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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO
MOBILIÁRIO E ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA:
a contribuição da loja de móveis Branco & Preto (1952 a 1970)
Bruno Silva Dias
São Paulo
2013
2
Bruno Silva Dias
MOBILIÁRIO E ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA:
a contribuição da loja de móveis Branco & Preto (1952 a 1970)
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Presbiteriana Mackenzie, como
requisito para obtenção do título de Mestre em
Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora: Profa. Dra. Eunice Helena Sguizzardi Abascal
São Paulo
2013
0
D541m Dias, Bruno Silva.
Mobiliário e arquitetura moderna brasileira : a
contribuição da loja de móveis Branco & Preto (1952 a
1970). / Bruno Silva Dias – 2013.
224 f. : il. ; 30 cm.
Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013.
Referências bibliográficas: f. 149-152.
3
À minha mãe, Arlinda Sousa Silva.
Ao meu avô, Joaquim Manuel da Silva, in
memoriam.
4
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho contou com a contribuição de muitas pessoas, entre elas amigos e
familiares, que nele se envolveram. Agradeço a todos que participaram de forma direta ou
indireta.
À minha orientadora, Professora Doutora Eunice Helena Sguizzardi Abascal, por
sempre me ajudar, desde a escolha do tema até a definição dos caminhos que o trabalho
deveria seguir, orientando-me constantemente a colocar o trabalho em uma linha de pesquisa
objetiva.
À minha mãe, Arlinda Sousa Silva, por acreditar e me incentivar a desenvolver
projetos que, em um primeiro momento, parecem inalcançáveis.
À minha avó, Arlinda Lourdes Sousa Silva, pela preocupação e por sempre me
ajudar.
Ao meu amigo, Neder Nagib, pela sua constante disponibilidade em me ajudar.
Ao Professor Gerson Moura Duarte, meu orientador da graduação, que foi um grande
incentivador quando externei minha ideia de ingressar em um programa de pós-graduação.
Aos Professores Doutores Marta Silveira Peixoto e Rafael Antonio Cunha Perrone,
integrantes da banca para o exame de qualificação, pelas valiosas considerações que foram de
extrema importância para o desenvolvimento do trabalho.
A Antonio Bioni, Romeu Castro de Souza e Sérgio Rodrigues, pela hospitalidade e
pelas preciosas informações concedidas.
À Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, com seu
programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo.
Especialmente à FAPESP – Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo,
por acreditar e conceder apoio financeiro para o desenvolvimento deste trabalho.
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RESUMO
DIAS, Bruno Silva. Mobiliário e arquitetura moderna brasileira: a contribuição da loja de
móveis Branco & Preto (1952 a 1970). 2012. 153 f. Dissertação (Mestrado) ‒ Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013.
A presente pesquisa traça um panorama da arquitetura e do mobiliário produzido no Brasil
desde o início do século XX, dando destaque para o móvel moderno brasileiro produzido
entre as décadas de 1950 e 1970 e para a arquitetura residencial burguesa. Tem também como
base analisar a produção articulada desse mesmo mobiliário e da arquitetura residencial
moderna paulistana. Naquele período, a sociedade formada pelos arquitetos da loja Branco &
Preto e o novo momento político que permeava o cenário nacional incentivaram a inserção e
levaram à consolidação do ideário moderno em São Paulo. Essa produção significou,
mediante a contribuição da loja de móveis Branco & Preto, um sinônimo de parceria e
cooperação, ao atuar como mediadora da inter-relação entre o móvel e a arquitetura
residencial propriamente dita. O objetivo geral é evidenciar e caracterizar a relação necessária
entre a arquitetura moderna e o mobiliário produzido no período supracitado, que foi
proporcionada pela disseminação e assimilação no Brasil do ideário e das práticas
modernistas. O mobiliário projetado nesses anos vinha de uma linha produzida com requinte e
excesso de ornamentos e consistia em elemento indissociável da expressão daquela
arquitetura. Sendo assim, a pesquisa parte do pressuposto de que a relação entre os espaços
internos e a casca arquitetônica encontrava no mobiliário um dos principais suportes de
expressão de vanguarda. Ademais, é inevitável considerarmos o fato de que o mobiliário
expressa valores culturais, estéticos, econômicos e sociais agregados, temas que o enriquecem
e tornam complexas as suas características específicas e influências artísticas, bem como as
técnicas de produção. As questões levantadas serão evidenciadas com a reconstituição, através
de desenhos e maquetes da loja Branco & Preto localizada na Rua Vieira de Carvalho, nas
reconstituições das salas da residência de Roberto Aflalo e da residência Pacaembu – projetos
dos arquitetos Plínio Croce e Roberto Aflalo de 1955, nas reconstituições da sala de estar da
residência Maria Luisa e Oscar Americano de 1952 e do primeiro pavimento da residência
Jardim América de 1956 – ambos projetos do arquiteto Oswaldo Arthur Bratke, além do
desenvolvimento de desenhos e maquetes de móveis inéditos de autoria dos membros da loja.
Palavras-chave: Arquitetura moderna; design; designer brasileiro; interiores e mobiliário.
6
ABSTRACT
DIAS, Bruno Silva. Furniture and Brazilian modern architecture: the contribution of the
furniture store Branco & Preto (1952 to 1970). In 2012.153 f. Master dissertation Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo,
2013.
This research provides an overview of the architecture and the furniture produced in Brazil
since the early twentieth century, giving prominence to the modern mobile Brazilian produced
between the 1950s and 1970s and the bourgeois residential architecture. It also has as a basis
to analyze production articulated this same furniture and modern residential architecture in
São Paulo. At that time, the company formed by architects Store Branco & Preto and the
new political moment that permeated the national scene encouraged the insertion and led to
the consolidation of the modern ideas in São Paulo. This production meant by the contribution
of the furniture store Branco & Preto, a synonym of partnership and cooperation, to act as a
mediator of the interrelationship between the mobile and residential architecture itself. The
overall goal is to demonstrate and characterize the necessary relationship between modern
architecture and furniture produced during the stated period, which was provided by the
dissemination and assimilation in Brazil's modernist ideas and practices. The furniture
designed these years came from a line produced with refinement and excess ornaments and
consisted of an inseparable element of the expression of that architecture. Thus, the research
assumes that the relationship between the interior spaces and architectural shell found in the
furniture of the main supports of expression forefront. Moreover, it is inevitable considering
the fact that the furniture expresses cultural values, aesthetic, economic and social aggregates,
themes that enrich and make it complex to its specific characteristics and artistic influences,
as well as production techniques. The issues raised will be evidenced by reconstituting,
through drawings and models Branco & Preto Store located in Rua Vieira de Carvalho, the
reconstructions of the halls of residence and the residence of Roberto Aflalo Pacaembu designs of architects Plinio Croce and Roberto Aflalo 1955 in reconstructions of the living
room of the house Maria Luisa and Oscar Americano 1952 and the first floor of the residence,
1956 Jardim America - both designs of architect Oswaldo Arthur Bratke, besides the
development of drawings and models of mobile unpublished authored by members of store.
Keywords: Modern architecture; design; Brazilian designer; interiors and furniture.
7
LISTA DE FIGURAS
Figura 1
Figura 2
Figura 3
Figura 4
Figura 5
Figura 6
Figura 7
Figura 8
Figura 9
Figura 10
Figura 11
Figura 12
Figura 13
Figura 14
Figura 15
Figura 16
Figura 17
Figura 18
Figura 19
Figura 20
Figura 21
Figura 22
Figura 23
Figura 24
Figura 25
Figura 26
Figura 27
Figura 28
Figura 29
Figura 30
Figura 31
Figura 32
Figura 33
Figura 34
Figura 35
Figura 36
Figura 37
Figura 38
Figura 39
Figura 40
Edifício para escritórios na Rua 7 de Abril ..................................................... 18
Edifício para escritórios em Campinas ........................................................... 18
Edifício João Ramalho .................................................................................... 19
Galeria Duraplac ............................................................................................. 19
Poltrona e buffet do designer Paul McCobb ................................................... 23
Móveis desenhados por Gregori Warchavchik ............................................... 25
Cadeira Bratke (1948) – Oswaldo Arthur Bratke ........................................... 25
Cadeira Preguiça (1945) – Vilanova Artigas .................................................. 26
Cadeira Paulistano (1957) Paulo Mendes da Rocha ....................................... 26
Cadeira de balanço Oscar Niemeyer(1977) .................................................... 27
Cadeira Girafa (1987); cadeira Frei Egídio (1987) ........................................ 30
Ambientes com peças da Loja de Móveis Z ................................................... 31
Cadeira GB01(1954) – Designer Geraldo de Barros ...................................... 32
Ambientações Sérgio Rodrigues na década de 50 ................................................ 33
Poltrona Verônica – designer Jorge Zalszupin ............................................... 33
Logotipo Branco & Preto Jacob Ruchti (1952) ............................................. 39
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: planta 1º pavimento .................... 43
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: planta mezanino ........................ 44
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: cortes AA e BB .......................... 45
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: perspectiva.................................. 46
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: desenho estante expositora ......... 47
Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: maquete – estante expositora...... 47
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista externa................. 48
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista superior ................ 49
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista frontal, primeiro
e segundo pavimento ........................................................................................ 50
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 1, primeiro
pavimento ......................................................................................................... 50
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 2, primeiro
pavimento .......................................................................................................... 51
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 3, primeiro
pavimento .......................................................................................................... 51
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: Vista 4, primeiro .......... 52
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 5, primeiro pavimento
......................................................................................................................... 52
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 6, primeiro pavimento
......................................................................................................................... 53
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 1, mezanino ......... 53
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 2, mezanino ......... 54
Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 3, mezanino ....... 54
Maquetes móveis Loja Branco & Preto .......................................................... 56
Maquetes mesas Loja Branco& Preto ............................................................ 57
Ferramentas utilizadas na marcenaria tradicional ........................................... 58
Maquete sistema de encaixe ½ esquadria ....................................................... 59
Jacarandá-da-Bahia, sendo: 1-2– Jacarandá em estado natural; 3-4 –
Jacarandá com aplicação de selador .................................................................. 61
Caviúna, sendo: 1‒ Caviúna em estado natural; 2 ‒ Caviúna com
aplicação de selador ........................................................................................... 61
8
Figura 41
Figura 42
Figura 43
Figura 44
Figura 45
Figura 46
Figura 47
Figura 48
Figura 49
Figura 50
Figura 51
Figura 52
Figura 53
Figura 54
Figura 55
Figura 56
Figura 57
Figura 58
Figura 59
Figura 60
Figura 61
Figura 62
Figura 63
Figura 64
Figura 65
Figura 66
Figura 67
Figura 68
Figura 69
Figura 70
Figura 71
Figura 72
Figura 73
Figura 74
Figura 75
Figura 76
Figura 77
Figura 78
Figura 79
Figura 80
Figura 81
Figura 82
Figura 83
Figura 84
Figura 85
Cabreúva, sendo: 1 ‒ Cabreúva em estado natural; 2 ‒ Cabreúva com
aplicação de selador ............................................................................................ 62
Marfim, sendo: 1 ‒ Marfim em estado natural; 2 ‒ Marfim com aplicação
de selador; 3 ‒ Marfim com aplicação de laca preta; 4 ‒ Marfim com
aplicação de laca branca .................................................................................... 62
Maquete espiga ............................................................................................... 63
Maquete malhete ............................................................................................. 64
Maquete meia madeira .................................................................................... 65
Maquete talisca ............................................................................................... 66
Maquete cunha ................................................................................................ 67
Maquete alma .................................................................................................. 68
Desenho técnico Sofá Aflalo .......................................................................... 70
Maquete Sofá Aflalo ....................................................................................... 71
Desenho técnico Mesa de Centro Aflalo ........................................................ 72
Desenho detalhes construtivos Mesa de Centro Aflalo .................................. 73
Perspectiva Mesa de Centro Aflalo................................................................. 74
Maquete física Mesa de Centro Aflalo ........................................................... 74
Desenho técnico Mesa Escola Olivo Gomes (aprox. 1952) – Carlos Milan .. 75
Desenho técnico Poltrona 1 ‒ Jacob Ruchti .................................................... 76
Maquete Poltrona 1 ‒ Jacob Ruchti ............................................................... 77
Desenho técnico Poltrona 2 ‒ Jacob Ruchti .................................................... 78
Maquete Poltrona 2 ‒ Jacob Ruchti ................................................................ 79
Desenho técnico Poltrona Residência Oscar Americano ................................ 80
Maquete Poltrona Residência Oscar Americano ............................................ 81
Desenho Poltrona Bergère .............................................................................. 82
Maquete Poltrona Bergère .............................................................................. 84
Planta Residência Aflalo ................................................................................. 86
Fotos ResidênciaAflalo ................................................................................... 87
Planta com localização sala de estar/jantar Residêncian Aflalo ..................... 87
Layout sala de estar/jantar Residência Aflalo ................................................. 88
Vistas 1, 2 e 3 sala de estar/jantar Residência Aflalo .................................... 89
Sala de estar Residência Aflalo com a relação entre os móveis ...................... 90
Perspectiva sala de estar Residência Aflalo .................................................... 91
Vista 1 superior maquete Residência Aflalo ................................................... 92
Vista 2 superior maquete Residência Aflalo ................................................... 93
Vista 3 superior maquete Residência Aflalo ................................................... 94
Vista 1 interna maquete Residência Aflalo ..................................................... 95
Vista 2 interna maquete Residência Aflalo ..................................................... 95
Vista 3 interna maquete Residência Aflalo ..................................................... 96
Residência Pacaembu: planta pavimento térreo e superior............................. 97
Fotos Residência Pacaembu............................................................................ 98
Residência Pacaembu: localização espaço sala de estar, jantar e bar ............. 98
Residência Pacaembu: layout sala de estar, jantar e bar ................................. 99
Residência Pacaembu: layout com relação entre os móveis sala de estar,
jantar e bar ........................................................................................................ 100
Residência Pacaembu: corte AA, BB e CC sala de estar, jantar e bar ........... 101
Residência Pacaembu: perspectiva sala de estar ............................................. 102
Desenhos sofás Residência Pacaembu ............................................................ 103
Maquete bar com banquetas............................................................................ 104
9
Figura 86
Figura 87
Figura 88
Figura 89
Figura 90
Figura 91
Figura 92
Figura 93
Figura 94
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Figura 100
Figura 101
Figura 102
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Figura 104
Figura 105
Figura 106
Figura 107
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Figura 109
Figura 110
Figura 111
Figura 112
Figura 113
Figura 114
Figura 115
Figura 116
Figura 117
Figura 118
Figura 119
Figura 120
Figura 121
Figura 122
Figura 123
Figura 124
Figura 125
Maquete móvel sala de jantar ......................................................................... 105
Maquete Residência Pacaembu: vista 1 ........................................................ 106
Maquete Residência Pacaembu: vista 2 ........................................................ 107
Maquete Residência Pacaembu: vista 3 ........................................................ 108
Maquete Residência Pacaembu: vista 4 ........................................................ 109
Maquete Residência Pacaembu: vista 5 ........................................................ 109
Maquete Residência Pacaembu: vista 6 .......................................................... 110
Planta pavimento térreo e superior sala de estar da Residência Jardim
América ............................................................................................................ 113
Fotos da Residência Jardim América .............................................................. 114
Localização área social residência Jardim América ....................................... 114
Residência Jardim América: layout área social .............................................. 115
Residência Jardim América: vista 1, 2, 3 e 4 área social ............................... 116
Residência Jardim América: layout área social com relação entre os móveis
......................................................................................................................... 117
Residência Jardim América: perspectiva sala de estar com o mobiliário
da Branco & Preto ............................................................................................. 118
Residência Jardim América: perspectiva da sala lareira com o mobiliário
da Branco & Preto ............................................................................................. 118
Residência Jardim América: desenho estante sala de estar ............................ 119
Residência Jardim América: maquete estante sala de estar ............................ 119
Residência Jardim América: vista 1 maquete área social ............................. 120
Residência Jardim América: vista 2 maquete área social ............................. 121
Residência Jardim América: vista 3 maquete área social ............................. 121
Residência Jardim América: vista 4 maquete área social ............................. 122
Residência Jardim América: vista 5 maquete área social ............................. 122
Residência Jardim América: vista 6 maquete área social ............................. 123
Residência Jardim América: vista 7 maquete área social ............................. 123
Residência Jardim América: vista 8 maquete área social ............................. 124
Residência Jardim América: vista 9 maquete área social ............................. 124
Residência Jardim América: vista 10 maquete área social ........................... 125
Residência Jardim América: vista 11 maquete área social ........................... 125
Residência Jardim América: vista 12 maquete área social ........................... 126
Residência Jardim América: maquetes móveis............................................... 127
Setorização Residência Maria Luísa e Oscar Americano ............................... 128
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: plantas térreo e nível .............. 129
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: cortes AA, corte BB,
fachada 1 e fachada 2........................................................................................ 130
Fotos do mobiliário atual da Fundação Maria Luísa e Oscar Americano....... 131
Ambientes da Residência Oscar Americano mobiliados com os móveis
da Branco& Preto .............................................................................................. 131
Fotos atuais da parte externa da Residência Maria Luísa e Oscar
Americano ......................................................................................................... 132
Redesenho da sala de descanso Residência Maria Luisa e Oscar
Americano ......................................................................................................... 133
Localização da sala de estar no pavimento térreo ........................................... 133
Residência Maria Luísa e Oscar Americano: layout sala de estar .................. 134
Residência Maria Luísa e Oscar Americano: cortes AA, BB, CC e DD .
Sala de estar ........................................................................................................ 135
10
Figura 126
Figura 127
Figura 128
Figura 129
Figura 130
Figura 131
Figura 132
Figura 133
Figura 134
Figura 135
Figura 136
Residência Maria Luísa e Oscar Americano: layout sala de estar com
Relação entre os móveis ................................................................................... 136
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: móveis sala de estar ................ 138
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: Layout da sala de estar com
desenhos dos móveis ......................................................................................... 139
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: Perspectiva sala de estar......... 139
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 1 maquete sala de estar ... 140
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 2 maquete sala de estar ... 141
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 3 maquete sala de estar ... 142
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 4 maquete sala de estar ... 143
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 5 maquete sala de estar ... 143
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 6 maquete sala de estar ... 144
Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 7 maquete sala de estar ... 144
11
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
CREA
Conselho Regional de Engenharia e Agronomia
EUA
Estados Unidos da América
FAU-USP
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
IAB
Instituto de Arquitetos do Brasil
MES
Ministério da Educação e Saúde
MAM-SP
Museu de Arte Moderna de São Paulo
MASP
Museu de Arte de São Paulo
MoMa
Museum of Modern Art
MUBE
Museu Brasileiro da Escultura
SESC
Serviço Social do Comércio
12
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO......................................................................................................... 12
2
CULTURA E ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA NO PERÍODO
ENTRE O INÍCIO DA DÉCADA DE 1920 E 1970 ............................................... 15
2.1
A INFLUÊNCIA DA ARQUITETURA E DA CULTURA NORTE- AMERICANA
.................................................................................................................................... 20
2.2
O PROJETO DE INTERIORES E A PRODUÇÃO DO MÓVEL MODERNO NO
BRASIL ...................................................................................................................... 24
3
LOJA BRANCO & PRETO ...................................................................................... 35
3.1
MEMBROS DA LOJA E A SUA FORMAÇÃO ....................................................... 35
3.2
A LOJA ....................................................................................................................... 39
4
O MOBILIÁRIO DA BRANCO & PRETO SUAS CARACTERÍSTICAS E A
UTILIZAÇÃO........................................................................................................... 55
4.1
AS CARACTERÍSTICAS E OS MATERIAIS UTILIZADOS NOS MÓVEIS ....... 57
4.2
MÓVEIS INÉDITOS.................................................................................................. 69
4.3
RECONSTITUIÇÃO DOS INTERIORES ................................................................ 85
4.3.1 Sala de Estar Residência Roberto Aflalo ‒ 1955 ........................................................ 86
4.3.2 Residência Pacaembu ‒ 1955 ..................................................................................... 97
4.3.3 Residência Jardim América ‒ 1956 ............................................................................ 111
4.3.4 Residência Maria Luisa e Oscar Americano – 1952 .................................................. 128
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 145
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 149
ANEXOS ............................................................................................................................... 153
12
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho é uma contribuição às pesquisas que abordam o mobiliário
moderno produzido no Brasil, ao investigar os móveis projetados pelos arquitetos da loja
Branco & Preto entre as décadas de 1950 e 70 que abasteciam principalmente a arquitetura
residencial burguesa paulistana. Tem como objeto a produção articulada desse mobiliário e da
arquitetura residencial, representada pela reconstituição através de maquetes volumétricas dos
móveis das salas de estar da residência do arquiteto Roberto Aflalo de 1955, da residência
Pacaembu – projeto dos arquitetos Plínio Croce e Roberto Aflalo de 1955. Apresentaremos
também a reconstituição da área social do primeiro pavimento da residência Jardim América
de 1956 e da sala de estar da residência Maria Luisa e Oscar Americano de 1952 – ambos os
projetos do arquiteto Oswaldo Arthur Bratke, além da reconstituição da loja da Branco &
Preto localizada na Rua Vieira de Carvalho, de 1952, e das maquetes físicas de móveis
inéditos, projetados pelos membros da loja que não chegaram a ser produzidos e a
complementação do catalogo através do desenvolvimento de redesenhos e maquetes. No
momento histórico assinalado, a sociedade formada pelos arquitetos que estiveram à frente da
loja Branco & Preto e o momento político que permeava o cenário nacional naquele período
incentivavam a inserção e levaram à consolidação do ideário moderno no Brasil e,
particularmente, em São Paulo. A loja de móveis Branco & Preto foi sinônimo de parceria e
cooperação entre vários atores históricos, arquitetos que estiveram à frente da arquitetura
moderna, atuando como mediadores da relação entre o projeto do mobiliário e a arquitetura
residencial propriamente dita.
A reconstituição dos projetos destacados acima e que serão abordados com mais
detalhes no decorrer trabalho demonstra os móveis da loja Branco & Preto integrados nos
projetos de interiores e arquitetônico. O mobiliário projetado naquele período ainda
apresentava resquícios de móveis com excesso de ornamentação, que consistia em elemento
indissociável da expressão da arquitetura residencial paulistana moderna que se pretendia
desenvolver, em especial pelos próprios arquitetos sócios da loja. A pesquisa parte do
pressuposto de que a relação entre o projeto de interiores e o arquitetônico encontrava no
mobiliário um dos principais suportes de integração do projeto.
Partimos da hipótese de que a loja Branco & Preto vendia móveis desenhados
conforme o ideário moderno, adequados com a capacidade de expressar o espaço fluido da
planta moderna, ou seja, com desenhos e processos de fabricação simplificados. Devemos
13
destacar que o mobiliário, além de servir como elemento de continuação dos ideários
propostos no projeto arquitetônico, expressa valores culturais, estéticos, econômicos e sociais
agregados, temas que o enriquecem e tornam complexas as suas características específicas,
bem como as técnicas de execução e as influências artísticas por ele recebidas.
Neste sentido, uma problemática mais ampla permanece de fundo ao presente
trabalho, que parte da identificação de técnicas, sistemas construtivos e materiais utilizados no
móvel produzido no Brasil e de uma análise do cenário da produção de mobiliário iniciada no
começo do século XX que caracterizaram marcantemente essa produção entre as décadas de
1950 e 70 e que continuam influenciando o desenho do móvel contemporâneo, porém,
ultimamente, muitos processos e técnicas de fabricação vêm se perdendo influenciado pela
automação industrial e devido à descontinuidade no processo de repasce do conhecimento das
técnicas e processos de produção. Devemos destacar, neste cenário, o mobiliário feito com
excelência e primor de qualidade formal e estética, pioneiro em projetos que buscavam uma
linha projetual similar com a arquitetura nessas duas décadas supracitadas. Merecem destaque
nomes como Sérgio Rodrigues, Joaquim Tenreiro e Zanine Caldas, entre outros, e, em
especial a contribuição da loja de móveis Branco & Preto e de seus integrantes nesse processo
de evolução e consolidação da arquitetura e do design de móveis modernos no Brasil.
Ao longo das últimas décadas tivemos a contribuição de pesquisadores, com trabalhos
que resgatam e valorizam a produção do móvel no Brasil e, para entendermos essa evolução
de técnicas e de processos produtivos e estéticos, devemos destacar obras como O móvel da
casa brasileira (BAYEUX, 1997), a vasta pesquisa da jornalista Adélia Borges na área do
design, o trabalho da Professora Maria Cecília Loschiavo dos Santos em O móvel moderno no
Brasil, de 1995, que, juntamente com a obra Cadeira: o mobiliário no Brasil, de 1998, e as
recentes publicações Móvel brasileiro moderno da FGV Projetos e A arquitetura de Croce,
Aflalo e Gasperini de Fernando Serapião, ambos de 2011, fazem menção ao trabalho da loja
Branco & Preto, o que evidencia a importância de seus idealizadores para a história do
mobiliário e da arquitetura brasileira e o desenvolvimento deste trabalho. Merece realce ainda
o trabalho da arquiteta Marlene Milan Acayaba, Branco & Preto: uma história de design
brasileiro nos anos 50, de 1994, desenvolvida para sua tese de doutorado, juntamente com a
revista Acrópole. Todas essas obras são fontes documentais e históricas que destacam a
produção da loja Branco & Preto cujos sócios eram arquitetos de grande participação
arquitetônica, principalmente na cidade de São Paulo, e que contribuíram com o
desenvolvimento de projetos de móveis dentro dos ideários modernos. Contamos ainda com
14
os depoimentos de Romeu Castro de Souza1, Sérgio Rodrigues2 e Antônio Bioni3. Do
primeiro, arquiteto de formação e que trabalhou na loja Branco & Preto. Já o segundo,
também arquiteto, foi colaborador da loja de móveis paulistana Forma e proprietário da loja
Oca nos anos de 1950, e tem seus móveis produzidos e comercializados em diversas partes do
mundo até hoje. Quanto a Antonio Bioni, artesão titulado como homem de bancada, por
participar diretamente nos processos de fabricação de mobiliário, foi um dos sócios da loja de
móveis Hobjeto entre os anos de 1950 e 80. Seus depoimentos foram de extrema importância
para entendermos o processo evolutivo do móvel no Brasil e o cenário arquitetônico e político
entre as décadas de 1950 e 70.
No início deste trabalho, com o levantamento de projetos que utilizaram os móveis da
loja Branco & Preto, observou-se uma forte relação entre o projeto de interiores e o
arquitetônico, ficando evidenciada a adoção da mesma linguagem projetual na confecção de
ambos. Podemos ainda destacar inovações na criação dos revestimentos, pesquisas de novos
materiais, desenvolvimento e aprimoramento de técnicas construtivas. Além disso, foram
também constatadas as inovações projetuais criadas pelo grupo, explicitando as características
empregadas por seus integrantes, como encaixes, padrões de acabamento, métodos
construtivos e estamparias, processos esses que estão se perdendo com o passar dos anos.
Note-se que a loja é um produto da associação entre representantes da modernidade
arquitetônica em São Paulo, os quais contribuíram para a sua consolidação, sendo seus
integrantes arquitetos com expressiva produção residencial na cidade no período considerado.
As residências são certamente a tipologia por excelência, evidenciando a articulação de
arquitetura e design de mobiliário com os seus projetos e os de seus parceiros, que
partilhavam dos mesmos ideários modernos.
Identificamos diferenças entre o cenário arquitetônico e o do design da década de
1950-1970 e o que é hoje vivenciado pelo mercado de mobiliário no Brasil. É possível
observar variações expressivas entre a produção de móveis no período atual e a que era feita
no momento em que esteve plenamente vinculada à arquitetura moderna nos anos de 1950. Na
atualidade, presenciam-se no Brasil ações isoladas de profissionais que projetam mobiliário
de forma a respeitar aspectos ergonômicos, atendendo a condições e parâmetros estéticos.
Neste trabalho poderão ser observadas, por meio dos projetos de móveis da loja Branco &
1
Depoimento de Romeu Castro de Souza ao autor concedido em 9 de outubro de 2012 (Anexo 2).
Depoimento de Antônio Bioni ao autor concedido em 6 de outubro de 2012 (Anexo 3).
3
Depoimento de Sérgio Rodrigues ao autor concedido em 23 de novembro de 2012 (Anexo 4).
2
15
Preto, as características próprias dos móveis que foram mantidas durante toda a existência da
loja, conforme relata o arquiteto Romeu Castro de Souza4que lá trabalhou:
O interessante da Branco & Preto é que eles mantiveram a fidelidade, o valor ao
material que era empregado, à concepção e de acordo com a arquitetura... Não
ficou ultrapassada, porque era muita adiantada. Sempre contemporânea, é um
clássico... São exemplos que podem nortear uma produção futura aproveitando a
ideia da coisa, a filosofia, é muito interessante com o mobiliário já existente. Eles
eram donos e os projetistas e além de tudo eram arquitetos que tinham uma relação
com o mobiliário e a própria arquitetura, assim fechavam o elo (Anexo 2).
Ao analisarmos os projetos que utilizaram os móveis da loja Branco & Preto vemos o
forte indício de que o mobiliário serviu como elemento de articulação entre a arquitetura e os
espaços de interiores nas décadas de 1950 e 1970. A problemática observada frente à
incompletude documental e à perda dos conceitos qualitativos que eram aplicados pelo grupo.
A fim de complementar o material existente, será apresentada reconstituições de ambientes,
através de desenhos e maquetes.
2 CULTURA E ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA NO PERÍODO ENTRE
O INÍCIO DA DÉCADA DE 1920 E 1970
O objetivo deste capítulo é apresentar breve panorama, pontuando contribuições e
realizações culturais definidoras do ambiente moderno brasileiro e em especial, paulistano.
Não se trata de tentativa de exaurir a matéria, mas assinalar eventos e realizações que
marcaram o período em análise e sua caracterização moderna.
Em 1922 realizou-se em São Paulo a Semana de Arte Moderna, que contou com a
participação de nomes importantes como Cândido Portinari, destaque na pintura, poesia e
política, bem como de outros atores históricos que puderam identificar aquele momento, tais
como Di Cavalcanti, Brecheret, Ismael Nery e Tarsila do Amaral, além de intelectuais como
Mário de Andrade, Monteiro Lobato, Oswald de Andrade, Ricardo Severo e Cândido Mota.
No final dos anos de 1940 Assis Chateaubriand criou o MASP (Museu de Arte de São
Paulo) e, em 1948, o MAM-SP (Museu de Arte Moderna de São Paulo), que foram fatores
que colaboraram com a divulgação da arquitetura e artes que estavam sendo produzidas, pois
atraíam um público formado por intelectuais e artistas. Em 1950 contou-se com a criação da
revista Habitat, idealizada por Pietro Maria Bardi e por sua esposa, a arquiteta Lina Bo Bardi.
No ano seguinte, ela faria o projeto de uma das obras de referência para a consolidação do
4
Romeu Castro de Souza foi professor de projeto na Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana
Mackenzie.
16
ideário e da práxis moderna entre nós, a Casa de Vidro, situada no bairro do Morumbi, em
São Paulo. Podemos observar, ainda nos anos de 1950, arquiteturas emergentes em São Paulo
definidoras de uma expressão a que se denominou brutalista, a qual teve seu início marcado
entre os anos de 1953 e 1958. Essa tendência arquitetônica está presente nas obras da
arquiteta Lina Bo Bardi e em outras, como nas escolas estaduais projetadas para as cidades de
Itanhaém (1959) e Guarulhos (1960) por Vilanova Artigas, com a participação de Carlos
Cascaldi. Posteriormente, aparece também nos projetos de João Eduardo de Gennaro, Pedro
Paulo de Melo Saraiva, Carlos Millan, Fábio Penteado, Ruy Ohtake e João Toscano, entre
outros (BASTOS; ZEIN, 2010).
A difusão da arquitetura moderna no Brasil foi incentivada por múltiplos eventos e
processos históricos, a exemplo da vinda de Le Corbusier ao Brasil por três vezes, nos anos de
1923, 1936 e 1962, ressaltando-se o ano de 1936, quando foi consultor para a elaboração do
projeto do edifício-sede do Ministério da Educação e Saúde no Rio de Janeiro. Rino Levi e
Gregori Warchavchik também foram personalidades de grande importância na propagação da
arquitetura moderna em São Paulo. Pode-se mencionar ainda a construção de Brasília (19591960) e os projetos e obras de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer.
No plano cultural, a difusão da arquitetura moderna no Brasil se deu mediante fatores
e processos diversos, mas foi fortemente estimulada pela Semana de 1922 – A Semana de
Arte Moderna.
A indicação de Lúcio Costa, em 1930, como diretor da Escola de Belas Artes no Rio
de Janeiro não só contribuiu como também foi um evento decisivo para a fomentação da
modernidade, visto que, nesse período, acabara de ser admitida a arquitetura neocolonial. Em
1936, a equipe liderada por Lúcio Costa, assessorada por Le Corbusier e ainda integrada pelos
arquitetos Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Ernani Vasconcelos, Jorge Moreira e Oscar
Niemeyer, foi responsável pelo projeto para o Edifício Sede do MES – Ministério da
Educação e Saúde (BRUAND, 1999). A obra obteve grande repercussão mundial e inaugurou
um período de realizações importantes, como o Parque da Pampulha em Belo Horizonte entre
1942 e 1943 e, mais tarde, em 1954, é exemplar o projeto dos edifícios que integram o Parque
do Ibirapuera em São Paulo, ambos de Oscar Niemeyer, com a colaboração de arquitetos
paulistas, entre eles Eduardo Kneese de Mello (XAVIER; LEMOS; CORONA, 1983), além
da construção de Brasília (SEGAWA, 1999).
Em 1947, o MASP foi fundado e desde então seu acervo foi sendo ampliado. A sede,
naquela época situada à Rua Sete de Abril, abrigava obras de arte distribuídas em quatro
andares. Logo depois, em 1948, o MAM-SP foi criado, com o intuito de valorizar os artistas
17
brasileiros, com a contribuição de Ciccilo Matarazzo e sua esposa, que o haviam idealizado.
Por isso, a organização de uma bienal, com base na anteriormente organizada em Veneza,
incentivou esse processo. Em outubro de 1951, a abertura da Bienal foi pautada nos pilares da
ousada proposta de elevar São Paulo à categoria de centro artístico mundial. O projeto para
abrigar essa exposição foi concebido por Jacob Ruchti e Miguel Forte, arquitetos egressos do
Mackenzie e que se tornariam sócios na loja de móveis Branco& Preto (CAMARGO,[19--]).
No Rio de Janeiro, Lúcio Costa foi diretor por um ano da Escola de Belas Artes e,
durante esse período, chamou o arquiteto Gregori Warchavchik para lecionar a disciplina de
projeto.
Quando falamos de arquitetura moderna devemos destacar a produção arquitetônica
residencial que, por sua escala reduzida, pode ser um alvo mais fácil de experimentações,
sejam elas tecnológicas ou do ponto de vista formal e conceitual. Trata-se de um período de
fundamentação do racionalismo e do funcionalismo arquitetônicos, com a “máquina de
morar” enunciada por Le Corbusier e apresentada no esquema da Maison Dom-Ino (1914), e
reafirmada em obras como a Villa Savoye (1929-1931), com a utilização dos cinco pontos
defendidos para uma nova arquitetura: pilotis, terraço-jardim, planta livre, fachada livre e
janela em fita. Com princípios opostos à residência racionalista de Le Corbusier, e
privilegiando o espaço fluido articulado à materialidade obtida pelo emprego de recursos
locais, deve-se lembrar a Casa da Cascata (Fallingwater) projetada em 1935 por Frank
Lloyd Wright, grande divulgador dos conceitos da arquitetura orgânica. No Brasil,
especialmente em São Paulo, a contribuição de nomes como Rino Levi, Galiano Ciampaglia,
Rodolfo Quintella, Salvador Candia entre outros foi responsável pelo desenvolvimento e
difusão de uma arquitetura especialmente residencial que buscou a relação do interior com o
exterior, o uso de luz natural propiciada por pátios internos destacados mais adiante nos
estudos de caso. O arquiteto curitibano João Vila Nova Artigas projetou suas primeiras casas
com influências organicistas (lembrando a Casa Paranhos no Pacaembu, São Paulo), porém
por volta de 1945 é notável a influência racionalista de Le Corbusier (ACAYABA, 1986).
Tudo isso influenciou uma geração de arquitetos, entre eles Oswaldo Arthur Bratke e
aqueles que integraram a sociedade da loja de móveis Branco & Preto.
Dentro desse cenário de modernidade, não podemos deixar de mencionar algumas
obras e produções arquitetônicas realizadas pelos membros da loja Branco & Preto que, além
de transitarem na área do design, eram também atuantes na produção arquitetônica, tanto de
residências como edifícios, visto que no final dos anos de 1960 e início dos 70, sobressaiu o
trabalho de arquitetura, conforme relata o arquiteto Romeu Castro de Souza,
18
Prevaleceram os escritórios de arquitetura, na profissão propriamente dita (...)
Com o passar do tempo começaram a pegar bastante serviço. Millan pegou o
Paineiras do Morumbi. Tinha ganhado já o Jockey Clube no Largo São Francisco,
em frente da Faculdade de Direito. Não fizeram, mas era um belo projeto. A
Peugeot em Buenos Aires também, mas acabou não sendo construída (Anexo 2).
Em 1944 Galiano Ciampaglia, Jacob Ruchti e Miguel Forte desenvolveram em São
Paulo projeto para prédios de apartamentos na Avenida Rebouças. O projeto para a sede do
IAB, de 1948, foi desenvolvido por uma equipe formada por Rino Levi, Roberto Cerqueira
Cesar, Zenon Lotufo, Abelardo de Souza, Hélio Duarte, Galiano Ciampaglia, Jacob Ruchti e
Miguel Forte. O edifício era formado por um subsolo, térreo com pé direto alto, mezanino e
seis andares para escritórios. Em 1949 Plínio Croce desenvolveu projeto do edifício para
escritórios na Rua 7 de Abril e em 1960 o edifício de escritórios em Campinas para abrigar o
Banco Hipotecário Lar Brasileiro e, em parceria com o arquiteto Roberto Aflalo, projetou o
Edifício Biaça, de 1953 (ACAYABA, 1994).
Figura 1 – Edifício para escritórios na Rua 7 de Abril
Fonte: Revista Acrópole, n. 137, p. 141-143, set. 1949.
Figura 2 – Edifício para escritórios em Campinas
Fonte: Revista Acrópole, n. 263, p. 808-809, set. 1960.
19
Ainda no mesmo ano, Plínio Croce e Roberto Aflalo executaram um conjunto
habitacional composto por 128 casas – um projeto cujos elementos marcantes são a adaptação
à topografia e as lajes planas. Também em 1953, Plínio Croce, Roberto Aflalo e Salvador
Candia elaboraram o projeto do Edifício João Ramalho, em São Paulo, que ganhou o primeiro
prêmio internacional na categoria habitação coletiva na IV Bienal de São Paulo.
Figura 3 – Edifício João Ramalho
Fonte: Revista Acrópole, n. 242,p. 55-57, dez. 1958.
Já em 1968, Jacob Ruchti desenvolveu projetos para a galeria Duraplac na Rua
Augusta e o Banco Itaú na Rua Boa Vista, ambos em São Paulo (SERAPIÃO, 2011).
Figura 4 – Galeria Duraplac
Fonte: Revista Acrópole, n. 354, p. 27-29, set. 1968.
20
Podemos observar influências que definiram o caminho consistente para a
consolidação da arquitetura moderna em São Paulo, era recorrente a formação de parcerias
entre os arquitetos, desenvolvendo projetos de várias temáticas que definiram um caminho
consistente para a consolidação da arquitetura moderna, não somente em moldes
lecorbusierianos, mas acolhendo a influência de outros arquitetos como Frank Lloyd Wright.
Esta influencia norte americana é decisiva para o entendimento da modernidade, sobretudo da
arquitetura moderna residencial na cidade de São Paulo. Observamos no trabalho de
arquitetos de grande produção em São Paulo como Salvador Candia, Rino Levi, Miguel Forte,
entre outros, através da criação de construções com grandes planos de vidro, na especificação
de matérias aparentes como pedras, com o desenvolvimento de uma planta mais fluida e
espaços integrados, notamos também influencias culturais conforme será abordado no
próximo capitulo.
2.1 A INFLUÊNCIA DA ARQUITETURA E DA CULTURA NORTEAMERICANA
Esta parte do trabalho se destina a traçar um panorama de características da arquitetura
norte-americana, sobretudo residencial de 1930 a 1970, com objetivo de identificar relações e
influências desta na arquitetura e design de mobiliário paulistano. Trata-se de reforçar as
possíveis vias de formas de comunicação entre essas expressões arquitetônicas e relações
recíprocas.
No final da década de 1930, com a Europa em crise, houve a migração de nomes como
Walter Gropius e Marcel Breuer para os Estados Unidos, que passaram então a trabalhar na
Universidade de Harvard. Outro expoente europeu que passou a viver e trabalhar na América
foi Mies van der Rohe, que passou a dirigir a escola de arquitetura do Armour Institute of
Technology. Outras personalidades de renome da arquitetura mundial como Lazlo Moholy
Nagy, Hilberseimer e Albers, e artistas como Wassily Kandinsky e Paul Klee, além de
cientistas do gabarito de Albert Einstein e Werner von Braun também mudaram de país, o que
ocasionou a propagação de conceitos do ideário moderno de origem europeia, os quais
passaram a prevalecer na produção arquitetônica em diversos locais do mundo. Os arquitetos
formados a partir dos anos de 1940, apesar de muitos possuírem formação em moldes
clássicos, mantinham paralelamente um contato com as obras dos precursores das obras
modernas (BASTOS; ZEIN, 2010, p. 23-24).
21
Em seguida, verificam-se alguns nomes que estiveram no Brasil, e entre eles arquitetos que
atuavam nos Estados Unidos:
Também a partir de 1951, e como evento agregado e paralelo à Bienal de
Arte, nasce a Bienal de Arquitetura, em cujas cinco primeiras edições, de
1951 a 1959, comparecem, fazem exposições e/ou são premiados arquitetos
como Le Corbusier, Mies van der Rohe, Walter Gropius, Philip Johnson,
Bruno Zevi, Max Bill, Craig Elwood, Paul Rudolph etc. (BASTOS; ZEIN,
2010, p. 37).
Enquanto a arquitetura moderna na Europa priorizou a construção de habitações
coletivas, os Estados Unidos, incentivados por políticas governamentais, despontavam com as
moradias individuais. As tipologias tradicionais das casas americanas tinham como marca
forte a sua fácil adaptabilidade − havia o layout bungalow que era simples, compacto, com a
parte social e o setor de serviços lado a lado, favorecendo uma integração entre o interior e o
exterior. Já no modelo de layout ranch podia-se observar três blocos principais: a área social,
a área íntima e a garagem, em forma de L ou de U. Uma arquitetura em geral marcada pelos
grandes beirais, janelas corridas, planta livre, cozinhas integradas à sala de jantar, em que
muitas plantas se desenvolvem em torno de pátios e jardins relacionando as áreas internas
com as externas.
Nas casas projetadas entre 1940 e 1960 nos Estados Unidos podemos ver inovações
funcionais, técnicas e formais, com certo regionalismo. Basicamente havia, na Califórnia, o
programa de Case Study Houses patrocinado pela revista Arts & Architecture, em que nomes
importantes da arquitetura da época como Richard Neutra, Charles Eames e Eero Saarinen.
Na costa leste americana temos o trabalho mais intenso do arquiteto Marcel Breuer, que
desenvolveu uma arquitetura com predominância do uso da madeira e de detalhes de
carpintaria, associados, porém, a partes em alvenaria de pedras brutas aparentes ou tijolos,
linhas marcadas pela horizontalidade, boa iluminação natural e aberturas amplas que
permitiam a integração entre interior e exterior. É importante evidenciarmos também a
influência wrightiana da casa japonesa, com sua leveza, espacialidade fluida incentivada pela
forma específica de dividir o espaço, e a utilização de modulação e forte relação com a
paisagem. (IRIGOYEN, 2008). Já na Flórida, a Escola de Sarasota destacou-se com o trabalho
mais intensificado dos arquitetos Paul Rudolph e seu sócio Ralph Twitchell.
Ocorreram influências da arquitetura e da cultura norte-americanas na arquitetura
moderna residencial paulistana entre as décadas de 1940 e 1960. Sua forte característica era
um traçado orgânico que possibilitava uma relação com o todo através da integração do
projeto de interiores, do espaço arquitetônico e do seu entorno. Os projetos eram
22
desenvolvidos em grande parte por espaços fluidos marcados por uma horizontalidade
(IRIGOYEN, 2008).
Podemos também citar uma forte relação das residências de São Paulo com obras
produzidas nos Estados Unidos, como a Casa da Cascata (Fallingwater House, Bear Run,
Pensylvania, 1935-1939). Exemplo emblemático em relação à utilização da topografia
original do terreno, seus interiores dispõem de móveis baixos integrados à arquitetura com o
objetivo de não obstruir os visuais, fato que contribui com a fluidez da planta. Veremos mais
adiante, na apresentação dos estudos de caso deste trabalho, que nos projetos de interiores,
bem como nos móveis desenvolvidos pela loja de móveis Branco & Preto, havia uma forte
relação com os projetos e na concepção dos espaços criados por Frank Lloyd Wright
A influência do cinema americano em nosso país é tão preponderante que até os dias
de hoje temos a imagem do “natal com neve” em um país tropical. Tínhamos intercâmbios
culturais entre norte-americanos e brasileiros. Um exemplo é o contato do arquiteto Sérgio
Rodrigues com o designer americano Jorge Nelson. Conforme relata Sérgio em seu
depoimento ao autor:
Foi interessantíssimo o contato com ele, que veio convidado para uma palestra no
Museu de Arte Moderna. Eu conhecia esse pessoal, que era da Herman Miller (...)
Fizemos amizade. Eu escrevia para ele e ele me escrevia em datas importantes,
como no Natal. Ele foi na Oca, sentou e gostou muito da poltrona Mole. Isso foi em
1958/1959.
A influência norte-americana na cultura brasileira passou a ser mais intensa por volta
das décadas de 1940 e 50. A referência de modo de vida para a população brasileira era o
American way of life – o estilo de vida americano, difundido através do cinema
hollywoodiano, do rádio, da televisão e das campanhas publicitárias, principalmente após a
Segunda Guerra Mundial.
Os ideários disseminados no cinema, rádio e televisão que permeiam em nossa
sociedade até hoje com as peculiaridades da sua arquitetura, que se torna notável na obra de
nomes como Richard Neutra e Frank Lloyd Wright. Podemos observar influências da cultura
e da arquitetura norte-americana disseminadas através de intercâmbios entre profissionais na
cidade de São Paulo, como os arquitetos Oswaldo Bratke e Carlos Millan (IRIGOYEN,
2008).
Pode-se observar nos projetos de alguns arquitetos da década de cinquenta – em
especial, os com atuação predominante na cidade de São Paulo – o desenvolvimento de obras
com características emprestadas da arquitetura norte-americana que permearam a arquitetura
23
residencial da época, estimuladas pela divulgação através de revistas internacionais como
Architectural Record, Pencil Points e Arts and Architecture. As iniciativas de tais publicações
possibilitavam uma difusão maior do ideário americano, além do que havia disponível nas
revistas nacionais como a Pilotis e a Acrópole. A cultura norte-americana também se difundiu
extensamente através da televisão e do cinema hollywoodiano. Outro fator relevante para esse
fenômeno foi o intercâmbio entre os arquitetos brasileiros e norte-americanos. Como
exemplo, pode-se citar as viagens internacionais de Miguel Forte e Jacob Ruchti, em 1947, e a
de Arthur Oswaldo Bratke, em 1948, e a vinda de arquitetos estrangeiros estimulados pela
crise na Europa após a Segunda Guerra Mundial e pela boa oferta de trabalho oferecida pelo
mercado americano. Isso trouxe ao Brasil diversas personalidades importantes, como Richard
Neutra, em 1945, enquanto visitava diversos países da América Latina, e Walter Gropius, em
1953, para participar da segunda Bienal de São Paulo.
O designer Paul McCobb (1917-1969) teve seu trabalho fortemente divulgado em
revistas de 1950. Podemos observar semelhanças entre a obra desse designer e a produção da
loja Branco & Preto, através das inclinações, das poltronas cujos pés normalmente têm na sua
base uma bitola mais fina e dos acabamentos com o uso recorrente de madeiras, lacas e
transparências nas estantes.
Figura 5‒ Poltrona e buffet do designer Paul McCobb
Fonte: GUIDE, 2000, capa.
A influência da arquitetura norte-americana na produção residencial brasileira é
evidenciada nos estudos de caso que serão apresentados a seguir. Projetos que levavam em
24
grande consideração entre outras questões o conforto ambiental, a relação da casca
arquitetônica com os espaços interiores, planta fluida além da integração com as áreas
externas e móveis projetados, a fim de não se bloquear as visuais criadas pelos panos de
vidro.
2.2 O PROJETO DE INTERIORES E A PRODUÇÃO DO MÓVEL MODERNO NO
BRASIL
Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808 e a consequente
abertura dos portos, começou-se a se importar móveis da Europa para elaboração dos projetos
de interiores. Em 1890 foi inaugurada a Companhia de Móveis Curvados, que fabricava
réplicas das cadeiras austríacas Thonet, muito utilizadas nos projetos de Le Corbusier, não só
pelo seu desenho, mas também pela sua solução formal (SANTOS, 1995).
Os integrantes da loja Branco & Preto são arquitetos por formação e atuantes no
campo da arquitetura, em especial no desenvolvimento da arquitetura moderna, mas também
permearam pelo design de mobiliário. Assim como já era usual na obra de nomes como Frank
Lloyd Wright, muitos arquitetos começaram a se dedicar ao desenvolvimento de projetos de
mobiliário, em um primeiro momento, para compor seus projetos e que acabaram, de forma
natural, se tornando uma continuação de suas obras de arquitetura.
Ao longo do último século tivemos no Brasil nomes pioneiros no processo de criação
desse mobiliário. Personalidades como Joaquim Tenreiro, Sérgio Rodrigues, Michel Arnoult,
Lina Bo Bardi, Zanine Caldas e Geraldo de Barros, entre outros, juntamente com a Branco &
Preto, contribuíram com o processo evolutivo do mobiliário produzido no Brasil. Muitos já
foram alvos de pesquisas e publicações porém no presente trabalho, apesar de objetivar
estudar de forma mais aprofundada os móveis e a composição dos espaços de interiores
elaborados pelos membros da loja Branco & Preto, não podemos deixar de destacar essas
personalidades, para entendermos o contexto geral da produção de mobiliário moderno no
Brasil. Evidencia-se ainda que, apesar de na grande maioria dos projetos utilizarem materiais
recorrentes como a madeira e a palhinha, eles transpassavam também conceitos formais, já
presentes em suas obras de arquitetura, para o móvel.
Sendo assim, é importante destacarmos essas características e esses profissionais que
permearam no desenvolvimento de projetos de mobiliário, temos um grupo que tamanha
qualidade projetual de seus móveis projetados em um primeiro momento para projetos
específicos com o tempo muitos foram produzidos em escala comercial e um segundo grupo
25
que já desenvolveram os projetos dos moveis com o intuito de ser produzido em escala
comercial. Esses profissionais se dedicaram com maior ênfase ao design de mobiliário,
contribuindo com o desenvolvimento de técnicas e questões formais da produção de móvel no
Brasil. Os arquitetos que estiveram à frente da loja Branco & Preto alcançaram o equilíbrio,
pois eram atuantes de forma incisiva no campo do design e contavam também com uma
produção arquitetônica considerável.
Podemos evidenciar diversos arquitetos que permearam na área do design de
mobiliário. Começamos destacando o trabalho do ucraniano Gregori Warchavchik: entre suas
obras tivemos a construção em 1927 da Casa Modernista na Rua Santa Cruz, considerada a
primeira obra moderna construída em São Paulo (SEGAWA, 1999). Warchavchik trabalhou
também no desenvolvimento de peças de mobiliário, conforme podemos verificar a te, nas
fotos do carrinho de chá, do revisteiro e de uma mesinha-revisteiro.
Figura 6 – Móveis desenhados por Gregori Warchavchik
Fonte: Etel Interiores.
O arquiteto Oswaldo Arthur Bratke, cuja obra arquitetônica residencial é abordada
com mais detalhes no decorrer deste trabalho, também transitou pelo campo do desenho de
mobiliário e acabamentos para a construção civil, como maçanetas e esquadrias. Na década de
1940 fez uma sequência de estudos com compensado recortado, como o da cadeira de 1948
apresentada na sequência.
Figura 7‒ Cadeira Bratke (1948) – Oswaldo Arthur Bratke
Fonte: Etel Interiores.
26
Outra figura importante da arquitetura brasileira é João Vilanova Artigas. Nascido na
cidade de Curitiba em 1915 e formado engenheiro-arquiteto pela Politécnica da Universidade
de São Paulo, ele estagiou no escritório do arquiteto Bratke na época em que este ainda
trabalhava com Botti. Em 1937 constituiu uma empresa de construção em parceria com Duílio
Marone. Em 1944 decidiu abrir seu escritório próprio e participou do processo para a criação
do IAB-SP. A seguir temos a foto da cadeira Preguiça desenhada por Artigas:
Figura 8 ‒ Cadeira Preguiça (1945) – Vilanova Artigas
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Quem também incursionou na área do design foi o arquiteto Paulo Mendes da Rocha
(1928), nome importante da arquitetura brasileira e reconhecido internacionalmente, sendo
um egresso da Faculdade de Arquitetura Mackenzie, como muitos nomes destacados ao longo
do trabalho. Entre seus projetos temos em destaque a loja Forma (1987), o Museu Brasileiro
da Escultura – MUBE (1988) e o projeto da reforma da Pinacoteca do Estado (1998). Em
2006 ganhou o prêmio Pritzker, o mais importante da arquitetura mundial, a cadeira
Paulistano faz parte do acervo do Museum of Modern Art (MoMa) de Nova York.
Figura 9 ‒ Cadeira Paulistano (1957) - Paulo Mendes da Rocha
Fonte: Revista Acrópole, n. 219, p. 162, jan. 1957.
27
Já o arquiteto Oscar Niemeyer, que nasceu no Rio de Janeiro em 1907 e faleceu
recentemente, no dia 5 de dezembro de 2012, faltando apenas 10 dias para completar 105
anos, lançou em 1971 na França, em parceria com a filha Anna Maria Niemeyer, a “Linha
Onda” de móveis que, através das suas linhas sinuosas, representam a continuidade da sua
arquitetura.
Figura 10 ‒ Cadeira de balanço Oscar Niemeyer (1977)
Fonte: Dpot.
Podemos
ressaltar
ainda
alguns
representantes
da
geração
de
arquitetos
contemporâneos que, assim como os nomes citados anteriormente, juntamente com o grupo
da loja Branco & Preto, continuam contribuindo para o desenvolvimento do mobiliário
brasileiro, figurando entre eles Arthur de Matos Casas, Isay Weinfeld, Marcelo Rosenbaum,
entre outros.
Os arquitetos e designers cuja obra se mencionou anteriormente compareceram para
evidenciar uma geração de profissionais que, embora tenha sido responsável por peças
relevantes e emblemáticas no cenário da produção de móvel no Brasil, não deixaram de se
dedicar com maior intensidade a projetos arquitetônicos. No entanto, há que se mencionar um
segundo grupo que, apesar de terem a formação em arquitetura, juntamente com alguns
autodidatas se dedicaram com maior intensidade ao design de mobiliário, produzindo-o no
mesmo período de formação e atividade da loja Branco & Preto.
O apreço pelo design de mobiliário e a necessidade eminentemente mercadológica de
se produzir móveis condizentes com a nova arquitetura e a industrialização incentivaram a
especialização de arquitetos, designers e artistas na produção de mobiliário. Alguns
profissionais, a fim de suprir as carências e caminhos singulares de sua trajetória profissional
em muitos casos se dedicaram com maior intensidade ao desenho de mobiliário.
Consequentemente, é possível enunciar transformações na concepção dos projetos dos móveis
acompanhadas do desenvolvimento industrial, bem como do surgimento de lojas que vendiam
móveis condizentes com os ideários modernos. Tudo isso possibilitou a concepção de projetos
cujos interiores apresentavam um misto de peças ainda produzidas com uma linguagem
clássica com excesso ornamentação, móveis importados com desenhos elaborados dentro dos
28
ideários da escola Bauhaus, mobiliário de personalidades que estão sendo destacados neste
trabalho que empregavam a utilização da madeira tipicamente brasileira, a palhinha vinda
principalmente da índia, mas com grande influência das técnicas construtivas portuguesas e
que permanecem nos dias atuais, porém cada um com suas peculiaridades, reflexos de suas
experiências profissionais e de seus conceitos, principalmente relacionados à forma de
trabalhar com a matéria-prima que fica explícita no produto final. Para compor os projetos de
interiores ainda se podia contar com peças desenhadas com exclusividade pelos autores dos
projetos arquitetônicos.
Os projetos de espaços de interiores, além suprir as necessidades funcionais, implicam
também na inserção de valores culturais, eis que hoje vivemos uma preocupação para se
considerar nos projetos as questões ambientais e sociais. Dessa forma, apesar do emprego de
materiais muitas vezes recorrentes, percebe-se a singularidade do desenho com características
próprias de cada arquiteto, designer ou grupo. Isso não se deu de forma linear ou acadêmica,
até porque não existiam muitas instituições onde se pudessem aprender as técnicas e os
processos produtivos de móveis. Um bom exemplo desse pioneirismo é o Liceu de Artes e
Ofícios de São Paulo, uma instituição de referência na qualificação de profissionais para a
indústria.
A partir do exposto, a pesquisa em questão se posiciona frente à relevância do design
de móveis e o seu papel na concepção de espaço de interiores condizente com a arquitetura
que estava sendo proposta, sendo possível mencionar inúmeros profissionais que no período
abordado realizaram projetos que contribuíram expressivamente para essa afirmação. A
atuação dos profissionais, os projetos por eles realizados e os próprios ao grupo de arquitetos
designers da loja paulistana Branco & Preto seguem contribuindo para estimular a
compreensão crítica da importância da articulação entre a produção do espaço arquitetônico e
de interiores.
As personalidades destacadas anteriormente permearam na área do design e
contribuíram com os projetos de interiores, porém se dedicaram com maior ênfase aos
projetos de arquitetura da edificação propriamente dita. Já os nomes que serão abordados a
seguir possuem grande atuação nos projetos de mobiliário e assim contribuem com maior
ênfase para a concepção de espaços de interiores dentro dos ideários modernos.
Quando falamos de mobiliário brasileiro não podemos deixar de destacar o trabalho do
português Joaquim Tenreiro (1906-1992), um dos precursores do desenho de móveis com
uma linguagem moderna. A marcenaria, profissão herdada de seu pai e de seu avô,
acompanhou-o por toda a vida, em conjunto com outras atividades paralelas, como a pintura.
29
A versatilidade desse designer contribuiu para o seu vasto conhecimento em relação aos tipos
de madeira existentes, tais como a imbuia, o roxinho, o jacarandá, o pau-marfim e o vinhático,
os quais comparecem em todos os seus trabalhos. Além disso, destaca-se o seu uso de tecidos
rústicos e fibras naturais que, segundo Tenreiro, são materiais que representam a matériaprima nacional e que também contribuíram para promover a adequação do mobiliário por ele
criado ao clima tropical. Tenreiro é reconhecido por nortear sua produção a partir dos
princípios modernos, ao acreditar que um móvel deveria romper com o supérfluo e se destacar
pela pureza e limpeza, estéticas especializadas na produção de móveis modernos de qualidade
(MACEDO, 1985). Ele chegou a ter uma loja no Conjunto Nacional em São Paulo,
praticamente vizinha da segunda loja da Branco & Preto que ficava na Rua Augusta,
conforme relata o arquiteto Romeu Castro de Souza em depoimento anexo a este trabalho.
Tenreiro, assim como a Branco & Preto, explorava ao máximo o material a ser empregado no
móvel.
Já a arquiteta Lina Bo Bardi, figura importante na produção arquitetônica conforme já
destacado, também contribuiu com a produção de mobiliário. Ela nasceu na cidade de Roma
(Itália) em 1914 e se formou em 1939 pela Faculdade de Arquitetura de Roma. Chegou ao
Brasil em 1946 e aqui desenvolveu projetos arquitetônicos emblemáticos como já destacado.
Ao elaborar o projeto para o auditório do Museu de Arte de São Paulo, ainda situado
na Rua Sete de Abril, Lina enfrentou grande dificuldade em encontrar um mobiliário
condizente com a proposta, o que fez com que ela desenhasse uma cadeira dobrável e
empilhável. “Nós viramos São Paulo inteira e não achamos ninguém que tivesse uma cadeira
moderna. Fomos obrigados a desenhá-las” (FERRAZ, 1997, p. 50).
Lina, seu marido Pietro Bardi e Giancarlo Palanti criaram o Studio d’Arte Palma
(1948) que funcionou durante dois anos, porém não teve muito sucesso, pois, apesar do
desenho adequado à nova arquitetura, o principal material usado nos móveis era o
compensado, diferente do tipo de madeira utilizada até então. Ainda existia uma grande
clientela que dava preferência para os móveis de desenhos rebuscados e para a tradição dos
móveis maciços, grande parte deles em madeira jacarandá. Outro fator relevante que levou ao
fechamento da loja foi à falta de mão de obra qualificada. Dessa forma, a produção de móveis
com a qualidade e o acabamento comprometido com a arquitetura de interiores ficou restrita
ao antiquário e à arte. O arquiteto Sérgio Rodrigues relatou: “(...) ela foi a única designer
estrangeira que vestiu a camisa brasileira porque tudo o que ela projetou poderia ser
chamado de mobiliário brasileiro” (Anexo 4).
30
Com Palanti, Lina fundou também a Pau-Brasil, em busca de desenvolver um móvel
de maior qualidade. A empresa foi depois transferida para os irmãos Hauner em 1951, que
mudaram seu nome para Móveis Patente.
Figura 11 – Cadeira Girafa (1987); cadeira Frei Egídio (1987)
Fonte: Marcenaria Barauna.
O nome do baiano Zanine Caldas não pode deixar de ser lembrado quando o assunto é
projeto de mobiliário. Apesar de não possuir o título de arquiteto, ele foi pioneiro na
construção de casas em madeira, tendo também atuado como maquetista. Caldas concebeu um
design em que o aporte de materialidade de seus projetos propiciou que o custo do mobiliário
fosse mais acessível, sobrepondo peças e lâminas de compensado. Como exemplo deve-se
ressaltar a escassez de encaixes em grande parte das peças e a sobreposição estilizada do
material laminado, formando explicitamente as letras “S” ou “Z”. Essa tecnologia e prática
foram responsáveis pela diminuição do custo de produção dos móveis, com isso aumentando
a possibilidade de atingir um numero maior de pessoas.
31
Figura 12 – Ambientes com peças da Loja de Móveis Z
Fonte: Revista Acrópole, n. 183, p. 132-133, jan. 1954.
Geraldo de Barros (1923-1998) é uma figura que também merece ser mencionada
quando falamos da produção de mobiliário no Brasil. Nascido no interior de São Paulo,
iniciou-se na arte depois de matricular-se no curso de pintura em 1945 e, posteriormente,
ingressou na fotografia, passando a frequentar o Foto Cine Clube Bandeirantes. Seu interesse
pela forma e função de um objeto, bem como a sua base intelectual surgiram por intermédio
do crítico de arte Mário Pedrosa e seus estudos da Gestalt Theorie (teoria da forma). Tal
teoria corresponde à tentativa de atribuir a um objeto a pureza da forma em harmonia com o
ambiente que o cerca, visto que cada objeto é capaz de produzir um determinado estímulo, o
qual é captado e interpretado pelo cérebro positiva ou negativamente. O estímulo é variável, o
que nos leva a crer que um objeto com uma forma simétrica e aparentemente “agradável aos
olhos” certamente possibilitará estímulos positivos ao cérebro. Geraldo de Barros pregava
piamente que o investimento tecnológico deveria ser baixo para o desenvolvimento de um
produto; assim tornava-o passível de ser produzido com um custo acessível ao maior número
de pessoas. Dessa forma, foi dele a iniciativa da produção de mobiliário em série por meio da
fábrica de móveis Unilabor (CLARO, 2004), que manteve suas atividades em São Paulo entre
1954 e 1967. Nesse período, o bairro do Ipiranga, local onde a fábrica foi instalada,
caracterizava-se como um bairro operário e, por isso, se adequava ao conceito do que seria a
Comunidade de Trabalho Unilabor. Posteriormente firmou parceria com o marceneiro
Antonio Bioni e, juntos, abriram a fábrica Hobjeto, que posteriormente teria lojas no Brasil
32
inteiro e se tornaria referência no processo de industrialização do móvel brasileiro. Antonio
Bioni, sócio de Geraldo na Hobjeto, relata: “O Geraldo pegava o lápis, desenhava o móvel de
baixo para cima, os rabiscos diziam tudo, ele tinha uma facilidade monstro”(Anexo 3).
Figura 13 ‒ Cadeira GB01(1954) – Designer Geraldo de Barros
Fonte: Dpot.
O arquiteto carioca Sérgio Rodrigues, nascido em 1927, é uma figura com grande
produção projetual de mobiliário. Ele traduz toda a complexidade escondida na criação de um
simples croqui por meio da escolha do tipo de madeira, tonalidade e a combinação com outras
matérias-primas, as quais dão continuidade a essa complexidade.
Sérgio Rodrigues optou por seguir, em meados dos anos de 1950, a linha de mobiliário
com características já idealizadas por Joaquim Tenreiro a qual, assim como os móveis da loja
Branco & Preto, possui características artesanais, apesar de que, naquela época, o Brasil já
estava desenvolvendo uma arquitetura com bases modernas intimamente ligadas a
personalidades como Lina Bardi, Oswaldo Bratke e Lúcio Costa, entre outros. Logo, o
mobiliário continuava mantendo aspectos relacionados ao passado, com elementos que ainda
faziam alusão aos móveis ditos clássicos. Na década de 1960 a sua loja, a Oca, chegou a ter
uma unidade próxima à Branco & Preto da Rua Augusta. Como poucos, ele conseguiu aludir
em suas peças a raízes culturais e, mesmo assim, transformá-las com linhas modernas. Seu
trabalhou ficou marcado pela versatilidade, pois desenvolveu projetos desde estantes, mesas,
cômodas e casas de madeira, até luminárias. Mas o reconhecimento e o destaque vieram pela
notoriedade de suas cadeiras e poltronas.
33
Figura 14 ‒ Ambientações Sérgio Rodrigues na década de 50
Fonte: Revista Acrópole, n. 74, dez. 1955.
O arquiteto polonês Jorge Zalszupin, nascido em 1922, veio para o Brasil em 1949 e
dez anos depois abriu a loja L’Atelier no Conjunto Nacional em São Paulo, onde já estava
estabelecida a loja de Joaquim Tenreiro. Nessa loja ele vendia peças de sua autoria e móveis
licenciados pela italiana Kartel. No final da década de 1980 passou a se dedicar com maior
intensidade à arquitetura e às artes plásticas. O arquiteto Romeu Castro de Souza fala sobre a
relação de Zalszupin com os membros da loja Branco & Preto: “Jorge Zalszupin, arquiteto
(...) ficaram amigos, iam pesquisar, trocar ideias; havia um relacionamento dos outros
projetistas da loja Ambiente com o Jorge Zalszupin do L’Atelier” (Anexo 2).
Figura 15 ‒ Poltrona Verônica – designer Jorge Zalszupin
Fonte: Etel Interiores.
Outro nome estrangeiro que contribuiu com o processo evolutivo da produção de
móveis e com a composição dos espaços de interiores é o do francês Michel Arnoult. Nascido
em 1922, ele chegou ao Brasil com 26 anos. Em 1951 formou-se arquiteto pela Faculdade
Nacional de Arquitetura do Rio de Janeiro. Trabalhou com Marcel Gascoin, nome forte na
produção seriada e foi estagiário do arquiteto Oscar Niemeyer. Juntamente com Norman
Westwater e Abel de Barros abriu em 1954 a Mobília Contemporânea, com a proposta de
fazer móveis que podiam ser produzidos em série e que, com um desenho simples,
34
conseguiriam atingir todas as faixas econômicas. Em 1970 começou a vender móveis em
supermercados com o conceito “peg-lev”. Ganhou o prêmio Roberto Simonsen com a
poltrona Ouro Preto, por questões mercadológicas, fechou as portas da sua fábrica. Faleceu
em 2005. O arquiteto Romeu Castro de Souza relata que:
Em uma ocasião, entra um cidadão chamado Michel Arnoult na loja da Vieira de
Carvalho, perto da praça da República. Ele falou: – Vou ser concorrente de vocês,
nesta avenida, vindo para o largo do Arouche, no fim da Vieira de Carvalho, em
frente à loja de tapetes. Estamos alugando esse local para fabricar móveis e vai se
chamar Mobília Contemporânea. Vamos produzir móveis com uma característica:
serão vendidos em supermercados (Anexo 2).
Observamos assim que os nomes já citados anteriormente, juntamente com o grupo da
Branco & Preto contribuíram de forma expressiva com o desenvolvimento do móvel no
Brasil e com a articulação do projeto arquitetônico com seus interiores.
Na atualidade, presenciam-se ações de profissionais que continuam pensando a
arquitetura e seus espaços de interiores e, como consequência, o mobiliário a ser empregado
de forma que se possua uma mesma linguagem. Contudo, vivemos também o processo do
desenvolvimento de projetos pensados de forma isolada, ou seja, propostas destoantes de
arquitetura e de interiores para a mesma obra, pensadas por profissionais com ideários e
conceitos opostos. No mobiliário podemos observar neste trabalho a continuação do legado
do uso da madeira e da produção evidenciada nos anos 1950. São nomes que contribuíram
com o desenvolvimento da indústria e com o design, área em que podemos notar a atuação de
profissionais que intrinsecamente acabam transpassando a linguagem adotada no projeto
arquitetônico para o projeto do mobiliário.
A produção de mobiliário nas décadas de 1950 a 70 merece destaque, pois influenciou
uma geração que está dando continuidade à tradição de peças em madeira maciça, do uso da
palhinha e do compensado, que continuam compondo os espaços de interiores no Brasil e em
diversas partes do mundo. Vários são os nomes de profissionais que seguem a tradição da
utilização desses materiais e que fazem parte de uma segunda geração de designers. Podemos
citar entre eles os trabalhos da designer carioca Cláudia Moreira Salles, do arquiteto
mackenzista Maurício Azeredo e do arquiteto paulistano Carlos Motta. Porém, podemos
observar outras influências no móvel brasileiro, como o desenho industrial proposto pela
Bauhaus, com uma produção pensada com influências industriais, que pode ser exemplificada
com os trabalhos de Fernando Jaeger, Baba Vacaro e Guto Índio da Costa. Temos ainda uma
influência mais ligada às artes, aos aspectos culturais e artesanais, exercida por nomes como
os irmãos Fernando e Humberto Campana, Gerson de Oliveira e Luciana Martins, os quais
35
também possuem participação da indústria, e Domingos Tótora que, além das influências das
artes, tem seu trabalho vinculado ao artesanato. As personalidades acima destacadas,
juntamente com alguns outros nomes que, além de apresentarem produtos que cumprem suas
funções, possuem identidade própria empregada em seus itens, contribuem com o
desenvolvimento do mobiliário contemporâneo brasileiro e com a composição dos espaços de
interiores.
Perante esse cenário apresentado sobre o mobiliário produzido e comercializado no
Brasil, tomamos conhecimento de ações de grupos e designers que ao longo do processo de
difusão e prática da arquitetura moderna contribuíram para o desenvolvimento da indústria
moveleira, e com a composição dos espaços de interiores entre as décadas de 1950 e 1970.
3 LOJA BRANCO & PRETO
3.1 MEMBROS DA LOJA E A SUA FORMAÇÃO
Destaca-se em 1947 a fundação da primeira faculdade de Arquitetura de São Paulo, no
Mackenzie, por iniciativa do arquiteto Christiano Stockler das Neves (1889-1982), formado
em 1911 pela Graduate Schoolof Fine Arts, da Universidade da Pensilvânia (EUA), que
aplicava os métodos de ensino baseados no programa da Escola de Belas Artes de Paris.
Stockler das Neves, na condição de diretor e professor, exerceu papel ao mesmo tempo
centralizador e polêmico, por inibir a realização entre os alunos daquela faculdade de projetos
modernos, por sua vez, supriam muitas vezes o anseio pela modernidade, buscando o acesso a
revistas estrangeiras consideradas progressistas. O arquiteto, tendo sido o responsável pela
criação do curso de arquitetura da Escola de Engenharia Mackenzie em 1917, permaneceu à
frente da direção da escola até 1956. Nesses 40 anos esteve sempre difundindo os conceitos
clássicos e procurando desenvolver nos arquitetos ali formados esmerada competência para
representação do espaço e composição, afirmando o pendor acadêmico da escola, sem
conseguir inibir, no entanto, o avanço da arquitetura moderna intramuros mackenzistas
(PEREIRA, 2005). Professor rigoroso e competente foi também defensor de uma arquitetura
de moldes acadêmicos e estimulou a prática exaustiva do desenho no ambiente acadêmico
(PEREIRA, 2005), formando arquitetos hábeis nessa instrumentação e que, sobretudo, se
utilizaram dela para alcançar o patamar de propagadores da arquitetura moderna.
Apesar do esforço de Stockler para manter o ensino nos moldes da arquitetura clássica,
a repressão instigou os alunos a procurar novas informações acerca da arquitetura e das artes
36
modernas, o que acarretou o surgimento de diversos grupos que partilhavam ideários
modernos, conforme nos relata Miguel Forte:
Existia um grupo Jacob Ruchti, Galiano Ciampaglia, Igor Sresnewsky e outros
poucos – que, escondidos do Christiano, estudava por conta própria os movimentos
da arquitetura dessa época. Então nós ficávamos empolgados com Frank Lloyd
Wright, Le Corbusier, Mies Van der Rohe, Gropius, Richard Neutra e, quase que
escondidos dos nossos professores de projetos, ficávamos manuseando revistas e
livros com a publicação desses arquitetos. E contávamos um para o outro: “Você
viu? Olha, eu comprei um novo livro, você viu a residência do Frank Lloyd Wright
publicada? Você viu aquela obra do Mies Van der Rohe?” E assim por conta própria
éramos professores uns dos outros (FORTE, 2001, p. 15).
Esses arquitetos integram uma geração que vivenciou a transição da arquitetura
acadêmica à moderna, porém muitos se dedicaram ao estudo da arquitetura moderna
estimulados por publicações estrangeiras que aqui chegavam. O interesse e o
desenvolvimento de habilidades para a prática da projetação e construção modernas se viram
reforçados ainda pelo ambiente urbano em modernização que se formava nas principais
capitais brasileiras, o que contribuiu para a substancial modificação da paisagem e da vivência
do espaço urbano (ABASCAL; BRUNA; ALVIM, 2009) na década de 1950.
Uma educação fundamentada na crença da relevância da articulação entre arte e
arquitetura acadêmica contribuiu para que os arquitetos formados nesse ambiente
produzissem obras modernas com grande competência do ponto vista de nível de
detalhamento projetual, complementando-se o fato a partir da vivência no Mackenzie de um
ideário pragmático (PEREIRA, 2005). Este meio acadêmico, embora muitas vezes não
estimulasse a uma referência pluralista de fontes arquitetônicas, não comprometia
mentalidades frente a uma única vertente da arquitetura moderna, estimulando que se viesse
beber de variadas referências e fontes, uma vez que não se constrangia à obediência do dogma
funcionalista. Dentro desse espírito, de não haver qualquer compromisso exclusivo com o
racionalismo de Le Corbusier, por exemplo, Miguel Forte e Jacob Ruchti buscaram outras
fontes em contatos, estudos e viagens, tal como a que foi realizada aos Estados Unidos em
1947. Nessa ocasião, estreitaram laços com as arquiteturas de Richard Neutra, Philip Johnson,
John Gaw Meen, Rudolf Mock, William Wurster e Frank Lloyd Wright, arquitetos
representativos da prática de arquitetura moderna, tendo a grande maioria de suas obras
espaços com mobiliário compatível às concepções arquitetônicas (ARGAN, 1997).
Tudo isso possibilitou que esses arquitetos formados nesse meio híbrido pudessem se
tornar arquitetos modernos de grande competência projetual e prática (PEREIRA, 2005).
37
Depois de formados, alguns destes profissionais, até mesmo trabalhando próximos uns
dos outros, com escritórios à Rua Barão de Itapetininga (MATERA, 2005), reuniram-se em
1952 para criar a loja de móveis Branco & Preto, que funcionou até meados de 1970
contribuindo consideravelmente para a consolidação da utilização de um mobiliário com uma
linguagem condizente com arquitetura que estava sendo produzida, e, sobretudo para a
disseminação de conceitos e princípios modernos por meio de seus projetos de móveis.
Roberto Aflalo um dos sócios da loja obteve experiência em desenho de mobiliário na
loja Ambiente pioneira na fabricação e venda de móveis modernos. Jacob Ruchti era filho do
arquiteto suíço Frederico Ruchti, que se formou na Technische Universität de Berlin, mas
veio ao Brasil trabalhar para a família Klabin, em 1919. Vivendo no meio cultural de seu pai,
teve a oportunidade de conhecer importantes personalidades, como o arquiteto Vilanova
Artigas e outros artistas renomados, como Bonadei, Volpi e Di Cavalcante. Posteriormente,
Aflalo trabalhou no escritório do arquiteto Warchavchik e, em 1951, lecionou na escola de
design do Instituto de Arte Contemporânea do MASP.
I Chen Hwa diplomou-se na Pennsylvania State University, nos Estados Unidos, e
imigrou para o Brasil durante a revolução comunista. Trabalhou no escritório de Philip
Johnson5 e, em 1952, veio ao Brasil para trabalhar no escritório de Plínio Croce e Roberto
Aflalo, em São Paulo (ACAYABA, 1994, pag. 53). A seguir, o arquiteto Romeu Castro de
Souza relata sobre a facilidade de Chen com o desenho: “Ele é o mais perfeito que eu vi até
hoje, era um artista. Os arquitetos pediam para ele desenhar as perspectivas do exterior, os
jardins, ele fazia as folhagens, as árvores tinham a aparência da estação do ano, secas no
inverno” (Anexo 2).
Carlos Millan (1927-1964) era membro de uma família espanhola, caçula de três
irmãos. O mais velho, Roberto, era médico; Fernando era advogado de formação e
proprietário de galeria de arte; Carlos tocava piano. Fernando foi proprietário do antiquário
Ouro Preto na Rua Augusta, depois na Alameda Jaú, e da galeria Fernando Millan na
Alameda Gabriel Monteiro da Silva, que até hoje é endereço de galerias e lojas de design.
Estudaram no Colégio São Luís. Casou-se com Ana Tereza Del Nero, formada em Línguas.
Residiram na Rua Dona Veridiana, depois na região da Serra da Cantareira. Na sequência,
mudou-se para o condomínio do Banco Lar Brasileiro na Rua Ministro Godói em Perdizes,
em um prédio projetado por Salvador Candia, Plínio Croce e Roberto Aflalo. Teve seis filhos,
porém um menino faleceu nos primeiros meses. Millan fumava muito. Estagiou nos
5
Arquiteto norte-americano referência na arquitetura moderna e ganhador do prêmio Pritzker, o mais importante
da arquitetura mundial.
38
escritórios de Abelardo de Souza, Arthur Oswaldo Bratke e Rino Levi (MATERA, 2005, p.
50).
Millan foi membro da Câmara de Arquitetura do CREA, quando concorreu à
presidência em 1963 e acabou perdendo para Alberto Botti. Foi diretor do IAB entre 1959 e
1961 e tesoureiro na gestão de 1962 a 1963. Em 1957 passou a ser professor da Universidade
Mackenzie. É autor de projetos muito bem-elaborados, conforme podemos verificar na citação
sobre arquitetura produzida na década de 1960: “Uma produção que atingiu alta qualidade
arquitetônica, especialmente no programa de residências, cabe destacar o apuro das casas
concebidas por Carlos Millan entre 1960 e 1964” (BASTOS; ZEIN, 2010, p. 141).
Millan faleceu prematuramente em um acidente de automóvel em 5 de dezembro de
1964, quando voltava com a esposa Ana Tereza e três dos cinco filhos de uma fazenda em
Joaquim Egídio, no interior paulista. Ele perdeu o controle do carro e caiu no rio Atibaia entre
as cidades de Valinhos e Joaquim Egídio. A única sobrevivente foi à filha mais velha.
O arquiteto Plínio Croce (1921-1984) trabalhou um ano na Regis & Augustinis, entre
1946 e 1947, quando era recém-formado. Em 1948 ingressou na filial paulista do renomado
escritório do designer americano Raymond Lowey. Em 1949 abriu seu próprio escritório e em
1950 se filiou a Aflalo, que funcionou até 1962. Também lecionou na FAU–USP.
Roberto Aflalo (1926-1992) ingressou na universidade em 1946 e já no primeiro ano
estagiou no escritório do Plínio. Em 1950 formaram o escritório Plínio Croce & Roberto
Aflalo, que funcionou até 1962. Aflalo conforme já citado obteve sua experiência iniciando
com o desenho de mobiliário para a loja Ambiente, onde desenvolveu uma série de móveis.
Em 1962, ele e Plínio Croce se juntaram a Gian Carlo Gasperini e participaram do concurso
para a construção do Edifício da Peugeot, tendo essa parceria inicial evoluído para uma
sociedade.
Jacob Ruchti (1917-1974), conforme já destacado anteriormente, era filho do arquiteto
suíço Frederico Ruchti, que se formou na Technische Universitätde Berlin, mas veio ao Brasil
trabalhar para a família Klabin, em 1919. Convivendo no meio cultural de seu pai, teve a
oportunidade de conhecer importantes personalidades, como o arquiteto Vilanova Artigas e
outros artistas renomados, como Bonadei, Volpi e Di Cavalcante. Ele se formou arquiteto em
1940 e foi trabalhar com seu pai, que era voltado principalmente ao desenvolvimento de
projetos e construções de residências. Em 1947 Jacob viajou com Miguel para os Estados
Unidos durante seis meses onde manteve contato com a arquitetura que estava sendo
produzida naquele país. Foi docente de composição decorativa no Instituto de Arte
Contemporânea de São Paulo da FAU-USP (1954-1961). No campo da arquitetura
39
desenvolvia projetos principalmente residenciais engajados no organicismo proposto por
Frank Lloyd Wright.
Miguel Forte (1915-2002), assim como Ruchti, formou-se engenheiro arquiteto pelo
Mackenzie. Trabalhou no escritório do arquiteto Rino Levi de 1938 até 1942, ano em que
abriu com seu cunhado Galiano Ciampaglia a firma de Projetos e Construções Forte e
Ciampaglia. Fez parceria em 1946 com Jacob Ruchti para participar do concurso que visava à
construção do edifício sede do Instituto de Arquitetura do Brasil, e conquistaram o primeiro
lugar, em conjunto com a equipe de Rino Levi. Foi à paixão e a admiração de Miguel Forte
pela arquitetura de Frank Lloyd Wright que o estimulou, juntamente com Jacob Ruchti, a
fazer a viagem aos Estados Unidos. A partir de 1964 Miguel também passou a dar aulas de
projeto na Faculdade de Arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
3.2 A LOJA
A fim de produzir moveis dentro dos ideários propostos na arquitetura moderna, em
1952, o grupo de arquitetos formados pela Faculdade de Arquitetura Mackenzie: Miguel
Forte, Jacob Ruchti, Galiano Ciampaglia, Plínio Croce, Roberto Aflalo e Carlos Millan, mais
o chinês I Chen Hwa (que destoava dessa formação naquela escola), abriram a loja de móveis
e tecidos para decoração Branco & Preto. O grupo obteve grande participação no
desenvolvimento da arquitetura moderna em São Paulo e no Brasil e contribuíram com uma
significativa atuação no campo do design mobiliando espaços da arquitetura moderna,
inclusive aqueles por eles produzidos (MATERA, 2005).
Figura 16 – Logotipo Branco & Preto Jacob Ruchti (1952)
Fonte: ACAYABA, 1994, p. 62.
O arquiteto Roberto Aflalo, consultor da loja Ambiente, reunindo experiência como
designer, propôs aos colegas do Mackenzie que montassem um estabelecimento comercial
próprio, cuja ação deveria desenvolver a indicação de tecidos e concepção de móveis. Isso iria
permitir que profissionais versados em arquitetura moderna fossem contratados para
40
desenvolver projetos de arquitetura de interiores adequados a residências, incluindo
indicações de tecidos, tapetes e luminárias, o que consistia em São Paulo uma ideia original.
Inicialmente, a Branco & Preto se instalou na Avenida Vieira de Carvalho e chegou a ter, nos
anos de 1960, uma filial na Rua Augusta, que vendia tecidos para móveis que eram
produzidos na indústria do sogro de Miguel Forte. Segundo Acayaba e Ficher (1982), o
design do mobiliário da loja prescrevia como material-chave madeiras como jacarandá-dabahia, caviúna, cabreúva ou pau-marfim, associados ao mármore, vidro e ferro.
Segundo Roberto Aflalo (CAMARGO, [19--]), uma grande influência para a
concepção da loja e seus projetos foi a Bauhaus e o arquiteto Mies Van der Rohe. Isto porque
ainda se produzia um desenho que oscilava entre móvel tradicional e moderno para as
camadas sociais mais altas. Os móveis existentes eram criados para as mais altas camadas da
sociedade para que se encaixassem a arquitetura dessas residências. Não alcançaram a
produção em série, pois eram móveis ricos em detalhes oque encarecia a sua execução,
embora fossem móveis modernos.
A produção em escala comercial implicou jamais em perda de qualidade do
acabamento artesanal e do requinte em articular aquela produção ao projeto de arquitetura de
uma residência singular. A sociedade da Branco & Preto se desfez em 1970, principalmente
devido à dificuldade em encontrar mão de obra especializada para garantir a qualidade que se
tornou a marca da empresa e à grande demanda de trabalhos dos escritórios que os sócios
mantinham paralelamente à loja.
O mobiliário nacional acompanhou a marcha das diversas transformações ocorridas no
setor da produção industrial no país ao longo dos anos, principalmente na década de 1950,
com a industrialização e formação da metrópole (MORSE, 1970). De produtores de utensílios
manufaturados artesanalmente, passamos à produção industrial. A experiência da Branco &
Preto possibilitou a continuidade da qualidade projetual capaz de singularizar o espaço
produzido à escolha do mobiliário, agregando técnicas tradicionais de marcenaria e os
métodos e materiais brasileiros às possibilidade de reprodução em escala comercial das peças,
com o uso de materiais como a madeira e a palhinha, entre outros.
Cabe salientar que paralelamente a esse período se vislumbravam espaços ainda
ocupados por mobiliários clássicos e ornamentados. Os arquitetos que comungavam o mesmo
ideário moderno elaboravam projetos de móveis com características brasileiras que pudessem
articular-se à nova arquitetura.
A partir da perspectiva apresentada, torna-se evidente a impossibilidade de se separar
o projeto de arquitetura do projeto de seu interior. Essa constatação justifica a relevância de
41
um estudo aprofundado da loja de móveis Branco & Preto, responsável pelo projeto de
mobiliário de diversas casas e apartamentos nos anos de 1950 e 1970 contribuindo com a
renovação do mobiliário brasileiro. Monica Junqueira de Camargo ([19--]) relata que a loja
destacou-se por explorar a madeira e o desenho dos tecidos e por projetar móveis que
passaram a fazer parte indissociável das casas modernas produzidas em São Paulo. A seguir
podemos observar como ocorria o desenvolvimento dos projetos, no depoimento do arquiteto
Romeu Castro de Souza ao autor,
Quando um tinha uma ideia para fazer um móvel eles se reuniam, de preferência os
seis, para ver se valia a pena continuar. Detalhavam até o produto final ou, se não,
encostavam. Aquele móvel recebia o nome do criador, com as iniciais dos seus
nomes. Os móveis em geral eram esmiuçados, iam ao detalhe total, explorando as
características naturais da aparência, estruturas, durabilidade da madeira, dos
tecidos, enfim, de tudo o que iria intervir naquele móvel em questão, e dos móveis
em geral, porque essa era a intenção deles. Então eles exploravam ao máximo o
material a ser empregado(Anexo 2).
Para Santos (1995, p. 111), que elaborou vasta pesquisa sobre mobiliário moderno no
Brasil, a loja Branco & Preto “foi um marco na história do mobiliário paulista”. Abaixo
temos dois relatos importantes falando sobre os móveis da Branco & Preto. Primeiro, o
arquiteto Sérgio Rodrigues,
Os móveis da Branco & Preto eram extremamente artesanais mas muito bem feitos.
Ficava na Vieira de Carvalho onde tinha também a L’Atelier, que usava muito
metal, madeiras prensadas. Quando era possível não usar só os móveis da Forma
eu usava uma coisa ou outra deles. (Anexo 4)
Agora, Antonio Bioni,
A Branco & Preto era sofisticação, era para atender cliente exclusivo, não era
móvel de produção em série. O móvel muito bem feito, o desenho finíssimo, a
qualidade era ótima. Marcenaria de alta qualidade com um desenho também muito
bom. (Anexo 3)
O alto custo de produção aliado ao sucesso dos escritórios pessoais dos sócios foram
fatores determinantes para o fechamento da loja, conforme relata Romeu Castro de Souza:
“Não foi uma quebra, fecharam naturalmente porque prevaleceram os escritórios de
arquitetura” (Anexo 2).
A sociedade formada pelo grupo de colegas se viu fragilizada com o passar dos anos,
devido aos inconvenientes de, paulatinamente. A sociedade de seis pessoas durou pouco:
Chen e Plínio saíram logo e depois de algum tempo, Jacob. Assim a loja passou a pertencer
42
apenas a Miguel Forte, Roberto Aflalo e Carlos Millan. O falecimento precoce de Carlos
Millan, aos quarenta e oito anos, também desfalcou a sociedade.
A seguir faremos a apresentação da reconstituição da loja localizada na rua Vieira de
Carvalho (1953). Optou-se em desenvolver os redesenhos dos layouts e dos cortes da loja
juntamente com a maquete volumétrica da arquitetura, que recebeu os móveis existentes no
catálogo e expostos nos anexos deste trabalho, provavelmente por uma questão
mercadológica, em que a mudança do layout da loja ocorria de acordo com a rotatividade de
venda das peças e campanhas ou promoções. Porém a reconstituição será apresentada
retratando o layout da loja no período da sua inauguração.
43
Figura 17 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: planta 1º pavimento
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
44
Figura 18 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: planta mezanino
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
45
Figura 19 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: cortes AA e BB
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
46
Figura 20 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: perspectiva
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
47
Estante expositora
Figura 21 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: desenho estante expositora
Fonte: Redesenho elaborado pelo próprio autor.
Figura 22 – Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: maquete – estante expositora
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
48
Figura 23 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista externa.
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
49
Figura 24 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista superior.
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
50
Figura 25 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista frontal, primeiro e segundo pavimento.
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
Figura 26 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 1, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
51
Figura 27 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 2, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
Figura 28 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 3, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
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Figura 29 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: Vista 4, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
Figura 30 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 5, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
53
Figura 31 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 6, primeiro pavimento
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
Figura 32 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 1, mezanino
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
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Figura 33 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 2, mezanino
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
Figura 34 – Maquete Loja Branco & Preto, Vieira de Carvalho: vista 3, mezanino
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 177, p. 330-331, ago. 1953.
55
4 O MOBILIÁRIO DA BRANCO & PRETO SUAS CARACTERÍSTICAS E A
UTILIZAÇÃO
Os móveis da loja Branco & Preto foram pensados dentro das técnicas e processos da
marcenaria tradicional para itens como sofá, poltrona, cadeira, mesa, buffet, escrivaninha, etc.
Eram também desenvolvidas peças especiais, como estantes e móveis de apoio, com o
emprego das características peculiares da loja relativas ao tipo de madeira, aos sistemas
construtivos e aos tecidos. Tais peças eram nomeadas de acordo com as iniciais dos seus
criadores. Os móveis em geral eram esmiuçados ao detalhe total, explorando as características
naturais da aparência, estrutura e durabilidade do material. Em geral, a madeira era utilizada
junto com outros materiais como palhinha, ferro, laminados, mármores e tecidos criados pelo
grupo, que eram acrescentados com a aplicação de técnicas artesanais da marcenaria
tradicional. Enfim, tudo o que iria intervir no móvel em questão era pensado. Podemos
observar nos móveis da loja que os elementos construtivos, além de suprir as questões
estruturais, se tornavam elementos de valorização das peças.
56
Figura 35 ‒ Maquetes móveis Loja Branco & Preto
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
57
4.1 AS CARACTERÍSTICAS E OS MATERIAIS UTILIZADOS NOS MÓVEIS
Entre os arquitetos da loja, Plínio Croce, Roberto Aflalo e Carlos Millan possuíam
maior afinidade com a arquitetura de Richard Neutra, Marcel Breuer e Mies van der Rohe; já
Jacob Ruchti e Miguel Forte estavam vinculados à arquitetura de Frank Lloyd e à do designer
Paul McCobb (1917-1969), que em 1950 teve seu trabalho fortemente divulgado em revistas.
Figura 36‒ Maquetes mesas Loja Branco& Preto
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
Os móveis eram fabricados pelos Irmãos Pássaro, descendentes de italianos, os quais
faziam mais a parte reta e os folheados. Tampo de mesa, estrutura de sofá e outros itens
torneados eram repassados, na maioria das vezes, para os Irmãos Malmeister, descendentes de
alemães (ACAYABA, 1994). Por coincidência, eram três irmãos tanto em uma quanto na
outra fábrica. Os arquitetos da loja faziam questão de ir às oficinas para acompanhar os
processos de fabricação dos protótipos.
A seguir, temos algumas ferramentas utilizadas na fabricação dos móveis da loja
Branco & Preto e dos móveis que utilizavam as técnicas de marcenaria tradicional.
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Figura 37 ‒ Ferramentas utilizadas na marcenaria tradicional
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Legendas: 1 – Martelo; 2 ‒ Esquadro de madeira; 3 – Serrote; 4 – Formão; 5 – Arco de Pua; 6 – Plaina;7 ‒
Furadeira manual; 8 – Esfregador de folha; 9‒ Compasso;10 – Gramin; 11 –Suta.
59
O projeto do mobiliário da loja Branco & Preto tem peculiaridades, uma delas é que,
quando utilizavam o ferro, na maioria das vezes era tubular. Normalmente, as mesas tinham
um requadro com 3 cm, sempre meia-esquadria, nada de perpendicular.
Figura 38 – Maquete sistema de encaixe ½ esquadria
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
60
Eles não trabalhavam com laminado melaminico no topo dos móveis porque na junção
da superfície com a espessura aparecia a linha preta de 0,8mm do laminado, então usavam o
requadro que possibilitava um melhor acabamento. Quando o tampo era de compensado,
usavam o folheado. O bom desenho, com elementos como o requadro a 45º adotado para dar
melhor acabamento às mesas, se tornou a marca dos móveis produzidos pelo grupo. Eles
eram, porém, móveis extremamente artesanais, o que os transformava em um produto com
custo extremamente elevado.
Geralmente os estofados eram produzidos com mola em almofadas com crina animal
ou plumas no enchimento. Aí vinham com os tecidos. Surgiu a No-Sag, porém os arquitetos
continuavam fiéis à mola horizontal, não queriam a mola helicoidal. Não saíam da filosofia
inicial, mantinham os princípios técnicos de alinhamento ao produto.
Recorrente no mobiliário produzido no Brasil, em especial entre as décadas de 1950 e
1970, também esteve presente nos móveis da loja a utilização da palhinha, herdada de nossos
colonizadores e que havia sido introduzida em Portugal entre os séculos XVII e XVIII. No
país, esse material era importado da Índia e da Áustria. Podemos evidenciar como sua grande
vantagem a ventilação possibilitada pelas frestas entre as tramas, além do fácil manuseio e da
disponibilidade de acesso ao material. Porém devemos também destacar os estofamentos
utilizando a crina ou a pluma e os tecidos fabricados no Lanifício Fileppo, que pertencia à
família da esposa de Miguel Forte. Lá se produziam tecidos exclusivos para a loja, que ficou
conhecida pela gama de cores, pela qualidade e pelos desenhos das estampas produzidos pelos
arquitetos.
Ainda hoje, a grande maioria dos projetos de mobiliário no Brasil prevê a utilização de
madeira, material bastante característico, entre nós, para a produção de móveis, devido
principalmente à abundância e à diversidade de espécies existentes em nosso país. Sendo
assim, a loja também adotou a madeira como material predominante em seus móveis.
Percebe-se que as madeiras dos móveis da Branco & Preto foram escolhidas com base no
conhecimento técnico dos arquitetos, pois fica evidente o conhecimento sobre questões como
variações de densidade, resistência, porosidade, colorações e peso. A tradição do uso da
madeira no móvel moderno brasileiro já tinha sido iniciada por Tenreiro e foi depois
disseminada por nomes já mencionados nesse trabalho como Sérgio Rodrigues e, claro, pelo
grupo da Branco & Preto, que contribuiu com o aprimoramento das diferentes técnicas dos
acabamentos e das junções. A seguir, podemos observar as madeiras utilizadas nos móveis
fabricados pela Branco & Preto em estado natural e com aplicação de selador.
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Figura 39 ‒ Jacarandá-da-Bahia, sendo: 1-2– Jacarandá em estado natural; 3-4 –Jacarandá
com aplicação de selador
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Nome científico: Dalbergia nigra (vell.) Allemao ex Benth
Como é conhecida: Jacarandá-da-Bahia, jacarandá-preto, caviúna, cabiúna-rajada, cabiúnado-mato, graúna, caviúno, jacarandá, jacarandá-cabiúna, jacarandá-caviúna, jacarandá-uma,
pau-preto, jacarandazinho.
Descrição: Árvore com altura média de 15-25m com tronco de 40-80cm de diâmetro. Com
ocorrência na Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.
Características: Madeira moderadamente pesada com densidade 0,87 g/cm³.
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Figura 40 ‒ Caviúna, sendo: 1‒ Caviúna em estado natural; 2 ‒ Caviúna com aplicação de selador
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Nome científico: Machaerium scleroxylon Tul
Como é conhecida: Caviúna, pau-ferro, sabiúna, jacarandá-ferro (SP), jacarandá-violeta,
caviúna-vermelha (PR), penanguba (MG), violeta (MG, ES), caviúna-rajada, candeia-dosertão, jacarandá-caviúna, suca (GO), candeia.
Descrição: Árvore com altura média de 15-25m com tronco de 50-90cm. Com ocorrência em
Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso do Sul, e Norte do Paraná
Características: Madeira moderadamente pesada (densidade 0,88g/cm³).
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Figura 41 ‒ Cabreúva, sendo: 1 ‒ Cabreúva em estado natural; 2 ‒ Cabreúva com aplicação de selador
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Nome científico: Myrocarpus frondosus Allemão
Como é conhecida: Cabreúva-parda, óleo-pardo, cabreúva, cabriúna, cabreúva-amarela,
bálsamo, caburé, pau-bálsamo (PR), cabrué, quina-morada, caboriba, cabureíba, jataúba, paude-óleo-verdadeiro, caboreíba.
Descrição: Altura de 20-30m com tronco de 60-90cm de diâmetro. Com ocorrência no Sul da
Bahia ao Rio Grande do Sul.
Características: Madeira pesada (densidade 0,91g/cm³).
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Figura 42 ‒ Marfim, sendo: 1 ‒ Marfim em estado natural; 2 ‒ Marfim com aplicação de selador;
3 ‒ Marfim com aplicação de laca preta; 4 ‒ Marfim com aplicação de laca branca
Fonte: Arquivo pessoal do autor.
Nome científico: Balfourodendron riedelianun (Engl.) Engl.
Como é conhecida: Pau-marfim, guatambu (SC), pequiá-mamão (SC), farinha-seca SP),
marfim, gramixinga, pau-liso, pau-cetim, guataia, guarataia, gramuxinga.
Descrição: Altura de 20-30m com tronco de 40-90cm de diâmetro. Com ocorrência em Minas
Gerais, Mato Grosso do Sul até o Rio Grande do Sul.
63
Os arquitetos membros da loja adotavam técnicas tradicionais de marcenaria para o
desenvolvimento de seus móveis. Podemos verificar que alguns dos sistemas por eles
empregados continuam sendo utilizados até hoje, inclusive pela indústria moveleira seriada,
como a espiga.
Figura 43 – Maquete espiga
Fonte: Elaborada pelo autor.
64
Porém, outros métodos construtivos, como o malhete, são utilizados apenas por poucas
fábricas de produção artesanal, devido à falta de ferramental e de mão de obra e ao alto tempo
de produção, além de vivermos a invasão de placas industrializadas, como MDF e MDP.
Figura 44 – Maquete malhete
Fonte: Elaborada pelo autor.
65
Além disso, existem outros fatores que são de extrema importância para definir
questões de estética e de durabilidade, como podemos observar a seguir, nos ensaios dos
sistemas construtivos da marcenaria tradicional, muitos deles recorrentes nos projetos da
Branco & Preto, o que demonstra o conhecimento técnico dos membros da loja.
Figura 45 – Maquete meia madeira
Fonte: Elaborada pelo autor.
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Figura 46 – Maquete talisca
Fonte: Elaborada pelo autor.
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Figura 47 – Maquete cunha
Fonte: Elaborada pelo autor.
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Figura 48 – Maquete alma
Fonte: Elaborada pelo autor.
69
Com base no levantamento documental feito na revista Acrópole, na obra de Marlene
Millan Acayaba e no estudo feito em peças originais da Branco & Preto, buscou-se completar
o catálogo através do desenvolvimento de desenhos e maquetes, a fim de se entender e
documentar métodos e processos construtivos dos móveis da Branco & Preto. Deve-se
salientar, entretanto, que existem projetos que poderiam ter adotado procedimentos diferentes
dos apresentados neste trabalho, porém buscou-se resgatar técnicas e processos produtivos
dentro dos ideários dos arquitetos da loja que pretendiam possibilitar uma durabilidade maior
do produto, bem como uma melhor qualidade estética e formal do móvel; essa era a filosofia
projetual do grupo que está evidente no catálogo da loja. Este trabalho conta com peças que
foram reeditadas, as quais, conforme relata o arquiteto Sérgio Rodrigues, são chamadas de
“vintage”(Anexo 4) nos Estados Unidos. Com o redesenho de peças que chegaram a ser
produzidas, mas não foram reeditadas e do desenho de móveis que apenas existem em
estudos, foram elaborados os respectivos desenhos e maquetes.
4.2 MÓVEIS INÉDITOS
Podemos observar expostos nos anexos deste trabalho, projetos de móveis que foram
produzidos e compõem o catálogo da loja, passaram por processos de criação através do
desenvolvimento de croquis, de desenhos técnicos e do desenvolvimento de protótipos, os
arquitetos acompanhavam todo o processo de fabricação para atestar que o projetos seriam
seguidos de acordo com os parâmetros qualitativos exigidos pelo grupo.
Como é recorrente, seja no campo da arquitetura ou do desenho industrial, projetos e
estudos, por questões diversas, não chegam a ser produzidos. Porém fica evidente nas peças
não produzidas dos membros da loja que o raciocínio projetual é o mesmo empregado nos
móveis que fazem parte do catálogo, sendo assim de grande valor. A seguir, com o intuito de
completar os arquivos existentes, foram elaborados os desenhos técnicos das peças inéditas
que estavam restritos apenas a croquis ou desenhos incompletos. E dentro dos padrões de
acabamento e técnicas construtivas foi preparada uma pequena descrição das peças com as
possíveis características dos móveis inéditos projetados pelo grupo. De acordo com as
características da loja e dos desenhos técnicos baseados nos esboços originais foram
desenvolvidas as maquetes físicas que podem ser vistas adiante.
70
Sofá Aflalo 1956: com estrutura em madeira fixada através de espigas. Pés em madeira
chanfrada e encosto modelado com fechamento através de madeiras torneadas. Assento
preenchido com pluma ou crina e revestido possivelmente com tecidos criados pelos
arquitetos sócios da loja. Designer: Roberto Aflalo. (Não chegou a ser produzido).
Figura 49 Desenho técnico Sofá Aflalo
Fonte: Elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
71
Figura 50 ‒ Maquete Sofá Aflalo
Fonte: Maquete elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
72
Mesa de Centro Aflalo: em compensado revestido com lâmina de madeira natural unidos
através do sistema macho e fêmea. Tampo com borda em lâmina a 45º, podendo ser de
granito, de compensado revestido com laminado melamínico ou de lâmina de madeira
natural. Designer: Roberto Aflalo. (Não chegou a ser produzido).
Figura 51 ‒ Desenho técnico Mesa de Centro Aflalo
Fonte: Elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
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Figura 52 ‒ Desenho detalhes construtivos Mesa de Centro Aflalo
Fonte: Elaborada pelo autorcom base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
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Figura 53 ‒ Perspectiva Mesa de Centro Aflalo
Fonte: Elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
Figura 54 ‒ Maquete física Mesa de Centro Aflalo
Fonte: Maquete feita pelo autorcom base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
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Figura 55 ‒ Desenho técnico Mesa Escola Olivo Gomes (aprox. 1952) – Carlos Milan
Fonte: Elaborada pelo autor com base no desenho existente em MATERA, 2005, p. 135.
76
Poltronas Jacob Ruchti: com estrutura em madeira envolvida com pluma ou crina e
revestida possivelmente com tecido ou couro. Base em madeira constituída por junções
elaboradas através de espigas e pés chanfrados em grau, marca recorrente nos projetos dos
arquitetos membros da loja. (Não chegou a ser produzida).
Figura 56 ‒Desenho técnico Poltrona 1 ‒ Jacob Ruchti
Fonte: Elaborada pelo autorcom base no desenho existente em RUCHTI, 2011, p. 99.
77
Figura 57 ‒Maquete Poltrona 1 ‒ Jacob Ruchti
Fonte: Maquete elaborada pelo autorcom base no desenho existente em RUCHTI, 2011, p. 99.
78
Figura 58 ‒ Desenho técnico Poltrona 2 ‒ Jacob Ruchti
Fonte:Desenho elaborado pelo autor com base no desenho existente em RUCHTI, 2011, p. 100.
79
Figura 59 ‒ Maquete Poltrona 2 ‒ Jacob Ruchti
Fonte: Maquete elaborada pelo autor com base no desenho existente em RUCHTI, 2011, p. 100.
80
Poltrona Residência Oscar Americano: com estrutura em madeira envolvida com pluma
ou crina e revestida com tecido. Recebe uma estrutura em madeira torneada constituída por
junções elaboradas através de espigas.
Figura 60 ‒ Desenho técnico Poltrona Residência Oscar Americano
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 68-69.
81
Figura 61 ‒Maquete Poltrona Residência Oscar Americano
Fonte: Maquete elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 68-69.
82
Poltrona Bergère: com estrutura em madeira modelada fixada através de espigas. Assento
e encosto preenchidos com pluma ou crina e revestidos tradicionalmente com tecidos
criados pelos arquitetos sócios da loja. (Não chegou a ser produzida).
Figura 62 ‒Desenho Poltrona Bergère
Fonte: Desenho elaborado pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
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Figura 63 ‒ Maquete Poltrona Bergère
Fonte: Maquete elaborada pelo autor, com base no desenho existente em ACAYABA, 1994, p. 79.
85
4.3 RECONSTITUIÇÕES DOS INTERIORES
Os projetos que utilizaram os móveis da loja Branco & Preto, a exemplo da
reconstituição feita da loja na Vieira de Carvalho, encontram-se documentados principalmente
na revista Acrópole e na obra de Marlene Millan Acayaba (1994). O presente trabalho busca
complementar o arquivo documental existente que, em alguns casos, encontra-se incompleto.
A fim de suprir essa lacuna no arquivo documental, desenvolveu-se um redesenho das plantas
originais das residências, se resgatou fotos dos projetos originais e se optou em desenvolver
com mais detalhes a reconstituição dos layouts com as elevações de áreas sociais, juntamente
com maquetes físicas que foram fotografadas em diversos ângulos, possibilitando assim
entendermos as relações projetuais através do material desenvolvido. Os móveis da loja
possuíam impregnada a mesma linguagem utilizada pelo grupo no desenvolvimento da
arquitetura. Temos como característica marcante peças de mobiliário que se integravam à
arquitetura, diferentemente do processo vivenciado atualmente, principalmente com móveis
planejados havia a preocupação de se desenvolver projetos de móveis especiais, ou seja, feitas
sobre medida para o espaço que era mesclado com peças já existentes no catálogo da loja e,
assim, esse mobiliário especial se tornava um elemento de articulação. A consolidação da
arquitetura moderna entre nós propiciou uma adequação e uma sintonia entre o mobiliário,
seu processo de concepção e execução, e as características arquitetônicas, entre as quais a
planta livre e a fluidez espacial (ARGAN,1997), e a utilização do mobiliário com desenho
marcado pela tridimensionalidade facilitando a montagem do layout, móveis sendo utilizados
como meio para a divisão dos ambientes e sua setorização, por exemplo, reforçando
princípios da arquitetura moderna. Os móveis da loja Branco & Preto compunham os espaços
de interiores de diversos projetos de arquitetura, em especial a residencial paulistana, muitos
desses projetos elaborados pelos próprios membros da loja ou por outros nomes de destaque
como Rodolfo Ortenblad, Galiano Ciampaglia, Rino Levi e Oswaldo Arthur Bratke, entre
outros.
A fim de compreender o conceito projetual de integração de forma mais aprofundada
foram escolhidas as salas de estar, lareira e jantar das residências que serão apresentadas
adiante. A definição por ambientes da área social foi determinada por se tratar dos espaços
mais ricos da casa do ponto de vista projetual. Serão expostos os redesenhos das plantas e
elevações de quatro ambientes juntamente com as suas maquetes que reconstituem a
arquitetura existente, possibilitando melhor compreensão das relações entre arquitetura e seus
interiores. A escolha dos ambientes reconstituídos ocorreu de forma pontual, cujo critério
86
principal foi determinar espaços de interiores que atrelaram os móveis da Branco & Preto
como elemento de articulação. É diferente do processo que ocorre hoje, em que apenas uma
pequena parte dos móveis da loja foi reeditada e é utilizada de forma pontual, ou seja,
juntamente com móveis de outros designers, contrariando o que ocorria no início, quando na
maioria dos projetos, os ambientes eram compostos por peças na grande maioria que
pertenciam ao catálogo da loja e, sempre que necessário projetos especiais eram
desenvolvidos. Dessa forma, executavam o projeto completo, sendo que muitas dessas peças
foram exclusivas e na reconstituição serão evidenciadas juntamente com uma apresentação
em ângulos inéditos dos projetos estudados.
4.3.1 Sala de Estar Residência Roberto Aflalo ‒ 1955
O arquiteto Roberto Aflalo, conforme já destacado anteriormente, foi membro da loja
Branco & Preto. Para o projeto da sua residência localizada na Vila Elvira em São José do
Rio Preto – SP ele optou por um programa de necessidades bem simplificado, composto pela
sala de estar/jantar, três quartos, closet, banheiro, cozinha, lavanderia e garagem.
Figura 64 – Planta Residência Aflalo
Fonte: Redesenho elaborado pelo próprio autor com base na revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, jun. 1955.
87
Figura 65 – Fotos Residência Aflalo
Fonte: Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, jun. 1955
A seguir, temos a localização da sala de estar e jantar com o redesenho do layout, no
qual devemos destacar alguns pontos recorrentes na arquitetura residencial desenvolvida pelos
membros da loja, quais sejam a opção pelo uso da lareira, pela transparência e a interligação
com o exterior da obra propiciada pelas grandes aberturas.
Figura 66 – Planta com localização sala de estar/jantar Residência Aflalo
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, jun. 1955.
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Figura 67 – Layout sala de estar/jantar Residência Aflalo
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 351-358, jun. 1955.
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Figura 68 – Vistas 1, 2 e 3 sala de estar/jantar Residência Aflalo
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 351-358, jun. 1955.
Podemos notar no desenho a seguir a busca pelos eixos no layout do mobiliário em
relação à arquitetura, uma coluna central alinhada ao eixo da lareira com a mesa de centro,
poltrona e mesa de jantar com seis cadeiras, as quais poderiam ser dispostas com duas nas
90
cabeceiras da mesa ou três alinhadas em cada lateral; temos também o sofá no eixo da mesa
de centro e do plano de vidro.
Figura 69 – Sala de estar Residência Aflalo com a relação entre os móveis
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 351-358, jun. 1955.
91
Figura 70 – Perspectiva sala de estar Residência Aflalo
Fonte: Desenho elaborado pelo autor.
92
Nas fotos das maquetes podemos observar com mais detalhes os pontos destacados
anteriormente. Percebemos também que nesse projeto se optou por móveis do catálogo da
loja. São eles a mesa de jantar, as cadeiras em palhinha, o sofá M1, a poltrona R3 e a mesa de
centro com pé torneado. A estante foge da linha do catálogo, sendo composta por um desenho
constituído por um único módulo reto, cortado e montado com duas peças na vertical, peça
nomeada pelos marceneiros como “fianco”, e cinco peças na horizontal. Devemos destacar
que a estante não possui fundo, nem base, nem fechamento superior, utilizando-se da própria
arquitetura para cumprir essas funções. Essas observações ficam mais evidentes na
apresentação da maquete.
Figura 71 – Vista 1 superior maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
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Figura 72 – Vista 2 superior maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
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Figura 73 – Vista 3 superior maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
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Figura 74 – Vista 1 interna maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
Figura 75 – Vista 2 interna maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
96
Figura 76 – Vista 3 interna maquete Residência Aflalo
Fonte: Elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 200, p. 352-353, ago. 1955.
Na reconstituição da sala de estar da residência do arquiteto Aflalo percebe-se a
utilização de móveis de linha do catálogo original da loja, o que de certa forma diminuiu o
custo de implantação do projeto exceto a estante na lateral da lareira. Era usual a criação de
móveis sob medida, pois assim se conseguia aproveitar melhor o espaço arquitetônico, porém
sempre mantendo as características projetuais e os materiais utilizados na loja.
Podemos notar a poltrona disposta a 45º, uma das peças mais emblemática do catálogo
da loja Branco & Preto que, do ponto de vista formal, conseguiu harmonizar a composição
formada pelos móveis centralizados no eixo da lareira. Apesar de ter um volume menor em
relação ao sofá de três lugares, localizado no lado oposto, a poltrona não prejudicou a simetria
do conjunto. O arquiteto optou por um sofá de linhas retas com desenho simplificado e o
colocou em oposição a uma poltrona que é uma peça menor, porém seu desenho mais
elaborado possibilitou o equilíbrio do ambiente.
97
4.3.2 Residência Pacaembu ‒ 1955
Projeto: Plinio Croce e Roberto Aflalo
As parcerias entre os arquitetos da loja Branco & Preto não ficavam restritas somente
ao desenvolvimento dos móveis, mas se estendiam também para a arquitetura. Uma dessas
parcerias foi o projeto da residência do engenheiro José Carlos Guimarães de Oliva, com
paisagismo de Paulo Leibkuchler.
O projeto da residência é composto por dois pavimentos, sendo que o primeiro, hall,
escritório, copa, cozinha, despensa e lavanderia e no segundo temos três dormitórios, um
deles suíte, hall de circulação, banheiro.
Figura 77 – Residência Pacaembu: planta pavimento térreo e superior
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
98
Podemos observar a seguir fotos do projeto original e a demarcação do espaço da sala
de estar/jantar na residência.
Figura 78 – Fotos Residência Pacaembu
Fonte: Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
Figura 79 – Residência Pacaembu: localização espaço sala de estar, jantar e bar
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
99
Podemos notar, através dos redesenhos da sala de estar, algumas peculiaridades.
Assim como na residência apresentada anteriormente, esta também possui um grande plano de
vidro, uma lareira como elementos de destaque da arquitetura e os móveis estão posicionados
de forma simétrica e alinhados.
Figura 80 – Residência Pacaembu: layout sala de estar, jantar e bar
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
100
Figura 81 – Residência Pacaembu: layout com relação entre os móveis sala de estar, jantar e bar
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
101
Figura 82 – Residência Pacaembu: corte AA, BB e CC sala de estar, jantar e bar
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
Ao analisarmos o layout e os cortes da sala de estar observamos a busca pelos eixos, o
alinhamento entre os móveis e a transparência proporcionada pela estante na lateral da lareira
e pelo biombo. Tais peças delimitam o espaço e possibilitam uma privacidade maior para os
usuários, porém, ao mesmo tempo, por serem elementos vazados – a estante não possui fundo
e o biombo é revestido com palhinha – contribuem com a ligação entre a sala de estar e a de
jantar, mantendo uma identidade projetual, considerando a palhinha, a qual é utilizada no
biombo, nas duas poltronas MR7 e nas cadeiras da mesa de jantar.
102
Figura 83 – Residência Pacaembu: perspectiva sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor.
103
A seguir temos o redesenho de dois sofás utilizados na residência, desenvolvidos
dentro dos ideários projetuais da loja, com a utilização possivelmente dos tecidos criados pelo
grupo, mesclados à madeira. Temos a maquete do bar móvel, recorrente em outros projetos
criados pelo grupo, e a maquete da estante da sala de jantar, desenhada com exclusividade
para a residência.
Figura 84 – Desenhos sofás Residência Pacaembu
Fonte: Elaborada pelo autor.
104
O bar é em laca, o que evidencia a busca pelo primor no acabamento dos móveis
criados pelo grupo. A parte inferior destina-se ao armazenamento de utensílios e o tampo é
para servir as bebidas. Acompanham-no quatro bancos. Fica nítido nesse projeto a influência
da arquitetura no desenvolvimento do mobiliário, pois podemos notar uma semelhança a um
projeto de arquitetura, através da estrutura independente que segura o volume principal e um
tampo de vidro que coroa o móvel.
Figura 85 – Maquete bar com banquetas
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
105
A estante, desenvolvida com exclusividade para esta residência, possui a
predominância das linhas retas, quebradas apenas pelos pés redondos, muito utilizados nas
mesas de apoio da loja. Outra combinação recorrente nos móveis especiais é a mescla de dois
materiais contrastantes, madeira e laminado melamínico.
Figura 86 – Maquete móvel sala de jantar
Fonte: Elaborada pelo próprio autor
106
Na sequência, nas fotos da maquete da sala de estar da residência, podemos observar
que no desenvolvimento do projeto de interiores optou-se pela mescla de peças. Temos os
sofás, cujos desenhos vimos anteriormente, e as peças clássicas do catálogo da loja, como
duas poltronas MF3, uma poltrona MR7 e duas mesas de centro com tampo em granito; temos
ainda o bar que serve de apoio para a área da sala de estar que, por sua vez, é composta pela
mesa com quatro cadeiras em palhinha e a estante, utilizada como cristaleira e aparador,
desenhada com exclusividade para a residência.
Figura 87 – Maquete Residência Pacaembu: vista 1
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
107
Figura 88 – Maquete Residência Pacaembu: vista 2
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
108
Outro elemento importante que devemos destacar é a estante na lateral da lareira e o
biombo, os quais delimitam os espaços, porém ao mesmo tempo os interligam, através das
transparências, característica que também está evidenciada na arquitetura, com os grandes
planos de vidro.
Figura 89 – Maquete Residência Pacaembu: vista 3
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
109
Figura 90 – Maquete Residência Pacaembu: vista 4
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
Figura 91 – Maquete Residência Pacaembu: vista 5
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
110
Figura 92 – Maquete Residência Pacaembu: vista 6
Fonte: Maquete elaborada pelo próprio autor com base na Revista Acrópole, n. 216, p. 460-465, ago. 1956.
No redesenho da sala de estar da residência Pacaembu, cujo projeto de arquitetura foi
desenvolvido pelos arquitetos Plínio Croce e Roberto Aflalo, ambos sócios da loja, fica
evidenciada a busca pela interação do projeto arquitetônico com a parte externa por meio do
grande plano de vidro. Esse conceito de interligação é levado para o projeto de interiores, com
os divisores de ambientes criados com transparência e demarcando os espaços, sem os isolar,
proporcionando uma transparência que interliga os ambientes. Na reconstituição dos móveis
destaca-se uma identidade projetual gerada pela linguagem dos materiais e pela mistura de
elementos que dão continuidade ao conceito original da arquitetura propriamente dita, peças
de linha do catálogo da Branco & Preto como poltronas, mesa, cadeira, etc. O
desenvolvimento da estante sala de jantar, utilizada provavelmente para suprir o programa de
necessidades. Fica evidenciado que o projeto de interiores não era pensado de forma isolada e
sim dentro dos conceitos empregados na arquitetura.
111
4.3.3 Residência Jardim América ‒ 1956
A residência Jardim América, diferentemente dos dois estudos apresentados
anteriormente, não foi projetada por arquitetos membros da loja Branco & Preto e sim pelo
arquiteto Oswaldo Arthur Bratke (1907-1997), nome de grande produção arquitetônica,
principalmente residencial, fruto de farta erudição documentada por profícuas conexões com
os principais eventos que marcam a arquitetura moderna e seu ideário, difundido
mundialmente. Ainda estudante, Bratke abriu um escritório de topografia com os amigos do
Mackenzie, Eduardo Kneese de Mello, Oscar Americano e Clóvis Silveira. Fazia parte do
sistema proposto pelo arquiteto Christiano Stockler das Neves, que seguia os padrões de
ensino provindos da França conforme já destacado anteriormente.
Junto com Botti projetou diversas residências na cidade de São Paulo. Entre 1933 e
1942 eles executaram mais de 400 obras, das quais cerca de 90% eram residências, a maioria
ecléticas. Nesse período elaboravam projetos já com alguns resquícios de modernidade. Em
1942 Botti faleceu em um acidente de avião e Bratke sofreu muito emocionalmente com a
falta do amigo e sócio, além das dificuldades para honrar todos os compromissos que ambos
tinham assumido. Influenciado pelo colega de profissão, Rino Levi, foi entregando todos os
trabalhos fechados e desvinculados da construtora e se dedicando totalmente apenas ao
desenvolvimento dos projetos de arquitetura. Em 1948, em uma das suas viagens aos Estados
Unidos, visitou as obras de vários arquitetos, dentre eles Wright, Neutra, Johnson e Mies Van
der Rohe.
Bratke trabalhou na urbanização do bairro Paineiras do Morumbi, em São Paulo. Nos
anos 50 ele foi eleito presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB-SP para duas
gestões, ou seja, de 1951 até 1954. Entre 1952 e 1959 elaborou o projeto para o Balneário de
Águas de Lindoia. Nos anos de 1960 desenvolveu projetos para estações da Companhia
Mogiana de Estradas de Ferro e foi presidente da comissão técnica da Cohab de São Paulo, de
1968 até 1970.
A influência dos conceitos da arquitetura norte-americana é evidenciada nas
transparências ocasionadas pelos vidros, possibilitando uma integração, a horizontalidade e a
textura aparente de materiais como a madeira e a pedra adaptação, à topografia, com uma
planta mais fluida, que facilitava uma integração entre a casca arquitetônica, o exterior da
obra e seus espaços de interiores.
Bratke dificilmente elaborava o design de interiores, portanto em alguns de seus
projetos foram adotados os móveis da loja Branco & Preto, que acabavam servindo como
112
elemento de articulação entre a arquitetura e os espaços de interiores. Tais características
podem ser vistas com maior ênfase no estudo de caso da residência Maria Luisa e Oscar, que
será apresentada com mais detalhes adiante, que denota principalmente um desenho já mais
articulado com os conceitos modernos. Os elementos construtivos desenvolvidos por Bratke
possibilitavam uma transparência maior na obra, como muxarabis, esquadrias e elementos
construtivos vazados. Na parte de interiores, chegou a desenvolver sistemas flexíveis de
paredes que poderiam ser recolocadas.
Bratke costumava deixar o projeto de interiores a cargo dos proprietários do imóvel,
porém, conforme já relatamos, em algumas de suas obras emblemáticas foi utilizado o
mobiliário da loja Branco & Preto, pois assim acabava conseguindo, no final, uma obra que
se integrava com o exterior, através das transparências, e com o interior, através de móveis
que não bloqueavam o campo de visão e possuíam, ao mesmo tempo, uma linguagem
moderna.
Um ponto forte que podemos destacar no térreo desse projeto do arquiteto Bratke é a
existência de grandes aberturas em todos os ambientes, não ficando restritas somente à sala de
estar e sim se estendendo à sala da lareira, ao escritório e à sala de jantar. (DOURADO;
SEGAWA,2012).
A seguir temos o redesenho das plantas da residência, com as fotos originais do
projeto e a localização da área social da residência que será detalhada mais adiante.
113
Figura 93 - Planta pavimento térreo e superior sala de estar da Residência Jardim América
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
114
Figura 94 ‒ Fotos da Residência Jardim América
Fonte: Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 95 ‒ Localização área social residência Jardim América
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Um ponto forte que podemos destacar no térreo desse projeto do arquiteto Bratke é a
existência de grandes aberturas em todos os ambientes, não ficando restritas somente à sala de
estar e sim se estendendo à sala da lareira, ao escritório e à sala de jantar. Outro recurso
projetual adotado pelo arquiteto foi incluir, nas aberturas da área interna, portas de correr que
vão até o teto e deslizam para a parte interna da parede, possibilitando uma comunicação entre
os ambientes. Podemos observar esses conceitos a seguir no redesenho do primeiro
pavimento.
115
Figura 96 ‒ Residência Jardim América: layout área social
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
116
Figura 97 ‒ Residência Jardim América: vista 1, 2, 3 e 4 área social
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
117
A relação entre os móveis fica evidenciada layout e nas perspectivas a seguir através da busca
pelos eixos.
Figura 98 ‒ Residência Jardim América: layout área social com relação entre os móveis
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
118
Figura 99 ‒ Residência Jardim América: perspectiva sala de estar com o mobiliário da Branco & Preto
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
Podemos observar na perspectiva a seguir que a distribuição dos móveis da sala da
lareira, o alinhamento das poltronas MR7 e das poltronas MF5 com a mesa e o sofá
acompanhando o eixo da lareira que pode ser visto também no layout apresentado com a
ligação dos móveis.
Figura 100 ‒ Residência Jardim América: perspectiva da sala lareira com o mobiliário da Branco & Preto
Fonte: Elaborada pelo autor.
119
A estante desenhada com exclusividade para esta residência evidencia a interligação
das suas aberturas, não obstruindo o visual do corredor em relação à sala de estar. A utilização
do laminado melamínico nas laterais foi mesclada com madeira, a qual serviu para esconder a
linha preta do topo do laminado, possibilitando um melhor acabamento. Os volumes das
portas e das gavetas são emoldurados com as laterais e prateleiras em madeira natural, além
dos pés torneados que suspendem o bloco principal do chão.
Figura 101 – Residência Jardim América: desenho estante sala de estar
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 102 – Residência Jardim América: maquete estante sala de estar
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
120
Na maquete que reconstitui o térreo podemos notar quatro ambientes mobiliados com
itens do catálogo da loja. Temos a sala da lareira, composta por duas poltronas MR7, mesa de
centro com tampo em granito, três poltronas M1 e a mesinha lateral e, conforme já observado,
destaca-se a busca pelos eixos. Na sala de jantar vemos a mesa com as cadeiras de palhinha,
material utilizado em grande parte dos projetos que empregaram móveis da loja. O escritório é
composto por três peças, sendo elas a cadeira de palhinha, a escrivaninha e duas poltronas
M1. Já a sala de estar é composta por sete poltronas M1, duas mesas laterais e mesa de centro
em duas cores; nesse projeto, apesar de já existir uma mesa na sala de jantar, optou-se por
utilizar outra, quadrada, com quatro cadeiras Aflalo, e a estante apresentada anteriormente,
desenhada com exclusividade para o projeto desta residência.
Figura 103 – Residência Jardim América: vista 1 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
121
Figura 104 – Residência Jardim América: vista 2 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 105 – Residência Jardim América: vista 3 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
122
Figura 106 – Residência Jardim América: vista 4 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 107 – Residência Jardim América: vista 5 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
123
Figura 108 – Residência Jardim América: vista 6 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 109 – Residência Jardim América: vista 7 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
124
Figura 110 – Residência Jardim América: vista 8 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 111 – Residência Jardim América: vista 9 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
125
Figura 112 – Residência Jardim América: vista 10 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
Figura 113 – Residência Jardim América: vista 11 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
126
Figura 114 – Residência Jardim América: vista 12 maquete área social
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
127
Figura 115– Residência Jardim América: maquetes móveis
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 299-303, ago. 1957.
128
Observa-se, na escolha dos móveis, a predominância de peças já pertencentes ao
catálogo da Branco & Preto e produzidas em série, ao contrário do que aconteceu na
residência que será estudada na sequência, em que muitos móveis foram projetados com
exclusividade. Isso possivelmente contribuiu para diminuir o custo da implantação do projeto,
exceto quanto à estante que serviu como elemento de interligação entre o projeto
arquitetônico e de interiores, pois, além cumprir sua função inicial, apresenta uma linguagem
de desenho coerente com o todo e explicita a transparência da arquitetura e da interligação
entre os ambientes observada nas aberturas em vidro da residência e nas grandes portas dos
ambientes. Ao analisarmos o layout, com móveis que não broqueavam os visuais como no
caso da estante já destacada e também com as poltronas e mesas de apoio que não chegam
com um grande volume até o chão, assim aumentado à transparência e a busca pelos eixos,
verificamos também que no projeto predominou a horizontalidade e a valorização dos visuais
possibilitados pelos fechamentos em vidro e com os moveis condizentes com essas
preocupações projetuais.
4.3.4 Residência Maria Luisa e Oscar Americano – 1952
Em 1952 Bratke foi convidado pelo amigo Oscar Americano para construir a
residência da família. Elaborou um projeto adaptado às depressões naturais do terreno, além
de seguir um extenso programa, com cinco quartos, salas de recreação e de projeção, etc. A
setorização é claramente demarcada na obra, dividida em três partes básicas: a área íntima e a
de serviços nas extremidades, e a área social, sendo que o programa principal está distribuído
no piso mais alto, deixando o inferior para lazer e serviços. O pórtico contínuo da fachada
torna o jardim interno parte integrante do volume.
Figura 116 ‒ Setorização Residência Maria Luísa e Oscar Americano
Fonte: Elaborada pelo autor.
129
O projeto adapta-se às depressões naturais do terreno, além de seguir um extenso
programa, com cinco quartos, salas de recreação e de projeção etc., sendo que o programa
principal está distribuído no piso mais alto, deixando o inferior para lazer e serviços. O
pórtico contínuo da fachada, que torna o jardim interno parte integrante do volume.
N
N
Figura 117 ‒ Residência Maria Luisa e Oscar Americano: plantas térreo e nível
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
130
Figura 118 ‒ Residência Maria Luisa e Oscar Americano: cortes AA, corte BB, fachada 1 e fachada 2
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
131
A residência hoje é ocupada pela Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, que
recebe diariamente estudantes e apreciadores de arte e se tornou uma referência da arquitetura
residencial moderna paulistana. Atualmente, a residência expõe obras de arte e seus interiores
são ocupados por móveis que fazem parte do acervo da família, porém não condizem com os
ideários modernos do projeto arquitetônico, conforme podemos observar nas fotos a seguir.
Figura 119 - Fotos do mobiliário atual da Fundação Maria Luísa e Oscar Americano
Fonte: Fundação Maria Luísa e Oscar Americano.
Seus interiores, conforme o projeto original, foram mobiliados com móveis da Branco
& Preto. A residência apresenta uma relação forte com as áreas externas através dos seus
grandes planos de vidro. O projeto de interiores conseguiu desenvolver uma linguagem
condizente e integrada entre o espaço interior e a casca arquitetônica. Pode-se começar essa
análise com as fotos inseridas na sequência.
Figura 120 - Ambientes da Residência Oscar Americano mobiliados com os móveis da Branco & Preto
Fonte: Fotos Peter Scheier (Fundação Oscar Americano).
132
A obra é marcada por uma volumetria que não conflita com a natureza e se adapta ao
perfil natural do terreno. Logo, o desenho é horizontalizado, a fim de usufruir da vegetação e
dos jardins. A entrada da propriedade localiza-se na parte baixa do terreno, enquanto que a
construção está na parte superior, para que assim possa propiciar maior privacidade. Foi
construída uma estrutura metálica na lateral da residência, que pode ser montada para receber
eventos como formaturas e casamentos.
Figura 121 – Fotos atuais da parte externa da Residência Maria Luísa e Oscar Americano
Fonte: Fotografias capturadas pelo autor.
A Branco & Preto utilizou nesse projeto peças do seu catálogo que eram produzidas
em série, mas algumas delas foram desenvolvidas exclusivamente para essa casa. Podemos
notar, por exemplo, quartos com peças que se encaixam perfeitamente com as dimensões da
133
arquitetura, conforme pôde ser observado nas fotos apresentadas anteriormente e na maquete
apresentada a seguir, que será estudada em detalhes, para que se possa verificar a existência
de uma relação conceitual e sua explicitação.
A seguir temos a perspectiva que reconstitui a sala de descanso e a planta com
localização da sala de estar que será detalhada.
Figura 122 ‒ Redesenho da sala de descanso Residência Maria Luisa e Oscar Americano
Fonte: Elaborada pelo próprio autor.
Figura 123 ‒ Localização da sala de estar no pavimento térreo
Fonte: Elaborada pelo autor.
134
A sala de estar da residência tem os fechamentos laterais em vidro com vista para a
área externa, composta pelos jardins e a fonte interna criada pelo arquiteto.
Figura 124 – Residência Maria Luísa e Oscar Americano: layout sala de estar
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
135
Figura 125 – Residência Maria Luísa e Oscar Americano: cortes AA, BB, CC e DD ‒ sala de estar
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
136
Ao observarmos no layout a ligação entre os móveis através dos eixos e nos cortes
ficou nítida a preocupação em não se bloquear os visuais.
Figura 126 – Residência Maria Luísa e Oscar Americano: layout sala de estar com relação entre os móveis
Fonte: Desenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
137
Na maioria dos projetos de interiores desenvolvidos pelos membros da loja
predominava a utilização de móveis já pertencentes ao catálogo, mas também foram criadas
peças pontuais, a fim de propiciar a interligação com a arquitetura ou suprir questões dos
programas de necessidades. A sala de estar da residência Maria Luisa e Oscar Americano
teve seus móveis desenvolvidos com exclusividade, ficando nítida nos desenhos apresentados
a seguir a preocupação em não se obstruir os visuais criados pelos planos de vidro e, de forma
mais sutil, nos sofás, nos bancos que têm seus volumes suspensos do chão pelos pés, e no
desenho das estantes laterais, seguindo assim o conceito de interação da obra proposto por
Bratke.
138
Figura 127 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: móveis sala de estar
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-362, ago. 1957.
Na sequência encontram-se o layout e com as perspectivas dos móveis. Pode-se
observar que, assim como no projeto arquitetônico, as linhas retas e a horizontalidade
predominam também no projeto da mobília.
Segundo o arquiteto Romeu Castro de Souza:
O móvel era pensado para se relacionar com a arquitetura do local. Porque
eles estavam inseridos nesse conceito. Quando foi criada, a Branco & Preto
fazia os móveis de acordo com os projetos que estavam surgindo (...). Havia
um relacionamento entre a estrutura do móvel em si e o desenho da casa
(Anexo 2).
139
Figura 128 ‒ Residência Maria Luisa e Oscar Americano: Layout da sala de estar com desenhos dos móveis
Fonte: Elaborada pelo autor a partir das fotos de Peter Scheier apresentadas anteriormente.
Figura 129 - Residência Maria Luisa e Oscar Americano: Perspectiva sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor.
140
Pode-se observar nas fotos da maquete a seguir uma transparência possibilitada pelo
grande fechamento em vidro e no mobiliário. As estantes nas extremidades evidenciam que
seus núcleos principais não chegam até o teto, o que a princípio poderia ser a solução mais
usual para uma estante. Os sofás e bancos não são totalmente fechados e a mesa de centro
evidencia essa transparência com o uso do vidro, o que possibilita maior integração entre os
espaços interno e externo da residência. Há simetria entre os móveis. As poltronas, por serem
peças que possuem um desenho diferenciado na parte de trás, foram posicionadas de forma a
se sobressaírem. Além disso, nota-se o cuidado de não encostar peças altas na parede
envidraçada, valorizando assim a integração do interior da residência com o jardim.
Figura 130 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 1 maquete sala de estar
Fonte: Maquete elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
141
Figura 131 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 2 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
142
Figura 132 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 3 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
143
Figura 133 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 4 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole, n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
Figura 134 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 5 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole,n. 226, p. 358-262, ago. 1957.
144
Figura 135 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 6 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole. 226, p. 358-362, ago. 1957.
Figura 136 – Residência Maria Luisa e Oscar Americano: vista 7 maquete sala de estar
Fonte: Elaborada pelo autor com base na Revista Acrópole. 226, p. 358-362, ago. 1957.
145
Pôde-se constatar no estudo uma forte relação entre o projeto arquitetônico e seus
interiores através de diversas opções projetuais, como a composição dos móveis a partir dos
eixos dos ambientes, a predominância de um desenho que se desenvolve em linhas
horizontais, assim como da própria residência. No projeto da residência Maria Luisa e Oscar
Americano, fica mais evidente a relação da arquitetura com o projeto dos interiores pela
criação de um mobiliário exclusivo que enfatizava a criação dos visuais através das
transparências e fluidez. Constatou-se que os projetos dos interiores e do mobiliário
apresentados estão relacionados e integrados ao projeto arquitetônico.
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciarmos o trabalho, partimos da hipótese de que a loja Branco & Preto produzia
e comercializava móveis desenhados conforme o ideário moderno, adequados à capacidade de
expressar o espaço fluido da planta moderna, ou seja, com formas de linhas retas e montagem
adequada à sua expressão. Porém, no decorrer da pesquisa, observamos que as questões
consideradas no desenvolvimento dos projetos eram mais abrangentes, o móvel não era
pensado como produto isolado e sim como um componente integrante da arquitetura.
Pudemos observar, no entanto, no decorrer da pesquisa e da realização das sucessivas
modelagens do mobiliário e sua aplicação ao espaço arquitetônico das residências
selecionadas fatores determinantes que podem ser atribuídos como causa ao desenho dos
móveis projetados pelos membros da loja. Primeiramente, o apurado sentido de execução e
projeto de detalhes podem ser atribuídos à formação dos membros da Loja: ao fato de todos
os sócios serem arquitetos, o Chinês I Chen Hwa, formado na Pensilvânia e Miguel Forte,
Jacob Ruchti, Plínio Croce, Roberto Aflalo e Carlos Millan formados pelo curso de
Arquitetura da Universidade Mackenzie, em uma época (anos cinquenta do século XX)
período em que a Instituição fundamentou o ensino de arquitetura em um ambiente de
contradição entre moldes clássicos e a emergência da arquitetura moderna, o que preservou a
habilidade de representação do espaço arquitetônico, exigindo um alto nível de detalhamento
do ponto de vista construtivo dos projetos desenvolvidos.
Posteriormente, essa exigência mostrou-se refletida em seus projetos de móveis,
porém concebidos com parâmetros estéticos modernos, entre estes, a estreita relação entre
mobiliário e espaço da arquitetura moderna, preceito chave bastante desenvolvido na
Bauhaus. É possível sugerir também que essa mudança teve como origem vários fatores: a
orientação variada das fontes referenciais consultadas e aceitas pelos arquitetos paulistas e
mackenzistas, por conseguinte nesse período; a relação que Miguel Forte demonstrou, por
146
exemplo, com a arquitetura residencial norte-americana, exemplo da franca relação entre
interior e exterior, marcada e definida pelo próprio mobiliário, que funcionava como divisão e
setorização espaciais, como se pode observar em residências de Neutra, Frank Lloyd Wright,
entre outros.
Por exemplo, os membros da loja, ainda no período de sua formação, tiveram contato
direto com obras de arquitetura moderna, em especial de tipo residencial, através de estágios,
revistas e viagens, o que influenciaria diretamente a sua forma de pensar a arquitetura e o
mobiliário propriamente dito. Deve ser destacado que os sócios da loja eram arquitetos
atuantes e trabalhavam no desenvolvimento direto da arquitetura com base no ideário
moderno que tinham como convicção.
Observamos, ao analisar os estudos de caso, que a composição dos projetos de
interiores acontecia não só com a utilização dos móveis do catálogo da loja Branco & Preto
como também com o desenvolvimento de projetos especiais, muitas vezes com o intuito de
demarcar os espaços, porém mantendo a ligação entre eles. Podemos citar como exemplo a
residência Pacaembu, em que a sala de estar se liga ao bar e à sala de jantar por meio dos
móveis. Tal setorização dos espaços era feita com peças pertencentes ao catálogo, como o
biombo, ou com a criação de móveis como estantes e buffets, os quais, além de dividir os
ambientes, mantinham a transparência presente na arquitetura. Havia a utilização de recursos
projetuais por meio do desenho de móveis com pés torneados que suspendiam o bloco
principal, dando a sensação de leveza, e da criação de móveis sem fundo, baixos, ou cujos
blocos principais não encostavam no piso e nem no teto, como no caso das estantes da sala de
estar da residência Maria Luisa e Oscar Americano. Devemos destacar que os móveis
chamados de “especiais” eram desenhados de acordo com o programa de necessidades do
projeto, porém sempre mantendo os sistemas construtivos e os padrões de acabamento dos
artigos pertencentes ao catálogo. Devemos evidenciar que o desenho dos móveis especiais
contribuía de forma direta com as questões explícitas no projeto arquitetônico através das
transparências e da tridimensionalidade, ou seja, não se tornava necessária a construção de
uma parede para servir de suporte à estruturação do móvel. Assim, as estantes e aparadores se
adequavam perfeitamente a uma arquitetura marcada pelos grandes planos de vidro,
evidenciando a interligação dos espaços, não obstruindo os visuais, e se encaixando
perfeitamente na elaboração dos layouts. Nota-se portanto que, dependendo do partido
arquitetônico, o mobiliário servia como elemento articulador ou setorizador, ou seja, eram
peças desenvolvidas dentro dos padrões de acabamento do catálogo, mas que foram utilizadas
para conectar o projeto de arquitetura ao projeto de interiores. Esses itens eram normalmente
147
combinados com as peças já pertencentes ao catálogo da loja. Podemos verificar esses
exemplos nos estudos de caso, através das maquetes apresentadas neste trabalho.
O estudo mais aprofundado dos móveis, mediante os redesenhos e o desenvolvimento
das maquetes físicas, possibilitou o entendimento de uma forma mais ampla dos processos
projetuais e dos sistemas construtivos utilizados nas peças e, assim, pôde-se amplificar a
hipótese levantada no primeiro momento, de que a loja desenvolvia apenas móveis modernos
com processos simplificados. Ao contrário, constatou-se a criação de um mobiliário que, além
de se engajar dentro da estética moderna, se diferencia por meio da riqueza dos detalhes
construtivos do ponto de vista qualitativo da escolha dos materiais e dos processos de
fabricação. Outras características ficaram também evidenciadas, por exemplo, a criação de
poltronas e cadeiras que se destacam, além do ponto de vista formal, pelo conforto
proporcionado por projetos desenvolvidos dentro de parâmetros antropométricos adequados.
Os móveis da Branco & Preto eram executados dentro das técnicas da marcenaria tradicional,
com a utilização tanto de materiais como o laminado melamínico, o compensado e a palhinha
como de madeiras nobres. Porém, inúmeras outras questões eram levadas em consideração na
hora de se projetar os móveis. Com os estudos das residências apresentadas, a reconstituição
dos desenhos e o desenvolvimento das maquetes, pudemos constatar uma forte relação,
caracterizada pelo incentivo da fluidez espacial pelo mobiliário, cuja concepção
tridimensional fez com que o próprio móvel consistisse em elemento definidor da arquitetura,
marcando a relação entre o projeto arquitetônico e seus interiores possibilitada pelo desenho
do mobiliário, através de diversas opções projetuais, como a composição dos móveis a partir
dos eixos dos ambientes e a predominância de um desenho que se desenvolve em linhas
horizontais, assim como as próprias residências. Outro fato já destacado foi o da criação de
um mobiliário exclusivo que servia como elemento articulador do projeto de arquitetura com
o projeto dos interiores, utilizando peças que enfatizavam os pontos fortes dos projetos
arquitetônicos, como a criação dos visuais através das transparências e da fluidez. Sendo
assim, constatou-se, por meio das reconstituições, que os projetos de interiores e do
mobiliário eram pensados de forma a se relacionar e a se integrar com o projeto arquitetônico.
No decorrer desta pesquisa observamos que a loja Branco & Preto ultrapassa o título
de loja que vendia móveis modernos – o que já seria um grande feito nas décadas de 1950 a
70. Além de suprir a necessidade de projetar e vender móveis dentro dos ideários modernos
da arquitetura que se estava produzindo naquele momento, os arquitetos membros da loja
utilizaram seus conhecimentos para o desenvolvimento dos projetos de interiores, levando em
148
consideração a arquitetura que ali existia, e aproveitaram o mobiliário por eles projetado
como um elemento articulador entre o projeto arquitetônico e o de interiores, possibilitando
assim a integração entre ambos. Vimos assim que os móveis da loja eram pensados de forma
global, ou seja, desde as questões técnicas de fabricação, estéticas e ergonômicas, até sua
inserção na arquitetura.
149
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153
ANEXOS
154
Anexo 1
Catálogo
Poltrona MF3 – 1953 em madeira modelada, com encosto em palhinha e sistema
estrutural constituído por junções elaboradas através de espigas, assento com estofamento
preenchido com pluma ou crina e revestido com tecido criado pelo grupo. Destaque para as
angulações que possibilitam maior conforto, além das junções com talisca das pernas
frontais com os apoios dos braços, e para os pés torneados, que são mais espessos nas
partes centrais e afinam nas extremidades. Designers: Carlos Millan e Miguel Forte
Figura 1 ‒Desenho técnico/Perspectiva poltrona MF3
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
155
Figura 2 Poltrona MF3 Passado Composto
Fonte: Passado Composto.
Figura 3 – Poltrona MF3 Etel interiores
Fonte: Etel Interiores.
156
Poltrona Branco & Preto– Com estrutura em madeira envolvida com pluma ou crina e
revestida possivelmente com tecidos criados pelos arquitetos sócios da loja. Base em
madeira constituída por junções elaboradas através de espigas e pés chanfrados em grau,
marca recorrente nos móveis da loja. Designer: Loja Branco & Preto. Produzida: Década
de 1950.
Figura 4 Desenho poltrona Branco & Preto
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
157
Figura 5 ‒ Maquete poltrona Branco & Preto
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
158
Mesa de jantar quadrada Branco & Preto – Com estrutura e pés em madeira chanfrada.
Tampo em compensado revestido com lâmina de madeira natural. Designer: Loja Branco
& Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 6 Desenho técnico Mesa de Jantar quadrada Branco & Preto
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 7 ‒ Maquete Mesa de Jantar quadrada Branco & Preto
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
159
Bar – Estrutura em madeira maciça fixada através de espigas envolve o caixote
confeccionado em compensado laqueado. Tampo superior em vidro com moldura em
madeira maciça fixado a 45º. Designer: Loja Branco & Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 8 Desenho técnico Bar
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
160
Figura 9 ‒Maquete bar
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
161
Banqueta – Em madeira maciça sistema estrutural constituído por junções elaboradas
através de espigas e assento de pluma ou crina e revestido com tecidos criados pelos
arquitetos sócios da loja. Designer: Loja Branco & Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 10 ‒ Desenho técnico Banqueta
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 11 ‒ Maquete banqueta
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
162
Biombo – Em madeira maciça junções elaboradas através de espigas e fechamento
superior montado a 45. Com fechamento com palhinha. Designer: Loja Branco & Preto.
Produção: Década de 1950.
Figura 12 Desenho técnico biombo
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 13 ‒ Maquete biombo
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
163
Aparador 1 – Confeccionado em compensado revestido com lâmina de madeira natural.
Tem quatro gavetas com as frentes recobertas por laminado melamínico e um segundo
móvel de apoio, com tampo em compensado revestido com lâmina de madeira natural e
pés em madeira maciça roliça. Designer: Loja Branco & Preto. Produção: Década de 1950
Figura 14 Desenho técnico Aparador 1
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
164
Figura 15 ‒ Maquete Aparador
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
165
Aparador 2 – Produzido em compensado revestido com lâmina de madeira natural. Tem
quatro gavetas com as frentes recobertas por laminado melamínico e pés em madeira
maciça roliça. Designer: Loja Branco & Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 16 ‒ Desenho técnico Aparador 2
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
166
Figura 17 ‒ Maquete Aparador 2
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
167
Mesas de centro – tampo em mármore branco Carrara e base em estrutura tubular com
aplicação de pintura preta. Designer: Loja Branco & Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 18 – Desenho técnico Mesa de Centro
Fonte: Desenho elaborado pelo autor.
Figura 19 – Maquete mesa de centro
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
168
Mesas de apoio – Produzidas com tampos em compensado revestidas com lamina de
madeira natural e pés em madeira maciça roliça. Confeccionada em diferentes dimensões e
utilizadas como mesa de centro ou lateral. Designer: Loja Branco & Preto. Produção:
Década de 1950.
Figura 20 ‒ Desenho técnico Mesas de Apoio
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
169
Figura 21 ‒ Maquete Mesas de Apoio
Fonte: Maquetes elaboradas pelo autor.
170
Mesa quadrada – Com tampo em compensado, revestimento em lâmina de madeira
natural e pés em madeira maciça com junções elaboradas através de espigas. Designer:
Loja Branco &Preto. Produção: Década de 1950.
Figura 22 ‒ Desenho técnico Mesa Quadrada
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
.
Figura 23 ‒ Maquete Mesa Quadrada
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
171
Cadeira em Palhinha – 1952 em madeira, com encosto modelado a fim de propiciar
maior conforto. Assento e encosto em palhinha com travas inferiores torneadas. Destaque
para os travamentos laterais, que são mais baixos do que o frontal e o posterior, resultando
em maior resistência para a peça. Sistema estrutural constituído por junções elaboradas
através de espigas. Designer: Jacob Ruchti. Dimensões: Larg. 0,46 / Alt. 0,85 / Prof.
0,48m.
Figura 24 ‒ Desenho técnico Cadeira em Palhinha
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
172
Figura 25 Cadeira de Palhinha Passado Composto
Fonte: Passado Composto.
Figura 26 – Cadeira de Palhinha Etel Interiores
Fonte: Etel Interiores.
173
Mesa de Jantar Branco Preto com estrutura em madeira torneada. Trava central fixada
através de espigas, inclusive o tampo constituído por quadro montado a 45º em
compensado revestido com lâmina de madeira natural. Designer: Miguel Forte. Produção:
Década de 1950. Dimensões: Larg. 3,25 / Alt. 0,76 / Prof. 1,20m
Figura 27 ‒ Desenho técnico Mesa de Jantar Branco & Preto
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
174
Figura 28 ‒ Mesa de Jantar Branco & Preto
Fonte: Passado Composto.
Figura 29 ‒ Mesa de Jantar Branco & Preto
Fonte: Etel Interiores.
175
Mesa Aranha – 1952 com estrutura em madeira modelada fixada através de taliscas e
unida através do sistema a meia-madeira. Tampo superior em vidro e tampo inferior em
compensado revestido com lâmina de madeira natural. Designer: Roberto Aflalo.
Produção: Década de 1950. Dimensões: D = 1,20/ Alt. 0,40m
Figura 30 ‒ Desenho técnico Mesa Aranha
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 30 ‒ Mesa Aranha (1952) ‒ Roberto Aflalo ‒ (D = 1,20 / Alt. 0,40m)
Fonte: Etel Interiores.
176
Mesa de Ripas constituída por réguas de madeira. É composta por uma base com estrutura
em madeiras fixadas por espigas e réguas superiores fixadas através de cavilhas. Designer:
Equipe Branco & Preto. Produção: Década de 1950. Dimensões: Larg. 1,50 / Alt. 0,30 / Prof.
0,75m
Figura 31 ‒Desenho técnico Mesa de Ripas
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
177
Figura 32 ‒ Mesa de Ripas
Fonte: Etel Interiores.
178
Mesa de duas cores – base composta por réguas de madeira. Desenho marcado pela
sobreposição de retas. Tampo constituído por quadro montado a 45º que emoldura o vidro.
Sua transparência valoriza o desenho da base. Designer: Equipe Branco & Preto.
Produção: Década de 1950. Dimensões: Larg. 1,50 / Alt. 0,30 / Prof. 0,75m
Figura 33 ‒Desenho técnico Poltrona R3
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
179
Figura 34 ‒ Mesa duas cores
Fonte: Etel Interiores.
180
Poltrona/sofá M1 – 1952 com estrutura em madeiras fixadas através de espigas. Assento e
encosto preenchidos com pluma ou crina e revestidos com tecidos criados pelo grupo.
Designer: Carlos Millan. Poltrona Dimensões: Larg. 0,69 / Alt. 0,70 / Prof. 0,715m
Figura 35 Desenho técnico Poltrona M1
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
181
Figura 36 ‒ Poltrona M1
Fonte: Etel Interiores
182
Sofá M1 - 1952
Dimensões: Larg. 2.00 / Alt. 0,70 / Prof. 0,75m
Figura 37‒ Desenho técnico Sofá M1
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor, com base no desenho de ACAYABA, 1994, p. 78.
183
Sofá MR7 com estrutura em madeira. Pernas frontais fixadas aos braços através de talisca e
as demais peças da estrutura fixadas através de espigas. Destaque para o detalhe da moldura
interna do quadro principal que estrutura o sofá, tendo o assento e o encosto preenchidos com
pluma ou crina e revestidos tradicionalmente com tecidos criados pelos arquitetos sócios da
loja. Designer: Miguel Forte e Jacob Ruchti. Produção: Década de 1950. Dimensões: Larg.
0,72 / Alt. 0,77/ Prof. 0,79m
Figura 38 ‒ Desenho técnico Poltrona MR7
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
184
Figura 39 ‒ Poltrona MR7
Fonte: Etel Interiores.
185
Sofá MR7 – estrutura em madeira fixada através de espigas formando um requadro
montado a 45° e com moldura que recebe uma moldura menor, a qual, assim como a
primeira, é também montada a 45°, criando um detalhe no desenho. É interessante notar
que a peça apresenta um pé central que serve como reforço para equilibrar o peso e não
selar a peça central da estrutura de madeira. Assento preenchido com pluma ou crina e
revestido possivelmente com tecidos criados pelos arquitetos sócios da loja. Designer:
Miguel Forte e Jacob Ruchti. Produção: Década de 1950. Dimensões: Larg. 2,44 / Alt.
0,77/ Prof. 0,79m
Figura 40 ‒ Desenho técnico Sofá MR7
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
186
Figura 41 ‒ Sofá MR7
Fonte: Etel Interiores.
187
Sofá M3 – 1952 com estrutura em madeira, braços modelados, estrutura fixada através de
espigas e pés torneados. Assento e encosto preenchidos com pluma ou crina e revestidos
com tecidos criados pelos arquitetos sócios da loja. Designer: Miguel Forte e Jacob Ruchti.
Dimensões: Larg. 2,77 / Alt. 0,72/ Prof. 0,77m
Figura 42 ‒Desenho técnico Sofá M3
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
188
Figura 43 Sofá M3
Fonte: Etel Interiores.
189
Cadeira Aflalo 1953 com estrutura em ferro. Opção com assento e encosto com moldura
em madeira e palhinha ou com assento preenchido com pluma ou crina e revestido com
tecidos criados pelos arquitetos sócios da loja. Designer: Roberto Aflalo.
Figura 44 Desenho técnico Cadeira Aflalo
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor, com base no desenho de ACAYABA, 1994, p. 74.
190
Figura 45 ‒ Maquete fisica Cadeira Aflalo
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
191
• Escrivaninha Millan 1952 – estrutura tubular com módulo individual de gavetas que pode
ser duplicado; o tampo apresenta o requadro a 45° tradicional dos móveis da loja e é
revestido com laminado melamínico. Designer: Carlos Millan. Dimensões: Larg. 1.20 /
Alt. 0,71 / Prof. 0,65m
Figura 46 Desenho técnico Escrivaninha Carlos Millan
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
192
Figura 47 ‒ Detalhes construtivos de gavetas e perspectiva Escrivaninha Millan
Fonte: Redesenhos elaborado pelo autor.
193
Figura 48 ‒ Maquete fisica Escrivaninha Millan
Fonte: Maquete elaborada pelo autor.
194
Poltrona R3- 1952 com estrutura em madeira maciça. Travas inferiores fixadas com
espigas, junção dos braços com as pernas a 45°, fixados com taliscas. Destaque para a
utilização de peças esbeltas na confecção da estrutura. Assento e encosto preenchidos com
pluma ou crina e revestidos com tecidos criados pelos arquitetos sócios da loja. Designer:
Jacob Ruchti. Dimensões: Larg. 0,62 / Alt. 0,725 / Prof. 0,77m
Figura 49 ‒ Desenho técnico Poltrona R3
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
195
Figura 50 Estrutura Poltrona R3 com detalhes construtivos
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
196
Figura 51 Estrutura Poltrona R3 com detalhes construtivos
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
197
Figura 52 ‒ Junta de topo na meia esquadria com talisca
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
198
Figura 53 ‒ Junções com espiga
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 54 – Espiga àmeia madeira
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
Figura 55 – Espiga tradicional
Fonte: Redesenho elaborado pelo autor.
199
Figura 56 Poltrona R3
Fonte: Etel Interiores.
200
Anexo 2
Depoimento Arquiteto Romeu Castro de Souza
09/10/2012
Eu sempre quis ser arquiteto. Quando tinha menos de 10 anos e morava em Niterói eu
vivia pegando argila, a tabatinga no rio, e ficava fazendo casinha. Sempre gostando da coisa
da construção, a arquitetura está implícita aí, com a construção das maquetinhas de barro. Em
1940 viemos para São Paulo. Em 1949 eu tinha acabado de terminar o Científico. Com 18
anos prestei exame na Poli, só para ver como funcionava e nem foi para arquitetura. Arrumei
um serviço no Tribunal Eleitoral e fiquei até o final de 1952. Em 1953 conheci Millan, recémformado, que tinha acabado de inaugurar a Branco & Preto. A loja abriu em 17 de dezembro.
Em 1955 eles estavam precisando de um desenhista para os interiores. As decorações, os
projetinhos e os móveis que eles bolavam tinham que ser em escala 1:1 para ir para a
marcenaria, tapeçaria, serralheria, tudo o que estaria interferindo na produção dos móveis. Fui
para a Branco & Preto em janeiro de 1955 e fiquei até 1962 (7 anos). Comecei com desenho.
Eles pegavam os projetos das casas: um living, uma sala de jantar, um dormitório – fosse o
cômodo que fosse. A Branco & Preto desenhava os móveis como fazem até hoje.
Dificilmente trabalhavam com móveis especiais. Porque isso até hoje é complicado, é
específico, perde-se um tempo e para as firmas onera muito o retorno, o custo/benefício não é
bom.
Eles começaram projetando para cada uso um desenho, por exemplo, uma
escrivaninha simples ou dupla com dois gaveteiros diferentes, toda em madeira. Eles tinham
elegido as características da madeira que seriam utilizadas na loja Branco & Preto: era
compensado; quando não era maciço era revestido com lâmina de jacarandá-da-bahia,
cabreúva, caviúna. Pau-marfim dificilmente era utilizado no seu estado naturalse Fazia a
estrutura da cadeira ou da poltrona de madeira muito fechadinha, muito boa, que recebia laca
preta ou branca. Todas as lacas eram no marfim, não eram no cedro e nem em outra, mas
podia ser caviúna, que é dura também, mas o marfim era uma madeira gentil. Falava-se tanto
em marfim que ele passou a ser usado por outros fabricantes que não tiveram cuidado. Agora,
há um ano e meio, que voltou o móvel claro, tudo em marfim, porque ficou um bom tempo
sem ter o estoque natural, que esgotou. É uma madeira muito boa para laquear ou encerar.
Móveis como sofá, poltrona, cadeira, mesa, sala de jantar em geral, buffet, escrivaninha,
cadeira de escrivaninha, poltroninha – isso eles não faziam especial, só quando era uma
201
estante de livros ou um dormitório com lambri. Os móveis totalmente especiais eram para um
local com características da Branco & Preto, as madeiras e os estofados quando havia.
O móvel era pensado para se relacionar com a arquitetura do local. Porque eles
estavam inseridos nesse conceito. Quando foi criada, a Branco & Preto fazia os móveis de
acordo com os projetos que estavam surgindo. Na década de 50 eles estavam com bastante
serviço e o móvel que você encontrava no mercado era aquele famoso estofado com pezinho
de madeira. Havia um relacionamento entre a estrutura do móvel em si e o desenho da casa.
Quando o móvel era especial, era especial mesmo! Nada de aproveitar módulo. Mas eles
tentavam; encaixavam os móveis da loja nos projetos – uma cadeirinha, complementos,
poltrona… era feito assim. Dificilmente se mexia no projeto que vinha. Eles faziam ajustes,
mas não mexiam na arquitetura, não derrubavam parede de parte construtiva, só aproveitavam
o espaço existente e, em um ou outro caso, alteravam divisórias de escritórios ou de casas.
Dificilmente se mexia na construção da arquitetura de interiores. O intuito mesmo era colocar
o mobiliário da Branco & Preto, encaixando, harmonizando com o espaço existente. Às vezes
as casas já vinham com armário embutido de cozinha. Não eram executados móveis com
desenho de outros arquitetos, eram colocados somente os móveis da Branco & Preto,
principalmente os já de produção. E eventualmente os especiais para dormitório, para
divisória de um móvel ou de um ambiente.
Eles tinham o que há de melhor de marceneiro e tapeceiro. Até hoje você vê peças de
uma loja Forma e uma L’Atelier, que surgiu logo depois. Tinha o Tenreiro, português que
começou no Rio de Janeiro. Ótimo! Ele era marceneiro, tinha jeito para decoração, para
projeto, mas era homem de bancada. Existia uma relação amistosa com os outros designers.
Em uma ocasião, entra um cidadão na loja da Vieira de Carvalho chamado Michel Arnoult,
perto da praça da República. Ele falou: – Vou ser concorrente de vocês, nesta avenida, vindo
para o largo do Arouche, no fim da Vieira de Carvalho, em frente à loja de tapetes. Estamos
alugando esse local para fabricar móveis e vai se chamar Mobília Contemporânea. Vamos
produzir móveis com uma característica: serão vendidos em supermercados. – Os
supermercados estavam começando a surgir, nessa época eles vinham ainda engatinhando,
havia só um ou outro. – Você pega o móvel na prateleira, leva para casa e monta. – Isso foi
revolucionário para São Paulo e para o Brasil.
Os móveis dele eram bem desenhados, combinavam com a arquitetura moderna.
Usavam o pau-ferro, tubo encaixado com cavilha e aparafusado na parte estofada. Você
chegava em casa com o pacote e com o prospecto e montava. Ficaram amigos, ele e os
arquitetos. Era designer, conhecia muita marcenaria e muita serralheria. A Mobília
202
Contemporânea evoluiu tanto que, com o tempo, ele fechou a loja e montou a Móveis em
Pacote. O Tenreiro virou amigo, fechou a loja em São Paulo e continuou no Rio de Janeiro.
Havia também a Ambiente, de quem também eram amigos, como o arquiteto que fazia os
projetos e o italiano, eles ficaram muito amigos do Aflalo e do Plínio Croce.
A L’Atelier era do grupo Fundições Brasil, que fazia fechaduras com desenho
especial, de designer mesmo. Fechou há pouco tempo e mudou de nome, virou Concept
Fechaduras e Chaves. Eles montaram a loja, um atelier, e pegaram o Jorge Zalszupin,
arquiteto nascido na França com origem judaica. Ficaram amigos e iam pesquisar, conversar,
trocar ideias; havia um relacionamento dos outros projetistas da loja Ambiente com o Jorge
Zalszupin do L’Atelier.
Michel Arnoult da Mobília Contemporânea fez sucesso, participando de uma época
em que a Branco & Preto acabou fechando. Porque a Branco & Preto, com o caminhar das
coisas, dos seis arquitetos que tinha no início, três de cara saíram e, com um ano e pouco, saiu
o Plínio Croce, sócio do Aflalo. O Jacob Ruchti já era antigo quando abriram a loja. Tinha o I
Chen Hwa que se formou na China. Ele era de família industrial que veio para o Brasil,
ficando no Rio Grande do Sul. Chen foi para Nova York recém-formado, trabalhou com
Philip Johnson, que foi discípulo de Mies van Der Rohe, mas não ficou muito tempo. Veio
para São Paulo e foi trabalhar com Aflalo, logo em seguida, em 1951. Ele tinha uma certa
grana e foi convidado para ser sócio da Branco & Preto. Ele ficou pouco mais de um ano
porque o chamaram de volta para dirigir a indústria da família e então ele se afastou
temporariamente da arquitetura. Quando foi lançado o livro da Marlene no MASP, em 1993, o
Miguel Forte estava na exposição, assinando os livros, e me deu o dele. Eu estava olhando os
projetos da Branco & Preto, veio um chinês e eu pensei, eu conheço esse cara. Ele olhou para
mim e foi quase que momentâneo, eu falei – Chen! E ele falou – Romeu! Porque tivemos
bastante contato na Branco & Preto, por causa do desenho. Ele é o mais perfeito que eu vi até
hoje, era um artista. Os arquitetos pediam para ele desenhar as perspectivas do exterior, os
jardins, ele fazia as folhagens, as árvores tinham a aparência da estação do ano, secas no
inverno. Não deu tempo para ele projetar os móveis. Ele participava das reuniões. Quando um
tinha uma ideia para fazer um móvel eles se reuniam, de preferência os seis, para ver se valia
à pena continuar. Detalhavam até o produto final ou, se não, encostavam. Aquele móvel
recebia o nome do criador, com as iniciais dos seus nomes. Os móveis em geral eram
esmiuçados, iam ao detalhe total, explorando as características naturais da aparência,
estruturas, durabilidade da madeira, dos tecidos, enfim, de tudo o que iria intervir naquele
móvel em questão, e dos móveis em geral, porque essa era a intenção deles. Então eles
203
exploravam ao máximo o material a ser empregado. O Tenreiro era um que fazia isso
também. A Branco & Preto via encaixes, não se via parafuso e sim espiga, cavilha, andorinha
nas gavetas.
Os três arquitetos que citei no começo: o Chen, o Plínio Croce e o Jacob tinham como
clientes o Banco Itaú, o Oscar Americano, a Eucatex que fez uma bela loja na Augusta. O
Aflalo ganhou o projeto da Peugeot. Miguel Forte, grande conhecedor, de grande capacidade,
de uma cultura tremenda, deu aula no Mackenzie; faleceu 5 ou 6 anos atrás. Millan, Miguel e
Aflalo também já faleceram. Millan ia de manhã dar aula no Mackenzie e depois na FAU e à
tarde ia para a Branco & Preto para ver como estavam as coisas. Miguel era o contrário – ia
para a loja na parte da manhã e o Aflalo variava. Então os três estavam sempre presentes e
atuantes. Tinha também a parte dos tecidos, que eram fabricados pelo sogro do Miguel, o
Forte Fileppo. Os desenhos eram exclusivos e cada um tinha sua razão de ser e as cores
também. Os tecidos eram desenhados por Miguel e Jacob. A mulher do Jacob fez Belas Artes,
o curso de Artes Gráficas. Era aluna do Jacob e acabou casando com ele, que era muito ligado
com desenho de tecido, tanto quanto confecções. O Millan era de projeto geral, a parte de
interiores, “decorações”, e o Miguel também pegava a parte administrativa.
O ponto de encontro com os outros arquitetos era o IAB, cujo projeto é do Miguel e do
Jacob. As grandes coisas saíam dali. Na época do golpe militar, o Artigas e todo mundo iam
para lá, as reuniões deles aconteciam lá.
Com o passar do tempo começaram a pegar bastante serviço. Millan pegou o Paineiras
do Morumbi. Tinha ganhado já o Jockey Clube no Largo São Francisco, em frente da
Faculdade de Direito. Não fizeram, mas era um belo projeto. A Peugeot em Buenos Aires
também, mas acabou não sendo construída. Em 1957 resolveram abrir uma loja na Rua
Augusta pois, além de ter os móveis, o foco era os tecidos. A Augusta fervilhava, era a rua
coqueluche da cidade. A Companhia Paulista de Estrada de Ferro tinha uma bitola de 1,60m
enquanto os outros tinham 1,00 m a 1,20 m de largura. Os trens luxuosos tinham os carros
pullman que iam de São Paulo até Campinas e levavam duas horas. A firma procurou a
Branco & Preto para decorar os vagões, desde os dormitórios à parte cultural, ligada à livraria
e à gastronomia, um negócio espetacular. O interessante é que eu estava desenhando nessa
época e não tinha nem entrado na faculdade ainda. O Miguel queria que desenhasse o tapete
persa na escala 1:20 e 1:50 com aquele esquema do verdadeiro tapete persa que eles tinham
em mente e eu aqui, desenhando. Já tinha apreendido muita coisa. Você vê o detalhe, o
requinte da coisa em si, quando pronta, que não fugia da ideia. A gente perdia no preço,
porque mesmo com pouca produção eles não abriam mão da qualidade, principalmente o
204
Miguel. Não fazíamos industrializado, como a Mobília Contemporânea fazia. Esse projeto
ficou todo pronto mas o orçamento não saiu. Eram três ou quatro vagões, todos com
características da Branco & Preto. Ficou famoso mas na hora do orçamento não vingou.
Outro projeto, mas esse foi feito, foi a Casa do Oscar Americano, projeto do Bratke.
A ideia era fazer móveis contemporâneos modernos, porém eles nunca deixaram de
lado a fidelidade ao passado, aos móveis clássicos. Tanto é que tem a poltrona do Miguel
Forte – o Jacob participou, mas o projeto levou o nome do Miguel. A poltrona foi executada
em jacarandá-da-bahia com o encosto de palhinha indiana, era toda torneada, o estofamento
era de um veludo especial que a Fileppo fazia, nada de outro tecido. De vez em quando
aparecia um louco que queria um estofado com listras. A Branco & Preto tinha um tecido, por
exemplo, que era branco, preto e verde-pistache, outro era preto e laranja com listras verticais.
Eles tinham treze gamas de cores – as lisas; as listradas que eles utilizam agora para essa
poltroninha não podia, só podia ser o veludo específico para aquela poltrona.
Eles tinham refletores, materiais cerâmicos, a palhinha era importada da Índia e da
Áustria e prevalecendo o detalhe típico de madeira deles. Os ferros, eles não utilizavam barras
maciças, eram tubulares. Normalmente as mesas tinham um requadro com 3 cm, sempre
meia-esquadria, nada de perpendicular. Eles não trabalhavam com fórmica porque na junção
da superfície com a espessura aparecia a linha da espessura da fórmica e eles não gostavam
disso, então usavam o requadro. Quando era tampo compensado, era o folheado. Então
sempre que tinha um requadro já se sabia que era Branco & Preto na época. As outras lojas
tinham outro tipo de desenho.
Geralmente, o estofado era com mola. As almofadas com crina animal, ou plumas para
o enchimento. Aí vinham com os tecidos. Começou a surgir a No-Sag e eles não queriam
trabalhar com ela, eram fiéis à mola horizontal, não queriam a mola helicoidal. Eles tinham
coisas muito interessantes. Não saíam da filosofia inicial, mantinham os princípios técnicos de
se manter alinhado ao produto.
Eles faziam questão, quando o protótipo estava quase pronto, de ir à oficina. Os
irmãos Malmeister, descendentes de alemães, no Bom Retiro, faziam a parte mais torneada.
Os irmãos Pássaro, descendentes de italianos – coincidência, eram três irmãos tanto em uma
quanto na outra – faziam mais a parte reta de folheado. Tampo de mesa, estrutura de sofá, o
que era torneado era dos irmãos Malmeister.
Eles tinham os particulares deles. Tudo era pensado, até o estoque. E também a parte
intelectual, de não popularizar muito, eram sabidos, queriam manter o melhor. Aflalo,
querendo abrir mais o leque, numa boa, mas o Miguel restringiu mais a produção. Eles
205
começaram a pegar muito serviço nos escritórios de arquitetura, o qual predominava mais
sobre a loja, onde faltava uma injeção. Mesmo assim, no final, fecharam a loja de tecidos em
1970.
Ficaram durante 20 anos dos quais eu fiz parte até 1962. Saí e fui trabalhar em outro
lugar. A minha turma é de 1963. Colamos grau em 1964 no Teatro Municipal, o paraninfo foi
João Goulart, Presidente da República. Foi quando teve a Revolução. Millan foi nosso
patrono e fez um belo discurso. Millan morreu 1964 com a família. Estava discutindo um
projeto para a IBM, a implantação, o estudo preliminar. Tinha ido trabalhar e aproveitou para
passear com a família.
Fizeram escola, houve muita cópia. O Zanine, o Sérgio Rodrigues, os Irmãos
Campana, são móveis especulativos, no bom sentido, como o próprio Le Corbusier com a
poltrona dele. Nada muito industrializado. No último contato que tive com o Michel Arnault
ele estava fazendo móveis em pacote, era em Pinheiros a fábrica. Fui com a minha mulher e
ele falou: – Vai se chamar Móveis em Pacote. A Mobília Contemporânea tinha fechado. –
Que tal o móvel? – Bacana, falei. Então ele falou: – Parando isso vou para a Ilha Grande. E lá
foi ele, se afastou e depois morreu. Foi um cara muito bacana.
A Hobjeto tinha muita coisa assim, geralmente tem um marceneiro por trás. Com o
Tenreiro era assim; fechou, não porque foi obrigado, mas porque ele quis.
Na faculdade dávamos a matéria de interiores. Tinha visita às fábricas e ainda
pegamos a L’Atelier na Mooca, na Rua dos Trilhos. Enorme a produção, mas era mais ligada
a escritórios. A Mobília Contemporânea do Michel abriu, fechou, abriu, fechou com uma
proposta mais industrial, a Hobjeto era idêntica.
Eu me lembro de um acontecimento específico: a Bienal de São Paulo, com Philip
Johnson, Frank Lloyd Wright (muito conhecido de Miguel), Salvador Candia, Miguel, Aflalo,
Jacob e outros. No IAB aconteciam conferências, palestras, exposições de arquitetura. Sérgio
Bernardo trabalhava com arquitetura, era muito bom arquiteto. Vira e mexe estava em São
Paulo. Ele tinha uma arquitetura que tendia para o colonial português. Quando era móvel
moderno, era Branco & Preto. Ele, Niemeyer, Miguel Pereira comandavam, os irmãos
Roberto, M&M Roberto. O Rino Levi teve Miguel Forte, Millan e Aflalo como seus
funcionários. Muita coisa foi aprendida, casas que ele indicava. Nessa época os arquitetos
paulistas eram da arquitetura moderna – ou Mies, limpo racional e claro, ou então Frank
Lloyd Wright. Não tinham uma coisa programada de mídia, era boca a boca e mala-direta.
Dificilmente um móvel, fosse ele qual fosse, voltava de cliente, mesmo por acidente, porque
bateu e quebrou, ou mesmo porque estava mal colado, mal executado, para conserto. Eu
206
colocaria até como possibilidade nula. Em qualquer alteração que precisasse fazer na
fabricação estrutural ou estética eles acompanhavam todo o processo. Dificilmente faziam
pernas de sofá e poltronas retinhas, havia a ilusão de ótica. A elegância do produto final, a
visão combinando o material do ferro para mesinhas, estofados.
Para o nome para a loja, Leonardo da Vinci surgiu como opção optaram por Branco &
Preto que são cores clássicas, uma completa a outra, interessante. Eles pensavam em ampliar,
mas o custo… eram todos trabalhadores, nada de fortuna herdada, ganhavam dinheiro
trabalhando. Eram trabalhadores normais, com diploma. O interessante é que não tinha
discórdia e nem vaidade, era amizade e sinceridade, respeitavam as opiniões. O que aconteceu
foram as coisas extraloja, os escritórios que tinham que olhar também. Havia uma estrutura
montada, funcionários, a própria loja em si. Levavam muito a sério, dependiam
exclusivamente de trabalho, incluindo a parte de magistério que o Aflalo não quis. O Jacob
deu aula, depois largou, o Millan ia, depois faleceu. O Miguel ficou no Mackenzie, o Plínio na
FAU e o Chen ganhando dinheiro no Sul e depois foi para Salvador na Bahia, não sei como
ele está agora. Foi esvaziando, e com a tendência, a loja da Augusta com menos trabalho com
a venda de tecidos que já existiam, só aumentavam um pouco a gama de cores e passaram a
funcionar assim, e foram fechando. Mas mantiveram o nome de qualidade. Não foi uma
quebra, fecharam naturalmente porque prevaleceram os escritórios de arquitetura, na profissão
propriamente dita, como arquitetos. Não ampliavam, não contratavam mais gente para tocar.
Meio romântica, a parte comercial. Engraçado que com os próprios concorrentes aconteceram
as mesmas coisas, como já citei anteriormente. A Ambiente, a Hobjeto, todas participaram da
mesma época do mesmo tipo de atuação da fabricação dos móveis modernos.
O interessante da Branco & Preto é que eles mantiveram a fidelidade, o valor ao
material que era empregado, à concepção e de acordo com a arquitetura, eles conseguiram.
Andaram copiando as poltronas mas havia a qualidade da mão de obra do profissional. Não
houve herança, como com os japoneses, os espanhóis e os italianos. A Branco& Preto
começou e terminou da mesma forma. Não ficou ultrapassada, porque era muita adiantada.
Sempre contemporânea, é um clássico.
Miguel teve dois filhos homens, o Millan teve 5 filhos, 3 mulheres ficaram – a Marta
que é arquiteta e o caçulinha filho do Aflalo. O Roberto é engenheiro e o Marcelo é arquiteto,
nasceu quando ele tinha acabado de entrar na Branco & Preto. O detalhe construtivo era o
centro da coisa. A preocupação com os materiais que compunham os móveis, a madeira com
o tecido, com estofamento, como é construído o espaço que é ocupado, tudo isso havia. A
preocupação atual na casa com o mobiliário não existe mais, não se tem preocupação com o
207
espaço arquitetônico, como alvo. São exemplos que podem nortear uma produção futura
aproveitando a ideia da coisa, a filosofia, é muito interessante com o mobiliário já existente.
Eles eram donos e os projetistas e além de tudo eram arquitetos que tinham uma relação com
o mobiliário e a própria arquitetura, assim fechavam o elo.
208
Anexo 3
Depoimento de Antônio Bioni
06/10/2012
Eu fiz escola de marcenaria, tinha vocação. Estudei durante 4 anos em período integral
no Instituto Dom Bosco e, saindo, comecei a trabalhar de empregado, como meio-oficial. Isso
em 1944. Eu mudava de emprego à medida em que ia esgotando os conhecimentos a serem
aprendidos. Um dos meus mestres me deu um conselho: eu não deveria ficar mais de três anos
em uma mesma firma.
Trabalhei em uma empresa que fazia vitrines, localizada no Paraíso. Em uma das
greves da marcenaria eu comecei a fazer alguns “bicos” e percebi que ganhava mais do que
trabalhando como empregado. Mesmo tendo um emprego com um salário razoável resolvi
montar a minha marcenaria. Comecei no quintal da minha casa. Fiz um 6x4 m (24 m²) e assim
comecei. Ficava sozinho mas meu cunhado, que trabalhava fora, me ajudava nas horas de
folga e meu compadre, que também trabalhava fora, também vinha ajudar nas horas de folga
dele, aos domingos. Montamos uma sociedade em três. Um ano e meio depois mudamos para
um espaço maior, porque 24 m² era um quarto e cozinha. Isso foi em 1955.
Nessa altura, fazíamos tudo o que aparecia, mas só de encomenda. O fato de ter
mudado muito de empresa me dava um gabarito. Descobrimos então que era mais negócio
trabalhar em série, enquanto que por encomenda ficávamos limitados. O pagamento era de
30% na entrega. Quando tínhamos muito serviço, não dava para pegar mais nada e se
estávamos sem serviço tínhamos que abaixar o preço para pegar o que aparecesse e otimizar o
pessoal. Fazia-se muito armário embutido e de cozinha. O Geraldo de Barros estava na
Unilabor e desenhou um carrinho de chá e um joguinho de mesinhas. Começamos a produzir
com material de resto de exportação. Havia uma serraria que cortava as peças para
exportação, eu pegava as sobras e convertia em móvel.
Foi assim que começou a nascer o interesse para trabalhar em série, com o carrinho de
chá. Depois vieram os beliches, que inclusive foram premiados. Começamos a produzir só o
beliche para o Brasil inteiro, um pouco antes de 1964. Nesse período a fábrica tinha quinze
pessoas e se chamava Bioni Companhia Ltda., só depois apareceu a marca Hobjeto.
Quando surgiu a crise de 1964 as empresas começaram a fechar as portas, ninguém
comprava nada. Havia uma empresa em Santa Catarina que me fornecia direto para fazer o
beliche. Usinavam lá e os cavacos de madeira ruim no mato, eles deixavam no mato, para
servir como adubo. Eles me mandavam as peças aparelhadas, eu só completava a operação.
209
A linha do Geraldo, na Unilabor, era bem reta, quadradinha mesmo. Faltava um toque,
que eu coloquei, para fazer que ela ficasse mais suave. Quando a Unilabor surgiu, eu era
empregado, ganhava um salário muito bom. Eu tinha algumas máquinas serra de fita que
vinham dos Estados Unidos. O Geraldo eu não conhecia mas ele tinha um amigo, que depois
virou padre dominicano, que era marceneiro e muito amigo meu, de infância. Eles me
convidaram para participar. Eu não aceitei, mas cedi a máquina para eles começarem a
trabalhar e acompanhei a empresa desde o início. Vi o crescimento dela e o desastre final
também. Eles perderam o sentido de cooperação. Enquanto eles não tinham nada, estavam
ganhando, mas a história diz que o estômago de marceneiro é igual ao do faxineiro, há
igualdade. O economista comunista, que era o Cláudio, também sentiu a impossibilidade de
continuar trabalhando lá. Ele tinha automóvel, uma vida mais cara, não dava para sobreviver
lá. O Geraldo tinha o Banco do Brasil, podia se dar ao luxo de ganhar um salário mínimo ou
meio salário, era mais o prazer de socializar a coisa e de ajudar o frei.
A Unilabor resolveu dispensar o Geraldo, por sugestão de um economista, que achou
que estava pesado o salário que ele ganhava. Ele ficou disponível para tocar algum outro
negócio. Nessas alturas ele fazia projetos para algumas encomendas altamente sofisticadas,
nós executávamos e dávamos uma comissão para ele. Depois ele virou meu sócio.
Arrumamos um dinheiro emprestado com o dono da Gessy Lever e compramos o galpão dos
fundos da minha marcenaria.
A empresa disparou e começou a crescer. A marca Hobjeto começou a ser utilizada
antes de 1964. Com a entrada do Geraldo de Barros sentimos a crise e quase fomos. Perdi um
dos sócios que também era funcionário do Banco do Brasil, ele fugiu da briga. Nós tivemos
que arcar com todos os problemas da crise de 1964. A grande sacada é que eu falei para
aquele fornecedor de Santa Catarina que eu não tinha condição de pagar porque estava sem
receber. Ele falou que confiava em nós porque éramos gente honesta e que quando passasse a
crise a gente ia sentar e acertar. Reduzi as horas extras para diminuir os nossos gastos e me
limitava a produzir só o necessário para não ter que dispensar operário. Isso era contra os
meus princípios, para mim era a morte, não era do meu feitio. Então conseguimos sobreviver
esse tempo.
Quando a crise passou percebemos que era melhor o beliche ser anunciado para venda
direta ao consumidor. Aparecia no jornal Folha de São Paulo um anúncio de meia-página com
o beliche Hobjeto de 120 por 60 cm e começamos a entregar direto ao consumidor, porque
antes era somente para o atacado, eram empresas que compravam o nosso móvel para
revender. Nós tínhamos entre 15 e 20 funcionários e já vendíamos para os grandes magazines:
210
Mappin e Mesbla. Mas não era um bom negócio. Quando se pensava em fazer um reajuste
eles vinham com a história de que a gente ia aparecer no jornais como fornecedor deles na
feira do móvel e então eles pediam um desconto. Faturávamos para o Mappin a 120 dias. No
caixa eles descontavam o cheque deles mesmos a juros de ladrão e a gente era obrigado a
perder dinheiro.
Chegamos à conclusão que a venda direta era a solução. Aí o Geraldo desenhou uma
linha de móveis, fizemos os protótipos das primeiras peças e oferecemos para a Unilabor.
Para salvá-la, fizemos um contrato – eles nos davam uma participação de 5% em cima do
faturamento, o que era um bom negócio. Eu queria gerenciar o projeto, queria acompanhar,
mas eles me falaram que eu não ia gerenciar nada, só iria receber a minha comissão. Eu queria
que tivesse sucesso e queria acompanhar porque havia uma série de soluções técnicas. Eu era
o pai da criança, sabia como tudo tinha que ser feito mas eles não entenderam e eu
simplesmente rasguei um contrato milionário. Falei com o Geraldo para pegarmos os
protótipos e procurarmos uma loja.
Abrimos uma loja em frente ao Clube Pinheiros, perto do Shopping Iguatemi. Quando
o shopping foi para lá eu li a pesquisa e comprei cotas. O poder aquisitivo era fantástico então
fomos procurar uma loja. Encontramos um tapeceiro querendo fechar e o Geraldo falou que
aquele era um ponto bom, que era para eu negociar porque ele tinha que ir para o banco.
Geraldo trabalhava na mecanizada, antes de chegar a computação, então era uma barulheira
lá. Ele era chefe de seção e várias vezes usamos o balcão do Banco do Brasil para solucionar
problemas de encomenda. A Unilabor me mandava para vender na minha lojinha coisas que
eu não produzia. Eu vendia mesinha de chá, carrinho de chá, e eles me davam em troca outros
produtos, até faziam algumas críticas construtivas.
A Hobjeto começou com uma linha mais quadradinha, teve um período que comecei a
descobrir a madeira aglomerada e eu desenvolvi algumas coisas. Quando a Feneberg chegou
no Brasil com alguns pedaços, eu comecei a pesquisar e testar. Então o que eu fazia era
arredondar os cantos, fazia cadeira com curvas. Eu com o Geraldo começamos a mexer com o
desenho, ele fazia os traços e eu arredondava, isso é permitido, isso não é permitido, isso dá
para fazer na máquina ou não dá. Até a parte de desenho limitávamos. Tínhamos uma tupia e
uma fresa com o raio, trabalhávamos em cima das máquinas que tínhamos. Isso hoje não é
problema, a máquina opera sozinha, mas naquele tempo tinha limites, eram máquinas
convencionais.
O mobiliário era moderno. No início sentimos um pouco mais, tinha gente com
tendência que já estava insatisfeita. Os mais novos aceitavam melhor. Quando fizemos a
211
linha, fomos negociar. Falamos para o tapeceiro que estávamos com deficiência na tapeçaria
da empresa e se ele queria entrar de sócio. Ele levaria a tapeçaria dele lá para o Jabaquara, eu
montaria uma loja na Faria Lima e ele ficava sócio da empresa. Não aceitou. Fizemos uma
proposta para comprar o ponto – ele emprestava o dinheiro, eu comprava o ponto e pagaria
juros de 4%. Ele topou. Compramos o ponto sem dinheiro e alugamos o telefone dele.
Fizemos uma reforma muito simples na loja. Colocamos lajota de produção em série, fizemos
alguns arcos, tinha um forro caipira, colocamos tijolo aparente pintado de branco, passamos
um betume no chão e enceramos. Demos para a loja uma cara bem colonial mas com móveis
modernos. A loja estourou porque o Geraldo começou a utilizar muito o local para fazer
promoção. Ele fazia galeria com pintores e marcava uma exposição lá. Não fazia mais nada
sob medida.
Tínhamos uma dificuldade a associação dos arquitetos do Rio de Janeiro nós dávamos
10% e eles queriam 15 ou 20%. Eu não podia dar, porque tínhamos propaganda nas revistas
nacionais Casa Cláudia e Casa & Jardim, e às vezes mencionamos o preço e que não havia
margem. Então ameaçaram dizer para todo mundo que o nosso móvel era de produção em
série de carregação. Tivemos três lojas no Leblon, na rua Raimundo Correia, em Copacabana
que fomos obrigados a fechar.
Fui o primeiro cara no Brasil a fazer franquia porque usavam a minha marca e a minha
publicidade, que era nacional. Eu diluía muito o custo, eles só vendiam e em cada pedido
ganhavam 20% de comissão e mais 4% se eles assumissem que o cliente pagava, porque se
não ele pagava, a opção era dele.
Quando iniciamos, ainda não tinha a facilidade para entregar em outros estados.
Tivemos que investir. Mandávamos um caminhão quase vazio para atender um ou dois
clientes até que gerou uma quantidade de um ou dois caminhões por semana.
O Geraldo conhecia todo mundo, o Tenreiro, o Randy Muller, quando ele veio ao
Brasil. Ele era nascido na Alemanha, era o papa do desenho industriall, claro que ele
precisava de algum estilista que desse uma arredondada nos cantinhos. Ia complicar um pouco
a produção mais ia dar outra graça para o móvel. Como solução para descobrir meio e formas
até hoje não conheci outro. Quando ele chegou ao Brasil ele foi na Unilabor mas eles não
tinham condição de atender e indicaram um marceneiro que chamava Bioni, que tinha uma
marcenaria pequena. Com desenho a gente se entende, então ficou fácil falar a linguagem
universal do desenho porque ele não falava uma palavra em português. Ele trouxe algumas
peças e ele operava as máquinas como um profissional de primeira linha.
212
Eu sempre tive em mente que o balanço social é melhor do que o balanço financeiro.
Para mim não justificava nada ganhar muito dinheiro e ver gente passando fome. Eu gostava
de ser o patrão que eu gostaria de ter tido quando eu era empregado. Essa filosofia eu mantive
enquanto estive na Hobjeto. A gente se misturava. Quando era primeiro de maio eu ia desfilar.
Eu era o presidente mas colocava o agasalho da empresa e jogava bola com meus
empregados. Eu convivi com eles, que não eram meus empregados, eram meus amigos. Uma
vez eu trouxe como sócio um amigo de infância que era diretor do Matarazzo. A Hobjeto
estava crescendo e ele veio para organizar. Tínhamos ajudantes 1, 2 e 3 e marceneiro 1, 2 e 3.
A Hobjeto não precisava muito de marceneiro, com seis meses fazia um profissional ficar top
para trabalhar. Ele era treinado, colocava em escolas se fosse o caso. Ele ainda tinha eu como
marceneiro, o meu sócio era marceneiro e tinha também um espanhol, excelente marceneiro,
todos profissionais dispostos a ensinar. Podíamos pegar um cara do Nordeste com um pouco
de vontade e inteligência e querendo ganhar dinheiro e em seis meses ele estava profissional.
A Branco & Preto era sofisticação, era para atender cliente exclusivo, não era móvel
de produção em série. O móvel muito bem feito, o desenho finíssimo, a qualidade era ótima.
Marcenaria de alta qualidade com um desenho também muito bom.
Havia uma razão para o crescimento da Hobjeto: começamos pequenos, concorrendo
com os gigantes. Quando fomos para a primeira feira tínhamos um stand de 4x4 m e a
Mobilínea era o centro do pavilhão. Começamos a encarar os grandes, a criar dificuldades
para eles, porque tínhamos uma filosofia diferente da deles. Eles tinham que vender muito e
achavam que aumentando o preço eles ganhavam mais. A nossa filosofia era aumentar a
clientela, aumentar a capacidade de produção e, reduzindo os custos do nosso produto,
crescemos na sombra deles. Eles pensavam na vaidade e nós investíamos na Hobjeto.
A loja começou em 1955 com 15 funcionários e eu fiquei lá durante 30 anos. Fechou
15 anos depois que eu saí, com 600 funcionários. Eu tinha uma empresa que fazia hotéis, que
fez o New Palace no Rio de Janeiro e parte do Maksoud Plaza em São Paulo. Tinha também a
que fazia 20% de peças para a Yamaha e a indústria automobilística e 70% para a Hobjeto, os
móveis e as estruturas em tubo. Eu tinha um marceneiro que era um prototipista. Ele era um
libanês que foi marceneiro da rainha da Inglaterra e fez todas as miniaturas da Hobjeto.
Chamava Elias Asfour, era o melhor profissional que passou na minha frente.
Eu viajava com o Geraldo que conhecia muitas línguas. A gente visitava as feiras de
Milão, Paris, visitamos quase todas as fábricas da Alemanha. O Geraldo foi ao consulado
alemão, disse que era designer e pegou uma carta de apresentação que abriu as portas para
nós. Trouxe 65 quilos de catálogos. Tinha sempre na gaveta um produto novo. Quando
213
fizemos a linha de aglomerado com cantos arredondados, uma linha fantástica, os alemães
falavam que tínhamos chegado a resultados que eles que inventaram não chegaram. Nós
tínhamos até ferragens próprias. A linha era quase completa, só não tinha cozinha. Mas tinha
algumas peças que entravam na cozinha. O aglomerado foi adotado.
A Duratex foi me fazer uma visita na fábrica e tinha feito um encosto da cadeira que
tinha os pezinhos quadradinhos. Com as sobras da exportação fazia o encosto: colava de
forma alternada uma lâmina de Duratex com outra lâmina de Duratex e depois revestia com
jacarandá. Todos juravam que era jacarandá maciço – éramos muito criativos. O sucesso do
negócio é ter pessoas criativas. O aglomerado tinha algumas camadas: uma fofa, cascalho, 2
médias e 2 finas para acabamento. Eu colava duas placas para ter o centro duro. Para massear
testamos tudo até descobrirmos a massa plástica. Conseguimos patente na Itália e nos Estados
Unidos de processos para o acabamento do topo. Depois a Sayerlack desenvolveu uma massa
para nós. A Mobília Contemporânea usava a madeira maciça. A Oca tinha muita coisa em
jacarandá, inclusive algumas poltronas.
O Zanine tinha um desenho fantástico que talvez não soube explorar comercialmente,
mas a ideia era interessante. Para alguns clientes que estavam começando nós falávamos para
primeiro comprar Tok&Stok e depois comprar Hobjeto para que eles tivessem a ideia
comercial. O Geraldo pegava o lápis, desenhava o móvel de baixo para cima, os rabiscos
diziam tudo, ele tinha uma facilidade monstro. Tínhamos como
concorrentes diretos a
Mobília Contemporânea e a Mobilínea.
Nosso piso salarial era de 3 salários mínimos enquanto que o por lei era de 2. E ainda
tinha o prêmio de produtividade, assistência médica, essas regalias todas e um bom salário.
Nós pensávamos no lucro sem esquecer do balanço social. Tínhamos até psicólogos que iam
às casas para ver como os nossos funcionários viviam. Quando acontecia uma chuva que
descobria a casa deles eu tinha uma caixinha de socorro. Eles não esqueciam e vestiam a
camisa. Quem era ruim no emprego e que também ficava no prejuízo no prêmio de
produtividade, eles tratavam de gelar. Não precisava mandar ninguém embora, eles iam
sozinhos, os próprios funcionários se encarregavam de fiscalizar, de forma natural. Tínhamos
10 a 12 lojas e a nossa em São Paulo.
Antes de eu sair eu tinha uma proposta para me aposentar, arrumar uma sala para os
aposentados, com mesa de snooker, geladeira farta e jogo de xadrez e deixar a administração
por conta deles (dos mais jovens). Tinha outra proposta para fazer a divisão de lucro,
perguntava quanto eles queriam de lucro livre depois do imposto de renda – 10% está bom?
Que era o que tínhamos e o que sobrava era deles. Ia dar por cota, não por salário. Explicava
214
para eles que quando eles jogavam uma lixa fora ia doer no bolso deles. Quando eu saí
estávamos com 600 funcionários na organização toda.
A minha saída da Hobjeto foi uma questão de saúde. Semanalmente eu ia ao
cardiologista no INCOR. Todos os dias eu fazia uma dieta e o colesterol não baixava. Uma
vez eu fui na padaria tomar um café, junto com um primo que tinha uma banca de jornal.
Parei minha Mercedes quase zero, importada. Entrei e pedi uma média e um pão sem
manteiga e o rapaz que me atendeu falou para o meu primo, mas eu ouvi, que eu era
miserável. Que eu andava de Mercedes e, para economizar trinta centavos, comia pão sem
manteiga. Meu primo começou a rir e eu idem. Fui para a fábrica e comecei a pensar: eu
tenho um apartamento no Guarujá com cinco suítes, ando de Mercedes, ganho mais de cem
mil por mês, e não posso comer pão com manteiga!
Eu lembro que estava fazendo um serviço para o Ribas Marinho, que era o secretário
da Ordem dos Advogados do Brasil e ele me disse que virava dia e noite na máquina de
escrever, ganhava muito dinheiro mas não tinha tempo para gastar. Um dia falei para o meu
sócio que estava indo embora e ele falou – está louco? E eu respondi: – agora que estou são
pode aprontar as minhas contas. Ele falou para eu ir para a Europa que ele mandava o salário
para mim, um ano, dois anos depois eu voltava. Falei que não era justo, ele trabalhando e eu
passeando. Pedi para ele falar quanto queria pagar porque eu ia embora mesmo. Levei 10% do
que valia a empresa, eu recebi 1,600 mil dólares em trinta e seis meses sem entrada. Recebi
também uma floresta de eucaliptos em Uberaba, que era uma encrenca, e um galpão
industrial. Muito pouco, pois só a marca tinha sido avaliada em 10 milhões de dólares.
215
Anexo 4
Depoimento de Sérgio Rodrigues
23/11/2012
Eu fui educado em uma casa que era cenográfica porque não tinha nada a ver com o
Brasil. Desde garoto eu achava aquela casa muito interessante mas eu não tinha definido em
mim que viria a ser arquiteto ou alguma coisa parecida. Vivia desenhando, se pudesse ficaria
só desenhando. Mas chegou uma época em que fui levado a um escritório de arquitetura. Eu
imaginava que o arquiteto só fazia fachada, não tinha ideia do que seria na realidade uma
arquitetura, então isso mexeu comigo. Com o tempo fui saber o que era na verdade. Só no
terceiro ano de estudo que eu percebi o que era arquitetura. Eu adorava desenhar qualquer
coisa.
Eu tinha um tio bisavô que era dono de um “castelo”, tinha aquelas ameias todas. Ele
era coronel, não tinha nada a ver com a arquitetura, com designer, porém gostava muito de
madeira. Então, como ele tinha aquele casarão e iria colocar abaixo uma parte para fazer uma
coisa nova, tinha muita madeira que foi aproveitada – peças de peroba fora de série. Havia lá
um quarto com uma pequena oficina com dois operários de alto nível que entendiam os
rabiscos que ele fazia. Eu ainda garoto, com seis ou sete anos, ficava nesse quarto vendo os
operários, os marceneiros, trabalhando. Fui me interessando e me apaixonei pela madeira.
Eles não tinham nenhum aparelho elétrico, tudo era feito manualmente. Faziam trabalhos com
grande precisão, sem ter nada elétrico. Eu fazia os meus brinquedos com canivete, isso então
meu deu a paixão pela madeira e pelo móvel. A casa era antiga e tinha o mobiliário de toda
espécie, da década de 1850. Os móveis dos quartos e da sala eram todos antigos. A maioria
deles era de importados. Então eu me interessei por duas coisas: pela arquitetura, muito
logicamente, e mais por mobiliário. Mas não queria fazer móvel mas sim fazer o que se
chamava na época de “decoração”. Na realidade era o que chamam hoje de designer de
interiores.
A palavra design quer dizer criação, não tem maiores explicações, pode ser de
arquitetura, pode ser de literatura, cinema, fotografia, porque designer é aquele que cria com
determinada matéria. Eu procurei já na faculdade uma escola sobre interiores, mobiliário, mas
não tinha nada. Tinha coisas estrangeiras com preços astronômicos e coisas que não tinham
nada a ver diretamente com o Brasil. Achei um professor jamaicano que havia chegado
recentemente dos Estados Unidos e tinha diploma. Chamava-se Louis F. James. Uma dessas
216
coisas engraçadas da vida é que o meu tio se chamava James também e encontrar outra pessoa
com esse nome… foi engraçado essa coincidência.
No terceiro ano eu já estava bastante adiantado com aquilo que era americano mas eu
sabia bastante diferençar as coisas que eram brasileiras, nacionais, das coisas que eram
estrangeiras. Aprendi os mobiliários todos, os chamados clássicos do final do século XVIII
comecinho do XIX. Depois entramos na fase eclética, que é uma mistura. Acompanhei tudo
aquilo e no terceiro ano de faculdade eu tinha uma matéria que se chamava “composição
decorativa”. É um nome que não tinha nada a ver com o que eu estava imaginando. Fiz esse
curso e um catedrático me chamou para ser monitor na Faculdade de Arquitetura. Meus
colegas todos não se interessavam por isso, porque tinham preconceito. Eu não me importava,
eu queria era aprender.
Eu fui também auxiliar do professor James, que não era americano mas falava somente
inglês. Ele ficou muito empolgado comigo e me disse: “Sérgio, você faz um tipo de
arquitetura moderna que nós não aprendemos nem nos Estados Unidos!” Ele pensava que eu
fazia aquilo na faculdade, mas não, eu aprendi por minha conta. Fui auxiliar dele nos
trabalhos em São Paulo. No Rio eu era ainda estudante e para mim era uma maravilha. O
catedrático da faculdade começou a gostar muito do meu trabalho. Estava fazendo coisas que
depois iria estudar na faculdade mas que eu já sabia porque havia feito os interiores com o
James.
Quando eu me formei, percebi realmente o que era a arquitetura. Tinha-se a ideia que
arquitetura era saber projetar uma casa, com tantos quartos e tantas salas, mas isso não é
arquitetura, é quase um joguinho de armar. Para fazer o projeto você tem de conhecer o
proprietário da casa, saber o que ele curte, porque é ele que vai morar na casa, não o arquiteto.
Naquela época isso era pouco compreendido. Quando eu era chamado para fazer um trabalho,
falavam: “Eu quero meu quarto Luiz XV, quero a minha sala Luiz XVI…” Eu acabei não
fazendo mais esse tipo de trabalho, deixava mais para o americano fazer. Eu continuei com
esse catedrático que me chamou para ser auxiliar de ensino e também para auxiliá-lo no
trabalho dele. Ele fazia muita coisa em arquitetura. Foi então que eu comecei a aprender
mesmo os interiores, o que era na realidade a arquitetura. Seriam as coisas de que o
proprietário estaria precisando, a parte interna e a parte externa. O que chamávamos de
arquitetura mesmo era basicamente a casca daquilo que nós estávamos sugerindo.
Eu lia revistas estrangeiras de qualidade, que pouca gente comprava porque eram
muito caras, francesa, inglesa, dinamarquesa, italiana, etc. Isso foi fazendo com que eu tivesse
uma interpretação de várias e diferentes maneiras, o que foi muito útil para mim.
217
Fui para Curitiba em 1953 porque o catedrático David Azambuja foi chamado para
fazer um trabalho para o governo do Paraná, o Centro Cívico de Curitiba, e me levou junto.
Fiquei dois anos lá enquanto estava sendo construído o prédio, que tinha trinta andares e era
interessantíssimo. As chamadas Secretarias de Estado eram onze. Cada uma tinha seu
programa e iam fazendo os desenhos, não de arquitetura, mas os interiores. Elas faziam a
localização, explicando onde ficaria a mesa de reunião, a mesa do ministro, etc., mas sem
definir especificamente os modelos do mobiliário. Esse trabalho no Centro Cívico era para
celebrar o quarto centenário da cidade. Havia uma equipe monumental para a construção dos
edifícios, com uma parte de engenharia e outra de auxiliares de desenho. Eu percebi que o
dinheiro para esse projeto vinha das sacas de café. Na época das geadas, a produção de café
foi a zero e eu já estava vendo que aquilo iria acabar sendo suspenso e eu iria ficar sem
serviço. O meu trabalho era só aquele, eu não tinha começado como os outros, fazendo
trabalhos normais, para casas. Eu sabia fazer, tinha consciência da história, mas não tinha a
prática. Eu estaria chegando a uma obra de arquitetura, vendo os operários trabalharem, mas
não saberia exatamente como se colocava um tijolo, e isso seria importante. Eu percebi esse
problema com o Centro Cívico, que iria acabar faltando dinheiro e que iríamos ser expulsos
de lá. Então resolvi abrir uma loja de mobiliário.
Eu me associei ao designer Carlo Hauner, italiano de altíssimo nível, garoto da minha
idade. Na época ele tinha uma loja grande em São Paulo, que depois virou a Forma, da qual
ele foi um dos fundadores. Assim, eu teria móveis contemporâneos em Curitiba. Apesar de a
cidade ter grandes indústrias de mobiliário, eram só móveis clássicos, não tinha coisas
modernas. Os que se ariscavam a fazer algo diferente, não sabiam e acabavam produzindo
coisas trágicas, desenhos horrorosos, que não tinham nada a ver. Algumas eram cópias de
móveis estrangeiros, mas eles não tinham ideia das proporções certas. Eu não tinha tino
comercial por isso tive que chamar uma pessoa para fazer essa parte. Eu fiz a loja e comecei a
usar o mobiliário todo novo, que o Hauner tinha em São Paulo. Mas os curitibanos vinham a
São Paulo, compravam aquele mesmo mobiliário que eu estava vendendo lá, às vezes com
vantagens porque nós tínhamos o interesse em agilizar a venda de móveis modernos. Mas o
pessoal não queria os nossos, queriam ir comprar em São Paulo para ter o prazer de ver o
caminhão com a placa de São Paulo parado em frente à casa deles, descarregando os móveis.
Isso era a mentalidade naquela época.
Eu comecei a vender aqueles móveis, mas não era exatamente o que eu queria. Então
eu comecei a desenhar peças que não tinham nada a ver com o que vinha de São Paulo. Mas
surgiu o problema do dinheiro, que começou a faltar. E só tinha móveis de carregação, tipo
218
Teodoro Sampaio – que melhorou um pouco, diga-se. Então, quando eu precisava de alguma
coisa, me falavam para ir lá; eu ia mas não achava nada que servisse, então passei a desenhar
e depois eu fiz a Oca.
Em 1955 já tinha um certo pessoal que me procurava querendo só fazer obras
modernas. A Oca começou e eu fiquei trabalhando em São Paulo por uma razão. Esse meu
amigo que era o criador da Forma e era designer, gostava muito do meu trabalho. Eu o
encontrei em Curitiba tentando vender para o Centro Cívico, mas não conseguiu porque lá
ninguém queria móvel moderno. Então, quando ele me viu naquela situação de não ter
trabalho, ele me convidou para ir para São Paulo. Disse que tinha um trabalho numa fábrica
que era maravilhosa e que seria um caminho bom para mim. Eu fui para lá e acabei morando
do lado da fábrica, no Itaim. Depois, passei a trabalhar na loja da Barão de Itapetininga, onde
peguei prática de venda e de contato com o cliente. Eu fazia os interiores usando os móveis
deles. Chegou uma época em que houve um desentendimento entre os sócios e, como eu tinha
sido chamado por um dos sócios que saiu, ele achava que eu deveria sair também. Ele disse:
“Vai para o Rio que é a sua terra, você deve ter muitos amigos e lá você vai ter sucesso!”
Passei um mês na casa do sogro, completamente desambientado, sem trabalho,
querendo fazer alguma coisa e sem clientes. Então resolvi fazer uma loja e o pessoal dizia:
“Você fez uma loja em Curitiba e foi aquele fracasso, em seis meses só vendeu dois sofás e
ainda assim vendeu com o preço errado!”
Lá pelos anos sessenta eu consegui um contrato com o edifício Mofarrej, para
completar o hotel. Eles não disseram se deveria ser uma obra moderna ou antiga, então
aproveitei para colocar o móvel moderno. Eu já fazia interiores nessa época.
Nos grandes palácios como o de Versalhes, o mobiliário era continuação da
arquitetura. As paredes dos grandes salões eram todas trabalhadas. Havia as falsas colunas, os
móveis eram colocados exatamente entre as colunas, as cadeiras e as poltronas sempre
encostadas na parede como se fossem continuação da arquitetura; faziam parte da arquitetura.
Sempre achei que deveríamos bater o pé para fazer o que era certo. Deixei de fazer
muita coisa por causa disso. Uma vez uma fulana falou: “Sérgio, eu queria que você fizesse o
meu quarto em Luís XV ou Luís XVI”. Perguntei: “Você é artista de teatro?” Quando ela quis
saber por que, eu respondi que fazer um ambiente Luís XVI é uma cenografia, ela então
deveria ter saia balão, carruagem lá fora… e caí na gargalhada para descontrair. Ela percebeu
e saiu.
Em São Paulo havia bons arquitetos como o Vilanova Artigas, o Bratke, o Paulo
Mendes da Rocha que fez a poltrona Paulistano, muito boa e o Warchavchic que estava
219
fazendo o Clube Paulistano. Entraram em contato e ele pediu para fazer alguns desenhos de
móveis porém não foram aceitos. Eu não tinha fábrica e precisava mandar fazer fora, só que
para fazer móveis especiais, todos cobravam um preço muito alto.
Havia também a própria Lina Bardi, que era ligada ao Carlo – os dois vieram da Itália
logo depois da guerra, por isso eu chamo de “missão italiana” (uma porção de gente veio para
o Brasil: a Lina Bo Bardi, o Giancarlo Palanti,o Dominici e diversos outros arquitetos
fazendo coisas e trazendo coisas de lá). No princípio eu pensei: “O que é que uma italiana vai
fazer de mobiliário aqui no Brasil?” Mas ela foi a única designer estrangeira que vestiu a
camisa brasileira porque tudo o que ela projetou poderia ser chamado de mobiliário brasileiro.
Tivemos só um contato rápido porque eu estava fazendo outras coisas.
Quando estava em São Paulo eu ficava o dia inteiro na fábrica e ia direto para casa.
Conheci o austríaco Martin Eisler, que desenhava móveis para a Forma e também foi um dos
diretores da loja. Um dia fui fazer um sofá diferente, com estrutura de madeira aparente, e o
Martin disse: “Você é arquiteto, não se meta a fazer móvel, que é uma coisa muito difícil. Não
dá para você fazer isso, você não vai ter futuro nenhum!” Ele já era arquiteto, tinha
experiência, já era uma pessoa conceituada; fiquei um pouco chateado. Já o italiano falou:
“Sérgio, eu não faria nada disso que você faz porque não é a minha área. Você tem coisas
maravilhosas, eu não vejo isso na Europa: móveis com gabarito internacional para serem
disputados”. E já que eles estavam brigando eu aproveitei e fui embora para o Rio.
A Mobília Contemporânea estava fazendo móveis mais próximos do que eu queria
fazer, móveis muito simples, para atender um público com menos dinheiro mas com muito
bom gosto. Os móveis da Branco&Preto eram extremamente artesanais mas muito bem feitos.
Ficava na Vieira de Carvalho onde tinha também a L’Atelier, que usava muito metal,
madeiras prensadas. Quando era possível não usar só os móveis da Forma eu usava uma coisa
ou outra deles.
Quando eu comecei a desenhar os móveis e dizia que iria abrir uma loja, falavam para
mim: “Você vai ser um fracasso, você não tem ideia nenhuma, você não vai vender seus
móveis porque o pessoal só quer comprar móveis de firmas conhecidas!”. Aqui no Rio, o
Tenreiro tinha móveis, o Laubisch Hirth uma fábrica monumental, havia o Leandro Martins
também. A Laubisch começou a fazer algumas coisas modernas. Eu fui colega de faculdade
do filho do Laubisch, que era um arquiteto moderno e estava começando a fazer coisas
modernas dentro de um estilo “modernoso”, vamos dizer assim, com boas proporções, bons
acabamentos.
220
Eu resolvi fazer uma loja, que era a Oca, no terceiro mês que tinha voltado de São
Paulo. Foi uma coisa muito interessante. Comecei a fazer desenhos e, para minha decepção,
quando eu mandei fabricar o banquinho Mocho em uma firma, não levei nem o desenho, levei
a peça e me falaram que eu podia pegar antes do final da semana. Antes do final da semana
passei pela rua Barata Ribeiro no Rio que, antigamente, era como se fosse a rua Gabriel
Monteiro da Silva hoje em São Paulo, todos que faziam móveis modernos tinham uma loja
naquela rua. Pois bem, antes do final da semana passei por lá e vi que todas as lojas tinham
um banquinho meu e perguntei como eles tinham comprado. Eles me falaram que tinha sido
de um vendedor. Fui até a fábrica e descobri que tinham feito uma dezena deles e vendido.
Fiquei muito chateado.
Então resolvi ter uma fábrica, foi quando dois anjos italianos excepcionais caíram do
céu. Eles foram nos procurar na loja da Oca para ver se precisávamos de alguma coisa, então
os convidei para serem meus sócios e na semana seguinte não só já tínhamos um local como
já estávamos trabalhando. Isso foi em 1955. Os meus sócios não faziam desenho. Eles tinham
vindo naquela “missão italiana” e entre eles Carlo Hauner, figura importantíssima lá no
desenho paulista. Era um estrangeiro que fez coisa boa, a Ambiente vendia coisas dele, o Leo
era o dono da Ambiente. Eu gostava muito do filho dele.
Passei a desenhar e tínhamos uma fábrica em Bom Sucesso, perto da Avenida Brasil.
O negócio começou a aumentar de verdade e de repente pegamos outra fábrica em Bom
Sucesso também, porque a que tínhamos tinha 1000 m² e essa outra tinha 3000 m2 e era do
outro lado da Av. Brasil, ainda em Bom Sucesso; chegamos a ter quase 150 operários.
Tínhamos a loja em Ipanema, na Praça General Osório, a primeira loja em Ipanema de móveis
modernos. Numa rua que dava para a praça tinha a Mobília Contemporânea do Michel
Arnoult, grande amigo, figura importantíssima. Oscar Niemeyer apareceu uma vez na loja e
disse: “Gostei dessa poltrona para dar para a minha filha que vai casar amanhã” e, em
homenagem a ele, passei a chamá-la de Oscar. Na realidade era uma poltrona que havia sido
encomendada pelo Jóquei Clube para a sala de jogos. Eu fiz e levei lá para jogadores que
seriam os juízes que usavam a sala, eles queriam ver a poltroninha. O Jóquei era todo
neoclássico então eles acharam que a poltrona era muito moderna e a chamavam de Brasília,
devido ao desenho da peça que fica na parte de trás. Não quiseram ficar com ela. Então eu a
levei para a loja e imaginei que havia perdido um bom negócio, mas o Oscar veio e levou as
duas que tinham sido produzidas, sendo que uma delas era o protótipo.
A Oca passou a ser ponto de referência moderna. Lá fazíamos exposições de quadros
feitos por especialistas, para fazer a coisa de alto nível. O Lúcio Costa já me conhecia, do
221
Centro Cívico que foi em 1951/52 em Curitiba. Tive um contato rápido com Le Corbusier.
Ele foi à casa do Burle Max que, nos finais de semana, dava um almoço em que ele mesmo
cozinhava. Lúcio Costa também foi. Eu estive com Charlotte Perriand, que trabalhava com
ele. Diversos móveis que ele colocava como dele eu dizia que eram da Charlotte, porque ele
era meio durão. Eu dizia que as cadeiras e os móveis bons eram feitos por ela porque era uma
designer excepcional.
Um outro estrangeiro com quem eu estive foi o americano Jorge Nelson. Foi
interessantíssimo o contato com ele, que veio convidado para uma palestra no Museu de Arte
Moderna. Eu conhecia esse pessoal, que era da Herman Miller. Na palestra, sentei na primeira
fila, fiz tietagem mesmo. Chegou o Jorge Nelson, puxou um papelzinho e falou: “Eu queria
conhecer um arquiteto chamado Sérgio Rodrigues!” E eu estava ali e dei um berro: “Sou eu!
Sou eu!” Fizemos amizade. Eu escrevia para ele e ele me escrevia em datas importantes,
como no Natal. Ele foi na Oca, sentou e gostou muito da poltrona Mole. Isso foi em 1958/59.
A poltrona mole tinha sido criada em 1957 e lançada ao público em 1958 mas ficou anos sem
vender. O pessoal passava e falava: “Olha o ovo estralado” e você via as dondocas falando
que parecia cama de cachorro. Depois do contato com o Jorge Nelson eu tive uma loja na
Califórnia, com dois sócios americanos que estavam querendo uma loja com os meus móveis,
em cidades pequenas mas de alto luxo, com diretores de cinema, etc. Mas isso já era 1967.
Antes disso, o Oscar Niemeyer me chamou para fazer os móveis do vice-presidente.
Na hora de assinar o contrato o gerente geral disse que para fornecer para Brasília a pessoa
teria que morar lá. Eu tinha acabado de fazer a Oca, tinha clientes no Rio e disse que não ia
dar. Então ele falou que ia deixar para uma segunda oportunidade. Foi muito gentil, dizendo
que não podia ser. Eu tinha ido aos Estados Unidos, na ONU, para ver se tinha alguma
semelhança com o Palácio do Congresso deles. Eu queria saber como eram os grandes salões
lá. Não peguei esse trabalho, mas o Oscar me pediu diversas outras coisas, como o Cine
Brasília. Ele pediu as poltronas e as cadeiras para o lobby que foram produzidas em Brasília
mesmo. Depois copiou e fez outros cinemas com as mesmas cadeiras.
Essa história de copiar é lamentável. Fiz o estudo todo da casa para o vice-presidente;
uma casa muito grande, e não me chamaram. Um ano depois eu estava em Brasília e
perguntei: “Eu fiz um trabalho, o Oscar aprovou, e vocês não me chamaram – teve algum
problema?” Então me falaram que já estava tudo pronto. Tinham entregado para outra pessoa
fazer. Mas isso não tinha desculpa, porque o Oscar tinha aprovado o meu trabalho! Foi uma
grande decepção, porque já estava pronto. O Oscar me chamou para fazer as cadeiras, as
poltronas do cine do Teatro Nacional. Eram três auditórios, eu fiz três poltronas diferentes. O
222
próprio Itamaraty me chamou para fazer estudos para os embaixadores e ministros. Eu fiz
uma grande parte, assim como outros, arquitetos de primeira linha. Um deles era um grande
amigo meu, o Bernardo Figueiredo, grande arquiteto, que faleceu recentemente, fez cadeiras
maravilhosas, figura importantíssima. Ele trabalhou comigo também quando eu tinha a Oca.
Eu fiz todos os móveis do Itamaraty, a sede mesmo, fiz as mesas. Jacarandá, tinha para valer,
não havia se pensava ainda em ecologia. A gente tinha jacarandá à vontade, mas agora
praticamente não tem mais. Estão crescendo novas árvores, mas demora muito. Fiz o
Itamaraty e depois teve um anexo para o qual fiz os móveis também.
Eu fiz casas de madeira também. A primeira foi feita na Oca. Para ter preço bom tem
que ter uma indústria acompanhando, se não ela passa a ser artesanal e cara. Então fizemos as
primeiras casas na nossa própria Oca. Um grupo de operários fazia, era muito simples.
Fizemos o Iate Clube de Brasília, para a Universidade de Brasília fizemos o prédio do
restaurante de 3000 m², uma coisa grande! Fizemos ainda dois pavilhões que seriam
hospedarias para professores da própria universidade. A pedido do Darcy Ribeiro fiz os
móveis para o auditório dos Candangos. Foi interessante porque foi uma fase de
industrialização excepcional. O Darcy Ribeiro foi me mostrar um lugar onde não tinha nada e
ele disse que o auditório seria feito em dois meses e que queria que eu fizesse os móveis. Eu
concordei e falei que iria para São Paulo, numa firma grande de móveis para escritório e
cadeiras de cinema para escolher umas peças, mas ele disse: “De jeito nenhum, quero que
você mesmo faça, queremos ter seu nome ligado ao auditório!” Então eu bolei o projeto, de
um dia para o outro. Era uma coisa que acontece uma vez só na vida. Bolei uma estrutura de
metal com tubos de ferro. O piso ainda não tinha sido feito então eu fiz os pés encaixados no
concreto. Foi um período maravilhoso! Tínhamos que colocar 250 cadeiras na Semana Santa
porque no Sábado de Aleluia seria a inauguração, com os secretários e o Ministro da
Educação. E não tinha ninguém para colocar… operário meu mesmo, só tinha um, para me
auxiliar. A questão é que eram 250 cadeiras! Pegamos um caminhão na cidade e colocamos
uma faixa com um letreiro que dizia “a Universidade precisa de você”. Encheu de gente que
queria colaborar e colocamos as 250 cadeiras. As cadeiras do Anhembi também foram feitas
todas por mim.
Todo arquiteto deveria fazer o interior. Normalmente um arquiteto faz a casa e o
proprietário entrega o interior ao decorador da moda para poder dizer depois quem foi o
decorador dele.
Quando eu estava fazendo os ministérios em 1958/59 o Itamaraty me chamou outra
vez para fazer as mesas dos ministros, porque todas as mesas de ministro estavam num estilo
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que não condizia com uma obra do Oscar Niemeyer. Eu fiz o desenho de uma mesa que foi
aprovada imediatamente, tanto que o protótipo serviu de mesa para o ministroHorácio Lafer.
Quando o embaixador designado para a Itália viu aquela mesa na Oca, ainda em
protótipo, falou que quem tinha desenhado aquela mesa iria com ele para a Itália, para fazer
os móveis da embaixada do Brasil lá. Quando eu disse que tinha sido eu, ele falou: “Prepara o
seu passaporte, que você vai comigo!” Em um mês fomos para lá e depois de 3 ou 4 meses
estava terminada a reforma e fizeram a inauguração. Eu fiz os estudos todos mas a fábrica da
Oca, que era a Taba, disse que eles não tinham condições de fazer porque estavam cheios de
encomendas e para fazer aquilo tudo, além da execução, tem o transporte até o porto, depois
tem o navio, a alfândega, etc., eles não davam conta. Então aquele Carlo Hauner disse que
fazia. Ele já estava por lá, tinha feito no norte da Itália uma fábrica espetacular e semanas
antes tinha me convidado para conhecer. Ele me contou sobre o jacarandá que vinha da Índia,
que era excepcional, de cair o queixo. Sabendo que ele tinha jacarandá, perguntei se ele
toparia fazer os móveis para a embaixada e ele topou. Fez o orçamento e assinou o contrato.
Acharam o preço extremamente razoável e fizemos as embaixadas do Brasil em Roma e no
Vaticano. Tudo feito lá. Daí um escandinavo que tinha uma loja no centro de Roma ficou
entusiasmado com os móveis e pegou o lote que tinha sobrado e deixou expostos na loja dele.
Isso foi em 1960.
Em 1961 recebi uma carta pedindo para eu fazer um móvel para participar de um
concurso lá. Eu inscrevi a poltrona Mole, que tinha praticamente acabado de ser feita, mas
eles me mandaram um telegrama dizendo que a peça era muito bonita mas que infelizmente
não podia ser apresentada porque não aceitavam inscrições de peças já conhecidas. Essa peça
já era conhecida na Itália e eu não sabia!
A palhinha, que não é brasileira, é indiana, ficou bastante ligada ao nosso móvel. Os
Irmãos Campanas têm coisas interessantíssimas, por exemplo, uma poltrona de urso de
pelúcia, muito gozada, para colocar em um canto. São designers criadores. Eu não sou crítico
de arte, eu falo de coisas que me agradam, sobre o que é perfeito para mim.
Não fui eu quem disse, foi um crítico de arte, que depois de mim nasceram uma
porção de “oquinhas” e variações sobre a madeira. Fernando Mendes inclusive tem coisas
diferentes, criadas por ele, mas a maneira de fazer a apresentação na madeira com os
torneados com o tipo de madeira é um tipo de “oquinha”. Tem ainda o Arthur Casas que é
bom, a Baba Vacaro, o Zanininho filho do Zanini Caldas, o Pedro Useche os móveis deles são
excepcionais e a Lia Siqueira e a Claudia Moreira Salles são as mulheres que estão no
primeiro escalão do design brasileiro.
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Em 1993 eu, o Zanine e o Lúcio Costa fomos convidados para fazer umas palestras na
Universidade no norte da Itália. O Lúcio não pôde ir, mas foi a filha dele, uma pessoa muito
capaz, com grandes conhecimentos. Eram papos só de arquitetura, entre os arquitetos de lá e
os arquitetos brasileiros que foram, uma coisa muito simpática.
Nos Estados Unidos chamam de “vintage” a reedição de móveis que foram feitos
antigamente, móveis reeditados que são valorizados. Em Nova Iorque tem uma exposição só
com móveis meus antigos. Abriram uma loja de dois andares e o andar de baixo é todo meu.
Tenho também meus móveis na Suíça e na Noruega.
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Bruno Silva Dias