologia, o importante é reter a ideia para compreendê-la. A anotação então será da ideia ipsis litteris, muitas vezes, do conceito. Este tipo de anotação dará origem a fichas temáticas, com anotação da citação. Isso porque, na avaliação do leitor-estudante, a ideia é tão interessante, tão bem construída e tão pertinente em relação àquele assunto, que é melhor guardá-la toda, por completo, para quando necessário citá-la. O mesmo vale para um conceito que nos salta aos olhos pela exatidão ou beleza da formulação. Neste caso, tem-se que colocar abaixo da citação todas as informações sobre o livro, a revista ou o site do qual ela foi tirada. Mas, se formos organizados, e precisamos sê-lo, a informação bibliográfica pode ser aí abreviada, porque fichas bibliográficas, facilmente manipulávies, conterão a informação por completo. As fichas temáticas vinculam-se a um tema e, por isto, uma mesma ficha reúne citações, resumo de ideias e de obras, e anotações livres retiradas de muitos textos diferentes. Digamos, por exemplo, que o aluno esteja estudando o tema família. Dentro deste tema, é possível elencar vários subtemas: história da família, características da família contemporânea, modelos de família, conceitos de família, hipóteses sobre a família contemporânea. Cada um destes subtemas dará nome a uma ficha. Desse modo, a ficha abrigará tanto informações de várias fontes (livros, artigos, monografias) como várias formas de anotação (esquema, citação, resumo, anotação livre). Outra forma de se estudar é fichar um texto por completo, retirando dele todas as informações interessantes, sejam hipóteses (teses, afirmações categóricas, conclusões), conceitos, informações. Após isto, pode-se identificar essas informações e enquadrá-las em algum dos subtemas, passando daí para fichas. Em outros casos, o interessante é fazer um resumo como texto corrido, e não esquemático, do artigo ou do capítulo de livro que foi lido. Este tipo de fichamento auxilia bastante no futuro quando se tem que produzir um trabalho de maior fôlego, como uma monografia. Ele pode, muitas vezes, se ajustar ao texto que está sendo produzido. Ademais, este tipo de resumo, para ser produzido, está condicionado a uma compreensão muito boa do que foi lido, daí sua releitura trazer de volta à memória os pontos essenciais do texto. Já dissemos e vamos aqui repetir: também se pode, em vez de fichas, usar um caderno para fazer essas anotações. Também se pode usar o computador. Há vários programas destinados a este fim. Se o computador coloca a nossa disposição essa possibilidade, por que ainda falamos em ficha de papel ou de anotação em caderno? Porque o computador é apenas uma ferramenta. Mesmo que o usemos, o trabalho de identificação das ideias e de tudo o mais que é possível de ser fichado é anterior e independente do computador. Não será ele, o computador, quem identificará para nós o que fichar, com que forma fichar e em que rubrica enquadrar a informação. Ele apenas facilita a estocagem da informação e seu acesso posterior. Faz parte desse aprendizado identificar o tema específico a que se refere a informação e traduzi-lo por uma palavras-chave. Chegar a essa identificação demanda esforço intelectual. O que se ficha Que tipo de informação merece ser fichada? As teses (postulados, afirmações categóricas), os conceitos e as informações gerais relevantes (características do ser ou fenômeno, dados estatísticos a ele referentes, informações sobre sua história, etc.). Nos textos abaixo, identifique os elementos referidos no parágrafo anterior. I “Nenhum período da história foi mais penetrado pelas ciências naturais nem mais dependente delas do que o século XX. Contudo, nenhum período, desde a retratação de Galileu, se sentiu menos à vontade com elas. Este é o paradoxo que tem de enfrentar o historiador do século. Mas, antes que eu tente fazêlo, devem-se reconhecer as dimensões do fenômeno. Em 1910, todos os químicos alemães e britânicos juntos chegavam talvez a 8 mil pessoas. Em fins da década de 1980, o número de cientistas e engenheiros de fato empenhados em pesquisa e desenvolvimento experimental no mundo era estimado em cerca de 5 milhões, dos quais quase 1 milhão se achava nos EUA, principal potência científica, e um número ligeiramente maior nos Estados da Europa”. (A Era dos Extremos, de Eric Hobsbawm, p. 504) II “A noção de racionalidade é empregada pelas ciências sociais em vários sentidos. Na tradição da ciência econômica, pelo menos tal como é expressa por Pareto (Tratado de sociologia geral), uma ação é chamada racional quando é objetivamente bem adequada ao fim buscado pelo sujeito. Nesse caso, racionalidade significa adequação dos meios aos fins. O economista moderno, por sua vez, define o comportamento racional como a escolha pelo indivíduo da ação que ele prefere entre todas aquelas que tem a possibilidade de executar; em poucas palavras, como uma escolha de acordo com suas preferências”. (Boudon e Bourricaud, Dicionário crítico de sociologia, p. 455) III Designa-se, muitas vezes, por paradigmas os princípios fundamentais sobre os quais apoia-se uma comunidade científica. Um paradigma é, de algum modo, a constituição, o conjunto de regras básicas que orientam o pesquisador em sua atividade. Fala-se, por exemplo, do paradigma cartesiano para designar os princípios em que repousam as teorias da física propostas por Descartes. Esses princípios incitam o pesquisador a representar de forma mecânica todos os fenômenos naturais, com base no modelo do choque entre as bolas de bilhar ou no da transmissão dos movimentos entre as engrenagens de um relógio. Este paradigma é usado, por exemplo, na teoria cartesiana da óptica. (Boudon, Tratado de Sociologia, 1995, p. 27) IV Como país, a Holanda é pequena – quase tão pequena quanto Portugal, e suas dimensões dificilmente se coadunam com um papel de formidável imperialista. Em 1500, os holandeses somavam cerca de um milhão; 150 anos depois, o dobro disso. País pequeno, mas potente: no século XVII, metade da população vivia em cidades, uma percentagem mais elevada do que em qualquer outra parte da Europa. E ativo: um observador de 1627 notou que as estradas e canais holandeses estavam cheios de gente, “que não há tantas carruagens (e como há, santo Deus!) em Roma quantas existem aqui, repletas de viajantes” (…) Ainda mais impressionantes eram os grandes e pequenos portos, colmeias de navios mercantes. Na década de 1560, só a província de Holanda possuía cerca de 1.800 navios de alto-mar – seis vezes o número de navios lançados à água por Veneza no auge de sua prosperidade, um século antes. (Landes, A riqueza e a pobreza das nações, 1998, p.150) Exemplos de fichas e fichamentos FICHA 1 FICHA DE RESUMO CULTURA Rubem Alves, no livro O que é Religião - pp. 16 e 18 – (São Paulo: Brasiliense, 1980?), constroi um exemplo simples e interessante para ilustrar a questão da cultura e de sua transmissão, resumido na ideia de que o homem é um ser cultural – vive embebido na cultura. Ele demonstra que os animais são completamente “programados”, não existindo para eles espaço para a inventividade – os pintassilgos sempre cantaram como hoje cantam, as abelhas nunca alteraram a forma da colmeia, etc. Em suma, não há necessidade de educação, uma vez que a aprendizagem é programada biologicamente. E conclui: “O animal é o seu corpo”. Quanto ao homem, ele diz: “O homem, diferentemente do animal, que é o seu corpo, tem o seu corpo. Não é o corpo que o faz. É ele que faz o seu corpo”. [Analisar, futuramente, o que há de idealismo nesta afirmativa]. E prossegue: “A cultura, nome que se dá a esses mundos que os homens imaginam e constroem, só se inicia no momento em que o corpo deixa de dar ordens”. “É necessário que os mais velhos lhes ensinem [às crianças] como é o mundo. Não existe cultura sem educação. Cada pessoa que se aproxima de uma criança e com ela fala, conta estórias, canta canções, faz gestos, estimula, aplaude, ri, repreende, ameaça, é um professor que lhe descreve este mundo inventado”. FICHA 2 FICHA DE RESUMO Supersentido - por que acreditamos no inacreditável, livro de Bruce M. Hood (Ribeirão Preto: Novo Conceito, 2010) Excelente livro sobre uma teoria do conhecimento inspirada na neurociência. A tese central é a de que todos nós, por mais racionais que sejamos e que estejamos dispostos a sê-lo, temos um cérebro predisposto a dar sentido sobrenatural, religioso ou não, a certas situações e acontecimentos. Pode-se avançar na conquista da racionalidade, mas haverá sempre uma brecha por onde se manifestam explicações intuitivas, frutos dessa predisposição inata. Sua tese é demonstrada exaustivamente. O autor é professor da Universidade de Bristol, no Reino Unido, com passagens por Havard, Cambridge e pelo MIT. Há na sua argumentação muitos exemplos daquilo que chamo de criatividade metodológica. FICHA 3 FICHA DE RESUMO - ESQUEMÁTICA Diferenças fundamentais entre o mundo rural e o urbano – texto de Pitirim A. Sorokim et alli. In MARTINS, José de Souza (org.). Introdução crítica à Sociologia Rural. São Paulo: Hucitec, 1986. pp.(texto escrito em 1930) 1. Diferenças ocupacionais . A população rural se define por sua ocupação: coleta e cultivo de plantas e animais. 2. Diferenças ambientais . Trabalho ao ar livre, exposição às variações climáticas, relação mais direta com a natureza. 3. Diferenças no tamanho das comunidades . Tamanho menor das comunidades rurais. 4. Diferenças na densidade populacional . A população rural é menos concentrada que a urbana. 5. Diferenças na homogeneidade e na heterogeneidade das populações . A população rural é mais homogênea (características psico-sociais) que a população urbana. Na população urbana misturam-se nacionalidades, religiões, condutas, gostos diferentes, enfim, culturas distintas. 6. Diferenças na diferenciação, estratificação e complexidade social . Comunidades urbanas são mais complexas, em razão da maior diferenciação e estratificação social. A cidade tem mais e diferentes partes, com funções especializadas. Na cidade, há maior divisão social do trabalho. “O caráter da comunidade rural agrícola é tal que ela ‘não mantém’ e ‘envia para a cidade’ os indivíduos que se tornam excessivamente ricos ou excessivamente pobres, ou que aspirem a prazeres, fama, status e atividades que a comunidade rural não pode proporcionar”. (p. 207) 7. Diferença na mobilidade social . Há mais dinâmica e mobilidade nas comunidades urbanas. (Mobilidade “de um lugar a outro, de uma ocupação a outra, de uma posição social a outra”, isto é, mobilidade horizontal e vertical). Mobilidade territorial – a população urbana muda mais de domicílio; desloca-se mais para ir ao trabalho; grande percentual de habitantes de uma cidade não é natural dali. . Mobilidade ocupacional – “As populações agricultoras permanecem mais tempo agricultoras ou, em média, mudam de emprego menos freqüentemente do que o grosso da população urbana”. “A percentagem dos filhos que ‘herdam’ a ocupação dos pais é uma das mais altas entre todas as grandes classes ocupacionais”. . Mobilidade social - “Todas as instituições que servem de canais de circulação vertical (...), as universidades, igrejas, centros de poder econômico e financeiro, quartéis-generais, centros de poder político, centros das artes, ciências, literatura, parlamentos (...) e outros ‘elevadores sociais’ estão localizados nas cidades e não no campo”. (p. 215) 8. Diferenças na direção da migração . Migração na direção rural-urbana. 9. Diferenças no sistema de integração social . Os contatos de um indivíduo rural são menos numerosos do que os de um indivíduo urbano. O agricultor trava relações sociais com muito menos gente. Agricultor se comunica menos (recebe menos cartas, menos objetos pelo correio). FICHA 5 FICHA TEMÁTICA IDEOLOGIA “Os sistemas sociais, para subsistirem, devem reproduzir e reformular as suas condições de produção. Toda formação social reproduz a força de trabalho através do salário, a qualificação desta força de trabalho através da educação e, por último, reproduz constantemente a adaptação do trabalhador à ordem social através de uma política culturalideológica que orienta toda a sua vida, no trabalho, na família, no lazer, de modo que todas as suas condutas e relações mantenham um sentido que seja compatível com a organização social dominante.” (CANCLINI, p. 34) Conceito “É o sistema ordenado de ideias ou representações e das normas e regras como algo separado e independente das condições materiais, visto que seus produtores – os teóricos, os ideólogos, os intelectuais – não estão diretamente vinculados à produção material das condições de existência. E, sem perceber, exprimem essa desvinculação ou separação através de suas ideias. Ou seja: as ideias aparecem como produzidas somente pelo pensamento, porque os seus pensadores estão distantes da produção material. Assim, em lugar de aparecer que os pensadores estão distanciados do mundo material e por isso suas ideias revelam tal separação, o que aparece é que as ideias é que estão separadas do mundo e o explicam”. (CHAUÍ, p. 65-66) __________________________________________________ − “Gramsci se aproxima muito mais do que Marx e Lênin, sem falar de Lukacs, de uma teoria da ideologia de protesto, tanto popular como proletária”. (p. 20) − “Ele distingue entre ‘ideologias historicamente orgânicas’, isto é, aquelas que são necessárias a uma determinada estrutura, e ideologias arbitrárias, racionalizadas ou desejadas”. (RUDÉ, Ideologia e protesto popular, p. 20) − Ideologias orgânicas – têm validade psicológica, organizam as massas, criam o terreno no qual os homens se movimentam. (cf. RUDÉ, p. 20) − Ideologias não-orgânicas – “formas menos estruturadas de pensamento que circulam no seio do povo comum, com frequência contraditórias e confusas, uma mistura de folclore, mito e experiência popular cotidiana”. (RUDÉ, p. 21) − Hegemonia – processo pelo qual se estabelece o consenso. “As pessoas se tornam colaboradoras de sua própria sujeição”. (RUDÉ, p. 21) FICHA 6 FICHA TEMÁTICA REALIDADE “A vida cotidiana apresenta-se como uma realidade interpretada pelos homens e subjetivamente dotada de sentido para eles na medida em que forma um mundo coerente”. (FROMM, p. 35) “O mundo da vida cotidiana não somente é tomado como uma realidade certa pelos membros ordinários da sociedade na conduta subjetivamente dotada de sentido que imprimem a suas vidas, mas é um mundo que se origina no pensamento e na ação dos homens comuns, sendo afirmado como real por eles. (FROMM, p. 36) “Muito do que consideramos como realidade são fenômenos que uma dada sociedade condiciona. De fato, grande parte do que acreditamos ser a verdade nada mais é que o consenso da maioria, manipulado por aqueles que detêm o poder.” (FROMM, Consciência e Sociedade Industrial, p. 129) “Para ele [Marx], a autoconsciência própria a um tempo faz parte da ‘realidade’ deste tempo... A este respeito, o pensamento mais doutrinário, o mais fantasioso ou o mais visionário pertence tanto à “realidade” quanto o pensamento que procura apenas dar conta do mundo onde se expressa. Pertence igualmente a esta realidade, e, no entanto, não tem o mesmo valor de verdade”. (BERTRAND, O homem clivado: crença e imaginário, p.37) FICHA 7 FICHA TEMÁTICA CONSCIÊNCIA E CONHECIMENTO “... o sistema da consciência da vigília... tem um esquema pré-fabricado ou categorias que estão determinados pela estrutura própria de qualquer sociedade. Esse esquema determina qual parte do conteúdo se fará consciente e qual parte permanecerá inconsciente . Denomino filtro social ao mecanismo pelo qual se realiza esse processo... O filtro social compõe-se essencialmente de três partes: uma delas é a linguagem. É difícil obter conhecimento de algo que não se designe com as palavras... A linguagem é um produto do modo de viver de uma certa sociedade e a formação de palavras leva o indivíduo a ter ou não conhecimento de algumas experiências que enfrenta”. (Fromm, p. 130.) “A segunda parte do filtro social é a lógica”. (…) “A terceira parte do filtro são os tabus sociais.” (Fromm, p. 131) “O filtro social evita que muitas experiências se tornem conscientes e que, portanto, esse filtro produz uma forma específica de ‘inconsciência social’. Mas há um quarto elemento que determina a consciência. Esse elemento consiste na considerável massa de ficção elaborada que toda sociedade transmite ao indivíduo... 90% do que preenche nossas consciências não são reais e... grande parte do ‘verdadeiramente real’ não é consciente”. (Fromm, p. 131) “Não existe nem vida, nem realidade social sem consciência, e dizer que a consciência está atrasada em relação à realidade é o mesmo que dizer que a cabeça de um homem que caminha está constantemente atrasada em relação a esse homem”. (Castoriadis, p. 32) “A história é tanto criação consciente como repetição inconsciente”. (Castoriadis, p. 33) FICHA 8 FICHA BIBLIOGRÁFICA BERTRAND, Michele. O homem clivado: a crença e o imaginário. In DORAY, Bernard e SILVEIRA, Paulo. Elementos para uma teoria marxista da subjetividade. São Paulo: Vértice, 1989. p. 15-40. CANCLINI, Néstor García. As culturas populares no capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1983. CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da sociedade. 2 ed. Rio de Janeiro: paz e Terra, 1986. CHAUÍ, Marilena. O que é Ideologia. São Paulo: Brasiliense, 1980. FROMM, Eric. Consciência e sociedade industrial. In MARTINS, José de Souza e FORACCHI, Marialice. Sociologia e sociedade: leituras de introdução à sociologia. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1980. p. 126-134. RUDÉ, George. Ideologia e protesto popular. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. O que não se ficha Não merecem ser fichadas informações triviais e ideias que não sejam basilares no texto. Abaixo temos o exemplo de um trabalho de fichamento do artigo Estresse, medo e uma arma na mão, feito por um aluno. “Os disparos pesados de fuzis, metralhadoras e pistolas não cessavam em direção aos policiais militares num dos becos do complexo da Maré em Bonsucesso”. “Um dos policiais avançou, enquanto outro deveria lhe dar cobertura, atirando. Mas algo aconteceu àquele segundo PM: ficou estático, arma em punho, sem esboçar qualquer reação”. “Os colegas zombam dele, já que um homem nesse estado coloca a vida da equipe inteira em perigo e compromete toda a ação”. À beira de um ataque de nervos, os policiais, que enfrentam bandidos bem armados e cada vez mais audaciosos, são vítimas constantes desse mal que desequilibra a técnica do militar...” “...a ousadia desses criminosos, nesses confrontos freqüentes, aumenta o estresse”. Anotações Há também um outro tipo de anotações que não é propriamente um fichamento e ele é muito importante quando se está redigindo um trabalho escolar: as anotações livres. Deve ser destinado um caderno a elas, o caderno de anotações, a ser conduzido aonde se vá. Se a gente está envolvido com a redação de um trabalho, o momento em que ele de fato engrena é aquele em que se passa a pensar no assunto a todo momento. Ou seja, é a partir do momento em que o trabalho vira quase obsessão que ele começa de fato a ser escrito. Nesse sentido, o caderno de anotações é providencial. Ele se destina a anotações livres. São ideias que nos vêm à cabeça, observações, interpretações de ideias lidas, relações entre fatos, dados de que nos lembramos, opiniões a respeito de leituras, lembretes metodológicos ou de estrutura do trabalho, ou seja, é para se anotar tudo que nos vem à cabeça, sem nenhuma censura, com relação ao trabalho que se vai escrever e que se tem medo de se perder da memória. O caderno de anotações serve para isso: para evitar o esquecimento. Ele é fundamental porque, escrevendo, a gente ajuda a si próprio a dar forma consciente ao que muitas vezes existe para nós ainda num estado um tanto amorfo, ou seja, o que pensamos ainda não está claro pra gente mesmo. Escrevendo, anotando, a gente ajuda a esclarecer o assunto pra gente mesmo. É fundamental fazer isso, e é bastante educativo. COMPREENSÃO DA LEITURA A produção de um resumo começa com a compreensão de cada parágrafo do texto. E a compreensão deste começa com a identificação de sua ideia principal e das ideias secundárias. É este trabalho que deverá ser feito com os textos seguintes. Livrai-nos dos crédulos Cláudio de Moura Castro Nossa sociedade deve preparar melhor as pessoas para que elas não tomem o falso pelo verdadeiro Em 1938, um senhor Orson Welles anunciou em seu programa radiofônico que Nova York estava sendo invadida por marcianos. As contínuas notícias do avanço da invasão trouxeram pânico à cidade, causando acidentes e uma confusão geral. Mas trouxeram também protestos veementes e fama instantânea para o genial ator. Mais recentemente, um editor da revista Esquire apostou com amigos quanto tempo levaria até ser denunciada a farsa inverossímil narrada em um artigo. Noticiou que um grupo escolhido pela Presidência americana se reunia secretamente em uma base subterrânea (chamada Iron Mountain) para discutir o que fazer após a Guerra Fria, quando a ausência de inimigos externos levaria a uma insurreição doméstica. O plano escolhido era desarmar os grupos de extrema direita, o provável estopim da guerra civil. Mas, em vez de perceberem o ridículo, os tais grupos acreditaram piamente no complô, e a publicação tornou-se a mais contundente evidência de que deveriam resistir a qualquer preço. Mesmo com o editor indo a juízo e provando sua autoria do ensaio maluco, não arrefeceram as crenças dos "vigilantes" extremistas. Em escala muito mais modesta, cometi involuntariamente uma travessura parecida. Viajo muito e sempre me defronto com quartos de hotel sem luz suficiente para ler. Já havia escrito sobre isso. Mas voltei ao assunto e, para não plagiar o ensaio prévio, inventei a longa história de um complô dos hoteleiros e de uma cruzada de protesto, o Movimento dos Sem-Luz. Até um website fictício foi inventado. A maioria dos leitores entendeu a piada. Mas qual não foi meu pavor quando comecei a receber um número assustador de e-mails de quem havia acreditado, pelo menos em parte, na ficção. Não houve vítimas, a história não congestionou o tráfego nem alimentou os ardores extremistas. Mas revelou uma semelhante vulnerabilidade de nossa sociedade. Em países democráticos, as pessoas votam, defendem suas opiniões, reclamam e, às vezes, são ouvidas. Por muito imperfeita que seja a nossa democracia, o governo não pode ignorar as demandas e aflições dos eleitores. Mas, para que o sistema funcione, é preciso que uma proporção bastante substancial da população não tenha opiniões sem pé nem cabeça e saiba decidir entre o certo e o errado, entre o verdadeiro e o inventado. Não pode ser vítima de embustes grosseiros nem crédula diante de evidência frágil. Tem de ter a dúvida sistemática que Descartes já pregava no século XVII: não se tome como verdade o que não pode ser demonstrado como tal. E tem de saber em quem acreditar. Os que estão em posição de ter seus escritos lidos por muitos têm uma responsabilidade maior. Não podem trair seus leitores, sob pena de gerar um agnosticismo pernicioso. Nesse particular, pequei, ao subestimar o perigo de que me acreditassem ao pé da letra, em vez de se divertirem com a brincadeira. Mas o incidente permite algumas reflexões. Nossa sociedade tem de preparar melhor as pessoas para que elas não tomem o falso por verdadeiro. É missão do ensino burilar a competência para julgar o que é lido e entendido. É uma arte e uma técnica que se tornaram vitais na democracia. No caso, não é apenas a sintaxe do ensaio, mas a análise do que está dito, diante de um conhecimento mais amplo acerca do que pode acontecer e do que é inverossímil. Pessoas cultas têm esse bom julgamento. Na verdade, ser culto é isso – não confundamos cultura com acúmulo de informação nem com erudição. Ser culto é ter lido e refletido o bastante para perceber que tais coisas não podem acontecer. Hoteleiros e arquitetos não se constituem em sociedades fechadas. E tanto falta luz nos hotéis multinacionais como na pousada da roça. Portanto, são impossíveis quaisquer reuniões, secretas ou não, com supostos conspiradores. E o Movimento dos Sem-Luz não poderia passar de uma alegoria. Termino, portanto, com minhas desculpas pela brincadeira mal interpretada, mas aproveitando para reforçar o Movimento por uma Educação Melhor (MEM). Será também brincadeira? (Veja, Ponto de Vista, 31/7/2002) Roubaram a Amazônia? Claudio de Moura Castro "A ativa e triste colaboração de acadêmicos de boas universidades brasileiras na disseminação de boataria pela internet" Alguém descobriu que em mapas de livros escolares americanos havia sido retirado um pedaço enorme do Brasil, na verdade toda a Amazônia. Os orgulhos verde-amarelos foram eriçados e os gigabytes da internet mobilizados para a denúncia de um grave fato: alguns já consideram internacionalizada a nossa Amazônia. O ministro-conselheiro Paulo Roberto de Almeida deu-se ao trabalho de escarafunchar por trás da notícia e desenterrou um entulho considerável (www.pralmeida.org). O livro não está listado entre os 100 milhões do acervo da Biblioteca do Congresso (americano). Não está à venda nos livreiros conhecidos (incluindo www.amazon.com). Nenhuma busca revelou algo sobre o autor. Com seu nome, só um cientista especializado em paleontologia e dinossauros. Não consta a editora do livro na citação. Mas o golpe de misericórdia na farsa vem de um exame do suposto texto, reproduzido na internet, pois contém erros grosseiros de inglês. Mais ainda, inclui palavras e expressões que são meras traduções literais do português. O trabalho de detetive conduz a um website brasileiro de extrema direita, responsável no passado por outras travessuras do mesmo naipe. Obviamente, tudo não passa de uma mentira deslavada. Nada ficamos sabendo do tema da internacionalização da Amazônia. Se queremos uma Amazônia solidamente nacional, temos de valorizar seu uso inteligente e as boas instituições de pesquisa que ajudam na busca de soluções locais. Temos de promover a troca de idéias com brasileiros e estrangeiros interessados – mas trocar impropérios em nada avança no conhecimento. O incidente lembra um boato de que a rainha Vitória mandou tirar a Bolívia do mapa, pois um embaixador britânico foi expulso daquele país por não cumprimentar a amante do presidente. Nem a Bolívia desapareceu nem a Amazônia foi internacionalizada. Mas há outras lições a tirar do incidente, ilustrando um tema central na aquisição do conhecimento: que confiança temos na informação recebida? A formação científica nos ensina a duvidar de tudo e de todos, pois só é provisoriamente aceito como verdadeiro aquilo que ninguém conseguiu demonstrar como sendo falso. Onde estão as fontes? Que credibilidade merecem? Como foi coletada a informação? A que procedimentos foi submetida? O mais triste é que a disseminação da boataria na internet recebeu a ativa colaboração de acadêmicos de boas universidades, totalmente despreocupados com a evidente violação desses princípios. Esse incidente mostra uma banda frágil de nosso mundo acadêmico. Confrontado com um e-mail do diplomata, um professor afirma que só responderá à mensagem depois de saber qual a opinião do autor acerca da internacionalização. Ou seja, o que importaria não é a autenticidade do dado, mas as opiniões do interlocutor. O método científico denuncia os argumentos ad hominem, isto é, descolados do mérito do assunto e condicionados às pessoas envolvidas. Que exemplos de busca serena do conhecimento estará dando esse professor a seus alunos? Fora dos meios acadêmicos, a situação é pior, pois a grande imprensa ainda está mais longe dos critérios de rigor da ciência. Ainda assim, há uma certa tradição de seriedade e os nomes dos redatores responsáveis estão impressos nos jornais. Na televisão, é mais comum o dito pelo não dito. Mas a internet é catastrófica desse ponto de vista. Não há responsáveis, não há autores, não há reputações construídas por décadas de trabalho sério. É a informação instantânea e a impunidade eterna. Ou os freqüentadores da internet aprendem a questionar o que lêem ou aumentará cada vez mais a volatilidade das informações e desinformações. Vivemos em sociedades abarrotadas de informação e capengas em controle de qualidade das notícias que circulam. Portanto, a boa cidadania inclui a aquisição de hábitos como checar fontes e questionar o que nos é dito. Já vem de Descartes o princípio da dúvida sistemática de tudo que nos chega às mãos e da necessidade de distinguir entre o verdadeiro e o falso usando a razão e o bom senso. Claudio de Moura Castro é economista ([email protected]) A arte refinada de detectar mentiras Carl Sagan (in O Mundo Assombrado pelos Demônios; a ciência vista como uma vela no escuro. São Paulo: Cia. Das Letras, 1996. - Trecho do cap. 12, pp. 207-217) A compreensão humana não é um exame desinteressado, mas recebe infusões da vontade e dos afetos; disso se originam ciências que podem ser chamadas “ciênicas conforme a nossa vontade”. Pois um homem acredita mais facilmente no que gostaria que fosse verdade. Assim, ele rejeita coisas difícies pela impaciênica de pesquisar; coisas sensatas, porque diminuem a esperança; as coisas mais profundas da natureza, por superstição; a luz da experiência, por arrogância e orgulho; coisas que não são comumente aceitas, por deferência à opinião do vulgo. Em suma, inúmeras são as maneiras, e às vezes imperceptíveis, pelas quias os afetoscolorem e contaminam o entendimento. Francis Bacon, Novum organon (1620) Na ciência, podemos começar com resultados experimentais, dados, observações, medições, "fatos". Inventamos, se possível, um rico conjunto de explicações plausíveis e sistematicamente confron-tamos cada explicação com os fatos. Ao longo de seu treinamento, os cientistas são equipados com um kit de detecção de mentiras. Este é ativado sempre que novas idéias são apresentadas para consideração Se a nova idéia sobrevive ao exame das ferramentas do kit, nós lhe concedemos aceitação calorosa, ainda que experimental. Se possuímos essa tendência, se não desejamos engolir mentiras mesmo quando são confortadoras, há precauções que podem ser tomadas; existe um método testado pelo consumidor, experimentado e verdadeiro. O que existe no kit? Ferramentas para o pensamento cético. O pensamento cético se resume no meio de construir e compreender um argumento racional e — o que é especialmente importante — de reconhecer um argumento falacioso ou fraudulento. A questão não é se gostamos da conclusão que emerge de uma cadeia de raciocínio, mas se a conclusão deriva da premissa ou do ponto de partida e se essa premissa é verdadeira. Eis algumas das ferramentas: • Sempre que possível, deve haver confirmação independente dos "fatos". • Devemos estimular um debate substantivo sobre as evidências, do qual participarão notórios partidários de todos os pontos de vista. • Os argumentos de autoridade têm pouca importância — as "autoridades" cometeram erros no passado. Voltarão a cometê-los no futuro. Uma forma melhor de expressar essa ideia é talvez dizer que na ciência não existem autoridades; quando muito, há especialistas. • Devemos considerar mais de uma hipótese. Se alguma coisa deve ser explicada, é preciso pensar em todas as maneiras diferentes pelas quais poderia ser explicada. Depois devemos pensar nos testes que poderiam servir para invalidar sistematicamente cada uma das alternativas. O que sobreviver, a hipótese que resistir a todas as refutações nessa seleção darwiniana entre as "múltiplas hipóteses eficazes", tem uma chance muito melhor de ser a resposta correta do que se tivéssemos simplesmente adotado a primeira idéia que prendeu nossa imaginação. 23 • Devemos tentar não ficar demasiado ligados a uma hipótese, só por ser a nossa. É apenas uma estação intermediária na busca do conhecimento. Devemos nos perguntar por que a ideia nos agrada. Devemos compará-la imparcialmente com as alternativas. Devemos verificar se é possível encontrar razões para rejeitá-la. Se não, outros o farão. • Devemos quantificar. Se o que estiver sendo explicado é passível de medição, de ser relacionado a alguma quantidade numérica, seremos muito mais capazes de discriminar entre as hipóteses concorrentes. O que é vago e qualitativo é suscetível de muitas explicações. Há certamente verdades a serem buscadas nas muitas questões qualitativas que somos obrigados a enfrentar, mas encontrá-las é mais desafiador. • Se há uma cadeia de argumentos, todos os elos na cadeia devem funcionar (inclusive a premissa) — e não apenas a maioria deles. 23 Esse é um problema que afeta os júris. Estudos retrospectivos mostram que alguns jurados tomam a sua decisão muito cedo — talvez durante a argumentação de abertura; depois guardam na memória as provas que parecem sustentar suas impressões iniciais e rejeitam as contrárias. O método das hipóteses eficazes alternativas não está em funcionamento nas suas cabeças. • A Navalha de Occam. Essa maneira prática e conveniente de proceder nos incita a escolher a mais simples dentre duas hipóteses que explicam os dados com igual eficiência. • Devemos sempre perguntar se a hipótese pode ser, pelo menos em princípio, falseada. As proposições que não podem ser testadas ou falseadas não valem grande coisa. Considere-se a idéia grandiosa de que o nosso Universo e tudo o que nele existe é apenas uma partícula elementar — um elétron, por exemplo — num Cosmos muito maior. Mas, se nunca obtemos informações de fora de nosso Universo, essa ideia não se torna impossível de ser refutada? Devemos poder verificar as afirmativas. Os céticos inveterados devem ter a oportunidade de seguir o nosso raciocínio, copiar os nossos experimentos e ver se chegam ao mesmo resultado. A confiança em experimentos cuidadosamente planejados e controlados é de suma importância, como tentei enfatizar antes. Não aprenderemos com a simples contemplação. É tentador ficar satisfeitos com a primeira explicação possível que passa pelas nossas cabeças. Uma é muito melhor que nenhuma. Mas o que acontece se podemos inventar várias? Como decidir entre elas? Não decidimos. Deixamos que a experimentação faça as escolhas para nós. Francis Bacon indicou a razão clássica: "A argumentação não é suficiente para a descoberta de novos trabalhos, pois a sutileza da natureza é muitas vezes maior do que a sutileza dos argumentos". Os experimentos de controle são essenciais. Por exemplo, se alegam que um novo remédio cura uma doença em 20% dos casos, temos de nos assegurar se uma população de controle, ao tomar um placebo pensando que ingere a nova droga, também não experimenta cura espontânea da doença em 20% das vezes. As variáveis devem ser separadas. Vamos supor que nos sentimos mareados, e nos dão uma pulseira que pressiona os pontos indicados pela acupuntura e cinquenta miligramas de meclizina. Descobrimos que o mal-estar desaparece. O que causou o alívio — a pulseira ou a pílula? Só ficaremos sabendo se tomarmos uma sem usar a outra, na próxima vez em que ficarmos mareados. Agora vamos imaginar que não somos tão dedicados à ciência a ponto de querer ficar mareados. Nesse caso, não separamos as variáveis. Tomamos os dois remédios de novo. Conseguimos o resultado prático desejado; aprofundar o conhecimento, poderíamos dizer, não vale o desconforto de atingi-lo. Freqüentemente o experimento deve ser realizado pelo método "duplo cego", para que aqueles que aguardam uma certa descoberta não fiquem na posição potencialmente comprometedora de avaliar os resultados. Ao testar um novo remédio, por exemplo, queremos que os médicos que determinam os sintomas a serem mitigados não fiquem sabendo a que pacientes foi ministrada a nova droga. O conhecimento poderia influenciar a sua decisão, ainda que inconscientemente. Em vez disso, a lista dos que sentiram alívio dos sintomas pode ser comparada com a dos que tomaram a nova droga, cada uma determinada independentemente. Só então podemos estabelecer a correlação existente. Ou, ao comandar uma identificação policial pelo reconhecimento de fotos ou dos suspeitos enfileirados, o oficial encarregado não deveria saber quem é o principal suspeito, para não influenciar a testemunha consciente ou inconscientemente. TIPOS DE TEXTOS CIENTÍFICOS 1. Resumo É o mais simples dos textos científicos e, no entanto, é a base de tudo. De um bom resumo depende a compreensão aprofundada de uma obra. O resumo exige fidelidade às ideias do autor. Não há nele espaço para o intérprete. Um resumo não deve nunca ir além de uma página. Se for, é porque o texto não foi entendido, isto é, entendido naquilo que ele tem de essencial. Num resumo, dizemos, com nossas palavras, expressão do nosso entendimento, o que nos parece essencial num texto. Ele não é apenas a colagem de frases retiradas do texto, uma cópia, portanto. É preciso digerir de fato um texto, compreendê-lo em todas as suas dimensões, para que se possa produzir um resumo. A "digestão" efetiva do texto nos indicará o que nele é essencial e o que é secundário. O resumo só trabalha com o essencial. Um conselho: habitue-se a fazer um resumo de todos os textos que você julga importante para sua formação. Para tanto, a primeira providência é identificar com muita precisão as ideias essenciais do texto. Encontrálas é uma arte: demanda esforço de rastreador, entusiasmo de detetive e meticulosidade de estrategista militar. Mas compensa. Tanto pelos resultados que patrocina como pelo prazer que proporciona. MODELO DE RESUMO DE TRABALHOS CIENTÍFICOS A SBPC tem utilizado, nos últimos anos, um modelo de resumo que, a meu ver, tem se revelado bastante eficiente, pelo conjunto de informações que apresenta, e educativo, pelos nexos que obriga o pesquisador a estabelecer entre uma parte e outra de sua pesquisa. Esse modelo apresenta 4 partes, cada uma nomeada entre parênteses: (INTRODUÇÃO), (METODOLOGIA), (RESULTADOS) e (CONCLUSÕES). . Introdução – em três ou quatro frases, trata-se de expor a teoria que recobre o problema: que teoria existe a respeito daquele problema. Em outras palavras, na introdução precisa-se o campo do conhecimento em que se situa o problema e o que já se sabe a respeito dele. Em seguida, do modo mais claro possível, apresenta-se os objetivos da pesquisa, isto é, o que se pretende conhecer. Os objetivos podem também ser formulados como questão. Basta que você os transforme numa interrogação: você pode querer saber o que é aquele fenômeno que lhe chama a atenção; você pode querer saber como se dá um determinado processo; você pode querer saber por que determinado fenômeno acontece. . Metodologia – aqui deve-se dizer onde será realizada a pesquisa (em que lugar, no sentido geográfico, em que locus, no sentido social – junto a que grupo social - ou noutro sentido), quem prestará as informações que se deseja, e como você fará para levantar essas informações, isto é, que instrumentos usará. Que passos pretende dar, etc. . Resultados – são apresentadas aqui as informações mais relevantes levantadas, ou seja, os dados coletados. . Conclusão – A conclusão é estabelecida a partir dos dados coletados, dos resultados obtidos. Ela pode confirmar ou não a hipótese levantada no início da pesquisa. A conclusão diz respeito a alguma generalização que se pode estabelecer a partir dos resultados. Exemplos PIOR QUE PROSTITUIR-SE É SENTIR O PRECONCEITO Autor: Nicácio Hélio Rodrigues de Souza, Verinaldo de Paiva Silva e Enailma Luciana da Silva 24 Orientador: Manoel Fábio Rodrigues25 Área Temática: Psicologia do Desenvolvimento Humano. (INTRODUÇÃO) A sociedade impõe padrões de sexualidade. Desde o passado até agora pessoas que escapassem de tais padrões eram consideradas marginais. Isto é explicado pelo preconceito e estigmas existentes em torno delas. As prostitutas, como um dos grupos marginalizados, sofrem esta situação. Partindo de tais constatações, foi realizada uma pesquisa com adolescentes do ensino médio do Centro Federal de Ensino Tecnológico do Rio Grande do Norte (CEFET-RN) do município de Mossoró, RN, com o objetivo de conhecer as explicações existentes em torno das posturas diante da prostituição. (METODOLOGIA) Foram questionados 39 estudantes escolhidos aleatoriamente de forma individual. Os dados foram agrupados em categorias e realizado um tratamento estatístico. (RESULTADOS) Os dados apontam para uma postura desfavorável diante das pessoas prostitutas; os sujeitos apresentam um receio ao contato social com elas, restrições ao seu comportamento e a recusa total em relacionar-se afetivamente com pessoas que já se prostituíram. (CONCLUSÃO) Apesar de ser uma temática muito discutida, a pesquisa constatou que pior que o fato de prostituir-se é o preconceito existente em torno das prostitutas. Com esta constatação, a Base de Pesquisa Educação, Psicologia e Desenvolvimento 24 Alunos do curso de Matemática da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. 25 Doutorando em Educação pela Universidade de Havana – Cuba e professor do Departamento de Educação da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN. Social, na qual a pesquisa está inserida, atualmente desenvolve pesquisa junto a 20 prostitutas na busca de explicações sobre as causas da prostituição sendo feito logo após um estudo comparativo entre as duas pesquisas. Palavras-chave: prostituição, preconceito, adolescência O “NOVO RURAL” PARAIBANO?26 Autor: João Ricardo Ferreira de Lima27 (INTRODUÇÃO) O problema central deste trabalho é entender a evolução da pluriatividade e das rendas não-agrícolas nas famílias rurais paraibanas nos anos 90. O objetivo é identificar a representatividade das famílias pluriativas e nãoagrícolas no total das famílias rurais e a composição de suas rendas. (METODOLOGIA) Para isto, analisamos a evolução das famílias rurais agrícolas, não-agrícolas e pluriativas nos anos 90, divididas entre empregadores, contaprópria, assalariados e não-ocupados. Estudamos também o comportamento dos rendimentos obtidos (pós plano Real) e a proporção de cada um no total.(RESULTADOS) A exemplo da situação nacional e regional, na Paraíba também se constata um crescimento das chamadas ORNA, do aumento no número das famílias pluriativas e não-agrícolas residentes em áreas rurais, além de uma grande disparidade entre as rendas obtidas pelas famílias exclusivamente agrícolas daquelas não-agrícolas e pluriativas, principalmente nos anos secos. As famílias pluriativas dependem menos das transferências públicas e privadas, comparando com as famílias agrícolas. Constatamos que no período pós plano Real, as rendas agrícolas apresentam um movimento de forte queda e as rendas não-agrícolas possuem um movimento inverso, sempre crescendo a cada ano. (CONCLUSÃO) Apesar da pluriatividade num estado pobre como a Paraíba decorrer em sua maior parte de estratégias familiares que procuram alternativas de renda para poderem sobreviver e manter o estabelecimento rural, isto não significa que o estado não possua condições de repensar o desenvolvimento das áreas rurais, reorganizando a base de sustentação de milhares de pequenos agricultores que hoje sobrevivem da agricultura de subsistência, com base em atividades agrícolas que possuam nichos de mercado e também em atividades não-agrícolas, como ecoturismo, chácaras de lazer e serviços públicos essenciais que existem nas áreas urbanas. Palavras-chave: novo rural, pluriatividade, rendas não-agrícolas. 2. Resenha A resenha é uma apreciação particular sobre a obra. É um dialogo científico com a obra e o autor, dissecando-lhe a ideia central, refutando ou reafirmando argumentos utilizados. A resenha é, além de compreensão do texto (o que às vezes significa retomá-lo resumidamente), também interpretação, acréscimo às ideias do autor ou julgamento delas. A resenha é opinativa. Ela fornece uma impressão, em grande medida bastante pessoal, da obra. Ela contém o resumo, no sentido de que, sendo opinativa, carece de mostrar, resumidamente, as ideias em questão, pressupondo que nem todos a conheçam, para, a partir daí, comentá-las, isto é, opinar sobre elas. A característica mais forte da resenha é que ela é "apreciativa". Nela, emite-se opinião, julga-se a ideia do autor, compara-se a outras ideias, etc. Faz-se citações, se assim se deseja, mas não de modo a esconder aquele que escreve a resenha. Se há citações em demasia, não há diálogo com as ideias do autor e seu contexto. Exemplo TEIXEIRA, JERÔNIMO. Ponto de vista. Veja, São Paulo, v. 45, n. 30, p. 127, 25 jul. 2012. Ponto de vista Jerônimo Teixeira Em ensaio sobre sua formação como escritor, Cristovão Tezza tenta delinear a natureza da prosa de ficção, que estaria 26 Esta pesquisa faz parte do Projeto Urbano do Instituto de Economia/UNICAMP. Para maiores informações vide a home-page: http://www.eco.unicamp.br 27 Professor do Departamento de Economia da FACEM/UERN (Universidade Estadual do Rio Grande do Norte). antes no narrador do que naquilo que se narra Livro que amealhou os prêmios Jabuti e Portugal Telecom, entre outros, O Filho Eterno, publicado em 2007, tinha como tema a relação de um pai com o filho que tem síndrome de Down. O autor, o catarinense Cristovão Tezza, 60 anos, tem de fato um filho com Down. Quase todos os episódios do livro são decalcados de sua biografia. No entanto, Tezza classificou a obra como um romance, uma peça de ficção. Em O Espírito da Prosa (Record; 224 páginas; 34,90 reais), que chega agora às livrarias, novamente temos um vasto recorrido biográfico. Para reconstituir sua formação como escritor (o subtítulo do livro é “uma autobiografia literária”), Tezza relembra a infância em Lage e, depois da morte do pai, em Curitiba, conta de seu primeiro emprego, como datilógrafo, e fala de seus anos libertários em uma comunidade meio riponga de atores de teatro em Antonina, no litoral do Paraná. Mas não, diz o autor, este já não é um romance, mas um ensaio. Em que ele difere de O Filho Eterno, se afinal a matéria-prima factual é a mesma – a vida de Cristovão Tezza? Eis aí o corolário da reflexão do autor sobre literatura: um escritor cria um romance não quando narra uma história ou retrata um personagem, mas quando cria um ponto de vista. “O nascimento da literatura é o nascimento de um narrador”, diz Tezza. Entenda-se: um narrador cuja voz não esteja colada ao autor, como acontece em O Espírito da Prosa, mas, ao contrário, se destaque dele, como faz a terceira pessoa que relata os eventos de O Filho Eterno. Vai aí em cima uma boa dose de simplificação sobre o argumento do livro, que, desenvolvido com vagar e sutileza, se ampara na obra do crítico russo Mikhail Bakhtin (1895-1975), tema da tese de doutorado que Tezza defendeu na USP. O espírito da prosa referido no título define-se, no esquema de Bakhtin, em oposição à poesia, cuja linguagem é mais depurada, pessoal, do que a pluralidade de vozes e registros que se encontram em romances e contos. Percebe-se, pelo arcabouço teórico, que este será um livro de interesse mais restrito do que os romances de Tezza. Embora não se encontre aqui o jargão incolor que tantas vezes atravanca ensaios e teses de letras, O Espírito da Prosa é um trabalho que talvez seja mais bem apreciado por quem tem alguma corrida na área da teoria literária. E, apesar do tom desassombrado, elegante e sereno do ensaísta, há aqui matéria com potencial para inflamar algumas igrejinhas acadêmicas – por exemplo, a defesa que Tezza faz da prosa realista em oposição aos truques metaficcionais do pósmodernismo, ou uma digressão breve mas acuada sobre as vozes “domesticadas” na narrativa poética de Guimarães Rosa. O prazer deste livro, porém, não está somente na especulação teórica. Tezza, o ensaísta, é ainda um grande narrador: são muito saborosas, por exemplo, as reminiscências do tempo em que viveu em uma comunidade “alternativa”, com todas as ilusões utópicas próprias dos anos 60 e 70 (ilusões que, diz o autor, o salvaram de se engajar na miragem mais nefasta do radicalismo comunista, popular naqueles anos de ditadura). Para se construir como escritor, Tezza teve de, aos poucos, desmontar as fantasias mais caras à sua geração. Uma luta árdua para, afinal, abandonar clichês coletivos e encontrar seu próprio, intransferível ponto de vista. UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA CENTRO DE CIENCIAS SOCIAIS APLICADAS O que é e como fazer uma resenha? Qual a diferença entre resumo e resenha? Uma resenha deve ser feita com base em algo que você leu, podendo colocar suas opiniões próprias no meio da resenha de forma critica. Resumo nada mais é do que uma diminuição de um texto ou de algum assunto abordado, nunca perdendo o foco do assunto principal. Quais os tipos de resenhas existentes? Além das resenhas básicas de obras e filmes, também existe a resenha acadêmica, esta se subdivide em resenha critica, descritiva e temática. Resenha Critica: Têm caráter mais critico, pois há muito mais a opinião do resenhista. Elas costumam ser ricas em interpretações e conjecturas a respeito do enredo do que está sendo resenhado. Abaixo oito passos básicos para sua elaboração: Identifique a obra: coloque os dados bibliográficos essenciais do livro ou artigo que você vai resenhar; Apresente a obra: situe o leitor descrevendo em poucas linhas todo o conteúdo do texto a ser resenhado; Descreva a estrutura: fale sobre a divisão em capítulos, em seções, sobre o foco narrativo ou até, de forma sutil, o número de páginas do texto completo; Descreva o conteúdo: Aqui sim, utilize de 3 a 5 parágrafos para resumir claramente o texto resenhado; Analise de forma crítica: Nessa parte, e apenas nessa parte, você vai dar sua opinião. Argumente baseando-se em teorias de outros autores, fazendo comparações ou até mesmo utilizando-se de explicações que foram dadas em aula. É difícil encontrarmos resenhas que utilizam mais de 3 parágrafos para isso, porém não há um limite estabelecido. Dê asas ao seu senso crítico. Recomende a obra: Você já leu, já resumiu e já deu sua opinião, agora é hora de analisar para quem o texto realmente é útil (se for útil para alguém). Utilize elementos sociais ou pedagógicos, baseie-se na idade, na escolaridade, na renda, etc. Identifique o autor: Cuidado! Aqui você fala quem é o autor da obra que foi resenhada e não do autor da resenha (no caso, você). Fale brevemente da vida e de algumas outras obras do escritor ou pesquisador. Assine e identifique-se: Agora sim. No último parágrafo você escreve seu nome e fala algo como “Acadêmico do Curso de Letras da Universidade de Caxias do Sul (UCS)” Resenha descritiva: Na resenha acadêmica descritiva, os passos são exatamente os mesmos, excluindo-se o passo de número 5. Como o próprio nome já diz, a resenha descritiva apenas descreve, não expõe a opinião do resenhista. Resenha Temática: a resenha temática também apresenta o texto a ser resenhado de modo geral como os tipos já citados. Você fala de vários textos que tenham um assunto (tema) em comum. Os passos são um pouco mais simples: − Apresente o tema: Diga ao leitor qual é o assunto principal dos textos que serão tratados e o motivo por você ter escolhido esse assunto; − Resuma os textos: Utilize um parágrafo para cada texto, diga logo no início quem é o autor e explique o que ele diz sobre aquele assunto; − Conclua: Você acabou de explicar cada um dos textos, agora é sua vez de opinar e tentar chegar a uma conclusão sobre o tema tratado; − Mostre as fontes: Coloque as referências Bibliográficas de cada um dos textos que você usou; − Assine e identifique-se: Coloque seu nome e uma breve descrição do tipo “Acadêmico do Curso de Letras da Universidade de Caxias do Sul (UCS)”. Discussão: Este é, provavelmente, o tipo de resumo que você mais terá de fazer a pedido de seus professores ao longo do seu curso. O resumo crítico é uma redação técnica que avalia de forma sintética a importância de uma obra científica ou literária. Quando um resumo crítico é escrito para ser publicado em revistas especializadas, é chamado de Resenha. Ocorre que, por costume, os professores tendem a chamar de resenha o resumo crítico elaborado pelos estudantes como exercício didático. A rigor, você só escreverá uma resenha no dia em que seu resumo crítico for publicado em uma revista. Até lá, o que você faz é um resumo crítico. Mas não deixam de estar certos os professores que dizem que resenha não é resumo. A resenha (ou resumo crítico) não é apenas um resumo informativo ou indicativo. A resenha pede um elemento importante de interpretação de texto. Você só fará uma boa resenha se tiver lido um texto ao menos até a quarta etapa de leitura. Como começar? Antes de começar a escrever sua resenha você deve se certificar de ter feito uma boa leitura do texto, identificando: 1. qual o tema tratado pelo autor? 2. qual o problema que ele coloca? 3. qual a posição defendida pelo autor com relação a este problema? 4. quais os argumentos centrais e complementares utilizados pelo autor para defender sua posição? DIAS, Almerinda Tereza Bianca B. Batti. Apostila de Metodologia Científica. Criciúma: Universidade do Extremo Sul Catarinense/ Curso de Administração, 2004. (mimeo) Referências Bibliográficas (NBR 6023/2003) 1. Obra de apenas um autor SOBRENOME, Prenome do autor. Título: subtítulo. Edição. Local de publicação (cidade): Editora, data de publicação. n.º de volumes ou páginas. Ex.: KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1987, 257p. 2. Obra escrita por dois autores SOBRENOME, Prenome do autor; SOBRENOME, Prenome do autor. Título: subtítulo. Edição. Local de publicação (cidade): Editora, data de publicação. n.º de volumes ou páginas. Ex.: REALE, Giovani; ANTISERI, Dario. História da filosofia. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 1990, 3.v. 3. Obra escrita por três autores SOBRENOME, Prenome do autor; SOBRENOME, Prenome do autor; SOBRENOME, Prenome do autor. Título: subtítulo. Edição. Local de publicação (cidade): Editora, data de publicação. n.º de volumes ou páginas. Ex.: PASSOS, L.M.; FONSECA, A.; CHAVES, M. Alegria de saber: matemática, segunda série, 22, primeiro grau: livro do professor. São Paulo: Scipione, 1995. 136p. 4. Obra escrita por mais de três autores SOBRENOME, Prenome do autor, et al. Título: subtítulo. Edição. Local de publicação (cidade): Editora, data de publicação. n.º de volumes ou páginas. Ex.: URANI, A. et al. Constituição de uma matriz de contabilidade social para o Brasil. Brasília, DF: IPEA, 1994. 5. Autor repetido na exposição da referência bibliográfica MARITAIN, Jacques. A filosofia moral. 2. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1973. Ex.: ______.Sete lições sobre o ser. São Paulo: Loyola, 1996. *______ corresponde a seis (6) espaços 6. Referência de um capítulo de livro, quando o autor do capítulo não é o autor do livro SOBRENOME DO AUTOR DO CAPÍTULO, Prenome. Título do capítulo. In: SOBRENOME DO AUTOR DO LIVRO, Prenome. Título do livro. Edição (quando não for a primeira). Local: Editora, data. Páginas inicial e final do capítulo utilizado. Ex.: ULIVI, Lucia Urbani. Bertrand Russel. In: ROVIGHI, S. História da filosofia contemporânea. São Paulo: Loyola, 1999, p. 441-459. 7. Referência de um capítulo de livro, quando o autor é o mesmo autor do livro SOBRENOME DO AUTOR DO CAPÍTULO, Prenome. Título da parte. In: ______. Título do livro. Edição (quando não for a primeira). Local: Editora, data. Páginas inicial e final do capítulo utilizado. Ex.: LEVY, Pierre. A nova relação com o saber. In: ______. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999, p. 157176. 8. Evento como um todo Inclui o conjunto dos documentos reunidos num produto final do próprio evento (atas, anais, resultados, proceedings, entre outras denominações). NOME DO CONGRESSO, número, ano, Cidade onde se realizou o Congresso. Título... Local da publicação: Editora, data da publicação. Ex.: IUFOST INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON CHEMICAL CHANGES DURING FOOD PROCESSING, 1984, Valencia. Proceedings…Valência: Instituto de Agroquímica y Tecnologia de Alimentos, 1984. REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE QUÍMICA, 20., 1997, Poços de Caldas. Química: academia, indústria, sociedade: livro de resumos. São Paulo: Sociedade Brasileira de Química, 1997. 9. Evento como um todo em meio eletrônico Ex.: CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UFPe, 4., 1996, Recife. Anais eletrônicos... Recife: UFPe, 1996. Disponível em: <http://www.propesq.ufpe.br/anais/anais.htm>. Acesso em: 21 jan.1997. 10. Trabalho apresentado em congressos AUTOR, Título do trabalho. In: NOME DO CONGRESSO, número, ano, Cidade onde se realizou o Congresso. Título (Anais ou Proceedings ou Resumos...). Local de publicação: Editora, data de publicação. Páginas inicial e final do trabalho. Ex.: RODRIGUES, M.V. Uma investigação na qualidade de vida no trabalho. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPAD, 13., 1989, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: ANPAD, 1989. p. 455-468. 12. Monografia no todo (on-line) KOOGAN, André; HOUAISS, Antonio (Ed.). Enciclopédia e dicionário digital 98. Direção geral de André Koogan Breikmam. São Paulo: Delta: Estadão, 1998. 5 CD-ROM. Quando se tratar de obras consultadas on-line, também são essenciais as informações sobre o endereço eletrônico, apresentado entre os sinais < >, precedido da expressão Disponível em: e a data de acesso ao documento, precedida da expressão Acesso em:, opcionalmente acrescida dos dados referentes a hora, minutos e segundos. NOTA – Não se recomenda referenciar material eletrônico de curta duração nas redes. ALVES, Castro. Navio Negreiro. [S.I.]: Virtual Books, 2000. Disponível em: http://www.terra.com.br/virtualbooks/freebook/port/Lpor2/navionegreiro.htm. Acesso em: 10 jan. 2002, 16:30:30. 13. Artigos de Periódicos AUTOR do artigo. Título do artigo. Título do periódico (abreviado ou não), local, nº de volume, página inicial e final do artigo, data (mês e ano). . Ex.: ESPÓSITO, I. et al. Repercussões da fadiga psíquica no trabalho e na empresa. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 8, n. 32, p. 37-45, out./dez. 1979. 14. Artigos de jornais AUTOR do artigo. Título do artigo. Título do jornal, local, dia, mês, ano. Número ou título do caderno, seção ou suplemento, página inicial e final. Ex.: OLIVEIRA, W. P. de. Judô: educação física e moral. O Estado de Minas, Belo Horizonte, 17 mar. 1981. Caderno de esporte, p. 7. 15. Artigos de periódicos (on-line) AUTOR. Título do artigo. Título da publicação seriada, local, volume, número, mês ano. Paginação ou Indicação de tamanho. Disponível em: <endereço>. Acesso em: data. Ex.: CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, Brasília, v. 26. n.3, 1997. Disponível em: <http://www.ibict.br/cionline>. Acesso em: 19 maio 1998. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - NORMAS DA ABNT − Livros no todo (monografia/ dissertação/tese, catálogo, guia, enciclopédia, dicionário, etc.) Autor. Título, edição. Local: editora, data de publicação. [. A referência ao autor inicia-se pelo sobrenome, em caixa alta, separado do nome por vírgula. Quando o sobrenome inclui Filho, Sobrinho, Neto, não se inicia por ele. . O título é escrito em itálico ou em negrito. Só se coloca a referência à edição a partir da segunda. Se não há referência, subentende-se que se trata da primeira edição. . Após local, dois pontos.] Exemplo 1: SOUSA, Aécio Cândido de. Para além do acesso à terra: representações sociais, condição camponesa e ação política dos colonos da Serra do Mel – RN. Campina Grande: UFPb/Mestrado em Sociologia Rural, 1991. Se necessário, pode-se acrescentar outras informações. SOUSA, Aécio Cândido de. Para além do acesso à terra: representações sociais, condição camponesa e ação política dos colonos da Serra do Mel – RN. Campina Grande: UFPb/Mestrado em Sociologia Rural, 1991. 280 p. (Tese de Mestrado) Outras informações: Monografia, nome da coleção, ISBN. Exemplo 2: CEPA-RN. PDRI Serra do Mel: repercussões sócio-econômicas. 1ª versão. Natal: Cepa, 1981. 52 p. (mimeo.) GOMES, L. G. F. F. Novela e sociedade no Brasil. Niterói: EdUFF, 1998. 137 p., 21 cm. (Coleção Antropologia e Ciência Política, 15). Bibliografia: p. 131-132. ISBN 85-228-0268-8. IBICT. Manual de normas de editoração do IBICT. 2.ed. Brasília, DF, 1993. 41 p. HOUAISS, Antonio (Ed.). Novo dicionário Folha Webster’s: inglês/português, português/inglês. Co-editor Ismael Cardim. São Paulo: Folha da Manhã, 1996. Edição exclusiva para o assinante da Folha de S. Paulo. BRASIL: roteiros turísticos. São Paulo: Folha da Manhã, 1995. 319 p. (Roteiros turísticos Fiat). Inclui mapa rodoviário. SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Planejamento Ambiental. Estudo de impacto ambiental – EIA, Relatório de impacto ambiental – RIMA: manual de orientação. São Paulo, 1989. 48 p. (Série Manuais). 2. Livros no todo em meio eletrônico O mesmo para livro, acrescentando o meio: CD-ROM, por exemplo. 2.1. Obras consultadas on line: IBGE. Senso populacional de 2000. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidades@>. Acesso em: 13 ago. 2003. 3. Parte de livros (capítulo, fragmento, etc.) Elementos essenciais: autor, título da parte + a expressão “In:” Segue-se a referência completa para livro no todo. Ao final, a paginação da parte referenciada. MASINI, Elcie F. Solano. Enfoque metodológico de pesquisa em educação. In: FAZENDA, Ivani (Org.) Metodologia da pesquisa educacional. 7 ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 59-67. 4. Artigo em Periódicos Elementos essenciais: autor, título da parte (artigo ou matéria), título do periódico, local, volume/ano/fascículo/número, página inicial e final, data. FAUSTO, Luiz M. Mossoró, de repente o futuro. RN Econômico, Natal, ano 13, nº 135, p. 30-34, set. 1982. MANSILLA, H. C. F. La controversia entre universalismo y particularismo en la filosofia de la cultura. Revista Latinoamericana de Filosofia, Buenos Aires, v. 24, n. 2, primavera 1998. SEKEFF, Gisela. O emprego dos sonhos. Domingo, Rio de Janeiro, ano 26, n. 1344, p. 3036, 3 fev. 2002. [Quando necessário, acrescentar outras informações, para maior precisão]. COSTA, V. R. À margem da lei: o Programa Comunidade Solidária. Em Pauta: revista da Faculdade de Serviço Social da UERJ, Rio de Janeiro, n. 12, p. 131-148, 1998. 5. Trabalho apresentado em evento [Os elementos essenciais são: autor(es), título do trabalho apresentado, seguido da expressão In:, nome do evento, numeração do evento (se houver), ano e local (cidade) de realização, título do documento (anais, atas, tópico temático etc.), local, editora, data de publicação e página inicial e final da parte referenciada.] Exemplos: BRAYNER, A. R. A.; MEDEIROS, C. B. Incorporação do tempo em SGBD orientado a objetos. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE BANCO DE DADOS, 9., 1994, São Paulo. Anais... São Paulo: USP, 1994. p.16-29. SOUZA, L. S.; BORGES, A. L.; REZENDE, J. O. Influência da correção e do preparo do solo sobre algumas propriedades químicas do solo cultivado com bananeiras. In: REUNIÃO BRASILEIRA DE FERTILIDADE DO SOLO E NUTRIÇÃO DE PLANTAS, 21., 1994, Petrolina. Anais... Petrolina: EMBRAPA, CPATSA, 1994. p. 3-4. UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E POLÍTICA Disciplina: METODOLOGIA DO TRABALHO CIENTÍFICO Prof. Aécio Cândido Exercícios . De posse das informações abaixo, indique a referência bibliográfica de cada publicação, conforme as regras da ABNT: − A (re) invenção do lugar – os Rosados e o “País de Mossoró”, livro de José Lacerda Alves Felipe editado em 2001 pela Editora GRAFSET, de João Pessoa. O livro tem 192 páginas. − Os dinossauros e as gazelas do ensino superior, artigo de Cláudio Moura Castro publicado no livro Dinossauros, Gazelas & Tigres, organizado por Victor Meyer Jr. E J. Patrick Murphy e publicado em 2000 pela editora Insular, de Florianópolis. O livro tem 176 páginas e o artigo vai das páginas 17 a 32. − Observações sobre a falência dos modelos policiais, artigo de Marcos Luiz Bretas publicado no volume 9, número 1, da revista Tempo Social, da USP, em maio de 1997, editada pelo Departamento de Sociologia. − Artigo de Alípio de Souza Filho intitulado Mestiçagens ou barbárie, publicado em Natal na revista Odisséia, do Centro de Ciências Humanas, Letras e Arte da UFRN, em 2001, no volume 7 e números 9 e 10. − Capítulo 4 do livro Falácias e mitos do desenvolvimento social, de Bernardo Kliksberg. O capítulo se chama Capital social e cultura, chaves esquecidas do desenvolvimento. Ele está nas páginas 105 a 148. O livro é uma co-edição da editora Cortez, de São Paulo, e da UNESCO escritório da Brasília, e foi publicado em 2001. − Artigo de Ricardo Abramovay intitulado O capital social dos territórios, repensando o desenvolvimento rural. Texto de 12 páginas publicado pela USP, São Paulo, sem data. Disponível na Internet no endereço http://biblioteca.nead.org.br − Pobreza rural, distribuição da riqueza e crescimento, a experiência brasileira. Texto de José Eli da Veiga, com 26 páginas, publicado sem as indicações de local, de editora e de ano. Pode ser encontrado no seguinte endereço eletrônico: http://biblioteca.nead.org.br − O livro Tratado de Sociologia, em terceira edição, organizado por Raymond Boudon e editado em 1995 pela Jorge Zahar, do Rio de Janeiro, com 601 páginas. − O elogio do ócio, livro de Bertrand Russel editado em 2002 pela Sextante, do Rio de Janeiro. O livro tem 183 páginas. − A 14ª edição do livro Como se faz uma tese, de Umberto Eco, publicado em 1998, pela Perspectiva, de São Paulo. − Metodologia do trabalho científico, livro de Eva Maria Lakatos, em 4ª edição. Publicado em 1992 pela Atlas, de São Paulo. − Metodologia científica na era da informática, livro de João Augusto Máttar Neto, publicado pela Saraiva, de São Paulo, em 2003. − 7ª edição do livro Redação científica: a prática de fichamentos, de João Bosco Medeiros, publicado em 2005 pela Atlas, de São Paulo. − Livro de Antônio Joaquim Severino, em 23ª edição, Metodologia do trabalho científico, publicado em São Paulo, pela Cortez, em 2008. Como expressar melhor o assunto? A dificuldade, e mesmo a completa incapacidade, de escrever de muitos estudantes se deve, além do baixo repertório de informações, ao desconhecimento de algumas técnicas elementares de redação. O baixo repertório de informações deriva da má leitura, da leitura desatenta e descuidada. No que tange à redação de um texto, poucos estudantes sabem que antes de se começar a escrever qualquer texto, a primeira providência a se tomar é fazer um roteiro do que se vai escrever. Esta é uma regra de ouro: ao se decidir a escrever sobre um tema, deixe que todas as idéias a respeito daquele tema lhe venham à cabeça, sem censura. Anote-as. Se você fez leituras anteriores e fez direitinho os fichamentos e as anotações, é hora de recorrer a eles. Veja as ideias e as informações que estão lá. Em seguida, selecione-as; há sempre as que lhe parecerão boas e as que não merecem estar ali. Depois, hierarquize-as, vendo quem vem em primeiro lugar, quem vem em segundo, etc., a fim de que seu texto ganhe uma transição tranquila, plácida. Se você seguir esta regra vai melhorar muito a redação de seus trabalhos e poupar bastante a paciência de seus professores. Por que escrever é tão difícil? Na verdade, escrever não é um trabalho mais difícil ou mais fácil do que outros trabalhos. É claro que escrever não é um ato natural. Não se nasce escrevendo. É um ato mais complexo, sem dúvida. Basta nos lembramos de que o Homo sapiens, nossa espécie, existe há pelo menos 100 mil anos e durante mais de nove décimos desse tempo comunicou-se exclusivamente através da linguagem oral. A escrita é recentíssima na história da humanidade – tem apenas 6 mil anos. Logo, a linguagem escrita requer muito mais trabalho mental para ser utilizada. E suas situações de uso são mais raras do que as situações de uso da linguagem oral, isto é, estamos menos expostos a situações em que precisamos escrever do que a situações em que precisamos falar. Tanto que aprendemos a falar, a dominar, relativamente, a fala muito antes de dominarmos a escrita. Tudo, porém, a escrita ou a fala, para ser bem dominado depende de aprendizado e treino. Aprendizado significa reflexão sobre; treino significa uso. O romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, ilustra muito bem esse domínio tosco da fala entre camponeses nordestinos da primeira metade do século XX. O pouco uso da fala atrofia-lhe a expressão. A comunicação dá-se por monossílabos, por sons guturais, por imprecações, por interjeições e não por um discurso longo, articulado. Crianças criadas nesse meio, em que a fala é desestimulada, em que não podem falar na frente de adultos masculinos, perguntar certas coisas, terão certamente um domínio incipiente da fala, uma gramática simplificada, um universo vocabular restrito, árido, ausente de muitos conceitos. Claro está, então, que o estímulo à fala desenvolve a fala, o estímulo à escrita desenvolve a escrita. Estímulo e exposição. A exposição à escrita se dá pela leitura de livros. Lendo-se, e lendo-se muito, internaliza-se as articulações da escritura, isto é, as relações que as palavras estabelecem umas com as outras. Não há outra forma. Quer ser um bom orador? Receba estímulos para falar, para combinar palavras de modo vivo, expô-las em boa altura de voz, com sons claros, etc. Quer escrever bem, leia muito. O contrário também é verdadeiro. Alguém com um grande talento de escritor não escreverá livro nenhum se não estiver exposto desde cedo aos estímulos da linguagem escrita. Talento precisa de bom terreno para vicejar. Senão morre. A metáfora da semente é uma boa metáfora para nossos propósitos. Uma boa semente por si só não quer dizer muita coisa; a vida que se encontra nela não desabrocha se não encontra boas condições para tanto, de solo, de clima e de bons tratos. Uma semente que não encontrar essas condições desaparecerá sem deixar vestígios da vida que poderia ter sido. Do mesmo modo o talento. Sem as condições que poderiam fazê-lo desabrochar, ele morre sem ter nascido. Os estímulos para a escritura são raros no Brasil, na família e na escola. A grande maioria dos pais não têm o hábito de leitura e muito menos o da escrita, e, do mesmo modo, poucos professores são leitores apaixonados e têm com os livros uma relação estreita. A leitura, o estudo são em geral concebidos como algo doloroso; não se admite que alguém pode dali extrair prazer. O estudo é algo triste, já que lhe tira da rua, da brincadeira. Quando não, no limite da crença, mas ideia muito corrente, a suspeita de que o estudo dedicado deixa a pessoa louca. Não são poucas as mães que enxotam seus filhos para a rua, para a brincadeira, se eles demonstram predileção pelos livros. E, vítimas do próprio machismo, burro e ingênuo, homens do povo e mesmo das classes médias vêem com suspeita de pouca masculinidade o gosto de algum filho pelos livros. Já usei esses fatos para demonstrar que com uma cultura assim permaneceremos muito tempo ainda longe de um prêmio Nobel. A necessidade de reescrever Os alunos, em geral, têm uma atitude ingênua diante da redação de textos. Grande parte deles acha que um texto bem escrito é necessariamente o resultado de um talento muito acima da capacidade deles. E como eles não são capazes de, de uma sentada, escrever uma obra-prima, nem ousam tentar escrever nada. Ledo engano. Um texto bem escrito é fruto de escrituras e reescrituras, principalmente de reescrituras. Mais que humildade, a prática da reescritura é um ato de inteligência. Reescrevendo o texto, tornamo-lo mais inteligível, mais claro, e mais elegante também. Muita gente se nega a fazê-lo, achando que um texto já nasce pronto. Esta prática deve ser incorporada desde o início do trabalho. Não se deve entender, porém, que logo ao final da primeira versão de uma página, deve-se de imediato tratar de reescrever uma segunda versão. O indicado é deixar o texto “dormir” por alguns dias e depois disso tratar de retrabalhá-lo. Esse tempo é essencial para que a gente adquira uma certa distância do texto e passe a encarálo criticamente. ::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::: Por fim, insistimos no que já ficou evidente: para o estudante universitário, o conhecimento sobre as técnicas de apreensão da leitura é essencial ao bom aproveitamento do seu curso. Concluir um curso universitário significa, por um lado, adquirir conhecimento sobre um determinado campo do saber. Por outro, significa adquirir uma certa autonomia intelectual, traduzida pela capacidade de enfrentar novos desafios, o que quase sempre se configura como a necessidade de arregimentar conhecimentos a fim de enfrentar o desafio. Numa e noutra situação, a melhora da capacidade de leitura, o que inclui o melhor aproveitamento desta, é fundamental. A aquisição de conhecimentos se faz com a estocagem de informações, o que nem sempre é possível fazer completamente na memória. Daí se lançar mão de outros métodos a fim de guardar as informações e de poder usá-las na hora precisa. Em cada disciplina cursada, é necessário aproveitá-la da melhor forma possível. Os textos lidos precisam deixar alguma informação. BIBLIOGRAFIA ALLÈGRE, Claude. Deus e a Ciência. Bauru: EDUSC, 2000. ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith e GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas Ciências Naturais e Sociais; pesquisa quantitativa e qualitativa. 2 ed. São Paulo: Pioneira, 2001. BASTOS FILHO, Jenner B. O que é uma teoria científica? - uma breve provocação sobre um tema complexo. 2 ed. Maceió: EdUFAL, 1998. 144 p. BASTOS, Cleverson Leite e KELLER, Vicente. Aprendendo a Aprender: Introdução à Metodologia Científica. 20 ed. Petrópolis: Vozes, 2007. BENJAMIM, César. O sonho de Descartes, por que somos todos cartesianos. São Paulo, Folha de São Paulo, 18/9/2011. Ilustríssima, p. 4. BOUDON, Raymond. O justo e o verdadeiro; estudos sobre a objectividade dos valores e do conhecimento. Lisboa: Instituto Piaget, 1998. BRAGA, Marco, GUERRA, Andreia e REIS, José Cláudio. Breve história da ciência moderna. Vol. 3. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005. BRODY, David Eliot e BRODY, Arnold. R. As sete maiores descobertas científicas da história. São Paulo: Cia. das Letras, 1999. DAWKINS, Richard. Boas e más razões para crer. In BROCKMAN, John e MATSON, Katinka (org.) As coisas são assim: pequeno repertório do mundo que nos cerca. São Paulo: Cia. das Letras, 1997. DIAS, Almerinda Tereza Bianca B. Batti. Apostila de Metodologia Científica. Criciúma: Universidade do Extremo Sul Catarinense/ Curso de Administração, 2004. (mimeo) ECO, Umberto. O Nome da Rosa. Rio de Janeiro: Record, 1986. (Cap. I, p. 36-39) FRIEDMAN, Meyer; FRIEDLAND, Gerald W. As dez maiores descobertas da medicina. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. HENRY, John. A Revolução Científica e as origens da ciência moderna. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998. HOOD, Bruce M. 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