UNIVERSIDADE MACKENZIE
Curso de Psicologia
UTILIZAÇÃO DO SANDPLAY EM
PROCESSOS DE CURTA DURAÇÃO
PATRICIA ALCOVÉR HADLICH
Orientador prof. me. Paulo Afrânio Sant’Anna.
Projeto apresentado ao programa de Trabalho de
Graduação Interdisciplinar da Faculdade de
Letras, Educação e Psicologia (FLEP).
SÃO PAULO
1998
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais que sempre incentivaram meus estudos.
À Patricia Gimenez, Denise Ramos e Margareth Lury pela colaboração e tempo
dispendidos para a concretização deste trabalho.
Especialmente ao meu orientador Prof. Paulo Afrânio Sant’Anna pela paciência,
incentivo, investimento, constante dedicação e presença oferecidos durante toda a
elaboração do trabalho.
ÍNDICE
Página
I.
Introdução
II.
Discussão Teórica
1.
2.
1
Sandplay
1.1. Histórico
3
1.2. Técnica
5
1.3. Fundamentação da técnica
10
1.4. Síntese
24
Processos de curta duração
2.1. Psicodiagnóstico
26
1.2. Orientação Vocacional
30
1.3. Psicoterapia Breve
35
1.4. Terapia Familiar
53
III. Método
1.
Sujeitos
1.1. Detalhamento da amostra
2.
3.
60
Instrumentos
2.1. Roteiro da entrevista
61
Proposta de análise dos dados
62
IV. Registro e Análise dos Dados
1.
2.
3.
Sujeito 1
1.1. Dados sobre o sujeito
63
1.2. Relato da entrevista
63
1.3. Síntese das respostas do sujeito
77
Sujeito 2
2.1. Dados sobre o sujeito
82
2.2. Relato da entrevista
83
2.3. Síntese das respostas do sujeito
98
Sujeito 3
3.1. Dados sobre o sujeito
103
3.2. Relato da entrevista
104
3.3. Síntese das respostas do sujeito
119
V.
Conclusão
126
VI.
Referências Bibliográficas
129
VII.
Anexos
130
RESUMO
Com base em referenciais teóricos sobre Psicologia analítica, o Sandplay e
alguns processos de curta duração, este trabalho procurou averiguar de que forma esta
técnica pode ser utilizada nestes processos, delimitados em: Orientação Vocacional,
Psicoterapia Breve, Psicodiagnóstico e Terapia Familiar/casal.
Para tal, foram realizadas 3 entrevistas semi-dirigidas com profissionais de
orientação junguiana que utilizam a técnica em sua prática clínica. Em seguida, estas
entrevistas foram analisadas qualitativamente levando à conclusão principal de que, por
tratar-se de uma técnica ainda muito recente e com pouca bibliografia publicada, ainda
deixa muitas dúvidas e questões, até mesmo para os profissionais que já trabalham com
ela. Uma das questões mais discutidas e pouco explicada, é a diferença existente entre
as terminologias “Sandplay” e “Caixa-de-areia”. A partir dos dados levantados
percebeu-se que é possível realizar um processo de curta duração utilizando-se a
técnica da caixa-de-areia. Porém, o Sandplay parece se caracterizar mais por ser um
jogo livre, sem regras, tempo limitado ou foco, perdendo seu real sentido, quando são
estabelecidas estas normas nos processos de curta duração.
1
I. INTRODUÇÃO
Este trabalho partiu do interesse pelo Sandplay e Psicoterapia Breve, com base
em cursos realizados a respeito do tema, bem como, por não ser conhecida nenhuma
publicação a respeito do tema do uso do Sandplay em processos de curta duração, o que
tornou a pesquisa mais interessante e proveitosa.
O Sandplay, ou técnica da caixa de areia, como é chamado no Brasil, foi
desenvolvido por Dora Kalff, analista junguiana suíça, baseada na World Technique de
Margareth Lowenfeld.
Trata-se de uma técnica de orientação junguiana, que utiliza uma caixa de areia
com um fundo azul, com medidas que favorecem a imaginação, através da criação de
um “espaço livre e protegido” que age como um fator regulador e protetor e possibilita
a constelação dos símbolos do Self. Para tal são utilizadas miniaturas de modo que o
paciente construa cenas que dêem forma à sua imaginação.
Com este trabalho, foram levantadas questões e pesquisou-se quais seriam as
possibilidades existentes para a utilização desta técnica nos mais variados processos de
curta duração. Foram delimitados quatro processos de curta duração: psicodiagnóstico;
orientação vocacional; terapia familiar e psicoterapia breve.
Foram discutidas as seguintes hipóteses:
- “O uso do Sandplay é uma técnica relevante em processos de curta duração”.
- “É um instrumento não-verbal, que facilita este tipo de processo
psicoterapêutico”.
- “É uma técnica que permite a integração das linguagens verbal e não-verbal”.
- “É relevante que haja uma análise não-verbal dentro de um processo
terapêutico de curta duração”.
2
- “Há possibilidade de trabalhar com um curto período de tempo utilizando-se
uma linguagem não-verbal”.
- “É uma técnica que permite maior rapidez
no surgimento de conteúdos
inconscientes”.
Com base nestas hipóteses realizou-se uma pesquisa bibliográfica, de modo a
esclarecer questões básicas a respeito de cada um dos processos acima citados e, em
seguida, através do método de entrevistas semi-dirigidas, levantou-se dados e questões
sobre o assunto. Estas entrevistas foram feitas com 3 profissionais de orientação
junguiana, que utilizam Sandplay em seu trabalho, de modo a verificar como as
questões estudadas teoricamente, são aplicadas na prática clínica dos mesmos. Foi feita
uma análise qualitativa dos dados colhidos nas entrevistas e da bibliografia existente,
procurando identificar práticas e reflexões que contribuíssem para as questões
levantadas.
Foi possível averiguar e discutir algumas questões como da diferenciação
existente entre a terminologia “Sandplay” e “Caixa-de-areia”, a opção por este recurso
de trabalho, as limitações de seu uso, as possibilidades existentes dentro dos mais
variados processos de curta duração e como ele pode ser útil e facilitador; a utilização
de outros recursos juntamente com a técnica, entre outras questões.
Espero ter contribuído com este trabalho, na medida que possa oferecer maiores
subsídios a reflexões para o uso do Sandplay em processos de curta duração dentro da
prática clínica.
3
II. DISCUSSÃO TEÓRICA
1. SANDPLAY
1.1. Histórico
Este capítulo basear-se-á principalmente no texto de Estelle L. Weinrib (1993).
A terapia na caixa-de-areia foi criada por Kalff (Ramos, in Weinrib, 1993), em
Zurique, e levada para os Estados Unidos por Estelle L. Weinrib, daí difundindo-se
amplamente.
Utilizada como técnica central por D. Kalff e como técnica auxiliar por Estelle,
tem se revelado um instrumento tanto para diagnóstico, como para o tratamento
psicológico. Ao compor um cenário, o paciente fornece um constante retrato de seu
estado emocional e um claro espelho do seu desenvolvimento analítico.
Por outro lado, os diapositivos dos cenários são um riquíssimo material de
pesquisa, tão raro de ser obtido dentro do campo clínico, onde as intersubjetividades
dificultam um pensar mais científico.(Ramos, in Weinrib, 1992)
Weinrib (1993) apresenta casos onde a caixa de areia pode ser usada como um
poderoso meio para atingir profundas experiências internas capazes de gerar
transformações. Com ela, lida-se com uma experiências viva. A autora destaca o caráter
não-verbal do processo que ocorre através da caixa-de-areia. Considera ainda, a partir
do que diz Neumann, que a cura ocorre ao nível do que ele chama de "consciência
matriarcal". "A união simbólica dos opostos, no nível abstrato dos princípios tal como
céu e a terra, ou no nível humano de homem e mulher, é uma característica importante
do processo, também neste nível pré-verbal. Os desenvolvimentos que ocorrem após a
constelação do Self , e que levam a uma nova estrutura do Ego, são de natureza
4
progressiva. Observa-se que na fase não-verbal do processo, quando a interpretação
analítica ainda não é revelada, já pode ocorrer uma mudança positiva na atitude para
com o mundo exterior e com outras pessoas. Quando o processo chega a um ponto bem
avançado em direção à constelação do Self, o trabalho verbal e analítico se torna mais
importante. É neste estágio que o processo inconsciente que se expressou na caixa-deareia pode ser integrado numa apreciação consciente das mudanças que ocorreram. Em
alguns casos, as pessoas não querem falar imediatamente após cada criação do último
cenário da caixa-de-areia, devido à própria profundidade pela qual passaram.
Posteriormente poderão voltar a olhar os cenários e trabalhar mais analiticamente com
eles."(Kalff, apud Weinrib, 1993, p. 15-16)
Stewart afirma que: "O primeiro junguiano a se envolver com a terapia na caixa- deareia pode ter sido o próprio Jung, que em sua auto biografia Memórias, Sonhos e
Reflexões, descreveu como , em 1912, se defrontou com um jogo do tipo curativo."
(Stewart, apud. Weinrib, 1993, p. 21)
Jung decidiu se submeter aos impulsos do inconsciente, lembrando-se de sua
época de menino, quando fazia castelos e construções de pedra e massa de terra e água.
Fez isto ao deparar-se com um estado de confusão interna, onde não era possível fazer
análise de seus sonhos, nem um exame de sua vida. Toda sua brincadeira de construir,
levou-o a considerar a fantasia como “a mãe de todas as possibilidades, onde os mundos
interno e externo são unificados numa união viva”.
"A forma concreta que Jung deu às próprias fantasias e a observação posterior de
seus pacientes levaram-no à descoberta do processo de individuação, da função
transcendente e da técnica da imaginação ativa".(Weinrib, 1993, p.22)
A caixa-de-areia, originou-se na Inglaterra, com Margareth Lowenfeld.
inicialmente, o método era chamado de World technique.
5
Em 1956, Dora Kalff, após ter trabalhado no Instituto Jung durante seis anos,
conheceu o trabalho de Lowenfeld e foi então, incentivada por Jung a ir para Londres
estudar e trabalhar junto a ela e outros como Michael Fordham e D. W. Winnicott.
Retornou à Suíça e iniciou seu trabalho com crianças, usando símbolos e
desenvolvendo sua própria versão da terapia na caixa-de-areia. Iniciou com a hipótese,
já postulada por Jung, de que há na psique humana um impulso fundamental em direção
à totalidade e cura. E, para que esta cura pudesse ocorrer, deu a seus pacientes um
“espaço livre”, aceitou-os incondicionalmente e observou sem omitir juízos e foi
orientada por suas próprias observações. Ela utilizava de uma linguagem não-verbal,
simplesmente observava, e aceitava o que ocorria na sessão. Começou então a perceber
que, mesmo sem dar ordens ou explicações às crianças, reconhecia estágios de
desenvolvimento nos cenários na areia como nítidas impressões de um amadurecimento
psicológico que estava ocorrendo com elas, mas não tinha nenhum esquema conceitual
de referência para explicar estes fenômenos.
Ao assistir uma conferência dada por Erich Neumann, analista junguiano,
tiveram conversas a respeito da prática de Kalff, que comprovava e confirmava a teoria
de Neumann do desenvolvimento psicológico na primeira infância. Planejaram uma
pesquisa em conjunto, mas logo após a conversa, Neumann faleceu.
1.2. Técnica
A terapia na caixa-de-areia é uma forma de terapia não-verbal e não-racional,
que atinge um nível profundo pré-verbal da psique. Os pacientes criam cenas
tridimensionais, cenários ou desenhos abstratos numa caixa de tamanho específico,
usando água e um grande número de miniaturas realistas. As interpretações não são
dadas quando da criação dos cenários; é adiada até que se tenha alcançado um certo
6
grau de estabilidade do ego. Um postulado básico da terapia na caixa-de-areia é o de
que há, nas profundezas do inconsciente, uma tendência autônoma para a psique se
curar sozinha, desde que haja condições adequadas.
Dois processos separados mas relacionados estão ocorrendo, sendo eles a
regressão criativa e a cura. Este é um tipo de terapia que permite que um período
incubatório, tipo uterino, torne possível, a reparação da imagem materna danificada,
permitindo assim, a constelação e a ativação do Self.
O principal objetivo da técnica da caixa-de-areia, portanto, não se limita a
problemas de privação materna, mas sim em restabelecer o acesso aos elementos
femininos da psique, tanto nos homens quanto nas mulheres. O termo feminino usado
por Weinrib, não se limita ao gênero feminino, mas sim, nas características que
possuímos tanto femininas quanto masculinas de pensarmos, sentirmos, agirmos e
sermos no mundo e nos relacionamentos. Segundo Jung, as qualidades femininas nos
homens são personificadas pela anima e nas mulheres, pelo animus.
A terapia na caixa-de-areia, segundo estudos de Weinrib, nos seus aspectos
concretos, espontâneos e emocionais, têm características marcadamente femininas. O
paciente se envolve fisicamente com a areia, que é considerada um elemento da terra
que, assim como a mulher, gera vida e nutrição.
A caixa-de-areia, consiste numa caixa retangular rasa, com dimensões de
72 x 50 x 7,5 cm cheia até a metade com areia. Seu lado interno é revestido com uma
chapa de metal ou plástico rígido de cor azul-claro. Tem-se desta forma, a impressão de
que o azul da caixa, pareça com água, podendo servir de rio, lago ou oceano. Este
revestimento, à prova d'água, permite que se possa utilizar água para molhar a areia, de
modo a moldá-la. Miniaturas diversas e pequenos objetos ocupam prateleiras abertas, de
modo que possam ser utilizadas para a construção de cenários na areia (Anexo I). Elas
7
incluem representações realistas de animais selvagens e domésticos, peixes, aves,
conchas e materiais de profissões, carros, trens, navios, aviões, pontes, construções,
igrejas, ferramentas de trabalho, árvores e flores, figuras humanas, adultos, crianças, de
diversas raças, profissões, situações de vida e de realidades, entre outros; ou seja,
objetos simbólicos com os quais pode-se criar um mundo. Estas miniaturas devem ser
de boa qualidade, de modo a estimularem o senso estético e criativo dos pacientes.
Não é dada nenhuma instrução, o paciente é simplesmente encorajado a criar o
que desejar dentro da caixa-de-areia, estando livre para colocar para fora suas fantasias,
sua criatividade, sua imaginação, externar e tornar concreto seu mundo interior numa
representação tridimensional.
O terapeuta deve manter-se calado, a uma certa distância, observando as reações
e o comportamento do paciente. O paciente pode ou não falar. "Freqüentemente, algo no
cenário induz o paciente a falar de lembranças pessoais ou preocupações atuais."
(Weinrib, 1993, p.25)
Ao término da montagem da cena, o terapeuta pode pedir que o paciente conte
sua história, pode fazer perguntas, ou falar de assuntos sugeridos pelo próprio paciente.
Assim, o terapeuta avalia o cenário à luz dos símbolos arquetípicos que emergem.
Desta forma, a finalidade da caixa-de-areia é oferecer um jogo livre, sem regras
e com circunstâncias seguras. O objetivo é, portanto, ser espontâneo, agir sem pressões,
livremente, expressando suas fantasias e encorajando sua atividade cerebral.
Um cenário de areia, nunca é desmontado na frente do paciente, ficando para ele
que aquele cenário poderá evoluir. Portanto, ao desmontar o cenário na frente do
paciente, desvaloriza-se uma criação completa e quebra-se o vínculo entre ele e seu
interior e o vínculo silencioso com o terapeuta. (Weinrib, 1993)
8
Após a saída do paciente, são feitos slides ou fotos do cenário. Estas fotos, ou
slides serão utilizados futuramente, quando o ego tornou-se suficientemente forte para
integrar este material e, quando for de mútuo acordo, o terapeuta mostra este material ao
paciente. É aí, então que ocorrem as interpretações, explicações e amplificações, e o
paciente pode ver claramente, diante das cenas o seu processo de desenvolvimento.
Desta forma, o processo na caixa-de-areia pode ser comparado a um longo sonho ou à
imaginação ativa.
A exibição das cenas ajuda a tornar mais concreta a experiência com o
inconsciente. Reitera e reforça a mudança e o impacto pode provocar ainda, mais
mudanças. Assim, a apresentação do material dá outra dimensão à experiência
terapêutica. Nesta apresentação, o terapeuta pode ajudar o paciente a fazer ligações
entre as imagens visuais e os acontecimentos da sua vida interior e exterior.
Freqüentemente, os pacientes reconhecem as ligações dos significados simbólicos dos
cenários com eles próprios, o que reforça seu senso de competência, bem como, novos
insights são acumulados tanto pelo terapeuta como pelo paciente à medida que estudam
os slides. Às vezes, o paciente vê ligações que passaram despercebidas do terapeuta.
A exibição do material é uma ocasião em que reforça-se o ego do paciente. A
quantidade de informação interpretativa aí, bem como a arquetípica amplificada
depende da prontidão do ego em absorvê-la e do interesse e capacidade do paciente em
compreendê-la.
Esta exibição pode ser comovente, excitante ou simplesmente divertida. O
terapeuta deve ser sensível a todos estes ítens e à possibilidade de que ele e o paciente
podem estar olhando para as imagens da alma do paciente.
É importante que o terapeuta, durante o processo, escolha muito bem suas
palavras, reconhecendo que, uma interpretação prematura pode perturbar o que é
9
concebido como um processo de cura essencialmente inconsciente. Deve portanto, ter o
devido cuidado e controlar sua vontade em encontrar respostas rápidas para ítens
duvidosos. Deve ter em mente que quaisquer avaliações, interpretações ou
amplificações, são hipóteses sujeitas a mudanças ou rejeições. É de suma importância
que o terapeuta tenha amplo conhecimento da simbologia de onde extrai as
interpretações. Interpretações estas, que devem ser apresentadas como troca entre
terapeuta e paciente, respeitando principalmente o tempo e as limitações deste paciente;
deve ser portanto, constituída dialeticamente entre terapeuta e paciente.
O papel do terapeuta é o de ouvir, observar e participar empaticamente. Porém, o
sucesso do processo não depende só de sua
compreensão cognitiva do sentido
simbólico do cenário, mas também da sua familiaridade com os estágios do
desenvolvimento do processo que se refletem nos cenários, ou seja, o surgimento de um
ego revitalizado capaz de se relacionar produtivamente tanto com o mundo interior
como com o mundo exterior, em seus diversos estágios. "Esta compreensão permite
uma comunicação não- verbal entre terapeuta e paciente, um vínculo mãe-filho, pois,
através das imagens concretas dos cenários, o terapeuta conhece conscientemente o que
o paciente sabe inconscientemente." (Weinrib 1993, p.38)
O paciente, para demonstrar qualquer insight ocorrido com ele, bem como
qualquer conhecimento imediato do significado dos cenários, precisa confiar no
terapeuta. Assim como em qualquer situação psicoterápica, este terapeuta deve ter
passado por uma análise profunda e um competente treinamento clínico, incluindo
amplos conhecimentos do simbolismo arquetípico. Também como para qualquer prática
psicoterápica é preciso que o terapeuta tenha tido a experiência de ser paciente no
processo que utiliza. Como paciente na caixa-de-areia, deve ter conhecido esta
experiência de modo que possa perceber seus próprios estágios de desenvolvimento, os
10
estudado e os comparado em muitos cenários, sendo esta a única maneira de aprender a
lê-los. Somente desta maneira ele poderá participar do processo de seu paciente como
próprio personagem que já sentiu e passou por este processo e que, desta maneira, pode
estabelecer uma comunicação profunda e averbal com este paciente. É a própria
capacidade empática e silenciosa de entrar com o paciente na criação de seu mundo.
1.3. Fundamentação da Técnica
Segundo Weinrib (1993), "a terapia na caixa-de-areia não é um jogo com regras.
É livre e encoraja o espírito lúdico. O seu valor repousa no seu caráter vivencial, nãocerebral." (p.30) Ela é uma terapia que se apoia, em grande parte, nas teorias de Jung e
Neumann. Para isto, é preciso conhecer alguns conceitos básicos utilizados por estes
autores.
O desenvolvimento psicológico do indivíduo é determinado arquetipicamente e,
sob circunstâncias normais, é semelhante para todos. (Neumann, apud. Weinrib, 1993)
“A psique é constituída pelo consciente e inconsciente e pela interação entre
eles, e é um sistema auto-regulador teleologicamente orientado. Contém um impulso em
direção à totalidade e tem a tendência a se equilibrar através da função compensatória
do inconsciente. O impulso para a realização e para a totalidade (Self) sugere que a
psique, assim como o corpo, têm, sob circunstâncias adequadas, a tendência de curar a
si própria”. (Jung, apud Weinrib, 1993)
“O Self é a totalidade (consciente e inconsciente) da personalidade e seu centro
diretor. É o fator organizador central da psique, da qual o ego, que é somente centro da
consciência, se desenvolve ... o Self é uma prefiguração inconsciente do ego”. (Jung,
apud. Weinrib, 1993)
11
À medida que a consciência moderna evoluiu, o ego ganhou preponderância
sobre o Self . A autonomia do ego é limitada. Ele é vulnerável às influências dos
complexos emocionalmente carregados que agem de maneira compensatória. “Uma das
principais metas da análise junguiana e da terapia na caixa-de-areia é a de “relativizar o
ego”, isto é, fazer com que o ego ceda a sua dominação ilusória e restabeleça uma
ligação e um relacionamento duradouro entre o consciente e o inconsciente." (Weinrib,
1993, p.32)
“Assim como a mãe é a fonte de vida física, também o inconsciente é a fonte da
vida psicológica. Portanto, a mãe e o inconsciente podem ser vistos como símbolos
femininos equivalentes” ... “no processo de individuação, a regressão pode ser
temporária e em prol de uma renovação psicológica e do renascimento simbólico”.
(Jung, apud. Weinrib, 1993, p.32)
Segundo Weinrib (1993), após ter atingido um certo grau de amadurecimento
(isto é, desenvolvimento do ego e separação da mãe pessoal), Jung fala sobre a
necessidade no processo de individuação do impulso, em religar o inconsciente com a
mãe simbólica. No processo psicoterapêutico, a separação e a religação do inconsciente
ocorrem simultaneamente, como um dos principais pontos no processo de individuação.
A cura psicológica envolve restauração da capacidade de funcionar normalmente
e a consciência implica em se saber o que está sentindo, pensando e fazendo, ou seja,
está relacionada com a consciência e com a escolha do que estamos fazendo ao agirmos.
Uma consciência ampliada, não garante a cura, embora possa contribuir com ela.
Segundo Weinrib (1993), a cura é então um fenômeno emocional, não racional,
que ocorre no nível matriarcal da consciência, o que permite a renovação da
personalidade e a expansão da consciência.
12
"A cura e a expansão da consciência são metas desejáveis em psicoterapia. O
emprego da caixa-de-areia aprofunda e acelera o trabalho terapêutico porque dois
processos estão ocorrendo. Estes processos estão intimamente relacionados, porém
separados. Durante o mesmo período em que uma análise verbal dos complexos,
sonhos, personalidade e problemas de vida está progredindo em direção à consciência, a
técnica da caixa-de-areia estimula uma regressão criativa (após a constelação do Self e a
emergência de um ego renovado e fortalecido, o processo na caixa-de-areia assume um
caráter mais verbal e progressivo. O paciente então é mais capaz de se relacionar
independentemente com o seu eu interior e com o mundo exterior), que permite a cura
exatamente devido a uma interpretação tardia e o desencorajamento deliberado de
pensamento dirigido."(Weinrib, 1993, p.33)
Uma imagem que possa ter aparecido em um sonho de um paciente, pode ser
vista num cenário, antes mesmo deste sonho ocorrer, portanto, a preparação do cenário
da areia é uma representação de uma realidade sensorial, uma ação concreta que
estimula a atividade arquetípica, a ação concreta seria a cena produzida na caixa e a
estimulação arquetípica, o sonho.
"O processo natural de cura pode ser concretamente ativado pelo jogo
terapêutico e pela estimulação dos impulsos criativos através das condições fornecidas
pelo ‘espaço livre protegido’ de Kalff. A visão junguiana da função do símbolo é que
ele é um agente curativo que age como ponte para reconciliar os opostos, isto é, pode
ser considerado como uma tentativa do inconsciente de levar a libido regressiva para
um ato criativo, mostrando assim o caminho para a solução do conflito." (Harding, apud
Weinrib, 1993, p.33)
Assim, a autora propõe que somente a produção de um cenário na caixa de areia,
já é um ato simbólico e criativo, desde que ocorra num espaço livre e protegido. Esta
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produção é voluntária, podendo não ocorrer em todas sessões. Ela diz que às vezes
passam-se semanas e até meses entre os cenários, porque a imagem, já que é vinda das
profundezas da psique e concretizada num ato criativo, no caso a produção, precisa se
desenvolver e se mover dentro do seu próprio padrão de tempo. Quando não há a
produção do cenário, é feita uma análise junguiana verbal comum, com interpretação de
sonhos, trabalho com problemas tipológicos, relações interpessoais e outros ítens. No
processo analítico verbal, segundo ela, as metas são insights etiológico e teleológico e a
expansão da consciência. O material simbólico que surge do inconsciente e os fatos
cotidianos são integrados na consciência o mais cedo possível. Na caixa-de-areia o
entendimento é menos importante do que o processo de cura em si.
Segundo estas afirmações, surge a dúvida de que poderiam haver da mesma
forma que o processo analítico verbal comum, frente à lacuna entre um cenário e outro,
outro tipo de criatividade lúdica tais como produção em argila, pintura, ou qualquer
outro tipo de jogo lúdico, já que o entendimento é menos importante do que o processo
de cura em si. Talvez, com o estudo ou conhecimento mais profundo da análise
junguiana esta questão possa ser esclarecida.
Weinrib (1993), explicita seu parecer em relação à função da consciência do
ego, dizendo que ela nos oferece opções de resposta comportamental aos nossos estados
emocionais baseados em instintos autônomos os quais permanecem independentes de
nossa vontade, sendo que nossas reações sentimentais e emocionais são a própria
essência da vida.
Neumann, define consciência do ego como “relativamente autônoma,
caracterizada pela razão, julgamento e ordem. Sugere que a consciência do ego evoluiu
de uma camada da psique que ele chama de patriarcal, sugere ainda, que uma segunda
consciência, chamada de consciência matriarcal, tem suas raízes num nível mais
14
profundo, antigo e arcaico da psique e que ambos existem em todos nós, homens ou
mulheres” ... “descreve esse modo matriarcal de consciência como um processo
semiconsciente, no qual não existe vontade do ego. Está sujeito ao inconsciente e reflete
processos inconscientes; no entanto contém qualidades da percepção, compreensão nãoverbal, contemplação, concepção, circum-ambulação, realidade e criação: um tipo de
estado psicológico de incubação ou gravidez” ... “todas essas são exatamente qualidades
da experiência da caixa-de-areia que tendem a apoiar a idéia de que esta última,
realmente opera num nível matriarcal e que é aí que ocorre a cura” ... “Neumann ainda
descreve a consciência matriarcal com uma percepção e atenção observadora, em vez de
pensamento ou julgamento direcionado, e nota que é afetada por sentimento e intuição.
Com relação à consciência patriarcal, sua função é focalizar a libido num evento
psíquico específico, intensificando seu efeito até que atinja a consciência. O ego mental
patriarcal, usa então a experiência como base para ação ou para a formulação de
conclusões abstratas e a expansão da consciência. Ele também sugere que a cura se
encontra no nível matriarcal da consciência”. (Weinrib, 1993, p.35)
A autora ainda destaca a importância dentro do processo na caixa-de-areia, da
formulação de Neumann, sobre o desenvolvimento do ego: “a constelação e ativação
precoces do Self entre o nascimento e o terceiro ano de vida são um pré-requisito para o
desenvolvimento de um ego saudável”(Neumann, apud Weinrib, 1993, p.36). O vínculo
imperturbado mãe-filho é de extrema importância durante o primeiro ano de vida da
criança, enquanto ela está no que Neumann chama de ‘estado urobórico’ pós uterino,
no qual o Self da criança ainda está simbolicamente contido na mãe. Qualquer ruptura
pode resultar num ego ferido, dependente e carente entre idades de um a quatro anos; o
que pode durar a vida inteira.
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A autora relaciona a técnica da caixa-de-areia, não-verbal e não-interpretativa,
como estimulante da reconstituição desta unidade psicológica mãe-filho proposta por
Neumann, assim, permitindo a constelação do Self e levando ao desenvolvimento de um
ego mais forte. Estimula, portanto uma regressão terapêutica (criativa) ao nível
matriarcal, onde pode ocorrer a cura e a renovação psicológica.
Sobre o espaço livre e protegido Weinrib (1993) cita uma conversa que teve com
Dora Kalff onde ela diz que este espaço é o espaço necessariamente seguro.
Este espaço tem dimensões tanto físicas como psicológicas, o que oferece
liberdade e proteção (limitação). A caixa tem o efeito de focalizar e depois refletir a
visão anterior.
A autora ainda supõe que os arquétipos são as forças formadoras do mundo
fenomenal, assim, por trás de cada miniatura, se oculta um arquétipo. Elas servem para
encarnar imagens arquetípicas num tamanho e formato manuseáveis, dentro deste
ambiente protegido.
A meta deste espaço livre e protegido é fornecer um espaço materno ou útero
psicológico. Neste espaço pode ocorrer, segundo Weinrib (1993), “a cura da ferida
psicológica interna, o Self pode ser constelado e a criança interna redescoberta, com
toda sua potencialidade de criatividade e renovação”.
Sobre a reconstrução do mundo materno, Jung diz: "O que foi danificado por um
pai só pode ser reparado por um pai, assim como algo que foi estragado pela mãe só
poderá ser consertado por uma mãe" (Jung, apud Weinrib 1993, p.41)
Weinrib (1993) explica ainda, a idéia junguiana de que os arquétipos se
manifestam em imagens que são evocadas pela experiência de vida de uma pessoa.
Quando ocorreu contato insuficiente com os pais e/ou mãe, a imagem da mãe fica ferida
e não é adequada para cumprir sua função protetora e nutridora. A imagem interna
16
danificada distorce a percepção e a reação da pessoa e prejudica a maturação normal da
personalidade. Quando há um contato suficiente com a mãe, a imagem materna é
adequada para servir de mediadora entre a pessoa e o poder arquetípico que está por trás
da imagem. Então o ego está protegido e a personalidade pode se desenvolver
normalmente.
A perda da mãe precocemente, segundo estudos de Weinrib, provoca sério dano
à imagem arquetípica da mãe, podendo ser patológico. Desta forma, a terapia na caixade-areia, segundo ela, tenta consertar o dano à imagem materna arquetípica através da
reconstrução metafórica da unidade urobórica mãe-filho danificada.
Weinrib afirma que: "A caixa-de-areia se torna um temenos metafórico ou uma
terra sagrada, onde ocorre um ritual físico-simbólico, remanescente das cerimônias e
atmosfera das religiões e mistérios antigas."(Weinrib, 1993, p.44)
O que ocorre na caixa-de-areia é uma experiência e não uma relação ideacional.
E desta forma, pode-se concluir, como a própria Weinrib diz, que a vantagem da caixade-areia é que ela não exige nenhuma habilidade específica, pois não há regras, nem
forma correta de “brincar”.
Com isto, talvez possa-se pensar que, com a caixa-de-areia, há uma entrada
imediata
na
infância,
dentro
do
espaço
livre
e
protegido,
trabalhando-se
tridimensionalmente, o que, no desenho, na pintura e na modelagem não há, pois no
desenho trabalha-se no plano horizontal e bidimensional e a escultura apesar de
tridimensional, não fornece os limites da caixa-de-areia. Ainda mais, a imaginação
ativa, na caixa-de-areia, é uma imaginação ativa concreta.
A autora cita ainda a idéia de Kalff de que “a caixa-de-areia é um caminho para
o espírito. Ela começou a ver o feminino como uma fonte de criatividade e de
significado. Na prática viu que emergia uma criação concreta na areia, algo ativado pela
17
mente, o mesmo que emergia nas mulheres sob a forma intuitiva trazendo insight,
sabedoria à experiência numinosa” ... “Viu também, que o acesso ao espírito ocorria nas
mulheres, através do encontro com os mais profundos níveis do seu ser feminino e, nos
homens, através do seu relacionamento com o feminino existente dentro deles” ...
“começou então a acreditar que os elementos materiais da técnica da caixa-de-areia
agiam como uma espécie de metáfora para o corpo”. (Weinrib, 1993, p.45)
Weinrib, discute então sobre o sentido da transformação na caixa-de-areia, sendo
que a transformação psicológica para ela, inclui mudanças subjetivas e objetivas numa
pessoa, o que define como um sentimento de renascimento. Cita ainda, Jung, sobre a
sua colocação com relação à transformação na Alquimia, na qual aparece o conceito de
sacrifício. A meu ver, toda a transformação, tanto descrita por Jung como outros
autores, exprimem a idéia de sacrifício do ego, ou seja, para que haja transformação e
amadurecimento, necessariamente deverá haver sacrifício.
Isto fica mais claro no texto em que Weinrib, diz que a disposição do paciente de
desistir da interpretação dos cenários na areia e manter tal processo alquímico interior
lacrado, é um sacrifício.
Segundo Weinrib "A técnica da caixa-de-areia fornece um recipiente limitante
que pode transformar a fantasia limitada em energia focalizada e criativa. A confecção
de um cenário é, em si, um ato formador e criativo. A transposição dos complexos ou
conflitos psicológicos do mundo interior e imaterial para o mundo exterior e concreto
parece causar uma mudança na dinâmica do inconsciente. Quando um conteúdo interno
arquetípico assume uma forma exterior concreta, torna-se simbolicamente objetivado;
isso parece causar uma mudança na dinâmica interna, como se algo se movesse e
liberasse o impasse psicológico."(Weinrib, 1993, p.49)
18
Assim, o paciente pode perceber algo que era ameaçador e que, ao produzir um
cenário, torna-se manuseável e desmitificado, passando a integrar sua vida e seu
desenvolvimento de uma forma menos ameaçadora, pois, já pode concretamente lidar
com aquilo que antes era só idealizado. Portanto, através da caixa-de-areia, é possível
haver uma transposição do conteúdo interno para uma forma exterior, a qual torna-se
uma ponte mediadora entre o mundo e aquilo que se passava apenas em seu mundo
interno.
E é desta forma também, que Weinrib, percebe esta ponte, como o objeto
transicional de D. W. Winnicott, que a criança percebe como não-eu, como não sendo
uma extensão dela mesma, por oposição à mãe, que ela percebe como parte de si
mesma. Winnicott
define o objeto transicional como “uma área experimental
intermediária, para a qual contribuem tanto a realidade interna como a vida externa. É
uma área que não é contestada, porque nada se perde dela além de existir como um local
de descanso para a pessoa envolvida na permanente tarefa de manter as realidades
interna e externa separadas, porém relacionadas” (Winnicott, apud Weinrib, 1993, p.54)
Portanto, de acordo com Winnicott, o objeto transicional leva a criança para o
mundo externo. Neste sentido, Weinrib expõe que dentro da unidade mãe-filho, quando
o ego estiver pronto, a caixa poderá se tornar um objeto transicional, que o leva para o
mundo externo. Em certos casos, a caixa-de-areia, funciona como um objeto
transicional, onde ocorre de certa forma a transferência que se desloca, ao menos
parcialmente, da pessoa do terapeuta, para a caixa-de-areia, à medida em que se torna
um objeto independente.
Weinrib diz ainda a respeito da agressividade extravasada através da caixa-deareia, onde, através de um espaço livre e protegido, as energias demoníacas não
redimidas podem ser transformadas através da expressão e exteriorização de
19
necessidades agressivas reprimidas. Ela oferece a possibilidade de externalizar com
segurança um impulso interno.
Na técnica da caixa-de-areia, o adulto brinca como criança, com seriedade.
Desta forma, lembranças perdidas da infância vêm à tona, bem como fantasias
reprimidas são liberadas e possibilidades de reconciliação ocorrem.
O paciente, ao entrar em contato com a caixa-de-areia, sente alto grau de
satisfação e liberação de tensão, de onde pode liberar então todo seu potencial criativo,
reforçando assim o ego e melhorando sua auto-imagem.
Segundo Weinrib, "A terapia na caixa-de-areia parece servir a uma finalidade
meditativa semelhante à de uma mandala. Fomenta a sensibilidade para as imagens
internas, condição para o relacionamento com o mundo interior. O seu aspecto concreto
pode estimular um estado de absorção e concentração relaxada, de consciência nãoracional."(Weinrib, 1993, p.66)
"Ao se completar o cenário, a tensão é aliviada. Neste momento, percebe-se que
o cenário representa pelo menos algum aspecto interior da pessoa. Portanto, toma-se
consciência daquela condição interna, daquele sentimento, daquele humor, etc.
A caixa de areia age como um foco de atenção que encoraja a centralização.
Seus limites físicos evitam as distrações. Como tal, a caixa tem um efeito tranqüilizante
e focalizador, que parece facilitar o aprofundamento no nível transpessoal da
psique."(Weinrib, 1993, p. 66 e 67)
A caixa-de-areia ainda, oferece várias possibilidades de liberação de energia, já
que, age como mediadora entre os opostos. Parece oferecer uma união metafórica do
masculino e feminino, combinando mente/espírito e corpo, elementos masculinos e
femininos, consciente e inconsciente, real e irreal, fantasia e realidade concreta.
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Weinrib cita o trecho de uma obra de D. Kalff, no qual explica o encontro dos
elementos sicronísticos da técnica da caixa-de-areia, o trecho diz o seguinte: “A terapia
na caixa-de-areia é um evento sincronístico, já que nela ocorre um fenômeno psicofísico
simultâneo. A imagem interna recebe expressão física. A cada evento sincronístico,
nasce o próximo passo. A síntese entre o psíquico e o físico torna-se tese para a próxima
etapa no processo.
Há um momento sicronístico de cura, quando o interno e o externo ocorrem
simultaneamente; isto é, quando o paciente revela seu estado subjetivo interno ao
mesmo tempo que o terapeuta o compreende. O evento sincronístico, ao completar uma
Gestalt, cria e torna possível o próximo passo no desenvolvimento.” (Kalff, apud
Weinrib, 1993, p. 68).
Sobre a interpretação, a autora diz que, quando realizada prematuramente,
prejudicaria o processo pois, haveria uma ruptura também prematura, onde o Self ainda
não está constelado e o ego ainda não tenha sido renovado e emergido, não sendo desta
forma, relacionado e apoiado pelo Self.
As interpretações dadas após este desenvolvimento, podem ser ouvidas e
absorvidas de uma maneira diferente, podendo o paciente relacionar o seu interior com
o que ouve de fora.
Um outro assunto apontado por Weinrib, diz respeito à resistência. Diz que a
maioria das pessoas gostam da caixa-de-areia, mas inicialmente, também são
previamente condicionadas intelectualmente por tipos de experiências diferentes das
instintivas e não-verbais. Então, algumas pessoas precisam reativar sua imaginação e
infância, lançando-se a seus próprios recursos criativos e brincar. Para isto é preciso
coragem em enfrentar o vazio da caixa-de-areia, e alguns têm a sensação de que o
processo terá um significado maior do que é de fato. Portanto, para isto é preciso
21
estabelecer um relacionamento de confiança, através de uma rápida formação da aliança
terapêutica. A experiência não-verbal e não-racional é uma perda de comando do Ego
difícil de aceitar, é algo que foge do controle, onde os gestos e cenas dizem mais do que
palavras, e isto parece a muitos, assustador.
Muitos pacientes também, segundo Weinrib, tentam uma forma de resistência na
medida que montam cenários para satisfazer as expectativas do analista supostas ou
reais, e estas resistências devem ser respeitadas.
A terapia da caixa-de-areia não é eficaz com todos os pacientes.
Os estágios de desenvolvimento, assim como na análise verbal, podem ser
descritos como uma espiral, segundo Weinrib, no entanto existem diferenças entre os
estágios de uma análise verbal e de um processo na caixa-de-areia.
A terapia na caixa-de-areia é vivenciada pelo paciente de forma sublimativa,
somente após algum tempo é que há mais consciência e atividade do ego.
"Assim como na análise verbal, nem todos os pacientes na caixa-de-areia passam
por todos os estágios ou completam um processo. Alguns trabalham na caixa somente
em tempos de crise, outros têm metas ou tempo limitados; vêm com um problema
específico para resolver e trabalham até que este problema seja resolvido, e então
encerram a terapia. Alguns nunca se envolvem realmente com a caixa-de-areia, têm um
limitado potencial de desenvolvimento."(Weinrib, 1993, p.71)
Os estágios juntam-se e sobrepõem-se, mostrando assim vários estágios ou
elementos em vários estágios de evolução.
Os primeiros cenários, segundo Weinrib, são geralmente realistas, podendo dar
indicações dos problemas e de suas possíveis soluções.
Os cenários na segunda fase indicam rápida penetração nos níveis mais
profundos da personalidade (sombra). Podem ter forma caótica e aos poucos, vai-se
22
progredindo e começa-se então a perceber uma solução para problemas e complexos,
liberando mais energia, o que permite um aprofundamento maior na psique, ao ponto
em que o Self ou a totalidade podem ser constelados e tocados. Este é o estágio mais
profundo, que pode ser representado na caixa de várias maneiras, mas geralmente
aparecem simbolizações de união ou centralização.
Segundo Weinrib, "A consciência (ego) do paciente, tendo experimentado o Self
maior, desiste de sua autonomia e, paradoxalmente, no mesmo momento sente-se mais
forte devido à sensação de apoio dado por aquele mesmo poder transpessoal ao qual se
rendeu. A pessoa ganha então, um novo senso de ordem e segurança de seu próprio
valor. É esse fenômeno que Kalff chamou de “relativização do ego” ... “O ego não mais
se considera como o poder supremo dentro da personalidade, mas como evoluindo do
inconsciente e diariamente relacionado com ele."(Weinrib, 1993, p.72)
Esta é uma experiência semelhante à do Self na análise verbal, a única diferença
é que na caixa-de-areia, ela ocorre mais rapidamente.
Com a exibição do material ao paciente, há a descoberta e a surpresa frente à
riqueza interior, representada de forma concreta. O paciente então, ganha uma nova
sensação de força e valor, porque literalmente a vê. Sente então confiança em si mesmo,
e na vida, sente que pode haver um significado oculto até mesmo nos eventos infelizes
ou triviais.
Outra diferenciação da análise verbal, destacada por Weinrib, é a de que a
diferenciação da contraparte sexual (anima/animus) ocorre junto com a manifestação do
Self na caixa-de-areia, enquanto que na análise verbal, esta diferenciação precede a
constelação do Self e é a porta para ela.
23
Desta forma a autora conclui que a terapia na caixa-de-areia opera num nível
mais profundo, reconstituindo a unidade mãe-filho, onde há a constelação do Self; o
surgimento de um novo ego e a diferenciação dos elementos sexuais.
Weinrib cita o que Neumann escreveu em seu livro História da origem da
consciência, a respeito do surgimento do ego como reflexo do desenvolvimento da
personalidade, no nível urobórico matriarcal ao nível patriarcal da psique. À medida em
que o ego se desenvolve, símbolos masculinos e femininos aparecem no mesmo cenário,
relacionando-se, indicando uma interação mais equilibrada e dinâmica entre essas
características, uma união dos opostos na personalidade. E, quando este ponto é
atingido, pode-se mostrar o material e dar explicações e interpretações. Há a suposição
de que exista um ego capaz de integrar o material do inconsciente.
A terapia na caixa-de-areia fornece um caminho seguro, sem direção externa,
para nossas profundezas, assim, as interpretações tardias podem ser gravadas na
memória de uma maneira diferente, a partir de uma sensação de segurança interna.
Se, numa certa altura do processo, a caixa-de-areia serve de objeto transicional,
ela está contribuindo, de uma certa maneira à independência, estimulando-a, ao mesmo
tempo em que oferece segurança.
Weinrib diz ainda sobre a vantagem de haver menos palavras, é que ao existirem
muitas palavras, pode atrapalhar a comunicação imediata, já que a linguagem do
inconsciente é a imagem.
Outra vantagem apontada por Weinrib é a rapidez e a profundidade em que
opera a terapia na caixa-de-areia. Ela arrisca falar sobre o porquê disto ocorrer, como se
a concentração da atenção e a ativação das faculdades criativas imaginativas de um
espaço livre e protegido possa gerar ou liberar libido suficiente para soltar as amarras
dos complexos de maneira relativamente rápida e como se o processo de cura fosse
24
ativado através do exercício da imaginação. Ela diz que pelo menos em alguns casos, a
interação entre a caixa-de-areia e a análise verbal parece ter um efeito sinérgico.
Weinrib ressalta ainda alguns pontos de precaução, onde alerta para a operação
de um nível primitivo da psique, onde os desenvolvimentos devem ser cuidadosamente
integrados à consciência e à vida cotidiana. Deve-se portanto assumir responsabilidades
por estes conteúdos.
Além disso, o paciente libera uma grande quantidade de energia física e
psicológica à medida em que começa a constelação do Self, havendo uma sensação de
bem-estar. Destaca que é importante encontrar um foco para esta energia, alguma saída
criativa e significativa. Se o terapeuta não reconhecer o fenômeno energético, ela alerta
sobre o perigo real de inflação, ou seja, de expansão da personalidade além de seus
limites adequados, através da identificação com a persona ou com um arquétipo; ou do
mau uso da energia, com conseqüências graves.
1.4. Síntese
Segundo Weinrib, "De uma maneira geral, a terapia na caixa de areia é uma
modalidade eficiente que fornece:
• Acesso direto ao mundo interior pessoal dos impulsos e dos sentimentos. Acesso ao
mundo lúdico criativo da criança, bem como uma entrada razoavelmente segura no
mundo arquetípico mais profundo, já que concretiza e delimita a linguagem
arquetípica de imagens. Também age como mediadora ou ponte para o mundo
exterior.
• Um instrumento para recuperação da dimensão especificamente feminina da psique.
• Um meio de reparar os danos à imagem materna que, de outra forma, iria prejudicar
a realização da potencialidade da personalidade completa. Isso é feito através da
25
reconstituição da unidade mãe-filho, que permite a constelação do Self, precursor do
desenvolvimento de um ego saudável.
• Ativação da capacidade natural , autocurativa, da psique.
Um meio de atingir e vivenciar o mundo transpessoal da psique. Isso produz a
“relativização do ego” e um relacionamento naturalmente mais equilibrado entre o
ego e o Self.
• Uma oportunidade para os pacientes com dificuldades de expressão saírem de seu
isolamento interno através da comunicação não-verbal realizada nos cenários da
areia. Isso é especialmente útil quando as capacidades intuitivas ou empáticas do
analista não forem muito desenvolvidas, já que os cenários oferecem uma expressão
concreta da situação do paciente.
• Uma recanalização e/ou transformação da energia bloqueada.
• Um meio de autodescoberta e um despertar da capacidade criativa com influência
mínima do terapeuta. Um ritual de passagem, tal como Jung descreveu em Dreams,
Memories, Reflections, ao pintar um quadro ou esculpir: “cada uma destas
experiências mostrou ser um ritual de entrada para as idéias e trabalhos que surgiam
vigorosamente atrás disto”.
• No mínimo, uma oportunidade para experiência criativa não-racional como uma
compensação a uma exagerada ênfase coletiva no intelecto dirigido pelo ego." (1993,
p.78-79)
A terapia na caixa-de-areia é um passo no processo de individuação, é uma
técnica na maioria das vezes inconsciente, ou, em algumas etapas, semiconsciente.
Para crianças, a cura, a constelação e a ativação positiva do Self, segundo
Weinrib, parecem fornecer uma base segura, da qual um ego saudável e uma
consciência madura podem surgir naturalmente.
26
Para os adultos, ocorre num prazo relativamente curto, a confiança renovada nas
suas próprias potencialidades e uma sensação de apoio interno. o processo então se
desloca progressivamente em direção à realidade concreta e à vida cotidiana, à medida
que o paciente se esforça para integrar experiência terapêutica no seu cotidiano.
2. PROCESSOS DE CURTA DURAÇÃO
2.1. Psicodiagnóstico
O psicodiagnóstico, segundo Ancona-Lopez (1995), é uma atividade que se
desenvolveu paralelamente à psicologia e procura conhecer e compreender o homem.
Costuma ser um momento de transição para o atendimento posterior, quando o cliente
encontrará acolhimento para suas dúvidas ou sofrimentos
O psicodiagnóstico para a autora é entendido como prática de investigação,
avaliação ou seleção, onde o paciente encontra-se mobilizado, porque já tentou de certa
forma utilizar de seus próprios recursos para resolver algo e, ao aceitar passar por um
psicodiagnóstico, está tentando compreender suas atitudes ou de outras pessoas.
Para Trinca (1984), a palavra diagnóstico significa discernimento, faculdade de
conhecer, de ver através de. Seu sentido pode ser amplo, confundindo-se com a
compreensão de um fenômeno, na medida em que para chegar-se ao conhecimento
utiliza-se processos de observações, de avaliações e interpretações, baseados em
percepções, experiências e informações adquiridas e formas de pensamento.
Nesta prática estão envolvidos diferentes níveis de intervenção, já que toda
intervenção segundo a Ancona-Lopez (1995), está sempre ligada ao processo
terapêutico, seja ele de longa ou curta duração. Por este motivo, é que há a necessidade
de se estudar novas formas e técnicas de intervenções. No caso, do paciente encontrar-
27
se mobilizado e, já ter utilizado de todos os seus recursos verbais, acredita-se que uma
nova técnica de intervenção não-verbal (Sandplay) possa ser muito útil.
Segundo a Ancona Lopez, é necessário que haja um pedido de ajuda imediata
por parte do cliente. Assim, estabelece-se um contrato com o cliente, deixando claro que
ele tente mapear a maneira como estabelece suas relações com o mundo, com ele
mesmo, com os objetos, entre outras coisas.
Para a autora, o profissional que trabalha com este recurso deve ter um papel
ativo, partilhando suas impressões com o cliente. Portanto deve haver uma relação
diferenciada, onde o terapeuta não guarda para si os conhecimentos que o paciente veio
buscar.
A meu ver, este é um ponto um pouco difícil a ser desenvolvido, num
psicodiagnóstico com o Sandplay, já que este necessita de uma relação de confiança
entre terapeuta e cliente. Esta é uma relação que necessita de certo tempo para ser
estabelecida, principalmente numa técnica como a da caixa-de-areia, onde o paciente
tem que expor-se, sem controle, sobre suas questões pessoais e, para esta exposição, ele
tem que sentir-se num ambiente seguro.
Na prática do Psicodiagnóstico, segundo Trinca (1984), o objetivo é organizar os
elementos presentes no estudo psicológico, de modo a obter uma compreensão do
cliente a fim de ajudá-lo.
O processo psicodiagnóstico para este autor, pode estar dividido, ou ser
classificado em conformidade com os tipos e modelos diagnósticos existentes:
O processo psicométrico é aquele onde o psicólogo é um simples aplicador e
avaliador de testes psicológicos, ele entra em contato apenas com aspectos parciais da
personalidade do cliente, de modo objetivo e evitando maiores compromissos com
aspectos mais profundos da personalidade deste cliente.
28
No processo comportamental, consideram-se prioritários os dados de observação
objetiva. São observações feitas através de dados extraídos da Psicologia
Comportamental.
No processo psicanalítico o diagnóstico deve configurar uma espécie de ante
visão dos fenômenos de uma prática psicanalítica (transferência e contratransferência).
O processo baseado no modelo médico leva em conta as noções advindas do
diagnóstico clínico em medicina. Neste caso, a conduta do psicólogo é de
despersonalizar-se para não prejudicar a coleta de informações e o pensamento clínico.
Vê-se apenas a patologia.
Por fim, o processo compreensivo tenta abarcar a multiplicidade dos fatores aí
em jogo. Pretende encontrar um sentido para o conjunto das informações disponíveis,
tomar aquilo que é relevante e significativo na personalidade. Este processo leva em
conta a visão totalizadora do indivíduo humano.
Para a estruturação de um processo psicodiagnóstico, para Trinca (1984),
normalmente se empregam técnicas e métodos especializados de exame psicológico.
Assim, a observação clínica, os testes psicológicos, as entrevistas, englobam-se de
modo a satisfazer o bom uso deste processo.
Um dos pontos principais que o autor ressalta na escolha dos recursos para esta
finalidade, é a escolha de procedimentos que permitam maior liberdade para a
emergência do material clínico. Ele considera este processo com sendo útil recurso
para: avaliação global da personalidade; a determinação da natureza, intensidade e
relevância dos distúrbios; a orientação psicológica aos pacientes, pais e responsáveis, à
escola; o fornecimento de subsídios a demais profissionais; indicações e
encaminhamentos terapêuticos; a definição do tipo de intervenção psicoterapêutica; a
determinação dos objetivos, áreas relevantes e intensidade da intervenção
29
psicoterapêutica (planejamento psicoterapêutico); o prognóstico do caso; o prognóstico
da evolução terapêutica; a pesquisa psicológica, etc.
Gilberto Safra (in Trinca, 1984), aborda a questão dos procedimentos clínicos
utilizados num processo diagnóstico. Ele diz que “o elemento primordial do processo
diagnóstico é a captação pelo profissional dos fatores perturbadores e das angústias
básicas do cliente, assim como dos mecanismos mais importantes que ele utiliza para
lidar com suas angústias”. Portanto ele conclui que a importância dos procedimentos é
que ofereçam a oportunidade de o cliente expressar suas angústias e dificuldades mais
prementes, e essas necessidades do cliente devem ser respeitadas. Ele destaca ainda
alguns instrumentos clínicos que possibilitam ao psicólogo um contato mais penetrante
na vida psíquica de seu cliente: O jogo dos rabiscos; o procedimento dos desenhos e
estórias; o ludodiagnóstico; a entrevista verbal com a criança; os testes psicológicos
usuais (Projetivos: T.A.T.; C.A.T.; Psicodiagnóstico de Rorschach; Desenho de
Família; desenho da figura humana; H.T.P. Testes Psicomotores: Stamback; Piagethead; Bender. Testes de Inteligência: Escala de Weschler/Wisc-Wais; Terman-Nenill;
Raven.)
Desta forma, a grande importância que vejo no processo diagnóstico é a de
fornecer um meio e um espaço seguro para que o paciente possa expressar-se e sentir-se
confiante em expor seus receios e angústias. Portanto, não se deve levar em conta um
determinado instrumento como certo para o sucesso do processo, e sim, adequar-se ao
paciente, tanto na relação entre ambos (terapeuta e paciente), como nos instrumentos a
serem utilizados; deve haver o respeito acima de tudo, pelo paciente.
Acredito que o recurso da caixa-de-areia, possa ser mais uma destas técnicas a
serem exploradas pelos terapeutas, desde que respeitada a relação dele com seu
paciente, bem como da técnica com ambos.
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2.2. Orientação Vocacional
A vocação é algo que encontra-se na base de qualquer escolha profissional. Ela é
um dom inato nas pessoas, sendo aprendida e desenvolvida a partir das experiências
pelas quais todos passam. O interesse por determinadas atividades é despertado pelo
meio social em que se vive como: família, parentes, amigos, etc. Os estímulos que esse
meio oferece é que impulsionam o indivíduo para a realização de determinadas tarefas,
proporcionando-o reconhecimento social e satisfação pessoal. Porém, também é
necessário dizer que o interesse por determinadas atividades está ligado ao fator das
potencialidades do indivíduo, ou seja, capacidades que ele apresenta e que lhe permitem
levar a cabo uma tarefa específica, com bom desempenho e habilidade. Portanto, o
interessante na escolha profissional seria aliar os três fatores comentados: interesse e
satisfação pessoal com suas potencialidades. Além disso, a escolha profissional baseada
na vocação leva em conta os valores sociais que são imputados às várias profissões.
Credita-se valor às funções e, mais tarde, quando o indivíduo torna-se adulto, quer ser
reconhecido segundo este valor.
A grande dificuldade na escolha profissional é a de articular estes três elementos
inseridos na organização da sociedade em que se vive. Este é o momento de crise que
todo indivíduo passa, ao ter que definir uma escolha em sua vida, não só no campo
profissional, como ao longo de diversas outras decisões. A escolha não define o término
total desta crise, mas direciona os esforços no sentido de melhor responder às várias
conseqüências da escolha. A escolha é apenas o início do trabalho. Neste momento de
crise, é importante a análise do meio social, bem como que possam ser reconhecidas as
profissões que podem adequar-se àquilo que se deseja, as habilidades que fazem parte
das características individuais, entre outras coisas. É articulando estes elementos que
31
pode-se adquirir consciência neste momento de escolha, sem ter que necessariamente,
ser obtido com grande sucesso. O empenho é necessário para o sucesso, mas se após
alguns anos a percepção indicar que esta não foi a melhor escolha, há de se
reconsiderar, pois o princípio básico que norteia o bem estar é o prazer que encontra-se
no “fazer” da função exercida.
A orientação vocacional e profissional, constitui um trabalho de extrema
importância na escolha de uma profissão, já que o jovem nem sempre está apto para
essa escolha que, de certo modo, parece ser tão conclusiva, envolvendo grande
responsabilidade.
O orientador participa do processo de escolha como um facilitador, como
redutor de tensões que não permitem correta visão do ser pessoal e social.
O momento da escolha profissional ocorre numa época em que o adolescente,
que muitas vezes jamais pensou em seu futuro profissional, encontra-se de repente
lançado no mundo adulto, vislumbrando as diversas responsabilidades que recaem sobre
cada setor profissional. Assim, ele é incentivado a começar a compreender-se, tornar-se
mais consciente de suas responsabilidades sociais. É preciso aí, que o jovem verifique e
entre em contato com suas habilidades, que descubra o que mais gosta de fazer, que
saiba considerar e pesar as pressões familiares, que reconheça suas expectativas quanto
ao status social que as diversas carreiras propiciam e que depois possa fazer com um
pouco mais de clareza sua opção profissional. É de extrema importância, que ele
descubra suas potencialidades e aprenda a lidar com elas de forma construtiva e criativa.
A escolha em si, faz parte da vida cotidiana, e o que deve ser trabalhado com o
jovem neste momento, é a preparação para enfrentar esta e outras escolhas em sua vida,
com seus riscos e responsabilidades, pois afinal, sempre estará havendo escolha, o que
varia é o grau de consciência e liberdade envolvido nisto.
32
A orientação profissional, quando iniciada em tempo hábil, pode ser considerada
um trabalho preventivo, pois analisa os vários aspectos envolvidos no processo de
escolha, permitindo uma tomada de consciência, por parte do adolescente, do papel
social que ele representa de sua vida e de seu futuro.
Este momento de escolha é tido como um momento de crise, pois é concebida a
percepção de que toda a escolha envolve riscos, implicando em conquistar coisas e
perder outras. Neste momento, a idéia de liberdade do adolescente, é colocada em
cheque, ele é desprovido disto para um ritual de iniciação: a idade adulta. É fato
portanto, que esta escolha deve ser vista como fruto de um processo de amadurecimento
emocional e cognitivo que possibilita as condições necessárias para que o adolescente a
faça. Para isso, faz-se necessário o estímulo a este amadurecimento, o levantamento de
questões, a verificação das potencialidades internas deste adolescente, o auxílio nas
discriminações das várias influências, inclusive inconscientes, a que está sujeito, a
discussão dos preconceitos sociais que direcionam suas escolhas.
Esta idéia de que o adolescente enfrenta um período de crise, assumindo os
riscos que implicam em ganhos e perdas, é que se insere o conceito de sacrifício,
comentado por Gimenez (1995) em seu trabalho, onde ela diz que o sacrifício pode ser
uma função estruturante criativa, ou seja, através dela pode-se criar novas estruturas na
personalidade do indivíduo que possibilite uma adaptação melhor ao meio externo e
simultaneamente ao seu mundo interior. “O sacrifício gera uma transformação através
da perda da experiência anterior. É o momento natural do morrer e renascer, do velho
dando espaço ao novo. Enquanto não aprendemos a morrer, a deixar morrer em nós e
em nossas vidas o que não serve mais o que não faz sentido, dificilmente conseguimos
realmente viver”(p. 94). Ela comenta que o adolescente nesta fase, tem que sacrificar
diversas coisas em sua vida, o que implica no sacrifício de seu estado infantil (seu
33
corpo, sua dependência dos pais, sua visão de mundo e seus relacionamentos). Ela
supõe ainda que, na procura do adolescente por uma orientação profissional, a resposta
que procura, não está no consciente, e que às vezes é preciso ir mais a fundo, dando voz
e espaço a dimensões mais profundas de seu ser para se chegar às respostas, e para isto
é preciso um sacrifício. “É preciso sacrificar a nossa ilusão de que o Ego (o centro da
consciência) é o centro da personalidade também”(p. 95) Para ela, é preciso que o
indivíduo abdique ou sacrifique o controle e o poder que acredita ter em relação à
consciência e passe a crer numa orientação no inconsciente para a totalidade, para a
realização do Self. “O sacrifício do Ego como princípio diretor da personalidade se faz
necessário para que continue a transformação em processo. Esse princípio diretor
perdeu sua eficiência. Através do seu sacrifício, é possível entrar em contato com a
psique autônoma, com o real princípio diretor da nossa personalidade, que é o Self”.(p.
97)
Gimenez levanta a hipótese de que o contato com a caixa-de-areia, logo no
início de um processo de Orientação Profissional, facilita a construção do vínculo de
confiança, o que num processo breve como este, é muito importante. Relata casos em
que percebeu a possibilidade de acesso a um nível de informação mais profundo.
Portanto, no que ela chama de primeira fase no atendimento em orientação profissional,
explora-se a dinâmica psíquica do paciente, chegando a símbolos profundos da psique,
através de imagens concretas que mobilizam profundamente e geram novos materiais
psíquicos, possibilitando ao terapeuta uma visão clara, concreta e profunda da dinâmica
do paciente. A partir disso, ela explora o material e o caminho que podem seguir
segundo as informações necessárias à jornada a que o paciente está se propondo. É o
momento de busca de informações, onde é trabalhada a questão profissional de uma
forma mais direta, a qual ela chama de segunda fase do atendimento.
34
Considera ainda, uma terceira fase, onde trabalha o final do processo, o vínculo
terapêutico que foi estabelecido, o significado do movimento breve e profundo que
fizeram e o espaço que há na vida do paciente para novos conhecimentos adquiridos no
processo.
Gimenez (1995) relata ainda, em seu trabalho, um estudo de caso realizado num
trabalho de orientação profissional, onde a técnica do Sandplay pode mobilizar a
paciente, desde o início do trabalho, estimulando uma produção simbólica importante,
na qual a utilização da caixa-de-areia possibilitou a constelação concreta de símbolos e
funcionou como um instrumento que levou o paciente a um momento de abrir novas
portas, que traziam novos símbolos que iam sendo aproveitados para a compreensão da
situação de escolha mais atual do que a anterior.
Ela relata ainda sobre as possibilidades de utilização que pôde experimentar
neste atendimento, sendo a primeira como forma de iniciar um contato com os símbolos
de forma profunda e concreta, funcionando como um “catalizador” do processo e, uma
segunda forma, com o objetivo de amplificar e trabalhar de uma forma concreta os
símbolos que a paciente havia trazido num sonho. Para ela, esta segunda forma de
trabalho, consiste na transformação de imagens
oníricas em expressão simbólica
concreta e palpável, visando facilitar e otimizar a assimilação deles pelo paciente, no
processo.
Desta forma, acredito com base nestes relatos, que seja possível a utilização da
técnica de Sandplay num processo de curta duração como O.P., já que trabalha-se
principalmente, com um momento de crise envolvendo uma escolha para o paciente (um
sacrifício), e também a possibilidade do trabalho simbólico de uma forma concreta e
clara, o que a meu ver, pode servir como um guia para o terapeuta na condução do
processo e direcionamento do foco que está sendo trabalhado.
35
2.3. Psicoterapia Breve
Lemgruber (1985), fala sobre a necessidade da mudança em direção ao modelo
das psicoterapias breves e ao abandono das terapias tradicionais a longo prazo,
numerando diversos fatores que podem explicar esta tendência em direção às terapias de
curto prazo; entre elas o desenvolvimento do movimento dos Centros Comunitários de
saúde mental (CMHC), nos Estados Unidos, a partir da década de 60; o advento das
terapias cognitivas e comportamentais, que sempre foram tratamentos de curta duração;
os estudos e pesquisas especificamente com tratamentos com tempo delimitado, já que
há muita dificuldade em se desenvolver estudos mais objetivos e sistematizados com as
terapias a longo prazo; a observação, entre os próprios terapeutas, de que a maioria dos
pacientes deseja um tratamento mais rápido e de que muitos pacientes que podem
beneficiar-se desta abordagem não teriam outra disponibilidade de tratamento devido às
várias dificuldades de que um tratamento mais longo requer, como uma maior
disponibilidade de tempo e/ou de dinheiro e de dedicação a um processo que não tem
previsão de término; e, finalmente, a pressão pela diminuição de custo exercida pelas
companhias de seguro saúde e pelas empresas que, mesmo dando cobertura aos seus
funcionários, limitam o atendimento psicoterápico a um número determinado de
consultas.
As raízes da P.B. de orientação psicodinâmica são encontradas nos trabalhos
pioneiros de S. Freud e de seus seguidores, sendo considerados portanto, a primeira
geração da P.B. Ainda desta primeira geração destacam-se F. Alexander e T. French.
Lemgruber (1997), define como a segunda geração da P.B., surgiu com o estudo
de técnicas mais modernas e dinâmicas com os estudos de D. Mallan, J. Mann, P.
Sifneos e H. Davanloo., onde Mallan, define o conceito de foco, sua grande
contribuição.
36
Com a terceira geração da P.B., cita-se principalmente abordagens em P.B., que
desenvolveram Manuais de Tratamento, nos quais se especifica com detalhes o modo
como o processo terapêutico deve ser conduzido, dando ênfase às terapias do tipo
comportamental e cognitivo.
A autora arrisca colocar como proposta de quarta geração de P.B., o modelo de
atendimento integrado da psicoterapia e farmacologia.
Ela ressalta a origem dos termos breve, ou curto prazo, onde encontra-se a
tentativa de S. Ferenczi em encurtar o tempo de duração dos tratamentos psicanalíticos.
Lemgruber (1997), diz que hoje em dia, há várias outras formas de tratamento,
inclusive muitas que não têm origem na Psicanálise, e que são também rápidas e
eficazes. Ela classifica a P.B., em duas abordagens e/ou categorias: as P.Bs. com
orientação psicanalítica e as P.Bs. de linha cognitiva e comportamental, portanto, não
ressalta nada ligado a Jung.
Ela ressalta ainda que, em sua forma didática, a técnica da P.B., se baseia num
tripé: foco; atividade e planejamento.
O principal aspecto que cabe aqui ressaltar em P.B., já que a autora apenas leva
em conta a teoria psicanalítica, é o foco; ou seja, todo o material consciente e
inconsciente do paciente, delimitado como área a ser trabalhada no processo terapêutico
por meio de avaliação e planejamento prévios. Para que isto ocorra, o terapeuta deve
sempre guiar seu paciente para o foco em questão e as interpretações devem ser vistas a
respeito de um determinado ponto da vida do paciente. O terapeuta portanto, vai tentar
levar o paciente a trabalhar emocionalmente, em especial em uma área previamente
determinada e, para atingir este objetivo ou alvo, ele deve lançar mão de três recursos
técnicos: a interpretação seletiva, ou seja, interpretar o material referente ao conflito
focal; atenção seletiva, onde se buscam todas as possíveis relações do material que o
37
paciente traz, com o problema focal; e negligência seletiva, que vai levar o terapeuta a
evitar qualquer material que, mesmo sendo interessante, possa desviá-lo demais da meta
a ser atingida.
"O foco que o terapeuta deve buscar na história do sofrimento do paciente é o
conflito crônico, que aparece em muitos eventos narrados durante as sessões. O
terapeuta deve então, basear e orientar todo o processo terapêutico nessa direção, com
vistas a fazer com que o paciente supere tais conflitos" (Lemgruber, 1997, p.40)
A autora diz que na abordagem focal, a finalidade é a reestruturação do Ego.
Quanto ao planejamento, deve-se levar em conta, segundo ela, o alto nível de
atividade do terapeuta, o estabelecimento de objetivos específicos e limitados, a
identificação e manutenção de um foco terapêutico, a delimitação de um limite
temporal.
Para Alexander (1965, apud Lemgruber), o fato do paciente vir a recordar algo
que antes lhe era impossível, demonstra que aumentou agora sua capacidade interna
para enfrentar certo tipo de constelação emocional perturbadora. A experiência antiga
então, agora poderá ser desfeita por uma experiência corretiva (E.E.C.).
Lemgruber (1997) ressalta para que nem todos os pacientes são adequados para
se submeterem a este tipo de abordagem, portanto é importante ao terapeuta um
diagnóstico, considerando inclusive a força do ego e a saúde física do paciente. Deve
então, ser usada com pacientes avaliados como passíveis de serem beneficiados por esta
técnica e apenas por terapeutas especialmente treinados para tanto. A motivação para a
mudança sempre foi considerada uma condição imprescindível para se realizar um
processo psicoterapêutico breve.
Segundo Mallan (1974;1981, apud Lemgruber), alguns critérios são contraindicados ao uso desta técnica:
38
Pacientes que tiveram sérias tentativas de suicídio; dependência de drogas;
alcoolismo crônico; homossexualidade convicta; hospitalização a longo prazo; mais de
uma terapia eletroconvulsiva; sintomas obsessivos crônicos severos e incapacitantes;
sintomas fóbicos crônicos severos; acting-out destrutivo ou auto-destrutivo. Destaca
ainda outros fatores que podem levar a um fracasso ou a pouco sucesso em P.B.:
dificuldade de se estabelecer um bom relacionamento terapêutico com o paciente; baixa
motivação do paciente para se submeter a um processo psicoterapêutico; presença de
problemas complexos ou arraigados, que requeiram um período de tratamento mais
amplo, para que possam ser abordados; reações transferenciais difíceis; ocorrência de
episódios depressivos ou psicóticos severos durante o tratamento, requerendo
tratamentos auxiliares.
Assim como ele ressalta para as contra-indicações, também ressalta três
elementos que considera essenciais na seleção de pacientes adequados a uma
abordagem em P.B., ou seja, os indicados: presença de um problema circunscrito;
habilidade em reagir às interpretações na entrevista inicial; clara evidência de
motivação para a mudança. Já Sifneos, (1964;1967;1972;1989;1993, apud Lemgruber),
aponta para outras indicações: queixa principal circunscrita; motivação para a mudança;
capacidade de expressar sentimentos e de interagir flexivelmente com o terapeuta;
capacidade intelectual acima da média e sofisticação psicológica; ter tido pelo menos
um relacionamento emocionalmente significativo na infância; disposição em participar
ativamente da avaliação de seu problema; honestidade ao relatar os dados a respeito de
si próprio e de sua vida; capacidade de reconhecer que seus sintomas são de origem
psicológica; capacidade de introspecção e curiosidade a respeito de si-próprio; abertura
a novas idéias; expectativas realistas em relação aos resultados do tratamento;
39
disposição em fazer um sacrifício razoável, seja de tempo, dinheiro, ou de
disponibilidade interna para lidar com questões muitas vezes desagradáveis.
Segundo Lemgruber (1997), a P.B., tem uma preocupação finalista, tem
objetivos terapêuticos definidos, e visa uma cura ou uma melhora na qualidade de vida
do indivíduo.
Para Jung, (1985) o terapeuta não tem que ter conhecimento apenas da biografia
social do paciente, mas também das condições espirituais do seu meio ambiente
próximo e remoto. Ele destaca como primordial em sua teoria a linguagem dos sonhos,
o que, a meu ver, tem muito da simbologia apresentada no Sandplay, pois ambos tratam
de um processo não-verbal, sendo linguagens simbólicas que segundo ele, além de
recorrer à formas recentes, também serve de modos primitivos de expressão. Por isso é
que a linguagem simbólica dá condições de ajudar o cliente a sair da estreiteza, muitas
vezes angustiante, de uma compreensão exclusivamente personalística de si, e livrá-lo
da prisão egocêntrica, que até agora lhe encobria a perspectiva de horizontes mais
amplos de sua evolução social, moral e espiritual.
Para ele, a psicoterapia é um campo da terapêutica, que desenvolveu e atingiu
uma certa autonomia somente nos últimos cinqüenta anos. Trata-se de um tipo de
procedimento dialético, como ele mesmo diz, um diálogo ou discussão entre duas
pessoas. "A pessoa é um sistema psíquico, que, atuando sobre outra pessoa, entra em
interação com outro sistema psíquico" (Jung, 1985, p.1). Assim ele define a relação
paciente-terapeuta.
Ele defende dois preceitos fundamentais, onde o primeiro é de que a psique
depende do corpo, e o corpo depende da psique; e a segunda é a de que o individual não
importa perante o genérico, e o genérico não importa sobre o individual. A partir disso,
ele considera que só se pode afirmar sobre a individualidade de outrem, o que encontra-
40
se na própria individualidade. Por isso é que para dispor-se a fazer um tratamento
psíquico, deve-se renunciar à superioridade no saber, a toda e qualquer autoridade e
vontade de influenciar. É portanto, por isso que opta-se por um processo dialético, onde
confrontam-se averiguações mútuas, sendo possível apenas, ao deixar ao outro a
oportunidade que apresente seu material o mais completamente possível, sem limitá-lo
por pressupostos. Aí é que compreendo que o processo da caixa-de-areia se faz
importante, pois o paciente está livre para apresentar seu material, sem pré-conceitos ou
limitações, onde expõe sua individualidade e onde a terapia breve serviria como uma
limitação apenas do foco a ser trabalhado, da questão principal e mais conflituosa no
indivíduo.
Sobre o homem genérico, sua segunda proposição, ele diz que tem
características primitivas, razão pela qual tem empregado métodos técnicos em seu
tratamento, outra razão a meu ver, em que no processo da caixa-de-areia, este homem
primitivo tem a oportunidade de se revelar e, portanto, facilitar o processo. Para Jung
(1985) só importa o método em que o terapeuta tem confiança, para isso, sua fé no
método é imprescindível e decisiva. "Se acreditar, ele fará por seu paciente tudo o que
estiver a seu alcance, com seriedade e perseverança, e esse esforço voluntário e essa
dedicação têm efeito terapêutico, dentro das limitações psíquicas do homem coletivo.
Os limites, porém, são fixados pela antinomia individual-coletivo."(p. 4 e 5)
Assim, acredito que seja possível que estes limites sejam fixados pelo terapeuta,
ou seja, o foco seja um acordo entre terapeuta e paciente, onde este terapeuta deverá,
por sua vez, esforçar-se e confiar, em que seu método de trabalho funcionará,
principalmente com a participação intensa de seu paciente. Jung (1985), diz que o
terapeuta não é mais um sujeito ativo, mas ele vivencia junto um processo individual,
assim como menciona Weinrib (1987) onde o terapeuta deve também passar pelo
41
processo analítico e, no caso, a caixa-de-areia, pois, aquilo que não está claro para ele,
porque não quer ser reconhecido em si mesmo, o impede que se torne consciente no
paciente.
Mais tarde, em sua obra, Jung (1985), fala sobre o inconsciente e comenta sobre
alguns sentidos simbólicos em que se utilizou para a interpretação de sonhos de seus
pacientes. Diz que como a água significa o inconsciente em geral, a figura da mulher
desconhecida é a personificação do inconsciente que denomina anima. Ele afirma que,
em princípio, essa figura só se encontra nos homens, e só se manifesta com nitidez
quando as características do inconsciente começam a tornar-se problemáticas para o
paciente. Desta forma, pode-se perceber que estes elementos estão presentes no
processo da caixa-de-areia, descrito por Weinrib (1987) onde existe o fundo azul da
caixa representando a água e onde a figura feminina, como já foi anteriormente descrita,
é parte permanente do processo.
Jung (1985), continua dizendo sobre a psicoterapia moderna, onde no decorrer
dos últimos 35 a 40 anos, operou-se uma mudança no campo da psicoterapia em
detrimento da sugestão direta, e a favor de todas as formas de terapia baseadas na
conscientização das causas patogênicas.
Ele fala que a psicoterapia moderna , já não pode ser de massas, mas depende do
interesse amplo e sem reservas dispensado a cada paciente individualmente. Ele diz
então que o procedimento é longo e demorado, apesar de haver muitas tentativas em
abreviar ao máximo a duração do tratamento, mas que não afirma que os resultados
possam ser animadores. Porém Melo (1998), em sua obra diz que a possibilidade de
aplicabilidade dos conceitos junguianos em Psicoterapia breve detém-se na "redução do
tempo em psicoterapia com focalização do processo terapêutico"(p.9). Ela diz que este
tipo de abordagem se faz, pela idéia de que "uma estrutura de Ego frágil tende a se
42
defender mais rigidamente das imagens do inconsciente. A mobilização do processo
criativo do indivíduo, facilita a focalização da psicoterapia, ampliando o campo da
consciência e fortalecendo o Ego através da integração das imagens que anteriormente
estavam dissociadas."(p.9)
A meu ver, esta mobilização do processo criativo faz-se presente
constantemente, no processo com a caixa-de-areia, assim como uma maior da
integração das imagens inconscientes e portanto um fortalecimento do Ego. A própria
autora vê a caixa-de-areia como sendo uma técnica focal, pois o uso das miniaturas e da
areia, fazem uma ponte entre os conteúdos simbólicos do inconsciente e o consciente,
que o ego imaturo, não teria condições de suportar.
Jung (1985), diz ainda que a evolução mais recente procura estabelecer como
meta terapêutica, não só a conscientização dos conteúdos e suas tendências causadoras
das doenças, mas também, a volta aos instintos primitivos e simples, a fim de
restabelecer no paciente sua condição humana natural e sem deformações, o que me
parece possível dentro do processo de Sandplay.
Assim comenta Jung (1985) que no desenvolvimento psicológico, é importante
que o terapeuta deixe imperar a natureza, e que evite, na medida do possível, influenciar
o paciente com seus próprio pressupostos teóricos, filosóficos, sociais e políticos. Com
isso ele justifica que, não se visa o "individualismo", mas unicamente uma forma de
estabelecer que, cada qual se conheça a si mesmo e sua própria maneira de ser, e que
tenha a coragem de assumi-la. Mais uma vez ele diz então que este é um processo
demorado, onde, reeducar uma pessoa, que em grande parte é inconsciente de sua
própria personalidade, até que ela mesma se veja em condições de trilhar,
conscientemente o caminho certo, e reconheça claramente sua responsabilidade social, é
um processo cheio de percalços. Por isso, acredito que um processo breve na abordagem
43
junguiana, por si só, colabora com a entrada neste universo onde vislumbra-se a
possibilidade deste conhecimento e, a caixa-de-areia, pode ser um meio facilitador para
que isto ocorra.
Jung (1985) cita o método que utiliza em, diminuir gradualmente o número de
sessões de modo que o paciente também tente por si mesmo caminhar cada vez menos
dependentemente de seu terapeuta, e mais, diz que certas vezes acha até aconselhável
haver uma pausa no tratamento, para que assim, o paciente dependa novamente de seu
ambiente normal de vida, não alienando-o assim em seu mundo. Diz ainda que este
método atribui ao tempo uma importante função na cura, sem que o paciente tenha que
pagar o tempo do terapeuta. Ele explica que, se os pacientes são bem orientados, em
pouco tempo, tornam-se capazes de colaborar. Percebe-se aí, que fala a respeito de um
tempo mais curto e mais espaçado entre as sessões terapêuticas, bem como da
preocupação com o gasto financeiro que o paciente tem nestas sessões, o pode colaborar
com a idéia de psicoterapia breve, de uma forma bastante orientativa aos pacientes, e
também, com certas restrições, como cita Lemgruber (1997).
Jung (1985), fala então sobre a importância na interpretação dos sonhos, sendo
muito eficaz e exigente de um conhecimento amplo do terapeuta a respeito da
simbologia, se utilizando para isto do estudo das mitologias e religiões, como também
instrumentos como o Sandplay.
Ele diz ainda que a tarefa da psicoterapia consiste em mudar a atitude
consciente, assim como a psicoterapia breve e o processo de Sandplay, não sendo
somente correr atrás de reminiscências submersas na infância. Diz que uma coisa não é
possível sem a outra, certamente, mas que a ênfase maior é sobre a atitude consciente do
paciente. A meu ver, o processo de Sandplay, integra de forma muito clara estes dois
níveis de crescimento e cura no tratamento terapêutico. Há tanto a mudança de atitude
44
visível ao paciente, como também o "mergulho" nas reminiscências submersas na
infância.
A respeito destas tendências regressivas da infância, Jung (1985), diz que não
representam apenas uma recaída na infantilidade, mas uma tentativa genuína do homem
de encontrar algo de importante para si. Reconhece ainda que, o fato do paciente
entregar-se a estas reminiscências da infância pode representar um risco e
eventualmente, ser sua ruína, mas mesmo assim, motiva-os conscientemente a lidar com
estas preciosas recordações, pois confia no sentimento de seu próprio valor. Emprega
portanto, tudo o que esteja a seu alcance para chegar ao resultado de cura terapêutica.
Mais adiante, Jung (1985) fala sobre os objetivos da psicoterapia, onde ressalta
para o êxito desta. Diz que o terapeuta só tende a aprender com seus fracassos, pois, são
eles experiências preciosíssimas, não só porque através dele se faz abertura para uma
verdade maior, mas também porque obriga-o a repensar sua concepções e métodos.
Diz também da dificuldade maior que encontra em trabalhar com pessoas de
mais idade, falando sobre o amanhecer e o entardecer da vida. Diz que a vida do jovem
está sob o signo de um expansão geral, em vista de uma meta a ser atingida; em
contrapartida, a pessoa de mais idade, está sob o signo da contração das forças, da
confirmação do que já foi alcançado e da diminuição da expansão e, nestas pessoas,
encontra-se maior resistência aos métodos racionais de tratamento. Por isso também,
vejo que o processo de Sandplay, trabalha com estes aspectos menos racionais, mais a
nível não-verbal e que vão tornando-se racionais, à medida em que o paciente percebe
aquilo como tendo uma importância consideravelmente transformadora em sua vida,
sendo este o momento em que já se encontra envolvido e capaz de pensar e trabalhar a
respeito.
45
Assim como ele, Weinrib (1987), diz que estas resistências tem que ser levadas a
sério, por mais paradoxal que isso possa parecer.
Jung (1985), diz ainda algo que contradiz com os princípios da psicoterapia
breve, onde ressalta e aconselha que o terapeuta não tenha tantos objetivos demasiado
precisos, pois dificilmente vai saber mais do que a própria natureza ou vontade de viver
do paciente. Diz que : "as grandes decisões da vida humana estão, em regra, muito mais
sujeitas aos instintos e a outros misteriosos fatores inconscientes do que à vontade
consciente, ao bom senso, por mais intencionados que sejam".
Muitas vezes, segundo ele, é aí que aparecem as resistências, a estagnação, um
processo psíquico provável que esteja ocorrendo nas reações do inconsciente, onde o
paciente pede conselhos, não sabe como agir, o que fazer e coisas deste tipo. Daí ele vê
a importância em se trabalhar com a interpretação dos sonhos. Com esta estagnação, os
sonhos significam algo para o paciente e fazem fluir sua vida. O sonho pode levantar
pistas ou referir-se à realidades do paciente, que o consciente nunca admitiu como
sendo problemáticas ou conflitantes. Da mesma forma, acredito que o Sandplay pode
trazer estes aspectos, já que trabalha dentro de um "espaço livre e protegido", onde há
maior segurança em colocá-los ou expô-los.
Outro aspecto que é muito enfatizado por Jung (1985), é a fantasia. Dá muita
importância a ela, pois é para ele "o poder criativo materno do espírito masculino". Ele
diz que "o poder da imaginação, com sua atividade criativa, liberta o homem da prisão
de sua pequenez, do ser 'só isso', e o leva para o estado lúdico". Ele comenta então deste
brincar e fluir a imaginação criativa exemplificando com pacientes que pintavam em
suas sessões, e de sua estimulação para que fizessem isto, não importando a perfeição
do quadro, mas unicamente o esforço que se faz para pintá-lo. Considera portanto, as
obras de seus pacientes, desprovidas de valor artístico, por mais beleza que possam
46
conter, pois, não tendo valor, vai-se a fundo na finalidade do exercício, tratando-se da
eficácia da vida sobre o próprio paciente. "Aquilo que do ponto de vista social não é
valorizado passa a ocupar aqui o primeiro plano, isto é, o sentido da vida individual, que
faz com que o paciente se esforce por traduzir o indizível em formas visíveis.
Desajeitadamente.
Como
uma
criança".(p.
46)
Assim
como
exatamente
o
funcionamento do processo de Sandplay, o qual pode-se agora fazer ligação, pois tratase, na realidade, dos mesmos conteúdos, sentido e descobertas do paciente. Jung (1985),
diz mais ainda, que "o paciente passa a representar coisas que antes só via passivamente
e desta maneira elas se transformam num ato seu. Não se limita a falar do assunto.
Também o executa. Psicologicamente isto faz uma diferença incalculável".(p. 46) Deste
modo, introduz-se na fantasia um momento de realidade, o que lhe confere um peso
maior e, conseqüentemente lhe aumenta o efeito. Basta
portanto, que o paciente
perceba que, por diversas vezes, o fato de pintar um quadro o liberta de um estado
deplorável, para que ele lance mão deste recurso cada vez que seu estado piora. "O
valor desta descoberta é inestimável, pois é o primeiro passo para a independência, a
passagem para o estado psicológico adulto"(p. 46). Usando este método, segundo Jung,
o paciente torna-se independente em sua criatividade. Já não depende dos sonhos, pois,
ao pintar-se a si mesmo, está se plasmando. "O que pinta são fantasias ativas - aquilo
que está mobilizado dentro de si. E o que está mobilizado é ele mesmo, mas já não mais
no sentido equivocado anterior, quando considerava que o seu "eu" pessoal e o seu
"self" eram uma e a mesma coisa. Agora há um sentido novo, que antes lhe era
desconhecido: seu eu aparece como objeto daquilo que está atuando dentro dele. Numa
série interminável de quadros, o paciente esforça-se por representar, exaustivamente, o
que sente mobilizado dentro de si, para descobrir, finalmente, que é o eterno
desconhecido, o eternamente outro, o fundo mais fundo da nossa alma". (p. 46 e 47)
47
Acredito que estas palavras sejam suficientes para explicar tudo o que a mente é capaz
de conhecer através da criatividade e o quanto isto pode ser proveitoso ao crescimento e
individuação do paciente, em perceber suas formas de lidar com os seus conflitos
internos e com o mundo real.
Jung (1985), volta a dizer sobre a segunda metade da vida , explicando que, com
estas pessoas já não existe a necessidade de educar sua vontade consciente, mas
precisam da experiência do próprio ser, para entender o sentido de sua vida individual.
Estes indivíduos sentem sua atividade criadora como algo que lhes é benéfico. Com este
trabalho, vão adquirindo firmeza interior e renovando sua autoconfiança, revertendo
então, em novos benefícios para sua vida social.
Ele faz uma tentativa em dividir a psicoterapia, ou melhor, o método
psicoterapêutico analítico em quatro etapas: a confissão; o esclarecimento; a educação e
a transformação.
Explica cada uma destas etapas, iniciando pela confissão, onde parte do
pressuposto de que desde que surgiu a idéia do pecado, surgiu também a parte oculta do
psiquismo, portanto, o que é oculto, é segredo. Possuir este segredo, tem o mesmo efeito
de um veneno, para ele, mas que, em pequenas doses, pode ser um "medicamento
preciosíssimo e até uma condição prévia indispensável a qualquer diferenciação
individual."(p. 53)
"Um segredo partilhado com diversas pessoas é tão construtivo, quanto
construtivo é o segredo estritamente pessoal."(p. 54) Ele diz que o inconsciente tem
conteúdos próprios, que brotam de regiões profundas, e depois se desenvolvem, para,
pouco a pouco, atingirem a consciência. E todos estes conteúdos inconscientes
costumam ter um efeito sobre o consciente. Ele explica então que qualquer segredo
pessoal atua como culpa ou pecado e que existe outra forma ainda, de ocultar, que é
48
conter aquilo que afeta. E, da mesma maneira, o afeto contido, atua como fator de
isolamento e perturbação, e provoca sentimento de culpa. Portanto, emoções reprimidas
e segredos, para ele, não raro, significam a mesma coisa. Eles são então, danos de
ordem exclusivamente pessoal, aos quais a natureza reage, finalmente, por meio da
doença. Desta forma, fica explicada a importância da confissão sincera e verdadeira.
Através da confissão, lança-se aos laços da humanidade, livre dos pesos do exílio moral.
Ele cita Freud em sua relação à catarse, que visa a confissão completa, isto é, não só a
constatação intelectual dos fatos pela mente como também à liberação dos afetos
contidos: à constatação dos fatos pelo coração.
A seguir, Jung (1985) explica então a etapa do esclarecimento, dizendo que nem
sempre é possível aproximar os pacientes do inconsciente, a ponto de perceber a
sombra. Cita então pacientes que têm tanto a confessar , que não precisam recorrer ao
inconsciente. Outra limitação que comenta, diz respeito àqueles pacientes cujos
sintomas desapareceram, tornaram-se invisíveis e já podem obter uma alta. Mas alguns
destes pacientes parecem ainda ter ficado ligados ao terapeuta pela confissão, ou, casos
em que pacientes afastam-se aparentemente curados e, continuam aplicando a catarse
consigo mesmos, ficando assim, ligados a seu inconsciente, a sim mesmo e não ao
terapeuta. Estes portanto, são os casos que necessitam de esclarecimento, pois começam
em ambos os casos, na fixação, devido à entrada do paciente num tipo de dependência
infantil, não conseguindo evitá-la. Neste momento ela aflora, há a transferência, onde há
a dependência entre o terapeuta e sua solicitude. Esta dependência, segundo ele, é
causada pela existência de fantasias inconscientes com caráter incestuoso. A
transferência é um produto artificial, mas nem por isso seu aspecto é anormal. O
esclarecimento desta transferência faz com que venham à tona conteúdos que, naquela
49
forma, jamais teriam tido condições de se tornarem conscientes. Ele diz ser esta a
diferença entre as etapas da confissão e do esclarecimento.
Nos casos comentados em que o paciente tem uma ligação com si mesmo e não
com o terapeuta, mas sim com seu próprio inconsciente, a imagem dos pais não é
transferida a um objeto humano, mas permenece na forma de representações da fantasia,
que produz a mesma dependência que a transferência. Portanto, aquilo que foi
transferido para o terapeuta tem que ser interpretado, ou esclarecido. O terapeuta tem
que submeter a uma análise interpretativa, todos os fragmentos disponíveis da fantasia
do paciente. Ele diz que as produções deste tipo mais fáceis de obter são os sonhos. O
resultado do esclarecimento de Freud (apud Jung 1985), é a elaboração mais minuciosa
do lado sombrio do homem. O método interpretativo de Freud é uma explicação
retrospectiva, cahamada redutiva, segundo ele. Para Jung (1985), a sombra necessita da
luz, assim como o mal não existe sem o bem e vice-versa, por isso a importância da
interpretação ou esclarecimento. Trata então, dos efeitos do esclarecimento, onde
explica que “a fixação, ao dar com sua origem esconsa, rebaixa a posição do paciente,
ele não pode deixar de ver a infantilidade, a inutilidade de sua posição. Isso o fará
descer do pedestal da autoridade e do arbítrio, a um nível mais modesto de relativa
insegurança, ou então, ele reconhecerá que a necessidade de fazer exigências aos outros
é produto de um comodismo infantil e deve ser substituída por uma maior
responsabilidade pessoal”. A partir disto, as idéias que o nortearão serão no sentido de
adaptar-se normalmente e ter paciência com a própria incapacidade, eliminando suas
ilisões, na medida do possível.
A partir daí é que se começa a terceira etapa, a da educação para o ser social.
“As pessoas sem dificuldades na área do ajustamento social podem ser
analisadas pelo prisma do prazer com maior probabilidade de acreto do que as que se
50
encontram num estágio insuficiente de adaptação, isto é, as que, devido à sua
inferioridade social, têm necessidade de prestígio e poder” (Jung, 1985, p. 63). Esta
etapa, segundo ele, “não deixa o doente permanecer uma criança só e abandonada,
mesmo depois de ter adquirido valioso entendimento de si, mas tenta torná-lo uma
pessoa normalmente ajustada, mediante todos os recursos da educação”, ou seja, “pouco
adianta ao paciente saber, naturalmente, como e onde se originaram seus males, pois
raríssimas vezes o conhecimento das causas levou à sua cura imediata. É que não se
pode deixar de levar em conta que os falsos caminhos da neurose se transformaram em
outros tantos hábitos tenazes, que, a despeito de todo o discernimento, só vão aparecer
quando substituídos por outro, e estes só podem ser adquiridos quando exercitados. Este
trabalho não pode ser realizado, a não ser com uma educação apropriada”. (p.64 e 65)
Resumidamente, na catarse (confissão), faz-se despejar tudo, até o fundo, tudo
veio à tona, tudo saiu, toda lágrima foi derramada, e daí para frente dá-se a impressão
que tudo ocorrerá muito bem. No esclarecimento, sabe-se o que provocou a neurose, as
reminiscências mais remotas foram desenterradas e, novamente dá-se a impressão de
que o caminho está livre para ser trilhado. Então vem a educação que mostra que uma
árvore que nasceu torta não endireita com uma confissão, nem com o esclarecimento,
mas que só pode ser aprumada pela arte técnica de um jardineiro, ou seja, o terapeuta.
Só que é agora que se consegue a adpatação normal. Então é que vem a última etapa, a
da transfromação, que não deve Ter a pretensão de ser a verdade; ela também, como as
outras, vai preencher uma lacuna deixada pelas etapas anteriores. Vem para satisfazer
uma necessidade a mais.
Jung (1985) esclarece que, para entender seu significado, é preciso levar em
consideração a necessidade da alma, que passou despercebida nas etapas anteriores. É
preciso perceber, portanto, o que mais ela poderia exigir, além e acima de tornar-se um
51
ser social normalmente ajustado. O que o terapeuta deve fazer, a partir disto, é renunciar
a qualquer opinião preconcebida, para usá-las apenas, se necessário, como hipóteses
para um possível esclarecimento do caso. O encontro das duas personalidades –
paciente-terapeuta – é como uma mistura de substâncias químicas diferentes, segundo o
autor, no caso de dar alguma reação, ambas se transformam. Portanto, o paciente vai
exrecer sua influência inconscientemente sobre o terapeuta e provocar assim, mudanças
em seu inconsciente. Este é mais conhecido como contratransferência, provocada pela
transferência. O terapeuta está, portanto, em análise tanto quanto o paciente. Ele é parte
integrante do processo psíquico do tratamento, razão pela qual ele também está exposto
às influências transformadoras. O terapeuta fica, portanto, com uma tarefa semelhante à
que ele gostaria de dar como encargo ao paciente, ser uma pessoa ajustada à sociedade,
ou adequadamente desajustada. Esta Quarta etapa portanto, exige que se reaplique no
próprio terapeuta o sistema em que se acredita, seja ele qual for, tal como diz a própria
Weinrib (1987), que diz que o terapeuta da caixa-de-areia deve submeter-se ao
processo, como paciente, para que saiba seu funcionamento dentro da psique, e assim,
poder entender como funcionará em seus pacientes. Existem também, como nos
pacientes, a resistência do próprio terapeuta, que deve superá-las dentro de si mesmo,
porque, como pode alguém educar, se ele mesmo não foi educado? Como pode
esclerecer, se está no escuro no que diz respeito a si mesmo? Como purufucará, se ainda
é impuro?
Jung (1985), diz que o passo da educação para a auto-educação é um passo à
frente lógico, ou seja, é necessário que o terapeuta também se transforme para ser capaz
de transformar o doente. “A arte da psicoterapia exige, portanto, que o terapeuta possua
uma convicção recomendável, defensável e de grande credibilidade, com provas de
eficácia, inclusive pelo fato de Ter resolvido ou evitado dissociações neuróticas em si
52
mesmo. O terapeuta que tem uma neurose é desacreditado. É que não é possível levar
um paciente além do ponto em que estamos”. (p. 75) Por muitas vezes ainda, o
terapeuta deve se utilizar de idéias filosófico-religiosas como forma de correspondê-las
aos estados emocionais do paciente. “Estes se apresentam em forma de arquétipos,
recém-brotados do mesmo solo materno em que, outrora, se formaram, sem exceção,
todos os sistemas filosófico-religiosos. Mas o terapeuta não tiver disposto a questionar
as próprias convivções, no interesse do paciente, é lícito por em dúvida a firmeza de sua
atitude básica”. (p. 77)
Diz ainda que o instinto não é uma coisa isolada, ele se apresenta sempre
inevitavelmente junto com uma espécie de visão do mundo, por mais arcaica, imprecisa
e crepuscular que ela seja; traz consigo conteúdos arquetípicos de caráter espiritual.
Ele destaca como objetivo mais nobre da terapia não colocar o paciente num
estado impossível de felicidade, e sim, possibilitar que ele adquira firmeza e paciência
filosóficas para suportar o sofrimento.
Assim, num processo psicoterapêutico breve junguiano, deve-se levar em conta
todos estes fatores, que podem ser de extrema utilidade na relação entre paciente e
terapeuta.
Melo (1998), ressalta que se a Psicoterapia breve não pode ser um processo
analítico mais profundo portanto, atém-se então a realizar os motivos que levam um
indivíduo a buscar alguém que possa compreendê-lo quando ele só, já não o consegue.
Ela diz que por realizar-se num período de tempo mais curto, não pode Ter a pretensão
da transformação que ocorre num processo analítico, mas ao atender ao alívio de um
sintoma e resolução de uma crise, é para ele uma oportunidade de crescimento.
A autora também aponta para que, num processo terapêutico breve, é importante
o conhecimento amplo da tipologia junguiana como meio de fornecer as bases
53
necessárias a uma melhor compreensão para a avaliação que pode apontar para os
caminhos a serem seguidos pelo terapeuta. Desta forma, este diagnóstico fornece uma
orientação e uma direção a ser seguida pelo terapeuta. Ela diz que estes estudos da
tipologia dão uma melhor compreensão dos aspectos menos desenvolvidos da
consciência do indivíduo, e que atuam de forma a impedir ou boicotar o processo de
desenvolvimento.
Melo (1998) diz ainda que, “busca-se com a terapia breve, a mobilização do
indivíduo para sua independência emocional, que lhe dará a possibilidade de
desenvolvimento e realização de suas potencialidades. O fechamento do processo se
detém com a focalização do trabalho na questão da separação, observando-se que para
que haja um crescimento humano, as fases da vida devem ser vividas com a realização
do sacrifício de estágios anteriores. No processo breve, o indivíduo deve ser conduzido
a caminhar sozinho” (p. 28). Ela conclui que a tarefa da Psicoterapia breve consiste na
remoção dos pequenos obstáculos circunstanciais e pode ser retomada quantas vezes se
fizer ou julgar como necessária.
2.4. Terapia Familiar
Foley (1990) afirma que a terapia familiar iniciou-se através de um caso
atendido por Freud: o caso do pequeno Hans que foi tratado através de seu pai. Em
seguida vieram os trabalhos de Harry Stack Sullivan (Foley, 1990), que acentuou o
papel interpessoal no desenvolvimento da personalidade, através da compreensão do
relacionamento mãe-filho. Também seguiu-se o trabalho de Alfred Adler (Foley, 1990),
que acentuou a importância dos impulsos sociais no desenvolvimento da personalidade.
Ele via o homem não como pessoa isolada, mas como ser social que se desloca no
sentido dos outros.
54
Seguiram-se ainda diversas pesquisas e trabalhos a este respeito, porém a maior
parte no início, tratando do relacionamento do esquizofrênico com sua família. “Apesar
disto, os observadores também puderam perceber semelhanças entre tais famílias e as
ditas normais. Nestas, os processos que produziam coisas tais como ‘duplos vínculos’
achavam-se presentes, embora não com tanta freqüência, nem tão graves. Estava se
tornando claro que, embora os sujeitos observados fossem, com grande freqüência,
gravemente perturbados, a aplicação do que se observava podia ser estendida a uma
gama muito mais ampla de famílias. Isto foi, de fato, o que aconteceu, e foi assim que a
teoria da terapia familiar se desenvolveu”. (Foley, 1990, p. 18)
Os nomes que mais se destacaram nesta abordagem são de Virginia Satir,
Nathan Ackerman, Don Jackson, Jay Haley e Murray Bowen. Mais recentemente,
apareceram Salvador Minuchin, os terapeutas de estratégia (seguidores de Don Jackson)
e os teoristas das relações objetais (James Framo, Norman Paul e Ivan Nagy) (Foley,
1990).
Calil (1987), divide a terapia familiar em três tipos, fazendo um esquema
comparativo. Ela diz que, apesar das diferenças estruturais, todas as abordagens
fundamentam-se no princípio da teoria geral dos sistemas.
Estrutural
Nesta abordagem, apenas um terapeuta está em ação, representando uma caixa
de ressonância, trabalhando em diferentes níveis de proximidade com o paciente. Ele
utiliza da comunicação concreta, metafórica e não-verbal, estimulando a interação entre
os membros e explorando suas diferenças. Ele se insere no sistema familiar de modo a
criar uma crise, onde a família é incapaz de reorganizar padrões usuais de interação. É
neste contexto terapêutico sistêmico que age o terapeuta. Ele considera a família como
55
um sistema complexo, composto por subsistemas com diferentes funções, enfatizando a
interação entre os subsistemas nos diferentes níveis de desenvolvimento.
“As sessões são semanais, geralmente com maior freqüência no início, com
intervalos maiores durante a fase final da terapia. Através da dramatização o terapeuta
cria cenários nos quais cada membro da família fala por si, tornando evidente suas
diferenças. As mudanças ocorrem na sessão e em casa, através da designação de
tarefas.” (Calil, 1987, p. 73 e 74)
Estratégia Breve
Existe uma equipe terapêutica que concentra-se na comunicação verbal e nãoverbal, dando ênfase aos padrões de comunicação que mantêm o problema.
A equipe terapêutica identifica qual é o problema, como está sendo mentido e
como poderá ser alterado, utilizando para isso meios que podem ser ilógicos.
Esta abordagem “considera mais o comportamento mantenedor do problema e
suas tentativas de redução, do que o sistema per si. Pode intervir em um membro da
família, em um subsistema, na família toda ou em sistemas extrafamiliares.” (Calil,
1987, p. 73)
As sessões são semanais, por um período de 10 sessões aproximadamente, onde
a coleta dos dados é feita através de focalização no problema e nas tentativas de
resolução.
O terapeuta atua predominantemente através de sugestões ou propostas em lugar
de ordens diretas. As mudanças ocorrem em casa através da prescrição, geralmente
paradoxal.
56
Grupo de Milão
Também existe uma equipe terapêutica, que enfatiza a neutralidade do terapeuta,
a objetividade e busca consenso sobre as hipóteses e intervenção ou diagnóstico
sistêmico.
O terapeuta concentra-se mais na comunicação verbal, com ênfase no
questionamento circular através do qual exploram-se as diferenças.
A equipe identifica como a família mantém sua situação disfuncional e intervém
para alterá-la. O sistema familiar é visto como uma unidade total, mas levando também
em consideração os grupos sociais com os quais a família interage.
As sessões são mensais (1 por mês). A coleta de dados é feita através de um
questionamento circular, iniciando com perguntas e solicitando aos membros que
discutam sobre a opinião de cada um deles e sobre suas diferenças. A postura do
terapeuta é neutra, unindo-se ao sistema total.
As mudanças ocorrem fora da sessão, através do diagnóstico sistêmico a ser
implementado em casa.
Minuchin (1990), diz que o terapeuta, ao observar uma família, é inundado pelos
dados, onde existem limites a serem mapeados, lados fortes para serem postos em
relevo, problemas a serem observados, funções de complementariedade para serem
investigadas. Ele deverá selecionar e organizar estes dados em um esquema terapêutico
que promova mudança. Segundo ele, para que isso ocorra, primeiro faz-se necessário
que o terapeuta encontre um foco e desenvolva um tema para trabalhar.
“ O terapeuta deve fazer a família ‘ouvir’ e isto requer que a mensagem supere o
umbral de surdez desta” (Minuchin, 1990, p. 118)
Richter (1979), diz que a terapia familiar seria uma série de métodos
relativamente diferentes, que têm o mesmo objeto e a mesma finalidade. Este objeto é
57
um conflito familiar e a finalidade é resolver este conflito, se não completamente, pelo
menos parcialmente. Portanto, a expressão “terapia familiar” é usada por ele, para
designar todas as atividades relacionadas com dinâmicas sistemáticas que sejam
orientadas para a cura de distúrbios na família.
Ele diz que neste tipo de terapia, quando bem conduzida, o paciente é a própria
família.
“ O substrato patofisiológico da doença da família é, em certo sentido, um
distúrbio na comunicação, no diálogo do grupo ... É essa falha da comunicação que
deve ser focalizada na terapia familiar”. (Richter, 1979, p. 112)
Existe um instrumento utilizado para a terapia familiar que assemelha-se
bastante à técnica proposta neste trabalho (Sandplay) chamado de Scenotest. De acordo
com Cerveny (1982), este instrumento foi desenvolvido por Gildhild Von Staabs, a
partir de uma observação feita em 1938, do trabalho de seu pequeno paciente de 8 anos,
que improvisou, numa sessão terapêutica, um diálogo entre dois esposos, utilizando o
apartamento onde a conversa se desenrolava, uma cortina e a porta de um armário semiaberta. Ele tinha portanto dramatizado e montado sua própria situação familiar.
Esta técnica inicial assemelha-se muito à técnica já descrita, de Margareth
Lowenfeld (World Technique), que foi aperfeiçoada, assim como o Scenotest,
transformando-se no Sandplay. Staabs achou necessário, dentro desta modificação,
colocar à disposição de seus clientes, um material através do qual eles pudessem
reproduzir mais facilmente sua situação cotidiana. Assim, através deste material, era
possível que crianças, adolescentes e adultos montassem cenas que, de uma maneira ou
de outra, traziam a própria vivência de problemas e conflitos. Este material consistia de
uma caixa de madeira medindo 60 X 40 X 10 cm e três caixas de papelão dentro dela
para facilitar a disposição e o agrupamento do material. Nesta caixas ficam dispostos
58
marionetes flexíveis de 8 adultos e 8 crianças, colocadas em posições diversas,
sugerindo ações, estados de espírito e estados afetivos. Também encontram-se
retângulos de madeira de três tamanhos diferentes e em quatro cores diferentes, além de
quadrados e cilindros. Também podem ser utilizados materiais complementares como:
animais; meios de transporte; personagens simbólicas, objetos da natureza e outros
objetos.
Segundo Cerveny (1982), através da sessão familiar pode-se perceber uma
repetição de algo que acontece no cotidiano de uma família. E esta análise fornece a
noção do tipo de grupo com o qual se está trabalhando, o tipo de interação que existe
entre seus membros, o tipo de ambiente físico em que vive a família, quais as normas,
condutas e limites presentes no grupo familiar. Diz ainda que a observação do grupo
familiar permite a melhor percepção do indivíduo que está em processo diagnóstico
dentro deste grupo e o quanto de influência o mesmo exerce sobre ele. Formula portanto
a hipótese de que pode-se usar este instrumento para investigar aspectos interativos do
grupo familiar ao qual está inserido o sujeito do diagnóstico psicológico.
Acredito que, pela semelhança existente com o Sandplay, também possa ser
utilizado da mesma forma, com a mesma finalidade, já que auxilia na observação do
grupo e de sujeitos inseridos no grupo como forma de diagnóstico. Como o próprio
Cerveny (1982) diz, para o objetivo de um diagnóstico e nas condições em que utiliza o
instrumento, ou seja, a reprodução da casa do cliente, a observação da rede de
comunicações é um dos aspectos mais importantes no sentido de oferecer uma visão de
como este grupo familiar se estrutura.
O autor apenas faz um alerta quanto a isto, uma vez que pode-se estar
quantificando indivíduos dentro da família, esquecendo-se a família como um sistema
ou um todo. Da mesma forma, acho importante ressaltar este fato com a utilização da
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Sandplay, podendo talvez ser utilizado apenas para a observação da família como um
todo, e não somente de indivíduos inseridos neste sistema.
Outro fato a ser levado em conta, ressaltado por Cerveny (1982) é o da
perspectiva temporal que está presente na própria investigação que se faz do grupo
familiar.
Ela diz que quando reúne-se uma família para a montagem do Sceno e avaliamse as relações existentes nela, há a preocupação com todos os obstáculos existentes ao
nível da comunicação verbal que normalmente surgem, assim como com o tipo de
comunicação que se estabelece naquele grupo familiar.
Foi realizada uma pesquisa medindo a eficiência das mensagens não-verbais e
verificou-se que além do estilo não verbal ser mais eficiente que o verbal; quando os
dois tipos de mensagem entravam em conflito, os conteúdos verbais eram praticamente
desprezados. Com isto, foi levantada a hipótese de, no comportamento social humano,
se utilizar o canal não-verbal para negociar atitudes interpessoais e o canal verbal
primariamente para transmitir informação.
Desta forma, mostra-se novamente a importância deste tipo de linguagem
estimulada por um recurso como este.
“Toda a rede de comunicação não-verbal é importante de ser observada e
também comparada à rede verbal”. (Cerveny, 1982, p. 20)
60
III. MÉTODO
1. SUJEITOS
Foram entrevistadas 3 psicoterapeutas de orientação junguiana que utilizam a técnica de
Sandplay como recurso terapêutico em seu trabalho, conforme quadro abaixo.
1.1 Detalhamento da amostra
Sujeito 1
Sujeito 2
Sujeito 3
Sexo
Feminino
Feminino
Feminino
Idade
29
39
50
Formação
Psicologia USP;
Pós-Graduação
USP.
Psicologia PUC,
mestranda PUC.
Psicologia PUC; Pósgraduação na New School
for Social Research –
Nova Iorque e Pósgraduação na PUC.
Formação em
Sandplay e
Psicologia
Analítica
Sociedade Brasileira
de
Psicologia
Analítica e vivência
em terapia com
Fátima Gambini.
Vivência
no
processo no Japão,
além de palestras e
cursos lá.
Sociedade Brasileira de
Psicologia Analítica. É
editora
da
revista
Junguiana teve a vivência
do processo nos Estados
Unidos, com Estelle
Weinrib.
2. INSTRUMENTOS
61
Foram entrevistas semi-dirigidas, de modo a permitir maior liberdade de
expressão com relação ao tema, bem como uma ampliação do assunto discutido em um
espaço de tempo delimitado. Este tipo de entrevista foi escolhido pois especifica as
áreas que devem ser exploradas, mas não estrutura as perguntas nem sua seqüência. Ela
é guiada por uma relação de pontos de interesse a ser explorado ao longo de seu curso.
Também foi escolhida pelo fato de permitir maior liberdade em formular as perguntas e
organizar sua seqüência. O roteiro foi constituído de perguntas previamente formuladas,
porém com liberdade ao entrevistado poder discutir e ampliá-las.
Estas entrevistas foram feitas pessoalmente e gravadas com a permissão dos respectivos
entrevistados, em seguida foram transcritas e analisadas.
2.1. Roteiro da entrevista:
A. Dados Pessoais
Nome, idade, sexo, formação, tempo de contato e interesse pela técnica, tempo de
utilização da técnica em seu trabalho.
B. Questões
- Por que escolheu este recurso de trabalho?
- Como é utilizar este recursos no processo psicoterápico; em que ele facilita?
- Há algum tipo de limitação que vê com o uso deste recurso?
- O que é, a seu ver, extremamente essencial num processo em que se utiliza o
Sandplay?
- De que forma os clientes mais utilizam este recurso em seu trabalho?
- Você utiliza outros recursos dentro do processo psicoterapêutico? Quais? Por que?
- Com que público você trabalha?
62
- Como é o tempo de duração do processo utilizado por você?
- De que forma você acha que este recurso pode facilitar em um processo de curta
duração?
- De que forma utilizaria este recurso em um processo de curta duração? Já utilizou?
- Como você vê a possibilidade de utilização do Sandplay nos seguintes processos:
Psicodiagnóstico; Orientação Vocacional; Psicoterapia Breve e Terapia Familiar.
- Em que, o fato de ser um recurso não-verbal pode interferir nos diferentes processos
psicoterapêuticos e nos diferentes tipos de público trabalhados?
C. Outras Observações Relevantes
3. PROPOSTA DE ANÁLISE DOS DADOS
Os dados foram analisados qualitativamente, de modo a identificar de que forma
a teoria se faz presente na prática, bem como em identificar de que forma pode-se
ampliar esta teoria, estendendo-a aos mais diversos processos psicoterapêuticos.
Observou-se e discutiu-se novas possibilidades da utilização da técnica, bem como
possibilitou-se futuras pesquisas a respeito do tema, levantando questões que são
importantes ao assunto.
63
IV. REGISTRO E ANÁLISE DOS DADOS
1. SUJEITO 1
1.1. Dados sobre o sujeito
P. G. , 29 anos, formada pela USP em Psicologia, com Pós-Graduação na USP e na
Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica (SBPA). Tem formação em Sandplay com
a Fátima Gambini.
1.2. Relato da entrevista
Entrevistada – Estou terminando o 1º ano lá (SBPA), agora, ainda tem chão. Tenho
isso. E, a nível de Sandplay é o trabalho com a Fátima Gambini, né, que é a formação
com Sandplay, né?
No intervalo, né, na minha formação na linha Junguiana, foi de muitos cursos na
sociedade e foi basicamente fazendo supervisão e análise como pessoal de lá, não tem
muita opção neste tipo de formação, né, é a SBPA.
Entrevistadora – Eu queria saber como começou seu interesse pelo Sandplay.
Entrevistada – Bom, eu já tinha ouvido falar em Sandplay antes de estar formada, né?
Foi um trabalho com uma Psiquiatra. Ela ... levantou né, a questão deste trabalho com
miniaturas e a questão da caixa-de-areia. Mas eu conheci como caixa-de-areia no início,
64
a caixa que eu conhecia e ouvia falar nesta época. Depois de quando eu me formei no
primeiro ano, é... eu tinha um paciente pequeno, um menino que eu atendia e, sei lá
porque, eu cismava que precisava de um outro recurso, além dos outros recursos de arte
que eu usava. Eu sempre usei, é ... tinta, e outras coisas. E tudo ele tinha que fazer
comigo e, eu achava que o Sandplay ia, quer dizer, a caixa-de-areia, né, que eu usava na
época, sei lá, eu tinha a impressão que seria legal e, coincidiu de na época eu ir para São
Francisco. São Francisco é algo ... O Instituto de São Francisco junguiano, ligado à
Internacional é algo de ... é a Porta do Sandplay nos Estados Unidos e eu fui lá e
comprei uma porção de livros assim e, já comecei a colecionar miniaturas lá mesmo,
vim para cá e fiquei mais ou menos uns 6 meses estudando e, comecei a colecionar mais
miniaturas e comecei a trabalhar com esse menino e fui me envolvendo com ele assim.
Fiz alguns cursos; quer dizer, cursos não, assisti palestras na época, da Denise Ramos,
eu tinha uma colega, que nos interessamos e fizemos um grupo de estudos juntas e
comecei a usar assim, até mais ou menos 1994, quando eu procurei a Fátima. Eu já fazia
supervisão com uma pessoa que desde o começo tinha me dito que eu precisava ir
conversar com a Fátima. E eu, tava em processo de análise com esta pessoa e então não
tinha a ver para mim também estar procurando antes. Quando eu percebi que este
processo de análise estava terminando, eu estava querendo me aprofundar na caixa-deareia; e eu já tinha até escrito um capítulo nesta época, aí eu fui procurá-la. E foi muito
engraçado, porque ela falava de Sandplay e eu falava de caixa-de-areia e eu achava que
estava falando o mesmo que ela. Foi um ano, um ano e meio bem neste esquema
assim... Eu não percebia que existia diferença entre as duas coisas.
Eu achava exagerado o jeito que ela tinha um cuidado com a areia, né, absurdo assim,
né? Quando começou a me mostrar esta questão da nomenclatura e foi muito assim,
quando eu percebi no meu trabalho mesmo, vendo a seqüência do Sandplay que eu fui
65
fazendo. Percebi que algumas coisas que mexiam muito, tinham muito a ver com o que
eu tava vivendo, com o jeito dos meus pacientes trabalharem e comecei a ver uma
mudança também no meu modo de trabalhar. Mas foi muito mais válido para mim na
época da tese, quando eu comecei a experimentação da tese, cê vai para uma pesquisa
você tá com outros olhos, com todas as antenas ligadas. E aí eu vi que estava muito
diferente o jeito que eu atendia antes, em 1 ano de terapia aqui no consultório. Foi muito
assim, sabe, quando chama atenção assim, disto assim. Aí é que eu comecei a ver de
uma maneira diferente, ligar mais para este lado.
Entrevistadora – Aí, isto então começou, a notar esta diferença há mais ou menos 1 ano
e meio após ter começado ...
Entrevistada – A vivência com a Fátima, é.
Entrevistadora – E, há quanto tempo você usa o Sandplay no seu trabalho?
Entrevistada – Em consultório?
Entrevistadora – Ou melhor ... Quanto tempo você usou caixa-de-areia e há quanto
tempo você usa Sandplay? (Risos)
Entrevistada – Tá. Eu não sei ... É que esta questão do Sandplay, até porque eu acho
que tem pessoas que não dá para trabalhar com Sandplay, tem pessoas assim que ...
pessoas que não entram no clima ... Pessoas que não entram em análise. Acho que isso é
uma outra ... Eu acho que as pessoas que não conseguem trabalhar com Sandplay não
entram em análise na verdade, que podem passar anos fazendo análise e não estão
fazendo análise. Né, é sinal de que elas não têm um processo de entrega mesmo , né? E
... eu comecei a trabalhar com caixa-de-areia, né, neste esquema que eu tava falando
mais ou menos em ... 1993 ... no meu 2º ano de formada, mais ou menos 1 ano e meio
que eu tava formada, que eu comecei a usar aqui. E eu comecei a trabalhar com a
Fátima em 94. Não sei se 94 ou 95, não sei. Acho que foi no começo de 95. Então ... eu
66
acho assim, que eu tô engatinhando, eu tô começando a trabalhar com Sandplay é muito
recente isto para mim. Acho que algumas pessoas eu consegui. Alguns clientes eu tive a
oportunidade de ... que estão comigo há 4 anos mais ou menos, que acompanharam
estes dois momentos. E é muito legal porque dá para ver no trabalho deles como foi o
jeito de se relacionar com o material.
Entrevistadora – Então assim, desde o início, quando você começou a entrar em contato
com a caixa-de-areia, faz mais ou menos uns 6 anos?
Entrevistada – Uns 6 anos.
Entrevistadora – E, porque você escolheu este tipo de recurso para trabalhar?
Entrevistada – É, foi uma coisa meio intuitiva no começo, né? Esse caso do menino
também foi um caso importante. Foi um caso que eu atendi por cinco anos. Também foi
um trabalho em que pude observar no trabalho ... essa transformação. Mas assim, hoje
eu acho que assim ... Eu acho que o Sandplay dá um contato com a areia muito mágico.
Mágico eu acho até perigoso falar pois pode cair numa coisa muito mística. É muito
engraçado assim ... porque é uma coisa que no início fascina por este lado, parece
mágico porque você vê concretamente, né? Esta presença de algo maior do que aquilo
que a gente conhece, que é a relação com o Self. É possível ver, né, este tipo de relação.
É ... Eu acho que dá para ter uma seqüência no Sandplay, organizada, e isto é muito
diferente da argila e de outros registros com os quais eu já trabalhava antes.
Agora, tem a intimidade com o próprio material, com a areia. Eu acho que tem uma
coisa assim, a questão do cuidado, a exigência do material em termos de terapia que
você encontra, é muito rico. Tanto a nível da sua formação como a nível de ... cuidado
com o material. Tratar a areia, cuidar das miniaturas, limpar ... Eu acho que tem muito
de botar a tua energia no material e isso é uma coisa que eu acho muito fascinante. E eu
67
acho que tem uma coisa assim, eu tinha a intuição de que minha terapia/vivência, isto ia
ser intocante. Tive grandes transformações na minha vida em função disto.
Entrevistadora – Por que você acha que este material, este recurso, em que ele facilita
na análise?
Entrevistada – O que ele facilita? Ele te dá a dimensão do não-verbal, né? Eu acho que
isto é uma coisa muito importante, o fato de você trabalhar o verbal e o não-verbal ao
mesmo tempo. Quando você trabalha ... Eu até aprendi por causa do Sandplay a
trabalhar desta forma com outros materiais. É interessante isso, assim. Eu passei muitas
vezes a usar argila ou outro material como tinta, da mesma forma que eu aprendi a usar
o Sandplay, durante toda a sessão, estar usando o material e estar trabalhando
conversando. Eu sei porque existem pessoas que precisam de um preparo para entrar em
contato com o Sandplay. E estes outros materiais ajudam de alguma forma. Precisam de
outros materiais ... depende muito da pessoa. Algumas pessoas ficam intimidadas diante
da caixa-de-areia, não conseguem deixar nada formalizado no Sandplay, só conseguem
ficar mexendo na areia. Aí eu faço um pouco de argila, elas mexem um pouco com a
argila e aí elas voltam para o Sandplay e conseguem deixar algo. Eu passei a fazer este
tipo de experimentação, mas é muito recente e eu tô observando ainda, né? Mas acho
que antes de tudo é o material que permite trabalhar o verbal e o não-verbal.
Na verdade mudou meu jeito de usar os outros recursos, o trabalho com o Sandplay.
Percebi que dá para conciliar, que é rico no processo, pois você está trabalhando ao
mesmo tempo com o verbal e com o não-verbal. Principalmente que você perceba
discrepâncias ou discordâncias entre o que você está falando e o que você está fazendo.
Então você vai percebendo qual é a fala do Ego e qual é a fala do Self. Eu acho que a
areia permite esse contato, esse caminho em direção ao Self.
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Entrevistadora – Você acha que tem algum tipo de limitação neste recurso, algum tipo
de personalidade que não dá para usar?
Entrevistada – Ah! Eu tenho várias coisas que eu posso te falar, mas eu não tenho
experiência, né, assim, eu não usaria em grupos para começar, não tenho essa
experiência. Sei que há pessoas que fazem este tipo de trabalho, mas eu não tenho
experiência, nem família, nem casais, nem tipo de utilização. Não acho que é legal, mas
não tenho experiência.
Psicóticos também não tenho nenhuma experiência. Também acho que não deva
ser possível trabalhar com psicóticos. Eu já tive trabalhos só com depressão, né, pessoas
com depressão. Não foram em momentos de grande crise.
Mas assim, com outras patologias eu não tive experiência e eu acho meio
complicado.
E eu acho assim, na minha experiência, existem alguns tipos de personalidade
que não entram em contato com o material, são meio defendidas. Talvez venham a
entrar, mas antes precisa ser feito um grande trabalho de amolecimento. Ou talvez
nunca entrem, pois eu acho que existem níveis de terapia, né? Jung foi muitas vezes
criticado porque do jeito que ele era “elitista”, mas eu acho que ele tem toda e completa
razão nisto. Tem pessoas que tem capacidade e outras ...
Entrevistadora – Você acha que isto é uma coisa da análise em geral, a qualquer tipo de
análise ou exclusivo à análise junguiana e a Sandplay?
Entrevistada – Não, eu acho que isto é uma condição humana. Acho que é um limite
humano.
Entrevistadora – E o que você acha que é extremamente essencial para que flua esse
processo com o Sandplay?
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Entrevistada – Eu acho que a questão da dedicação, ela... muita seriedade e isso faz
parte do vaso, né? Do contato que é feito entre o terapeuta e o paciente. Isso existe
quando o paciente tem uma grande confiança no terapeuta, não é da pessoa do
terapeuta, mas é no processo que ele pode vislumbrar através deste espaço que o
terapeuta propicia. Acho que... eu vejo isso muito nas crianças. As criança fazem um
ótimo contato com você. Elas olham no teu olho, elas vêem, se elas sentirem que bate o
santo. Eu acho que é bem esta coisa de bater o santo, as crianças fazem isto
espontaneamente. O adulto, você leva muito tempo para conseguir isto. Às vezes até um
pré-adolescente você tem esta forma de lidar com ela. Mas eu acho que esta questão de
... ter uma confiança, de ter uma química! A gente sente que vai dar, sente que vai dar
para fazer uma parceria legal, e fazer a viagem juntos, porque é uma grande jornada que
a gente tem que fazer.
Entrevistadora – E as pessoas que vem com uma defesa muito grande. Isso dificulta
também, não?
Entrevistada – Dificulta! Isto não dá para dizer se a pessoa vai ou não. A gente leva
muito tempo observando essa pessoa e essa pessoa observando a gente, né? E não dá
para dizer se vai dar ou não vai dar. Pode ser que dê, pode ser que não dê. Não dá para d
cara dizer. Eu tenho uma intuição por exemplo que me diz isso.
Entrevistadora – E de que forma seus clientes mais usam a caixa? Usam só a areia, ou
com a miniatura? Areia seca ou molhada? No chão ou na mesa?
Entrevistada – Eu acho que é muito difícil definir uma predominância assim. Posso te
dizer que as criança usam muito as miniaturas e a areia. Então quem tem mais utilizado
a areia molhada e são mais abertos a utilizar diversas modalidades de areia são as
crianças.
70
Os adolescentes eles ... vai depender muito. Tem pessoas que já chegam bem
travadinhas e outras chegam numa entrega muito grande. Tem pessoas que tem uma
abertura grande de início, elas tem mais jogo de cintura para usar diferentes tipos de
areia, para experimentar, para olhar para diferentes tipos. As pessoas que vêm mais
defendidas, elas vão ficar mais na miniatura.
Eu espero o interesse das pessoas. Porque ... Tem pessoas que entram aqui e podem
ficar vindo e não falam nada. E um belo dia olha : Oh! Nossa, o que é isso? (risos) E
isso tá aqui.
Eu espero algum sinal deste tipo assim.
Quanto ao tipo do material eu acho que é assim tão rico e tão variável quanto é o
número de pessoas e personalidades que existem. É algo assim muito individual, que eu
nunca vi uma pessoa usar igual à outra.
Entrevistadora – Você usa argila e pintura, né? Tem mais algum recurso que você usa?
Entrevistada – Uso muito tinta de pintura. Uso muito tinta guache, né? E ... a argila
mesmo. São os dois materiais que eu mais uso.
Entrevistadora – E porque você usa estes materiais também?
Entrevistada – Depende muito da questão das pessoas. Às vezes eu acho que assim ... a
argila eu acho que é um material extremamente rico, muito sensual. Eu gosto muito de
trabalhar com argila com pessoas que estão muito defendidas. Eu acho que uma
seqüência do material, isso é uma das coisas que eu aprendi com o uso do Sandplay. Eu
nunca uso o material uma vez e ponto. Quando eu me proponho a usar um material
deste tipo eu proponho fazer uma seqüência. Eu uso por um bom tempo. Eu acho que é
uma coisa que eu aprendi com o Sandplay e uma coisa que eu aprendi com O.P., com
Terapia Breve. Fazer uma seqüência de sessões usando uma mesma coisa por um
determinado momento da análise.
71
A gente vai estar fazendo uma relação daquilo que aconteceu, daquilo que foi
concretizado na matéria com aquilo, as questões que a pessoa vai estar trazendo naquele
momento. Então eu faço muito isso.
Eu proponho isso, que ele escolha o material. Às vezes isso vem, né? Por exemplo, tem
um caso de uma menina que sonhou que estava trabalhando na argila e era uma sessão
comigo e nesta sessão eu falava para ela que ela tinha que trabalhar com muita argila,
um volume grande de argila, trabalhar com coisas grandes de argila. E a gente toma
isso como uma dica, e passamos a trabalhar fazendo uma seqüência a partir disto.
Eu acho que até o uso de ... Eu não sei se eu vou chegar a usar um dia só o Sandplay.
Hoje isto não faz sentido para mim. Eu vejo que é rico trabalhar com outros materiais.
Mas eu sinto que as pessoas assim, que eu faço um trabalho só com o Sandplay fica
mais ... acho que fica mais fácil de visualizar o processo com um só material. Em O.P.
eu uso só um material, só o Sandplay. Isso que eu acho rico no material. Justamente este
propósito de observar, de ter esta condição de observar num vaso, num espaço a
transformação ocorrer. Eu acho que se eu trabalho com outros materiais funciona como
se o alquimista tivesse mais coisas. Fica muito mais difícil de perceber o processo.
Entrevistadora – E talvez então seja mais fácil para um processo de curta duração ...
Entrevistada – Ah, sim! Com certeza. Usar só um material.
Entrevistadora – E aqui você trabalha com que tipos de pessoas? Adultos, crianças ...
Entrevistada – Eu atendo crianças, adolescentes e adultos. Adultos eu, ah, nem vou
dizer né? Há até algum tempo atrás eu dizia que trabalhava com adultos jovens, mas
hoje eu tenho adultos mais velhos, assim, pessoas de 50, 60 anos, que eu tenho
atendido. Mas não é assim o grosso. Porque eu trabalho mesmo, a maioria dos meus
clientes são adolescentes e adultos jovens. Com crianças eu trabalho pouco, assim, eu
sempre trabalho com crianças, mas num volume menor de trabalho, porque precisa de
72
mais sessões, de trabalho com os pais, porque eu acho que é um trabalho que exige
mais, exige mais de tudo, né? Exige mais em dedicação com os pais, tudo ... É ... e
também mesmo assim, a sessão, a arrumação, assim. Porque para a criança vale tudo.
Entrevistadora – Parece ser variável assim, o número de sessões. Como é o tempo de
duração do processo, tem uma média, uma maioria, como é?
Entrevistada – É ... depende também, eu acho que não dá para ter uma previsão assim.
O.P. é 10, 11 sessões. Terapia ... eu acho que em termos das crianças é mais fácil assim.
Crianças eu trabalho mais ou menos cerca de uma ano, já tem resultados. Vai depender
de como está a estrutura fora para você poder dar alta. Mas ... adulto eu não tenho a
menor idéia assim, de tempo de duração.
Entrevistadora – Você disse que uma das coisas que podem facilitar num processo de
curta duração é o fato de se trabalhar com... tem mais alguma coisa que você acha que
facilita, que o Sandplay pode facilitar num processo de curta duração?
Entrevistada – O ... Eu acho assim, que é muito delicado assim, eu tenho idéias, eu
ainda tenho muito forte a questão de que se chega a trabalhar com Sandplay num
processo de terapia breve. Mas assim, o que eu acho principal é a proposta ritual que
envolve, você consegue, é a estrutura ritual que você consegue montar através do
Sandplay e junto com o limite de tempo e o limite de foco que você tem numa terapia
breve. Tudo isso junto, dá uma característica de um ritual, de um ritual de iniciação,
independente de você estar trabalhando com adolescente, de você estar trabalhando com
a questão da escolha, de você estar trabalhando com continência, com ambiente de luto,
seja lá qual for o foco, né, que você tenha na terapia breve, você tem que pensar assim,
tem que ter isso em mente, você sempre tem esta questão: trabalhar com foco, trabalhar
com tempo limitado, e isso são ingredientes, né, características que permitem a gente
considerar um ritual, e permite agente considerar um ritual. Eu acho que qualquer
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circunstância que leva uma pessoa a fazer um processo de terapia, ela é uma, como se
fosse uma portazinha que tá sendo aberta para ela entrar em contato com o inconsciente.
Ela pode usar ou não, pode-se chegar a passar ou não. São oportunidades, momentos
oportunos na vida da gente que temos que olhar e poder fazer pontes com o lado de lá.
Eu acho assim, que isso é um ritual de iniciação, pois o ritual de iniciação tem isso de
permitir, de modo a amparar esta construção. Eu acho que não é a construção da ponte,
pois a construção da ponte leva tempo. É vislumbrar que existe a possibilidade de
construir uma ponte, ou digamos assim, de vislumbrar que vale a pena construir uma
ponte. (Risos)
Eu acho que é isso que dá para fazer em termos de terapia breve e eu acho que o
Sandplay ..., nossa, eu acho bárbaro a argila, eu acho bárbaro a tinta, mas eu acho que
não dá essa dimensão ritual que o Sandplay dá.
Tem muito a ver com esta questão ritual, este lado numinoso. É interessante e muito
curioso, porque tanto é uma coisa conhecida, por ser uma brincadeira, porque todo
mundo tem como brincadeira, como uma referência, todo mundo passou por isso, mas
ao mesmo tempo como é isso, passar pelo processo, é uma coisa de estranhamento e de
conhecimento, é ambíguo.
Eu nunca me esqueço da primeira vez que eu estive no consultório da Fátima, e a minha
sensação ... ela ficar falando, contando coisas para mim, da Dora Kalff, não sei o que,
mil coisas, eu não sei do que ela falava, mas assim eu não fiquei prestando atenção, eu
prestava atenção nas miniaturas e a sensação que elas tinham vida era muito forte e é
isso que eu acho que assim, no Sandplay você consegue perceber: Tem vida! Tem vida
própria assim! Tinha até uma menina que chegou a trabalhar comigo e ela falava assim,
eu acho até que comentei isso com vocês, ela falava: Quem quer brincar comigo,
olhando para as miniaturas. E o brinquedo respondia!! (Risos). É isso, sabe? É esta
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possibilidade de você conseguir se comunicar com a fantasia, e conseguir se permitir
ver coisas que não estão animadas com animação, projetar numa boa ...
Entrevistadora – Talvez, esta entrada no mundo da fantasia, esta comunicação com o
mundo da fantasia seja mais rápida no processo de Sandplay, do que num processo de
análise comum ...
Entrevistada – Não sei, talvez, eu não sei, eu não vejo muito esta questão de ser mais
rápido, eu nunca me preocupei muito com isto, nunca parei para visualizar isto. Eu acho
que a questão maior é a de sentir, de ter substância. Eu acho que você pode ficar na
casca, trazendo e falando coisas maravilhosas, e sonhos maravilhosos e nunca preencher
este espaço, é algo que mexe com você.
Entrevistadora – Você já usa em O.P., como processo de curta duração. E eu gostaria de
saber como você utilizaria em outros processos de curta duração, como
Psicodiagnóstico, ...
Entrevistada – Em diagnóstico, é para mim o principal instrumento. Eu uso, não
costumo fazer um diagnóstico longo. Eu acho que a visão do diagnóstico é
principalmente assim, ter uma idéia de qual é a questão que a criança está trazendo, Ter
uma idéia da relação dela, de como está a relação dela com os familiares,, em relação ao
mundo que ela vive e eu acho que para isso a gente tem que usar ... eu uso sempre
desenho. Agora, meu diagnóstico, eu trabalho com uma hora lúdica inicialmente,
sempre, né? Ma hora livre. Eu peço para a criança escolher as armas, né, o que ela quer
e neste momento, na minha experiência sempre o Sandplay é o escolhido, o 1º contato
no consultório sempre fica sendo o Sandplay. Depois eu posso usar, dependendo da
questão, sempre uso desenho, o desenho livre, mas eu uso Wisc, CAT, sei lá, algum
teste se tiver alguma questão ..., mas eu faço assim, não mais de 2 sessões de teste, eu
procuro ter umas 2 sessões para a criança estar usando o Sandplay e aí eu fecho, faço a
75
entrevista com os pais, a anamnese, depois faço uma devolutiva para os pais e para a
criança. Na devolutiva da criança eu faço mostrando, falando um pouco sobre o que eu
senti, sobre o que ela taria fazendo aqui, e eu peço para ela me responder através do
Sandplay e normalmente a criança é ... não fica muito de blá blá blá, a gente vai
conversando enquanto ela vai trabalhando.
Fora o diagnóstico ... A minha experiência é usar o Sandplay em diagnóstico, orientação
profissional e na terapia. Terapia breve também é O.P.
Entrevistadora – Como você vê a utilização deste processo em outros tipos de curta
duração?
Entrevistada – Eu imagino que seja bastante interessante assim, mas eu não tenho este
tipo de experiência, de ver outros tipos de terapia breve, além da O.P.
Entrevistadora – E terapia familiar e de casal?
Entrevistada – Eu não usaria, é até meio complicado porque eu não faria terapia de
casal nem terapia familiar, entendeu? Não é uma área que me interessa. Mas eu acho
assim, para mim é um trabalho muito individual, não consigo vislumbrar. Essa relação,
através do Sandplay, tem uma intimidade absurda, eu não usaria. Eu não arriscaria.
Entrevistadora – No que o fato de ser um recurso não-verbal, ele pode interferir, nestes
diferentes processos e nos diferentes públicos trabalhados?
Entrevistada – Eu acho que o não-verbal nunca é um problema. E eu acho até
engraçado, acho que as pessoas podem ler de diferentes formas. O Jung, mas em textos
básicos do Jung, onde ele grifa, em negrito, a importância do não-verbal, o quanto que
muitas coisas você não consegue acessar só com o verbal. Então eu acho que assim, é
básico para quem trabalha com terapia junguiana, trabalhar com o não-verbal, eu vejo
assim, mas eu sei que existem muitos que não trabalham assim. Para mim, eu não
consigo entender, até porque eu parto de minha formação, eu sempre fiz terapia
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utilizando o não-verbal, então foi difícil para mim vislumbrar e conhecer e quando eu
leio Jung, eu encontro muito respaldo nisto, mas assim, eu acho que o não-verbal num
trabalho breve, ele tem a grande função de mostrar para a pessoa que existe algo além
daquilo que ela conhece, algo além daquilo que ele controla e que isto tem um sentido,
que isto não é caótico como ele tem a noção de tudo. É só ele observar a seqüência de
sonhos, é só observar a seqüência de cenas que ele vai ver que isto tem uma relação
entre elas, que isto tem um sentido e que portanto existe um lado dele que está o tempo
todo querendo ajudá-lo e que ele não tem muita noção e que esta é a grande riqueza
numa terapia breve, mostrar isso, que existe isso também. Vamos investigar, vamos
perceber. Agora, vai ter gente que vai olhar e falar: Ah! Tá bom! (risos), mas que
também é válido, são processos de escolha.
Entrevistadora – Bom, eu queria agradecer a colaboração, minhas perguntas eram estas
e se você tiver algo mais a dizer ...
Entrevistada – Não, eu acho que as coisas que eu te falei antes é que são importantes
para se levar em conta, sabe Paty, é ... ter muita noção do que você está fazendo, do que
você está pesquisando, tem um trabalho para compreender, que através da experiência,
do outro, seja com entrevistas, seja com conversas com pessoas, você compreende e
veja o mundo, que tem que viver este momento, e isto fica incoerente com a vivência do
Sandplay, com o que é o Sandplay.
Então se você tiver isto bem claro, eu acho que você vai conseguir montar uma
estrutura e ir se preparando para estar vivendo, né? Eu acho que você vai juntar os dois
lados, né? Mas a gente tem que começar de um lado, é assim que a gente faz mesmo,
para mim isto é familiar, eu também comecei desta forma, foi o meu processo. Eu só
acho que a gente tem que ter muito cuidado, muita ética, muito cuidado quando a gente
vai usar o que os outros estão falando. É só isso que eu peço para você tomar cuidado. É
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uma coisa que eu tomo muito cuidado também, não vale a pena se queimar, né? Se tiver
alguma dúvida, se tiver alguma coisa te preocupando. Me lembro da primeira vez que
eu tava atendendo na faculdade, né? Me veio na mente uma forma: Pise com cuidado
pois são nos meus sentimentos que você está pisando. A gente tá falando de psique é
assim, né? Quando você tá falando do trabalho do outro também é assim, né? O nosso
trabalho de psicologia tem alma! O que eu estudo é uma coisa que tem tudo a ver com a
minha vida! Então nisso que eu aprendi muito a respeitar muito a Fátima, porque o
investimento dela é absurdo assim, e ela é uma pessoa muito séria, o casal aliás, são
pessoas muito sérias, então eu aprendi a deixar o estranhamento de lado e o preconceito
também. Porque diante do novo, os dois tem preconceito, né? (Risos) E ouvir, e ser
humilde, se você tem certeza que você é capaz de fazer uma coisa respeitando, séria,
né? Puta, então ninguém pode falar nada! Então tome cuidado, pise com cuidado nesta
questão. Se você tiver alguma dúvida, quiser que eu dê uma olhada no material depois,
me dá um toque!
1.3. Síntese das respostas do sujeito
Sexo: Feminino
Idade: 29 anos.
Formação: Psicologia na USP; Pós-graduação na USP
Formação com Sandplay e Psicologia Analítica: Sociedade Brasileira de Psicologia
Analítica e vivência do processo com Fátima Gambini.
1. Como começou o interesse pela técnica do Sandplay?
- Através de uma palestra de um psiquiatra.
- Da necessidade de outro recurso em função de sua prática clínica.
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- De um curso no Instituto de Psicologia de São Francisco.
- De um grupo de estudos.
- Da vivência do processo de Sandplay.
- Do experimento através da pesquisa de mestrado.
2. Há quanto tempo utiliza Sandplay em seu trabalho?
- aproximadamente 6 anos.
3. Por que escolheu este recurso para trabalhar?
- Diante da dificuldade com um caso; um pouco por intuição.
- Por perecer mágico, pois vê-se concretamente a relação com o Self.
- Por oferecer uma seqüência mais organizada, o que difere de outros recursos.
- Pela riqueza da intimidade e cuidado com o material.
- Por ter sido uma vivência válida em seu próprio processo de análise, tendo grandes
transformações em sua vida em função disto.
4. Em que você acha que este recurso facilita na análise?
- Favorece a dimensão não-verbal, possibilitando o trabalho do verbal junto com o nãoverbal.
- O Sandplay não é uma técnica isolada. Utiliza em conjunto com outros recursos.
- Nem sempre é fácil o contato com o Sandplay - “algumas pessoas ficam intimidadas
diante da caixa-de-areia.
- Permite ainda perceber discrepâncias e discordâncias entre o que o paciente está
falando e o que está fazendo. Percebe-se assim, qual é a fala do Ego e qual é a fala do
Self.
- Permite o contato com o caminho em direção ao Self.
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5. Há algum tipo de limitação que vê com o uso deste recurso?
- Não usaria em grupos, nem famílias, nem casais, mas não tem a experiência.
- Com psicóticos.
- Há o limite humano de que existem pessoas mais defendidas, que não entram em
contato com o material.
6. O que é, a seu ver, extremamente essencial num processo em que se utiliza o
Sandplay?
- Dedicação e seriedade.
- Contato feito entre terapeuta e paciente.
- Confiança que o paciente tem no terapeuta, no processo que ele pode vislumbrar
através do espaço que o terapeuta propicia.
7. De que forma seus clientes mais utilizam este recurso em seu trabalho?
- Crianças utilizam muito as miniaturas e a areia, utilizam a areia molhada e são mais
abertos.
- O material é tão rico e variável quanto o número de pessoas e personalidades que
existem.
- Nunca viu uma pessoa usar igual à outra.
- Pessoas defendidas usam mais as miniaturas.
8. Você utiliza outros recursos dentro do processo psicoterapêutico? Quais? Por que?
- Argila, pintura, tinta guache.
- Usa a argila por ser muito rico e sensual.
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- Propõe para o cliente a escolha do material.
- Acha mais fácil a utilização de um só recurso para vislumbrar o processo. Funciona
como um vaso, a observação num vaso, a transformação ocorrer naquele espaço. Se
trabalhar com outros materiais funciona como se o alquimista tivesse mais coisas e
assim, fica mais difícil de perceber o processo.
9. Com que público você trabalha?
- Crianças, adolescentes e adultos (adultos jovens)
- Maioria de adolescentes e adultos jovens.
10. Como é o tempo de duração do processo utilizado por você?
- Em OP, de 10 a 11 sessões.
- Em terapia com crianças, em aproximadamente 1 ano já se tem resultados. Depende da
estrutura fora.
- Adulto é muito variável.
11. De que forma você acha que este recurso pode facilitar em um processo de curta
duração?
- O principal é a proposta ritual que envolve, que se consegue montar através do
Sandplay.
- A junção do limite de tempo, de foco e a estrutura ritual montada, dá a característica
de um ritual de iniciação, seja lá qual for o foco. Como se o tempo e o foco fossem
ingredientes que permitam considerar como ritual.
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- O vislumbrar da possibilidade da construção de uma ponte entre consciente e
inconsciente, o vislumbrar de que vale a pena construir esta ponte.
- O Sandplay dá uma dimensão ritual que a argila e a tinta não dão.
- É uma situação ambígua de conhecimento e estranhamento.
- Sensação de que as miniaturas têm vida. Possibilidade de ver coisas que não estão
animadas com animação, de projeção.
12. De que forma utilizaria este recurso em um processo de curta duração? Já utilizou?
13. Como vê a possibilidade de utilização do Sandplay nos seguintes processos:
Psicodiagnóstico, Terapia Breve, Orientação Profissional e Terapia Familiar?
- É o principal instrumento em diagnóstico.
- A principal idéia em diagnóstico é a visão da questão que a criança está trazendo, sua
relação, relação com os familiares, ao mundo em que vive.
- Pede para a criança escolher “as armas” inicialmente no diagnóstico. E a maioria vai
para o Sandplay. Usa também desenho, CAT, WISC.
- Procura ter 2 sessões para a criança usar o Sandplay e em seguida fecha, faz a
entrevista com os pais e dá uma devolutiva para os pais e para a criança.
- Experiência com orientação profissional.
- Não usaria em familiar ou casal. Não se interessa por esta área. Considera o Sandplay
um trabalho muito individual, não arriscaria usar devido à intimidade através do
Sandplay.
14. Em que, o fato de ser um recurso não-verbal, pode interferir nos diferentes
processos psicoterapêuticos e nos diferentes tipos de público trabalhados?
82
- Básico para quem trabalha com terapia junguiana.
- Encontra muito respaldo na literatura junguiana.
- Num trabalho breve, tem a grande função de mostrar que existe algo além do que a
pessoa conhece, que controla, que existe um lado que está o tempo todo querendo
ajudá-lo e que ele não tem muita noção.
- A grande riqueza na terapia breve é mostrar que existe isso também.
15. Outros
- Diferenças entre Sandplay e caixa-de-areia.
- Não é um processo que é vivenciado por todas as pessoas. Compara com pessoas que
entram de pronto na análise e as que não entram.
- Trabalha com o verbal e o não-verbal.
- Fala das variações no uso da sala, onde algumas pessoas utilizam a mesma sala para a
análise verbal e para o Sandplay enquanto que outras utilizam salas separadas.
- Aprendeu a usar outros materiais, assim como usa o Sandplay; durante toda a sessão,
trabalhando e conversando.
- Espera sempre o interesse das pessoas; algum sinal para utilizar e indicar o Sandplay.
- Quando utiliza outros recursos como a argila, usa mais de uma vez, propõe uma
seqüência.
- Não faz sentido para ela, atualmente, a utilização somente do Sandplay.
- Trabalho com crianças exige mais, exige dedicação com os pais e mais arrumação.
2. SUJEITO 2
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Esta entrevista contou com a participação de uma outra pessoa, porém as perguntas
levantadas por ele não serão levadas em conta de modo a não interferir nos resultados.
2.1. Dados sobre o sujeito
M. L. Y., 39 anos, formada pela PUC em Psicologia, mestranda da PUC.
2.2. Relato da entrevista
Entrevistadora – E há quanto tempo você tem contato com o Sandplay?
Entrevistada – Olha, já faz ... desde 82, tem que fazer a conta.
Entrevistadora – 16 anos.
Entrevistada – Na verdade, eu fui fazer uma especialização no Japão e o Sandplay tava
começando lá. Atualmente o presidente da Sociedade Internacional de Sandplay, não sei
se você sabe, é um japonês. É um professor de Kioto, que na época foi uma das pessoas
convidadas pela Dora Kalff para fazer parte do núcleo inicial. Ela convidou umas 12
pessoas do mundo todo, com quem ela já tinha um certo conhecimento, né? E ela
fundou. Então nesta primeira reunião ela lançou o nome, não só o nome Sandplay, mas
ela lançou a Sociedade Internacional. E ainda é muito recente isto e ele é
atual
presidente, é um japonês. Em 82 o Sandplay tava começando a entrar no Japão e um
lugar onde eu trabalhei que era um hospital psiquiátrico, eles tinham uma sala imensa
com todo o material comprado. Na Inglaterra, né, que na Inglaterra também tem um
pessoal super importante trabalhando com Sandplay, então foi lá que eu comecei a
conhecer o Sandplay. E também não tinha o problema da língua, porque como eu falava
84
japonês relativamente bem, mas às vezes para explicar noções mais profundas você
acaba tendo certas dificuldades, então para aprender o método eu passei por ele. Aí
acabou sendo a minha formação, né? E também a gente fazia estudos de caso e também
como tava todo mundo aprendendo, aplicávamos e tudo mais, né? Então acabou sendo
uma experiência muito interessante lá. E foi então do outro lado do mundo que eu
conheci o Sandplay, né ... e depois disso é que foi em 82.
Participante – A Sociedade é aonde? Ela fica sediada aonde?
Entrevistada - Ela é sediada na Suíça, porque foi a Dora Kalff que iniciou, né? Então
ela tem a base lá, só que esse ... É como a Sociedade de Psicologia Analítica, né? Tem
uma gestão que são escolhidas pessoas e, nesta última gestão é que está esse japonês,
este professor japonês e na época ele estava começando o Sandplay lá, então tinha
algumas palestras lá e eu fui assistir e acabei gostando.
Entrevistadora – Como é o nome dele?
Entrevistada – Hayashikawagui; Professor Kawagui. Também tem uma formação muito
interessante, uma trajetória que tem a formação dele em Psicologia na Califórnia.
Também tem que ver que ele não é um japonês qualquer, né? (risos) Até agora, dia 18
ele tá dando um curso em Los Angeles sobre Sandplay e Budismo, ele e o filho da Dora
Kalff, o Martin Kalff e ele que estão dando o curso. Então eu acho que o Sandplay tem
muito a ver com a minha própria forma japonesa de ser, que foi lá que eu descobri, tem
a coisa da língua, mas eu acho que tem alguma coisa que o japonês preserva muito que
é a relação com o outro e o Sandplay tem uma relação, quer dizer, que faz isso, que se
baseia muito na relação que se estabelece com o outro. O japonês tem uma forte ligação
com a natureza, então o Sandplay teve uma boa entrada aí, porque se trabalha com
bandejas de areia, então, já então também por minha própria natureza, foi uma forma de
recuperar a minha própria orientalidade, vamos dizer assim. Então foi um bom achado e
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desde aí tenho trabalhado, às vezes. Mas logo que eu voltei eu não trabalhei com
Sandplay, mas ah ... de certa forma quando eu comecei a trabalhar mais com crianças eu
senti uma grande necessidade de ter, de um novo meio de me comunicar, então foram
até as próprias crianças que requisitaram esta forma. Eu tinha uma caixa ludoterápica,
mas minha idéia não era essa, mas começou a acontecer e eu falei: Ah! Acho que é esse
o meu caminho!
Entrevistadora – E o seu interesse pelo Sandplay começou como? Como você ficou
sabendo que existia?
Entrevistada – Na verdade, antes de ir para o Japão, minha terapeuta, né? Já existia este
núcleo, mas ela tinha uma caixinha muito pequena, e algumas miniaturas, então eu já
sabia que isto existia, só que quando eu fui ao Japão eles tinham a caixa na dimensão
certa, todas as coisas organizadas conforme mandava o figurino, então foi lá de fato que
eu tive um contato e aprendi o método, e comecei a estudar.
Entrevistadora – E há quanto tempo eu você utiliza a técnica em seu trabalho?
Entrevistada – na minha prática, começou de uma forma muito, muito ... é, como eu
vou dizer? De uma forma muito devagar, porque na verdade não era isso. Eu tinha uma
caixa ludoterápica que foi se transformando no Sandplay, né? Então eu acho que foi
desde oitenta e ... , é, por volta de 1986. E eu voltei a trabalhar de novo com isso.
Participante – Então aí você tá falando que por necessidade, de trabalhar com crianças,
por voltar a trabalhar ...
Entrevistada – Na verdade eu trabalhava com as crianças com ludoterapia, mas eu
achava que faltava alguma coisa. Eu não me sentia confortável só com aquilo, aí eu me
lembrei do Sandplay e eu coloquei uma caixa de areia para ver o que acontecia, e foi ...
foi por aqui mesmo, mas eu comecei a me organizar então de um outro jeito, porque
para ter um consultório para o Sandplay, eu precisava de um outro espaço, né? Tem
86
consultórios que as caixas e as miniaturas são colocadas em uma outra sala, tem
situações assim. Então eu vi outros consultórios de outras pessoas, algumas professoras
lá em Los Angeles que é uma outra sala. Tem gente que acha muito “over”, que
estimula muito o paciente, ele ficar na frente disto tudo. Então tem muitas variações.
Como é uma coisa muito nova, tem gente fazendo de tudo quanto é jeito. Tem gente que
tem sala só para a terapia e isso inclui-se o Sandplay. Tem gente que põe tudo na outra
sala, separada: Vamos agora à sala do Sandplay. E conheço outras que tem salas de 3
prateleiras destas. Então, acho que funciona muito da forma como você se organiza. Se
eu me sinto bem assim, acaba se sentindo na minha casa, né? É uma forma de expressão
de mim própria, a forma como eu arrumo, forma como eu disponho as coisas. De uma
certa forma, o meu trabalho com crianças começou a me chamar de uma certa forma de
volta a isso, aí eu comecei a me reorganizar, buscar os meus contatos, estudar de novo e
tal. Mas aos poucos, como fica na sala, os adultos também percebem e acompanham o
desenvolvimento daqui, então eles acabam sendo convidados e inclusive ficam mais
animados do que as crianças.
Entrevistadora – Uma pergunta agora até fora do meu trabalho. Você vê alguma
diferença entre as palavras, a terminologia Sandplay e caixa-de-areia?
Entrevistada – Olha, eu tenho lido até algumas coisas. Sandplay é uma coisa muito
específica e acho que a Dora Kalff até foi muito feliz com esta terminologia. Porque
existe uma diferença que eles usam muito nos Estados Unidos de que Sandplay e
Sandtray. Essa é a diferenciação muito importante. Porque Sandtray se faz com uma
base Psicanalítica, você pode usar Sandtray numa atividade ludoterápica, numa relação
ludoterápica. Sandtray é qualquer caixa de areia em qualquer contexto. Sandplay
significa ... pelo menos é essa diferenciação que eu procuro fazer para não ficar
bagunçado. Sandplay é a técnica advinda da Margareth Lowenfeld, mas é a técnica
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junguianamente orientada. Por isso que eu perguntei para você: De onde este grupo está
vindo? Se existe um núcleo junguiano, porque senão não é Sandplay.
Porque se faz caixa de areia em muitas outras abordagens, mas Sandplay, que é o termo
que a Dora Kalff criou, tem a visão junguiana por baixo.
Então eu não consegui ainda outra palavra, porque Sandplay, o jogo da caixa de areia,
porque play é muito maior do que brincar. Play é tocar, tem uma coisa de alegria, então
eu acho que é uma coisa de lúdico, mas é que caixa lúdica fica parecendo outra coisa.
Eu não mudei, então eu chamo de caixa de areia, mas relativo à caixa de areia em si,
mas a técnica em si eu chamo de Sandplay porque eu não consegui encontrar uma outra
palavra mais adequada.
Entrevistadora – O que você acha que facilita isso no processo psicoterápico?
Entrevistada – Bom, com crianças a gente não tem nem o que pensar, é uma forma
direta, é de transformar e trabalhar, entrar em contato com a dinâmica interna, com o
que está acontecendo, consiste em transformar. E que com o adulto, como a gente tá
muito longe do brincar, acaba demorando um pouco mais. Às vezes o próprio brincar
leva um tempo muito grande, esta soltura necessária para você começar a brincar e
montar as imagens, também tem um tempo do próprio processo, mas o Sandplay, ele
acaba facilitando, não sei também porque não é tão fácil, você acaba entrando em
contato com uma dimensão de uma forma que às vezes parece menos ... assustadora,
talvez seja uma palavra perigosa, mas eu vou contar um exemplo, acho que é mais fácil.
Eu tenho uma paciente que tá comigo há 7 anos e a caixa tá aí, mas só agora ela teve a
vontade de trabalhar, eu já a convidei, dei oportunidade outras vezes, mas agora ela tá
entrando numa problemática que tá difícil e ela tá desgastada de pensar ou falar sobre,
tá? Então ela falou: Eu quero trabalhar de outro jeito, e o recurso da caixa de areia é
muito interessante porque ela tá trabalhando e isso trouxe, é ... verificou aquela situação
88
que ela estava vivendo, que ela tá passando difícil a problemática que não tem nenhuma
solução e nem a caixa deu alguma solução, mas ela estar na caixa, fazer uma cena na
caixa é como se tivesse dado uma refrescada em tudo aquilo e ela só tá vendo a situação
por um outro ângulo, ela tá fazendo alguma coisa, então ela tá passando aquela situação
interna, aquelas imagens internas. Através da formação da imagem interna, que se
transforma numa ... que volta para você de novo, ela vem meio que, energetizada, ela
sai de você, vai para fora, mas na hora que você a vê, ela entra de novo em você e essa
passagem, essa transformação, eu acho que ela traz uma energia que eu acho que é
muito importante para o processo. Não sei se ficou muito claro, mas acho que de uma
forma geral, é isso que acontece, então eu acho que isso ajuda muito, não para quando o
paciente não tem o que falar, não sabe o que falar, mas inclusive muita gente usa o
Sandplay quando o paciente não sonha, o paciente é, tem dificuldades de falar, então
usa-se a caixa como recurso. Esse eu acho que é um mal, quer dizer, não é que é um
mal, é um sub-uso. O Sandplay não é para isso, quando o paciente não fala e não quer o
Sandplay, você não pode forçar.
Participante – Quer dizer, se ele não quer realmente, mas como no caso dela, em que
ela desgastou a expressão verbal, aí ela tá buscando uma outra forma, aí sim ela entra ...
entra como que ela tá aberta ...
Entrevistada – É, aberta para, porque é um desafio, também para quem nunca brincou
ou é alguém muito rígido, dá muito medo de mexer na areia. Parece que é uma
brincadeira, mas vai mexer a primeira vez para você ver! Dá muito medo. É o
desconhecido, é algo que você não controla, então você vai entrar em contato com algo
que você não controla ou entrar em contato com isto é todo o contato com o
inconsciente, então a forma não é nem a cena que é construída que é interessante, mas
todo o processo que o indivíduo leva para chegar até a areia, ou para conseguir botar a
89
mão e ficar. Como é que ele olha, como é que ele mexe a areia, que ele faz com a areia.
Conheço por exemplo uma criança que não põe a mão na areia. Uma criança! Quer
dizer, ela trabalha, mas ela só usa pazinha, estas coisinhas, mas ela não põe a mão. Ela
trabalha deste jeito, faz coisas, só que tudo com pazinha, não põe a mão. Mas isso faz
parte da complexidade da dificuldade dele. Mas o chegar até o processo de você
conseguir brincar, ou entrar nesta outra linguagem, tá? É uma coisa muito delicada.
Participante – No caso assim das crianças, você apresenta o Sandplay inicialmente
como um processo inicial ou ela acontece durante o processo, ou ambos?
Entrevistada – Não. O que geralmente acontece com a crianças é que elas chegam aqui
e falam: Nossa! Elas querem brincar com tudo isto que tem aqui, desta forma, com estas
caixas. As caixas estão aqui disponíveis. Então a gente brinca aqui na sala, tem crianças
que saem daqui, dão a volta; a coisa se estende, o aviãozinho sai dali, dá a volta inteira e
volta, né?
Participante – As crianças escolhem aqui e vão para lá ou você traz as caixas aqui?
Entrevistada – Não, as caixas geralmente ficam lá. Eventualmente uma ou outra quer
que ponha no chão, mas elas geralmente ficam ali, uma caixa do lado da outra.
Ricardo – Por que tem que ser duas?
Entrevistadora – Seria uma seca e uma molhada, não?
Entrevistada – Na verdade é para uma praticidade, Na verdade uma só bastaria, mas
entre um paciente e outro às vezes a areia foi toda molhada, você não tem tempo de
trocar, então você deixa uma caixa com a areia úmida e outra com a areia seca e isso na
verdade é uma comodidade do terapeuta. Porque você tem que ter todo um espaço, uma
forma de trabalhar que você tem intervalo, depois para poder fotografar as cenas; para
limpar as cenas, organizar. Porque na verdade fica tudo uma bagunça, fica areia para
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tudo quanto é lado. Então às vezes as crianças molham muito ou colocam muita água na
caixa, então você tem que tirar toda a areia.
Entrevistadora – Você vê algum tipo de limitação, assim, algum tipo de paciente que
você acha que não dá certo, não funciona?
Entrevistada – olha, aqui na minha casa, como eu não atendo crianças, é ... vamos dizer,
... muito ... com problemáticas muito severas, eu não tenho nenhum tipo de restrição.
Mas na época em que eu trabalhava no hospital, eu percebi que alguns pacientes tipo ...
borderline são perigosos, porque você ativa uma energia muito grande. E ... se bem que
eu trabalhei com muitos pacientes psicóticos e quando você percebia por exemplo que
uma crise se inicia ... porque quando ele tá em crise ele não faz, porque ele não entra em
contato, então ele pode até fazer a cena, mas de nada adianta, porque ele faz a cena mas
não entra em contato, a cena tem que voltar; ele não faz esta conexão então não adianta,
né? Aquilo fica ali. Só que quando ele tá saindo da crise, ele consegue fazer, daí você
vai percebendo uma outra formatação das cenas, é muito interessante. Então, eu acho
que existem muitos estudos sendo feitos. Eu nunca ... no meu consultório, como eu não
tenho estes casos severos, eu não tenho, ah ... tido este tipo de problema. Mas eu acho
que pacientes muito é ... às vezes até pacientes em pânico, mas um pânico muito
severo, de um modo drástico, a dificuldade, não é muito indicado, porque você tá com
uma produção tão grande ali dentro e isto aqui ativa bastante, ativa mais o inconsciente
e você pode chegar a uma crise. Então, isto são estudos feitos, não é a minha
experiência no consultório, porque é porque eu não tenho mais este tipo de pacientes.
Participante – Então você teria assim, que falar do sucesso da caixa, né? As
experiências que não foram com sucesso ou que seriam, não sei se agente pode chamar
de fracasso, mas de trazer um impasse dentro da tua experiência estes anos, um impasse
na caixa de areia...
91
Entrevistada – Por exemplo, eu atendo crianças, né? Então eventualmente a mãe vem
junto ... ou até eu tive algumas experiências: Eu deixei que mãe e filho trabalhassem na
caixa para ver que tipo de interação existe. Ah ... ou com o pai e eu me deparei até com
casais, e foi uma experiência muito desastrosa, porque tá bom, a problemática do casal
era muito pesada, mas era uma pessoa extremamente racional, que estudava Psicologia,
que conhecia tudo, então este era um meio que ele não conhecia, então por isso foi
levantado a hipótese de que podia ser interessante para ele, então o que me indicou. Era
essa indicação de que era um meio que não conhecia. Mas como ele era muito
controlador, então a primeira coisa que ele fez foi tentar lutar com isto. Então a caixa
até virou uma coisa persecutória para ambos, né? Porque eles contavam as coisas e a
mulher era um pouco menos racional, mas ele era muito, muito defendido, e depois
mais tarde eu descobri que ele tinha um ... antecedentes psicóticos na família. Ele era
borderline. Não chegava a ser um PMD, mas quase, né? Então, de certa maneira isso
influenciou e eu não sabia, fiquei sabendo depois. Como ela fazia terapia e ele também
fazia, então o casal veio tentar fazer juntos. Existem aqueles playing games, né, jogos
não sei o que lá, existe alguma coisa com o Sandplay mas muito focalizado. E eu tentei
trabalhar naquela abordagem, mas eu achei que foi muito desastroso porque como era
algo que eu não tinha, então ... E isto é importante no Sandplay: Você tem que ter um
vínculo muito grande com o paciente para ele poder entrar na caixa. Porque o que
acontece na caixa é fruto da sua relação com ele. E é fruto de alguma coisa que tem a
ver com você também. Então é muito complicado, logo de cara fazer o Sandplay, logo
na 1ª sessão. É muito difícil eu fazer. Eu faço outras coisas como desenho, para ela se
ambientar. Porque o que acontece tem a ver com você. Você não fala nada mas tá ali,
junto. Então não adianta também você só dar a caixa para alguém fazer em casa
sozinho, não funciona. Porque o que funciona é você fazer e estar sendo visto por
92
alguém, que é a idéia, de ser acolhido. Inclusive um paciente disse uma vez uma coisa
muito bonita. Ele disse: Você não vai falar nada? Eu disse: Não! Isso aqui funciona
assim, desta forma! O homem tem 50 anos, não, 64 anos e tava numa profunda
depressão. Aí então eu expliquei para ele e ele disse: Ah, mas então eu entendi. É como
uma praia. A gente nada, nada, nada e o salva-vidas tá sempre ali. Sempre que a gente
precisar dele! Eu falei: Esta é uma idéia maravilhosa! Vou até usar nas minhas aulas e
eu perguntei: Pode? Ele falou: Pode! Porque eu acho que é perfeito! Essa é a idéia!
Então a imagem fala por si só!
Participante – E nesta medida que ela conta também na relação. A idéia que você diz é
de que existem as imagens e elas tem a ver com você, mas existe uma relação, se é uma
relação, isso significa também, ao falar na relação, pode falar de uma imagem que é
também do terapeuta.
Entrevistada – Pode! E geralmente eu digo que a imagem produzida é um terceiro, que
é fruto da relação, né? Do paciente com ele próprio, mas também a relação dele com o
terapeuta e do terapeuta com ele próprio, então existe um terceiro formato desta
interação. Para mim fica mais fácil me achar ali porque eu sou japonesa, às vezes põe
uma sombrinha japonesa (risos); pagodes chineses. Tem um paciente que falou: Aqui é
o Japão! E ela fala isso para mim. Quer dizer: Eu tô ali! (risos).
Participante – Então dá para ver como é que está a relação também como entra sua
parte também na areia.
Entrevistada – É, onde é que eu estou, como é que eu estou evoluindo ao longo de uma
seqüência de cenas, então é fácil de ver, eu tenho esta característica que é fácil de
perceber. Se fosse no Japão isso não seria tão fácil de perceber. Se fosse no Japão isso
não seria tão fácil de perceber. (risos) Mas aqui eu tenho isso, principalmente com
crianças. Às vezes coloca um japonezinho no meio da cena, fala que esse daqui é
93
fulano, mas é lógico que esse japonês apareceu ali porque? Né? Então às vezes é
escancarado e às vezes não. Então existem coisas, por exemplo, parecidas, que tem a
ver com a transferência. São registros finais que mostram como é que você ... como é a
relação anda. Então o Sandplay não acontece se não tiver alguém olhando.
Entrevistadora – Então eu acho que até de certa forma você já responde uma das
minhas perguntas, sobre o que é extremamente essencial no processo, acho que você já
falou, que é o vínculo, não é?
Entrevistada – É, você tem que estabelecer um vínculo muito forte com o paciente
primeiro, antes deste vínculo se estabelecer não é possível fazer. Até é, mas fica muito
capenga. Por isso, você tava falando das terapias breves, muito focalizadas, até acho
que funcione, desde que você tenha bem claro isso, então não espere um grande
processo porque ele não acontece.
Entrevistadora – Talvez seja mais uma iniciação, não é? Um ritual de iniciação?
Participante – Então assim, qual seria o objetivo numa Psicoterapia breve do uso do
Sandplay. Ele confirma o estabelecido: é muito mais tênue, qual seria a vantagem?
Entrevistada – Pois é, quando você me falou no telefone sobre isso, ou para
Psicodiagnóstico é uma coisa muito questionada hoje em dia, eu até ... Eu até uso para
fazer com crianças, né? Mas quando eu uso, eu uso com uma outra abordagem, porque
Sandplay de fato, não pode ser feito. Então a forma como a Dora Kalff preconiza para
que as pessoas tenham agora estudado ... não é Sandplay, você não pode estudar
Sandplay, é o sub-uso de novo, o Sandplay precisa de um tempo outro, o tempo da
relação, que acontece só com a relação, então fazer diagnóstico, você tá focalizando, a
base é de oferecer um espaço livre para acontecer o que for. Quando você faz
diagnóstico, você tá ... você tem um foco, você tá esperando alguma coisa e uma cena
logo você já tem uma espera, então a grande dificuldade eu acho aí, é que todo trabalho
94
que a gente faz da formação do terapeuta que é de não esperar nada, tudo ... não é que
vai por água abaixo, é que não é preservado neste momento, quando você faz
Psicodiagnóstico, você pode até ver então: Bom, vamos ver o que acontece, mas o
Psicodiagnóstico, ele está direcionado. Então quando eu faço, eu digo: isso aqui não é
Sandplay e eu não quero que ele transforme, não faça nada, mas que ele brinque só, e aí
eu uso a caixa desta forma, mas eu não tenho nenhuma pretensão de ser o Sandplay, que
ele faça um processo, que ele se transforme. Também, dependendo do estado que o
paciente se encontra, isso é muito transformador. Poucos adultos que vem já com a
coisa bastante pronta, o processo vai muito rápido, mas isso também com terapia normal
também acontece. Tem gente que com 6 meses vão, né? Transforma toda a vida. Então
isso é muito relativo. Mas questiona-se muito o uso para fazer Psicodiagnóstico como se
fosse um desenho, ou uma coisa assim.
Participante – Porque aí assim, mesmo num Psicodiagnóstico, com a cena feita, e como
você chega a fazer uma avaliação?
Entrevistada – Por exemplo, uma cena feita só, não é que não vale nada, mas é aquilo
que a gente falou de uma seqüência, ao longo da relação, dos sonhos que foram
trazidos, é um material muito rico, e que se você olhar desta forma ele pode te dar, é ...
muitas outras possibilidades. Num Psicodiagnóstico ele fecha. Eu sei que aqui às vezes
a gente tem muita dificuldade, e mesmo lá nos Estados Unidos que se questiona muito
porque é... tem muitas pessoas que estão aplicando, elas fazem psicologia analítica e
tudo, mas ... a gente chegou a trabalhar num hospital, que tem uma demanda e tem um
tempo, ou até, não é só isso, mas a própria ... como é que chama, o seguro social paga,
não sei quantas sessões. Então eu falo, como é que vocês organizam isto? Uma delas
falou que ela tenta trabalhar com pacientes de que aquilo não vai ser o limite. Que então
se o seguro neste ano só vai pagar 20 sessões, ele só vai Ter 20 sessões, mas isso não
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quer dizer que o processo vai acabar. Tem que trabalhar além disso, fora desse, desse ...
número.
Lógico que existem estudos maravilhosos, existem casos de crianças que estão em
hospitais, que fazem tratamento de câncer ... o fazer o Sandplay, elas em tratamento, e
estão tendo dificuldades para seguir o tratamento, e as cenas montadas transmitem
exatamente o que a criança está sentindo, então aquela que tem uma dificuldade muito
grande com determinados tipos de cena, têm tido um prognóstico melhor e isso ajuda.
Em hipótese diagnóstica e medicação diferenciada isso tem ajudado muito, né? Então
isso pode ser levado em conta. Isso pode ser perfeito. Só para fazer diagnóstico, é o que
eu digo, não é que não pode, é um sub-uso, então se você tiver em mente isso, tudo
bem.
Entrevistadora – E em outros processos de curta duração como Orientação Vocacional,
que não deixa de ser uma terapia breve, né?
Entrevistada – Com Orientação Vocacional eu nunca vi também ninguém que tenha
feito, com o Sandplay e acaba sendo um recurso, é isso que eu acho que acaba sendo ...
O que a Dora Kalff dizia é que ela tinha muito medo. Tem a idéia do Sandplay como
um grande vaso alquímico ou um útero que possibilita um nascimento de uma outra
forma. O paciente pode pensar numa outra possibilidade ... ele pode nascer de novo,
refazer um trauma ou ... refazer ... não, mas é um outro nascimento, na hora que ele vai,
é ... curar esta ferida, ele nasce de novo! Então na verdade, é um espaço que ele pode
transformar a ferida. A ferida tem possibilidade de ser transformada. Aí ele pode, ele
pode tudo, é a gente que não deixa, né? (risos) mas só acontece na relação, então o
terceiro para formar precisa de 2. E até a idéia básica de Sandplay, que por permitir uma
abordagem do ... Sandplay contemporâneo, ela tem sido uma grande busca, é uma busca
pessoal. Esta é a questão difícil do Sandplay, é que precisa se passar pela abordagem,
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pelo menos Ter passado por uma grande transformação em termos psicoterápicos, para
você poder acompanhar o outro, porque senão não dá para ficar junto, você não
agüenta. Então é importante a formação, né? E na formação você pode passar pelo seu
próprio processo. Lógico, como eu falo, não é porque você é terapeuta que você tem
que ter todos os seus problemas resolvidos, não existe isso, mas você tem que Ter
passado por uma grande transformação, para você saber o que é isso, e poder agüentar
com o outro, né? A ansiedade, a expectativa, a espera, senão você não agüenta também.
Senão a gente acaba reagindo contratransferencialmente, acaba entrando onde não deve.
Só acho que a terapia breve, o sub-uso do Sandplay, não é que não pode ser usado. Eu
mesma utilizo aqui. Mas quando eu uso, eu uso com outro intuito, eu sei que não é
Sandplay! Eu tô usando uma técnica da caixa-de-areia, mas eu não tento ler da mesma
forma como eu leio o Sandplay!
Participante – Então daí você tá, ... isto para mim não ficou muito claro, como no caso
do psicodiagnóstico. Como é feita a leitura? Entendi com relação ao Sandplay, mas no
caso do Psicodiagnóstico, quando uma cena tá montada, o que você tira?
Entrevistada – Eu tiro por exemplo, com foi a relação dele com a caixa ... eu focalizei,
mas eu tô falando mais da atitude interna, porque é isso que muda. A atitude interna
enquanto ele faz o trabalho na caixa, é completamente diferente de quando ... aquilo é
um processo. Então eu não espero nada! E quando eu tô fazendo um Psicodiagnóstico
eu estou esperando. Então não adianta dizer, não eu não estou esperando, porque é
mentira! Tá? Então isso muda muito com a forma com que tudo vai surgindo na caixa.
Participante – Então isso não quer dizer que ... muda em relação a você terapeuta,
porque o cliente tá tendo a experiência pela primeira vez. Se ele está ao longo do
processo ou se está sendo estimulado algumas coisas, do que no processo do Sandplay.
Se for num primeiro momento como técnica de psicodiagnóstico, obviamente o que vai
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estar sendo estimulado para ele também vai ser diferente e em relação a você terapeuta,
ali você tá tranqüila, a coisa vai surgindo, não há uma ansiedade, uma espera, se você tá
num psicodiagnóstico, você já tá lendo e esperando que surjam algumas coisas e sua
postura vai ser diferente.
Entrevistada – Mas eu tô olhando tudo o que ele fala, faz e fala, você vai estar
focalizando e fotografando tudo. Enquanto que no Sandplay você não pode estar nesta
atitude de alerta. Você tem que estar solto e relaxado para sentir, tá? Então isso muda!
A forma como você vai ler a cena às vezes até são muito parecidas, mas muda porque
sua posição tem que mudar, porque o paciente também se protege.
Entrevistadora – Eu acho até que é aí que pode estar o maior problema, né? Porque no
Sandplay vem se formando este vínculo, enquanto que num psicodiagnóstico não há o
tempo hábil para formar.
Entrevistada – Então se você se colocar dentro desta posição, você fica tranqüila e o
paciente também. Então existe um outro vínculo, é um fio que liga, mas é outra
qualidade e aí, a cena montada, eu tenho tempo de ler, esquadrinhar, e isso é uma coisa
que eu não faço logo que o paciente vai embora, de um processo. Eu limpo as coisas,
deixo vir a minha emoção, o que eu senti. E isso é muito mais importante para eu anotar
e deixar ali para eu pensar, do que eu faço quando eu tô fazendo Psicodiagnóstico. É
uma qualidade de relação ... é uma postura diferente. Porque aí você tá usando uma
técnica. Não é a mesma coisa. Tem gente que lê a caixa por quadrantes e não sei o que,
não sei o que lá, e isso é muito questionável também porque às vezes a gente pode
dividir, fazer uma leitura de uma coisa que é tridimensional, usando um parâmetro que é
uma outra coisa que é o desenho, que só tem 2 dimensões. Se é que pode? Funciona?
Aquilo que eles usam só lá no meio das montanhas pode ser muito usado, funciona num
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país como o nosso? Nós temos a mesma forma de olhar os fatos? Então, ainda como no
Brasil isso é muito novo, a gente precisa fazer a pesquisa e escrever, né? O que mais?
Entrevistadora – Bom, eu acho que é só isso. Eu gostaria de agradecer pela sua
disponibilidade e atenção.
Entrevistada – Tá bom. Qualquer coisa que precisar depois, é só falar!
2.3. Síntese das respostas do sujeito
Sexo: Feminino
Idade: 39 anos
Formação: Psicologia pela PUC e mestranda da PUC.
Formação em Sandplay e Psicologia Analítica: vivência do processo de Sandplay no
Japão.
1. Como começou o interesse pela técnica do Sandplay?
- Foi fazer uma especialização no Japão.
- Trabalhou em um hospital psiquiátrico onde tinha uma sala com todo o material.
- Para aprender o método, passou por ele.
- Fazia também estudos de caso.
- Tem a ver com a sua orientalidade: o japonês preserva muito a relação com o outro e o
Sandplay tem uma relação que se baseia nisto.
- Foi uma forma de recuperar a própria orientalidade.
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2. Há quanto tempo utiliza o Sandplay no seu trabalho?
-
16 anos que conhece a técnica.
-
Há 12 anos que utiliza no trabalho.
3. Por que escolheu este recurso para trabalhar?
- Quando começou a trabalhar com crianças, sentiu muita necessidade de ter um novo
meio de se comunicar. As crianças requisitaram.
- Começou com uma caixa ludoterápica, o que não era realmente a sua idéia.
- Antes de ir para o Japão, sua terapeuta tinha uma caixa muito pequena e algumas
miniaturas. Só que no Japão tinha a caixa com
as medidas certas e as coisas
organizadas.
- Trabalhava com ludoterapia com crianças mas achava que faltava algo.
4. Em que você acha que este recurso facilita na análise?
- Com as crianças não precisa nem pensar. É uma forma direta de transformar e
trabalhar, entrar em contato com a dinâmica interna.
- Como o adulto está muito longe do brincar, acaba demorando um pouco mais.
- Entra-se em contato com uma dimensão de uma forma que parece menos assustadora.
- A formação de uma imagem interna que se concretiza, volta para o paciente mais
energetizada. Esta volta da imagem é uma passagem, uma transformação que traz uma
energia muito grande para o processo.
- Funciona também como um recurso para os pacientes que já não têm o que falar,
quando o paciente não sonha e tem dificuldades em falar.
100
5. Há algum tipo de limitação que vê com o uso deste recurso?
- Borderline são perigosos, por ativar-se uma energia muito grande.
- Psicótico em crise não entra em contato com o material, ele faz a cena, mas não
adianta, pois a cena não volta, não entra em contato. Mas quando ele sai da crise, ele
faz.
- Pacientes em pânico muito severo.
- Não é indicado para casais. Já tentou trabalhar com casais na linha dos playing games,
mas não deu certo.
- Tem que ter um vínculo muito grande com o paciente para ele entrar na caixa, pois o
que acontece na caixa é fruto da relação entre terapeuta e paciente.
- É complicado fazer logo na primeira sessão. Ela faz outras coisas como o desenho
para o paciente se ambientar.
- Não funciona dar a caixa para alguém fazer sozinho. Pois o que funciona é fazer,
sendo visto por alguém. A idéia é de ser acolhido. “É como uma praia, a gente nada,
nada, e o salva-vidas tá sempre ali. Sempre que a gente precisar dele.” – disse um
paciente seu.
6. O que é, a seu ver, extremamente essencial num processo em que se utiliza o
Sandplay?
- O vínculo muito forte que tem que ser estabelecido com o paciente.
7. De que forma seus clientes mais utilizam este recurso em seu trabalho?
- crianças utilizam mais a areia molhada e as miniaturas. Adultos utilizam mais a areia
seca e, muitas vezes não utilizam as miniaturas. (este trecho não refere-se à descrição
literal da entrevista devido a uma falha na reprodução da fita)
101
8. Você utiliza outros recursos dentro do processo psicoterapêutico? Quais? Por que?
- Desenhos e sonhos.
9. Com que público você trabalha?
- Crianças e adultos.
10. Como é o tempo de duração do processo utilizado por você?
- variável, adultos que vêm com as coisas bastante prontas, em 6 meses vão,
transformam toda a vida.
11. De que forma você acha que este recurso pode facilitar em um processo de curta
duração?
- nas terapias breves não se pode esperar um grande processo, pois ele não acontece.
- no psicodiagnóstico, não se faz Sandplay, é um sub-uso, pois o Sandplay precisa de
um tempo outro, um tempo da relação. Não se focaliza, pois focalizando estará
esperando por algo e o trabalho que se faz é de deixar livre, não esperar nada.
- uma cena feita, só, não vale nada, mas sim uma seqüência, ao longo da relação, dos
sonhos que são trazidos, e olhando desta forma, a cena dá outras possibilidades.
- O Psicodiagnóstico fecha.
- Fala da possibilidade realizada num hospital, onde existe um número de sessões pagas
pelo seguro-saúde, trabalha-se com o paciente, de que aquilo não vai ser o limite.
- O Sandplay tem a idéia de ser como um vaso alquímico, ou um útero, que possibilita o
nascimento de um outra forma, o paciente pode pensar em outra possibilidade, ele pode
nascer de novo, refazer um trauma, transformar a ferida.
102
12. De que forma você utilizaria este recurso em um processo de curta duração? Já
utilizou?
- Usa o psicodiagnóstico com as crianças, mas com uma outra abordagem. Diz que isto
não é Sandplay, não quer que ele transforme, não faça nada, não tem a pretensão de que
ele faça um processo, que ele se transforme.
- Utiliza até como Psicoterapia breve, mas não chama de Sandplay. Usa uma técnica da
caixa-de-areia, mas não lê da mesma forma como lê o Sandplay.
- Ela tenta tirar como foi a relação do paciente com a caixa, porque a atitude interna é
diferente quando é um processo.
13. Como você vê a possibilidade de utilização do Sandplay nos seguintes processos:
Psicodiagnóstico; Orientação Profissional; Psicoterapia Breve e terapia Familiar.
- Nos processos de curta duração, o terapeuta está olhando tudo o que o paciente fala e
faz, tá focalizando e fotografando tudo, e num processo no Sandplay não há este estado
de alerta, o terapeuta vai estar mais solto e relaxado.
- O vínculo muda. A preocupação maior na curta duração é a de ver a cena montada, ler,
esquadrinhar e, num processo, isso não é feito logo que o paciente vai embora, é mais
importante anotar sua emoção, o que sentiu e deixar para se pensar mais tarde. Portanto
muda a qualidade da relação, a postura.
14. Esta questão não foi respondida por falta de tempo para mais perguntas.
15. Outros.
103
- Existem vários espaços para o Sandplay. Tem pessoas que têm 2 salas e outras que
têm tudo junto.
- Alguns acham que tudo numa sala fica muito “over”, estimula muito.
- Funciona de acordo com a forma com a qual o terapeuta se organiza. É uma forma de
expressão do próprio terapeuta; como arruma, como dispõe as coisas.
- Diferenças entre a terminologia Sandplay e a caixa-de-areia. (Sandplay e Sandtray)
Sandplay se faz com qualquer contexto terapêutico. É qualquer caixa de areia em
qualquer contexto. Sandplay é a técnica advinda da Margareth Lowenfeld, é a técnica
junguianamente orientada.
- Pode-se usar a caixa de areia em outras abordagens.
- Mexer na areia pela primeira vez dá muito medo, pois você vai entrar em contato com
algo que não controla, é o entrar em contato com o inconsciente.
- É importante não só a cena, mas todo o processo que ele leva para chegar até a areia,
ou para conseguir botar a mão e ficar.
- As crianças geralmente chegam e querem brincar com tudo o que tem na sala; existem
crianças inclusive que saem da caixa brincando e voltam.
- Ela tem uma caixa de areia seca e outra molhada, pela praticidade, mais para uma
comodidade do terapeuta.
- Contou o caso de uma experiência desastrosa com um casal.
A imagem produzida é um terceiro: fruto da relação do paciente com ele mesmo, dele
com o terapeuta, e do terapeuta com ele mesmo.
- Na cena dá para ver onde o terapeuta está, como ele está evoluindo ao longo de uma
seqüência de cenas. O fato da transferência, como a relação anda. Mas só acontece
quando tem alguém olhando.
104
- Relata casos de crianças com câncer que estão passando pelo processo de Sandplay,
onde transmite exatamente o que a criança tá sentindo. Tem ajudado muito em hipótese
diagnóstica e medicação diferenciada.
- O terapeuta precisa passar pela abordagem, ou pelo menos Ter passado por uma
grande transformação em sua vida; pois senão ele não agüenta ficar junto.
- Várias coisas são muito questionáveis. Precisa-se fazer pesquisas e escrever.
3. SUJEITO 3
3.1. Dados sobre o sujeito
D. R., 50 anos, formada em Psicologia desde 1971 pela PUC, pós graduada em
Nova Iorque, na New School for Social Research e em psicologia clínica pela PUC. É
vice-coordenadora do programa de Psicologia clínica na PUC, membro do núcleo de
Psicossomática e Psicologia Hospitalar e da Sociedade Brasileira de Psicologia
Analítica. Foi diretora de lá durante muitos anos e hoje é editora da revista Junguiana.
Trabalha com abordagem junguiana e principalmente com doenças orgânicas, pacientes
com câncer, pacientes cardíacos e neuróticos. Estudou Sandplay com Estelle Weinrib,
fazendo análise por dois anos intensivos com ela em Nova Iorque. Em 78, quando
voltou ao Brasil, foi a primeira pessoa a trazer a técnica para cá.
3.2.
Relato da entrevista
Entrevistada – Quando eu voltei ao Brasil, em 78, eu fui a primeira pessoa que trouxe a
técnica do Sandplay para cá. E comecei a ensinar outras pessoas e hoje tem várias
pessoas trabalhando com isto. Tanto que eu sou, eu fiz a revisão técnica do livro da
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Estelle, eu escrevi uma introdução, não sei se você teve a oportunidade de ler. Então ela
é uma pioneira nos Estados Unidos. Então faz uns 20 anos que eu trabalho com isso.
Então, em 78, quando eu voltei ao Brasil, que eu trouxe esta técnica e comecei a
trabalhar com os pacientes e dar aulas sobre isso, embora eu acho que ninguém pode
aprender o Sandplay sem ser submetido à técnica, né? Você tem que se submeter à
análise, tem que ter passado por isso, porque a técnica é relativamente simples de ser
ensinada, né? Você lê o livro e você entende, mas é uma técnica muito profunda, mexe
muito com o inconsciente, é uma técnica perigosa, que pode até psicotizar uma pessoa,
se ela não estiver bem. Então eu só recomendo. O próprio analista passa mal se não
tiver feito o Sandplay. Então eu tento trabalhar nesta linha, né? As pessoas aprendem, se
submetem por um tempo primeiro e aí depois, se quiserem podem trabalhar com isso.
Entrevistadora – E quando você entrou em contato com isso, foi lá? E você já conhecia,
já tinha ouvido falar?
Entrevistada – Não, eu nem conhecia, nem sabia, nos anos 70 era uma técnica bastante
desconhecida, era conhecida somente em Zurique, que a Dora Kalff tava desenvolvendo
isso. Então no Brasil esta técnica eu sequer nunca tinha ouvido falar. Ninguém conhecia
isto, nem em 78 quando eu voltei, ninguém conhecia. Porque era uma coisa muito nova
nos estados Unidos e agora sofreu um desenvolvimento enorme. Na década de 90, muita
gente tá trabalhando com isso, tem a Sociedade de Sandplay hoje nos Estados Unidos,
então é uma técnica que vem crescendo muito, com um número de adeptos muito
grande. Mas isso eu tô falando nos últimos 10 anos. Há 20 anos atrás ninguém conhecia
praticamente. Ela tinha lançado o livro dela naquela época, nos Estados Unidos, então
tava começando esta história, né? Pouca gente trabalhava, mesmo lá. Hoje é que tá
muito difundido.
106
Tá aumentando bastante, mas infelizmente tá aumentando de um jeito ruim. As pessoas
lêem o livro, compram as miniaturas, mandam fazer a caixa e ficam fazendo sem saber
o que estão fazendo. Estão fazendo ... eu estou vendo muita bobagem por aí ... São
poucas pessoas que trabalham seriamente, e que foram para lá e fizeram estágio com a
Dora Kalff, estiveram nos Estados Unidos ou se submeteram à técnica e portanto,
podem aplicar. São poucas as pessoas. Portanto eu tô um pouco preocupada com isso,
muita gente trabalhando com isso e muita gente mal formada. Então estão vulgarizando
uma técnica, né? Vulgarizando! E acaba ficando uma técnica que está dentro de um
contexto analítico, de repente que acaba virando um método em si, e perde a força, né?
É uma técnica dentro de um processo, né? Como você usar a imaginação ativa, como
você usar argila, como você usar uma pintura, né? Ela tem um trabalho muito profundo
como inconsciente, um trabalho que mexe com conteúdos tão inconscientes e
profundos, muito mais que com desenho. Então você mobiliza, e eu tenho visto gente
fazendo bobagens assim, grandes.
Entrevistadora – E você tomou conhecimento desta técnica como?
Entrevistada – Então, eu fui estudar nos Estados Unidos e em Nova Iorque eu quis fazer
análise e por acaso, a minha analista, a Estelle, trabalhava com Sandplay e foi aí que eu
fui conhecer. Foi meramente por acaso. Nem sabia que existia. Tanto é que quando eu
vi a técnica eu até perguntei: Você trabalha com crianças? Ela falou: Não! Isso é para
adulto! (risos) Quando eu vi todas as miniaturas, né? E aí a gente começou a trabalhar e
eu achei incrível, realmente o nível de profundidade e a riqueza que a gente trabalha,
né? E ... nós fizemos muitas trocas, conversamos muito sobre isso.
E foi assim que eu conheci. É, foi por acaso, porque ela poderia ter sido uma analista
que não trabalhasse com isso e eu nunca ia saber, então por acaso ela trabalhava com
Sandplay e aí eu fui no C.G. Jung Center, que é a fundação em Nova Iorque e eu fui
107
ouvir palestras sobre isso, levantar material, né? Na época tinha muito pouca coisa, era
o livro dela e o livro da Dora Kalff. E agora é que tem mais livros. Poucos ainda, né?
Tem revista, agora é que tá aparecendo mais. Foi assim, por acaso! E aí, quando eu ia
para lá, eu levava um monte de miniaturas do Brasil para ela, então na caixa dela tá
cheio de miniaturas do Brasil, tem muita coisa do Nordeste, mais primitivas, né? Essas
miniaturas mais primitivas, que eu tenho levado para ela. E a gente começou uma troca
de miniaturas, né? De imagens! É interessante porque o Sandplay dá um diagnóstico
permanente do estado do paciente, né? Então em termos clínicos, para pesquisa, ele é
excelente. Porque você tem o retrato do processo do paciente, constantemente. E
normalmente numa análise verbal é difícil, você não tem muitos parâmetros para medir
se o paciente tá melhorando ou não. Com o Sandplay, como você tem um retrato da
psique, é quase como se você mandasse fazer um exame clínico permanente do
paciente. Então você pode acompanhar esse caso comparando com casos de outros
colegas, entendeu? Então eu acho que em termos de pesquisa o Sandplay é fabuloso!
Porque ele dá um quadro muito objetivo do desenvolvimento do processo do paciente.
Então você tá sempre medindo, você pode comparar com outros resultados, com outros
colegas, pode apresentar os casos de uma forma mais clara, né? É difícil você descrever
um processo analítico, né? É muito difícil! Eu acho, né? Por mais prática que a gente
tenha. Então o Sandplay fornece permanentemente esse retrato. Então eu acho que é
uma técnica bastante interessante, principalmente para pesquisa. E eu tô trabalhando
agora com pacientes com enxaqueca, por exemplo com Sandplay. E tá aparecendo um
complexo que subsidia as dores de cabeça, as doenças orgânicas. Eu tenho dois livros
sobre doenças orgânicas: “A Psique e o corpo” e “A Psique e o coração”, eu tô
trabalhando basicamente com isso. Então você vai ver que toda doença, seja ela física
ou psíquica, ela tem um complexo por baixo dela, que é o substrato da doença, né? O
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sintoma na verdade tá mostrando uma disfunção no organismo como um todo: psíquico
e físico. Na hora que você começa a trabalhar com o sintoma e simboliza o sintoma no
Sandplay, você vai entender a dinâmica que está por trás desta doença, é muito
interessante! Então mesmo que a doença seja causada aí, por uma radiação química, ou
qualquer coisa, vai somar o complexo do paciente. Eu tenho tido muito bons resultados
com pacientes com doenças orgânicas, né?
Entrevistadora – Por que você escolheu este recurso de trabalho?
Entrevistada – Eu já falei bastante, né? Com a análise junguiana eu sempre fui procurar
técnicas que mobilizassem o inconsciente do paciente, que façam uma conexão entre o
Ego e o inconsciente. Eu acho o Sandplay uma técnica até mais interessante que o
desenho, porque muitos pacientes não tem a capacidade técnica de desenhar aquilo que
eles imaginaram, o que eles sonharam, ficam perdidos porque não conseguem desenhar.
E o Sandplay fornece essa liberação porque não tem certo ou errado, não tem como
você ... você não precisa de técnica nenhuma, não precisa de habilidade nenhuma. Então
é muito mais fácil você se soltar no Sandplay do que no desenho, eu acho. Porque o
desenho atinge outras camadas, né? Eu também trabalho muito com desenho, mas o
Sandplay é uma coisa de que você não precisa saber nada, você pode ser analfabeto,
pode ser burro, pode ser inteligente, tanto faz.
Entrevistadora – E você usa também outros recursos?
Entrevistada – Eu uso muito desenho, trabalho muito com sonhos, eu uso todos os
recursos que mobilizam o inconsciente. Eu uso, também trabalho com imaginação ativa
também em alguns casos. É uma técnica muito mais difícil que o Sandplay e mais
perigosa também. Mas normalmente eu acho que o Sandplay também é uma técnica que
impõe poucas resistências nos pacientes, né? Isso também é relativo dizer porque tem
alguns pacientes que recusam o Sandplay, porque eles tem medo da mobilização que o
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Sandplay pode causar: - Ah, eu não sou mais criança! Vou me sentir muito bobo!, muito
infantil! Tem medo de errar! Então vai aparecer muito da atitude do indivíduo frente à
sua performance no mundo. Tem pacientes que não vão. Super bem-sucedidos
profissionalmente, porque acham que vão fazer feio, vão errar. Eu falo: “ Mas não tem
certo ou errado!” Mas eles mostram o lado infantil e têm vergonha de mostrar o lado
infantil deles. Então é um recurso que também você vai trabalhar isso, né? O que ele
não quer mostrar, ficar só na palavra, quer ficar mais defendido na palavra. Então essa
coisa de você ter um local protegido para por o inconsciente. Você não fala, né? Então o
paciente vai por o inconsciente dele lá, sem falar. Ele acha que fica mais exposto por
isso. E fica mais exposto mesmo. Então, como a Dora Kalff fala, o Sandplay é um lugar
protegido e secreto para você colocar o seu inconsciente. E eu encontro pacientes muito
resistentes. Eles têm medo! Tem medo. E é interessante que a gente trabalha com isso.
Entrevistadora – E você vê algum tipo de limitação, algum tipo de paciente que não dá
para trabalhar com Sandplay?
Entrevistada – Olha, pacientes em mania, pacientes esquizofrênicos ou, pacientes que
estão em mania, às vezes é complicado. Paciente que pega tudo o que está na prateleira
às vezes e põe na caixa. Eles vão despejando. Perdem o controle, então você tem que
dar um limite, você tem até que mudar as instruções. O paciente põe tudo o que está, o
que é possível dentro da caixa e ainda põe na beirada da caixa, ou faz uma ponte, põe
uma ponte entre a caixa e a prateleira, porque ele quer por tudo lá dentro e não cabe.
Então nós trabalhamos com isso, a questão de como ‘conter’, tem uma hora que tem
que conter, tem que parar, então para por limite de tempo. E às vezes pacientes muito
excitados, o Sandplay pode excitar mais ainda. Então a gente tem que tomar cuidado e
não é indicado, não é indicado pelo nível de excitação que o Sandplay pode gerar neste
pacientes.
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Entrevistadora – E outros tipos de patologias, depressão ...
Entrevistada – Não, depressão é ótimo, mas às vezes angustia muito o paciente porque
ele tá tão deprimido que ele não tem energia para por nada na caixa. Então ele se depara
com a sua própria depressão e a falta de energia. Mas se ele consegue ir até a caixa e
por alguma coisa, já é uma mobilização, entendeu? Você consegue fazer um esforço
neste sentido, é bom. Embora o paciente muito, muito deprimido, você tem que mexer
com o corpo dele, né? Porque ele não tem energia nem para o Sandplay. Então a única
contra-indicação que eu vejo realmente é o paciente que tá muito excitado, tá em surto
realmente, tá tendo crises alucinatórias e o Sandplay pode servir como estimulação do
inconsciente e você não quer estimular, na verdade você quer reduzir o inconsciente,
conter, né? Então você tem que ver se naquele caso, dentro daquela dinâmica é
adequado ou não. Se o Sandplay vai estimular ou vai conter. Se vai conter então tá
ótimo. Mas eu vejo que muitas vezes estimula e o paciente sai muito excitado e foge do
controle, então não dá o trabalho. Às vezes o desenho indica mais onde ele vai, se
conter mais ... E aí ele vai ter que fazer algo, né? Não vai ter aquele mundo de
miniaturas onde tudo estimula, tudo tem sentido, tudo tem significado e ele fica perdido
dentro daquele mundo, né? Então, ou você pega no Sandplay alguns objetos e trabalha
só com aqueles, sabe? Tenta conter o inconsciente, e não aumentar.
Entrevistadora – E o que você propõe? Que a pessoa vá para a caixa, como é isso?
Entrevistada – Então, eu uso o Sandplay, porque a Dora Kalff fez duas técnicas, dois
níveis. A Dora Kalff trabalha só com o Sandplay todas as sessões, toda análise dela,
toda a terapia, ela não fazia análise daí, ela fazia terapia com o Sandplay, era centrado
na caixa. A Estelle Weinrib, a escola americana de Nova Iorque, trabalha com o
Sandplay como uma técnica complementar. Está dentro do processo analítico. Você
propõe, convida o paciente para ir para a caixa, não é toda a sessão. É, às vezes tem
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pacientes que nunca foram, tem pacientes que vão com uma grande freqüência, outros
de vez em quando. Então ela entra como uma técnica auxiliar, né? E é assim que eu
trabalho. Então, em alguns momentos. Às vezes algum momento, alguma imagem da
caixa mobiliza tantas coisas que você fica falando várias sessões sobre aquele material,
né? E ... às vezes não, o paciente tá muito desvitalizado, então ele vai várias vezes à
caixa, ele emenda uma estória na outra e vai indo, ou eu peço para ele representar um
sonho. Sonhos sem enlices, quer dizer, sonhos sem final é muito angustiante, então nós
vamos para a caixa para refazer o sonho e dar uma conclusão a ele. Então é muito
variável, não há regras. É mais uma técnica de mobilização do inconsciente.
Então é importante você colocar no trabalho estas duas linhas de trabalho. Tem uma que
trabalha terapeuticamente só com a caixa e outra que usa a caixa como técnica auxiliar,
como eu faço e a escola americana faz. Mas o pessoal que estudou em Zurique com a
Dora Kalff faz toda a terapia só com a caixa. E a parte verbal é quase nula. O terapeuta
nem pergunta muito como vai, o que aconteceu, não interessa. É tudo na caixa, que é
uma outra linha de trabalho muito interessante também.
Entrevistadora – Você conhece alguém que trabalha nesta linha aqui? No Brasil?
Entrevistada – Olha, eu acho que a Mariana Liguetti tá trabalhando assim e acho que a
Fátima Gambini. A Fátima Gambini trabalhou e estudou com a Dora Kalff, então ela
seria uma boa representante da Dora Kalff.
Entrevistadora – E o que você considera extremamente essencial na utilização do
Sandplay?
Entrevistada – Essencial? É, eu acho que a relação transferencial é básica, né? Como é
que o paciente tá com você? O Sandplay não é o inconsciente do paciente separado. Na
verdade ele é resultante também da relação que ocorre com o terapeuta. O terapeuta e o
paciente têm que ter uma relação transferencial positiva, de preferência, ou se for
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negativa tudo bem também, mas você tem que saber o que está acontecendo na
transferência e na contratransferência. Isso é fundamental. Para que o paciente sinta-se à
vontade para colocar ... e se ele não se sentir à vontade você tem que conversar sobre
isto, mas você tá vendo que há dois espaços aqui, né? Um espaço para o Sandplay e
outro espaço para a análise, né? Porque eu acho importante que aquele lugar ali ...
naquele lugar não se conversa (apontando para a sala da caixa). Ele senta ali só para
fazer o Sandplay. Quando termina o Sandplay conta a história, né? Eu só faço perguntas
sobre a história e eu nuca interpreto o Sandplay. Então se o paciente põe o cachorro lá,
eu vou falar do cachorro, eu jamais vou falar que aquele cachorro significa parará,
parará ..., então você trabalha só no mundo simbólico, com a linguagem simbólica. Eu
acho então que é fundamental também você não interpretar o Sandplay e ... respeitá-lo
como um espaço sagrado, né? Onde ele contenha o inconsciente. E só quando ele tenta
conversar comigo outras coisas então eu saio de lá e então vem para cá. Então eu separo
os dois espaços.
Entrevistadora – Então durante a montagem da cena não ...
Entrevistada – Não se fala. É, não se fala. É proibido conversar. Então se ele começa a
conversar você fala: Olha, vamos nos concentrar, você faz a cena e depois a gente
conversa. Aí se ele fala: Não, mas eu tenho um monte de idéias agora, aí cê fala: Então
tá, então vamos sair daqui e vamos para outro lugar. Porque ali é o lugar especial para
isso. Não se conversa. Quando ele termina a cena eu peço para ele contar uma história
tipo: Era uma vez e, a única coisa quando termina a história, eu posso pedir
esclarecimentos do tipo: E esse personagem aqui, você não falou dele? Quem é ele?
Que que tá acontecendo? Que que ele sente? É ... eu peço esclarecimento sobre a
história, se eu não entendi alguma coisa eu peço para ele completar a história, às vezes
eu posso insistir um pouco para ele dar um final para a história. Aí ele fala: A história
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não tem final, então tudo bem, aí eu respeito, tá? Mas eu converso da história como
história. Eu jamais faço ligação então, que essa pessoa aqui, esse velhinho parece que é
seu avô, seu pai, nada disso. Se o paciente faz associação, tudo bem. Mas eu sempre
falo dos personagens com o nome dos personagens que o paciente dá, nunca traduzo
isso.
Entrevistadora – E você tira as fotos, depois? Como você registra?
Entrevistada – Depois que o paciente vai embora, eu fotografo. Quando termina o
processo dele, ou em determinado momento do processo, eu passo slides, eu passo a
seqüência para ele rever e eu conto a história toda. Tem pacientes que não tem o menor
interesse nisso, nem perguntam, então eu nem passo também. E isso é mais, em geral eu
faço isso com Psicólogo, viu? Ou com pessoas que tem interesse em trabalhar com o
inconsciente. Os pacientes leigos raramente tem o interesse em ver a história toda até o
fim do processo. Os Psicólogos têm, e muitas vezes eu até já dou uma cópia dos slides
para eles terem em casa, para verem seu processo, né? É legal isso! Eles ficam com um
retrato do seu processo, para eles examinarem e estudarem, é muito interessante. É
riquíssimo, é uma coisa que fica para a vida, né?
Entrevistadora – E de que forma que os pacientes mais usam a caixa? Areia molhada,
areia seca?
Entrevistada – A areia sempre fica seca, se eles quiserem molhar podem, tenho ali um
pouco de água. A grande maioria não mexe com água não. Eu trabalho com adultos,
raramente trabalho com crianças. A grande maioria usa pouca água. Eu tenho duas
caixa, né? Então eu troco, quando uma tá molhada.
Entrevistadora – Existem pessoas que usam só a areia, não usam a miniatura?
Entrevistada – Existe. Existe. Tenho pincel até, se a pessoa quiser ficar só mexendo na
areia ... mas a grande maioria põe a miniatura, gosta das miniaturas. Agora, tem de tudo,
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tem um paciente muito narcisista que pôs um espelho e ficou falando só para um
espelho. Então tem de tudo, né? Mas a grande maioria adora miniaturas. Alguns
pacientes trazem a miniatura de casa, um bonequinho de infância, traz aqui para mexer,
leva embora. Tinha um paciente que tava muito mal e pegou um símbolo da caixa e
pediu para levar para casa por um tempo e ela ficou com a miniatura por um tempo,
depois trouxe. Então também tem um processo de troca dos pacientes trazerem alguma
coisa de casa para usar aqui na caixa.
Entrevistadora – Então seu público aqui são adultos?
Entrevistada – A grande maioria adultos. Eu atendo um ou outro caso que eu atendo
crianças, mas os pais fazem terapia de família ou terapia de casal, os pais tão em
orientação. Pais que não estão sendo orientados eu não atendo a criança.
Em geral quando as crianças melhoram os pais começam a intervir e tiram, então aí a
criança fica com um processo muito, muito ... porque a criança fica mobilizada e os pais
cortaram e aí eu passo mal. Então eu só atendo agora a criança com os pais em terapia,
ou sendo supervisionados por alguém que tenha um vínculo de confiança, que eu vou
poder concluir o trabalho com a criança. E você vê criança muito mobilizada, com o
inconsciente ativado e os pais aí param porque tão vendo que a criança, tão achando que
a criança mudou ou coisa assim. Tive experiências muito ...
Entrevistadora – E o tempo de duração do processo, é variado, não é?
Entrevistada – Olha, eu tô trabalhando cada vez mais com terapia breve, né? Então eu
tô fazendo uma terapia intensiva e breve, tentando fazer três, quatro meses a terapia. A
grande maioria demora 2 anos, mas eu tô tentando encurtar este tempo, principalmente
com pacientes com crises orgânicas. Uma coisa mais focalizada. Um tratamento mais
focalizado em cima do sintoma, em cima da doença, tá?
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Entrevistadora – Este trabalho inclusive, é sobre a utilização do Sandplay em processos
de curta duração, né? Então eu acho muito interessante isso!
Entrevistada – É! Não tem pesquisas sobre isso, né? Tem que experimentar e pesquisar.
Entrevistadora – E o que você acha que o Sandplay pode facilitar nos processos de
curta duração? Porque eu defini para Psicodiagnóstico, Orientação Vocacional e
Terapia Familiar/casal.
Entrevistada – Aí eu acho que tá havendo a maior mistura! Tá vendo, porque não se faz
orientação vocacional com Sandplay, então você tá utilizando duas coisas diferentes.
Sandplay é uma técnica ‘De Psicoterapia’, exclusiva de psicoterapia. Você pode usar as
miniaturas e a caixa para fazer diagnóstico, para fazer análise. Para fazer orientação
vocacional não se usa isto, é outra coisa, não é Sandplay.
Entrevistadora – É, eu defini o tema como processos de curta duração, e não terapia
breve, né? Porque terapia breve seria um destes processos de curta duração.
Entrevistada – É, mas eu quero dizer uma coisa, você vai usar a miniatura e a caixa de
areia para fazer orientação vocacional, você não tá fazendo Sandplay. Sandplay tem
uma definição: é uma técnica psicoterápica onde você mexe com o inconsciente
profundamente. Portanto, você não pode fazer orientação vocacional com o Sandplay. E
aí? Você vai usar miniaturas e a caixa de areia. É isso que eu tô falando. Tá havendo
distorções em relação ao Sandplay. Isso não se faz. Você vai usar, é outra coisa. Você
não vai estar fazendo Sandplay, é outra coisa. Você vai usar as miniaturas e vai inventar
uma técnica de orientação vocacional. Não é Sandplay. Sandplay tem uma definição
específica. Se você for fazer orientação vocacional e deixar rolar seu inconsciente, você
vai demorar 2 ou 3 anos fazendo orientação vocacional, não vai dar. Você vai Ter que
dirigir de uma certa forma, o trabalho dele para orientação vocacional e isso não é
Sandplay, isso é outra coisa! Então é importante não misturar os assuntos. Sandplay é
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uma técnica de psicoterapia, que tem suas regras muito bem definidas e tem suas
instruções muito bem definidas, tá? Você pode usar este material para fazer outra coisa,
mas não dê o nome de Sandplay porque é uma distorção aí. Porque você vai dirigir o
paciente. Se você vai fazer orientação vocacional, você vai dar instruções diferentes e
não tem como, não dá para fazer. É muito diferente da técnica do Sandplay! Tem um
foco dirigido para um objetivo e isso não é Sandplay! Sandplay às vezes pode demorar
muito tempo porque há a idéia de que o Self vá reconstruir, a estrutura psicológica do
indivíduo tá reorientada para a saúde, então é uma técnica não intervencionista e na
orientação vocacional você tá fazendo a intervenção, né?
Mesmo o diagnóstico é complicado. Uma coisa é aquele teste de percepção do mundo
que você usa a miniatura sem areia para fazer o diagnóstico. Isso é uma coisa. Aliás a
Dora Kalff se inspirou no teste de percepção do mundo, né? Se fazia com miniaturas
para o Sandplay. É importante se dizer: Sandplay é isso, agora eu posso usar as
miniaturas e a caixa para fazer outras coisas, né? Mas não é Sandplay. E isso é
fundamental, porque senão as pessoas vão ficar muito confusas. Quer dizer, quando eu
trabalho no ... eu não vou falar represente a sua doença e também não vou deixar o
paciente fazer o Sandplay daquilo que vier a ele, eu não posso fazer isso. Sandplay é
uma técnica não dirigida! E é assim! Sandplay é o nome técnico, é uma coisa específica.
Mas as miniaturas você pode inventar com elas o que você quiser, né? Pode criar o que
você quiser. Mil técnicas, mas você vai ter que dar outro nome. Técnicas usando
miniaturas para análise vocacional. Tudo bem. Para diagnóstico. Tudo bem. E tem um
quadro muito bem definido pela Dora Kalff, pelo grupo todo, pela Sociedade de
Sandplay. A gente tá fazendo uma coisa ... É bem específico, né? Não pode misturar.
Entrevistadora – E com terapia breve?
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Entrevistada – Terapia breve também. Você não vai dirigir, não pode dirigir o processo.
É uma técnica não diretiva. O terapeuta olha o que o paciente está fazendo, acompanha
a direção que o Self dá. Essa é a base do Sandplay, deixar que o Self estruture a cena.
Portanto, o controle do tempo aí é inexistente, né? Pode ser que se configure, pode ser
que não se configure, mas você não pode dirigir o processo, senão você tá fazendo outra
coisa. Se eu falo para ela, coloque o seu conflito no Sandplay, já não é Sandplay. Você
tá inventando outra coisa. Mas você pode inventar também, todo mundo pode criar
coisas, né? Dar outro nome, tá? Orientação Vocacional utilizando miniaturas e uma
caixa de areia.
Entrevistadora – E no caso de terapia familiar, terapia de casal?
Entrevistada – Idem. A mesma coisa. Você trabalha na terapia de casal. Você pode
fazer terapia familiar ou de casal com as miniaturas e a caixa de areia, mas não é
Sandplay. Agora, a gente pode inventar. Estamos aqui para inventar coisas mesmo, não
é? Mas eu acho que você tem que tomar cuidado aí, dar outro nome. Terapia de casal
temos tido resultados bastante interessantes, mas eu também não chamo de Sandplay, eu
tô vendo o que vai acontecer, né? Mas também não é dirigida. O casal vai e coloca a
cena que eles querem, eles fazem o que querem, né? E eu não dirijo. Mas é óbvio que
aí, você vai começar a observar a dinâmica do casal em função do que ocorre na caixa,
né? Você pode estar fazendo outra coisa, né? Aí você vai falar, um atropela o outro,
chega o marido ocupando todo o espaço da caixa, não deixa ela entrar. Sabe, essa coisa
da dinâmica que tá ocorrendo ali é analisada.
Entrevistadora – Então você acha que nestes processos todo não existe a possibilidade...
Entrevistada – Não, é outra coisa, é outro nome! Tem que batizar de outro jeito, porque
senão a gente não vai estar sendo fiel aos que o criaram, nem à Sociedade de Sandplay,
ao que é proposto. São outras técnicas alternativas usando o mesmo material, o que eu
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acho muito válido! Não tô contestando isso! Acho super válido! Porque você vai dirigir
o processo e isso muda, porque o Sandplay é uma técnica não dirigida. Tem que
respeitar o processo.
Entrevistadora – E no que você acha que as miniaturas e a caixa podem facilitar nestes
outros tipos de processo?
Entrevistada – São sempre mobilizações do inconsciente, agora você veja, a análise
vocacional com Sandplay, aliás, não com o Sandplay, com esse material, é outra coisa,
né? Porque você não vai poder deixar que o inconsciente seja muito mobilizado porque
você tá com um tempo preciso. Porque aí a pessoa vai colocar seus conflitos e tal, e aí
você vai perder o controle do processo, vai ter que deixar rolar o processo. Com 3 ou 4
sessões para fazer uma análise vocacional, vai ficar meio difícil. Porque você começou
a mexer com complexos, com o inconsciente profundo e de repente explode uma
neurose na sua mão, fazendo isso. Se tem uma neurose oculta, isso vai vir à tona, é
como um tumor ali fechadinho ali, que não aparece, aquilo vem e explode. Aí você tem
um contrato de Orientação Vocacional e você faz o que? Aí você tem que mudar as
instruções, então o processo é outra coisa e senão você vai deixar o paciente no meio do
caminho.
Entrevistadora – E o que o fato de ser um recurso não-verbal, ele interfere no processo?
Entrevistada – Então, o inconsciente, ele é basicamente ... ele se manifesta basicamente
por meio das imagens, a palavra aparece depois, na nossa formação. Então enquanto
mais não-verbal, mais inconsciente é a mobilização. As palavras sempre exigem um
nível de consciência maior. Então a não-palavra, o trabalho com as imagens, ele sempre
atinge dimensões profundas. É como um sonho, o sonho não pode ter palavras. É uma
associação de imagens que vai aparecendo. Então é mais interessante você trabalhar
com imagens quando você quer trabalhar com o inconsciente. Por isso que eu acho
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complicado quando você tem um objetivo. Eu vou fazer uma orientação vocacional que
tem que ser muito via consciente, se você tem um tempo determinado. Você começou a
mobilizar um monte de coisas e o teu objetivo é outro. Então você vai ter um conflito,
porque você mobiliza emoções, vem complexos e tal e você fica fazendo orientação
vocacional em 2 semanas. Que você faz? Você vai estar com um problema na mão e
grande. Se você pegar uma pessoa com um problema psicológico muito grande.
Entrevistadora - Mesmo no caso de uma orientação vocacional com um número de
sessões maior?
Entrevistada – Eu acho que não dá. Muito complicado. Porque você pode mobilizar o
inconsciente e não ter controle. Aí é uma questão de experimentar, né? Faz-se
experiências.
Agora, nada impede de vocês experimentarem, saberem onde estão mexendo, né? E as
conseqüências disto, né? Eu tenho tido experiências surpreendentes no Sandplay. Você
pensa que a pessoa é normal, tá tudo bem, aí ela vai no Sandplay e explode assim um
problema gravíssimo, sabe uma cirurgia que você pensa que vai ser fácil e vem um
câncer, você abre e tem um câncer, e aí você vê você que a coisa vai ser muito mais
complicada do que você imaginou. Então realmente, a hora que você mobiliza o
inconsciente, você não sabe o que vai vir. E você não pode aí fazer com compromisso
de tempo restrito, né, com o paciente. Agora, você pode fazer: “Vamos representar a
profissão tal”. Tá, como você imagina essa profissão e você dentro desta profissão. Aí é
outra coisa, não é Sandplay. Então: “Como seria, como você se imagina sendo médico.
Representa uma cena de um médico e se encaixe aí nesta cena, veja se você vai se sentir
bem aí, nesta profissão”. Então tudo bem. Você tá trabalhando no nível da consciência,
tá? Aí você não deixa o paciente livre para ele fazer o que ele bem entender. Aí ele vai
experimentar através da imaginação como é ele dentro de uma profissão, tá? Aí ele tá
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bem limitado, bem seguro. Ele não tá livre e solto para fazer o que bem entende. Então
o inconsciente aí tá seguro, né? É dirigido. Você não dá o nome de Sandplay.
Acho que é tudo experiência, né? Se você for fotografar, registrar. Então eu acho que
tem que ser feitas experiências, aí você registra, você fotografa, você dá instruções
diferentes e esse é seu material de pesquisa.
Vou mostrar para você ... mais alguma pergunta?
Entrevistadora – Não, era só isso mesmo. Obrigada.
Entrevistada – Vou mostrar para você a sala onde eu atendo Sandplay.
3.3 Síntese das respostas do sujeito
Sexo: Feminino
Idade: 50.
Formação: Psicologia pela PUC, Pós Gradução em Nova Iorque (New School for
Social Research) e psicologia Clínica pela PUC.
Formação em Psicologia Analítica e em Sandplay: É vice-coordenadora do núcleo de
Psicossomática e Psicologia Hospitalar e da Sociedade Brasileira de Psicologia
Analítica. É editora da revista Junguiana. Fez análise com Estelle Weinrib em Nova
Iorque, sendo a primeira pessoa a trazer o Sandplay para o Brasil, em 1978.
1. Como começou o interesse pela técnica, pelo Sandplay?
- não conhecia, nos anos 70 era basicamente desconhecida. Foi estudar nos Estados
Unidos/Nova Iorque e fez análise. Por acaso, sua analista, a Estelle Weinrib, trabalhava
com Sandplay e foi então que veio a conhecer.
- Depois foi ao C.G. Jung Center, a fundação de Nova Iorque, ouvir palestras sobre isto
e levantar material.
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2. Há quanto tempo usa o Sandplay em seu trabalho?
-
Trabalha com isto há 20 anos.
3. Por que você escolheu este recurso de trabalho?
- Com a análise junguiana, sempre procurou técnicas que mobilizassem o inconsciente
do paciente, que fizessem conexão entre Ego e inconsciente.
4. Em que você acha que este recurso facilita na análise?
- O Sandplay dá um diagnóstico permanente do estado do paciente. Em termos clínicos,
para pesquisa, é excelente! Porque existe o retrato do processo do paciente,
constantemente. Ele dá um quadro muito objetivo do desenvolvimento do processo do
paciente.
- Está sempre medindo, podendo ser comparado com outros resultados, com outros
analistas, podendo apresentar os casos de uma forma mais clara.
5. Há algum tipo de limitação que vê com o uso deste recurso?
- Pacientes em mania, esquizofrênicos é muito complicado. Eles pegam tudo o que tem
na prateleira e põe na caixa, perdem o controle. Às vezes fazem uma ponte entre a
prateleira e a caixa. Nestes casos, tem que dar um limite, mudar as instruções e conter.
- Pacientes muito excitados, o Sandplay pode excitar mais ainda.
- Para depressão é ótimo, mas às vezes angustia muito o paciente porque ele tá tão
deprimido que não tem energia para por na caixa. Ele se depara com sua própria
depressão e falta de energia.
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- Nos pacientes excitados, em surto, com crises alucinatórias, o Sandplay pode servir
como estimulação do inconsciente e, na verdade, neste momento deve-se conter, reduzir
o inconsciente, e não estimulá-lo.
- Uma forma de trabalhar com os psicótico em surto, é pegar alguns objetos apenas, no
Sandplay e trabalhar só com eles. Tentar conter o inconsciente.
6. O que é, a seu ver, extremamente essencial num processo em que se utiliza o
Sandplay?
- a relação transferencial que é básica. O Sandplay é resultante também da relação que
ocorre com o terapeuta.
- Também é fundamental não interpretar o Sandplay, respeitá-lo como um espaço
sagrado, que contenha o inconsciente.
7. De que forma os pacientes mais utilizam este recurso em seu trabalho?
- A grande maioria não mexe com água.
- A grande maioria põe miniatura, mas tem pessoas que não usam, então tem pincel para
aquelas que querem só mexer com a areia.
8. Você utiliza outros recursos? Quais?
- Desenho; sonhos; imaginação ativa. Mas imaginação ativa é uma técnica mais
perigosa que o Sandplay.
9. Com que público você trabalha?
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- Com adultos. Raramente com crianças. Só atende crianças em que os pais estão em
terapia, terapia de família ou de casal. Pais que estejam em orientação, pois geralmente
quando as crianças melhoram, os pais que não estão em orientação começam a intervir e
tiram a criança que já está mobilizada e os pais cortam.
10. Como é o tempo de duração utilizado por você?
- Está trabalhando cada vez mais com terapia breve, tentando fazer 3 ou 4 meses a
terapia.
- A grande maioria demora 2 anos.
- Está tentando encurtar este tempo, principalmente em pacientes com crises orgânicas,
focalizando em cima do sintoma, em cima da doença.
11. De que forma você acha que este recurso pode facilitar em um processo de curta
duração?
- Não existem pesquisas sobre isto. Tem que experimentar e pesquisar.
- São sempre mobilização do inconsciente.
- No caso de orientação vocacional é mais complicado, pois não se pode deixar que o
inconsciente seja muito imobilizado. Com 3 ou 4 sessões é mais difícil.
12. De que forma utilizaria este recurso em um processo de curta duração? Já utilizou?
13. Como vê a possibilidade de utilização do Sandplay nos seguintes processos:
Psicodiagnóstico; Orientação Vocacional; Psicoterapia Breve e Terapia Familiar.
- Não se faz Orientação Vocacional com Sandplay.
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- Pode-se usar as miniaturas e a caixa para fazer Psicodiagnóstico e análise, mas não
para Orientação vocacional. Deve-se usar as miniaturas e inventar uma técnica de
Orientação vocacional, mas não é Sandplay.
- Se for usar Sandplay, vai-se demorar 2 ou 3 anos fazendo Orientação vocacional.
- Pode até usar o material do Sandplay, mas com outros nomes que não seja Sandplay.
- Não pode existir um foco em Sandplay, pois a idéia é a de que o Self vá reconstruir, a
estrutura psicológica do indivíduo tá reorientada para a saúde, então é uma técnica não
intervencionista e na Orientação vocacional está se fazendo intervenção.
- Mesmo o diagnóstico é complicado. Porque Sandplay é uma técnica não dirigida.
- Com terapia breve também. Não se pode dirigir o processo. A base do Sandplay é
deixar que o Self estruture a cena, portanto o controle do tempo é inexistente.
- Terapia familiar e de casal é a mesma coisa.
- Existem resultados bem interessantes com terapia de casal, mas ela não chama de
Sandplay. Começa-se a observar a dinâmica do casal em função do que ocorre na caixa.
- Utilizando o mesmo nome, não vai estar sendo fiel aos que o criaram, então são outras
alternativas, usando o mesmo material, é só dar outro nome.
14. Em que, o fato de ser um recurso não-verbal, pode interferir nos diferentes
processos psicoterpêuticos e nos diferentes tipos de públicos trabalhados?
- O inconsciente se manifesta basicamente por meio de imagens. A palavra aparece
depois.
- Quanto mais não-verbal, mais inconsciente é a mobilização; pois as palavras sempre
exigem um nível de consciência maior.
15. Outros.
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- Quando voltou ao Brasil, em 78, foi a 1ª pessoa a trazer a técnica do Sandplay para cá.
Começou a ensinar outras pessoas.
- Fez a revisão técnica do livro da Estelle Weinrib e escreveu a Introdução.
- Ninguém pode aprender o Sandplay sem ter passado ou se submetido à técnica.
- É uma técnica muito profunda e perigosa, que pode até psicotizar uma pessoa.
- O próprio analista passa mal se não tiver feito o Sandplay.
- Está trabalhando com pessoas com enxaqueca, com Sandplay. E está aparecendo um
complexo que subsidia as dores de cabeça, as doenças orgânicas. Toda doença tem um
complexo por baixo dela. No momento em que se começa a trabalhar com o sintoma e
simboliza-se o sintoma no Sandplay, entende-se a dinâmica que está por trás da doença.
- Sandplay é mais interessante que o desenho, porque muitos pacientes não têm a
capacidade técnica de desenhar aquilo que eles imaginaram ou que sonharam.
- Com o Sandplay não precisa sabre nada. O paciente pode ser burro, inteligente ou
analfabeto.
- É um lugar protegido, para o paciente por o inconsciente. Porque alguns pacientes são
muito resistentes, tem medo do que o Sandplay pode mobilizar, do que esta mobilização
pode causar.
- Existem 2 níveis, 2 técnicas feitas pela Dora Kalff. Ela trabalha só com o Sandplay.
Ela não fazia análise, e sim terapia com o Sandplay, era centrado na caixa. A parte
verbal é quase nula. A Estelle Weinrib, a escola americana de Nova Iorque, trabalha
com o Sandplay como uma técnica complementar. Não é utilizado em todas as sessões.
- Também pede às vezes parta o paciente representar um sonho, ou para concluir
aqueles sonhos que não têm um final.
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- Ela tem 2 salas. Uma só para o Sandplay, onde não é permitido conversar, só serve
para fazer cenas, e outra para a análise verbal, onde pode falar, contar a história da cena,
enfim, o que quiser.
- Ela só faz perguntas sobre a história, e nunca interpreta o Sandplay. Trabalha no
mundo simbólico, com a linguagem simbólica.
- Fotografa a cena depois que o paciente vai embora. Quando termina o processo dele,
ou em determinado momento do processo, ela passa slides para o paciente rever e contar
a história toda.
- Geralmente, as pessoas que têm interesse em ver a seqüência são Psicólogos, ou
pessoas que têm interesse em trabalhar com o inconsciente. Pacientes leigos raramente
têm interesse em ver a história toda, até o fim do processo.
- Às vezes até dá uma cópia dos slides para eles terem em casa, verem seu processo,
examinarem e estudarem.
- A hora em que se mobiliza o inconsciente não se sabe o que vai vir.
V. CONCLUSÃO
A partir da discussão da teoria realizada durante o trabalho, bem como das
entrevistas realizadas foi possível concluir que, por ser uma técnica ainda muito recente,
parecem haver muitas dúvidas e discordâncias a seu respeito. Uma destas discordâncias,
bastante evidenciada durante as entrevistas, é sobre a diferenciação da terminologia
“Sandplay” e “Caixa-de-areia”. Acredita-se que exista uma diferença entre estas
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palavras, porém nada foi publicado a este respeito e tampouco as pessoas que trabalham
com isto conseguem definir ao certo. Pode-se perceber que, por Sandplay entende-se
uma técnica realizada com um recurso (caixa-de-areia), num processo de longa
duração, pois não pode ser delimitado tempo, nem foco, ou seja, deve-se deixar livre
para que o paciente sinta-se seguro ao expor seus sentimentos, suas angústias e seus
conflitos. Já a técnica da Caixa-de-areia, parece ser utilizada como um teste, ou algo
que seja imposto
ao
paciente, focalizando-se mais a atividade, dirigindo-se as
perguntas e o material inconsciente que está sendo trabalhado. Assim, parece ser
relevante o uso desta técnica num processo de curta duração, porém talvez, não possa
ser nomeado como Sandplay, pois de uma forma ou de outra estará se dirigindo de
alguma maneira o processo, o foco e o tempo de duração do mesmo. Entretanto, existem
muitas contradições a este respeito.
Também pode-se perceber que, por ser um instrumento não-verbal, pode facilitar
bastante num processo de curta duração, por: 1) oferecer uma ligação entre a análise
verbal e a não-verbal. 2) permitir uma relação e um contato maior com o Self. 3) ser
uma ponte visível entre o inconsciente e consciente. 4) expressar concretamente aquilo
que está se passando no inconsciente. 5) ser também uma técnica que oferece uma
seqüência mais organizada, permitindo ao terapeuta acompanhar o movimento que está
sendo realizado pelo paciente, sua mobilização e a transferência que existe. Finalmente,
permite ainda, observar discordâncias entre o que o paciente está fazendo e o que ele
está falando.
Outro ponto destacado pelas entrevistadas é o fato da possível rapidez que possa
ocorrer com a utilização de um recurso não-verbal, não só com a caixa-de-areia, mas
também como análise dos sonhos, argila, pintura, imaginação ativa, entre outros.
Portanto, é um recurso que permite maior rapidez nos surgimento de conteúdos
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inconscientes, assim como qualquer outro recurso não-verbal. Ele apenas difere dos
demais por oferecer um espaço livre e protegido, onde parece que os pacientes têm
maior segurança e confiança em expor seus conteúdos, sentem-se mais livres e
entregam-se mais à análise.
Também é um recurso que pode funcionar quando os pacientes esgotaram as
possibilidades da análise verbal, ou até para amplificar um sonho ou auxiliar em outros
recursos.
A maioria das pessoas que trabalham com este recurso utiliza ainda, outros
recursos como forma de auxiliar a visualização do processo. Costuma-se utilizar análise
de sonhos, argila e pintura.
Existem também muitas variações no uso da técnica, como a forma de
disposição da sala. Alguns usam uma única sala para a análise verbal e para o Sandplay,
outros usam duas salas separadas. Alguns permitem a fala durante a construção da cena
enquanto que outros, não permitem que se fale enquanto se constrói a cena, somente
após a finalização do cenário.
A maioria das terapeutas iniciaram o trabalho com o Sandplay através das
crianças, por estarem procurando outros recursos que mobilizassem o inconsciente.
É comum a todas as entrevistadas, a importância do vínculo que se estabelece
entre o paciente e o terapeuta, pois concordam num ponto em que a relação
transferencial é básica para que o processo ocorra. O Sandplay também é resultante da
relação que ocorre com o terapeuta, pois ele só funciona na presença de outra pessoa
observando. Possibilita-se a sensação de ser acolhido, de saber que existe alguém que
estará ali para quando ele precisar.
O terapeuta também deve ter passado pelo processo, ou seja, vivido a
experiência.
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Dentre os processos de curta duração estudados neste trabalho, parece ser
possível a utilização deste recurso em todos eles, porém o importante é que se respeite
as limitações exigidas por cada um e por cada paciente, variando assim a forma como é
utilizado. Em uma terapia breve não se pode tocar a fundo o inconsciente; na orientação
vocacional tem-se que respeitar o foco proposto; na terapia familiar não se pode analisar
individualmente o sujeito e sim o todo, a comunicação familiar e o conflito familiar e
no diagnóstico pretende-se obter um mapeamento do estado psíquico do indivíduo.
Portanto, deve-se ater ao que estabelece o processo proposto, adequando o recurso a ele,
utilizando-o como forma auxiliar a este processo.
VI. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ANEXOS
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