UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DOUTORADO EM ADMINISTRAÇAO MARIA DE LOURDES BORGES EVENTOS INESPERADOS ATRAVÉS DO ENTENDIMENTO TEÓRICO DE KARL WEICK E DE NIKLAS LUHMANN São Leopoldo 2010 MARIA DE LOURDES BORGES EVENTOS INESPERADOS ATRAVÉS DO ENTENDIMENTO TEÓRICO DE KARL WEICK E DE NIKLAS LUHMANN Projeto de Tese apresentado à Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Administração. Orientador: Dr. Cláudio Reis Gonçalo São Leopoldo 2010 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................................04 1.1 PROBLEMA............................................................................................................................05 1.2 OBJETIVOS.............................................................................................................................09 1.2.1 Objetivo Geral......................................................................................................................09 1.2.2 Objetivos Específicos...........................................................................................................09 1.3 JUSTIFICATIVA.....................................................................................................................10 2 REFERENCIAL TEÓRICO....................................................................................................14 2.1 WEICK.....................................................................................................................................14 2.1.1 Aspectos Introdutórios do Sensemaking..........................................................................14 2.1.2 Influências teóricas em Weick............................................................................................21 2.1.3. Sensemaking........................................................................................................................24 2.1.4 Fontes da abordagem do sensemaking...............................................................................34 2.1.5 Organizações de Alta Confiabilidade (OAC) ...................................................................38 2.2 LUHMANN..............................................................................................................................40 2.3 RELACIONANDO WEICK E LUHMANN..........................................................................46 3 METODOLOGIA......................................................................................................................49 3.1 ANÁLISE DA CONVERSA....................................................................................................52 3.2 NARRATIVAS........................................................................................................................56 3.3 PESQUISA EXPLORATÓRIA INICIAL...............................................................................59 4 RECURSOS...............................................................................................................................77 5 CRONOGRAMA.......................................................................................................................78 REFERÊNCIAS............................................................................................................................79 3 INTRODUÇÃO A compreensão das vicissitudes da prática organizacional vai além do entendimento da organização racional do trabalho (AKTOUF, 1996) e inclui entender a gestão como prática social a partir da inabilidade de se construir, implementar e manter sistemas universais de controle racional (REED, 1984). Porque tais sistemas de controle não são infalíveis, o imprevisível pode suceder. São os eventos inesperados que transcendem a ordem das rotinas e do planejamento organizacional. Diante da ocorrência de um evento inesperado, as organizações não podem prescindir de soluções tão eficientes e eficazes quanto àquelas previstas para eventos programados (BORGES e GONÇALO, 2010a). Organizações que trabalham com atividades de alto risco tomam maior cuidado com as pequenas e grandes falhas em seu processo devido as suas consequências serem potencialmente catastróficas, tais como companhias de energia elétrica, emergências de hospitais, energia nuclear, torres de controle aéreo, times de bombeiros entre outros. Weick e Sutcliffe (2001) denominam tais empresas de Organizações de Alta Confiabilidade (OAC), as quais aprenderam maneiras mais eficazes de lidar com o inesperado do que outras organizações. Este projeto delineia-se a partir da ocorrência de eventos inesperados em organizações consideradas de alta confiabilidade. O esforço se concentra no entendimento dos eventos inesperados como um fenômeno que mobiliza a organização não somente em seus aspectos microdinâmicos, mas também nos aspectos macroestruturais. Os aspectos microdinâmicos compreendem os processos cognitivos individuais e coletivos de sensemaking (WEICK, 1995), bem como a visão sociológica da confiança como redutora da complexidade social (LUHMANN, 1996). Já os aspectos macroestruturais referem-se à comunicação como imprescindível para os sistemas sociais e à decisão como promotora da adaptação do sistema ao ambiente; neste sentido são estruturantes do sistema (LUHMANN, 1995, 1996a, 1996b, 1997a, 1997b, 2010). Assim, comunicação é um conceito fundamental e estruturante para a teoria luhminniana, uma vez que é entendida como uma rede fechada (autopoiética) que reproduz recursivamente os elementos do sistema como unidades autônomas (RODRÍGUEZ; TORRES N., 2003). Outro aspecto, considerado para esta proposta macroestrutural, pois decisões são comunicações que promovem a adaptação do sistema social ao ambiente, servindo como referência entre o aspecto interno e o externo do sistema (LUHMANN, 1996a). 4 Do ponto de vista microdinâmico, entende-se que, diante de uma situação imprevisível, as pessoas responsáveis procuram compreender o problema a partir de elementos que façam sentido em suas estruturas de análise (conforme o conceito de sensemaking segundo Weick, 1995), levando em consideração as suas experiências e as interações com o grupo de trabalho, para, enfim, encontrar a decisão possível e eficaz. Além da compreensão do processo do sensemaking (WEICK, 1995) como microdinâmica crítica para o enfrentamento de situações imprevisíveis, busca-se a diminuição da complexidade através da identificação de familiaridade na situação através da confiança (LUHMANN, 1996). Ocorre que neste processo, vários elementos se intercambeiam através da comunicação, compreendida como elemento macroestrutural, a qual passa a ter um papel estruturador para a continuação do próprio contexto repleto de complexidade. Busca-se suporte então, o entendimento de comunicação proposto por Luhmann, para dar conta deste ambiente de complexidade que são as OAC. Portanto, o enfrentamento da situação inesperada, que exige solução, sucede-se em um contexto de comunicação expresso através de decisões que, promovem a continuidade do sistema e, ao mesmo tempo, o colocam em risco. 1.1 PROBLEMA O problema que este projeto propõe refere-se a um contexto complexo de organizações que precisam ser altamente confiáveis, tais como instituições de saúde (hospitais, salas de emergência, unidades cardiovasculares), companhias de energia elétrica (centros de operações do sistema, hidroelétricas, transmissoras) entre outras. Em tais organizações, os eventos inesperados, na maioria das vezes, não são considerados como crises, pois não são raros, mas podem causar grandes consequências se não forem enfrentados adequadamente através das melhores decisões (WEICK; SUTCLIFFE, 2001). Para um melhor entendimento deste contexto de complexidade, recorre-se a Luhmann (2010, 1997a, 1997b, 1996a, 1996b) e sua compreensão da organização enquanto ente sociológico, onde a relação entre organização e decisão pode ser interpretada sob perspectivas teóricas sociais (LUHMANN, 1997a). Luhmann propôs o entendimento da Nova Teoria dos Sistemas em que o sistema é o mediador entre a extrema complexidade do mundo e a pequena capacidade do homem em assimilar as múltiplas formas de vivência (NEVES, 1997). Diante 5 dessas múltiplas formas ocorre um processo de seleção entre as possibilidades que respeita um “sentido”, que delimitam fronteiras invariantes do sistema social em relação ao meio. Ou seja, para Neves (1997, p. 12), no entender luhminniano “as fronteiras de um sistema devem ser entendidas como fronteiras de sentido” produzidas pelas relações entre as ações na busca pela redução da complexidade. Assim, a ideia de sentido está associada à possibilidade de realizar seleções no interior do sistema que permitam tanto a redução da complexidade ambiental, como a sua evolução ao longo do tempo (COHN, 1998). Por isso, para Luhmann, “sistemas sociais são sistemas de sentido ou sistema-sentido (Sinnsysteme), isto é, algo que faz sentido ou produz sentido” (CARDOSO; FOSSÁ, 2008, p. 3). A importância do sentido para a redução da complexidade (Luhmann) e para a redução da ambiguidade (Weick) é o ponto convergente que impele o problema de pesquisa deste projeto. A ambiguidade e/ou a complexidade está presente nas OAC, pois são consideradas organizações “interativamente complexas” e fortemente acopladas, em que a ocorrência de acidentes independe da quantidade de controles e cuidado que se tenha com eles, pois a fonte de acidentes é o próprio sistema, na maioria das vezes, independente dos agentes humanos (PERROW, 2009). A figura 1 demonstra o framework que norteará esta pesquisa. Figura 1: Framework da pesquisa Fonte: Dados desta pesquisa Diante desse contexto, como focalizar o olhar de pesquisa sobre a organização? Czarniawska (2007) questiona se a organização deve ser estudada de dentro ou de fora. Olhar o lado de fora das organizações a partir de dentro parecia, para as teorias organizacionais, um vislumbre através de janelas semiopacas ou ao contrário, entender as organizações como objetos 6 obscuros, ou atores, cujos feitos estão dentro do desconhecido ou irrelevantes para o observador dos macrofenômenos. Este questionamento refere-se à delimitação do problema de pesquisa deste projeto em que, para além de ser um desencontro epistemológico, tem a intenção de entender melhor a interposição entre o micro e o macro em eventos inesperados nas OAC. Portanto, a partir do ponto em comum da complexidade/ambiguidade presente nos eventos inesperados das OAC e da necessidade de produzir sentido a partir disso, tenta-se compreender o fenômeno sob os pontos de vista microdinâmico e da macroestrutura. Sob o aspecto microdinâmico, observa-se que diante da ocorrência de um evento inesperado, é preciso entender como as pessoas fazem sentido (sensemaking) desse evento coletivamente e como esse entendimento leva às decisões. A busca por criar sentido ocorre a partir de informações ambíguas – geradas pelo evento inesperado – a partir da comunicação (WEICK, 1995), bem como pelo aumento da complexidade da organização que busca na confiança sua diminuição através da comunicação (LUHMANN, 1996). A comunicação é o meio de conexão interna do sistema (STOCKINGER, 2001) que leva a compreensão do aspecto macroestrutural entendendo o evento inesperado como um sistema acoplado de características complexas e invulnerável (PERROW, 1999). A estrutura analítica da pesquisa está representada na Figura 2, a qual busca demonstrar essa relação entre a delimitação do que se entende por macroestrutura para esta pesquisa e do que se entende por microdinâmica. Figura 2: Estrutura analítica da pesquisa Fonte: Dados desta pesquisa 7 Assim, a macroestrutura corresponde ao entendimento da comunicação como produto dos sistemas sociais, não como processo comunicacional, mas compreendida por Luhmann (2010, p.300) como um “pulsar constante [em que] a cada criação de redundância e a cada seleção o sistema se expande e se contrai permanentemente”. Observa-se que a complexidade passa do entendimento de um sistema linear (emissor-mensagem-receptor) para um entendimento dinâmico e quase “vivo”. “As organizações são sistemas sociais baseados em comunicação que têm de ser interpretadas como decisões” (LUHMANN, 1996a, p.345), pois são as decisões que, através da comunicação, reconhecem fatos ambientais e lidam com as incertezas autogeradas e geradas externamente ao sistema, produzindo decisões signficativas em relação ao aspecto externo e interno (LUHMANN, 1996a). Para estudar essa relação, propõe-se a seguinte questão de pesquisa: Como o processo dos eventos inesperados pode ser compreendido através do entendimento teórico de Weick e de Luhmann? Para responder a esta questão propõe-se a realização de um referencial teórico abrangente o suficiente que possa analisar o pensamento de cada um dos principais autores, bem como sua interrelação e possíveis avanços. Para a compreensão das opções teóricas, propõe-se a compreensão de eventos inesperados a partir de Weick e Sutcliffe (2001), bem como dos microprocessos de sensemaking, a partir do entendimento de Karl Weick (1973, 1995, 2005), formado por ambiguidade, experiência e interações, bem como dos microprocessos da produção da confiança (LUHMANN, 1996b) que envolvem diminuição da complexidade através da familiaridade expressa no comportamento social e do papel da comunicação como elemento macroestrutural do sistema que desencadeia decisões (LUHMANN, 1996a, 1997a) e que acaba por afetar de maneira positiva ou negativa o evento considerado como inicialmente inesperado. A figura 3 mostra o relacionamento analítico entre as teorias luhminniana e weickiana neste projeto de pesquisa. 8 Figura 3: Estrutura analítica da pesquisa Fonte: Dados desta pesquisa 1.2 OBJETIVOS Diante desta problemática, os objetivos desta pesquisa são apresentados a seguir. 1.2.1 Objetivo Geral: - Compreender o processo de eventos inesperados a partir da ótica de Karl Weick com o avanço teórico do entendimento de Niklas Luhmann. 1.2.2 Objetivos Específicos: - Analisar a relação teórica entre os microprocessos da criação de sentido (Weick) e os de construção da confiança (Luhamann) e a sua relação com a comunicação (Luhmann e Weick). - Apresentar um modelo explicativo das decisões para eventos inesperados a partir do entendimento de Weick e de Luhmann. - Verificar no campo empírico das OAC, como se apresentam as interrelações entre os aspectos microdinâmicos e macroestruturais e suas consequências para a gestão. - Compreender a interrelação entre as duas teorias e o avanço da teoria para a compreensão de eventos inesperados. Para se atingir esses objetivos, além do aprofundamento teórico necessário, pretende-se utilizar como campo de pesquisa dois tipos de OAC em dois setores distintos: no setor da saúde, pretende-se compreender eventos inesperados ocorridos nas Centrais de Regulação do SAMU e 9 no setor de energia, no Centro de Operação de Serviços da CEEE – de abrangência estadual. Como pesquisa exploratória inicial deste projeto, foi estudado um pequeno evento ocorrido no Centro de Operações do Sistema do setor elétrico brasileiro que ajudou a clarear parte dos elementos da microdinâmica propostos neste projeto. Nos dois setores indicados, pretende-se utilizar a metodologia qualitativa para a realização de pesquisa exploratória, utilizando-se de diversas técnicas tais como observação, entrevistas semi-estruturadas e em profundidade, análise de narrativas e a abordagem metodológica da Análise da Conversa. Através desses recursos metodológicos pretende-se atingir aos objetivos desta pesquisa. Ocorre que, para se estudar no campo empírico a Teoria dos Sistemas Sociais, deve-se ter presente a ambiguidade da oscilação entre o olhar de fora e de dentro de seu “objeto” de pesquisa (NEUSER, 1994). Ocorre que Luhmann (1997b) renuncia a objetificação do homem, da sociedade, ou do que quer que seja o objeto de pesquisa, mas os procedimentos metodológicos possuem tradição objetificadora. Esta ambiguidade passa a ser esmaecida quando se observam eventos inesperados como sistemas em busca da diminuição da sua complexidade. A partir disso, pretende-se compreender as relações e interrelações entre os diversos sistemas sociais utilizandose abordagens metodológicas mais tradicionais, bem como outras mais recentes no campo da administração como a Análise da Conversa. Segundo Baraldi e Gavioli (2007) a Análise da Conversa pode ser um bom ferramental de entendimento dos Sistemas Sociais, mesmo que à primeira vista haja algum estranhamento no uso da AC para abordagens macrossociológicas. Observa-se, porém que o método elaborado pela AC parece interessante para complementar uma teoria da sociedade, pois os sistemas sociais “são constituídos por uma série de eventos comunicativos e a sua parte visível são as sequências de ações” (BARALDI; GAVIOLI, 2007, p. 126) em que sua compreensão não é diretamente observável. Assim também a AC observa as interações como uma sequência de ações produzidas pelos interlocutores, convidando ao estudo dos detalhes destas sequências de ações e assim descrevendo a interação como um sistema social (BARALDI; GAVIOLI, 2007). 1.3 JUSTIFICATIVA Os eventos inesperados estão se fazendo cada vez mais presentes nas organizações. Eventos inesperados em nível mundial parecem cada vez mais comuns, tais como a crise monetária mundial de 2008, o bloqueio da mobilidade aérea do espaço europeu por vários dias 10 por conta das cinzas provocadas por um vulcão islandês em abril de 2010 e o vazamento de petróleo que iniciou em 20 de abril de 2010 que despeja de 15 a 10 mil barris de petróleo diário no mar do Golfo do México (RODRIGUES, 2010). .Na América, terremotos abalaram seriamente em janeiro, o Haiti e em fevereiro o Chile, contabilizando mais de 220.530 mortes (CHAVES-SCARELLI, 2010). A pandemia da Gripe A (Vírus Influenza H1N1) iniciada em 2009 tem gerado críticas de especialistas quanto às falhas de gestão da informação por parte da Organização Mundial da Saúde (OMS), a qual registrou até abril de 2010, 17.770 mortes em todo o mundo (NEBEHAY, 2010). No Brasil pode-se citar o blackout elétrico de 10 de novembro de 2009 em que 60 milhões de brasileiros ficaram no escuro por até quatro horas (BROOKS, 2009) e inundações no Rio de Janeiro classificadas entre as mais fatais do mundo em 12 meses pelo Centro de Pesquisas de Epidemiologia dos Desastres (MELLO, 2010). Observa-se que eventos como os citados, afetam diretamente as organizações que se encontram na área de abrangência de cada evento, e indiretamente outras. Tais eventos extremos estão sendo denominados por Michael J. Mauboussin (2009) de cisnes cinzentos, uma alusão aos cisnes negros da metáfora de Aristóteles, segundo o qual, eventos inesperados não são tão impensáveis quando analisados depois de ocorridos (RODRIGUES, 2010). Portanto, entender como enfrentar eventos inesperados pode estar sendo difundido à literatura de gestão, ultrapassando os limites do interesse acadêmico. Para se compreender a dinâmica dos efeitos de eventos inesperados para as organizações, torna-se necessário uma visão sistêmica que ultrapasse o entendimento das fronteiras organizacionais. Eventos inesperados podem ter causas externas, como por exemplo, os citados anteriormente, ou mesmo causas internas como erro humano, problemas técnicos entre outros. Quando acontecem, alguma decisão precisa ser tomada. Por isso, para compreender eventos inesperados é preciso entender como as decisões desses eventos são realizadas. Ocorre que as decisões acontecem em e através de um contexto de comunicação. Para esta proposta de pesquisa, a comunicação é um elemento vital para as organizações, pois “o que tem que ser feito em um sistema social tem que ser realizado pela comunicação” (LUHMANN, 1996a, p. 343). Ou seja, é por meio da comunicação que as ações são realizadas nas organizações, uma vez organizações são consideradas sistemas sociais para Luhmann (1996a, p. 345), pois são operacionalmente fechadas e reproduzem a si mesmos através da comunicação. Para Luhmann (1996a, p. 345) a característica que distingue as organizações de outros tipos de sistemas sociais é 11 a comunicação das decisões, ou seja, “organizações são sistemas sociais baseados em comunicação, que precisam ser interpretadas como decisões” (LUHMANN, 1996a, p. 345). Para Luhmann (1996 a) as decisões são interconectadas pela absorção e transformação da incerteza (baseado em March e Simon, 1958) em certeza autogerada que é a informação. É a incerteza que produz a ambiguidade da informação que a organização precisa compreender através do processo do sensemaking (WEICK, 1995), bem como da tentativa de diminuição da complexidade ambiental através da confiança (LUHMANN, 1996 b). Ambos (Weick e Luhmann) enfatizam o papel estruturante da comunicação além do ferramental de emissão e recepção de mensagens, vendo a ação como produto da comunicação. A organização é vista por Luhmann (1987) como um sistema autopoiético, ou seja, um sistema que tem capacidade para reproduzir elementos a partir dos elementos de que são compostos (baseado em Maturana e Varela, 1975). Neste sentido, Weick (1979) cunhou o termo organizing devido à compreensão da organização como processos que se desdobram como uma sequência de ações em um contexto social intersubjetivo. Observa-se que ambas apresentam esse caráter dinâmico em que existe uma busca por diminuição da ambiguidade e/ou complexidade para resolução de dificuldades e à constante presença da incerteza nas organizações. Neste projeto de tese, é apresentada a proposta de um avanço do entendimento de Weick para os eventos inesperados, através do entendimento de Luhmann da organização vista como sistemas sociais em interrelação direta entre o sistema psicológico e o sistema social através da comunicação. Tal perspectiva pode trazer para a teoria que busca compreender as OACs, algum avanço no sentido de focalização do processo que as OACs enfrentam diante de um evento inesperado, observando-o de dentro a partir da teoria de Weick (sensemaking) e de Luhmann (confiança), bem como de fora, vendo a organização como um sistema fechado que possui fronteiras permeáveis com o ambiente, ou seja, a organização vista como sistema social apresenta diferença em relação ao seu ambiente, mas é suscetível às mudanças ambientais (LUHMANN, 1996 a). A teoria de Luhmann procura explicar a complexidade da sociedade contemporânea através da elaboração de uma rede de conceitos suficientemente complexa, que ajuda a explicar a sociedade mundial e seus processos, ultrapassando o marco conceitual em que os autores ‘clássicos’ explicavam a sociedade de sua época (RODRÍGUEZ; TORRES N., 2003). 12 As opções teórico-metodológicas desta proposta de pesquisa envolvem a compreensão das origens teóricas dos autores estudados. Niklas Luhmann (1927-1998) nasceu na Alemanha, formou-se em Direito e em 1961 foi estudar em Harvard com Talcott Parsons (1902-1979), teórico americano que o influenciou, porém, mais tarde, acabou erigindo sua própria teoria (BIOGRAFY, 2010). Garfinkel (1917-) também estudou com Parsons, o qual não aceitava suas ideias sobre como o ator ordena a interação social, mas conseguiu formar-se em 1952. Karl Weick (1936- ) estudou no começo da década de 1960 com Garfinkel, o qual marcou seu entendimento de sensemaking (WEICK, 1995). Harvey Sacks(1935-1975) também estou com Garfinkel. Sacks é precursor da Análise da Conversa, abordagem metodológica que estuda a falaem-interação (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998) presente nesta proposta. A figura 4 mostra a representação das opções teórico-metodológicas. Observa-se que os principais autores desta proposta tiveram sua origem intelectual a partir de Parsons, pois Luhmann metaforicamente pode ser entendido como seu “filho” e Weick e Sacks como seus “netos” teóricos. Figura 4: Matriz das opções teórico-metodológicas Fonte: Dados desta pesquisa 13 2. REFERENCIAL TEÓRICO Esta seção pretende apresentar os conceitos de cada tema abordado neste Projeto de Tese de maneira inicial para auxiliar na delimitação do problema de pesquisa. 2.1 WEICK 2.1.1 Aspectos Introdutórios do Sensemaking Karl E. Weick é um teórico organizacional americano com formação em Psicologia Cognitiva. Nascido no Estado americano da Indiana em 1936 recebeu o título de Doutor em Psicologia em 1962. Desde então se envolveu com pesquisas sobre cognição nas organizações. Em 1969, escreveu o livro The Social Psychology of Organizing, que inaugura um novo entendimento das organizações como processos sociais compostos por comportamentos interligados (livro traduzido para o português em 1973) (ANDERSON, 2006). Acadêmico ativo, a partir de 1965 escreveu mais de 100 artigos, participou em mais de 100 capítulos de livros e publicou oito livros individuais (CURRICULUM, 2007). Weick é um dos mais influentes pensadores no campo das teorias organizacionais (SUTCLIFFE et al., 2006). O comportamento organizacional se fundamenta na maneira com que as pessoas interagem no grupo social. Weick (1973) entende que a participação individual no grupo é pouco heterogênea porque os comportamentos sociais dependem das ações dos outros. Essa interrelação entre indivíduo e grupo se estende ao ambiente, pois ao invés de reagir, os atores criam o ambiente ao qual se adaptam conforme as suas necessidades e as dos outros. Um importante aspecto no delineamento da abordagem, é que o ambiente é um fenômeno ligado a processos de atenção. Weick (1973) cita autores ligados à Fenomenologia Existencial que se interessam pelo mundo da experiência cotidiana, entre eles Schutz (1967) é muito citado, por introduzir uma dimensão temporal ao significado da experiência vivida (BURREL & MORGAN, 1998). O ato reflexivo pode ser compreendido através da metáfora de um cone de luz que se amplia para trás (passado) a partir de determinado presente dando definição e contorno a certas partes da experiência vivida. Como o cone começa no presente, qualquer que seja a atitude ou a disposição do ego neste momento, afetará o olhar voltado para o passado. Assim, a “atitude do 14 ego com relação à atividade presente, determina sua atitude com relação ao passado” (WEICK, 1973, p.67). Por isso, o sentido de uma experiência vivida passa por modificações e dependem do tipo específico de atenção que o ego lhe outorga em cada momento. A atenção está pragmaticamente condicionada, pois os sentidos mudam em função de projetos e interesses do ator no momento presente. Um dos aspectos essenciais desta abordagem é a característica dinâmica atribuída aos processos existentes na organização. São os processos que permitem a existência da organização. Os processos são formados por conjuntos (famílias) de comportamentos interligados que podem afastar certa ambiguidade da informação. [54] Weick deve a Campbell (1965) a idéia de que os processos são processos de evolução, embasado na idéia de um modelo evolutivo adaptado ao comportamento social. Na evolução os principais processos são a variação, a seleção e a retenção. A variação corresponde às variações do comportamento que são casuais e escolhidas, sendo conservadas as que receberam o maior reforço ou permitem maior sobrevivência. A seleção cria a novidade pela composição de vários genótipos. Por isso, grupos parecem mais ‘sábios’ que qualquer um de seus membros, por exemplo, na combinação de porções de respostas. A retenção é, por sua vez, o oposto da variação, a busca da estabilidade através de índices moderados de mutação, os quais são necessários para a sobrevivência e para a vantagem evolutiva. Weick (1973) adaptou tais processos à teoria das organizações e uma das emendas realizadas à teoria evolutiva foi com relação ao ambiente criado devido aos aspectos sutis da organização humana. Para o refinamento do conceito de ambiente criado, Weick (1973) se embasa em Mead (1956), Allport (1967), Skinner (1963), Bem (19965), Garfinkel (1967), Schachter (1967) e principalmente Schutz (1967). O ator humano cria o ambiente ao qual o sistema depois se adapta, e é esse ambiente criado que é trabalhado pelos processos de organização. Para a compreensão do ambiente criado, o entendimento da dimensão tempo torna-se vital, pois o seu aspecto mais decisivo reside no passado, uma vez que “só podemos saber o que fizemos depois de ter realizado a ação” (Weick, 1973, p.64). Ou seja, em linguagem de estímulo-resposta: apenas quando uma resposta foi completada é que o estímulo se torna definido. Essas afirmações envolvem o tempo como duração pura e como segmentos discretos. O tempo como duração pura é como uma corrente de experiência vir-a-ser, deixar de ser, sem contornos, nem limites, um fluxo, de confusão entre início e fim. Já o tempo, como segmentos discretos com propriedades espaciais e 15 temporais, ocorre quando o ator sai da corrente de experiência e volta sua atenção para ela, para o passado, uma vez que só é possível voltar a atenção para o que passou. Se o ator se afasta da corrente atual e reflete sobre o que passou, a experiência passa a ser vista como separável, distinta, definida, “cujo sentido será determinado pela sua atitude com relação às atividades presentes, [ou seja] sua atitude determina o tipo de atenção que será dirigida para o passado, e esse modo de atenção é o sentido que a experiência terá” (WEICK, 1973, p.68). Por isso “todo conhecimento e todo sentido decorrem de reflexão, de um olhar para trás” (WEICK, 1973, P.64), e todo sentido pressupõe uma experiência que pertence ao passado. Tornase importante clarificar as propriedades do ambiente criado, as quais possuem implicação em toda a abordagem de Weick (Quadro 1): Propriedades do ambiente criado Criação de sentido é um processo de atenção para o que já ocorreu Como a atenção se dirige para trás, para um aqui-e-agora específicos, o que quer que ocorra no momento influirá no que a pessoa descobre ao olhar para trás. A atenção se volta para trás a partir de determinado ponto no tempo (aqui, agora) e quando fixa uma experiência passada encontra objetos significativos. 3 Os processos de memória (retenção ou reconstrução) influem no sentido 4 Como não podemos conhecer a fase inicial, uma ação só pode tornar-se objeto de atenção depois de ter ocorrido, pois enquanto ocorre não pode ser observada. Quadro 1: Propriedades do ambiente criado Fonte: Embasado em Weick (1973) 1 2 Portanto, os atores humanos em coletividade estão imersos em uma corrente contínua de experiência. Depois de vivida, a experiência está potencialmente disponível para a atenção, embora a maior parte dela não seja notada. Se o ator se afasta da corrente atual e reflete sobre o que passou, a experiência passa a ser vista como separável, distinta, definida, “cujo sentido será determinado pela sua atitude com relação às atividades presentes, [ou seja] sua atitude determina o tipo de atenção que será dirigida para o passado, e esse modo de atenção é o sentido que a experiência terá” (WEICK, 1973, p. 69). É importante perceber que certas partes da experiência passada se tornam significativas porque há afastamento de parte da ambiguidade intrínseca numa corrente de experiência. É próprio da organização procurar afastar a ambiguidade do ambiente de informação. Por exemplo, através de clientes teimosos, relações com sindicatos, entre outros. A incapacidade das organizações para tolerar o processamento ambíguo pode ser a razão mais importante para que 16 tenham perturbações, ou seja, “é o fato de não querer perturbar a ordem que faz com que para a organização seja impossível criar a ordem” (WEICK, 1973, p.42). É a partir da reflexão que certas partes da experiência passada são escolhidas e definidas (que equivale ao processo de variação). São essas partes da informação criada que formam a informação recebida que alimentam os processos de seleção e de retenção. Por isso o processo de variação poderia ser chamado como processo de criação (enactment). Finalmente, é possível definir os processos de evolução apropriados à teoria organizacional, segundo Weick (1973): 1. Processo de Criação: Sequência em que partes da experiência passada tornam-se significativas e em que há afastamento de parte da ambiguidade. Esse processo de criação é alimentado por informações de dentro do sistema (linha do retorno da retenção) e de fora do sistema (a partir da mudança ecológica) (Figura 2). Uma vez que a reflexão escolhe e define certa parte da experiência passada, parte da ambiguidade é afastada. São os ‘sentidos primitivos’ que serão passados para a pragmática coletiva. O sentido da informação criada não é fixo, mas fluido, porque os projetos estão em mudança, os interesses estão sendo modificados, bem como a interpretação varia em função da distância temporal a partir do que está sendo visto. Em um primeiro momento, somente os interesses do ator individual determinam o sentido. Quando essa informação é transmitida para o processo de seleção, é a pragmática coletiva que controla o estabelecimento do sentido. Neste estágio, diferentes componentes da informação recebida merecem atenção, em diferentes maneiras, com o estabelecimento final de sentidos distintos. Assim, “a informação que é unívoca para o indivíduo, pode ser ambígua e problemática para o sistema” (Weick, 1973, p.69), mesmo assim, como a criação é um processo fracamente estruturado, resulta em várias produções (informações que contém certa ambiguidade). 2. Processo de Seleção: Quando o sentido estabelecido pelo indivíduo no processo de criação, passa para a pragmática coletiva no processo de seleção, a informação passa pelos critérios da ação coletiva e as consequências dessa informação são diferentes para a estrutura coletiva e para o indivíduo. As ações egoístas conservam o indivíduo, mas destroem a coletividade. A produção final de diferentes sentidos dependerá do nível de ambigüidade das ações coletivas, ou seja, depende do aspecto coletivo a partir do qual são vistas retrospectivamente. Perguntas próprias da pragmática coletiva: Por que estou fazendo isso? Quais as consequências para o sistema? A função do processo de seleção é separar a maior parte das produções ambíguas e torná-las mais unívocas e ordenadas na medida do possível. 3. Processo de Retenção: Esse processo enfrenta duas fontes de ambiguidade: (a) ambiguidade das informações a partir do processo de seleção e (b) ambiguidade que se desenvolve a partir de contradições entre itens mais novos e mais antigos do conteúdo conservado. O principal objetivo da retenção é a retirada de mais um pouco da ambiguidade da informação. Quando a informação chega no processo de retenção a partir do processo de seleção, tem o potencial para contradizer ou reafirmar o conteúdo pré17 existente. É a reorganização interna dentro do processo de retenção que afasta a ambiguidade criada por contradições. As informações rotineiras (baixa ambiguidade) passam por todos esses estágios. Quando o item rotineiro possui baixa ambiguidade, é difícil assimilá-lo na experiência passada, não passa pela memória por isso pode ficar sem sentido. Itens rotineiros podem provocar muita perturbação quando a ambiguidade presente neles não aparece. Por isso o equilíbrio entre estabilidade e flexibilidade é importante. O trabalho dos processos é o de afastar parte da ambiguidade. Quando a informação chega a qualquer um dos processos citados, inicialmente é registrado o grau de ambiguidade da informação, uma vez que se houver muita ambigüidade na informação – o processo se torna desordenado até que se destrói no caos total. Se muito ordenado se destrói, pois atuará com partes cada vez menores de informação recebida e se torna cada vez mais isolado do ambiente que atua. Esse é o problema de registro e afastamento. Weick (1973) formulou hipóteses sobre regras que ajudam a construir os processos. Essas regras permitem reunir o processo a partir do conjunto total de ciclos interligados que estão presentes na organização. O grau de ambiguidade é registrado a partir da aplicação das regras de reunião, que consiste na escolha de alguns dos seguintes critérios para a escolha dos ciclos: menor esforço, maior freqüência, maior êxito no afastamento da ambiguidade, estabilidade na recepção da informação, menor tempo, disponibilidade, pessoal mais experiente, semelhança no conteúdo da informação, mais compensadores e que provoquem menor perturbação no sistema. Após a aplicação das regras de reunião são escolhidos ciclos adequados. Cada ciclo se inicia com a ação da pessoa (ato) que vai suscitar uma resposta da outra pessoa (interato) e o consequente reajustamento da primeira pessoa (interato duplo). Weick (1973) sugere alguns ciclos que seriam adequados para reunir um processo de seleção: 1 2 3 4 5 Ato Ação da pessoa Interato Resposta da outra pessoa Isola uma propriedade da informação para exame maior Escolhe critério para aplicação à propriedade da informação Constrói novo critério de seleção Diferencia um critério existente, através do novo componente Reúne um conjunto de critérios para aplicação a Aceita ou rejeita essa escolha Aceita ou rejeita o critério Aceita ou construção Aceita ou diferenciação rejeita a rejeita a Aceita ou rejeita a reunião Interato duplo Reajustamento pela primeira pessoa Abandona, revê ou conserva propriedade Abandona, revê ou conserva critério Abandona, revê ou conserva construção Abandona, revê ou conserva diferenciação a o a a Abandona, revê ou conserva reunião 18 informação Aplica os critérios escolhidos Avalia o ajustamento à informação critério-informação Quadro 2: Descrição de alguns ciclos de reunião de processo Fonte: Weick, 1973, p. 74 6 Aceita ou rejeita, a fim de reter Portanto, quanto mais ambígua é uma informação, não se conhece dela o suficiente, então poucas regras de reunião são utilizadas, em compensação maior quantidade de ciclos será aplicado e vice-versa. Observa-se que os processos atuam através de redes interpessoais de interação, uma vez que a estrutura coletiva suporta a diminuição da ambiguidade através dos comportamento interestruturados. A ambiguidade corresponde ao excesso de sentido de uma informação. Os processos de criação, seleção e retenção são interligados na organização e as relações existentes entre eles constituem os controles do sistema (embasado no circuito causal de Maruyama, 1963). Weick (1973) entende que as relações entre processos estão relacionadas ao problema de como ocorre a organização, pois em ambas há, o que ele chama de ‘circuitos’, que ampliam o desvio (mudam condição, desenvolvem estruturas, criam diferentes padrões de respostas), bem como há os que contrabalançam os desvios (estabilidade no sistema e continuidade), esses últimos são os circuitos de autocorreção que “permitem que a organização conserve as lições que aprendeu com a experiência e possa utilizá-las” (p. 86). Portanto, o trabalho dos processos é o de afastar parte da ambiguidade. O ambiente externo, sob a forma de mudança ecológica, atinge mais o processo de criação do que o de seleção. Quando a informação chega no processo, inicialmente é registrado o grau de ambiguidade da informação, através do aumento ou redução do número de ‘regras’ que são ativadas para reunir um processo (menos regras significa maior ambiguidade; mais regras significa menor ambiguidade). Quando poucas regras são ativadas, mais ciclos (afastam a ambiguidade) são escolhidos (ato, interato e interato duplo). Ou seja, quando há grande ambiguidade poucas regras e muitos ciclos são escolhidos, e quando há pouca ambiguidade na informação, muitas regras e poucos ciclos são escolhidos. Isso ocorre em cada um dos processos de criação, seleção e retenção. Quando há excesso de ambiguidade e os processos de seleção e retenção não conseguem diminuí-la, ocorre a produção de diferentes sentidos, conforme demonstrado na figura 6. 19 Mudança ecológica Individual Criação R-C Atenção retrospectiva Diferentes Sentidos: Maior Ambiguidade Seleção R-C Retenção R-C Pragmática coletiva R-C Regras de reunião e escolha de ciclos Linhas de informação com maior ou menor ambiguidade Figura 6: Diagrama do relacionamento entre processos com excesso de ambiguidade Fonte: Embasado em Weick, 1973 Já se no final do processo, o conteúdo conservado for utilizado como indicação, pois conseguiu a diminuição da ambiguidade, e for utilizado em oportunidades posteriores ocorre então a ação (criação/enactment) e o consequente ajuste do sentido, conforme demonstrado na figura 3. Assim, o sentido da organização é definido pelas ações dos seus atores. O sentido não é ‘ligado’ à experiência. O sentido de qualquer coisa é a maneira pela qual a atenção a vê, e nada mais. Deve-se salientar que mesmo conteúdos não ambíguos podem ser reinterpretados como ambíguos (quando confrontados com o sentido retrospectivo). A partir dessa ambiguidade recém descoberta, podem aparecer novos sentidos para o item remetendo novamente à figura 7. 20 AÇÃO Mudança ecológica Ajuste sentido Individual Criação R-C -A Escolha Seleção R-C Retenção R-C Pragmática coletiva R-C Regras de reunião e escolha de ciclos -A Diminuição ambiguidade informação Atividade coletiva da da Linhas de informação com maior ou menor ambiguidade Figura 7: Diagrama do relacionamento entre processos com diminuição da ambiguidade Fonte: Embasado em Weick, 1973 Para esta pesquisa, os primórdios do conceito da criação do sentido concebido por Weick são consideradas a partir do livro de 1969, traduzido para o português em 1973. A seguir é apresentada uma análise das suas fundamentações teóricas. 2.1.3 Influências teóricas em Weick Para uma melhor compreensão das influências teóricas que o conceito de criação do sentido proposto por Karl Weick, aqui considerado como primitivo (livro de 1973), será utilizado o entendimento das abordagens propostas por Burrel e Morgan (1998) para o entendimento das teorias organizacionais. A Abordagem Funcionalista (BURREL; MORGAN, 1998) é o quadro dominante na sociologia acadêmica e no estudo das organizações. Explica o status quo, a ordem social, a integração social, a solidariedade e a necessidade de satisfação e atualização. Explica os assuntos sociais de forma essencialmente racional, sendo pragmático, orientado para o problema e solucionador prático, para entender a ordem, o equilíbrio, a estabilidade na sociedade e os meios que podem ser mantidos. Observa-se que as principais influências foram: a) Simmel (1917) e Mead (1956) são autores com forte presença na obra de Weick (1973). Para Burrel e Morgan (1998) esses autores representam a categoria do Interacionismo Simbólico, tópico pertencente à Abordagem Funcionalista por conter idéias do positivismo sociológico. O 21 positivismo sociológico procura utilizar os aparatos metodológicos das ciências naturais para as ciências sociais (NUNES, 2003). No Interacionismo ocorre a presença em maior ou menor grau de determinismo, no sentido de que há estruturas externas ao indivíduo que produzem certo cerceamento de suas ações e de suas interações, através dos padrões, regras e valores com que o indivíduo precisa lidar. Com isso, o voluntarismo individual também é afetado (Burrel e Morgan, 1998). b) O sociólogo Simmel (1917) focaliza seu interesse de pesquisa nas estruturas (estado, cidade, família etc) que os indivíduos cristalizam nas suas múltiplas relações através das interações. Sua preocupação é o estudo da associação através do entendimento das interações dos indivíduos como átomos sociais, ou seja, nas relações estabelecidas pelos indivíduos durante a interação. Preocupa-se mais com a associação do que com a sociedade (Burrel e Morgan, 1998). Weick (1973) absorveu muito do seu trabalho, principalmente as formas de interação grupal como as díades e as tríades. c) Mead (1956) destaca o papel dos gestos e da linguagem no processo de interação, os quais fomentam o desenvolvimento da mente e da pessoa. Para ele a consciência do ser humano evolui através do processo social de interação que envolve uma conversa interna com o outro generalizado. Reconhece o papel do ser humano em influenciar seu ambiente através da interação (Burrel e Morgan, 1998). Observa-se que Weick (1973) absorveu a questão do ambiente criado e muito do papel da interação na sua teoria de Mead. d) Skinner (1963) é um dos principais representantes do tópico ‘objetivismo’, caracterizado pelo alto grau de modelos e métodos das ciências naturais. Skinner é um psicólogo comportamentalista que desenvolveu teorias causais de comportamento baseadas na análise de estímulo e resposta. Para ele, o homem é quase igualado a uma máquina, respondendo de maneira determinística às condições externas em que é exposto. Weick (1973) foi influenciado pela questão do estímulo-resposta no entendimento da criação do sentido. A busca da Abordagem Interpretativista é a compreensão do mundo social e dos seus fenômenos a partir da experiência do sujeito, ou seja, valoriza o ponto de vista dos atores que estão diretamente envolvidos no processo social (BURREL; MORGAN, 1998). Esta é uma visão bastante diferente da Abordagem Funcionalista que prevê que há ordem e padrão contínuos nos processos organizacionais, guiados pela objetividade. Na Abordagem Interpretativista, o subjetivismo tenta entender o mundo social ao nível da experiência subjetiva, ou seja, o entendimento do mundo a partir da consciência individual, a qual encerra a subjetividade. Observa-se que as principais influências foram: a) Schutz (1967) pertence à Abordagem Interpretativista, pertencente ao tópico da Fenomenologia Existencial em que o interesse resido no mundo da experiência cotidiana. Schutz acredita que a função da ciência social é ser interpretativista em uma análise fenomenológica de significado originada no fluxo da consciência. Através do entendimento de Schutz, é introduzida 22 uma dimensão temporal junto ao conceito de reflexividade e ao significado da experiência vivida. O aspecto da temporalidade é essencial na obra de Weick (1973), uma vez que o sentido sempre é retrospectivo. Outra questão importante a ser destacada é a perspectiva sociológica, ou seja, como conhecer a subjetividade do outro através da apreensão intencional de sua experiência, em que o verdadeiro entendimento depende da interação. b) Garfinkel (1967) é um dos autores que mais influenciou Weick no seu entendimento da criação do sentido. Garfinkel pesquisou os jurados em parceria com Pepinski para entender “o que os torna jurados?”. É importante notar que Pepinski foi um dos orientadores de doutorado de Weick. Chegaram à conclusão que os jurados seguiam uma série de práticas para fazer sentido de uma atividade social específica. Garfinkel é considerado pertencente ao tópico da Etnometodologia por Burrel e Morgan (1998). A Etnometodologia estuda o detalhamento da vida cotidiana. Os tópicos de estudo empíricos são as atividades práticas da vida diária, como as pessoas ordenam e dão sentido para as suas atividades e às dos outros. O termo Etnometodologia foi inventado por Garfinkel no referido Projeto Júri. Observam-se influências de outras correntes teóricas nos escritos de Weick, tais como: a) Allport (1962) é citado por Weick (1973) sobre a importância da participação das pessoas nas estruturas do grupo. Allport foi importante para a Psicologia Social, transparecendo em sua teorização uma vertente positivista através da ênfase no comportamentalismo (CAVEDON, 1999). Allport (1962) deixou marcas na obra de Weick (1973) através do seu entendimento sobre as estruturas coletivas onde os comportamentos dos membros são interligados através de ciclos e complementação do comportamento. Depois da estrutura coletiva formada, as pessoas tentam preservá-la através de seguranças estruturais. A estrutura coletiva é uma propriedade básica dos grupos. b) Campbell (1965) aprofundou a Epistemologia Evolucionista, através de uma abordagem evolutiva para explicar o conhecimento humano (GARCIA, 2005). Weick (1973) adaptou suas idéias dos processos evolutivos sociais de variação, seleção e retenção o que traduz um caráter evolucionista na sua obra. c) Maruyama (1963) tratou dos processos de auto-organização descritos na cibernética de segunda ordem, ou seja, tratava da capacidade de auto-organização do sistema de modo que o organismo pudesse se adaptar às condições do contexto para sobreviver, através de uma retroalimentação positiva (GRANDESSO, 2000). Termos e aspectos apropriados para a Teoria dos Sistemas, aproveitados por Weick no entendimento da inter-relação entre os processos evolutivos, conforme demonstrado nas figuras 2 e 3. Portanto, a obra de Weick (1973) sofreu diversas influências. Quando comparadas com a categorização de Burrel e Morgan (1998) é possível perceber que a abordagem foi influenciada, entre os autores citados, por teorias mais objetivistas, bem como mais subjetivistas. Dentre os autores utilizados de outras disciplinas, é possível perceber que a questão da estrutura perpassa todas as suas análises, podendo ser aqui categorizados como mais objetivistas. Assim, observa-se 23 que a abordagem da Criação do Sentido pode ser compreendida como pertencente às abordagens Interpretativista e a Funcionalista, uma vez que bebe de fontes heterogêneas. 2.1.4. Sensemaking No livro Sensemaking in Organizations, Weick (1995) “consolida uma nova forma de relacionar a ação com o contexto organizacional, na qual se destaca o modo como as pessoas criam sentido a partir de elementos da experiência e de seu contexto cultural e discursivo” (BORGES; GONÇALO, 2009b). Sensemaking significa literalmente construir sentido ou significado (making of sense). Para este estudo, a tradução de sensemaking será considerada como ‘criação de sentido’. Esta opção deve-se às características singulares do conceito, tais como a questão do retrospecto. Se a cada vez que o ator se deparar com uma situação ambígua e complexa ele buscar em sua memória situações semelhantes com a atual e se seus projetos e inclinações do momento interferem no sentido dessas experiências passadas, a cada vez ele estará criando um novo sentido para cada situação. Como, para o autor, a questão do enactment é importante decidiu-se, que a melhor tradução de sensemaking para o português e para este trabalho é ‘criação de sentido’. O processo de criar sentido tem uma forte influência sobre a maneira com que os indivíduos, dentro das organizações, começam os processos de transação com outros para clarificar a própria identidade e da organização. Weick (1995) adapta os trabalhos de Steele (1988), Ring e Van de Ven (1989), Chatman et al., (1986), Louis (1980), Duton e Dukerich (1991), Erez e Earley (1993). O que faz um evento ser uma oportunidade para criação de sentido organizacional? Há algumas características que precisam estar presentes em um evento, tais como um fluxo de eventos que acusa discrepância de sinais ou pistas, que surpreende, que não se ajusta. Quando se olha para o passado, ocorre um lapso na experiência, pois não se encontra nada semelhante. Iniciam-se especulações sobre o que está ocorrendo, surgem pistas que o grupo ou comunidade começa a discutir, pois contatos são cruciais na construção e percepção do problema. Normalmente identidade ou reputação estão envolvidas. Portanto essas características envolvem identidade, retrospecto, promulgação/decretos, contato social, eventos em processo, pistas e plausibilidade que são as sete características da criação de sentido. As organizações são terrenos 24 férteis para a criação do sentido, pois trabalha sobre uma rede de ação coletiva, com informações ambíguas, possui linguagem e símbolos próprios, bem como eventos e interrupções inesperados. Os principais problemas de pesquisa que o estudo da criação do sentido suscita são: Como eles constroem o que eles constroem, por que e quais seus efeitos? Organizações que se envolvem em criação do sentido são mais ou menos adaptativas? Entre os autores que estudaram a criação do sentido a partir das ideias de Weick (1995), o autor concorda com os achados de algumas pesquisas realizadas e as utiliza para um refinamento de seu conceito de criação do sentido. A interpretação é diferente da criação de sentido e nem faz parte dela, mas ambas são frequentemente confundidas. Para o ato de interpretar é preciso que haja alguma forma de explanação como um texto a ser lido, um sonho a ser interpretado ou um poema. O resultado da interpretação sempre será uma tradução ou uma leitura aproximada, é como ler o texto que outro escreveu, sem a compreensão do contexto dos acontecimentos. Por isso, interpretação envolve interesses políticos, consequências, coerção, persuasão e retórica, o que provoca amiguidade e equívoco. O processo de criação de sentido inclui a construção e quebra do texto como pistas ou sinais que são interpretados, bem como revisão destas interpretações baseadas na ação e suas consequências. Criar sentido é sobre autoria, bem como interpretação, criação bem como descoberta, ou seja, alto nível de engajamento do ator (WEICK, 1995). Portanto, a criação de sentido é sobre uma atividade ou um processo enquanto interpretação pode ser um processo que descreve um produto. É comum ouvir que alguém fez uma interpretação, mas Weick (1995) defende que alguém criou um sentido (fez um sensemaking). Assim, a atividade, mais do que o resultado está em primeiro plano, com foco no processo. Para o ato de interpretação é como se houvesse um texto no mundo esperando para ser descoberto ou aproximado. Criar sentido é menos sobre descoberta e mais sobre invenção. Criar sentido contém mais estágios do que a interpretação, ou melhor contém mais complexidade do que a interpretação. Weick (1995) começou a se interessar por sensemaking nos anos 60 através dos trabalhos de Garfinkel e Pepinsky (1967) que estudavam a tomada de decisão dos jurados. O que intrigava ao autor era que os jurados não pareciam primeiramente verificar o dano provocado pelo réu e sua extensão e então alocar a culpa e finalmente a pena (remedy). Eles primeiro decidiam a pena e então decidiam os fatos entre as alternativas alegadas que justificassem a pena. Os jurados criavam uma seqüência consistente (makes good sense) e a tratavam como se isso fosse o que 25 realmente ocorreu. Os fatos eram produzidos retrospectivamente para suportar a escolha do veredicto dos jurados, através da construção de uma história plausível. (WEICK, 1995). Por isso, a questão que Wallas (1926) trás é essencial para a criação do sentido: “Como posso saber o que penso até ver o que eu disse?” Assim, observa-se que uma característica da criação do sentido é que o resultado ocorre antes da definição da situação. As situações são progressivamente clarificadas, ou seja, as pessoas começam com um veredito ou uma escolha em mãos e constroem uma história plausível que a reproduz, como aparece no trabalho de Garfinkel (1967). Este entendimento está fundamentado na Teoria da Dissonância Cognitiva (Festinger, 1957) que define como uma dissonância, uma tensão entre o que a pessoa acredita e o que ela faz. A pessoa procura reduzir a dissonância entre cognições que coexistem simultaneamente, modificando um dos dois conhecimentos devido à tendência à consistência cognitiva. A pessoa procura então reduzir o incômodo psíquico aproximando sua percepção à do dissonante ou percebendo a informação de forma distorcida (SOTO, 2002), revisando assim o sentido de decisões que tiveram consequências negativas, por exemplo. A Teoria da Dissonância Cognitiva e a Etnometodologia fornecem robustez para a abordagem da criação do sentido. A Etnometodologia foi inaugurada por Garfinkel (1967) e consiste no estudo do raciocínio prático do cotidiano, buscando explicação para a realidade através do conjunto de evidências observado (GUESSER, 2003). A etnometodologia busca descrever os métodos que as pessoas usam para representar suas próprias ações para os outros (HUTCHBY e WOOFFITT, 1998). Ambas as perspectivas compartilham idéias comuns uma vez que, para a Etnometodologia, na presença de outros, a pessoa busca provar competência social e racionalidade nas ações, o que é muito semelhante à autojustificação da Teoria da Dissonância Cognitiva que é também real ou imaginada pela audiência (WEICK, 1995). A definição das sete propriedades da criação do sentido é um dos principais incrementos contidos no conceito refinado da abordagem. As propriedades são apresentadas por Weick (1995) como uma sequência, mas também com implicações recíprocas e interrelacionadas. As sete propriedades são descritas e refinadas a partir da literatura sobre criação do sentido, especialmente sobre o artigo de Porac et al. (1989), e será aqui utilizado para exemplificar cada uma das propriedades. Deve-se salientar que este autor propôs uma taxonomia para a abordagem ainda em 1988. O autor sugere que esta estrutura sirva mais como um material para ‘imaginação 26 disciplinada’ do pesquisador do que proposições para serem testadas. As sete propriedades do sensemaking são: a) Construção da identidade Esta propriedade da criação do sentido envolve o entendimento da identidade não como uma entidade fixa, mas como uma construção realizada no processo de interação. Quando há mudança no processo de interação, ocorre mudança na definição do eu. Assim, o criador de sentido está em processo de contínua redefinição, ao mesmo tempo que apresenta algum eu para os outros e tenta decidir qual deles é mais apropriado. Weick (1995) utiliza os estudos de Erez e Earley (1993) sobre a Teoria da Auto-Representação Cultural em que o autoconceito é um agente de sua própria criação. Nesta Teoria há três necessidades autorderivadas: (a) manter um estado cognitivo e afetivo positivo sobre o eu, (b) desejo de perceber a si mesmo como competente e eficaz e (c) desejo de sentir e experienciar coerência e continuidade. O processo de criar sentido tem uma forte influência sobre a maneira com que os indivíduos, dentro das organizações, começam os processos de transação com outros para clarificar a própria identidade e da organização. Weick (1995) adapta os trabalhos de Steele (1988), Ring e Van de Ven (1989), Chatman et al., (1986), Louis (1980), Duton e Dukerich (1991), Erez e Earley (1993) para a propriedade da construção da identidade e identifica alguns pontos importantes: - criar sentido é ativado pelo fracasso de confirmar o próprio eu; - criar sentido ocorre a serviço de manter uma autoconcepção consistente; - as pessoas aprendem sobre suas identidades projetando-as no ambiente e observando as consequências; - as pessoas compartilham e reagem ao ambiente simultaneamente, em uma mistura complexa de pró-ação e reação,um jogo de forças comum na criação de sentido; - as pessoas estão mais preocupadas consigo próprias do que com os acontecimentos externos, mas também interessadas com as conseqüências que esses acontecimentos pode vir a ter sobre elas; - quantos mais eus a pessoa tem acesso, mais sentidos pode criar. Há duas entidades: uma individual como si-mesma e uma individual como representação da coletividade. Assim, o indivíduo não fala em nome da organização, mas, quando incorpora os valores, crenças e objetivos da coletividade, o comportamento individual é mais macro do que usualmente reconhecemos. As pessoas simultaneamente formam e reagem ao ambiente, isto é uma mistura complexa de ação e reação como lugar comum na criação de sentido. Finalmente a idéia de que criar sentido é auto-referencial, sugere que o eu, mais que o ambiente pode ser o texto com necessidade de interpretação. Criar sentido é auto-referencial, o eu mais que o ambiente é o texto para interpretação, o que equivale à máxima “conhece-te a ti mesmo”. O sentido que o sujeito dá ao que acontece ao seu redor depende que implicações esses eventos terão para o que ele será. O trabalho de Porac et al.(1989) investigou 17 empresas escocesas fabricantes de pulôveres com as seguintes questões sobre o modelo mental dos estrategistas: -Qual é a identidade consensual e crença causal construída por gestores para fazer sentido de transações dentro de seu ambiente competitivo? -Como as crenças relacionam-se as atividades estratégicas das empresas dentro do setor? 27 -Como as crenças se mantém e se alteram através do tempo? Eles encontraram que as crenças sobre a identidade da empresa é parte fundamental do modelo mental dos gestores, bem como as crenças compartilhadas definem as escolhas estratégicas a serem tomadas no espaço competitivo, onde cada estrategista procura descobrir quem eles estão se tornando neste espaço fluido. b) Retrospeto A questão do retrospeto foi estabelecida em Weick (1969). Como a percepção do mundo é de um mundo passado, uma vez que a memória é definida como a experiência do passado, então toda percepção é uma forma de memória. Weick (1995) embasa-se em Schutz (1967) para analisar a experiência vivida significativa. Por isto, (1) a criação de significado é um processo “atencional” para o que já ocorreu; (2) a atenção é direcionada para trás de um ponto específico no tempo (aqui e agora) e tudo o que ocorre no aqui e agora influenciará o que é descoberto quando as pessoas olham para trás (influenciados pelo contexto situacional) (3) porque o que será interpretado é somente uma memória, qualquer coisa que afete a lembrança afetará o sentido dessas memórias (4) uma ação somente se torna objeto de atenção depois que ela ocorreu, em outros termos, o estímulo somente é conhecido depois da resposta Para a clarificação desta propriedade, volta-se aos escritos de 1969 para explicações sobre as experiências em termos de pura duração (experiencing) e episódios específicos (experiences). A consciência das ações somente ocorre depois que elas tenham sido completadas e nunca durante a ação (acting), pois a consciência é sobre os processos sensórios e não sobre os processos motores (MEAD, 1956). Weick (1995) procura clarificar com a metáfora do cone de luz (item 1 deste estudo). Não há pragmatismo no estudo da propriedade retrospectiva da criação do sentido, pois cada experiência será reconstruída em uma história diferente dependendo do seu resultado mais ou menos favorável e dos interesses e projetos do ator no aqui e agora. É importante lembrar ainda que: (a) o aspecto retrospetivo pode envolver tempo relativamente curto entre ação e reflexão, (b) através da retrospeção o passado pode clarear, mas não o faz transparente e (c) um dos objetivos de criar sentido é a busca do sentimento de ordem, claridade e racionalidade, ou seja, quando esse sentimento é atingido o processo retrospectivo para. No estudo de Porac et al.(1989), na região escocesa de Hawick, os pulôveres são feitos à mão pois se acredita que tal decisão estratégica traga maior qualidade ao produto. Weick (1995) questiona o quanto o motivo do produto ser feito à mão é por realmente fornecer alta qualidade ao produto, quando comparado com produtos industrializados de fabricação mais barata, ou porque o motivo é que sempre foi feito assim? c) Decretos sobre ambientes sensíveis A palavra utilizada por Weick (1995) é enactment para preservar o fato que na vida organizacional as pessoas produzem parte do ambiente que elas encontram. Gestores constroem realidade a partir dos atos de autoridade ou dos decretos em que limitam, rotulam e categorizam aspectos do ambiente. O decreto é uma lei, um limite que o legislador escolhe. Na prática não há muita diferença entre 399, 400 ou 401 chamadas telefônicas, mas ao impor um valor (400) o decretante estará deixando vários insatisfeitos. Por isto o decreto em si pode levar ao fracasso do ‘decretante’, porque os ambientes que sofrerão o decreto não são únicos, monolíticos, fixos, imparciais para as pessoas. As pessoas são muito mais uma parte de seus próprios ambientes. As pessoas são ativas no ambiente. 28 Os atores organizacionais agem e acabam por condicionar as ações no ambiente por eles criado através de restrições e oportunidades. O autor se embasa em Follet (1924) que entendia que as pessoas recebem estímulos em função de sua própria atividade no ambiente. Causa e efeito se confundem em sujeito e objeto e são somente descrições de momentos em um processo. Quando as pessoas categorizam, elas agem como se existisse algo fora para ser descoberto, como uma ordem externa e factual que faz sentido. É a partir dessa propriedade que a teoria institucionalista pode ser ligada à abordagem da criação do sentido. O processo de entender emerge a partir da necessidade dos indivíduos de construir uma ordem factual externa ou reconhecer que há uma realidade externa em seu relacionamento social. As pessoas agem na medida em que suas características de realismo começam a aparecer para elas. A construção social passa a ser institucionalizada a partir do momento que toma uma forma de uma realidade objetiva específica com regras e ações rotineiras. (Ring e Van de Ven, 1989) Essa institucionalização da construção social dentro da maneira como as coisas são feitas e a transmissão desses produtos liga a criação do sentido com a teoria institucional (Weick, 1995). No trabalho de Porac et al. (1989) Weick destaca que a crença na identidade e sobre como gerenciar o negócio afeta suas escolhas estratégicas como por exemplo a crença em utilizar agentes que vendem roupas masculinas clássicas o que faz a informação do mercado seja altamente filtrada, sendo que tais agentes são como se fossem os donos da marca Hawick. d) Social Criar sentido é um processo individual e social, pois ambos são seus aspectos essenciais. A conduta individual é contingenciada pela conduta de outros, uma vez que esses outros podem ser imaginados ou estar fisicamente presentes. Para esta propriedade, o embasamento de estrutura coletiva de Allport está presente no entendimento de como o pensamento, o sentimento e o comportamento do individuo são influenciados pela presença do outro, seja ela real, imaginada ou insinuada. E ainda, que as decisões trarão implicações em termos de entendimento, efeitos ou aprovação dos outros. A criação do sentido nunca é solitária, porque o que a pessoa faz internamente é contingenciada por outros, pois até mesmo os monólogos e comunicações solitárias presumem uma audiência. O ser humano é essencialmente social, pois as idéias e pensamentos são criados no contexto de interação com outros e são comunicados ao grupo social, que se viáveis, podem tornar-se parte da cultura. Kahlbaugh 1993 Interessa ao pesquisador de criação do sentido as formas de fala, discurso e conversa porque é como o contato social é mediado. A literatura corrobora isto em Shotter (1993), March e Olsen (1976), Gron (1983), uma vez que palavras induzem a conexões estáveis, podendo estabelecer entidades para as quais as pessoas se orientam, união em tornos de projetos e informação significativa (Weick, 1985). O aspecto social da criação de sentido é mais do que compartilhar entendimento, uma vez que o aspecto social é considerado uma cola que mantém as pessoas juntas. Porac et al. (1989) estudou comunidades cognitivas, observou-se que os gestores comunicam-se frequentemente de maneira formal e informal, além de haver imitação direta ou indireta entre as empresas. Através desse modelo mental passa a ocorrer a convergência de combinação de criação e imitação pulverizadas em redes de competidores, fornecedores e competidores onde a intersubjetividade, a subjetividade genérica e o nível de análise cultural tem lugar (WEICK, 1995). 29 e) Contínuo/Processo A criação do sentido nunca começa e nem nunca pára, uma vez que as pessoas estão sempre no meio de coisas. O começo ocorre a partir da focalização do passado por alguma pessoa a partir de algum ponto. È através do entendimento desses fluxos constantes que o criador de sentido se encontra no meio de situações complexas e transitórias que tenta lidar. Quando se está no meio de um processo é impossível evitar agir, voltar as ações e refletir sobre elas, não se sabe dos efeitos da ação, não se tem representação estável da situação, toda representação é interpretação e linguagem é ação.(idéias de Heidegger) O contexto de gestão consiste no fluxo de ações e palavras em uma organização que é pontuada por eventos como lançamentos, planejamento estratégico, orçamento. Eles focalizam e cristalizam significado nas organizações. Podem ser eventos com alguma significância, servem para criar novas histórias. Promover ações futuras, anunciar novos começos, marcos e fins, desencadear mudanças em curso, reafirmar identidades individual e organizacional. = Eccles e Nohria 1992 Se uma pessoa esta no meio de um projeto então a pessoa vê no mundo aspectos que lembram o projeto. A realidade do fluxo torna-se mais aparente quando o fluxo é interrompido. Uma interrupção de um fluxo induz a uma resposta emocional que vai influenciar na criação do sentido. Os fluxos dos processos são objetos para interrupção, nos quais a criação do sentido está fusionada com sentimento. (Weick, 1995). A literatura que Weick (1995) se embasou para a construção desta propriedade foi: Dilthey e Heidegger entendidos por Rickmann (1976), Katz e Kahn (1966), Langer (1989), Cohen, March e Olsen (1972), Starbuck (1983), Ecles e Nohria (1992), Berscheid e Mandler (1984), Berscheid, Gangestad e Kilaskowki, (1983). A emoção aparece no intervalo de tempo em que uma sequência organizada é interrompida e o momento em que tal interrupção é removida ou a resposta substituta encontrada que permite com que a sequência seja completada. Quando a primeira interrupção ocorre, há um esforço redobrado para completar a sequência original. Se há muitas maneiras diferentes em que uma interrupção pode ser completada, então o interesse não é para construir muito mais. Isto sugere que generalistas, como as pessoas que são hábeis para improvisar, deveriam demonstrar menos comportamento emocional e menos emoções extremas nessas situações, pois possuem mais comportamentos substitutos que mais rapidamente podem organizar a sequência interrompida. Neste sentido, é mais fácil interromper planos mais pervasivos do que planos ordenados por leis ou legislados. Quando ocorre a interrupção de um fluxo nas organizações, os locais que são mais frouxamente acoplados deveria ser locais em que a interrupção no projeto provoca menos emoção porque as interrupções são menos disruptivas (quebra). Locais em que os planos são pouco desenvolvidos deveriam se menos interruptivos e exibir menos emoção, uma vez que os processos não possuem sequência de respostas tão bem estruturada. Isto é sobre a frequência da emoção e não sobre o tipo de emoção que ocorre. Emoções negativas ocorrem quando uma sequência de comportamento organizado é interrompida inesperadamente e esta interrupção é interpretada como prejudicial. Emoções positivas são associadas com remoção repentina de obstáculos de estímulos interruptores, por exemplo quando um colega chato é transferido, o telefone está desconectado, ocorre um feriado, entre outros. Ou ainda, quando eventos repentinos e inesperados aceleram a finalização do plano. Por exemplo, quando m artigo é submetido a um periódico e o primeiro rascunho é aceito para publicação há uma interrupção inesperada dos planos de muitas e severas revisões, tal interrupção gera uma emoção positiva. Também no contexto do relacionamento com outras pessoas as 30 emoções positivas podem ocorrer quando o outro remove estímulos interruptores para finalização de um plano, ou ainda quando o outro ajuda a completar planos que a pessoa sozinha não poderia completar. Se a interrupção pode ser sanada, ocorre uma experiência de alívio, se a interrupção foi frustrada, passa de raiva a fúria ou mesmo uma irritação. Essas emoções afetam a criação de sentido porque lembram uma emoção congruente. As pessoas lembram eventos como o mesmo tom emocional do que o atual. Quando o sentimento é de raiva na interrupção do processo, encoraja lembranças em que o mesmo sentimento de raiva foi dominante. Logo, nesses momentos de raiva quando as pessoas olham para eventos passados e descobrem experiências de eventos similares, os prévios eventos podem sugerir algo sobre o significado dos eventos presentes. Eventos passados são reconstruídos no presente como explanações, não porque eles olham o mesmo, mas porque sentem o mesmo. Como resultado é usado uma memória baseada em sentimentos para resolver um quebra cabeça que faz a criação de sentido mais difícil porque tenta juntar duas formas diferentes de evidência. É isto precisamente que possibilita observar porque a criação de sentido está em processo, nunca começa e nunca termina por inteiro. No trabalho de Porac et al. (1989) a questão do fluxo aparece em alguns aspectos organizacionais como na fábrica em si e na rede de transações. As questões sobre emoção não se sobressaíram, talvez porque interrupções são raras. A relação com os agentes de mercado trazem agressividade ao seu preço, mas sua interrupção poderia ser devastadora devido à inércia do mercado. f) Pistas As pessoas veem mais facilmente produtos que processos. Para neutralizar essa tendência, é preciso ver como as pessoas desafiam os paradoxos, dilemas e eventos inconcebíveis e também a maneira como as pessoas percebem, extraem pistas e anunciam o que elas extraíram. Pistas são estruturas familiares como sementes, a partir das quais as pessoas desenvolvem um amplo sentido do que pode estar ocorrendo. Uma pista (uma parte) é considerada equivalente ao todo do qual ela pertence. Por exemplo, em uma indústria têxtil um pedaço de tecido mostra-se desbotado. Esta pista pode mostrar que a tinta estava quimicamente instável e que todo o tecido estava desbotado. A extração de pistas sugere uma conseqüência mais óbvia que era sugerida pelos dados totais originais. Assim, um pedaço de tecido desbotado sugere que a roupa ficou um curto espaço de tempo no processo previsto, o que não poderia ter sido observado na mera inspeção da roupa em si. Extrair pista a partir de um pedaço, uma parte do todo, mostra uma implicação que era invisível e indefinida. Esta propriedade está embasada em Miller (1978); Bartlett (1932); Bruner, (1973); Swann (1984); James, (1950); Smircich e Morgan (1982); Shooter (1983); Cyert e March (1963); Milliken, (1988); Goffmann, (1974); Ring e Van de Ven (1989); Starbuck e Milliken, (1988); Fiske e Taylor (1991); Kiesler e sproull (1982); Leiter (1980); Salancik e Pfeffer (1978); Mailloux (1990). Um exemplo de extração de pistas é o da profecia autor-realizável em que uma pista extraída é usada para predizer a natureza do referenciado a partir do que ela foi extraída. Quando a pessoa atua com segurança, como se houvesse uma referência maleável das características inferidas a partir das pistas, a referência é frequentemente compartilhada em direções consistentes com a profecia. Mas a profecia, em si, é também ajustada. Cada elemento, da profecia e das referências, é informado e ajustado para emergir imagens de outros, resultando que quase 31 nenhum antigo ponto da referência fará um novo começo. Isto estimula uma estrutura cognitiva que leva as pessoas a agirem com mais intensidade, a qual cria uma ordem material no lugar de uma ordem presumida (WEICK, 1983). Essa sequência lembra o fluxo de eventos freqüentemente descritos como a profecia auto-realizável. O autor cita como exemplo a história do soldado lituano que se perdeu de sua tropa em meio a selva gelada dos Alpes. Por dois dias nevou e quando ele pensou ter sido despachado sua própria tropa para morrer, esta o reencontrou no terceiro dia. Como eles tinham encontrado sua direção? Eles também haviam se considerados perdidos e esperando o fim, quando um dos soldados encontrou um mapa em seu bolso. Isto acalmou a todos. Lançaram-se a campo depois da tempestade de neve, e com o mapa descobriram sua orientação. O lituano pegou emprestado o mapa e descobriu, para sua surpresa, que o mapa não era dos Alpes, mas dos Pirineus. [Incidente preservado no poema de Holub (1977)] Os soldados encontraram a saída a partir de um velho mapa porque eles estavam ativos, eles tinham um propósito e eles tinham uma imagem de onde estavam e onde deveriam estar. Eles continuaram se movendo, informando pistas e atualizando seus sentidos para onde eles estavam. Como resultado um mapa imperfeito provou ser o suficiente. As pistas que eles extraíram e mantiveram atuando na fé entre a indeterminação e ambientar a criação de sentido em movimento. Uma vez que o ambiente está em movimento, a criação de sentido tende a confirmar a fé através de seus efeitos sobre as ações que fazem material o que previamente tem sido meramente visualizado. Extraindo pistas simples, estruturas familiares como sementes é que as pessoas desenvolvem um sentido amplo para o que pode estar ocorrendo. A metáfora da semente captura a incerteza (vagueness) e indeterminação da criação de sentido. “Elas formam pontos de referência ou núcleos a partir dos quais as idéias podem ser conectadas em redes de significado”(CHOO, 2003, p. 127). Assim, uma pessoa começa a agir (enctment/criação), gera resultados tangíveis (pistas) no mesmo contexto (social) e ajuda a descobrir (retrospecto) o que está ocorrendo (processo) que precisa ser explicado (plausabilidade) e o que deverá ser feito (mudança/incremento de identidade). Gestores esquecem que é isto e não o que planejam que explicam o seu sucesso. Eles dão crédito ao plano, o que é um erro, gastam mais tempo planejando e menos tempo agindo. No trabalho de Porac et al. (1989) as pistas são reunidas dentro de um modelo mental, que precisam de um contexto para fazer sentido. Neste trabalho, aparecem quatro fontes de pistas aos gestores: a partir dos agentes de venda (direta ou indiretamente), pistas do mercado a partir dos consultores, o que ouvem nas visitas as lojas e feiras, no encontro entre as empresas descobrem o que está acontecendo. E ainda, pistas são enviadas quando algum dos competidores muda de estratégia e começa a agir diferente. g) Aceitabilidade em detrimento da precisão A abordagem da criação do sentido invoca uma ontologia realista – algo fora pode ser registrado e sentido detalhadamente e uma ontologia idealista – sugestão que algo de fora precisa ser combinado de maneira aceitável. Por isso, a precisão é boa, mas não é necessária. Para essa propriedade, a lógica dedutiva em que o ator organizacional vai na direção, ou no mínimo de informação consensual, a partir de idéias que provém alguma certeza faz mais sentido. Neste caso, a razão não é necessariamente correta, mas ela se ajusta aos fatos, embora às vezes imperfeitos, assim como a razão é baseada em informações incompletas (Embasado em Isenberg 1986). Na prática, uma coisa que um executivo não precisa é uma percepção totalmente 32 acurada, precisa. Ver no quadro 3 alguns motivos para a precisão ser secundária na abordagem da criação do sentido. Quando o gestor segue percepções não precisas, ou mesmo comete um erro de percepção, isto pode ser benéfico para superar tendências inerciais e perseguir os objetivos em ambientes avaliados com total objetividade. Esta propriedade está embasada em Starbuck e Milliken (1988); Sutcliffe (1994); Bruner (1973); Swann (1984); Brunsson (1982); Taylor (1989); Gagliardi (1990). 1 2 3 4 5 6 7 Fonte Precisão é secundário na criação de sentido É preciso distorcer e filtrar sinais da torrente de projetos se Miller, 1978 elas não são massacradas com dados. Como os objetos tem muitos significados e significâncias, Bartlett, 1932 seguir muitas pistas pode não ser profícuo, pois a precisão perde o sentido quando significa algo do passado. Ocorre um trade-off entre velocidade e precisão, sendo a Bruner, velocidade eleita pelos gestores, pois é preciso habilidade 1973, para usar poucas pistas em categorizações de eventos. Precisão responde a questões especificas e não gerais e não Swann 1984 há tempo para isto. Precisão faz mais sentido ao investigar percepções de objeto do que percepções interpessoais, porque a tradução do significado da percepção interpessoal é melhor modelo que a percepção do objeto. Precisão é um projeto específico e pragmático (instrumentalidade), enquanto que a capacidade para ação afeta a crença do que pode ser feito, o que se acredita ser a conseqüência da ação é o que faz sentido Percepções detalhadas tem o poder para imobilizar. Pessoas Brunsson que querem agir tendem a simplificar em vez de elaborar. 1982 Quadro 3: Motivos para a precisão ser secundária na abordagem da criação do sentido Fonte: Embasado em Weick (1995) Enfim, algo que um executivo não necessita é uma percepção totalmente acurada, precisa. Ações deliberadas e detalhadas não tem mais seu lugar no tempo de rapidez (embasado em Starbuck e Milliken, 1988). Mesmo que precisão não seja necessária na criação do sentido, é preciso preservar a coerência, uma vez que algo que é razoável, incorpora a experiência passada e a experiência, pode ser construído retrospectivamente, que captura o sentimento e a idéia, ajusta exceções, é divertido para construir, ou seja, o que é necessário é uma boa história para proporcionar a aceitabilidade que propicia a ação. O mundo pósmoderno entendeu que políticas e interpretações necessitam ser precisas, tornando-se uma obsessão, muito mais ajudas são armadilha simbólicas da criação de sentido como mitos, metáforas, fábulas e paradigmas (Gagliardi, 1990). Muito mais do que fábulas e mitos que são sem contexto e impessoais, uma boa história dispara elementos que energizam e guiam a ação, aceitabilidade através do sentido retrospectivo que as pessoas criam e engajam as pessoas a contribuir para a criação geral do sentido. O estudo de Porac et al. (1989) mostra que a escolha estratégica das empresas de Hawick, na escolha de agentes de vendas, restringe muito as informações do mercado sobre preferências dos consumidores e estrutura competitiva no setor. Resulta em feedbacks filtrados e relativamente uniformes. Como as empresas constituem um oligopólio cognitivo elas trocam 33 informações que criam sentido para elas, nessas transações extraem pistas e encorajam ações coordenadas aceitáveis e conhecidas. 2.1.5 Fontes da abordagem do sensemaking A abordagem da criação do sentido organizacional foi estabelecida no livro de 1995. Por isso, Weick oferece uma cronologia histórica dos trabalhos que fundamentaram o conceito. Observa-se que, além da literatura citada pelo autor no livro Sensemaking in Organizations (Quadro 3), muitos outros autores foram por ele referenciados em seus trabalhos. No caso dessa abordagem, as fontes são consideradas pelo autor como diversas e específicas e cada contexto de trabalho enriquece o outro. Das 55 obras citadas pelo autor, observa-se que oito delas são de pesquisadores de outras disciplinas, tais como filosofia ou psicologia (seminais) e os 47 restantes trabalham com o tema das organizações. Destes, 21, ou seja 38% são pesquisas embasados nos conceitos de Weick (Quadro 4). James, 1950 Thomas e Thomas, 1928 Mead, 1954 Roethlisberger e Dickson, 1939 Barnard, 1938 Weber, 1947 Selznick 1949 Jaques, 1951 Deutsch e Gerard, 1955 Boulding 1956 Festinger, 1957 March e Simon, 1958 Dalton 1959 Thompson e Tudden,1959 Burns e Stalker, 1961 Bittner, 1965 Katz e Kahn, 1966 Garfinkel, 1967 Schutz, 1967 Berger e Luckman, 1967 Weick, 1969 Blumer, 1969 Steinbruner 1974 Staw, 1975 March e Olsen, 1976 Giddens, 1976 Bougon, Weick e Binkhorst, 1977 Salancik e Pfeffer, 1978 Pondy, 1978 Brown, 1978 Assunto Seletividade Subjetividade e grupos Interação Pessoas e o trabalho Organizações controladas Estrutura das organizações Institucionalização Cultura organizacional Grupos Teoria dos sistemas Dissonância Cognitiva Adaptação organizacional Aprendizagem organizacional Tomada de decisão Inovação organizacional Conceito organizacional Psicologia da organização Interações Atenção e experiência Construção social Epistemologia evolucionária Interacionismo simbólico Cibernética/grupos Grupos nas organizações Decisões organizacionais Estruturas sociais Cognição organizacional Processo de informação Liderança Socialização organizacional Organiz. Filosofia Psicologia Psicologia Sim Sim Sim Sim Sim Psicologia Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sociologia Psicologia Sim Sim Psicologia Psicologia Sim Sim Sim Sim sim Sim Sim Pesq. Criação Sentido Sim 34 Daft e Wiginton, 1979 Ranson et al, 1980 Louis, 1980 Pfeffer, 1981 Kiesler e Sproull, 1982 Meyer, 1982a Martin et al.,1983 Putnam, 1983 Daft e Weick, 1984 Smircich e Stubart, 1985 Mintzberg e McHugh, 1985 Barley, 1986 Daft e Lengel, 1986 Dutton e Jackson, 1987 Starbuck e Milliken, 1988 Porac et al, 1989 Feldman, 1989 Isabella, 1990 Dutton e Dukerich, 1991 Gioia e Chittipeddi, 1991 Gioia, 1992 Pentland, 1992 Weick, 1993b Elsbach, 1994 Linguagem e organização Estrutura organizacional Novatos e sensemaking Ação administrativa Resposta organizacional Adaptação ao ambiente Histórias organizacionais Estrutura social organizacional Aprendizagem organizacional Estratégia organizacional Estratégia organizacional Relacionamento e tecnologia Design organizacional Estratégia organizacional Cognição executivos Cognição executivos Cognição na organização Mudança organizacional Identidade organizacional Mudança estratégica Desastre organizacional Sensemaking de consumidores Desastre Organizacional Institucionalização e sensemaking Quadro 4: Fontes para a abordagem da criação do sentido Fonte: Embasado em Weick (1995) Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Ao observar o Quadro 4, é possível perceber a crescente literatura interessada no entendimento dos processos de criação do sentido propostos por Weick que trataram dos mais diversos temas sobre as organizações. Tal aspecto corrobora a importância do significado do conteúdo, mais do que o conteúdo em si, uma vez que conteúdo é embebido em pistas, estruturas e conexão que são material para a criação de sentido. Observa-se neste trabalho de Weick (1995) um salto em termos de taxonomias, abrangência e importância do conceito voltado para a teoria das organizações quando comparado com seu livro de 1969. Observa-se que, nesta edição, o autor fez um esforço de compilar escritos que diversos pesquisadores fizeram a partir de sua abordagem, bem como reuniu ideias de autores exteriores ao entendimento da criação de sentido e ainda utilizou literatura anterior ao seu volume de 1969 para fortalecer a sua abordagem. O amadurecimento da abordagem é considerado pelas pesquisas realizadas após 1995, em que trouxe uma miríade de temas, abrangência (ANDERSON, 2006) e potencialidade. Observa-se que a literatura ficou muito mais dispersa e flexível e porque “nenhuma das teorias das organizações caracterizam o paradigma do sensemaking” (WEICK, 1995, p.69). 35 Quanto a essa questão, o autor responde a uma crítica que Burrel e Morgan (1979) fazem aos teóricos que tentam utilizar as idéias da hermenêutica, fenomenologia e interacionismo simbólico, os quais enfatizam alta subjetividade e negam a existência de estruturas sociais e de realidades sociais concretas, mas que, ao operacionalizar suas idéias caem na armadilha de uma ‘oscilação ontológica’. Por isso, considera que os decretos (enactive) são importantes para mostrar um limite tangível sobre a expectativa das pessoas. Como explicação à sua necessidade de uma continência, ou seja, em uma estrutura própria do funcionalismo, o próprio Weick (1995) critica a rigidez com que os paradigmas de Burrel e Morgan (1979) foram desenhados e alega que, se as pessoas têm múltiplas identidades, não podem ser puristas ontológicos. Diante disso, Weick mostra que tem um affair com o funcionalismo, no sentido da necessidade de certo estruturalismo. Coerente com essa visão, Machado-da-Silva et al., (2005, p.24) consideram o trabalho de Weick como multiparadigmático. Várias pesquisas foram realizadas embasadas total ou parcialmente na abordagem da criação de sentido de Weick. Sua teoria não somente é base para programas de pesquisa em estudos organizacionais, como também fornece insights para gestores do mundo todo (SUTCLIFFE et al., 2006). A tradicional revista Organization Studies publicou em 2006 um capítulo especial em homenagem a Weick com o título “Making Sense of Organizing: in Honor of Karl Weick”. Neste capítulo, Marc H. Anderson pesquisou a influência do livro de 1969 de Weick através do número de citações dessa obra no âmbito europeu e americano. Em comparação das citações desse livro com outros estudos organizacionais clássicos, encontrou sua grande influência. Dentre as citações, os temas de maior influência (aproximadamente 70%) são enactment e equívoco. Encontrou ainda, que nos estudos americanos, há maior interesse na diferenciação entre organizing e organization enquanto que nos estudos europeus aparece mais questões referentes às perspectivas de processo e interpretativas (ANDERSON, 2006). Gioia (2006) escreve um artigo na edição especial acima citada, e defende que Weick mudou o nível de conversação sobre a maneira de pensar, falar e agir da teoria organizacional, devido aos termos complexos e profundos, bem como trouxe sofisticação ao campo das teorias organizacionais.. “A conversação muda quando você enfatiza verbos e gerúndios” e isso é uma das razões porque, quando se tem uma visão ‘Weickiana’, as coisas são vistas diferentemente (GIOIA, 2006, p. 1711). Para este autor, Weick deixa como legado muitos insights e entendimentos a cada releitura de seus textos. 36 Existem inúmeras pesquisas aplicadas nos melhores periódicos internacionais que trazem diferentes aspectos da criação de sentido (ANDERSON, 2006). Em pesquisa na Base de Dados EBSCOHost ao solicitar a palavra Weick contendo no Abstract dos artigos aparecem 272 trabalhos que utilizaram os escritos de Weick como seu autor seminal. Quando se solicita artigos nesta mesma Base com a mesma palavra de busca, mas estando citada no corpo do artigo, aparecem 4.873 resultados. Em revisão à posição do conceito da criação do sentido, Weick, Sutcliffe, Obstfeld (2005) concluem, através do estudo de diversos trabalhos que tratam sobre o assunto, que algumas características da criação de sentido tem sido explicadas, mas negligenciadas, algumas tem sido assumidas, mas não explicadas, algumas tem mudado o significado através do tempo e algumas aparecem equivocadas. O objetivo dos autores é fazer um levantamento do conceito da criação de sentido, o qual materializa um significado central em teoria organizacional que reúne identidade e ação. O artigo faz um apanhado deste conceito através do tempo, inicialmente relatando um incidente profissional de uma enfermeira pediátrica, em seguida é discutida a evolução do conceito de criação do sentido intraorganizacional, promoção, plausibilidade e identidade. Para eles, criar sentido é um processo significante de organização em que se desenrola uma sequência em que as pessoas se envolvem com identidade no contexto social de outros atores engajados na circunstância do processo, onde ocorre extração de pistas, onde ocorre uma reflexão retrospetiva, plausível, enquanto agem mais ou menos dentro das circunstâncias do processo. Neste artigo, a natureza da criação de sentido organizacional é subdividida entre a visão descritiva, a visão conceitual e a visão prospectiva. Na visão descritiva, a busca da criação de sentido inicia compreendendo a história que está se desenrolando através da resposta à questão: Como algo se tornou um acontecimento para os membros da organização? Esta pergunta evoca a seguinte questão: O que significa esse acontecimento? Essa questão remete à importância do significado no fluxo dentro da existência, em uma busca retrospetiva para organizar, em meio a uma sequência indiferenciada de impressões. Portanto, respondendo a questão “qual é a história?” traz o acontecimento à existência e a questão “o que devo fazer?” traz sentido à essa existência através de pensar uma ação para o futuro, continuam a agir e se envolvem no constante fluxo de experiência. 37 Na visão conceitual, os processos de mudança, criação, seleção e retenção são incrementados a partir dos estudos de 1969. No novo entendimento, o relacionamento recíproco entre mudança ecológica e criação sofre a constante influência das atualizações do processo, como novidades indesejadas que causam discrepâncias, ocasionado mudança no fluxo das situações. O número de possíveis sentidos reduz a carga sobre o processo de seleção através da atenção retrospetiva, modelos mentais e articulação do resultado reduzindo a imobilização e trazendo aceitabilidade para a história. Na visão prospetiva, futuras direções para a pesquisa da criação do sentido são estabelecidas, em temas a serem mais bem explorados como instituições, distribuição do “sensemaking”, poder e emoção. Outro aspecto da abordagem que deverá ser cada vez mais aprofundado será a Gestão da Incerteza. 2.1.6 Organizações de Alta Confiabilidade (OAC) As OAC distinguem-se das outras organizações por apresentar características como a interligação de diferentes processos e tecnologias em um sistema sensível a qualquer erro, o que pode ocasionar consequências desastrosas, pois uma pequena falha em um local, pode tornar-se grande em outro e quanto mais complexa for a interdependência mais difícil será de controlar o problema, por isso podem ser chamados de acidentes normais (ROBERTS; BEA, 2001). Se é certo que tais organizações são mais suscetíveis a problemas, como preveni-los? Cada ver mais o mundo estará dependente das OAC, tais como plantas nucleares, vôos espaciais, maior controle do tráfego aéreo, indústrias químicas, redes elétricas, de computadores e telecomunicações, redes financeiras, engenharia genética, armazenamento de resíduos nucleares entre outros. Como gerenciar organizações neste nível de complexidade de maneira eficiente? Para Roberts e Bea (2001b) a confiabilidade requer constante atenção aos processos como comportamentos intragrupais, intergrupais, comunicações; ou seja, atenção aos detalhes, treinamento constante para a vigilância integral. “Eficiência é obtida através de decisão racional, confiabilidade é obtida através de intuição treinada e análises em profundidade” (ROBERTS; BEA, 2001b, p. 181). Perrow (1999) sugere aspectos organizacionais para reduzir vulnerabilidades da infraestrutura, pois nenhum sistema organizacional é perfeito ou invulnerável. O planejamento das ações envolve expectativas que são representantes da ordem e da rotina, os quais as OACs 38 não podem prescindir, mas a realidades destas organizações podem surgir diferente das expectativas imaginadas e das experiências, representantes da desordem e do inesperado (BALOGUM; JOHNSON, 2005; WEICK; WESTLEY, 1996). Quando ocorre essa quebra da expectativa nos processos, as rotinas e padrões são enfrentadas como momentos problemáticos de interrupção na operação processual que precisa ser reparada através da escolha de uma solução de problemas, entretanto o processo continua vulnerável à outra interrupção (WEICK, 1995). Para Weick, Sutcliffe, Obstfeld (1999) as OACs são formas organizacionais precursoras de adaptação em um ambiente cada vez mais complexo. Para esses autores, as OACs são ambientes em que imperam a incerteza e um aparente exotismo, mas fornecem a infra-estrutura cognitiva que permite a aprendizagem adaptativa simultânea e desempenho confiável (p. 81). Essas organizações são especialistas em tomar rápidas decisões com base em dados imperfeitos e sabem abandonar rotinas em favor da improvisação (WALLER; ROBERTS, 2003, p. 813). Apesar dos erros poderem gerar conseqüências catastróficas, eles podem ser evitados nas OACs (ROBERTS, 2005), pois a confiabilidade é tão importante quanto os resultados dessas organizações (ROBERTS et al., 1994). Não se pode esquecer que as OACs, em sua maioria, possuem uma base tecnológica complexa (ROBERTS, 2005). Apesar disso, o que foi inicialmente um interesse exótico por compreender as OACs tornou-se um movimento interdisciplinar de livros, congressos, cursos, conferências, revistas (CZARNIAWSKA, 2007). Karl Weick tem chamado a atenção para o fato de que as falhas na atenção são fontes de acidentes (PERROW, 2009). Em 2007, foi lançada a segunda edição do livro Managing the Unexpected: Resilient Performance in an Age of Uncertainty de Weick e Sutcliffe (2007). Nele os autores analisam salas de emergência em hospitais, controle de aeronaves e operações de bombeiros como modelos a serem seguidos. Essas organizações desenvolveram modelos de agir e estilos de aprender que faz com que gerenciem melhor o inesperado que outras organizações. Este livro apresenta um viés aplicado, uma vez que cada vez mais o inesperado está presente na vida diária das pessoas, como furacões, enchentes ou araques terroristas, ou de formas mais sutis como pequenos lapsos nas organizações, ou pequenos eventos que levam a uma crise. Weick e Sutcliffe (2001, 2007) consideram que as organizações que precisam alta performance em indústria/setores em que pequenas falhas provocam graves efeitos, tais como em sistemas de controle aéreo, emergência médica ou negociação com reféns. Estas organizações “não têm escolha” a não ser funcionar de maneira altamente confiável. Para isso, existem 39 algumas práticas, que promovem um ambiente de confiabilidade, passíveis de aprendizagem, que ocorrem com essas organizações (Figura 7). Características das HRO Descrição Preocupação com o fracasso Não subestimam pequenas falhas e as entendem como um sintoma de que algo está errado, tentando compreender o sistema atualmente (dinâmica organizacional). Relutância em aceitar HRO sabem que o mundo é complexo, instável, desconhecido e simplificações imprevisível. Não subestimam a complexidade e tentam compreender os diversos aspectos implicados em cada situação. Como? Promovendo debate com pessoas de diferentes pontos de vista, sem destruir as diversidades. Mais visão com menor simplificação. Sensibilidade para as operações Importância às operações de como o trabalho é realizado – entender que os eventos são situacionais (dinâmicos) e que existem ‘falhas latentes’ no operacional. Compromisso com a resiliência Entendem que nenhum sistema é perfeito. Resiliência é uma combinação de pequenos erros e soluções improvisadas que fazem o sistema funcionar. Para isso é preciso o trabalho de experts, pessoas com experiência, habilidade de recombinação e treinamento em pessoas com características de serem mentalmente estimulantes. Consideração à perícia Migração da hierarquia/liderança para pessoas com maior expertise na área, conforme a situação. Decisões são tomadas na linha de frente, por pessoas com condições de resolver a situação e não necessariamente obedece a hierarquia. Figura 7: Características das práticas verificadas nas OAC’s Fonte: WEICK e SUTCLIFFE, 2001 Roberts e Bea (2001a) evidenciam que o aprendizado com as OAC podem ser espraiados à prática dos executivos e as lições podem ser aplicadas às organizações. 2.2. LUHMANN Nessa seção serão apresentadas as ideias do pensamento de Niklas Luhmann como uma visão global do pensamento do autor, necessitando de maiores aprofundamentos a ser realizado depois da Qualificação. A teoria de Niklas Luhmann incorpora conceitualizações da filosofia, sociologia, lógica formal, direito, teologia, biologia, física entre outras. Este intercâmbio ajudou a desenvolver uma teoria que oferece uma ampla variedade conceitual que permite dar conta de vários fenômenos sociais (RODRÍGUEZ e TORRES N., 2003). Na década de 1960, quando foi estudar na Harvard com Talcott Parsons, Luhmann percebeu que a compreensão da sociedade como um sistema dos sistemas era insatisfatória. Para Parsons, a sociedade era entendida como resultado de padrões 40 comportamentais produzidos em um sistema de interação de atores individuais, ou seja, compreendia um equilíbrio entre o controle dos impulsos individuais pela padronização cultural e a autonomia dos agentes (RIBEIRO, 2006). Niklas Luhmann é conhecido por sua teoria sobre os sistemas sociais ou ainda sobre a Nova Teoria dos Sistemas em que buscou formular uma teoria geral da sociedade, tentando superar a estreiteza da conexão entre o micro e o macro, o que o levou a analisar cada contato social como um sistema (NEVES, 1997). A teoria luhminniana pode ser considerada tendo duas partes: a primeira de 1960 a meados de 1980 sua teoria era considerada funcional-estrutural (parecida com ideia de Parsons) onde procurava estabelecer a diferença entre sistema e ambiente, em que através de um mecanismo de seleção o sistema procurava reduzir a complexidade. Na segunda parte de sua teoria adaptou os conceitos de autopoiese dos cientistas chilenos Maturana e Varela em que substitui a teoria dos sistemas abertos pela teoria dos sistemas autopoiéticos. Assim, o sistema social passa a ser visto como fechado, autoreferenciado, poiético, segundo o qual é possível analisar a sociedade moderna (NEVES, 1997). Sistemas autopoiéticos para Luhmann são sistemas que se realizam graças a uma reprodução recursiva de seus elementos como unidades autônomas. Conforme Luhmann (1995) autopoiéticos são os tipos de unidades que produzem e reproduzem os elementos dos quais estão constituídos. Todos esses elementos utilizam como unidade (elementos, processos, estruturas, de si mesmos) e devem ser produzidos mediante essas mesmas unidades. Mesmo que haja relações com o entorno, elas se situam em um nível de realidade diferente do nível da autopoiesis (RODRÍGUEZ e TORRES N., 2003). Sistemas autopoiéticos são, nas palavras de Luhmann (1997b, p. 53) “sistemas que precisam produzir, eles próprios, todas as unidades que necessitam para a continuidade de suas operações”. A comunicação é vista como uma realidade independente e sui generis, que emerge de um sistema operacionalmente fechado. Somente a comunicação pode comunicar, pois não existe comunicação entre os sistemas, como por exemplo, não existe comunicação de consciência a consciência (não é possível pensar o pensamento de outra pessoa) e nem entre o indivíduo e a sociedade (RODRÍGUEZ e TORRES N., 2003). Mas, se “todos os sistemas de comunicação estão acoplados a processos de consciência” (LUHMANN, 1997b, p.67) é porque a comunicação necessita da consciência, “mas não significa que eventos de consciência (percepções e 41 pensamentos) como tal, possam ser elementos de comunicação”, pois o sistema de comunicação permanece um sistema referencial operacionalmente fechado (LUHMANN, 1997b, p.67). “À sociedade pertence apenas aquilo que no processo de comunicação é tratado como comunicação” (LUHMANN, 1997b, p.70) que acontecem como referência recursiva a outras comunicações. Portanto, Luhmann (1997b) não nega o indivíduo, nem a sua existência corpórea e psíquica, nem seu comportamento perceptível, mas considera que estes e todos os aspectos que não são entendidos como comunicação permanecem como ambiente do sistema. Conforme Luhmann (1997b), esta visão ‘anti-humanista’ lhe rendeu críticas, especialmente de Jürgen Habermas sobre o ‘valor’ da vida humana. Mas, para Luhmann (1997b), a resposta a tais críticas é que a teoria dos sistemas não está fixada em um objeto especial, mas na diferença entre o sistema e o ambiente. Assim, o ser humano, para a teoria luhminniana é referência externa e não mais na ótica do sujeito/objeto, a qual defende que precisa ser abdicada. A seguinte citação é esclarecedora desta questão: “Para a teoria da sociedade, o ser humano é o outro lado [objeto], e na sociedade e em suas comunicações, ele está continuamente presente através da diferenciação entre autorreferência e referência externa” (LUHMANN, 1997b, p.71) Portanto, a autorrenfencialidade é a sociedade e qualquer referência ao ser humano deve ser entendida como referência externa. Luhmann (1997b) destaca que também podem ser observados como sistemas, o sistema psíquico, cérebros, células, sistemas imunológicos etc, dos seres humanos como “sistemas-no-seu-ambiente”. Segundo Fedozzi (1997b), Luhmann realiza uma crítica radical aos clássicos e as teorias da ação, as quais são construídas sobre uma teoria de indivíduo antropológico e pouco preciso. Por isso, três obstáculos epistemológicos precisam estar superados: (a) o preconceito humanista: pressupõe que a sociedade é constituída de pessoas ou de relações entre as pessoas; mas Luhmann vê as pessoas concretas como “parte” dos diferentes sistemas sociais, como a economia, política, ciência, direito (NEVES, 1997b); (b) preconceito das unidades ou fronteiras territoriais e/ou políticas: as fronteiras estão sendo diluídas, existe, na modernidade, diferença na sociedade e não entre as sociedades; (c) o preconceito da objetividade do social: crítica à separação entre sujeito/objeto, pensamento/existência ou conhecimento/objeto equivale à 42 diferenciação entre autoreferência e referência externa. Portanto, a comunicação para Luhmann é um conceito inovador entendida como produto dos sistemas sociais enquanto operação reprodutora desses mesmos sistemas, não como pessoas, nem como papel, nem como ação, mas como comunicação, que se condicionam reciprocamente (FEDOZZI, 1997b). A insatisfação de Luhmann, com o pensamento de Parsons, resultou do entendimento de que a teoria não poderia enfrentar o problema dos sistemas de sentido, os quais traziam maior complexidade. Percebeu avanços no paradigma da autorreferência e na compreensão da autoorganização e toma emprestado o termo de Maturana da autopoiesis para o entendimento da teoria dos sistemas sociais (RODRÍGUEZ; TORRES N., 2003). Para Luhmann, sistemas autopoiéticos são considerados “sistemas que produzem e reproduzem os próprios elementos, dos quais eles se compõem através dos elementos, dos quais, até então, eles compunham” (FLICKINGER; NEUSER, 1994, p.77). A autopoiese para Luhmann é baseada em acontecimentos, pois a desintegração da continuidade (diferente do conceito de homeostase) é condição para a manutenção do sistema através dos pensamentos e comunicação que buscam uma conexão de sentido (p. 79), por isso para que o sistema se mantenha, ele deve sempre criar algo novo internamente, que é a ‘capacidade de replicação das estruturas’ por meio da linguagem (p.80). Portanto, para a autopoiese em Luhmann, existem perturbações no sistema que devem ser eliminadas pelo sistema auto-organizado. “Luhmann se concentra no ‘interior’ do sistema. Maturana, por sua vez, nas condições do meio ambiente e seu significado para o sistema” (FLICKINGER; NEUSER, 1994, p.82). Assim, para Maturana, a origem da vida refere-se ao processo de clausura de certas proteínas e, para Luhmann o processo de socialização (humanização) foi possível graças a uma rede fechada de comunicação. A rede de comunicação abriga tudo o que se refere à rede de comunicação de sentido (RODRÍGUEZ; TORRES N., 2003). Assim como a origem da vida tem a ver com o processo de clausura de certas proteínas, assim, na proposta de Luhmann, aquele que foi designado como processo de humanização (socialização) foi possível graças ao surgimento de uma forma emergente, uma rede fechada (autopoietica) de comunicação (LUHMANN, 1995, p.122) que se tornou a humanidade. Os seres humanos não são os criadores do processo de civilização, mas são dependentes desta rede emergente de ordem superior, submetidos às suas condições para poder contatar outros seres humanos. 43 É importante frisar que, para Luhmann, não são os seres humanos os criadores da civilização, o que lhe rendeu várias críticas como já visto, mas eles são dependentes da rede de comunicação que é de ordem superior (denominada de sociedade) dentro da qual existem os contatos com outros seres humanos. Esta rede de comunicação de ordem superior é o que denominamos sociedade. O social não surge do homem. Consiste em uma solução evolutiva que precede os sujeitos e que provê estruturas de sentido que se impõe à tendência radical de desintegração (LUHMANN, 1995, p. 122). Assim, para Luhmann os sistemas autopoiéticos são aplicados aos sistemas vivos, neuronais, as consciências e aos sistemas sociais, pois são realizadas graças a uma reprodução recursiva de seus elementos como unidades autônomas. Portanto, o social não é constituído por seres humanos, mas pela comunicação que não depende nem é resultado da ação do ser humano, mas existe por si mesma, pois não é possível haver comunicação de consciência a consciência, nem entre o indivíduo e a sociedade. Portanto, a sociedade é autônoma não somente no plano estrutural, mas no plano do controle da organização de suas estruturas (RODRÍGUEZ; TORRES N., 2003). Luhmann (1996a) entende as organizações como um sistema social. O principal componente que distingue as organizações de outros sistemas sociais é a comunicação das decisões, ou seja, “a produção das decisões através da comunicação” (p.345). Por isso, organizações são sistemas sociais baseados em comunicação, que precisam ser interpretadas como decisões sobre incertezas. As incertezas (autogeradas) acabam por “irritar” o sistema até serem transformadas em uma certeza autogerada que é a produção da informação. Portanto, a realidade é construída através da produção e reprodução de decisões significativas em constante referência entre o aspecto interno e o externo do sistema. Assim, a “decisão em si representa a auto-observação do sistema, mas o conteúdo da decisão reconhece fatos ambientais” ou externos (LUHMANN, 1996a, p.345). São as fronteiras permeáveis do sistema da organização que promovem a sua adaptação ao ambiente através da autotransformação. Um dos pontos essenciais na teoria de Luhmann é a complexidade da sociedade moderna, a qual necessita teorias com novos paradigmas para conseguir compreendê-la (NEVES, 2007). Complexidade refere-se a elemento e relação: com o aumento de elementos que devem permanecer unidos no sistema, crescem a possibilidade de relações, fazendo com que o sistema 44 precise selecionar a forma como deve relacionar tais elementos (LUHMANN, 2010). Por complexo se designa “a soma de elementos que em razão de uma limitação imanente de uma capacidade de conexão do sistema, já não possibilita que cada elemento permaneça sempre vinculado” (LUHMANN, 2010, p. 184). Por isso, a complexidade obriga à seleção que situa e qualifica os elementos (contingência) que significa risco (NEVES; NEVES, 2006). A questão do acoplamento é estudada por Weick (1985), que conclui que sistemas acoplados com certa amplitude são mais estáveis do que aqueles com acoplamento mais estrito (tight coupling), ou seja, sistemas perfeitos não existem, conclusões estas que não trazem algo novo para a teoria da complexidade, segundo Luhmann (2010). Já a Teoria da Racionalidade Limitada de Simon (1957) refere-se à gradação de níveis de complexidade, como incrementar complexidade no sistema e como este pode continuar operando como, por exemplo, a evolução e o planejamento de uma organização (LUHMANN, 2010). Luhmann identifica, na confiança, a possibilidade de gerenciar a complexidade das sociedades modernas (GILBERT, 1998), pois pode ser um elemento de redução da complexidade (LUHMANN, 1996b). Para Luhmann (1996b), a confiança é instituidora da vida social, pois sem ela o ser humano ficaria imobilizado e a partir da qual são derivadas as regras e conduta apropriada. O mundo com que o ser humano se depara é demasiado complexo e as respostas do homem objetivam lidar e enfrentar esta complexidade. A complexidade é natural ao mundo social, mas a confiança fornece uma base para que aumente as possibilidades de experiência e de ação neste mundo, mesmo que corra o risco de aumentar a complexidade, ainda assim fornece uma estrutura que faz com que seja reduzida a complexidade. A familiaridade e a confiança são formas complementares para absorver a complexidade e estão unidas do mesmo modo que o passado com o futuro. Assim, “mostrar confiança é antecipar o futuro” (LUHMANN, 1996b, p.15), pois a confiança somente pode manter-se no presente, pois o futuro representa “uma carga excessiva para a habilidade de representação do homem”, por isso tenta simplificá-lo e assim reduzir a sua complexidade, através de uma tentativa de projetar o futuro, de garanti-lo. A noção de tempo tem para Luhmann importância fundamental no entendimento da confiança, pois o passado é complexidade já reduzida, uma vez que tornou o complexo em 45 familiar. A complexidade do mundo futuro, por sua vez, se reduz por meio do ato da confiança de que o futuro se assemelhe com o presente. Assim, a confiança possui, para Luhmann (1996), uma natureza instável, formada por três componentes principais: (a) enquadramento em uma ordem externa mais complexa, (b) necessidade de aprender e (c) o controle simbólico. A confiança está associada com a redução e a compreensão da complexidade resultante das ações das outras pessoas. Portanto, a confiança é a expectativa generalizada que o outro gerenciará sua liberdade, seu potencial perturbador de ação adversa, mantendo sua personalidade socialmente visível (p. 65-66), portanto todo o problema da confiança gira em torno da interação e a forma com que se apresenta é o meio pelo qual as decisões ocorrem. Outra importante característica da teoria de Luhmann (1996b) é a intersubjetividade, uma vez que é através dela que o sentido é organizado para fazer frente às condições complexas. A capacidade de confiança varia de acordo de como o sentido e o mundo estão constituídos intersubjetivamente. Ocorre que tal constituição não é consciente e racional, por isso a familiaridade é simples, porém frágil, por isso, ao mesmo tempo em que abriga expectativas confiáveis, contém algum risco. Assim, para a familiaridade, o passado prevalece sobre o presente e o futuro, por isso a complexidade passa a ser reduzida, por isso a história é a forma mais importante de reduzir a complexidade. Se há confiança que comportamentos familiares (do passado) permanecerão, há a solução de um problema social: a exclusão da expectativa da ação inesperada. Por isso a confiança somente é possível em um mundo familiar, pois precisa da história como um pano de fundo confiável. Quando os fatos mostram que esta expectativa não é realizada, levanta-se a confiança nos sistemas sociais que estão embasados na constituição intersubjetiva, sobressaindo-se de uma confiança puramente interpessoal para uma confiança no sistema que implica renunciar a maiores informações, bem como a controle dos resultados. A confiança no sistema não se refere somente a sistemas sociais, mas a outras pessoas vistas como sistemas pessoais. A troca da confiança interpessoal para a confiança no sistema são definidas em termos emocionais, mais do que em termos de apresentação (LUHMANN, 1996 b). 2.3 RELACIONANDO WEICK E LUHMANN Ao relacionar o pensamento de autores como Weick (1973, 1995) e Luhmann (1996a,1996b, 1997a, 1997b, 2010) percebem-se algumas similaridades e algumas dissonâncias. 46 Como similaridades, pode-se observar que a problematização do tempo é significativa para suas respectivas teorias. Enquanto Luhmann preocupa-se com o tempo no futuro através do estudo da confiança como expectativas, Weick o estuda no passado sobre os efeitos nas memórias de eventos passados para construir sentido sobre o entendimento da experiência vivida. Para Luhmann (1996b) o futuro contém muito mais possibilidades do que as que poderiam acontecer no presente, e do presente transformar-se em passado. Para reduzir a complexidade do futuro deve ‘podar’ o futuro de modo que se assemelhe com o presente através da interpretação e estruturação da experiência 25. Já para Weick (1973) a compreensão sobre o passado muda em cada momento, dependendo do tipo específico de atenção que o ego lhe outorga em cada momento. Outra questão abordada por ambos é a questão da complexidade. Para Luhmann (1996), a dimensão social da existência humana aumenta o potencial de complexidade. A familiaridade e a confiança são formas complementares para absorver a complexidade e estão unidas do mesmo modo que o passado com o futuro. Para Weick (1973), as pessoas buscam construir sentido de eventos inesperados a partir da tentativa de diminuir parte da ambiguidade da informação. Ambiguidade é o excesso de significado quando se tenta construir sentido sobre um evento inesperado ou situação complexa, ou seja, procura-se criar sentido em um mundo repleto de complexidade. Observa-se que ambos utilizam conceitos da cibernética de segunda ordem, em Weick através dos trabalhos de Maruyama (1963) onde compreende a capacidade de auto-organização do sistema de modo que o organismo pudesse se adaptar às condições do contexto para sobreviver, através de uma retroalimentação positiva (GRANDESSO, 2000). Termos e aspectos apropriados para a Teoria dos Sistemas, aproveitados por Weick no entendimento da interrelação entre os processos evolutivos. Luhmann (2010) entende que a cibernética de segunda ordem auxilia na observação do sistema enquanto sistema de observação. Outro ponto comum em ambas as teorias é a base do entendimento evolucionista, pois Weick entende os processos organizacionais para diminuição da ambiguidade (criação, seleção e retenção), os quais são incitados por uma ‘mudança ecológica’, enquanto Luhmann acredita que os sistemas precisam evoluir sob pena de sua extinção através da autopoiesis. Um ponto polêmico no encontro entre as duas teorias é a visão da importância delegada ao homem enquanto indivíduo independente e com capacidade de modificar o seu meio. Weick 47 entende que o homem cria o ambiente ao qual o sistema depois se adapta e é esse ambiente criado que é trabalhado pelos processos da organização (WEICK, 1973). Nesse sentido, pode-se observar que, para Weick, o homem tem a capacidade de criar o ambiente e o sistema deve posteriormente se adaptar a este ambiente (criado pelo homem), enquanto para Luhmann, o indivíduo é entendido como um sistema dentro de outro sistema. Para Weick, cabe aos processos (criação, seleção e retenção) afastar o excesso de ambiguidade da informação. Pergunta-se se o conceito de processos que buscam afastar a ambiguidade para Weick não pode ser entendido como um sistema que busca diminuir a complexidade (na lógica de Luhmann)? Observa-se que Weick considera o aspecto cognitivo do ator/pessoa como elemento do ambiente criado, como por exemplo através da memória, percepções de si e do outro, etc. Esse ponto pode ser marcado como distinto entre as duas teorias, pois isto faz com que se entenda a “organização [como] mutável porque sofre influência das ações de seus membros, por intermédio dos sentidos que esses produzem continuamente na resolução de situações complexas” (BORGES; GONÇALO, 2009b). Mas, para Weick, a cognição tenta entender e fazer sentido da ação, ou seja, existe um elemento não volitivo na ação constituída intersubjetivamente, parecido com o pensamento de Luhmann em que a ação acontece através da comunicação no sistema social. Talvez esse entendimento pode aproximar o pensamento de ambos os autores. Para Luhmann o que liga os diversos sistemas é a comunicação, portanto o homem pode ser entendido como referência externa ao sistema social. Por isso, entende-se que as duas teorias podem ser complementares, uma vez que a pragmática coletiva, ou seja, os elementos sociais possuem grande repercussão sobre o indivíduo em Weick e em Luhmann as ações acontecem por meio da comunicação entre os sistemas dentro do sistema. Para ambas as teorias a comunicação mostra-se ponto em comum e necessária para o entendimento da ação, principalmente quando se estuda as OACs. Conforme Barbara Czarniawska (2005) a teoria dos sistemas abertos tornou-se o sustentáculo da análise organizacional, mas na visão de Weick e Sandelands (1990) permaneceu subdesenvolvido. Weick desenvolveu o tema através da utilização de conceitos relacionados à autopoiética, autoregulação, mas admite que autores como Luhmann (1990) e Maruyama (1974) trouxeram desenvolvimento ao campo do estudo dos sistemas (CZARNIAWSKA, 2005) Diante disso, propõe-se uma tentativa de avanço teórico a partir da investigação empírica destas duas teorias. 48 3. METODOLOGIA Esta seção está dividida da seguinte maneira: primeiramente será apresentada a proposta da metodologia, em seguida aprofundar-se-á na abordagem da Análise da Conversa, em seguida nas narrativas e por fim, apresentar-se-á um artigo publicado que teve o objetivo inicial de investigar parte do framework desta proposta no campo empírico, o qual serviu como um teste de pesquisa (pesquisa exploratória inicial). Para Meredith (1993) o ciclo normal da pesquisa, a descrição, a explanação e o teste da pesquisa devem estar em contínua interação, não sendo um processo linear. Meredith (1993) chama a atenção para a característica do framework em cada pesquisa, indicando a importância do seu poder explanatório. Esta proposta de pesquisa delimita-se a partir das ciências sociais a partir de estudos empíricos que pretendem compreender aspectos do mundo social das organizações (STABLEIN, 2001). Para esta proposta, pretende-se compreender o processo de eventos inesperados a partir da ótica de Karl Weick com o avanço teórico do entendimento de Niklas Luhmann. Para isto, pretende-se realizar uma pesquisa de caráter exploratório, de cunho qualitativo, devido ao grau de complexidade interna que o objetivo sugere, bem como por ser fenômenos específicos e delimitáveis (MINAYO & SANCHES, 1993). Os fenômenos serão específicos e delimitáveis, pois partir-se-á da ocorrência de eventos inesperados em instituições consideradas OACs, para a partir disso, verificar a interrelação entre os construtos da pesquisa especificados na Introdução. Para se atingir aos objetivos da pesquisa, propõe-se as seguintes etapas desta pesquisa: 49 Figura 10: Descrição das etapas da pesquisa Fonte: Embasado em Collis & Hussey (2005) A estratégia de investigação proposta neste projeto é o estudo de casos. O tipo de pesquisa a ser escolhida está diretamente relacionado com o tipo de questão de pesquisa proposto. Neste caso, o tipo de questão de pesquisa proposta é complexo e para responder à questão, é preciso um estudo profundo das evidências coletadas a partir do framework de investigação (MALHOTRA, 2001). Conforme Yin (2001), o estudo de caso permite uma investigação em que são preservadas as características holísticas e significativas dos eventos e dos processos organizacionais. O estudo de caso a que esta proposta se refere, compreende o entendimento do contexto de cada instituição a ser estudada, bem como a escolha e análise de três eventos inesperados em cada uma delas. Pretende-se investigar as seguintes instituições consideradas OAC devido ao alto risco humano e financeiro que sua atividade lida diariamente: Centro de Operações do Sistema (COS) no setor elétrico do Rio Grande do Sul e sistema de atendimento pré-hospitalar móvel (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – SAMU) em uma cidade da grande Porto Alegre. 50 No setor energético de eletricidade pretende-se pesquisar eventos inesperados que ocorreram no Centro de Operações do Sistema (COS), responsável pelo controle de geração e transmissão elétrica do Rio Grande do Sul, que tem uma população com mais de mais de 11 milhões de habitantes. Este contexto empírico de pesquisa do setor elétrico caracteriza-se como um ambiente que trabalha sob constante pressão e vigilância, em que pequenas falhas podem gerar grandes consequências. Mais especificamente, o problema de pesquisa é suscitado a partir do aumento da ocorrência de crises que elevam a complexidade ambiental em que as organizações, e especialmente as Organizações de Alta Confiabilidade (WEICK e SUTCLIFFE, 2001), se deparam diariamente (BORGES; GONÇALO, 2010a). Nesta instituição, pretende-se analisar três eventos considerados inesperados, onde analisar-se-á as narrativas dos eventos, e a fala-eminteração no momento do evento através da análise da gravação dos diversos telefonemas realizados durante o acontecimento selecionado. Além disso, pretende-se realizar pesquisas em profundidade e semi-estruturadas com os funcionários de diferentes níveis hierárquicos daquela instituição. No setor da saúde, pretende-se estudar um sistema de atendimento pré-hospitalar móvel (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – SAMU) em uma cidade da grande Porto Alegre. O SAMU consiste de um serviço de assistência, padronizado nacionalmente, que opera através de uma central de regulação que recebe telefonema e que possui uma regulação regionalizada, hierarquizada e descentralizada (MINAYO; DESLANDES, 2008). As equipes de socorro são compostas segundo o grau de complexidade, conforme o tipo de unidades móveis, suas atribuições e recursos. As vítimas telefonam para a SAMU (linha 192) que dispõe de ferramentas operacionais (mapas, pontos de apoio das unidades básicas, entre outros) e objetivam oferecer suporte imediato (20 minutos) a vítima para que minimize as sequelas (MINAYO; DESLANDES, 2008). Neste contexto, pretende-se realizar um estudo de caso, aprofundando-se em três eventos considerados inesperados, através da análise da gravação do telefonema, bem como da narrativa dos participantes no evento e entrevistas em profundidade e semi-estruturadas com os funcionários de diferentes níveis hierárquicos dessa instituição. Como o framework proposto entende a comunicação como a base dos sistemas sociais, a metodologia desta proposta busca uma profunda compreensão da comunicação que ocorre nestes eventos inesperados. Para isto, propõe-se a utilização da abordagem metodológica da Análise da 51 Conversa, para analisar as falas-em-interação gravadas no momento dos eventos inesperados, bem como a utilização da técnica das narrativas, além de técnicas de pesquisa mais utilizadas como entrevistas em profundidade, entrevistas semi-estruturadas e observação. 3.1 ANÁLISE DA CONVERSA2 Os pesquisadores organizacionais sentem uma constante inquietação relacionada a novos métodos que auxiliem na compreensão da complexidade dos ambientes organizacionais, especialmente no que tange à abrangência das interações e discursos organizacionais (COOREN, 2006). A Análise da Conversa, doravante denominada AC, é o estudo da fala, ou seja, é análise sistemática da conversa produzida em situações diárias da interação humana no processo denominado de fala-em-interação (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). A conversação através das formas da fala, discurso e conversa ocorrida na empresa, interessa aos estudos organizacionais, pois sua análise revela como o contato social é mediado (WEICK, 1995). A fala que interessa à AC é aquela que ocorre naturalmente, sem ser produzida em um laboratório, pois objetiva descobrir como o participante entende e responde ao outro em seu turno de fala, com o foco central nas seqüências de ações que são geradas (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). Portanto, na busca por novas maneiras de compreensão da complexidade organizacional, a AC mostra-se um importante ferramental que pode auxiliar a aumentar esta compreensão. Apesar de seu uso ser considerado limitado nos estudos organizacionais, observa-se que trabalhos que utilizam esta metodologia nos estudos organizacionais tem aumentado (NIELSEN, 2009). A Análise da Conversa iniciou seu desenvolvimento há 40 anos. Seu objetivo é descrever as competências e procedimentos envolvidos na produção dos diversos tipos de interações sociais (ARMINEN, 1999). Segundo Stephen Levinson (1983), a AC tem sua origem na Etnometodologia, movimento que estuda os métodos étnicos (dos próprios participantes) de produção e interpretação da interação social. A Escola da Etnometodologia foi fundada por Harold Garfinkel (1967) e lida com a questão de como as pessoas produzem a realidade social no processo interativo e através deste. Realidade social pode ser aqui entendida como produzida localmente (‘aqui e agora’ no curso da ação), endogenamente (no interior da situação), audiovisualmente e na interação pelos participantes(FLICK, 2004). Portanto, a Etnometodologia 52 reespecifica a ordem social como fenômeno construído nas ações ordinárias e cotidianas dos membros do grupo social, reconhecendo a identificação destas ações com o seu contexto social (McCLEARY, 2009). A preocupação central dessa abordagem é o estudo dos métodos empregados por membros na produção da realidade da vida cotidiana. O programa de pesquisa etnometodológica é caracterizado pelo interesse nas atividades cotidianas, na sua execução e na constituição de um contexto de interação, localmente orientado no qual se realizam as atividades. Em geral, o programa de pesquisa etnometodológica é realizado nas pesquisas empíricas da Análise da Conversa (FLICK, 2004). O precursor da AC é Harvey Sacks (1935 – 1975), cientista do departamento de sociologia da Universidade da Califórnia primeiramente e depois de Irvine, entre 1964 e 1972. Para ele, a fala-em-interação é sistematicamente organizada e profundamente ordenada; sua produção é metódica e finalmente a análise deve ser baseada em dados que ocorreram naturalmente (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). O objeto de análise da AC é a fala na interação social e os dados são dessas interações naturalísticas gravadas em tape e/ou vídeo, que enfatizam o papel social da interação como uma realidade autônoma sui generis (ARMINEN, 1999). A fala que interessa à AC é aquela que ocorre naturalmente, sem ser produzida em um laboratório, pois objetiva descobrir como o participante entende e responde ao outro em seu turno de fala, com o foco central nas seqüências de ações que são geradas (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). O foco da análise da conversa não é o significado subjetivo para os participantes, mas a forma como essa interação é organizada. O tópico de pesquisa é o estudo da vida cotidiana, por isso é crucial o papel do contexto em que as interações ocorrem. Cada evento de fala-eminteração apresenta esforços de produção dos membros ali mesmo, ou seja, das contribuições conversacionais dos membros. Enfim, a Etnometodologia preocupa-se com a descrição dos métodos dos membros, em vez de suas perspectivas, a fim de descrever o processo em estudo a partir de dentro (FLICK, 2004). Na AC, a fala das pessoas é estudada per se, e não seus pensamentos, emoções, atitudes, crenças ou experiências de vida, os quais são assumidos como subjacentes à fala e que podem ser expressos por meio dela. A Análise da Conversa trata da fala como uma forma de ação social, 53 como uma forma de fazer coisas no mundo (OSTERMANN, 2006 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007, CLIFTON, 2006). Portanto, a fala pode ser compreendida como ação social tangibilizada na interação, por isso "o foco de atenção não é a linguagem na condição de um sistema abstrato de regras, mas a linguagem é tomada como meio para interação" (p.246), por isso é importante estudar as falas nas práticas sociais, pois clareia ao pesquisador o que as pessoas fazem de fato (PASSUELO e OSTERMANN, 2007). AC é a análise sistemática da conversa produzida em situações diárias da interação humana, denominada de fala em interação (talk-in-interaction), que ocorrem naturalmente, sem a interferência do pesquisador. O foco da AC é na seqüência, pois através do curso da conversa em interação os falantes dispõem, na próxima seqüência de turno, um entendimento do que era o primeiro turno (ver Exemplo de Interação1). A ferramenta básica da AC é o next-turn proof procedure, ou seja, o próximo turno pode ter uma seqüência desejada ou indesejada, conforme o que o falante anterior disse. São as propriedades ordinárias da fala (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). Para a AC, segundo Hutchby & Wooffitt (1998), os turnos de fala não são serialmente ordenados, ou seja, cada interagente fala na sua vez, mas sequencialmente ordenados. Existem maneiras descritíveis de observar que os turnos são ligados em uma seqüência ordenada, através da: (i) next turn: local onde os participantes dispõe seu entendimento sobre o primeiro turno para possível compreensão. Os próprios participantes analisam o processo de produção da fala para negociar sua participação nela. (ii) content: o próximo falante de turno prioriza o conteúdo do turno, ou seja, a ação que tem sido designada para fazer. Além dessas maneiras de observar a ordem inferencial de fala, deve-se atentar para o tipo de cultura e recursos interpretativos dos participantes levam ao entendimento de maneiras diversas e próprias (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). Convencionalmente as interações ocorrem em pares, é a seqüência conversacional que ocorre através dos pares adjacentes. Nem sempre os pares adjacentes ocorrem de maneira uniforme e ideal, ou seja, nem sempre a primeira parte do par faz uma formulação reconhecível e a segunda parte produz um segundo par a partir do que reconheceu do primeiro par. Os pares adjacentes têm uma significância fundamental em AC: a questão de como o entendimento mútuo 54 é acompanhado e arranjado na fala. Os participantes podem usar o mecanismo de pares adjacentes para arranjar e/ou analisar o processo de entendimento e sensemaking da fala do outro. Os pares adjacentes constituem uma estrutura normativa de poder para avaliação de ações do interlocutor e motivos da produção da primeira parte. Isso mostra que a fala em interação é um problema de realização de ações, assim o fracasso na troca de turno já é um tipo de ação representativa (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). Vários conceitos foram sendo estabelecidos para o entendimento e análise dos dados transcritos tais como tomada de turno, par adjacente, preferência/despreferência, sequência lateral, reparo, abertura, pré-fechamento entre outros, os quais não são objetos do presente trabalho, mas que representam parte da riqueza analítica do pensamento de Harvey Sacks, o qual foi inspirado por Harold Garfinkel e seguido por Emmanuel Schegloff e Jail Jefferson a partir dos anos de 1970 (McCLEARY, 2009). Nos contextos institucionais, normalmente existe um script interiorizado de conversação natural. Porém, não basta a intuição em saber qual o comportamento mais adequado para cada contexto social, é preciso relatar o significado público que os participantes demonstram para os outros, sua orientação para o contexto e seu entendimento da relevância do contexto institucional de cada ação do outro (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). Nos contextos institucionais, os participantes cumprem a natureza disciplinada da conversação em si. A abordagem da Análise da Conversa trata do importante papel da fala na produção da vida social. Esses autores argumentam ainda que, segundo essa abordagem, a fala nos ambientes institucionais está envolvida no cumprimento da sua natureza institucional (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). A utilização da AC nos estudos organizacionais situa-se nos trabalhos que examinam os diferentes contextos institucionais. Nestes contextos, é exaltado o papel da fala na produção da vida social, pois a fala é sempre situada, seja em entrevistas de seleção, reuniões de negócios, reuniões entre supervisores e trabalhadores, orientador (a) e orientando (a), avaliações, venda de produtos através de call-centers, consultas médicas, comportamento de clientes em visita a museus, audiências do PROCON entre outras. Nos contextos institucionais, os participantes parecem se orientar por sistemas de falas, variando conforme a ocasião, grau de formalidade, entre outras. Nestes contextos institucionais, há uma redução ou sistematização das práticas disponíveis na conversação, de acordo com o papel institucional e com a maior ou menor formalidade do contexto (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998), por exemplo, espera-se um tipo de 55 comportamento de uma testemunha em um julgamento e outro tipo de comportamento em uma entrevista de seleção para emprego. Ambientes organizacionais são considerados contextos institucionais para a AC. Ora, se conversa é ação então "organizations are talk, and talk is organizations" (CLIFTON, 2006, p. 202). A utilização da AC nos estudos organizacionais está crescendo (NIELSEN, 2009; CLIFTON, 2006), e os estudos estão demonstrando diferentes aspectos que a AC pode contribuir nos estudos organizacionais. Segundo Baraldi e Gavioli (2007) a Análise da Conversa pode ser um bom ferramental de entendimento dos Sistemas Sociais, mesmo que à primeira vista haja algum estranhamento no uso da AC para abordagens macrossociológicas. Observa-se, porém que o método elaborado pela AC parece interessante para complementar uma teoria da sociedade, pois os sistemas sociais “são constituídos por uma série de eventos comunicativos e a sua parte visível são as sequências de ações” (BARALDI; GAVIOLI, 2007, p. 126) em que sua compreensão não é diretamente observável. Assim também a AC observa as interações como uma sequência de ações produzidas pelos interlocutores, convidando ao estudo dos detalhes destas sequências de ações e assim descrevendo a interação como um sistema social (BARALDI; GAVIOLI, 2007). 3.2 NARRATIVAS3 É no contexto organizacional que ocorrem os sistemas de relacionamentos, os quais podem explicitar o conteúdo e o processo através das narrativas de experiências pessoais (SNOWDEN, 2002; PETTIGREW, 1990). São as narrativas, consideradas essenciais na vida organizacional, de que trata a abordagem do Storytelling. A abordagem das narrativas ou storytelling tem sido utilizada no ambiente organizacional para diversos objetivos, entre eles: a propagação da estratégia; a análise da memória; a análise das normas, valores, cultura organizacional; transmissão de altos níveis de complexidade; promoção do aprendizado na gestão do conhecimento; catalisador dos sentimentos dos consumidores, e divulgação da mensagem estratégica (BOJE, 1995; GARGIULO, 2000; SWAP et al, 2001; SNOWDEN, 2002; ABMA, 2003; KÜPERS, 2005; ALLEN, 2005; DENNING, 2006; ADAMSON et al, 2006). Métodos históricos de análise organizacional devem ser reconhecidos, sob o risco de excluir condições antecedentes e dados retrospectivos como uma fonte pragmática do passado. A 56 abordagem de contar histórias vem ajudar a explicitar o contexto em que as ações estão ocorrendo à medida da seqüência de acontecimentos, resultados, ritmos, características próprias, onde tempo e história são aspectos centrais das análises dos processos (PETTIGREW, 1990). Através da abordagem metodológica da narração, o narrador pode revelar aspectos que não revelaria em uma entrevista, por exemplo, pois a narrativa apresenta certa independência ao narrador; através da narrativa há maior revelação do que as teorias que a pessoa carrega e ainda as pessoas expõe eventos da maneira como vivenciaram (FLICK, 2004). A narração pode ser utilizada não somente para a contação das histórias de vida, mas também para narração de episódios, adequados para o entendimento dos eventos inesperados nas organizações. Segundo Flick (2004) as experiências são armazenadas nas formas de conhecimento narrativo-episódico (vinculado a situações e circunstâncias concretas) e semântico (suposições e relações abstraídas das situações concretas). A narrativa episódica vincula os dois tipos. Estudos recentes vêm utilizando a abordagem do Storytelling para objetivos específicos. Observa-se que muitos destes estudos têm estimulando a utilização desta abordagem na compreensão do ambiente organizacional para identificar dimensões como transferência do conhecimento, conhecimento de clientes e/ou propagação da estratégia (ver quadro 1, a seguir). Dimensão Autor Educação Memória organizacional Paciente s cardíacos BARONE, 1992 BOJE, 1995 BERS et al, 1998 Storytelling como prática gerencial GARGIULO, 2000 Transferência conhecimento SWAP et al, 2001 de Complexidade SNOWDEN, 2002 Cultura BANKS- African Especificidades da abordagem Transformar a educação através de histórias honestas contadas pelos professores e ouvidas dos alunos. Análise da história de Tâmara Land para entender a Disney como organização. Utilização do Storytelling Agent Generation Environment (kit em base web para criação de histórias) para ajudar a jovens pacientes cardíacos a suportar a doença. Histórias podem ser usadas estrategicamente para estimular uma organização de muitas maneiras diferentes. Ajudam líderes a fazer uma leitura precisa de suas organizações para comunicar novas visões e missões aos empregados, propicia novas maneiras de pensar sobre suas organizações, assim como fornecem grandes insights e oportunidades. Histórias se originam dentro da organização e refletem suas normas, valores e cultura, através de elementos que identifiquem um padrão familiar na história, um arquétipo. É um importante meio de transferir conhecimento, pela riqueza de sua dimensão tácita. Modo de lidar com a transmissão de altos níveis de complexidade e transmitir formas densas de experiências de formas simples. Storytelling para capturar a tradição oral da cultura African 57 American WALLACE, 2002 ABMA, 2003 Aprendizado organizacional Conhecimento Lealdade consumidores KÜPERS, 2005 dos ALLEN, 2005 Construção de marca através do Storytelling SRINIVASAN , 2005 Disciplina narrativa empresarial DENNING, 2006 da Fonte de inspiração de mudanças corporativas ADAMSON et al, 2006 American. O aprendizado é facilitado através de workshops de Storytelling em cuidados paliativos, visto como um processo dialógico. Utilização da Storytelling na Gestão do Conhecimento, através de um framework fenomenológico que clarifica o status relacional entre conhecimento tácito, implícito e narrativo. Storytelling como catalisador para permitir aos consumidores acesso aos sentimentos, fundamentais para a sua lealdade. Uso do Storytelling como ferramenta para construção de uma marca através da identificação de uma core story que contenha valores da estratégia de diferenciação da marca através dos atributos dos produtos. Apresenta as características e elementos de boas histórias. Apresenta oito padrões de narrativas diferentes para redirecionar objetivos, inspirar marcas, compartilhar conhecimento, transmitir valores, diminuir rumores nefastos à organização, mostrar o futuro, etc. Ferramenta de estratégia corporativa para que o executivo principal possa inspirar os funcionários a mudanças vitais na estratégia, através de histórias estratégicas inspiradoras. Histórias tem o potencial para revitalizar os negócios. Divulgação da mensagem estratégica através de Storytelling, por meio de narrativas da história corporativa. Divulgação da MARZEK, mensagem 2007 estratégica Quadro 1: Características na utilização da abordagem de Storytelling Fonte: Dados desta pesquisa Dos autores que utilizaram a abordagem de Storytelling/Narrativas, citar-se-á os que mais interessam a esta proposta de pesquisa. Boje (1995) analisou a história de Tâmara Land para entender a Disney como organização, conceituando Storytelling organizacional como um sistema coletivo em que a performance das histórias é uma peça chave para fazer sentido (sense-making) e significado, por permitir um suplemento de memória individual com a memória institucional. Snowden (2002) preconiza que Storytelling pode ser um modo de lidar com a transmissão de altos níveis de complexidade e transmitir formas densas de experiências de modo simples. Histórias têm a habilidade de enviar em linguagens simbólicas uma grande quantidade de conhecimento ou informação de modo sucinto. Cada símbolo tem um significado diferente conforme a combinação de símbolos que o precedem. A habilidade para transmitir altos níveis de complexidade através de histórias contém quantidades elevadas de abstração através das 58 associações simbólicas na mente dos observadores quando ouvem as histórias. Isto desencadeia idéias, conceitos, valores e crenças nos níveis emocional e intelectual simultaneamente. Assim, Storytelling emerge como uma ferramenta organizacional capaz de estimular toda a organização, revelar seus valores, crenças e atitudes, agir como um catalisador para compreender a organização como um sistema de atividades que fazem sentido para todos (WEICK, 1973). 3.3 PESQUISA EXPLORATÓRIA INICIAL A seguir é apresentado o artigo “Aprendizagem através do sensemaking e da confiança: um estudo em um ambiente de eventos inesperados” de autoria da aluna e do professor Orientador, o qual foi apresentado no 3rd Latin and European Meeting on Organization Studies (LAEMOS) em Buenos Aires, abril de 2010. Este artigo é apresentado nesta seção a título de exemplificação da aplicabilidade empírica de parte do framework desta proposta, bem como da apresentação da abordagem metodológica da Análise da Conversa. Introdução Eventos inesperados transcendem a ordem das rotinas e do planejamento, entretanto quando ocorrem, demandam das organizações soluções tão eficientes e eficazes quanto àquelas previstas para eventos programados. No caso específico de organizações cuja característica de suas atividades envolvem se deparar constantemente com tais eventos, uma importante atividade gerencial é a criação de situações de aprendizado para capacitação de sua gestão na solução de problemas. Nestas organizações, quando as decisões não conseguem responder com eficácia frente aos eventos inesperados , as conseqüências geralmente são catastróficas, devido ao tipo de atividade de alto risco em que estão inseridas, tais como companhias de energia elétrica, energia nuclear, emergências de hospitais, torres de controle aéreo, times de bombeiros entre outros. Pesquisas sobre as organizações de alta confiabilidade (HRO) estão presentes nos estudos organizacionais, tratando de questões sobre acidentes e risco (PERROW, 1994; PERROW, 1999; PERROW, 2007; ROBERTS, 1990; STRAHLEN et al, 2008; WONG et al, 2005) tomadas de decisões (ROBERTS et al, 1994); falhas nos sistemas organizacionais (ROBERTS, BEA, 2001; SCHULMAN et al, 2004) entre outros temas. Em comum está o entendimento de que as HRO’s constroem maneiras mais eficazes de enfrentar eventos inesperados do que outras organizações. Diante de uma situação imprevisível, as pessoas responsáveis procuram compreender o problema a partir de elementos que façam sentido em suas estruturas de análise (sensemaking), levando em consideração as suas experiências e as interações com o grupo de trabalho, para, enfim, encontrar a decisão possível e eficaz. A compreensão do processo do sensemaking (WEICK, 1995) é crítico no enfrentamento de situações imprevisíveis, bem como a busca pela diminuição da complexidade através da 59 identificação de familiaridade na situação (LUHMANN, 1996) em prol do comportamento mais adequado para a situação no momento. Assim, o objetivo deste estudo é compreender a interrelação produzida entre os microprocessos que compõem o sensemaking (WEICK, 1995) e a construção da confiança (LUHMANN, 1996) presentes em eventos inesperados. Utilizou-se como objeto de estudo um evento inesperado no contexto organizacional de um Centro de Operações do Sistema Elétrico Brasileiro (COS) identificando suas características e repercussões de aprendizagem para a organização. Analisou-se desde o processo de reconhecimento do evento inesperado até a decisão escolhida. Este COS é responsável pelo controle de geração e transmissão elétrica de um importante estado brasileiro, que tem uma população com mais de mais de 11 milhões de habitantes. Este contexto empírico de pesquisa caracteriza-se como um ambiente que trabalha sob constante pressão e vigilância, em que pequenas falhas podem gerar grandes consequências. Mais especificamente, o problema de pesquisa é suscitado a partir do aumento da ocorrência de crises que elevam a complexidade ambiental em que as organizações, e especialmente as Organizações de Alta Confiabilidade (WEICK e SUTCLIFFE, 2001), se deparam diariamente. Para atingir ao objetivo, inicialmente será apresentado o referencial teórico sobre sensemaking, confiança e aprendizagem, em seguida será apresentado o contexto empírico e procedimentos metodológicos, acompanhados da análise dos dados, e finalizando com o framework teórico proposto. 2. Referencial Teórico 2.1 Sensemaking como ponto de partida Sensemaking é um conceito teórico que traz nova perspectiva para o entendimento das organizações (WEICK, 1995), pois consegue o intento de relacionar a ação com o contexto organizacional através do modo como pessoas criam sentido a partir de elementos da sua experiência, bem como do contexto cultural e discursivo em que estão inseridas naquele instante (BORGES e GONÇALO, 2009). Para Weick (1969, 1995, 2005), as organizações devem ser compreendidas como processos dinâmicos que sofrem continuamente a influência das ações de seus membros. Sensemaking é um processo cognitivo que os indivíduos e os grupos estão envolvidos na busca pela resolução de situações complexas através da diminuição da ambiguidade de eventos problemáticos nas organizações (organizing). Na verdade, sensemaking envolve o processo retrospectivo de imagens plausíveis que racionalizam o que as pessoas estão fazendo através do envolvimento da identidade no contexto social para extração de pistas que criam certa ordem nos eventos (WEICK, SUTCLIFFE E OBSTFELD, 2005). Para que esforços do sensemaking ocorram é preciso que algo aconteça diferente do esperado (WEICK, SUTCLIFFE OBSTFELD, 2005), tal como um fluxo de eventos que demonstra discrepância de sinais ou pistas e desajustamento das expectativas. Diante da surpresa, tenta-se lembrar de algo semelhante e não se encontrando nada iniciam-se especulações sobre o que está ocorrendo. Surgem então hipóteses que as pessoas começam a discutir, pois os contatos são cruciais na construção e percepção do problema que evolvem identidade ou reputação (WEICK, 1995; BORGES E GONÇALO, 2009, P. 186). Portanto, circunstâncias inesperadas que quebram a rotina organizacional são compreendidas explicitamente em palavras que refletem ações e escolhas, as quais precedem objetivos e planos (ANDERSON, 2006; WEICK, SUTCLIFFE OBSTFELD, 2005). Assim, as expectativas (representantes da ordem e da rotina) apresentam-se diferentes das experiências (as quais referem-se à desordem e ao inesperado) (BALOGUM e JOHNSON, 2005; WEICK e WESTLEY, 1996). Quando ocorre essa quebra da expectativa nos processos, as rotinas e padrões são enfrentadas como momentos problemáticos de interrupção na operação processual que precisa ser reparada através da escolha de uma solução de problemas, entretanto o processo continua vulnerável à outra interrupção (WEICK, 1995). 60 As High Reliability Organizations (HROs) caracterizam-se por apresentarem maior resistência às várias interrupções. Nas HROs, apesar dos erros poderem gerar conseqüências catastróficas, eles podem ser evitados (ROBERTS, 2005), pois a confiabilidade é tão importante quanto os resultados dessas organizações (Roberts et al., 1994). Não se pode esquecer que as HROs, em sua maioria, possuem uma base tecnológica complexa (ROBERTS, 2005). Weick, Sutcliffe, Obstfeld (1999) preconizaram que as HROs são formas organizacionais precursoras de adaptação em um ambiente cada vez mais complexo. Para esses autores, as HROs são ambientes em que imperam a incerteza e um aparente exotismo, mas fornecem a infra-estrutura cognitiva que permite a aprendizagem adaptativa simultânea e desempenho confiável (p. 81). Essas organizações são especialistas em tomar rápidas decisões com base em dados imperfeitos e sabem abandonar rotinas em favor da improvisação (WALLER, ROBERTS, 2003, p. 813). Karl Weick tem chamado a atenção para o fato de que as falhas na atenção são fontes de acidentes (PERROW, 2009). Weick e Sutcliffe (2001, 2007) consideram que as organizações que precisam alta performance em indústria/setores em que pequenas falhas provocam graves efeitos, tais como em sistemas de controle aéreo, emergência médica ou negociação com reféns. Estas organizações “não têm escolha” a não ser funcionar de maneira altamente confiável. Para isso, existem algumas práticas, que promovem um ambiente de confiabilidade, passíveis de aprendizagem, que ocorrem com essas organizações (Figura 1). Características das HRO Descrição Preocupação com o fracasso Não subestimam pequenas falhas e as entendem como um sintoma de que algo está errado, tentando compreender o sistema atualmente (dinâmica organizacional). Relutância em aceitar HRO sabem que o mundo é complexo, instável, desconhecido e simplificações imprevisível. Não subestimam a complexidade e tentam compreender os diversos aspectos implicados em cada situação. Como? Promovendo debate com pessoas de diferentes pontos de vista, sem destruir as diversidades. Mais visão com menor simplificação. Sensibilidade para as Importância às operações de como o trabalho é realizado – entender operações que os eventos são situacionais (dinâmicos) e que existem ‘falhas latentes’ no operacional. Compromisso com a Entendem que nenhum sistema é perfeito. Resiliência é uma resiliência combinação de pequenos erros e soluções improvisadas que fazem o sistema funcionar. Para isso é preciso o trabalho de experts, pessoas com experiência, habilidade de recombinação e treinamento em pessoas com características de serem mentalmente estimulantes. Consideração à perícia Migração da hierarquia/liderança para pessoas com maior expertise na área, conforme a situação. Decisões são tomadas na linha de frente, por pessoas com condições de resolver a situação e não necessariamente obedece a hierarquia. Figura 1: Características das práticas verificadas nas HRO’s Fonte: WEICK e SUTCLIFFE, 2001 2.2 Confiança 61 O tema confiança é considerado uma abordagem controversa com diferentes enfoques originados no campo da psicologia, da sociologia e da economia, o que conduziu a variadas definições (SINGH & SIRDESHMUKH, 2000) as quais trazem valor ao conceito (ROUSSEAU et al., 1998). Nos estudos organizacionais, a confiança é estudada sob os aspectos interorganizacionais e intraorganizacionais (ROUSSEAU et al., 1998; LANE & BACHMAN, 2002). Para a compreensão da construção da confiança nos processos cognitivos, será considerada a confiança sob o aspecto intraorganizacional. Sob este ponto de vista, a confiança é compreendida como um tópico cultural complexo das organizações (ALLEE, 2002), como um fator do sucesso para a colaboração bem sucedida entre times (HERZOG, 2001). E ainda, como sustentadora da efetividade individual e organizacional (McALLISTER, 1995), mais como causa do que consequência das mudanças econômicas (ZUCKER, 1986), enfim como um conceito “meso” integrador de vários níveis compreendendo desde processos psicológicos a arranjos institucionais (ROUSSEAU et al., 1998). Um consenso geral entre pesquisadores conclui que a confiança intraorganizacional (within) é importante em uma escala de atividades e processos organizacionais, tais como o trabalho em equipe, liderança, direcionamento dos objetivos, avaliação de desempenho e comportamento cooperativo que beneficie as organizações e seus membros (AXELROD, 1984; GAMBETTA, 1988; McALLISTER, 1995, KRAMER, 1999). Diante das diversas abordagens com que a confiança é tratada, dentre os estudos que enfatizam o entendimento interrelacional da confiança (McALLISTER, 1995; LEWIS e WEIGERT, 1985; WHITENER et al., 1998; CHO, 2006), as ideias de Luhmann (1979, 1996) mostram-se fundamentais. A teoria sociológica contribui de maneira fundamental para o entendimento do complexo papel da confiança (MEYER et al., 2008) principalmente através da análise neo-funcionalista de Luhmann que identifica, na confiança, a possibilidade de gerenciar a complexidade das sociedades modernas (GILBERT, 1998), colocando assim a confiança no centro das teorizações sociológicas sobre as sociedades contemporâneas (LEWIS e WEIGERT, 1985). Confiança, no entendimento de Luhmann (1996) é o modo com que as pessoas conseguem lidar melhor com a complexidade produzida pela dimensão social da existência humana. A busca da redução da complexidade pode ser conduzida através do enquadre cognitivo em um sistema que busque semelhança e familiaridade em um mundo em que a dimensão social aumenta a complexidade. A confiança fornece uma base para que aumente as possibilidades de experiência e de ação neste mundo, mesmo que corra o risco de aumentar a complexidade, fornece uma estrutura que faz com que seja reduzida a complexidade. A familiaridade e a confiança são formas complementares para absorver a complexidade e estão unidas do mesmo modo que o passado com o futuro. Assim, “mostrar confiança é antecipar o futuro” (p.15), pois a confiança somente pode manter-se no presente, pois o futuro representa “uma carga excessiva para a habilidade de representação do homem”, por isso tenta simplificá-lo e assim reduzir a sua complexidade, através de uma tentativa de projetar o futuro, de garanti-lo. Outra importante característica da teoria de Luhmann (1996) é a intersubjetividade, uma vez que é através dela que o sentido é organizado para fazer frente às condições complexas, tanto que a capacidade de confiança varia de acordo de como o sentido e o mundo estão constituídos intersubjetivamente. Ocorre que tal constituição não é consciente e racional, por isso a familiaridade é simples, porém frágil, por isso, ao mesmo tempo em que abriga expectativas confiáveis, contém algum risco. Assim, para a familiaridade, o passado prevalece sobre o presente e o futuro, por isso a complexidade passa a ser reduzida, por isso a história é a forma mais importante de reduzir a complexidade. Se há confiança que comportamentos familiares (do passado) permanecerão, há a solução de um problema social: a exclusão da expectativa da ação inesperada. Por isso a confiança somente é possível em um mundo familiar, pois precisa da história 62 como um pano de fundo confiável. Quando os fatos mostram que esta expectativa não é realizada, levantase a confiança nos sistemas sociais que estão embasados na constituição intersubjetiva, sobressaindo-se de uma confiança puramente interpessoal para uma confiança no sistema que implica renunciar a maiores informações, bem como a controle dos resultados. A confiança no sistema não se refere somente a sistemas sociais, mas a outras pessoas vistas como sistemas pessoais. A troca da confiança interpessoal para a confiança no sistema são definidas em termos emocionais, mais do que em termos de apresentação. 2.3 Aprendizagem O conceito de aprendizagem organizacional mostrou-se como forte valor explicativo para o enfrentamento dos eventos inesperados nas organizações. O contexto competitivo em que as organizações estão inseridas, aponta a aprendizagem organizacional como favorecedora para a sobrevivência das organizações na medida em que pode fomentar a inovação em produtos e processos (SOUZA, 2004), bem como a capacitação para enfrentar momentos críticos. Para Fiol e Lyles (1985), a aprendizagem tem importância estratégica como processo de ações de melhoria que amplie o conhecimento e a compreensão que implique em melhoria dos resultados organizacionais. Portanto, a aprendizagem organizacional viabiliza a empresa a construir uma interpretação e um entendimento do ambiente de onde está inserida possibilitando avaliação de estratégias viáveis (DAFT & WEICK, DONALDSON & LORSCH, STRARBUCK et al apud FIOL & LYLES, 1985). Por outro lado, Crossan et al. (1999) consideram que a aprendizagem é um meio de alcançar o que chamam de renovação estratégica e desenvolveram uma modelo para o processo da aprendizagem organizacional. Esta estrutura de aprendizagem apresenta quatro premissas: tensão permanente entre exploration e exploitation; cognição afeta a ação e vice-versa; multinível (individual, grupal e organizacional), os quais interagem com os processos sociais de psicológicos da intuição, interpretação, integração e institucionalização. Para Weick & Westley (2004) aprendizagem organizacional é um oximoro, pois são processos antagônicos. “Aprender é desorganizar e aumentar a variedade. Organizar é esquecer e reduzir a variedade”(p.361). Esta antítese significa que a aprendizagem é possível em espaços sociais que justapõem a ordem e a desordem em uma tensão saudável, as quais incluem momentos de humor, improvisação e pequenas vitórias. Entender a organização como cultura ajuda a compreender a natureza da aprendizagem, pois a cultura está inserida em produtos visíveis como a linguagem, nos artefatos e nas rotinas das ações coordenadas. Dessa forma, o invisível (relações sociais) torna-se manifesto no tangível (artefatos como modelos). O relacionamento entre aprendizagem e organização é essencialmente uma tensão. As organizações adhocráticas são mais hábeis em adaptar-se em ambientes mutantes, pois são organizações que se autodesenvolvem, enquanto que as burocráticas estão voltadas à eficiência e a colher os benefícios da curva de aprendizagem, às distinções e racionalidades claras que tentam suprimir ou ocultar qualidades confusas ou contraditórias. Ambas exploram posições mais vantajosas, o desafio é encontrar um ponto intermediário entre as duas estruturas, ou seja, uma justaposição ótima entre a ordem e a desordem, “não mediante a alternação entre as duas, mas mediante a conexão íntima e contínua entre as duas”(WEICK & WESTLEY, 2004, p.369). Assim, para Weick e Westley (2004) a aprendizagem organizacional tanto é um resultado quanto é um processo. A aprendizagem depende, mas não é exclusividade dos indivíduos, pois ocorre também nas estruturas organizacionais, tais como a cultura que aparece na linguagem, palavras, frases, vocábulos e expressões que os grupos desenvolvem, nos artefatos, nos objetos materiais que um grupo produz. As organizações podem auto-desenvolver-se, quando procuram por pequenas mudanças contínuas, ou burocráticas, quando buscam a eficiência. 63 As organizações que se auto-desenvolvem aprendem enquanto que as burocráticas organizam. A aprendizagem depende da linguagem presente na interação social, a qual é o seu instrumento e repositório (WEICK E WESTLEY, 2004). Portanto, a aprendizagem é um momento nas ações rotineiras quando ordem e desordem se justapõem (erros, quase acidentes, etc) como encontrar áreas permeáveis num tecido impermeável. Como característica, as organizações de aprendizagem retêm elementos de redundância, de desordem e flexibilidade, em que a fronteira entre o planejar e o fazer desaparece. A improvisação confere um novo significado às experiências, pois variam, combinam e recombinam um conjunto de figuras que dão coerência à peça, tal como em um quebra-cabeças. Enfim, para Weick e Westley (2004), a aprendizagem organizacional está próxima da estética da imperfeição. 3. O contexto empírico e procedimentos metodológicos Em um país em desenvolvimento como o Brasil, a infraestrutura elétrica precisa ser confiável para garantir a expansão da oferta e evitar novas crises de suprimento em 2009 e 2010 (CORREIA et al., 2006). O autor refere-se à crise como o evento inesperado de 10 de novembro de 2009 em que 60 milhões de brasileiros ficaram no escuro em função do blackout elétrico que atingiu 18 dos 26 estados do Brasil e os deixou sem energia elétrica por até quatro horas (BROOKS, 2009). Este contexto sugere a necessidade de pesquisas dos COS elétricos compreendidos enquanto Organização de Alta Confiabilidade (High Reliability Organization - HRO). Segundo Weick e Sutcliffe (2001), HRO’s operam sob condições extremas, tais como verificadas no contexto do Centro de Operações do Sistema (COS). Elas desenvolveram comportamentos mais eficazes para lidar com o inesperado do que organizações tradicionais e muito lhes podem ensinar. O COS tem a responsabilidade de supervisionar e controlar o sistema de transmissão e geração de energia do seu Estado viabilizando o suprimento de energia às concessionárias de distribuição, bem como a consumidores livres, produtores independentes e outras empresas de geração. O principal objetivo do COS é manter os consumidores abastecidos de energia elétrica. O evento inesperado analisado ocorreu em duas hidrelétricas deste Estado brasileiro, nos dias 24 e 25 de setembro de 2009, o qual foi gerenciado pelo COS. Para analisar este evento inesperado, os procedimentos metodológicos adotados foram: - Entrevistas - Seis entrevistas semi-estruturadas conduzidas com os diversos níveis hierárquicos do COS, desde a gerência até os despachantes (operadores que controlam os painéis). - Análise da Conversa (AC) - Análise dos principais excertos da conversa entre os despachantes e o supervisor desde o início do evento até a sua finalização (gravadas em tempo real). 3.1 Compreendendo a Análise da Conversa As ciências sociais reconhecem que a linguagem é um recurso simbólico essencial para a compreensão da realidade social (SAMRA-FREDERICKS, 2003). Neste contexto, a fala é entendida como uma forma de ação social (CLIFTON, 2006). A utilização da Análise da Conversa (AC) nos estudos organizacionais situa-se nos trabalhos que examinam os diferentes contextos institucionais, tais como os ambientes organizacionais, nos quais é exaltado o papel da fala na produção da vida social. Se a fala é ação (SAMRA-FREDERICKS, 2003) então "organizations are talk, and talk is organizations" (CLIFTON, 2006, p. 202). A utilização da AC nos estudos organizacionais está crescendo (NIELSEN, 64 2009; CLIFTON, 2006), e as pesquisas estão demonstrando diferentes aspectos que a AC pode contribuir nos estudos organizacionais. O objetivo da AC é descrever as competências e procedimentos envolvidos na produção dos diversos tipos de interações sociais (ARMINEN, 1999). Segundo Stephen Levinson (1983), a AC tem sua origem na Etnometodologia, movimento que estuda os métodos étnicos (dos próprios participantes) de produção e interpretação da interação social. entendida como produzida localmente (‘aqui e agora’ no curso da ação), endogenamente (no interior da situação), audiovisualmente e na interação pelos participantes(FLICK, 2004). Portanto, a Etnometodologia reespecifica a ordem social como fenômeno construído nas ações ordinárias e cotidianas dos membros do grupo social, reconhecendo Etnometodologia foi fundada por Harold Garfinkel (1967) e lida com a questão de como as pessoas produzem a realidade social no processo interativo e através deste. Realidade social pede a identificação destas ações com o seu contexto social (McCLEARY, 2009). A preocupação central dessa abordagem é o estudo dos métodos empregados por membros na produção da realidade da vida cotidiana. O programa de pesquisa etnometodológica é caracterizado pelo interesse nas atividades cotidianas, na sua execução e na constituição de um contexto de interação, localmente orientado no qual se realizam as atividades. Em geral, o programa de pesquisa etnometodológica é realizado nas pesquisas empíricas da Análise da Conversa (FLICK, 2004). O precursor da AC é Harvey Sacks (1935 – 1975), cientista do departamento de sociologia da Universidade da Califórnia primeiramente e depois de Irvine, entre 1964 e 1972. Para o precursor da AC, Harvey Sacks, a fala-em-interação é sistematicamente organizada e profundamente ordenada; sua produção é metódica e finalmente a análise deve ser baseada em dados que ocorreram naturalmente (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). O objeto de análise da AC é a fala na interação social e os dados são dessas interações naturalísticas gravadas em tape e/ou vídeo, que enfatizam o papel social da interação como uma realidade autônoma sui generis (ARMINEN, 1999). O foco da análise da conversa não é o significado subjetivo para os participantes, mas a forma como essa interação é organizada. O tópico de pesquisa é o estudo da vida cotidiana, por isso é crucial o papel do contexto em que as interações ocorrem. Cada evento de fala-em-interação apresenta esforços de produção dos membros ali mesmo, ou seja, das contribuições conversacionais dos membros. Enfim, a Etnometodologia preocupa-se com a descrição dos métodos dos membros, em vez de suas perspectivas, a fim de descrever o processo em estudo a partir de dentro (FLICK, 2004). O foco da AC é na seqüência, pois através do curso da conversa em interação os falantes dispõem, na próxima seqüência de turno, um entendimento do que era o primeiro turno (ver Exemplo de Interação1). A ferramenta básica da AC é o next-turn proof procedure, ou seja, o próximo turno pode ter uma seqüência desejada ou indesejada, conforme o que o falante anterior disse. São as propriedades ordinárias da fala (HUTCHBY & WOOFFITT, 1998). As conversas telefônicas são passíveis de serem analisadas pela perspectiva da Análise da Conversa. Para Hutchby (2001), em chamadas telefônicas ocorrem alguns eventos conversacionais típicos, tais como a identidade do chamador, atendente e respondente. Para este autor, a pessoa que realiza a ligação (chamador) tem uma posição superior, uma forma de poder social, sobre o atendente, pois não tem 65 certeza da identidade do chamador. Existem muitas maneiras com que as estruturas normativas da interação conversacional ao telefone podem se estruturar. Por questões éticas, todos os nomes de instituições, empresas, pessoas, cidades, usinas e sistemas foram trocados para preservar seu anonimato, sendo substituídos por outros nomes escolhidos de maneira aleatória. 4. Análise dos dados Como evidência empírica é analisado um evento inesperado no COS de um importante estado brasileiro, entre 24 e 25 de setembro de 2009 nas Usinas Hidrelétricas do Taí e Salto Azul, as quais produzem 35% da carga consumida pelo Estado. Para atingir aos objetivos deste estudo, iniciar-se-á com a exposição do evento inesperado analisado. No dia 24 de setembro foi verificado um aquecimento anormal (ponto quente na relação primária) de um transformador de corrente na Usina Salto Azul. Para resolver esse problema, considerado rotineiro neste contexto, foi realizado o desligamento de urgência deste transformador. Assim, a usina Taí passou a operar de forma isolada do sistema suprindo as cargas de duas regiões do estado. Para atender a configuração de operação, foram também desligados três geradores da usina Roberto Peres. Depois da conclusão da manobra, foi realizado o processo de interligação da Usina de Taí e a 1h19min com a Salto Azul (referente ao Momento 1 da Figura 2). No momento do fechamento do disjuntor no terminal da Usina Salto Azul e sua junção ao sistema, ou seja, no momento da realização do sincronismo (fechamento de paralelo) com a Usina do Tai ao sistema, houve o desligamento automático das seis unidades geradoras da Usina Taí, permanecendo o atendimento das cargas da área, até então isolada, através do sistema, pela linha que foi energizada. À operação de desligamento automático conjunto das unidades geradoras chama-se desarme, ou seja, a usina foi desligada automaticamente para fins de proteção e não manualmente (FARIA et al, 2002). Este desarme ocorreu devido à falha da operação do Salto Azul que ligou o disjuntor da Usina Tai sem atender as condições de sincronismo. Como conseqüências foram acionados vários relés de sobretensão e houve descarga das garrafas de CO2, menos em uma unidade geradora por problema de queima de contato em um relé. A 1h22min houve outro equívoco, desta vez do operador do Taí (referente ao Momento 2 da Figura 2), em que o operador abriu vários disjuntores para recomposição, sendo que um deles encontravase aberto. Assim, houve interrupção de energia elétrica para duas cidades, deixando mais de 340 mil pessoas sem abastecimento de energia elétrica por quatro minutos. As unidades geradoras voltaram paulatinamente ao funcionamento até 3h28min depois. A demora deveu-se a inspeção nas máquinas. Impedir a interrupção no fornecimento de energia elétrica é um dos objetivos do COS, como mostra a fala do entrevistado ED3: Isso [o objetivo do COS] envolve a cada momento manter ligados as linhas e os transformadores do sistema de transmissão que transmite energia pra todo o estado e controlar a produção de energia nas usinas. Como conseqüência, além das duas cidades ficarem sem energia elétrica por 4 minutos devido ao desligamento geral da Usina do Taí que operava ilhada, após conclusão de manutenção programada em Salto Azul, a operação do Taí interpretou equivocadamente que o desarme das seis unidades geradoras era um desarme geral e executou os procedimentos de recomposição previstos para o desarme geral [descarga de CO2]. 66 Figura 2: Representação dos dois principais momentos do Evento Fonte: Dados desta pesquisa Depois do evento, como providências foram realizadas reuniões de esclarecimento do evento, onde foram discutidos os procedimentos adotados no evento, identificação das causas que levaram a interpretação equivocada de desarme geral e esclarecimento dos procedimentos corretos a serem executados. Também foi realizado treinamento dos operadores quanto aos procedimentos e as restrições a serem observadas durante o fechamento de paralelo (sincronismo) entre as áreas do Sistema de Potência. Houve também as substituição do contato danificado no relé da unidade geradora. Neste ambiente do COS, todas as conversas telefônicas dos despachantes do COS são gravadas. A seguir, são apresentados e analisados vários excertos de conversas telefônicas que evidenciam aspectos de sensemaking e de confiança. As conversas selecionadas não abarcam todo o contexto do evento, mas referem-se às categorias que respondem à questão inicial do artigo. As chamadas telefônicas constituem um dos ferramentais essenciais para a eficácia do COS, pois os operadores centralizam informações do Estado todo, para isso, contatam por telefone com os diversos setores, empresas, usinas, entre outros, para receber informações de rotina e gerenciá-las, bem como para agir em casos de eventos inesperados. Para isso, tais conversas contêm um script próprio de atendimento de chamadas, por exemplo: 1 2 3 ((telefone chamando)) Ana: É Ana Nilo: Ana é Nilo. Observa-se que, neste ambiente institucional, convencionou-se iniciar a conversação através da identificação dos nomes, assim Ana é a pessoa que atendeu ao telefone e o chamador é Nilo. Verifica-se que existe subtração das palavras convencionalmente aceitas em conversas telefônicas como o “Alo” e “Quem fala”, por exemplo, gerando maior agilidade e objetividade na chamada telefônica. Outra característica deste ambiente institucional são as abreviações dos nomes de equipamentos, operações, 67 ocorrências, etc. Conforme Hutchby e Wooffitt (1998) nas interações institucionais ocorre redução e especialização sistemática de várias práticas utilizadas na conversação cotidiana, tais como os exemplos no atendimento ao telefone. Por questões éticas, todos os nomes de instituições, empresas, pessoas, cidades, usinas e sistemas foram trocados para preservar seu anonimato, sendo substituídos por outros nomes escolhidos de maneira aleatória. Foram selecionados três excertos de conversas naturalísticas gravadas entre os despachantes do COS e os operadores das Usinas envolvidas no evento. Estes excertos foram selecionados porque apresentavam aspectos definidos no objetivo desta pesquisa. Excerto 1 (25/09/09 as 0h:12min) ((Nilo aguarda enquanto Ana fala no rádio com Zeno)) 17 Ana: Nilo:: 18 Nilo: ah. 19 Ana: agora o Zeno me passo que tá incendiando a parte da R: da RPV que é ali na eleve:: que tem um ponto quente em cima do transformador 20 Nilo: (.) tá e ai: o Z. o Zeno quer que faça o que? 21 Ana: não. só pra te falá 22 Nilo: (.) >tem aéle em CIMA do transformador?< 23 Ana: isso Aha 24 Nilo: (.) ºbarbaridadeº. Bom= 25 Ana: = tu aguarda qualquer coisa te do o retorno en[tão ta bom] 26 Nilo: [E ai o] que que eles querem? Querem que desligue a KZ? Faça alguma coisa:: que que:. 27 Ana: não. tá tudo desligado aqui pra nós. por isso que nós por isso que nós fizemos: agora o pessoal da transmissão ta la. eles tão no escuro la. o Zeno foi levar lanternas pra vê XXX XX ta bom? 28 Nilo: ta bom ta oquei tudo bem ((desligam o telefone)) Obs.: Ver convenções de transcrição na Nota 1 Neste excerto, fica claro o contexto de urgência que a equipe do COS trabalha. Ana é operadora da Usina Salto Azul e Nilo, despachante do COS. Observa-se que Ana relata na linha 19 uma ocorrência de incêndio em um transformador. A narração é realizada de uma maneira calma, sem pressa sendo a primeira parte do par na conversação. Como segunda parte do par (linha 20), Nilo fica um momento em silêncio e quer investigar que tipo de ação ele (representando o COS) pode tomar, mas Ana apenas relata o acontecido e reitera “só pra te falá”. O “não” da linha 21 e 27 mostra-se resposta despreferida em formato de ação preferida (HUTCHBY e WOOFFITT, 1998), ou seja, uma negativa de maneira simples, direta e sem demora. A esta negativa, Nilo realiza na linha 22 uma formulação de maneira rápida “tem aéle em CIMA do transformador?” O objetivo da formulação é compreender o que ambos os interagentes estavam fazendo em conjunto (ANTAKI, BARNES & LEUDAR, 2005), ou seja, através da formulação é possível esclarecer o sentido explícito do que foi dito (DREW, 2003). Como a formulação ocorre em pares adjacentes conversacionais (linha 22), há a preferência para concordar na segunda parte do par adjacente (linha 23), através da expressão ‘isso Aha’ uma vez que depois de uma formulação o outro deve reconhecê-la e ratificá-la (HERITAGE & WATSON, 1979 apud ANTAKI, BARNES & LEUDAR, 2005). Na linha 24, Nilo fala com tom de voz baixo a expressão regionalista “barbaridade” que pode estar significando ‘que coisa absurda’. Nilo pretende continuar com seu turno de fala utilizando o marcador “Bom” quando Ana se auto-seleciona na linha 25 para encerrar a conversa, causando uma interrupção no 68 turno de Nilo. A interrupção pode ser interpretada como instrumento de controle e poder (OSTERMAN, 2006), reafirmando a vontade de Ana de encerrar a conversa com Nilo. Observa-se que, ao mesmo tempo em que Ana pretende encerrar a conversa, Nilo não fica satisfeito com o final da conversação e faz um overlap (linhas 25 e 26). Conforme Hutchby & Wooffitt (1998), o overlap é caracterizado como uma sobreposição da fala entre os interagentes, pois através de sua marcação, importantes pontos do gerenciamento da conversação podem ser revelados. Na linha 26, esse overlap parece estar indicando a necessidade e urgência que Nilo mostra para auxiliar na resolução do incêndio no transformador, não concordando com a maneira tranqüila de Ana e não se orienta para a finalização da conversa. Assim, observa-se que Nilo fica procurando na memória formas de agir diante do evento do incêndio em cima do transformador, ao qual Ana tenta tranquilizá-lo e produz grande quantidade de fala explicando as ações realizadas na usina, terminando com a expressão “ta bom?” Pode-se compreender que Ana constrói uma explicação (account) sobre suas ações (linha 26) que objetiva evitar inferências negativas a seu respeito, de modo que a sua construção de versão sobre a realidade pareça sólida e não problemática (POTTER, 1996 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007). Ana consegue convencer Nilo com sua explicação, uma vez que ele reafirma a concordância por três vezes (linha 28): “ta bom ta oquei tudo bem” em formato preferido. Mesmo assim, observa-se que Nilo está orientado para a consecução da tarefa na interação institucional e não quer abrir mão dela, nem de sua identidade institucional, caracterizando a fala-em-interação institucional (DREW E HERITAGE, 1992). Através desta análise é possível associar ações dos interagentes que ficaram explícitas no excerto 1 com os microprocessos que compõem o sensemaking (WEICK, 1995). Por exemplo, na linha 19, quando Ana relata o incidente do incêndio em cima do transformador de maneira calma, Nilo percebe que há ambigüidade entre o conteúdo na notícia e o modo calmo de relatá-la, ao qual reage com um breve silêncio e pergunta que tipo de ação pode tomar diante do evento. Para Weick (1973), ambiguidade refere-se ao excesso de sentido de uma informação. Assim, a linha 19 provocou excesso de sentido na informação (ambigüidade entre o conteúdo na notícia e o modo calmo de relatá-la). Nilo tenta diminuir a ambiguidade através das perguntas das linhas 22 e 26. Observase ainda que o evento provoca complexidade no entendimento de Nilo. Complexidade para Luhmann (1996) ocorre quando as possibilidades excedem a capacidade de resposta, conforme verificado na linha 26 quando Nilo pergunta “Querem que desligue a KZ? Faça alguma coisa:: que que:.”. Observa-se ainda nesta linha, que Nilo procura em sua memória ações que poderiam ser realizadas para ajudar a solucionar o evento do incêndio no transformador, o qual pode trazer consequências graves. Ao procurar fazer sentido de um evento (sensemaking), os envolvidos buscam em sua experiência algum episódio parecido de modo que possa ser aplicado ao evento presente, tal como Nilo faz na linha 26, pois criar sentido é um processo de atenção para o que já ocorreu, atenção essa influenciada pelo contexto atual do sujeito e pelos processos da memória (WEICK, 1973). O inesperado está sempre dentro do possível das HRO’s, pois existe uma sensibilidade para as operações, ou seja, falhas são passíveis de ocorrer (WEICK e SUTCLIFFE, 2001), tal como mostra a fala do entrevistado EA2: Então o centro trabalha com uma previsão programada, mas nem sempre aquilo que ta programado é o que vai ser executado. Ele tem uma certa temática, certa rotina, mas nem sempre acontece exatamente assim. E tem aquelas situações que são totalmente inesperadas, que são as ocorrências. Portanto percebe-se que o excerto 1 demonstra o início do evento inesperado e a presença dinâmica dos microprocessos de ambigüidade e de experiência (Sensemaking) e complexidade (Confiança) de modo interrelacionado. Excerto 2 (25/09/2009 as 0h:20min) 69 19 Ana: Nilo 20 Nilo: Eu 21 Ana: Vai ser feito por uma XXX inspeção (.) ligar os disjuntores e fechar os seccionadores 22 Nilo: Ta assim ó ó ó. Ana. me consegue alguém que me dê informações ã: ã: mais conCRETAS, me me me coloque os pés no chão. >porque eu não to vendo vocês aí< tá: quero sabê. o que que vocês vão faze tá bom? 23 Ana: Ta bom 24 Nilo: Me consegue alguém aí que me dê informação. brigado ((desliga o telefone)) É próprio das interações que ocorrem em contextos institucionais que os interagentes preservem a identidade profissional ou institucional, pois ela se faz relevante nas atividades de trabalho em que estão engajados (DREW e HERITAGE, 1992). O objetivo dos interagentes é manter a imagem pública, em outras palavras, manter a imagem do “eu” delineada em termos de atributos aprovados socialmente e assim preservar sua face (GOFFMAN, 1955). Observa-se que na linha 22, Nilo fere a face de Ana ao solicitar outra pessoa que possa dar informações mais precisas. Como o processo de manutenção da face é uma condição da interação, mas não é seu objetivo, para a continuação das interações e para que se atingisse o objetivo de resolução do evento emergencial, Nilo opta por solicitar outra pessoa para continuar a tratar do evento e portanto, acaba por ferir a face de Ana. Através desta atitude, Nilo demonstrou que não encaixa mais Ana na categoria de operadora confiável que entenda o suficiente para dar informações claras do que esta acontecendo na usina de Salto Azul. Conforme Silvermann (1998), a categorização dos membros em uma instituição envolve a identidade dos trabalhadores como capazes de entender e solucionar problemas relacionados às tarefas de seu trabalho. Na linha 22, Nilo não reconhece as ações de Ana dentro da categoria de operador eficiente. Por isso, a fala da linha 22 mostra a sua reação deste não enquadre através de estranhamento, anormalidade, por isso solicita que outra pessoa passe as informações, pois não está compreendendo o que está acontecendo diante do evento emergencial. Ao realizar o ato de ferir a face de Ana, Nilo produz grande quantidade de fala através de várias explicações, repete várias vezes várias palavras, como “me me me” e termina solicitando a compreensão dela. Observa-se que Nilo toma algum cuidado, pois realiza uma pré-seqüência quando diz “Ta assim ó ó ó.” (linha 22). A pré-sequência foi usada para projetar um novo tipo de seção (SILVERMAN, 1998), mais delicada. Desta vez, foi Nilo que produziu explicação (account) sobre suas ações (linha 22). A explicação objetiva que Ana não faça inferências negativas a respeito de Nilo, de modo que a sua construção de versão sobre a realidade pareça sólida e não problemática (POTTER, 1996 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007), através da explicação “>porque eu não to vendo vocês aí<”. A resposta de Ana na linha 23 aceitando chamar outra pessoa, através das palavras “tá bom” traz implicações para o entendimento do discurso assimétrico. Uma delas é a caracterização de um discurso assimétrico, pois conforme Hutchby & Wooffitt (1998), o discurso assimétrico é entendido em termos de poder dos agentes institucionais para estabelecer a oportunidade de participação dos falantes e para definir seu resultado. É comum que as interações institucionais tenham o caráter assimétrico percebidos na distribuição dos turnos e nos controles dos tópicos, tais como demonstrados nas linhas 22 e 23. A resposta da linha 23 é preferida (concorda com o outro interagente) em formato preferido (simples, direta e sem demora) (HUTCHBY e WOOFFITT, 1998). Observa-se que a interação analisada através do Excerto 2, mostra que, para que Nilo pudesse criar sentido (sensemaking) do que estava acontecendo na usina de Salto Azul, ele realiza um conduta que pode ser entendida dentro do micro-processo da interação (no entendimento de sensemaking) e do comportamento social (no entendimento da confiança). Como a conduta individual é contingenciada pela conduta de outros e se mostra nas formas de fala, discurso e conversa, porque é como o contato social é 70 mediado (WEICK, 1995), observa-se que Nilo realiza uma ação drástica para a interação solicitando que outra pessoa passe as informações. Tal ação ocorreu, porque ele não estava conseguindo criar sentido da situação diante das respostas de Ana, para que conseguisse diminuir a ambigüidade e procurar experiências que lhe auxiliassem a tomar atitudes para a resolução do evento analisado. Comparativamente, pode-se analisar tal atitude através do micro-processo de comportamento social, pois o comportamento social é gerador de complexidade (LUHMANN, 1996) quando a confiança não consegue ser estabelecida para a diminuição da complexidade. Sob esse ponto de vista, observa-se que Nilo mostra que entende que Ana (linha 22) não está sendo digna de confiança, pois o comportamento de cada pessoa tem implicações simbólicas e toda ação ou inação tem possíveis efeitos no comportamento social (LUHMANN, 1996), ou seja, na interação. Dessa maneira, Nilo deseja conversar com outra pessoa, para que possa criar sentido da situação (sensemaking), bem como construir confiança e assim diminuir a ambigüidade e a complexidade do evento inesperado. Excerto 3 (25/09/2009 as 1h:27min) ((Telefone chamando)) 1 Aldo: Sim Aldo 2 Nilo: Aldo porque a RPV ligou pro Fausto? 3 Aldo: Ã:? Desarmou todo o Taí XXX 4 Nilo: >Tava conectado com o SALTO AZUL< 5 Aldo: (.) Peraí então:: acho que o operador:: fe:z bobagem então. Só um momentinho aí 6 Nilo: Tu não tem a tensão lá do salto azul? (0.4) ((vozes ao fundo)) Alo. Alo. Alo:: >tu não tem a tensão do salto azul?< 7 Aldo: (.) não não é o seguinte >nós tamo pegando as proteção tamo com tudo o setor desligado agora< ta oquei? 8 Nilo: Tá mas tu não tinha a tensão do salto azul? 9 Aldo: Ã? 10 Nilo: Tu tinha a tensão do salto azul? 11 Aldo: Tinha. não. Ta desarmado o salto azul Aldo trabalha na Usina Taí e Nilo é despachante do COS. Este excerto ocorre no momento crucial do evento em que ocorre o desligamento das seis unidades geradoras da Usina Taí. A conversa entre Nilo, despachante do COS, e Aldo, operador da Usina do Taí tentam compreender o que está acontecendo. Ao atender ao telefone, Aldo anuncia seu nome, na forma característica da conversação telefônica desta instituição. Observa-se que Nilo não anuncia seu nome, e já pergunta porque a concessionária RPV telefonou para o Fausto, como um sinal de alerta de que algo está fora do esperado. Observa-se que Nilo repete o nome de Aldo, funcionando como uma pré-sequência para a questão da linha 2, a qual envolve a orientação para a tarefa de entender o que está acontecendo com a Usina do Taí, uma vez que houveram pistas de anormalidade. A orientação para a tarefa é próprio dos ambientes institucionais (DREW E HERITAGE, 1992) e principalmente de contextos de HRO. Observa-se que Aldo responde com “Ã:?” demonstrando estranhamento, mas logo afirma “desarmou todo o Taí” como um evento relacionado. Na linha 4, Nilo faz a afirmação de que a Usina do Taí estava conectado como Salto Azul por isso desarmou. Observe-se que neste primeiro momento ele afirma, para em seguida repetir isso em forma de indagação (linhas 6,8 e 10). Através da afirmação de Nilo, Aldo (linha 5) realiza uma pré-sequência alongada “peraí então::” e faz uma formulação concluindo que “o operador fez bobagem”, pois através da formulação é possível esclarecer o sentido explícito do que foi dito (DREW, 2003). Por conta do sentido produzido por esta formulação, Aldo solicita “só um momentinho”, mas Nilo continua com sua questão, que não fora respondida. Nilo continua orientando-se para a tarefa de descobrir se a Usina do Taí recebia a tensão do Salto Azul, precisando esperar 4 segundos enquanto escuta vozes ao fundo. Conforme Weick e 71 Sutcliffe (2001) as HRO’s levam em consideração os diferentes aspectos de cada situação, não subestimando a complexidade e isto aparece na fala do entrevistado ED3: O importante na ocorrência é tu não te ater apenas aos contatos relacionados com aquela ocorrência, porque o mundo continua, entendeu? Tá tratando daquela ocorrência, mas tá o cara te ligando para outra coisa e isso interfere muito. Esta característica é enfatizada pelo entrevistado EA2 que alerta para a questão da simultaneidade de acontecimentos e da necessidade de gestão, que envolvem a resiliência e decisões tomadas na linha de frente, as quais são características das HRO’s (WEICK e SUTCLIFFE, 2001): É tudo simultâneo, então uma pessoa tem que falar com a distribuidora, outro tem que fazer uma análise de carga, ou tem outro serviço e todas essas atividades ocorrem em paralelo, então ali um é o supervisor, um é o energético e o outro elétrico, mas essas atividades elas são todas interligadas, não são separadas, o sistema é uma coisa só, então no caso de uma ocorrência, uma contingência eles tem que trabalhar em sintonia. Retornando à análise do excerto, Nilo tenta retomar a conversa e chama “Alo. Alo. Alo.” (linha 6), característica utilizada para chamar o interlocutor à conversa telefônica. Aldo responde com uma présequência (linha 7) depois de um momento em silêncio e as palavras “não não é o seguinte” não estão significando respostas desprefidas, mas uma pré-sequência à explicação (account) “tamo pegando as proteção”. Observa-se que Aldo utiliza uma expressão engajadora “nós” como uma maneira de se referir a ação representativa realizada pelos trabalhadores da Usina, comum em um contexto institucional (DREW E HERITAGE, 1992). O account, objetiva ao falante evitar inferência negativa a seu respeito (POTTER, 1996 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007) e espera que o outro interagente concorde. Mesmo com a concordância de Nilo ao account através “Tá”, logo se reorienta para sua dúvida inicial que é saber se a Usina de Taí recebe tensão do Salto Azul. Aldo, então na linha 11 responde à questão de maneira “Tinha. não. Tá desarmado o salto azul”, ou seja, inicialmente diz que tinha tensão, depois nega e depois faz uma formulação para deixar claro que a Usina do Salto Azul está desarmada, ou seja, a usina foi desligada automaticamente para fins de proteção e não manualmente (FARIA et al, 2002), conseguindo assim esclarecer o sentido explícito do que foi dito. A não manutenção dos equipamentos ligados gera problemas para a Instituição, pois uma parte dos equipamentos é alugada. Assim, quando estão desligados trazem prejuízos financeiros à empresa. Pode-se perceber isso na fala do entrevistado ED3: [Falta de energia pros consumidores] continua sendo uma grande variável, mas tem a outra que é manter os equipamentos ligados, porque os equipamentos da [Instituição] são alugados e eles tem que permanecer ligados, se eles forem desligados você perde dinheiro. Assim, observa-se que nos ambientes HRO’s a complexidade não é subestimada (WEICK e SUTCLIFFE, 2001). Neste excerto, observa-se que há uma busca emergencial pela compreensão dos diversos aspectos do evento, em que Nilo não se contenta até não esclarecer sua dúvida. Aldo cria o sentido (sensemaking) de que houve falha operacional (linha 5) “acho que o operador fez bobagem”, pois sabem da importância como o trabalho é realizado (WEICK e SUTCLIFFE, 2001). Torna-se interessante perceber que o sensemaking ocorreu através de uma formulação, que justamente esclarece o sentido explícito do que foi dito (DREW, 2003) no momento da interação. Isso mostra a importância do microprocesso interação, pois criar sentido é um processo individual e social (WEICK, 1995). Assim 72 também ações engajadoras como o uso de “nós” também representa este microprocesso, pois remete à contingencia social presente no microprocesso do sensemaking de interação. Percebe-se que o microprocesso da confiança denominado comportamento social também está presente, pois Aldo procura manter sua integridade através da promoção do account, o qual objetiva evitar inferências negativas a seu respeito, de modo que a sua construção de versão sobre a realidade pareça sólida e não problemática (POTTER, 1996 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007). Assim, através da utilização de accounts, o microprocesso comportamento social da confiança que é a busca pela integridade para garantir a confiança do outro (LUHMANN, 1996). Nas HRO’s, a aprendizagem mostra-se indispensável na prática diária, pois assim ficam mais resistentes às interrupções (ROBERTS, 2005). É prática desta Instituição, realizar análises dos eventos, reuniões, treinamentos, entre outros, conforme aparece na fala do entrevistado ED3: Uma ocorrência no sistema pode interromper o consumo, pode derrubar uma linha, ficar um tempo fora, tu perder dinheiro, ali uma análise dessa ocorrência tu tem que ir lá na décima casa depois da vírgula, pra ver o que que gerou, o que não funcionou bem, como tinha que ser e aí geramos recomendações. [...] Também tem a reunião de análise de ocorrência que é uma reunião bimensal onde tu analisas todos os fatos que deixaram alguma margenzinha de dúvida, tá. E ali a gente gera uma recomendação, coloca lá no mapa, vai para o responsável com prazo. Diante deste ambiente complexo, a aprendizagem é possível em espaços sociais que justapõem a ordem e a desordem em uma tensão saudável, as quais incluem momentos de humor, improvisação e pequenas vitórias (WEICK e WESTLEY, 2004). Neste evento, observaram-se esses aspectos, e também deliberações que indicam que houve aprendizado, tais como treinamento específico com os operadores sobre o sincronismo, além dos reparos técnicos nos sistemas afetados e que se mostraram com defeito. 5. Framework teórico proposto Este artigo teve o objetivo de compreender a interrelação produzida entre os microprocessos que compõem o sensemaking (WEICK, 1995) e a construção da confiança (LUHMANN, 1996) presentes em eventos inesperados. Diante do desenvolvimento da metodologia e análise do evento inesperado, propõese um framework teórico de entendimento para tais eventos. Ressalta-se que a característica do framework teórico é a compreensão do problema complexo em questão, mesmo perdendo parte de sua capacidade explicativa quando retirado do seu contexto. O framework teórico proposto pode ser representado conforme a Figura 3. 73 Figura 3: Framework teórico proposto Fonte: Dados desta pesquisa Através dos resultados apresentados é possível concluir que existe interrelação entre os microprocessos do sensemaking, aqui considerados como ambigüidade, experiência e interações e os microprocessos da confiança, considerados como complexidade, familiaridade e comportamento social. A interrelação entre os microprocessos também é verificada, pois diante de uma situação inesperada ocorre ambigüidade que é o excesso de sentido de uma informação (WEICK, 1995), bem como aumento da complexidade que é quando as possibilidades excedem a capacidade de resposta (LUHMANN, 1996). Observe-se que ocorreram nas análises algumas situações que estavam mais situadas no entendimento dos microprocessos do sensemaking, como quando a ambiguidade devia ser diminuída através da busca na memória por experiências similares e culminava com as interações que frisava a mediação do contato social. Outras situações foram mais bem compreendidas através dos microprocessos da confiança em que iniciava-se com o aumento da complexidade e culminava com o comportamento social que apresentava efeitos com implicações simbólicas para a confiança. Observou-se que a metodologia da Análise da Conversa mostrou-se útil para o entendimento dos microprocessos do sensemaking e da confiança, pois é uma abordagem que auxilia no entendimento da ação dos envolvidos na conversação. Através disso, todas as ações ou inações dos interagentes são registradas e analisadas. Como uma importante conclusão do trabalho observou-se que o microprocesso da interação (sensemaking) foi produzida através de formulações. Na AC, as formulações procuram esclarecer o sentido explícito do que foi dito (DREW, 2003), enquanto que no comportamento social a estratégia interacional utilizada mostrou-se o account, ou seja, explicações que objetivam evitar inferências negativas a respeito do interagente que a pronuncia (POTTER, 1996 apud PASSUELO e OSTERMANN, 2007). Esses são exemplos de ações dos sujeitos inseridos em um processo relacional em busca de solução para eventos inesperados. Sugere-se que esses aspectos podem ser aprofundados em pesquisas posteriores. 74 Portanto, diante de eventos inesperados em contextos complexos, a análise das falas rápidas, decisões que sobrepujam hierarquia, valorização de pequenos problemas como pistas desencadeadoras de grandes conseqüências, formulações, accounts através da metodologia da AC mostrou-se produtiva para o entendimento das HRO’s. E ainda, a estrutura do framework apresentada mostrou-se consistente para subsidiar o entendimento da dinâmica dos eventos inesperados que culminam com aprendizagem em ambientes de HRO’s. Como limitação pode-se citar poucos excertos analisados, bem como a necessidade de maiores pesquisas para validar o framework em outros contextos e eventos. Como recomendações gerenciais, sugere-se que pequenas falhas operacionais não sejam relevadas na rotina organizacional, que a interação entre as diversas pessoas que fazem parte da organização sejam valorizadas e que a aprendizagem com pequenos eventos seja efetivada a fim de evitar maiores complicações. Sendo assim, beneficiar-se-ão deste entendimento, organizações que fizerem de sua gestão o mais próximo das HRO’s e que leve em conta os microprocessos do sensemaking e da confiança nas suas decisões para gerenciamento das crises que conduzam ao aprendizado organizacional. Referências ALLEE, Verna. Reconfiguring the value network. The Journal of Business Strategy. Boston: Vol.21, Iss. 4; pg. 36, 4 pgs. Jul/Aug 2000. ANTAKI, C., BARNES, R., & LEUDAR, I. (2005). Diagnostic formulations in psychotherapy. Discourse Studies, 7(6), 627-647. ARMINEN, I. Conversation Analysis: a quest for order in social interaction and language use. Acta Sociologica, Review Essay Vol. 42. 1999. AXELROD, Robert. The evolution of cooperation. [s.L.]: Basic Books, 1984. 241 p. BORGES, M. L.; GONÇALO, C. R. Criação de sentido nas organizações. Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos, v.6(2), p.185-186, 2009. BROOKS, Bradley. Blackout raises fears about Brazil infrastructure. Associated Press Headlines. Disponível em: http://hosted2.ap.org/txdam/9e997301051748e6b7ba5d8b60b1e3c1/Article_2009-11-12-LT-Brazil-Blackouts/idp1fd90bec8d7b47929b3da8ef6d5dcf30 . Acessado em: 12/11/2009. CHO, J. 2006. The mechanism of trust and distrust formation and their relational outcomes. Journal of Retailing 82 (1, 2006) 25–35, 2006 CLIFTON, J. A conversation analytical approach to business communication: The Case of Leadership. Journal of Business Communication, Volume 43, Number 3, July 2006 202-219. CORREIA et al. 2006 Trajetória das Reformas Institucionais da Indústria Elétrica Brasileira. Revista EconomiA, Brasília(DF), v.7, n.3, p.607–627, set/dez 2006. CROSSAN, Mary; LANE, Henry; WHITE, Roderick. An organizational learning framework: from intuition to institution. Academy of Management Review, vol. 24, nº3, pp.522-537, Julho, 1999. DREW, P., J. Heritage, eds. Talk at work: interaction in institutional settings. Cambridge: Cambridge University Press: 101-34, 1992 DREW, P. (2003). Comparative analysis of talk-in-interaction in different institutional contexts: A sketch. In P. J. GLENN & C. D. LEBARON & J. MANDELBAUM (Eds.), Studies in Language and Social Interaction (pp. 293308). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates. FARIA, V.; VALE, M.I, ARAUJO, L; VALE, M.H. STA – Sistema para tratamento de alarmes: uma ferramenta de auxílio à operação. In: 3º. Simpósio de Especialistas em Operação de Centrais Hidrelétricas. Foz do Iguaçu, 2002 FIOL, M. e LYLES, Organizational learning. The Academy of Management Review, out. 1985, pp 803-813. FLICK, Uwe. Uma introdução à pesquisa qualitativa. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. GAMBETTA, D. (ed) Familiarity, Confidence, Trust: Problems and Alternatives Basil Blackwell: New York, pp.94107, 1988. GILBERT, T Towards a politics of trut. Journal of Advanced Nursing, 27, p. 1010-1016, 1998 GOFFMAN, E. On face-work: An analysis of ritual elements in social interaction. Psychiatry, 28, 213-231.,1955 75 HERZOG, V.L. Trust building on corporate collaborative project teams Project Management Journal. Mar 2001.Vol.32, Num. 1; pg. 28, 2001 HUTCHBY, Ian; WOOFFITT, Robin. Conversation analysis: principles, practices and applications. Cambridge: Polity, 1998, 273 p. HUTCHBY, Ian. Conversation and Technology: from the telephone to the internet. Cambridge: Polity Press, 2001 JUNG LAO, C.; OSTERMANN, A.C. AS Interações no Telemarketing Ativo de Cartões de Crédito: da Oferta Velada à Rejeição. Alfa, São Paulo, 49(2): 65-88, 2005. KRAMER, R. Trust and Distrust in Organizations: Emerging perspectives, enduring questions. Annual Review of Psychology, v. 50, p. 569-598, 1999 LANE, C. & BACHMAN, R.(org) Trust within and between organizations: conceptual issues and empirical applications. Oxford: Oxford University, 2002. 334 p. LEVINSON, Stephen C. Pragmatics. 1. ed. Cambridge: Cambridge University, 1983. 420 p. LEWIS JD., WEIGERT A. Trust as a social reality. Social Forces, v.63, p.967-985, 1985. LUHMANN, Niklas. Confianza. Barcelona: Anthropos; México: Universidad Iberoamericana; Santiago do Chile: Instituto de Sociologia da Pontificia Universidad Católica de Chile, 1996. McALLISTER, R. Affect and cognition based Trust as Foundations for Interpersonal Cooperation in Organizations. Academy of Management Journal, v. 38, n. 1, p. 24-59,1995. McCLEARY, L.E. Disciplina: Os Fundamentos Etnometodológicos da Análise da Conversação - Universidade de São Paulo. Criado em 01/06/2009. Disponível em: http://sistemas1.usp.br:8080/fenixweb/fexDisciplina?sgldis=FLM5147 Acesso em: 17/08/2009. NIELSEN, M.F, Managers' Interactional Strategies through Conversation Analysis Interpretative Management in Business Meetings: Understanding. Journal of Business Communication 2009; 46; 23 OSTERMANN, Ana C. Comunidades de prática: gênero, trabalho e face. In: HEBERLE, Viviane, OSTERMANN, Ana C., FIGUEIREDO, Débora. Linguagem e Gênero: no trabalho, na mídia e em outros contextos. Florianópolis: Editora da UFSC, 2006. PASSUELO, CB. OSTERMANN, AC. Aplicação da análise da conversa etnometodológica em entrevista de seleção: considerações sobre o gerenciamento de impressões. Estudos de Psicologia 2007, 12(3), 243-251 PERROW, C. The limits of Safety: the enhancement of a theory of accidents. Journal of Contingencies and Crisis Management.Vol 2, Num 4, Dec 1994 PERROW, C. Organizing to Reduce the Vulnerabilities of Complexity. Journal of Contingencies and Crisis Management.Volume 7 Number 3 September 1999 PERROW,C. Disasters Evermore? Communications of the Acm. Vol. 50, No. 7. July 2007 PERROW, C. What’s needed is application, not reconciliation: a response to Shrivastava, Sonpar and Pazzaglia. Human Relations. Volume 62(9): 1391–1393. 2009 ROBERTS, K. Some characteristics of one type of high Reliability organization. Organization Science, Vol. 1, No. 2, 1990 ROBERTS, K. STOUT, S., HALPERN, J. Decision Dynamics in Two High Reliability Military Organizations. Management Science, VoI. 40, No. 5, May 1994 ROBERTS, K., BEA, R. Must accidents happen? Lessons from high-reliability organizations. Academy of Management Execulive. Vol. 15, No. 3, 2001 ROBERTS. K. High Reliability Organizations. Blackwell Encyclopedic Dictionary of Organization Behavior, p.1-1. 2005 ROUSSEAU, Denise; SITKIN, Sim; BURT, Ronald; CAMERER, Colin. Not so different after all: a cross discipline view of trust. Academy of Management Review. v. 23, 3, p. 393- 404, 1998. SAMRA-FREDERICKS, D. A Proposal for Developing a Critical Pedagogy in Management from Researching Organizational Members’ Everyday Practice. Management Learning Vol. 34(3): 291–312. 2003 SCHULMAN,P. ROE, E. EETEN, M, BRUIJNE, M. High Reliability and the Management of Critical Infrastructures. Journal of Contingencies and Crisis Management, 12(1): 14-28, March 2004 SILVERMAN, David. Harvey Sacks: Social Science and Conversation Analysis. Oxford University Press, Oxford. 1998. 76 SOUZA, Y.S. Organizações de aprendizagem ou aprendizagem organizacional. RAE-eletrônica, v. 3, n. 1, Art. 5, jan./jun. 2004 STRAHLEN, D., CALDERON, R. LEWIS, J. ROBERTS, K. Changing a Pediatric Sub-acute Facility to Increase Safety and Reliability. In: SAVAGE, G. FORD, E; Advances in Healh Care Management: Patient Safety and Health Care Management. Vol 7Emerald: United Kingdom, 259-282. 2008 WALLER,M., ROBERTS, K. High reliability and organizational behavior: Finally the twain must meet. Journal of Organizational Behavior, 24, 813-814. 2003 WEICK, Karl E Sensemaking in organizations. Thousand Oaks: SAGE, 1995. WEICK, K.E.; SUTCLIFFE, K.M.. Managing the Unexpected: assuring high performance in na age of complexity. San Francisco: Jossey-Bass, 2001, 199p. WEICK, K. E., & WESTLEY, F. “Organizational learning: Affirming an Oxymoron”. In Clegg, S.R. Hardy,C. & NORD W. R. (Eds.), Handbook of Organization Studies, London: Sage, pp. 440-458., 1996 WEICK K E, SUTCLIFFE K M, OBSTFELD D. Organizing for High Reliability: Processes of Collective Mindfulness. Research in Organizational Behavior. 1999;21:81–123. WHITENER,E. BRODT, S. KORSGAARD, M. A. WERNER, J. Managers as initiators of trust: an exchange relationship framework for understanding managerial trustworthy behavior. Academy of Management Review. Vol. 23, No. 3, 513-530. 1998 WONG, S., DESAI, M. MADSEN, P., ROBERTS, K. CIAVARELLI, A. Measuring Organizational Safety and Effectiveness at NASA. Engineering Management Journal Vol. 17 No. 4 December 2005 ZUCKER, L. G. (1986). “Production of trust: Institutional sources of economic structure, 18401920.” Research in Organisational Behaviour Vol. 8: 53-111. Nota 1 - Convenções de transcrição das interações telefônicas gravadas Fonte: Jung Lao e Osterman (2005, p. 88) [ ] = (0.0) (.) ABC :: ? . ºabcº >< XXX (( )) indica o início de uma sobreposição de fala indica o final de uma sobreposição de fala indica que um turno é imediato ao próximo indicam pausa maior do que três segundo indica uma pausa menor do que três segundos indica entonação enfática indica alongamento do som precedente indica elevação de entonação indica uma entonação descendente indica uma fala em tom de voz mais baixo indica aceleração na velocidade da fala indica incapacidade para ouvir o que era dito indicam as descrições do áudio convencional 4. RECURSOS Os recursos a serem utilizados para a consecução deste projeto de pesquisa consistem em várias visitas às instituições para proposta, negociação e aceitação da realização da pesquisa. Serão necessários recursos de suporte como gravador MP3, notebook, livros, material para pesquisa além de investimento financeiro em transporte entre outros. 77 5. CRONOGRAMA 2010 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 Etapas Realização de estudo exploratório Defesa do projeto de pesquisa Revisão da literatura e adequação do projeto Contato e negociação com as instituições Solicitação e liberação no Conselho de Ética da instituição quando necessário Realização das entrevistas Realização das observações Coleta de dados secundários Coleta de conversas em áudio Transcrição do material coletado Análise do material coletado Análise final dos dados Conclusão Redação final Revisão final e entrega MA MJ JA √ √ √ 2011 SO 2012 ND JF MA MJ JA SO √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ ND JF √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ √ Notas: 1- Pretende-se realizar um aprofundamento teórico sobre o tema das decisões e sobre confiança como complemento ao Referencial Teórico da tese. 2- Publicaram-se três artigos que versaram e/ou utilizaram a abordagem da Análise da Conversa: BORGES, Maria L. e GONÇALO, Cláudio R. Aprendizagem através do sensemaking e da confiança: um estudo em um ambiente de eventos inesperados In: 3rd Colloquium Latin and European Meeting on Organization Studies (LAEMOS), Buenos Aires, 2010a. BORGES, M.L.; GONÇALO, M.L. “Contribuições da Análise da Conversa aos estudos organizacionais”In: VI ENEO- Encontro de Estudos Organizacionais da ANPAD, 2010, Florianópolis, Anais VI Encontro de Estudos Organizacionais da ANPAD, 2010 BORGES, M. L. ; GONÇALO, C. R. Learning Process promoted by sensemaking and trust: a study related to unexpected events Cadernos Ebape – FGV , no prelo (a ser publicado em 2010 Issue Special LAEMOS – Classificação B1). 3- Publicou-se um artigo que versou sobre Storytelling 78 BORGES, Maria L. GONÇALO, Claudio R. Abordagem de Storytelling: Ferramenta para Identificação de Estratégias Praticadas In: Anais do 3Es: Encontro de Estudos em Estratégia do ANPAD, Recife - PE, 2009 REFERÊNCIAS ABMA, Tikene. Learning by Telling Storytelling Workshops as an Organizational Learning Intervention. Management Learning Vol. 34(2): 221–240, 2003. ADAMSON, Gary, PINE, Joe, STEENHOVEN, Tom Van, KROUPA, Jodi. How Storytelling can drive strategic change. Strategy & Leadership. Vol. 34. Iss. 1, p.36, 2006. AKTOUF, Omar. A Administração entre a Tradição e a Renovação. São Paulo, SP: Atlas, 1996. ALLEN, Kathryn. Organizational Storytelling. Franchising World. Vol.37, Iss. 11; pg. 63, 3 pgs. Washington: Nov 2005 ANDERSON, M. How Can We Know What We Think Until We See What We Said?: A Citation and Citation Context Analysis of Karl Weick’s The Social Psychology of Organizing. Organization Studies 27(11): 1675–1692 ARMINEN, I. Conversation Analysis: a quest for order in social interaction and language use. Acta Sociologica, Review Essay Vol. 42. 1999. BALOGUN, Julia and JOHNSON, Gerry. From Intended Strategies to Unintended Outcomes: The Impact of Change Recipient Sensemaking. Organization Studies. 26(11): 1573–1601, 2005 BANKS-WALLACE, JoAnne .Talk That Talk: Storytelling and analysis Rooted in African American Oral Tradition. Qualitative Health Research, Vol. 12 No. 3, 410-426 March 2002. BARALDI, Cláudio; GAVIOLI, Laura. The relevance of interactions in functionally differentiated society: The contribution of conversation analysis to the theory of social systems Soziale Systeme, v. 13 (Heß 1+2), p. 125-135, 2007 BARONE, T. Beyond theory and method: a case of critical story-telling, Theory into practice, 31(2),pp. 42–146. 1992 BECKER, Kai Helge, HAUNSCHILD, Axel. The impact of boundaryless careers on organizational decision making: an analysis from the perspective of Luhmann's theory of social systems. International Journal of Human Resource Management 14, no. 5, p. 713-727, 2003. BERS, Marina U., ACKERMANN, Edith, CASSEL, Justine, DONEGAN, Beth, et al. Interactive Storytelling Environments: Coping with Cardiac Illness at Boston’s Children’s Hospital. Appears in Conference on Human Factors in Computing Systems, 603-610.CHI: 1998. BIOGRAFY: Niklas Luhmann. Disponível em http://www.servinghistory.com/topics/Niklas_Luhmann::sub::Biography Acesso em 04 de junho de 2010. BOJE, David M. Stories of the Storytelling organization: A postmodern analysis of Disney as "Tamara-Land". Academy of Management Journal.Vol.38, Iss. 4; pg. 997, 39 pgs, Aug. 1995 BORGES, Maria L. e GONÇALO, Cláudio R. Aprendizagem através do sensemaking e da confiança: um estudo em um ambiente de eventos inesperados In: 3rd Colloquium Latin and European Meeting on Organization Studies (LAEMOS), Buenos Aires, 2010a. BORGES, Maria L. GONÇALO, Claudio R. Abordagem de Storytelling: Ferramenta para Identificação de Estratégias Praticadas In: Anais do 3Es: Encontro de Estudos em Estratégia do ANPAD, Recife - PE, 2009a. BORGES, Maria L. GONÇALO, Claudio R. Criação de Sentido nas Organizações. BASE – Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos, 6(2):185-186, maio/agosto, 2009b 79 BROOKS, Bradley. Blackout raises fears about Brazil infrastructure. Associated Press Headlines. Disponível em: http://hosted2.ap.org/txdam/9e997301051748e6b7ba5d8b60b1e3c1/Article_2009-11-12-LTBrazil-Blackouts/id-p1fd90bec8d7b47929b3da8ef6d5dcf30 . Acessado em: 12/11/2009. BURREL, G.; MORGAN, G. Sociological Paradigms and Organisational Analysis: Elements of the Sociology of Corporate Life. Aldershot, England: Ashgate, 1998. CAVEDON, Neusa. As representações sociais dos universitários sobre o trabalho. In: Anais da XXII EnAnpad, Foz do Iguaçu, setembro de 1999. CHAVES-SCARELLI, Thiago. 2010 já é segundo pior ano da década em número de mortes por terremotos no mundo. Disponível em http://noticias.uol.com.br/especiais/terremoto-nochile/ultimas-noticias/2010/03/01/2010-ja-e-segundo-pior-ano-da-decada-em-numero-de-mortespor-terremotos-no-mundo.jhtm Acesso em 06 de junho de 2010. CLIFTON, J. A conversation analytical approach to business communication: The Case of Leadership. Journal of Business Communication, Volume 43, Number 3, July 2006 202-219. COHN, Gabriel. As Diferenças Finas: de Simmel a Luhmann. Revista Brasileira de Ciências Sociais. São Paulo, vol. 13, n. 38, Oct. 1998 COLLIS, Jill; HUSSEY, Roger. Pesquisa em Administração: um guia prático para alunos de graduação e pós-graduação. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. COOREN, F. Arguments for the in-depth study of organizational interactions: A Rejoinder to mcphee, Myers, and Trethewey. Management Communication Quarterly, Feb2006, Vol. 19 Issue 3, p327-340, 13p. CURRICULUM VITAE, Karl E. Weick. Maio de 2007. Disponível em http://www.bus.umich.edu/FacultyBios/CV/karlw.pdf. Acesso em 31/01/2009. CZARNIAWSKA, Barbara. Complex Organizations Still Complex. International Public Management Journal, vol. 10, n. 2, pag. 137–151, 2007. CZARNIAWSKA, Barbara. Karl Weick: Concepts, style and reflection. The Editorial Board of the Sociological Review 2005, p. 267-278, 2005 DENNING, Stephen. Effective Storytelling: strategic business narrative techniques. Strategy & Leadership. Vol.34, Iss. 1; pg. 42, 7 pgs. Chicago: 2006. FEDOZZI, Luciano. A nova teoria de sistemas de Niklas Luhmann; uma leitura introdutória. In: LUHMANN, Niklas. A Nova Teoria dos Sistemas. Porto Alegre: Ed. Universidade UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997, 111 p. FLICK, Uwe. Uma introdução à pesquisa qualitativa. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2004. FLICKINGER, Hans-Georg; NEUSER, Wolfgang. Teoria de auto-organização: as raízes da interpretação construtivista do conhecimento. Porto Alegre: EdiPUCRS, 1994. GARGIULO, Terrence. Power of Stories. The Journal for Quality and Participation Cincinnati: Vol.29, Iss. 1; pg. 4, 6 pgsSpring 2006. GILBERT, T Towards a politics of trut. Journal of Advanced Nursing, 27, p. 1010-1016, 1998 GIOIA, D. Introduction to the Special Issue ‘Making Sense of Organizing: in Honor of Karl Weick’. Organization Studies, 27(11): 1573–1578, 2006 GRANDESSO, Marilene A. Sobre a reconstrução do significado: Uma análise epistemológica e hermenêutica da prática clínica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. GUESSER, A. A etnometodologia e a análise da conversação e da fala. Revista EmTese (UFSC), Vol. 1 nº 1 (1), agosto-dezembro/2003, p. 149-168. Disponível em http://www.emtese.ufsc.br/h_Adalto.pdf. Acesso em: 31/01/2009. 80 HUTCHBY, Ian; WOOFFITT, Robin. Conversation analysis: principles, practices and applications. Cambridge: Polity, 1998, 273 p. KÜPERS, 2005 LEVINSON, Stephen C. Pragmatics. 1. ed. Cambridge: Cambridge University, 1983. 420 p. Luhmann N. Membership and Motives in Social Systems. Systems Research, September 1996; 13(3):341-348, 1996a. LUHMANN, Niklas. Confianza. Barcelona: Anthropos; México: Universidad Iberoamericana; Santiago do Chile: Instituto de Sociologia da Pontificia Universidad Católica de Chile, 1996b. LUHMANN, Niklas. La diferenciación evolutiva entre sociedad e interacción.1987. Disponível em http://www.ual.edu.mx/Biblioteca/Teoria%20Social%20IV/Pdf/Unidad_04.pdf Acesso em 15 de maio de 2010. LUHMANN, Niklas. Organización y decisión, autopoiesis, acción y entendimiento comunicativo. Barcelona: Anthropos, 138 p., 1997a LUHMANN, Niklas. A Nova Teoria dos Sistemas. Porto Alegre: Ed. Universidade UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997b, 111 p. LUHMANN, Niklas ¿Qué es comunicación?, Revista Talón de Aquiles, Nº 1, 1995, pp. 7-11 Disponível em http://conocimientoysociedad.blogspot.com/ Disponibilizado em: enero 04, 2007 Acesso em: 15 de abril de 2010. LUHMANN, Niklas (1987) La Diferenciación Evolutiva Entre Sociedad e Interacción. Disponível em http://www.ual.edu.mx/Biblioteca/Teoria%20Social%20IV/Pdf/Unidad_04.pdf acesso em 15/04/2010 LUHMANN, Niklas. Introdução à Teoria dos Sistemas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010, 414p. MARZEC, Morgan. Telling the corporate story: vision into action. The Journal of Business Strategy. .Vol.28, Iss. 1; pg. 26 Boston: 2007 MAUBOUSSIN, Michael. Think Twice: Harnessing the Power of Counterintuition. Harvard Business School Press, October 2009. McCLEARY, L.E. Disciplina: Os Fundamentos Etnometodológicos da Análise da Conversação Universidade de São Paulo. Criado em 01/06/2009. Disponível em: http://sistemas1.usp.br:8080/fenixweb/fexDisciplina?sgldis=FLM5147 Acesso em: 17/08/2009. MELLO, Fernanda. Enchente no Rio está entre as mais fatais. Disponível em http://tnonline.com.br/noticias/brasil/33,3235,07,04,enchente-no-rio-esta-entre-as-maisfatais.shtml Acesso em 06 de junho de 2010. MEREDITH, Jack. Theory building through conceptual methods. International Journal of Operations & Production Management. Vol. 13, num. 5, p. 3-9, 1993 MINAYO, Maria. C. S.; DESLANDES, Suely F. Análise da implantação do sistema de atendimento pré-hospitalar móvel em cinco capitais brasileiras. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 8, p. 1877-1886, ago, 2008. MINAYO, M. C. S.; SANCHES, O. Quantitativo-qualitativo: oposição ou complementaridade? Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro: v.9, n.3, p.239-262, 1993. NEBEHAY Stephanie. OMS reconhece falhas na gestão de informação sobre Gripe A (H1N1) e cria comité de 29 especialistas. Em 12/04/2010. Disponível em http://crohn.netne.net/index.php/dossier-gripe-a/44-dossier-gripe-a/782-oms-reconhece-falhas-nagestao-de-informacao-sobre-gripe-a-h1n1-e-cria-comite-de-29-especialistas Acesso em 06 de junho de 2010. 81 NEUSER, Wolfgang. O objetivo das teorias de auto-organização. In: FLICKINGER, HansGeorg; NEUSER, Wolfgang. Teoria de auto-organização: as raízes da interpretação construtivista do conhecimento. Porto Alegre: EdiPUCRS, 1994 NEVES, Clarissa E.B. Niklas Luhmann e sua obra. In: LUHMANN, Niklas. A Nova Teoria dos Sistemas. Porto Alegre: Ed. Universidade UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997, 111 p. NEVES, Clarissa, NEVES, Fabricio. O que há de complexo no mundo complexo? Niklas Luhmann e a Teoria dos Sistemas Sociais. Sociologias, Porto Alegre, ano 8, nº 15, , p. 182-207, jan/jun 2006 NIELSEN, M.F, Managers' Interactional Strategies through Conversation Analysis Interpretative Management in Business Meetings: Understanding Journal of Business Communication; 46; 23; 2009 NUNES, Jordão H. Neutralidade ou impregnação teórica na observação:implicações metodológicas nas ciências sociais. In: Anais XXVII Encontro Anual da Anpocs. Fórum Dicotomias Metateóricas nas Ciências Sociais. Outubro de 2003. PASSUELO, C.B. OSTERMANN, A.C. Aplicação da análise da conversa etnometodológica em entrevista de seleção: considerações sobre o gerenciamento de impressões. Estudos de Psicologia 12(3), 243-251, 2007 PERROW, C. The limits of Safety: the enhancement of a theory of accidents. Journal of Contingencies and Crisis Management.Vol 2, Num 4, Dec 1994 PERROW, C. Organizing to Reduce the Vulnerabilities of Complexity. Journal of Contingencies and Crisis Management.Volume 7 Number 3 September 1999 PERROW,C. Disasters Evermore? Communications of the Acm. Vol. 50, No. 7. July 2007 PERROW, C. What’s needed is application, not reconciliation: a response to Shrivastava, Sonpar and Pazzaglia. Human Relations. Volume 62(9): 1391–1393. 2009 PETTIGREW, A. M. Longitudinal field research on change: theory and practice. Organizational Science, Providence, v. 1, n. 3, p. 267-292, august 1990. PORAC, J.;THOMAS, H.; BADEN-FULLER, C. Competitive Groups As Cognitive Communities: The Case Of Scottish Knitwear Manufacturers. Journal of Management Studies 26:4 July 1989 REED, Michel. Management as a social practice. Journal of Management Studies,v.21, n.3, p.273-285, 1984. RIBEIRO, Ednaldo A. O elemento voluntarista na sociologia de Talcott Parsons. Acta Sci. Human Soc. Sci. Maringá, v. 28, n. 1, p. 93-98, 2006 ROBERTS, Karlene, BEA, Robert. Must accidents happen? Lessons from high-reliability organizations. Academy of Management Executive. Vol. 15, No. 3, 2001a ROBERTS, Karlene, BEA, Robert. When system fail. Organizational Dynamics, vol. 29 no. 3, p. 179-191, 2001b. RODRIGUES, Jorge N. Aprenda a lidar com “cisnes cinzentos” (02/05/2010). Disponível em http://aeiou.expresso.pt/aprenda-a-lidar-com-cisnes-cinzentos=f580029#commentbox Acesso em: 06 de junho de 2010. RODRÍGUEZ. Dario; TORRES N., Javier. Autopoiesis, la unidad de una diferencia: Luhmann y Maturana. Sociologias, Porto Alegre, ano 5, nº 9, jan/jun 2003, p. 106-140, 2003 SNOWDEN, David. Complex acts of knowing: Paradox and descriptive self-awareness. Journal of Knowledge Management. .Vol.6, Iss. 2; pg. 100, 12 pgs. Kempston: 2002. SOARES, Ana T. N. A comunicação organizacional sob o olhar teórico – contribuições de Niklas Luhmann. In: Anais da XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação 82 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação– Uerj – 5 a 9 de setembro de 2005. SOTO, Eduardo. Comportamento organizacional: O impacto das emoções. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. SRINIVASAN, Shiva Kumar. Storytelling: branding in practice. South Asian Journal of Management Vol.12, Iss. 3; pg. 92, 4 pgs. Jul-Sep, 2005. STABLEIN, Ralph. Dados em estudos organizacionais. In: CLEGG, Stewart, HARDY, Cynthia, NORD, Walter. Handbook de Estudos Organizacionais. São Paulo: Atlas, p. 63 – 88, 2001. SUTCLIFFE, K.; BROWN, A. ;PUTNAM, L. Introduction to the Special Issue ‘Making Sense of Organizing: in Honor of Karl Weick’. Organization Studies 27(11): 1573–1578, 2006 SWAP, Walter; Leonard, Dorothy; SHIELDS, Mimi; ABRAMS, Lisa. Using mentoring and Storytelling to transfer knowledge in the workplace. Journal of Management Information Systems; Summer 2001. WEICK, Karl E. A psicologia social da organização. Tradução Dante Moreira Leite. São Paulo: Edgard Blücher, 1973 (Trabalho original publicado em 1969). WEICK, Karl. E Sensemaking in organizations. Thousand Oaks: SAGE, 1995. WEICK, Karl E.; SUTCLIFFE, K.M.. Managing the Unexpected: assuring high performance in na age of complexity. San Francisco: Jossey-Bass, 2001, 199p. WEICK, K. SUTCLIFFE, K. Managing the Unexpected: Resilient Performance in an Age of Uncertainty; 2ª. Ed. John Wiley and Sons, Inc, USA, 2007 WEICK, Karl E.; SUTCLIFFE, K.M..OBSTFELD, D. Organizing for High Reliability: Processes of Collective Mindfulness. In: SUTTON, R.S. and STAW, B.M. (eds), Research in Organizational Behavior, Volume 1; Stanford:Jai Press, pp. 81–123, 1999. WEICK, K. E., & WESTLEY, F. “Organizational learning: Affirming an Oxymoron”. In Clegg, S.R. Hardy,C. & NORD W. R. (Eds.), Handbook of Organization Studies, London: Sage, pp. 440-458., 1996 YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001. 83